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quinta-feira, 28 de março de 2013

Guiné 63/74 - P11325: Notas de leitura (469): Estudos sobre a Etnologia do Ultramar Português (Volume III)”, editado pela Junta de Investigações do Ultramar, Lisboa, 1963... Usos e costumes: a tecelagem, o arrancamento da pele dos cadáveres, as práticas de necrofagia, o fanado, o choro, o bombolom... (Francisco Henriques da Silva, antigo embaixador)

1. Mensagem de Francisco Henriques da Silva, nosso camarada e grã-tabanqueiro, ex-alf mil, CAÇ 2402 / BCAÇ 2851 (,Mansabá e Olossato, 1968/70),  e mais tarde ex-embaixador de Portugal, na Guiné-Bissau (1997/1999)] [, foto à esquerda, 26 de Abril de 2012, Lisboa, Bertrand Dolce Vita Monumental, tertúlia,; foto de L.G.]


Data: 23 de Março de 2013 à40 19:00

Assunto: Estudos sobre a Etnologia do Ultramar Português (Volume  III), editação da  Junta de Investigações do Ultramar, Lisboa, 1963


Meu caros amigos,


Aqui há umas semanas veio-me parar às mãos uma obra do maior interesse  que descobri, por mero acaso, na biblioteca particular de um amigo meu  e para a qual solicito a vossa atenção.Trata-se do livro "Estudos  sobre a Etnologia do Ultramar Português (Volume III)", editado pela  Junta de Investigações do Ultramar, Lisboa, 1963. Um livro de vários  autores,  essencialmente focado em temas de antropologia (entre os quais  sobressai o nome de António Carreira), editado e totalmente dedicado à Guiné então Portuguesa.

Esta obra vem precisamente na linha da correspondência travada com o  Luís Graça, em que ambos reconhecemos que partíamos para as missões de  soberania no chamado Ultramar, qualquer que fosse o local, sem fazermos a menor ideia do que iríamos encontrar. Que povos? Que  línguas? Que religiões? Que usos e costumes? E a lista podia  continuar, sendo a Guiné, atenta a exiguidade do território, de uma  diversidade extraordinária, multifacetada e vibrante.

Explicavam-nos o funcionamento da "Dreyser", como montar uma emboscada  ou como comunicar no rádio, mas nada nos diziam sobre as realidades  geográficas, etnológicas, históricas, religiosas, etc. com que nos  íamos confrontar. Tratava-.se de um ponto essencial, mas os altos  mandos militares da época nunca pensaram nisso ou consideraram-no  desnecessário, como só muito tardiamente pensaram na chamada "acção  psicológica", como é do conhecimento público. Oficiais, sargentos e praças partiam na quase total ignorância do que era a Guiné e os seus  Povos e, no fundo, bastaria um pequeno esforço para dar a conhecer,  por exemplo, mesmo de uma forma resumida, a realidade sociológica da  Guiné. Isso, que eu saiba, jamais foi feito. Partíamos rumo ao
desconhecido, na escuridão total. Recordo que os norte-americanos na  Coreia e no Vietname - e suponho que noutros teatros de operações -  eram instruídos e dispunham de pequenos manuais de divulgação  relativos aos países e povos que iriam encontrar.

O livro em apreço é de um grande interesse e lança-nos muitas pistas  sobre a Guiné. Muitos reconhecerão práticas locais que aprenderam por  experiência própria.  Enfim, aqui vos deixo as minhas impressões.

Com um abraço cordial e amigo e as habituais "mantenhas"

Francisco Henriques da Silva

(ex-Alf Mil Inf  da CCaç 2402, e ex-embaixador de Portugal em Bissau)



Capa do livro  > Junta de Investigações do Ultramar -  Estudos sobre a etnologia do Ultramar português.  Lisboa : Junta de Investigações do Ultramar, 1963. Vol. III, 240 p. : il. ; 25 cm. (Estudos, Ensaios e Documentos. 102).


2. ALGUNS USOS E COSTUMES DA GUINÉ
por Francisco Henriques da Silva


O livro “Estudos sobre a Etnologia do Ultramar Português (Volume III)”, editado pela Junta de Investigações do Ultramar, Lisboa, 1963, é uma obra coletiva de grande interesse, para todos aqueles que se sentem atraídos pela Guiné-Bissau e pelos seus diferentes povos, respetivos usos e costumes. Inserido na coleção “Estudos, Ensaios e Documentos”, cabe referir que é um livro que beneficia do contributo de vários autores da época, investigadores e estudiosos das questões etnológicas, entre os quais avultam nomes conhecidos, como é o caso, por exemplo, de António Carreira. 

Tanto quanto me apercebi teriam sido editados diversos volumes, sob aquele título genérico, cada um sobre uma das províncias ultramarinas sendo este sobre a Guiné, em que só são focados temas exclusivamente guineenses.

Os textos abordam assuntos tão diversos como o estudo da tecelagem, o arrancamento da pele dos cadáveres e as práticas de necrofagia, as mutilações genitais (ou seja, o fanado masculino e feminino – circuncisão, no primeiro caso, e excisão do clitóris, no segundo), as práticas funerárias dos Brames (ou mancanhas), os tambores “falantes” (o bombolom e outros instrumentos de comunicação por percussão à distância) e, finalmente, a etnonímia das populações autóctones da Guiné Portuguesa.

O primeiro texto – “Subsídios para o estudo da tecelagem na Guiné Portuguesa”, elaborado por Maria Emília de Castro Almeida e Miguel Vieira – começa por referenciar os povos tecelões do território: manjacos, papéis, brames, mandingas e fulas, portanto de várias origens étnicas e religiosas (animistas e islamizados). Contrariamente à tradição europeia, trata-se de uma profissão reservada ao sexo masculino. 

Em seguida, ao ser estudada a origem do tear em África e, baseando-se nas descrições dos primeiros cronistas e navegadores portugueses na região, concluem que o tear já existia quando da nossa chegada à Senegâmbia, uma vez que “a indústria do algodão na Guiné era já uma realidade quando os portugueses ali chegaram” (p. 46). Por conseguinte, não sendo de origem europeia seria presumivelmente de origem asiática. Teria tido inicialmente “uma possível mas fraca irradiação já nos princípios da nossa era, cremos, porém, que a verdadeira e intensa introdução do tear de pedais na Guiné seria mais tardia, no tempo da expansão muçulmana em África” (p. 51).

Independentemente da origem – presumivelmente asiática – e da sua transmissão através de povos islamizados, os autores assinalam que “os manjacos e também os papéis são os povos que mais se entregam actualmente à tecelagem e dos que sofreram menos a influência muçulmana” (p. 57). Muito provavelmente os tecelões manjacos terão exportado as suas técnicas para Cabo Verde, concluem também os autores.

Maria Emília C. Almeida e Miguel Vieira tecem alguns comentários sobre os diferentes panos guineenses e fazem a descrição tecnológica relativamente pormenorizada do seu modo de fabrico. O artigo contem mapas da distribuição dos diferentes povos da Guiné e ilustrações dos teares e das respetivas peças, bem como fotos dos tecelões em plena atividade e dos panos já confecionados.

[Cartoon, à esuqerda: António Barbosa Carreira, Ilha do Fogo, Cabo Verde, 1905- Lisboa, Portugalo, 1988. Fonte: Página de Barros Brito, com a devida vénia]


O artigo que se segue, da autoria de António Carreira,  intitula-se “Do arrancamento da pele aos cadáveres e da necrofagia na Guiné, Portuguesa”. No primeiro caso estamos perante uma estranha prática ancestral dos manjacos, conhecido na expressão crioula por “descascar defuntos”. Era uma prática, segundo Carreira, já pouco seguida no início da década de 1930 e que, entretanto, terá desaparecido. Ninguém, nem mesmo os mais idosos, era capaz de elucidar as origens deste ritual insólito, nem o objetivo último do mesmo. Apenas se sabe que se tratava de um rito funerário daquele povo e circunscrito em exclusivo aos manjacos, não se tendo verificado tal prática em nenhum outro grupo étnico. 

 Segundo relata Carreira, “ficámos sem saber se o descasque de defuntos fora, desde sempre uma verdadeira modalidade dos ritos funerários dos manjacos ou se seria um derivante ou substituto da antropofagia.” (p. 106). O autor interroga-se: “Da antropofagia – que se admite tenha existido em toda esta área – não teria resultado, por evolução, a necrofagia e, numa fase posterior o descasque de cadáveres?” (ibidem).


Todavia, nem entre os manjacos, nem entre os brames (mancanhas) foram detectadas práticas de
canibalismo, muito embora os felupes a praticassem em tempos remotos. Carreira admite, como mera hipótese de trabalho, que os manjacos a tivessem levado a cabo, muito embora não o possa provar, tendo, ao longo do tempo, evoluído para o descasque de cadáveres.

[ Foto à direita: Um felupe, 1821... Gravura norte-americana, imagem do domínio público, cortesia de Wikipédia]


A cerimónia revestia-se de uma certa complexidade, na medida em que previamente era necessário proceder ao interrogatório do defunto, o anúncio da morte, o sacrifício de vários animais, a que se seguiam danças e outras cerimónias para afastar os maus espíritos. O corpo depois era colocado num estrado, regado com álcool e defumado.

Como relata Carreira, “logo que a decomposição estivesse avançada, o descascador (o profissional chamado Natiêmá) procedia à operação do arrancamento da pele. Para tanto servia-se de enormes unhas, que propositadamente deixava crescer; elas constituíam a ferramenta do ofício” (p. 111). Depois o corpo era envolto em panos e inumado.

Quanto à prática da necrofagia que se verificava ainda na década de 50 entre os Felupes, os cadáveres eram enterrados quase à superfície da terra, durante uma semana, finda a qual, os corpos já putrefactos eram desenterrados, cozinhados e comidos. 

Outro dos costumes ancestrais dos felupes consistia em colecionar crânios dos inimigos caídos em combate e que eram utilizados em libações. Hábito que não nos deverá parecer tão exótico, na medida em que os antigos vikings também o praticavam. Membros de tribos inimigas que penetrassem em território felupe eram “assassinados em condições misteriosas; e a maior parte (dos crânios, entenda-se) provém, precisamente, dos cadáveres desenterrados e comidos nos festins do fanado (circuncisão) ou nos ritos especiais, nos Irãs.” (p. 116). 

Comer carne humana de cadáveres consistia numa cerimónia ritual que se revestia da maior importância entre os membros desta etnia. Comer determinadas partes do corpo do inimigo morto conferiria, a quem as devorasse, as mesmas qualidades do defunto, designadamente de coragem e bravura em combate,. Em regra, eram apenas comidos os corpos das pessoas que faleciam de morte natural ou que morriam em conflito armado, mas, muitas vezes, secretamente, os feiticeiros envenenavam pessoas com o fito de as devorarem, muito embora a tribo não tivesse necessidade de carne, porquanto tinha gado e a caça abundava. A necrofagia era um ritual mágico e envolto no maior secretismo.

A. Carreira conclui que “a influência da cultura portuguesa, da francesa e mesmo da africana não conseguiu vencer práticas milenares que a civilização do Ocidente condena, por repugnantes, como a necrofagia” (p. 121).

“Contribuição para o estudo das mutilações genitais na Guiné Portuguesa” é outro interessante artigo subscrito por António Carreira e bastante abrangente, pois abarca todo o território guineense e confere-nos uma panorâmica da extensão destas práticas. 

O autor divide a população local em 3 grupos consoante a diversidade da prática das mutilações sexuais: 

(i)  o primeiro grupo, é aquele em que se pratica a circuncisão nos indivíduos do sexo masculino e a excisão do clítoris nos do sexo feminino (trata-se de etnias islamizadas: fulas, mandingas, biafadas, nalus, banhuns, cassangas e balantas-mané); 

(ii) o segundo grupo confina-se apenas à prática da circuncisão, não se procedendo à ablação do clitóris (estão neste grupo os animistas: manjacos, papéis, brames, felupes, baiotes, balantas e mansoancas);

(iii) o terceiro e último grupo apenas pratica uma circuncisão de caráter simbólico, “por incisões superficiais na pele do pénis, seguidas de escarificações tegumentares simples” (p. 135) e nas mulheres umas incisões no baixo ventre (apenas os bijagós mantém este hábito ancestral).

Quer no caso da circuncisão, quer no da ablação do clitóris, ambas as cerimónias são genericamente designadas, em crioulo, por fanado.

A circuncisão consiste no corte da pele do prepúcio, em geral, com uma faca afiada de lâmina recta. Trata-se de uma cerimónia ritual de purificação (segundo Bastide, citado por Carreira) que só se realiza com uma periodicidade determinada (depende das etnias) e que implica provas físicas, algumas de grande dureza, e nalguns casos até castigos corporais; provas intelectuais e de conhecimento de vida e sócio-religiosas, como refere o autor. Existem igualmente múltiplos tabus e regras específicas, variáveis de tribo para tribo. Em geral, as cerimónias terminam com uma série de festas públicas.

[Foto à direita: Vaqueira manjaca... Detalhe de postal ilustrado da série Guiné Portuguesa. Cortesia de Joaquim Ruivo]


Dependendo das etnias, a circuncisão pode ocorrer na infância, puberdade, adolescência ou já na idade adulta. O autor não refere, porém, que, em muitos casos, os circuncisos podiam morrer de hemorragia, por inexperiência do “operador” ou de infeção (tanto quanto sei, pessoalmente, no caso dos balantas, eram utilizados emplastros com plantas e lama).

A excisão clitoridiana tem menor expansão que a circuncisão, que como se vê está generalizada a quase toda a população masculina, e segundo A. Carreira alguns elementos femininos de certos grupos étnicos (mandingas e fulas) opõem-se-lhe. Todavia, como sublinha, “o certo é que o costume tem, ainda, grande simpatia e aceitação das massas” (p. 172). 

Aparentemente, os rituais destas cerimónias são bastante mais simples e menos violentos que os da circuncisão, aparte a operação de excisão propriamente dita. O autor descreve-a da seguinte forma: “Consiste na ablação do clítoris por um corte transversal, dado com uma lâmina recta. Para o efeito, puxam o clítoris para fora, depois de seguro por uma espécie de anzol sem rebarba. Em uns grupos a ablação é total e em outros está limitada a uma pequenina porção da ponta.” (p. 144). 

A extracção ou corte dos lábios da vulva não é de todo em todo levada a cabo por nenhuma etnia guineense. Registe-se que a excisão do clítoris não constitui um mero rito de passagem, mas uma condição “sine qua non” para o casamento. Sem embargo de Carreira descrever com minúcia a operação, as cerimónias e as regras a observar, não regista em qualquer parte do texto o menor sinal de repúdio ou de horror perante o barbarismo e a crua brutalidade deste costume ancestral.

Para além de apresentar um mapa das mutilações sexuais na Guiné Portuguesa, o autor traça um quadro de cada uma da tribos e dos diferentes processos e cerimónias que nesta matéria que levam tradicionalmente a efeito.

O investigador José Lampreia elaborou um estudo intitulado “Da morte entre os Brames”. Segundo nos conta, no passado remoto, entre os Brames (mancanhas) na cerimónia do “choro” (funeral) chegava a ser sacrificado um casal de crianças se o defunto fosse um régulo. Essa prática terá desaparecido, mas o sacrifício de animais manteve-se e o abate do gado do defunto para alimentar toda a comunidade também, o que, aliás, como se sabe, não é costume exclusivo dos brames. 

Uma cerimónia com algumas semelhanças à do descasque de cadáveres dos manjacos também se praticava, contrariando, de algum modo, o que refere António Carreira que a considera exclusiva daquela etnia. É interessante saber-se como era determinado o local propício ao enterro do corpo. O ritualista acompanhava uma cabra e no local onde esta urinasse cravava-se uma estaca e era esse o sítio designado para se abrir uma galeria funerária onde seria enterrado o defunto.


[Imagem à esquerda: O bombolom...Cortesia do sítio italiano Parrocchia San Leonardo Murialdo di Milano]

“Talking drums in Guiné” é um texto em inglês da autoria de W. A. A. Wilson da Universidade de Londres e que menciona, entre outros instrumentos de percussão (tambores) para transmissão de mensagens à distancia, o bombolom. Seis tribos da Guiné comunicam por este meio – manjacos, papéis, mancanhas, bijagós, balantas e mansoancas. Trata-se de um método muito utilizado em várias partes de África. Contrariamente ao que se possa pensar, não se trata de um qualquer código morse ou algo de aparentado, mas a reprodução de uma língua em que cada sílaba é pronunciada, nesta caso tocada, num tom alto ou baixo, “cada palavra ou frase tem uma melodia particular: os tons altos e baixos são tão importantes como a posição do acento tónico em português ou inglês” (p. 216), como refere o resumo. 

O bombolom é um tronco de madeira escavado com uma frincha que se estende a todo o comprimento. O tocador com dois paus extrai os sons cavos ou mais agudos do instrumento. O som pode ser ouvido a vários quilómetros de distância.

Finalmente, o artigo “Sobre a etnonímia das populações nativas da Guiné Portuguesa” da autoria do professor António de Almeida. O autor defende a tese de que as designações de quase todos os povos da Guiné é de origem mandinga, com várias alterações introduzidas pela língua portuguesa ou pelo crioulo. Também existiriam etnónimos de outras origens designadamente fulas.
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Nota do editor:

Último poste da série > 25 de março de 2013 > Guiné 63/74 - P11309: Notas de leitura (468): Catarse, por Abel Gonçalves (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11054: Notas de leitura (455): "Raças do Império", por Mendes Corrêa (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Novembro de 2012:

Queridos amigos,
Raças do Império foi um acontecimento editorial do seu tempo, mereceu honras de edição de luxo e uma outra mais popular, um pouco como a História de Portugal, a chamada edição de Barcelos, dirigida pelo Prof. Damião Peres.
Estamos numa época de rescaldo de diferentes eventos sobre o mundo colonial português, houvera a exposição do Porto, em 1934, a do Parque Eduardo VII, em 1937, e o acontecimento excecional que foi a Exposição do Mundo Português, fazia todo o sentido divulgar, como material de estudo, com abundante mostra fotográfica, todos os povos que pertenciam ao Império e que bebiam a tão apregoada “missão civilizadora”.

Um abraço do
Mário


Raças do Império: A Guiné Portuguesa, pelo Prof. Mendes Corrêa 

Beja Santos

Em 1943, um médico que se lançara entusiasticamente na antropologia e etnografia, Mendes Corrêa, deu à estampa na Portucalense Editora um livro singular na investigação da época: “Raças do Império”. Note-se que Mendes Corrêa será convidado pelo governador Sarmento Rodrigues a visitar a colónia e daí resultará, em 1947, a sua obra “Jornada Científica na Guiné Portuguesa”, de que já aqui se deu notícia(1).

As suas teorias sobre a raça estão hoje obviamente em desuso, não aguentaram os novos estudos decorrentes da evolução trepidante que conheceu a Paleontologia, entre outros conhecimentos científicos. Define a raça como assente numa trilogia História, Psicologia e Biologia, em que nenhum dos elementos é dispensável. E diz mesmo: “Estudar a raça como um fator da História e da vida social é, afinal, estudar o papel da hereditariedade psicossomática, das causas germinais remotas, dos fatores biológicos profundos e permanentes, das energias elementares de estirpes naturais geradora dos povos, na fisionomia e atividade étnica, política e histórica destes últimos”.

Mendes Corrêa inicia a sua investigação sobre as gentes da Guiné procurando dar um quadro histórico da região antes da chegada dos portugueses. Recorda que no século III consta já junto do Níger superior, no Sudão Ocidental, o estado de Ganá, a leste do qual irá surgir o primeiro reino Songai. No século X, a invasão dos Sossos abate-se sobre o reino de Ganá que começará a desagregar-se, irão então surgir em cena populações negras oriundas de outros territórios. Formara-se entretanto o Estado de Mali, dos Mandingas, que no século XIV estendem o seu domínio até à Guiné Portuguesa. No seu apogeu, aquele reino terá incorporado Tungubutu, Songai e outras regiões, mas o Império de Songai conseguiu libertar-se. O Mandimansa seria o imperador de uma parcela do vasto reino Mandinga. Se nos recordarmos do que escreveu na sua tese de doutoramento Carlos Lopes em Kaabunké (Espaço, território e poder na Guiné-Bissau, Gãmbia e Casamance), de que igualmente aqui já se fez menção(2), os dados históricos têm larga margem de flutuação. Espero em breve referir-vos uma compilação de textos publicada pelo Comissariado Nacional da Mocidade Portuguesa intitulado “Mandingas – Um pouco de História” e também se verificam discrepâncias cronológicas apreciáveis.

Mas voltemos a Mendes Corrêa, estamos no Império do Mali e é a vez dos árabes se voltarem para os tesouros do Sudão. Tungubutu é conquistado em 1591 pelo Sultão de Marrocos. Songai passa a colónia marroquina. É neste entretanto que emergem os Fulas.

Na Guiné, os Mandingas são os principais adversários que os Fulas encontram no Futa-Djalon. Os Mandingas da Guiné são batidos e subjugados pelos Fulas em 1836, o mesmo sucede com os Beafadas. Para Mendes Correia é este o contexto em que se chega à carta etnológica atual.

A população da Guiné não terá mudado muito desde as descrições dos nossos autores dos séculos XV e XVI. Terão perdido importância demográfica os Nalus, os Beafadas e os Cassangas e progredido os Balantas e os Fulas. Adverte Mendes Corrêa: “Apesar das diversas investigações realizadas, não pode considerar esclarecido o problema das origens e afinidades raciais de todos os grupos étnicos da nossa Guiné”.

Os Fulas proviriam de uma mistura de Etíopes e de Negríticos (negros sudaneses e nilóticos). Os outros agregados seriam Negríticos (negros que não falam línguas Bantus), destacando-se os Mandingas (ou Mandé) num grupo à parte: todas as outras populações da nossa Guiné seriam Negríticos litorais ou guineenses, com grande uniformidade do tipo físico. Os Felupes seriam a tribo principal dos Diola de entre o Casamansa e o Gâmbia. Mendes Corrêa refere como quase autóctones os Balantas, os Banhus, os Papéis, os Bijagós, os Beafadas e os Nalus.

O Fula é suscetível de enquadramento na raça etiópica. André Álvares de Almada, no século XVI, descreve-os deste modo: são robustos, bem-dispostos, de cor amulatada, os cabelos corredios. Na nossa Guiné, mencionam-se os Fulas forros, os Futa-Fulas e os Fulas pretos. Os primeiros e os últimos terão resultados das migrações Fulas, os forros consideram os Fulas pretos são antigos escravos. Os Fulas forros são descritos como de estatura elevada, corpo delgado, cor acobreada, cabelos lanosos, nariz e lábios finos. Segundo Carvalho Viegas, um governador que se abalançou a estudar a região, o Mandinga morfologicamente é uma espécie de raça negra, sem mescla de sangue. Duarte Pacheco refere que os Beafadas estavam sujeitos aos Mandingas. Os Sossos teriam sido expulsos do Futa-Djalon e empurrados para a costa pelos Fulas. André Álvares de Almada refere que os Bijagós são “mui pretos, gentis-homens, não furam as orelhas, as mulheres sim”.

Mendes Corrêa recolhe a opinião dos colonialistas do seu tempo: Os Fulas são tipos como ambiciosos, o grupo mais civilizado e de maior superioridade intelectual; os Mandingas como inteligentes, perspicazes, observadores, empreendedores e aristas; os Felupes como independentes, corajosos e hospitaleiros; os Papéis como traiçoeiros, belicosos, pouco trabalhadores; os Brames como inteligentes, pacíficos e trabalhadores; os Manjacos como inteligentes, dominados pelo pudor, trabalhadores, os mais acessíveis a influência portuguesa, ainda que litigantes e pouco probos; os Balantas como inteligentes, tenazes, argutos, laboriosos, mas ladrões e litigantes; os Bijagós como artistas, belicosos e tímidos.

Depois, Mendes Corrêa abalança-se à descrição sobre os idiomas, mobiliário, tipos de habitação, vestuário, tatuagens, manifestações religiosas, totemismo, sistemas de justiça, panaria, olaria, escultura, trabalhos em coiro, arte musical e literatura, não há elementos inovadores, digamos que se trata de um conspecto antropológico e etnográfico com base em bibliografia recolhida.

“Raças do Império” foi uma revelação para o tempo, nunca se tinha ido tão longe numa síntese sobre todos os povos que constituíam Portugal e o seu Império. Tratou-se de uma recolha meticulosa, de acordo com a documentação existente e as preocupações raciais que fizeram furor no primeiro quartel do século, ao nível dos estudos coloniais. Mendes Corrêa procurou ser abrangente e leu alguma da melhor bibliografia internacional do seu tempo, reconheça-se.

Daí resultou um texto fluído, bem organizado para não iniciados, estamos numa época em que os autores procuravam atrair o leitor capturando-o para o exotismo e quase com ternura pelo “bom selvagem”. É assim que ele escreve: “Há, entre Mandingas, Fulas, Manjacos, Papéis, Bijagós, entre outros, canções, batuques, danças, pantominas, de variado carácter, como para incitamento ao trabalho agrícola, orgia, culto religioso, homenagens fúnebres. Entre Mandingas, as mulheres casadas, geralmente, não dançam; os Papéis cantam a valentia dos seus chefes mortos, organizando danças fúnebres em sua honra. Os Bijagós têm o culto da vaca…”.

Foi um enorme esforço, este estudo de índole imperial, e não é por acaso que refere com alguma insistência a exposição colonial de 1934 e a Exposição do Mundo Português de 1940, foram polos de atração para o desenvolvimento da curiosidade em conhecer os povos que estavam sujeitos à nossa missão civilizadora.
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Notas do editor:

(1) Vd. poste de 12 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9183: Notas de leitura (311): Uma Jornada Científica na Guiné Portuguesa, de António Mendes Corrêa (Mário Beja Santos)

(2) Vd. poste de 12 de Outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10519: Notas de leitura (416): Kaabunké Espaço, território e poder na Guiné-Bissau, Gâmbia e Casamance", por Carlos Lopes (Mário Beja Santos)

Vd. último poste da série de 1 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11037: Notas de leitura (454): "A Pátria ou a Vida" por Gertrudes da Silva (2) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Guiné 63/74 - P10597: Excertos do Diário de António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (19): A pobreza em chão manjaco


1. No Diário da Guiné, do António Graça de Abreu (AGA), há algumas referências à "pobreza" e à miséria" em que viviam as populações guineenses, nomeadamente  no chão manjaco... AGA tinha chegado à Guiné, há pouco tempo, tinha vivido em países ricos como a Alemanha... O contraste é duro, aos seus olhos, mesmo cotejando as duas pobrezas, a nossa e a deles...  Aqui se reproduz essa parte do Diário do AGA, com a devida vénia... (LG):


(...) Teixeira Pinto ou Canchungo, 27 de Junho de 1972

Fui dar uma volta pela terra e já ouvi uma enormidade de coisas sobre o lugar para onde me atiraram os acasos da sorte e da pouca fortuna.

Teixeira Pinto ou Canchungo é a quarta ou quinta maior povoação da Guiné, tem uma larga avenida central quase com um quilómetro e casas razoáveis estendendo-se para ambos os lados. Ao fundo situa-se a praça Dr. Oliveira Salazar. Isto é airoso e parece sossegado. À volta da avenida, para norte, ficam as tabancas ou moranças, centenas e centenas de casas pobres da população predominantemente de etnia manjaca, uma das muitas existentes neste território. Estamos no Chão Manjaco, a terra destes negros. Os miúdos pretos são uma ternura que dói. A carapinha, os olhos muito escuros, nus e sujos, as barrigas grandes, subalimentados, mas por dentro são iguais aos meninos loiros e morenos da nossa Europa. O mundo à sua volta é que os faz diferentes! (...).

(...) Canchungo, 5 de Julho de 1972 

Não é tempo de inventar coisa nenhuma, são horas de tudo descobrir.  Não posso falar, escrever sobre a guerra se não a conhecer, se não a viver até dilacerar o sentir, não posso falar deste povo, deste solo queimado se desconheço os negros e os brancos, a terra que pisamos.

Hoje, a primeira saída. Fui até ao Bachile, um aquartelamento uns quinze quilómetros a norte, na estrada para o Cacheu, junto às florestas que dão acesso ao Balanguerez e à Caboiana, zonas libertadas pelo PAIGC. Dois jipes, no da dianteira, um capitão e dois cabos armados, no meu, três homens desarmados. Fui à confiança, esta zona é controlada pelas nossas tropas, não há perigo. As populações da região, de etnia manjaca, parecem estar do nosso lado e os guerrilheiros vivem ainda longe, não atacam, não costumam atacar.

O que vi? Logo à saída de Canchungo, tabancas paupérrimas cobertas de colmo, negros indolentes, lixeiras, vacas esqueléticas, cabras, porcos passeando pela estrada. A savana africana, terras pobres para se cultivar o que quer que seja. O jipe do capitão atropelou um porco e seguiu em frente.  (...)

(...) Canchungo, 11 de Julho de 1972 

Faz amanhã um mês que estive de serviço como adjunto do oficial de dia no quartel do Depósito Geral de Adidos, na calçada da Ajuda, em Lisboa. Há quanto tempo isso foi! 

Precisava de comer um bom bacalhau ou um borrego assado, um cozido, um esplendoroso bife em qualquer parte do nosso Portugal mimoso. Parece que saí daí há três anos e ainda não tenho três semanas de Guiné.

Hoje dei comigo a pensar na grande Europa por onde já derramei algum suor durante um dos meus vinte e cinco anos de vida. Quero atravessar outra vez o velho continente, saltitar de país para país, falta-me conhecer Londres, Viena, Budapeste, Florença, Roma, sei lá, tanta coisa! Há-de acontecer. A esperança é uma menina com olhos de todas as cores.

De tarde, resolvi sair e dar uma grande volta a pé, sozinho pelas ruelas e tabancas de Canchungo, Guiné, África. Tanta pobreza! Só o que os alemães gastam para alimentar principescamente os seus cães de estimação - o que tanta admiração me causou quando dos dezanove para os vinte anos ancorei a minha vida em Hamburgo, no norte da Alemanha, - só esses marcos, moeda forte alemã, davam para alimentar milhões de crianças desta África pobre.

Mas isto não é assim tão simples. Os problemas do continente africano são muito complexos e é aqui que têm de ser resolvidos. Está quase tudo por fazer. Como passar de uma sociedade primitiva e agrária para estádios de desenvolvimento mais decentes? Há ventos que sopram quer do leste, quer do ocidente e ajudam quem? Essa ajuda é mesmo “ajuda”? Aqui na Guiné a agricultura é um desastre e funciona como a única fonte de subsistência e riqueza. Eles têm as bolanhas, os arrozais, mas são tão difíceis de cultivar! Hoje, nas tabancas vi os negros a comer. Fazem uma bola de arroz e metem-na na boca com a mão. Não têm facas nem garfos, fiquei impressionado. 


(...) Canchungo, 3 de Agosto de 1972 

Estou rico. No meu quarto tenho agora uma cadeira com encosto de lona, outra de pau e uma mesa quadrada sobre a qual escrevo. A Companhia 122 de pára-quedistas seguiu ontem para Bissau a fim de reforçar a segurança da capital nestes dias “tenebrosos” que se aproximam, com as comemorações do aniversário do PAIGC. Fui incumbido da difícil tarefa de guardar as chaves dos quartos dos alferes pára-quedistas, companheiros de degredo nas terras da Guiné. Vai daí, fui-lhes buscar duas cadeiras e uma mesa que tanto jeito fazem no meu quarto. Os páras regressam daqui a doze dias e então devolverei a mobília, ficarei de novo pobre.



Guiné > Região do Cacheu > Teixeira Pinto > 1972 > Meninos (manjacos) a caminho da escola, em transporte militar.


Fotos: © Luís Graça (2012). Todos os direitos reservados




Canchungo, 4 de Agosto de 1972 

Ontem a brincar com a minha pobreza, hoje a sentir a pobreza a sério, brutal, dilacerante. Como se já não bastasse a guerra!... 

É uma fatalidade nascer na Guiné, a terra é avara, o clima é mau, as populações também sofrem com o calor e as doenças.

Esta manhã Canchungo foi assolada por um pequeno tufão que passou sobre uma extremidade da vila e arrasou vinte tabancas, as casas de adobe e colmo das famílias negras. Meti-me no jipe e fui ver o que se podia fazer.

Um espectáculo impressionante. Os telhados das casas de palha ou de zinco voaram e despedaçaram-se, estilhaçados. Algumas tabancas ruíram completamente arrastando as pobres mobílias, os tarecos e as gentes. Felizmente não morreu ninguém, só três feridos graves que foram hoje evacuados para Bissau.

O que me arrepiou foi a atitude dos negros. Os homens tentavam salvar os restos dos haveres, as mulheres choravam, um choro feito de berros, de esponjar na lama, de gestos como eu nunca tinha visto. O corpo encarna a dor total, é o máximo da expressividade possível. Ao olhar para aquela miséria toda e para os negros transfigurados em desgraça, lembrei-me do que será a destruição de uma aldeia aqui perto, nesta mesma Guiné, pela guerra, pelo napalm, pelo fogo. São coisas que escapam à nossa compreensão. Só quem as vive pode entender.

Isto do tufão e miséria está mal escrito. É tudo muito pior do que as palavras possam dizer. Eu ainda sou “periquito” nesta guerra. Vi pouco, continuo a tentar entender. (...)


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Nota do editor:

Último poste da série > 12 de junho de 2012 > Guiné 63/74 - P10025: Excertos do Diário de António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (18): A ponte Alferes Nunes, a CCAÇ 16, o Bachile, a 38ª CCmds, o Canchungo, o cor pára Rafael Durão, o futebol, a violência, a morte...

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Guiné 63/74 - P10035: In memoriam (119): 11 militares (10 da CCAÇ 16 e 1 da 3ª C/BCAÇ 4615) e um número indeterminado de civis, mortos na emboscada de 22/4/1974, na estrada Bachile-Cacheu (José Joaquim Rodrigues / Bernardino Parreira)




Página de rosto do blogue Gotas d' Água... O autor, J.J. Rodrigues,  assina-se com o pseudónimo o Gota d' Água, e tem perfil no Blogger desde novembro de 2006... Possui diversos blogues ligados às coisas e às gentes da sua terra (Conceição,  Faro)... Diz-se um contador de histórias, "algumas rimadas, outras apenas prosadas, mas todas imaginadas", e onde "qualquer semelhança com situações reais é (im)pura coincidência", pelo menos "até ver"... 


Sabemos que se trata de um camarada, ex-fur mil,  que pertenceu à 3ª C/BCAÇ 4615/73 (, batalão sediado em Teixeira Pinto),tendo deixado  um comentário no poste P4267, de 29 de abril de 2009: 


"Olá, amigos. Há algum tempo que sigo o blogue e a página sobre a Guiné, uma vez que também sou um antigo combatente na Guiné. Tentei encontrar notícias do meu Batalhão 4615, que em 73/74 esteve na zona de Teixeira Pinto. Se por acaso algum camarada, desse batalhão, ler este comentário agradeço que me mande uma mensagem para o e-mail: jlrodrigues.22@gmail.com. Um abraço, J.J. Rodrigues". 


Depois de diversos mails trocados com o nosso camarada Bernardino Parreira, que vive em Faro e que foi fur mil na CCAÇ 16 (1972/73), descobrimos que se trata do José Joaquim Rodrigues a quem saudamos e convidamos a integrar a Tabanca Grande. 


Desta companhia, a 3ª C/BCAÇ 4615, já temos entre nós o António Tavares Oliveira, também  ex-fur mil, e que vive em Vila Nova de Gaia. Diz-nos que esteve no TO da Guiné entre Out de 1973 e Set de 1974. O batalhão era conhecido como o Pifas.




1. Comentário de Bernardino Parreira, com data de 24 de setembro de 2010, ao poste P7024:

Caro amigo [António] Branco

Esta tua crónica demonstra bem a forma como a Guerra evoluiu na zona de Bachile/Teixeira Pinto, entre 1972/73/74. Pelo que se sabe, o poderio militar do PAIGC passou a estar muito acima do que dispúnhamos. O que até ao fim de 1972 parecia ser uma zona "calma", com o perigo à espreita, visto o aquartelamento de Bachile se situar a pouca distância da residência do IN (Caboiana), passou a ser, nos fins de 1972 princípio de 1973, mais um ponto nevrálgico da guerra. 


Após o meu regresso [à metrópole], em Março de 1973, tive conhecimento da morte de muitos camaradas da CCAÇ 16, bem como de elementos da população civil, na sequência de ataques do PAIGC. Seria pertinente, para ajudar a escrever a História desta Guerra, que os ex-combatentes que testemunharam, de alguma forma, estes episódios os divulgassem. (*)

Por acaso, encontrei na Internet o testemunho de um meu conterrâneo, de Faro, autor e editor do Blogue "Gotas d' Água", que se refere, precisamente, a um episódio de guerra na zona de Bachile, que vem confirmar, em parte, a justeza desta tua crónica. Dada a falta de espaço, irei transcrever a seguir o relato que encontrei no Blogue "Gotas d'Água".

Um grande abraço
 Bernardino Parreira
CCAÇ 16
Bachile, 1972/1973 




2. Histórias de guerra VII > Bachile


Reprodução.  com a devida vénia, do Blogue  Gotas d'Água > 29 de setembro de 2007 > Histórias de guerra VII [,José Joaquim Rodrigues, ex-fur mil, 3ª C/BCAÇ 4615/73, Bachile e Bassarel, 1973/74] 

O Bachile ...

Zona muito perigosa, situada a meio caminho entre Teixeira Pinto e Cacheu, no Bachile estava sedeada uma Companhia de guerreiros operacionais guineenses que operava os Obuses. Nesta Companhia estavam também alguns guerreiros graduados,  naturais da metrópole. [Referência à CCAÇ 16].


Mesmo encostada ao Bachile ficava a misteriosa Caboiana, mata onde se sabia existir um quartel-general dos "turras”, nome assustador pelo qual designávamos os guerreiros inimigos; pelo seu lado, eles vingavam-se chamando-nos “tugas” mas que afinal viemos a saber apenas queria dizer “brancos”.

Na recepção, os “velhinhos” logo tentaram matar-nos de susto, exagerando no seu comportamento, mais parecendo acabados de sair do manicómio do que verdadeiros guerreiros. Relataram-nos com exagerados detalhes os sucessivos ataques sofridos ao arame, isto é, junto à vedação exterior do aquartelamento. Segundo afirmavam,  os turras não os deixavam dormir ou descansar porque os confrontos eram quase diários. Viver mais de dois anos naquela situação, tinha-os deixado em estado de semi-loucura!
Tanto ronco tinha-os deixado cacimbados! (tanta festa tinha-os deixado malucos!)

Instalámo-nos como pudemos, iniciando de imediato este inevitável esforço de guerra. Agora, em pleno teatro de guerra, todas as operações eram feitas com grande cuidado, devido ao enorme risco que as envolvia.

Felizmente enquanto permanecemos no Bachile não houve qualquer confronto com os guerreiros inimigos, embora por vezes pressentíssemos a sua presença espiando os nossos movimentos.

Finalmente para nosso alívio, chegou o dia de abandonarmos o Bachile. Deixaríamos um grupo em Churobrique e outro em Chulame,  indo o resto da Companhia [3ª C /BCAÇ 4615], incluindo o guerreiro do sul [, José Joaquim Rodrigues, o autor do relato], instalar-se em Bassarel, zona teoricamente um pouco mais calma.

No Bachile, mais um pequeno incidente com o guerreiro do sul que aqui "apanhou o paludismo" tendo levado a famosa "injecção de cavalo” o que lhe valeu um enorme inchaço na anca e a perna direita toda apanhada. Pudera,  as injecções eram doses para as referidas cavalgaduras, não para humanos, mesmo que guerreiros. Mas o fim justifica o meio e o paludismo foi gradualmente desaparecendo, para alívio do guerreiro do sul.

Nesta breve referência ao Bachile, cabe aqui o relato de um grave incidente de guerra, ocorrido poucos meses após a nossa saída, no qual foram intervenientes o nosso grupo de Churobrique, um grupo do Bachile, um grupo de combate da 2ª.Companhia e os Fiats da Força Aérea, para além dos guerrilheiros inimigos.

Pelo meio cerca de cinquenta civis que,  não tendo directamente a ver com a guerra, só porque naquele momento estavam a trabalhar para as nossas tropas, foram dura e barbaramente castigados.

Uma manhã, o grupo de combate do Bachile [, CCAÇ 16,] fazia,  como habitualmente, a escolta a uma Berliet com cerca de cinquenta trabalhadores civis que,  havia uma semana,  efectuavam trabalhos de “capinagem”, isto é, cortavam o mato que envolvia a estrada para o Cacheu. Atrás, com o objectivo de durante o decorrer dos trabalhos diários, fazer a segurança dos mesmos trabalhadores, seguia um Unimog, com o grupo de combate de Churobrique [3ª C/BCAÇ 4615].

Precisamente ao chegar ao local, onde iriam reiniciar os trabalhos, a pouco mais de quinhentos metros do Bachile, foram surpreendidos pelos guerrilheiros inimigos que,  emboscados na mata, dispararam e lançaram uma grande quantidade de granadas.

De todas as mortes a lamentar, houve uma em particular que a todos causou ainda maior consternação e desespero. O furriel que chefiava a escolta, tinha recebido a notícia, há tanto tempo esperada, do fim da sua comissão de mais de vinte e oito meses de guerra. [Referência provável a Arnaldo do Nascimento Carneiro Carvalho].  Naquela manhã,  que seria a última no Bachile,  ofereceu-se (sem ter de o fazer) para chefiar a escolta, segundo as suas palavras, para fazer a despedida.


E fez, de forma dramática e definitiva! Na emboscada foi atingido em pleno abdómen por uma granada RPG que o destruiu, tendo morte imediata. Nem um único guerreiro daquela escolta sobreviveu nesta emboscada, assim como, todos os trabalhadores civis.

Os guerreiros de Churobrique, um pouco mais atrás, com vários feridos, quase não conseguiram reagir a este inesperado ataque. No entanto, de imediato recebem apoio da 2ª. Companhia que estava sedeada no Cacheu e dos Fiats da Força Aérea, o que fez com que os guerrilheiros inimigos retirassem rapidamente. Para trás não deixaram uma única baixa.

Na perseguição, o grupo de combate da 2ª. Companhia avança pela mata sem qualquer meio de comunicação que pudesse indicar correctamente a sua posição aos Fiats da nossa Força Aérea e quase acaba sendo atingido pelo fogo amigo. Felizmente os pilotos não efectuaram quaisquer disparos, evitando assim agravar aquela situação que teve momentos de invulgar tensão, raiva e desespero!

Na retirada, os “turras” desapareceram,  utilizando uma técnica de dispersão em pequenos grupos, sendo difícil saber exactamente para onde se dirigiam, uma vez que se ouviam disparos de zonas completamente diferentes e até opostas.

Ao fim de algum tempo, tudo termina num enorme silêncio de dor e de morte!

Na manhã seguinte quando o guerreiro do sul, integrando a coluna de Teixeira Pinto para Bissau, se preparava para iniciar a viagem, foi-lhe pedido que transportasse na sua Berliet alguns daqueles mortos, de entre os quais, o nosso infortunado furriel.

E assim se fez mais uma história de guerra, diferente e ao mesmo tempo tão igual a tantas outras que muitos camaradas guerreiros viveram. 
Nós estamos cá para as contar, mas infelizmente outros não tiveram tanta sorte!

Até outro dia, camaradas!

Fonte: Blog Gotas d'Água > 29 de setembro de 2007 > Histórias de guerra VII 


[Há doze histórias de guerra neste blogue, relatando as (des)venturas do José Joaquim Rodrigues, ex-fur mil da 3ª C/BCAÇ 4615, por terras da Guiné: ver aqui o link]




3. Comentário(s) do Bernardino Parreira:


(i) O meu Bem Haja ao camarada que escreveu e publicou este texto na Internet, que, a dezenas de anos de distância, nos veio ajudar a perceber por que consta na listagem dos mortos na Guerra do Ultramar, na Guiné, o nome de 10 militares da CCAÇ 16, que perderam a vida em 22/04/1974.


 Resta-me mencionar o nome dos 10 camaradas que perderam a vida no fatídico dia 22/04/1974, na sequência de um ataque do PAIGC, 3 dias antes da revolução do 25 de Abril que conduziria ao cessar fogo entre as duas partes envolvidas nesta guerra.


Albino Gomes da Costa,  Fur Mil
Ambrósio Capambu Injai,  Sold At 
Arnaldo do Nascimento Carneiro Carvalho, Fur Mil
Carlos Gomes,  Sold At 
Luís da Costa, Sold At
Nulasso Albino Gomes, Sold At
Paulo Caiesta Tué Mendes,  Sold At 
Policarpo Augusto Gomes, Sold At
Samper Mendes, Sold At
Vicente Rodrigues, Sold At



(ii) Confrontado com a existência de um 11º morto, nesse dia e provavelmente no mesmo local, o Manuel Martins Lopes da 3ª C/BCAÇ 4615 (#), o Bernardino Parreiro respondeu-me o seguinte, em mail recente, de 14 do corrente:



(...) "É verdade, o meu amigo Policarpo [Gomes, o tal que fui visitar à prisão antes de regressar a São Domigos, e que pertencia ao seu pelotão] , juntamente com outros camaradas e amigos da CCaç 16, vieram a falecer tragicamente numa emboscada, 3 dias antes do 25 de Abril. Fiquei muito consternado ao ter conhecimento da sua morte, mas pormenores só os fiquei a saber, por acaso, quando vi o blogue do José Joaquim Rodrigues. Também aí faleceu outro grande amigo meu, o furriel Carvalho, que me dizia, quando eu parti de Bachile, ter o 'pressentimento que não regressaria vivo' e , ao que sei, morreu na véspera do regresso à Metrópole. São memórias muitos tristes, para os meus 63 anos.

"Quanto ao falecimento do Manuel Martins Lopes, da 3ª C/BCAÇ 4615 (**), nada sei, nem conheci, pois essa companhia passou por Bachile em data muito posterior à minha saida de lá. Mas se encontrar por aqui o José Joaquim, vou 'convidá-lo' a colaborar com esta Tabanca porque ele até tem jeito para escrever" (...).


(#) Lista dos mortos em combate no dia 22/4/1973 (Fonte: Liga dos Combatentes > Mortos no Ultramar > Guiné)

Apelido  Nome  Posto  Ramo  Teatro de operações  Data  Motivo  
CARVALHO ARNALDO NASCIMENTO CARNEIRO CARVALHO FurExércitoGuiné22/04/1974  Combate  
COSTA ALBINO GOMES DA COSTA FurExércitoGuiné22/04/1974  Combate  
COSTA LUÍS DA COSTA SoldExércitoGuiné22/04/1974  Combate  
GOMES CARLOS GOMES SoldExércitoGuiné22/04/1974  Combate  
GOMES NULASSO ALBINO GOMES SoldExércitoGuiné22/04/1974  Combate  
GOMES POLICARPO AUGUSTO GOMES SoldExércitoGuiné22/04/1974  Combate  
INJAI AMBRÓSIO CAPAMBU INJAI SoldExércitoGuiné22/04/1974  Combate  
LOPES MANUEL MARTINS LOPES SoldExércitoGuiné22/04/1974  Combate  
MENDES PAULO CAIESTA TUÉ MENDES SoldExércitoGuiné22/04/1974  Combate  
MENDES SAMPER MENDES SoldExércitoGuiné22/04/1974  Combate  
RODRIGUES VICENTE RODRIGUES SoldExércitoGuiné22/04/1974  Combate  
ApelidoNomePostoRamoTeatro de operaçõesDataMotivo

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Notas do editor

(*) Último poste da série > 10 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9880: In Memoriam (118): A sã camaradagem e a vil emboscada, morreu o camarada Vasco Almeida (Vasco da Gama)




(**) BCAÇ 4615/73: Mobilizado pelo RI 16. Partida: 22/9/1973; regresso: 8/9/1974; sede: Teixeira Pinto, comandante: ten cor inf Nuno Cordeiro Simões. 


A 1ª C/BCAÇ 4615/73 esteve no Cacheu; comandantes: cap mil cav Germano de Amaral Andrade;  cap mil inf  António Miguel Seabra Nunes da Silva; e cap mil inf cap mil inf Carlos José da Conceição Nascimento.


A 2ª C/BCAÇ 4615/73 esteve em Teixeira Pinto.Comandantes:  cap mil inf cap mil inf  António Miguel Seabra Nunes da Silva; alf mil inf José Carlos de Barros Moura; cap mil inf cap mil inf  António Miguel Seabra Nunes da Silva.


E, por fim, a 3ª C/BCAÇ 4615/73 esteve em Bassarel.  Comandante: cap mil inf  Fernando Moura de Castro Felga.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Guiné 63/74 - P10029: Fichas de Unidades (9): A CCAÇ 16, constituída no essencial por camaradas de etnia manjaca (Teixeira Pinto, Bachile e Churobrique, fevereiro de 1970/agosto de 1974) (José Martins)




Guiné > Região do Cacheu >  Bachilé > CCAÇ 16 (1972/74) > Foto de grupo [, pede-se ao António Branco, que parece ser o primeiro, da segunda fila, de pé, a contar da direita, para identificar os restantes elementos do grupo].

Foto:  
 © António Branco (2010). Todos os direitos reservados




Guiné > Região do Cacheu > Bachile > CCAÇ 16  (1972/74) >  Os fur mil José Romão (à direita) e Bernardino Parreira (à esquerda), dois algarvios de Vila Real de Santo António e Faro, respetivamente. Ao fundo, no memorial, lê-se: "Para uma Pátria una e indivisível, a Companhia Manjaca [,CCAÇ 16, constituída em 1970] está defendendo o seu chão da cobiça de estranhos, ainda que tenha de derramar o seu sangue".

Foto:  
© José Romão (2010). Todos os direitos reservados  

1. Notas sobre a Companhia de Caçadores n.º 16, compiladas pelo nosso colaborador permanente José Martins, ex-Fur Mil Trms,  CCAÇ 5, Os Gatos Pretos (Canjadude, 1968/70):


(i) A CCAÇ 16, subunidade do recrutamento local, foi organizada no Centro de Instrução Militar (CIM),  de Bolama, em 4 de Fevereiro de 1970;


(ii) À semelhança de outras, da chamada "nova força africana", era constituída por quadros (oficiais, sargentos e praças especialistas) de origem metropolitana e por praças guineenses, neste caso de etnia manjaca;


(iii) Colocada em Teixeira Pinto (ou Canchungo), em 4 de Março de 1970, destacou dois pelotões para Bachile, passando a estar integrada no dispositivo do BCAÇ n.º 1905, e substituindo a CCAÇ n.º 2658, que se encontrava em reforço no sector;


(iv) Em 30 de Abril de 1970, já com o quadro orgânico de pessoal completo, passa a ser a unidade de quadrícula de Bachile;


(v) Em 28 de Janeiro de 1971 passa a depender do CAOP 1 (com sede em Teixeira Pinto);


(vi) A partir de 1 de Fevereiro de 1973, fica na dependência do BCAÇ n.º 3863 e do BCAÇ n.º 4615/73, que assumiram, a seu tempo, a responsabilidade do sector em que aquela subunidade estava integrada;


(vii) Destacou forças para colaborar nos trabalhos de reordenamento de Churobrique;


(viii) Em 26 de Agosto de 1974, desactivou e entregou o quartel de Bachile ao PAIGC, recolhendo a Teixeira Pinto, onde foi extinta a 31 de Agosto desse ano;


(ix) Assumiram o comando desta subunidade os seguintes oficiais:

Cap Inf Rolando Xavier de Castro Guimarães
Cap Inf Luciano Ferreira Duarte
Cap Mil Inf José Maria Teixeira de Gouveia
Cap QEO [Quadro Especial de Oficiais] José Mendes Fernandes Martins
Cap Inf Abílio Dias Afonso [, foto à esquerda; hoje maj gen ref]
Cap Mil Art Luís Carlos Queiroz da Silva Fonseca
Cap Mil Inf Manuel Lopes Martins;

(x) Esta subunidade não tem História da Unidade: existem apenas alguns registos, muito incompletos, relativo aos períodos de 1 de Janeiro a 31 de Setembro de 1972 e de 1 de Janeiro a 31 de Dezembro de 1973 (Vd. Arquivo Histórico Militar, caixa n.º 130 – 2.ª Divisão/4.ª Secção). 





(i) António Graça de Abreu (Estoril/Cascais): Creio que meu tempo no CAOP 1 em Teixeira Pinto,(Junho 1972 a Abril 1973,) a CCaç 16 era comandada pelo capitão Abílio Dias Afonso. O infatigável ratão de bibliotecas e arquivos, o nosso bom amigo José Martins, descobre sempre tudo.



(ii) Bernardino Parreira (Faro) [, foto atual à direita]: Caros Camaradas, estive em Bachile, como Furriel Mil na CCaç 16 de Jun/72 a Fev/73, sob o comando inicial do capitão Martins e posteriormente do capitão Afonso. 


Estive na situação de diligência visto que a minha companhia estava sediada em S. Domingos. Regressei à Metrópole em Março de 1973.


(iii) António Branco (Lisboa) [, foto atual à esquerda]: Estive no Bachile, de Junho de 1972 a Março de 1974, sou o ex-1.º cabo de reabastecimento de material e tinha a cargo a arrecadação de material e fardamento cujo chefe era o 2.º sargento Guerreiro.



Desde o meu regresso só tive oportunidade de contactar com um camarada que foi operador cripto, o 1.º cabo Miranda. Reconheço os nomes do furriel Parreira e do António Graça e era interessante que ao fim destes anos fosse possível reencontrar algum dos que durante algum tempo partilharam momentos muito interessantes. Um abraço a todos e o meu endereço é o seguinte
asdbranco@gmail.com

(iv) Bernardino Parreira:

Camarada António Branco: Graças a este blogue vamos tendo notícias dos amigos que fizemos e que pensávamos não mais encontrar. Pois de facto partilhamos bons momentos juntos, e longas conversas, eu tu e o sargento Guerreiro, de quem não tive mais notícias. Também me lembro do Miranda, também grande amigo. O António Graça a que te referes deve ser o Furriel mecânico, porque o Alferes António G. Abreu estava em Teixeira Pinto.

 Foi com grande emoção que vi a foto da Ponte Alferes Nunes e o Rio Costa, onde tantas vezes afoguei as minhas mágoas. Era com os banhos no Rio e com os jogos de futebol, que jogava pela companhia CCAÇ 16, em Teixeira Pinto, que aliviava o meu stress.




Também tenho saudades dos camaradas africanos, e foram tantos os amigos que lá deixei. Pode ser que um dia nós nos encontremos, ou nos contactemos, através de e-mail ou do blogue. Gostava de ver uma fotografia tua aqui publicada, que eu também vou providenciar a digitalização da minha, para ver se nos vamos recordando das caras que há 36-37 anos deixamos de ver.



(v) Miranda: Olá,  caros amigos e colegas de Teixeira Pinto... Tal como vocês, conheci muitos amigos. Sou o ex-1.º Cabo Enfermeiro Miranda e gostava de ter os vossos endereços de e-mail para contactar. O meu é: carlosrogeriomiranda@hotmail.com.

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 Notas do editor:

(*) Último poste da série > 24 de outubro de 2010 > 
Guiné 63/74 – P7169: Fichas de Unidades (8): Batalhão de Caçadores N.º 4514/72 (Guiné, 1973/74) (José Martins)


(**) Postes sobre a CCAÇ 16 (1970/74):

 25 de junho de 2010 > Guine 63/74 - P6643: Memória dos lugares (86): Bachile, chão manjacho (José Romão, ex-Fur Mil, CCAÇ 16, 1971/73 / António Graça de Abreu, ex-Alf Mil, CAOP1, 1972/74)
6 de julho de 2010> Guiné 63/74 - P6680: O Nosso Livro de Visitas (92): A. Branco, CCAÇ 16, Bachile, chão manjaco, 1971

10 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6709: Tabanca Grande (228): António Branco, ex-1.º Cabo Reab Mat da CCAÇ 16, Bachile, 1972/74


13 de julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6726: Memórias do Bachile, chão manjaco (1): O que será feito do menino Augusto Martins Caboiana ? (António Branco, ex-1º Cabo Reab Mat, CCAÇ 16, 1972/74)

20 de agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6875: Tabanca Grande (236): Bernardino Rodrigues Parreira, ex-Fur Mil da CCAV 3365/BCAV 3846 e CCAÇ 16 (S. Domingos e Bachile, 1971/73)

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9456: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (50): Em busca do Joaquim Fernandes (ex-Fur Mil, CCAÇ 2590 / CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71), meu camarada da recruta e da especialidade do CISMI, Tavira (Eduardo Estrela, ex-Fur Mil, CCAÇ 2592 / CCAÇ 14, Cuntima, 1969/71)


Guiné > Zona Leste > Sector de Farim > Cuntima > Destacamento de Cuntima > CCAÇ 14 > 1970 > 4º pelotão. O Fur Mil At Inf António Bartolomeu é 1º da direita.

Foto: © António Bartolomeu (2007) / BLogue luís Graça & Camaradas da Guine. Todos os direitos reservados.


1. Mensagem,de ontem, do nosso leitor (e camarada) Eduardo Francisco da Cruz Estrela, ex-Fur Mil da CCAÇ 14 (Cuntima, 1969/71) Amigo,  Companheiro e Camarada !

Preciso da tua ajuda!

Retirei do blogue o némero de telemóvel do Joaquim Fernandes [ ex-Fur Mil At Inf, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71) e já fiz várias tentativas para o contactar,  mas todas elas resultaram infrutíferas.

Com ele fiz no CISMI [ Tavira,]a recruta e a especialidade, sempre no mesmo pelotão e convosco [ a malta da CCAÇ 2590 / CCAÇ 12,] embarquei a 24 de Maio de 1969 para a Guiné [, no N/M Niassa].

Agradeço o favor de me indicares a forma de contactar com o Joaquim Fernandes. Se for caso disso, informa-o que é o Estrela da 14, que quer falar com ele. A última vez que o vi, foi pouco depois do nosso regresso, aqui no Algarve,  na zona da Praia Verde.

Um grande abraço e um bem hajam pelo extraordinário trabalho que têm desenvolvido em prol da nossa memória colectiva.

Eduardo Estrela
Ex-Fur- Mil,
CCaç 14 (Cuntima, 1969/71)

2. Resposta de L.G.:

Eduardo: O Joaquim não aparece pelo blogue... Faz parte da nossa Tabanca Grande, vai aos encontros anuais da malta de Bambadinca (1968/71), vive no Barreiro, está bem de saúde... Não tenho o telemóvel dele, atual, mas tens aqui o mail dele... Eu mesmo dou-lhe conhecimento da tua tentativa de contacto.

Agradeço-te as referências elogiosas que fazes ao blogue. Gostaria de te ver integrado na nossa Tabanca Grande. Ficas, por isso, convidado a juntar-te à malta: só preciso de duas fotos e uma pequena apresentação tua  ("Sou o Eduardo Estrela, estive na CCAÇ 14, no sítio tal e tal...")...


Infelizmente temos poucas referências à tua CCAÇ 14... O único camarada que vos representa, aqui, é o António Bartolomeu, do 4º pelotão,  que esteve connosco em Contuboel, a dar instrução.

Um Alfa Bravo (ABraço)
do Luís Graça (Henriques)


3. Historial da CCAÇ 14 (elementos informativos, retirados - com a devida vénia - da página do Carlos Fortunato, ex-Fur Mil da CCAÇ 13 >  Guiné História):

"Companhia de Caçadores N.° 14

"A história da CCaç 13 e da CCaç 14 estão muito ligadas, ambas foram costiuidas em Portalegre na mesma data, e ambas seguiram para Bolama, para treinar os soldados africanos que iriam constituir as respectivas companhias.

"A CCaç 14, e tal como a CCaç 13, teve inicialmente outra identificação, neste caso a de CCaç 2592.

"Em Bolama a CCaç 13 treinou um pelotão de felupes, contudo acabou por ser a CCaç 14, que os integraram durante as suas primeiras operações, mas durante poucos meses, tendo estes seguido depois para Varela, como estava inicialmente planeado.

"O 4º pelotão foi inicialmente destacado para Aldeia Formosa, mas ao fim de poucos meses, juntou-se ao resto da companhia em Cuntima". (CF)
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Resumo Oficial da história da CCaç 14

Companhia de Caçadores n.° 2592
Identificação: CCaç 14
Cmdt: Cap Inf José Luís de Sousa Ferreira
Cap Inf José Augusto da Costa Abreu Dias
Cap QEO Humberto Trigo de Bordalo Xavier
Cap Inf José Clementino Pais
Cap Inf Mário José Fernandes Jorge Rodrigues
Cap Inf Vítor da Silva e Sousa
Alf Mil Inf Silvino Octávio Rosa Santos
Cap Art Vítor Manuel Barata

Início: 18Jan70 (por alteração da anterior designação de CCaç 2592). Extinção: 02Set74

Síntese da Actividade Operacional:

(i) Em 18Jan70, foi criada por alteração da sua designação anterior, integrando quadros e especialistas metropolitanos, e pessoal da Guiné, das etnias Mandinga e Manjaca,  e ainda um pelotão da etnia Felupe, que constituíam anteriormente a CCaç 2592;

(ii) Continuou instalada em Cuntima, nas funções de subunidade de intervenção e reserva do sector de Farim, com vista à actuação prioritária sobre a linha de infiltração de Sitató;:

(iii) Após ter deslocado um pelotão para Farim, a partir de finais de Dez70, foi transferida para Farim em 20Fev71, depois de ter sido substituída, por troca, pela CArt 3331;

(iv) Rendeu, na função de intervenção e reserva do sector, a CCaç 2533, com vista a realizar acções de contrapenetração no corredor de Lamel;

(v) Destacou ainda pelotões para reforço temporário de outras guarnições, nomeadamente de Binta, de 25Abr71 a 12Jun71, Jumbembém e Canjambari;

(vi) A partir de 10Fev73, mantendo no entanto a sede era Farim e continuando orientada para a sua anterior missão assumiu, cumulativamente, a responsabilidade do subsector de Saliquinhedim, para onde deslocou um pelotão;

(vii) Em 02Set74, foi desactivada e extinta.

Observações: Tem História da Unidade a partir de Jan72 (Caixa n.° 117 - 2.a Div/4.a Sec, AHM).

[Este texto foi retirado do livro Resenha histórico militar das Campanhas de África, 7º Volume, Fichas das Unidades, Tomo II - Guiné.] (CF)
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Nota do editor:

Último poste da série > 15 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9358: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (49): O "anónimo" J.B. Marques que comunicou o falecimento de Daniel Matos (Hélder Sousa)

terça-feira, 6 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6680: O Nosso Livro de Visitas (91): A. Branco, CCAÇ 16, Bachile, chão manjaco, 1971

1. Mensagem do nosso camarada José Romão [, foto à esquerda], com data de 30 de Junho último:

Assunto:  Bachile, CCAÇ 16


Amigos e camaradas Magalhães Ribeiro e António Graça Abreu


Aqui vos mando uma mensagem enviada pelo camarada Branco que também prestou serviço militar no Bachile.


Um grande abraço. Romão


2. Mensagem do A. Branco, com data de 29 de Junho passado, para o Zé Romão:

Assunto -  Bachile,  CCAÇ 16

Caro Romão

Acabo de fazer mais uma das minhas habituais visitas ao blogue do Luis Graça e rapidamente me apercebi do texto e das imagens da CCAÇ 16.

Tal como referes, e ao contrário da opinião do António Graça Abreu, o Bachile nessa altura era efectivamente tal qual o descreves e sublinhas com fotos.

A confusão do António Graça Abreu, deve ter a ver com o que eu algures já li,  noutros sítios,  em que o Bachile antes da conclusão da estrada até ao Cacheu não tinha nem por sombras  aquelas condições, até porque a CCAÇ 16 só foi organizada em Fevereiro de 1970,  conforme nota descretiva que a seguir envio.

Esclarecida esta situação, queria-te pedir que me autorizasses a copiar para o meu album pessoal as imagens do quartel e nomeadamente da minha secção, a arrecadação, já que as que eu tenho não têm a mesma qualidade.

Por agora um abraço e vou continuando atento a tudo o que surja referente à nossa companhia e ao Bachile.

A. Branco
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Notas sobre a Companhia de Caçadores nº 16, compiladas por José Martins (Vd. poste P4347, de 14 de Maio de 2009)


(i) Subunidade do recrutamento local, foi organizada no CIM de Bolama, em 4 de Fevereiro de 1970;

(ii) À semelhança de outras, da chamada "nova força afriacna", por quadros (oficiais, sargentos e praças especialistas) de origem metropolitana e por praças guineenses, de etnia manjaca;

(iii) Colocada em Teixeira Pinto, em 4 de Março de 1970, destacou dois pelotões para Bachile, passando a estar integrada no dispositivo do BCAV nº 1905, e substituindo a CCAÇ nº 2658, que se encontrava em reforço no sector;

(iv) Em 30 de Abril de 1970, já com o quadro orgânico de pessoal completo,  passa a ser a unidade de quadrícula de Bachile;
(v) Em 28 de Janeiro de 1971 passa a depender do CAOP 1 (com sede em Teixeira Pinto);

(vi) A partir de 1 de Fevereiro de 1973, fica na dependência do o BCAÇ nº 3863 e do BCAÇ nº 4615/73, que assumiram, a seu tempo, a responsabilidade do sector em que aquela subunidade estava integrada;

(vii) Destacou forças para colaborar nos trabalhos de reordenamento de Churobrique;

(viii) Em 26 de Agosto de 1974, desactivou e entregou o quartel de Bachile ao PAIGC, recolhendo a Teixeira Pinto, onde foi extinta a 31 de Agosto desse ano.

(ix) Assumiram o comando desta subunidade, os seguintes oficiais:

Cap Inf Rolando Xavier de Castro Guimarães
Cap Inf Luciano Ferreira Duarte
Cap Mil Inf  José Maria Teixeira de Gouveia
Cap QEO [Quadro Especial de Oficiais] José Mendes Fernandes Martins
Cap Inf Abílio Dias Afonso
Cap Mil Art  Luís Carlos Queiroz da Silva Fonseca
Cap Mil Inf Manuel Lopes Martins

(x) Esta subunidade não tem História da Unidade: existem  apenas alguns registos,  muito incompletos, relativo aos períodos de 1 de Janeiro a 31 de Setembro de 1972 e de 1 de Janeiro a 31 de Dezembro de 1973 (Vd. Arquivo Histórico Militar, caixa nº 130 – 2ª Divisão/4ª Secção).

3. Comentário de L.G.:

Agradeço ao Romão e ao Branco (bem como ao nosso infatigável colaborador, amigo e camarada José Martins) estas preciosas notas sobre o historial da CCAÇ 16, da qual não temos falado muito no nosso blogue, a não ser mais recentemente.

O Branco, que é nosso leitor regular, fica deste já convidado a integrar a nossa Tabanca Grande, se assim o desejar. Basta-lhe mandar-nos duas imagens, digitalizadas, uma actual e outra do tempo da tropa. Diz-nos também qual foi o teu percurso na tropa, onde moras e, ainda, se quiseres, o que fazes ou fazias na vida activa, além do dia do teu aniversário. Tens aqui um batalhão de gente à tua espera. E que desejarão saber mais coisas sobre Bachile, a CCAÇ 16 e os teus manjacos. Até á volta do correio. (*)
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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 5 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6674: O Nosso Livro de Visitas (91): Hélio Matias, ex-Alf Mil Cav, comandante do Pel Rec Daimler 805 (Nova Lamego, 1964/66), que conheceu o Triângulo do Boé (José Martins)