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sexta-feira, 16 de maio de 2008

Guiné 63/74 - P2851: Pensar em voz alta (Torcato Mendonça) (11): De quantas mentiras é feita a verdade?

1. Mensagem do Torcato Mendonça, de 14 do corrente: Meus Caros Camaradas e Editores:

Anexo um pensamento feito pela manhã e relido agora. Podia ficar cá, talvez lugar mais conveniente mas, ao guardá-lo enviei-o para o Pensar em Voz Alta. Ficava só, melhor, junto ao A, B, e C já enviados, pois que se vá.

Amanhã ou depois confirmo se vou ou não a Ortigosa. Tenho aqui ao lado os contactos, notas, telemóvel do Mexia Alves, mapa etc. M, arcar, na hora, no meio de tantos não se nota. Desmarcar uma vez admite-se, duas não. Mas meu caro Carlos, mando-te um e-mail. Não tenho telemóvel. Espero um tri-abraço pessoalmente.

Até lá um netabraço, Torcato Mendonça,
Fundão

2. Pensar em Voz Alta – D

Tarde de Maio, morna, baça, cinzenta. Depois da hora da bica, três homens permanecem no café, em conversa animada. A soma das suas idades rondará os duzentos e vinte anos. Não são velhos, entraram, isso sim, pela vida há alguns anos. Hoje reformados, nome esquisito para todos, são antes, homens com profissões interrompidas. Leis, medicina, obras e afins. Mantêm-se vivos, despertos, reflexivos e críticos.

Nesta conversa abordaram a crise no País, o 25 de Abril, as políticas de certos políticos e a solidariedade ou fraternidade como o mais novo prefere. Posições completamente diferentes na maneira como se posicionam. Há talvez uma direita, centro e esquerda. Há, acima de tudo, a experiência de vida e o saber respeitar a opinião divergente. Assim se demonstra (sem eles nada terem a demonstrar) que o diálogo é possível, se praticado por pessoas intelectualmente honestas. Teríamos tanto a ganhar com isso como povo. E aqui nesta Tertúlia se necessário.

Curiosamente dois foram antigos militares que passaram pela Guerra Colonial. O mais novo foi em idade normal. O outro, aos 38 anos, “despacharam-no” até ás Terras do Fim do Mundo exercer medicina nas N.T. Malhas que o Império teceu!

A necessidade, neste mundo ou sociedade global, em sermos mais solidários. Globalizar a solidariedade: África e o Darfur, China, Birmânia. Muito a falar e a reflectir sobre isto e uma interrogação, que não invalida a solidariedade globalizada – e para dentro do nosso País? Cada vez mais pobre e vulnerável aos interesses de minorias internas ou dos apetites de vizinhos. Cada vez mais cheio de maioria de pobreza envergonhada ou já bem visível? Cada vez menos.

Hoje de manhã abro o blogue e corro-o com o rato. Paro um pouco e hesito entre ler e sair. Chove lá fora. Não faço uma coisa nem outra. Prefiro tomar um café de plástico e ver o noticiário da Televisão. Pouco depois dizem vir comentar a imprensa diária o Presidente da ADFA.

Parabéns pelos 34 anos da ADFA, na defesa de tanta gente humilhada e ofendida. Tantos que ao serviço de uma Pátria, não perdendo a vida, ficaram contudo para sempre, fortemente marcados. Continuam à espera de justiça. Nada querem de privilégio. Não. Querem ser tratados com o respeito que merecem.

Ouvi o Presidente da ADFA dizer das necessidades que tantos antigos militares têm hoje, quase quarenta anos depois. Aos poucos deixam de ser problema pois da vida se vão libertando. Se tiverem Posto Militar, mesmo na reforma terão o RDM!? Não acredito, não quero acreditar e certamente é engano meu. Falar, dialogar….é preciso.
Resolvi voltar a ler o blog e passar á tecla, pensando e teclando. Assim:

1 – A Guerra estava militarmente perdida?

Responde Beja Santos a António G. Abreu. Uma guerra como aquela nunca se ganha militarmente. No aspecto teórico, todos, ou a maioria dos que para lá foram, o sabiam. Exemplos antigos na Indochina, Argélia e conhecimentos adquiridos. Devemos analisar de forma diferente a guerra em Angola, Moçambique e Guiné. A última é a que nos diz mais aqui. Sabemos como era difícil aguentar e esperar a solução politica. A solução politica…que politica? Que solução?

É assunto a ser longamente debatido. Certamente com opiniões diferentes. Pois ainda bem. Só assim proporcionarão uma visão mais próxima doa realidade.

Mas o debate, aqui ou noutro lado, tem que ser feito a bem da verdade histórica.
Sabemos ser assunto polémico. Só fazendo esse e outros lutos, essa e outras discussões encontraremos a verdade. Plagiando – de quantas mentiras é feita a verdade!!?? Aqui não pode ser assim. Temos que enfrentar, mais os historiadores, a verdade assente nos factos reais.

2 - Comandos Africanos Fuzilados – (Carlos B. Silva/ Virgínio Briote)

Um tema, para mim, demasiado doloroso. É uma página negra na guerra da Guiné. Outras haverão. Mas esta repugna-me. Aqueles homens, não só os Comandos Africanos, não podiam ter sido abandonados pelas Forças Armadas Portuguesas. Viviam-se tempos conturbados. Não aceitemos isso como justificação. Menos ainda aceitemos as desculpas de quem mandou disparar. Nem desculpas, nem coragem de assumir.

Outro assunto polémico. Um assunto dos dois Países e a ser tratado por ambos. Esperar pelo esquecimento é um erro.

3 – Morrer em Guidaje

Mama Sume (grito de guerra Comando), diz o Amílcar Mendes. Lembra, em homenagem, a morte de um Camarada - José Raimundo.

Que não entrem no esquecimento. Depois da morte há um silêncio que se entranha, não é Camarada. Mas a recordação, por isso mesmo fica e não esquece…

4 – Estórias Cabralianas – Ida a Belel do Jorge Cabral.


Se te quiseram tramar, é injusto. Foste mais longe que eu, nem sei se fui a Belel, a Madina, se fiz a Operação Gavião. Dizem que a águia do Benfica é um Gavião. Se calhar fiz a Op Águia.

Mas continuo a ser um teu fã, e leitor atento. Caro amigo escreve mais.

Vou continuar a pensar. Talvez prefira desenvolver alguns temas aqui levemente focados. Depois ficam por aí.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2768: Pensar em voz alta (Torcato Mendonça) (10): A nossa por vezes difícil mas sempre boa con(v)ivência

Vendas Novas > Escola Prática de Artilharia > Meados dos anos 60 > "Cadetes em Vendas Novas limpam armas em tempo de paz", diz laconicamente o Mendonça, ou melhor, o José, ou talvez o Silva, ou muito simplesmente o Torcato, o nosso Torcato... Citando um velho provérbio popular, ele sabe, melhor do que ninguém, que O dente morde na língua mas mesmo assim vivem juntos... (LG)

Vendas Novas ? Do tempo de tropa do pai do Torcato, imagino... "Anos 40? Ford Canada? Ainda as havia no meu tempo. Tinham a embraiagem ou acelerador fora do sítio habitual" (TM)... Julgo que na Guiné se chamavam Matadores e serviam, para além do transporte de carne para canhão (fui num do Xime a Contuboel, carregado de periquitos, no 2 de Junho de 1969, se bem me lembro), para rebocar os nossos velhos obuses da II Guerra Mundial... Terão desaparecido com a vinda das Berliet do Tramagal (LG)

Fotos: © Torcato Mendonça (2008). Direitos reservados


1. Mensagem do Torcato Mendonça, com data de 26 de Março último:

Caros Editores:

Anexo texto Pensa em Voz Alta - C; a merecer mais título de Mentes Perturbadas… Mexer na água com a mão faz ondas… Para quê ? Com pedrinha faz círculos concêntricos, todos iguais... Não quer dizer que mereça leitura atenta e menos ainda publicação. Sai pela bolha e toque de tecla.

Envio 8 fotos, divididas por três ou quatro mensagens [Artilharia 2, 3, 4 e 5]. Uma é de Vendas Novas e as outras dos anos quarenta.

Gostava de saber que raio de Peças e Obuses são estes. O Coronel Nuno Rubim sabe. Dizem-me algo as fotos. Questões afectivas. Vai breve legenda.

Agradeço, isso sim, que um de vós me diga – recebido.

Bem hajam

Um abraço,
Torcato Mendonça
Fundão


2. Pensar em Voz Alta - C
(O título do poste é da responsabilidade do editor, L.G.)

Pensa, pensa em voz baixa, deves concordar, aplaudir, louvar, enaltecer. Pensa, pensa mas guarda para ti. Se o não fizeres, ao menos bate palmas, ri, mostra a alegria própria dos teus verdes anos. Felizardo, sim tu que neste País vives. Felizardo. Tens o Benfica, uma canção que é nacional, uma Santa que olha por nós, por todos nós.

Quantos anos tens? Nem vinte... dezoito… não dizes? Olhas para onde? … Pareces olhar o vazio. Porquê? A tua geração não pode pensar em voz alta… para quê? Outros por ela o fazem, deixa-te disso. Cala-te e deixa o resto para os outros. O quê? A tua geração quê? Queriam castrá-la? Como assim, meu parvo… não podias falar, pensar em voz alta… para quê, macaquinho, não tens a mente perturbada…pois é isso…felizardos e ingratos…hein!...

Passa uma, duas, três décadas e hoje, pensar em voz alta é como respirar. Aceitar a opinião diversa é (ou tem que ser? – ou começa a ser e a não ser?) a normalidade. Na pluralidade e diversidade de opiniões será encontrada a razão, o rumo certo, a liberdade da vivência colectiva, depois de salutarmente debatida e aceite...

Não aqui, neste espaço plural, ou por isso mesmo aqui, neste espaço de Camaradas de outrora, porque não de agora, em busca do Rumo, do Caminho consensual de uma vivência comum, por todos vivida fortemente, mesmo em tempos ligeiramente diferentes.

Essa vivência comum que os une é a Guiné, a guerra colonial ou do ultramar em consonância ainda não completa e unanimemente aceite. Ou, para outros, guerra de libertação, será que foi? Será que já terminou? Será que falhou esse desígnio?

Talvez a Paz não seja sinónimo de Libertação, aqui ou lá, em maior justiça social, maior desenvolvimento, menores assimetrias ou a não existência de um fosso tão grande entre o Povo (de lá e de cá? ou só de lá? porque não de cá?) e as ditas elites dirigentes. Conjugado de dirigir: Há ainda a conjugação com digerir …outra estória…

Curiosamente há muitos anos atrás um homem compreendeu, brilhantemente, porque sendo de lá, foi educado cá, conheceu estas gentes, como no futuro, logo a seguir, melhor conheceu as gentes de lá, a sua gente. Anos depois diria: não faço guerra ao povo de lá, (ao de cá), faço aos políticos, à sua politica colonial. Esperto o homem de lá, conhecedor do povo de cá, pois alguns, os mais jovens, estavam em passagem curta e sofrida pela sua terra. Aplicava um sofisma mas, mesmo assim, a deixar marcas. Politíco a saber aplicar os seus conhecimentos. Discordamos dele lá e, mesmo depois de melhor conhecer o seu pensamento, cá. Não discordamos totalmente, é certo e respeitamos a sua memória.

Morreu precocemente, o homem. Não viu, o seu povo, o de lá e mesmo o de cá a gritar liberdade. Seria diferente, certamente muito diferente, a vida em liberdade do seu povo se ele tivesse sobrevivido. Porque não o de cá… e há liberdade, cá ou lá, hoje, como ele a sonhou, ontem, cá e lá? … Dúvidas e incertezas, muitas…

Hoje penso em voz alta, respeitando a pluralidade do pensamento e livre expressão de outros. Assim vou aceitando, reflectindo e buscando o caminho desejado… É pena certas marcas do meu passado, certa má formação, difícil ou impossível de modificar. Não esquecer, não saber esquecer e, menos ainda perdoar... Irrelevante para quase todos ou todos... Irrelevante…

Posso é pensar em voz alta e assim:

1 – Prefiro repetir-me. Já falei da nossa Memória como Povo. É difícil viver sem conhecer e debater o nosso passado. Não pretendo recuar oito séculos, nem cinco para falar dos descobrimentos ou da exploração de terras de chegada, desbravadas, conquistadas em nome da fé, da civilização e, porque não, de muita pouca-vergonha. Outros, de forma diferente, mais agressivos e aguerridos, mais preocupados com o cofre e menos ainda, do que nós, com as gentes, nem sabemos se terão tratado da memória. Talvez não. A soberba da grande potência inibe certamente essa preocupação. Coisas menores… foram-se dessas terras mais cedo, compreendendo o processo evolutivo da história mas sempre foram ficando ou regressaram, aos poucos, de forma diferente para um neocolonialismo aceite ou consentido...

Nós nem por isso… temos regressos de afectos e parcerias. Sem querer desviamo-nos.

Devemos debater, tentar compreender o fim do Império. Fundamentalmente é isso que aqui nos interessa. Talvez tenha um certo interesse. Talvez evite o avolumar de certas tensões, incompreensões, só fruto da falta da busca do consenso – debatido e aceite.

Não para justificar uma qualquer verdade histórica. Trabalho para Historiadores. Não. Procuremos somente gerar consensos e ao tratarmos dessa Memória(s), da nossa memória, sintamos orgulho de nós como Povo.

Não sintamos qualquer vergonha como antigos combatentes em guerra de uma dúzia de anos. Porquê? Por alguns excessos? Mas guerra é guerra e existem sempre excessos, de ambos os lados. Um ataque a uma povoação com morte de civis versus uma emboscada, tipo Quirafo, feita pelo outro contendor? Diferenças?! Quantas gentes de lá, fulas, mandingas, balantas…foram por nós salvas. Quantos os que, lutando ao nosso lado, sofreram mais tarde, após a independência, fortes represálias.

Ouvimos há dias o relato de um Militar que prefere salvar soldados e populações. Como classificar? Como compreender o desejo dos seus compatriotas, Libertadores, prontos a tudo arrasar… guerra é guerra e assim se justifica….

2 – Ainda é cedo para falar do recente Simpósio de Guileje pois aos poucos ainda se juntam elementos. Certo é que se abriu uma porta de futuro. Não acrescentamos mais nada… Esperamos.

3 – Continuemos a pensar em voz alta nuns pontos mais… Talvez um intervalo seja preferível… Isso, façamos um intervalo, um voto e um desejo:

- Que os Guineenses encontrem a Paz e o Desenvolvimento que ambicionam e merecem;

- Que nós, antigos combatentes, não nos sintamos – menos ainda admitamos – que alguns tenham a veleidade de nos querer colocar no lado errado da história. Combatemos envergando a farda do Nosso País.

Parece haver incongruência. Não!

Reflictamos lentamente, de quando em vez no intervalo das estórias... Talvez assim se encontrem muitas respostas a tanta questão levantada… E aceitemos a diversidade de opiniões, fazendo a crítica que julguemos estar correcta…

(continua... um dia, melhor, numa noite de insónia...)

_________

Nota dos editores:

(1) Vd. último poste desta série:

14 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2758: Blogoterapia (47): Pensar em voz alta... O tédio que às vezes nos invade (Torcato Mendonça / Carlos Vinhal / Virgínio Briote)

O Torcato deixou lá o seguinte comentário:

Abri e oh...o Narciso, o grego da mitologia, como aqui se lastimava não sei quem. Sou de facto eu, não um jovem turco, menos narciso mas sim um parolo em Fá, no início de comissão, roncos, peles e artefactos junto a abrigo de adorno. O que tenho ao pescoço acompanha-me há 40 anos(agora no saco). Os abrigos de Mansambo era á prova de canhão. Caí da cama mas tudo bem (ver o Mosquiteiro-salvo erro). O Torcato anda triste com a morte do José. Mas o SILVA deve chegar amanhã a Fá...já saiu de Bissau. Tudo para dizer:Isto eram conversas demasiado intimistas e não esperava a publicação. Saiu. Os Editores são soberanos e eu, como facilmente se constata, continuo apanhado. AB doTM

sábado, 1 de março de 2008

Guiné 63/74 - P2597: Pensar em voz alta (Torcato Mendonça) (9): Ler o blogue tornou-se quase um vício

A coragem de pensar em voz alta. A falar com ele, de tudo, mesmo de factos que nem sempre o deixaram em paz. O Torcato Mendonça.
__________

1. Mensagem do Torcato Mendonça.

Domingo, 24 de Fevereiro de 2008.

PENSAR EM VOZ ALTA
Meus Caros Editores

Não era para enviar mas vai. Vou parar uns dias devido a outras vidas.

Para mim as sondagens, se tratadas por quem sabe, podem dar uma amostragem curiosa desta Tertúlia. Partindo do principio que, o universo das respostas se confina só aos membros (207?). Pode ser alargado a todos os que não pertencendo votam. Sabem melhor que eu.

Quanto a fracturas…bem … o que não fractura…

Votos de óptima viagem aos que, neste momento, trilham estradas a caminho de Bissau e aos que, proximamente, vão ao Simpósio.
Oxalá aparece “livro” com comunicações e conclusões.

Um abraço,
Torcato Mendonça

__________


PENSAR EM VOZ ALTA ---- B


1 - Os P´s

Quando lemos alguns textos somos, por vezes, levados a reflectir calmamente sobre o seu conteúdo. Depois, podemos ou não fazer um escrito. Ou seja, podemos prosar de forma prosaica sem prosápia e, porque a senilidade ainda não se instalou totalmente, expressarmos o nosso pensamento. Sem pretensão de infirmar sobre o pensamento de outros, muito pelo contrário, afirmar, isso sim o nosso e quantas vezes, se formos capazes, reforçar em livre expressão nossa, o que lemos. A sondagem 7… sobre a guerra… violenta e humana… é um desses textos.

Ler o Blogue tornou-se quase um vício. Agradável e não uma dependência.
Hoje, com o tempo frio e húmido, as cicatrizes a protestarem, dizendo – presente – a leitura do jornal, o café duplo e a espera pelo despertar das ideias.
Passamos ao teclado, alinhamos palavras, voltamos a locais de contradição, locais de dor e amor, de alegria e tristeza, locais únicos de saudável duplicidade. Só nós entendemos. Porquê? Não entendo ou não o quero fazer?

Volto lá e tento um comentário. Assim:
O Psiquismo dos combatentes era fortemente abalado. Depois da morte do Alferes, da Milícia de Moricanhe, Uro Balde, vitimado por uma mina anti-pessoal aquando do rapto do Soldado Monteiro, sofri um choque forte. Outros factores agravaram.

Dormia mal. Ainda tomei um medicamento forte. Era pior. Dormia mas os sonhos continuavam. Depois habituamo-nos. Melhor, pensamos estar habituados. Não. Vejamos, um tormento desse tempo a prolongar-se mais que o desejável.
(….)

SONHOS

A maior operação em que participei, quer pelo número de dias quer pelos meios humanos empregues, foi a Lança Afiada. Só neste aspecto foi grande.

Os resultados, vistos pelo aspecto militar, foram fracos. Destruíram-se inúmeros acampamentos inimigos, fizeram-se prisioneiros – mulheres, crianças, adolescentes e velhos. Não se desarticulou profundamente a estrutura do PAIGC. Mesmo com muito armamento apreendido e a destruição de muitos “depósitos” de alimentos.

As baixas provocadas ao IN foram poucas, face aos meios por nós empregues. Parece incorrecto assim falar, mesmo hoje quase quarenta anos passados.

Parece um desejo de morte. Não é assim. Tento é ver com os olhos de outrora e, ontem como hoje, aquela operação, como todas, eram de destruição e aniquilamento. Assim, no nosso entendimento, deviam ter participado forças especiais a montar emboscadas na margem esquerda do Corubal.
E não só. Pode considerar-se uma crítica a todos os que a planearam e ao ComChefe.
Teimosia do General, mais que falta de visão, aliada á falta de coragem de o contrariarem. Tinha e tenho consideração pelo General. Não devo agora falar dele. Talvez um dia o faça. Escrevi na Agenda de 69 – em nota final à operação – assim a guerra é uma merda!

Sofremos vinte e dois feridos (quatro eram do meu grupo), cento e muitos evacuados por doença e insolação.

Temos que atender à duração, onze dias, às elevadas temperaturas – com médias de máximas à sombra entre 39 e 43,6 e ao Sol entre 70 e 74,5 graus – ao deficiente apoio logístico, principalmente no fornecimento de água e às rações de combate não adaptadas aquele clima.
Podemos voltar, um dia, a falar desta operação e à reacção ou retaliação do IN.

Já no regresso da operação, perto do Galo Corubal, com a tarde a cair rápida, parámos para descansar e comer. Tudo no maior silêncio possível, aplicando-se aqui e bem – o silêncio é de ouro.
Trazíamos prisioneiros, mulheres, crianças e três ou quatro adolescentes. De repente, já o sol tinha desaparecido, ouve-se o choro de um bebé. Alto, cuidado.
Digo, talvez ao Sukel – manda calar o miúdo. Cala-se, mas volta a chorar.
Mau, raios parta a sorte. O Sukel olhava para mim mostrando a sua impotência em pôr cobro á situação. Ele era fula, a mulher e o bebé balanta ou beafada sendo difícil o entendimento.

O choro aparecia de forma descontínua entrando como som de corneta mata adentro. Levanto-me e vou junto da mãe. Na penumbra, vejo-a segurar mais fortemente o bébé contra o peito. Não procuro falar. Olha-me e sabe porque ali estou. Vejo medo, terror mesmo, no olhar e sinto que compreende a situação. A segurança de muita gente está a ser posta em causa. Ela apercebeu-se disso, embala e aperta mais forte o filho contra o peito. Levanto-me e, quando me voltava, o bebé esperneia e volta a chorar.

Paro. Olho-a e ponho a mão esquerda na minha boca, puxo da faca de mato e passo-a pelo meu pescoço.

O terror no olhar daquela mulher, o soluço contido, o forte apertar do filho contra o peito, os olhares das outras mulheres e o choro abafado das outras crianças deixam-me aturdido, perturbado, revoltado. Afasto-me lentamente.




Guiné >Zona Leste > Sector L1 > Mansambo > CART 2339 (1968/69) > O Alf Mil Torcato Mendonça. Uma imagem que nos traz à memória o Apocalipse Now, O Caçador e outros filmes americanos da Guerra do Vietname. Pena é que a Guerra na Guiné, com tanto pessoal colocado anos e anos no Departamento de foto-cine, no QG em Bissau, não tenha praticamente produzido nenhum documento que não fossem as cerimónias de Bissau. E entretanto, a Guerra prosseguia impiedosamente, todas as horas de todos os dias, 11 anos seguidos, sem um dia de tréguas, nem mesmo depois do 25 de Abril.

Em quem, ou no que me tornei?
Sento-me, procuro acalmar e encontrar justificação, para toda aquela brutalidade. O miúdo calou-se. De repente barulho, correrias, sons a serem abafados, vozes sussurradas. Dizem-me: - o puto mais velho fugiu e um outro está ferido.

São dadas ordens rápidas para sair dali. Não tínhamos condições de segurança. Os turras estavam perto e o puto, quinze ou dezasseis anos, já sabia muito. Depressa os encontraria. Iniciámos um regresso rápido.
Nem duas horas depois aí estavam os nossos inimigos a bater a zona. Aceleramos o passo e só paramos depois da meia-noite. A estrada Mansambo – Xitole não estava longe.
Paramos para breve repouso. Enfiei-me no ponche com o Capitão. Consulta à bússola e à carta, dar umas curtas “passas” num cigarro e descansar um pouco, sentados sobre os calcanhares travando o desandar dos corpos com os ombros. Só que o cansaço atraiçoou-nos e o tempo passou rápido.
Acordámos em sobressalto com a manhã quase a raiar. Por pouco não acertei com a G3 numa “surucucu”, enroscada ali perto. O Milícia estava atento… e houve uma baixa nos répteis.

Saímos rápido, tentamos o contacto com Mansambo e só voltamos a parar bem perto da estrada. A partir daí tínhamos que redobrar os cuidados. Uma vaca de mato apareceu e o Lhavo, o nosso guia, queria atirar. Não! Mansambo é já ali – dizia ele. Não!
De facto, pouco depois estabelecemos contacto com a nossa malta, aliviámos a carga, sentimos mais segurança e Mansambo aí estava.

Belo aquartelamento…Larguei o material e tentei encontrar chocolates, doces e bolachas. Não tinha esquecido aquela mãe. Procurei-a. Quando me viu recebeu-me com o mesmo olhar de terror e apertou o filho. Tentei sorrir e dar-lhe as guloseimas. Certamente desconhecidas para ela e para a criança. Sabia, isso sim que eu era o seu inimigo. Entreguei ao Chefe de Tabanca, Leonardo Balde as “coisas”. Ele percebeu e disse: vai Alferes, vai. Eu trato deles.
Pedi ao Zeferino uma garrafa de uísque e fui tomar banho. Não voltei a ver mãe e filho. Durante muito tempo, de quando em vez eles voltavam, sempre da mesma maneira em sonho ou pesadelo a encharcar-me o corpo e a latejar as têmporas. Era mais um sonho ou pesadelo a juntar a outros. O tempo foi curando… nem sei. Os sonhos sempre foram e vieram, cada vez menos… um dia pensei terem-se ido, enganei-me. Mas isto não é o muro das lamentações. Foi um período dispensável da minha vida. Aconteceu… marcaram fortemente aquelas experiências. Foi negativo. Certamente também teve algo de positivo.

Há dias, tentei justificar o meu voto na sondagem a guerra… com o envio desta mensagem depois de ler uma resposta a outra.(…)

Abri o “correio” e li a mensagem abaixo. Mas que é isto? Nem reparei, haver outra mais abaixo em declaração de voto. Quando, antes, tinha lido a frase suporte da sondagem disse: porquê? Depois li e reli.

Na minha idade deve ler-se e reler-se. Não só por mor da idade. Não me queria meter nisto e, menos ainda faço declaração de voto. Tento afastar-me da politica… mas! Se isto fosse Declaração de Voto parecia política, nada disso. É um simples escrito. Talvez de alguém muito intrometido. Já votei. Porquê? Pela razão que devo participar e o voto, aqui e noutras sondagens poderão – se tratadas – ser um indicador deste Grupo.
Vejamos:

- Se eu regredir até ao meu tempo de militar posso votar;
– Concordo! Escrevi, alguns escritos foram publicados, sobre o Malan Mané, Braimadicô e, das estórias do José;
– O Sonho – não deve ter sido publicado (um tormento meu) e outros que não me lembro.

Eram tempos de Guiné, tempos de guerra imposta para a qual fui preparado. Melhor ou pior foi, no entanto, o treino suficiente para a desumanização. Se olhar para a frase com os olhos de hoje, digo não. É primário e básico para mim. A guerra é a suprema violência colectiva. A sucessão de actos desumanos, injustos e só praticados, por quem procura através da injustiça fazer prevalecer uma razão que não lhe assiste.

Vejamos as guerras actuais. Tentemos, com olhos de hoje, ver aquela em que participamos. Então? Claro, claro que era injusta, desumana e de violência gratuita. Cuidado: de ambos os lados existem erros. Disse aqui, creio eu – Bons, Maus e Vilões…disse…

Nas chamadas – tropas especiais – essa “metamorfose” era mais notória. Tive uma especialidade e preparação um pouco consentânea com esses princípios. Por isso sofri, depois de, sem dar por isso, ter claudicado. Sofri a tal metamorfose, a transformação, o sentido da disciplina, o suor a poupar sangue e outras…

Aqui, neste espaço sou forçado a regredir para escrever sobre esse passado. Será correcto? Seria dispensável a Sondagem? Não.

Vamos certamente ter uma amostragem que, se tratada, terá interesse para melhor nos conhecermos. Voto como outrora, CONCORDO. Porque não é o voto actual. É isso sim o voto do militar de outrora. Antes fora aquele jovem alegre e brincalhão que um dia os senhores da guerra, a mando dos políticos, metamorfosearam e era mais um…é pá…UM VOTO ACTUAL: TODOS PELA PAZ, PELA CONCÓRDIA, PELA JUSTIÇA (possível) ENTRE OS HOMENS. Em liberdade, igualdade e fraternidade. Mesmo utópica.

E peço desculpa dela ultima frase…C’ est la revolution? Bá… I beg your pardon (…) Não apago a “citação em francês e em inglês” porque expressam somente um pensamento e, simultaneamente tentam dizer que, neste site existe a livre expressão mas não a tomada de posição fora dos onze princípios…

Hoje, 24 de Fevereiro, no escrito do autor da frase que deu origem á sondagem, leio … a guerra dos pára-quedistas e uma foto de um cartaz contra a pide.

Quanto á primeira merece um breve comentário: se os pára-quedistas tinham uma guerra diferente (ou sentida de outra forma diversa) dos outros miltares desconhecia. Talvez o título induza em erro ou tenha eu entendido mal.

Quanto ao cartaz: eles estavam em toda a parte e nós milicianos mereciam, no tempo que lá estive, uma atenção especial…voltarei a este tema.

Antes, sem atingir ninguém que nesse tempo tinha entrada no lado do edifício de oficiais de Bambadinca, não sei ao certo onde ou quem viu os livros, acrescento um breve escrito sintomático dos longos tentáculos das” informações”….(…) O Livro, o Bufo* e o Jagudi**. Ou Bambadinca, Meu Amor.

Era uma vez um Livro, pequeno, cerca de cem folhas ou poucas mais. Viajante infatigável, habituara-se a passar de mão em mão, sendo folheado calma ou bruscamente, consoante o leitor. Desta vez entregaram-no a um sujeito barbudo e de rosto fechado.
Pegou nele, lançou breve olhar á capa e contracapa. De forma brusca atirou-o para cima de uma cama. Aterrou, o livro, próximo de um monte de roupa, junto a um saco cilíndrico, verde, seboso pelo uso pouco cuidado e com restos de lama de tarrafo. Pela experiência pressentiu a proximidade de viagem. Limitou-se pois a observar tudo o que o rodeava.

O homem arrumava papéis, blocos, canetas e objectos similares numa caixa de madeira. Fechou-a com um cadeado, colocando depois a chave num fio que tinha ao pescoço. Com gestos automatizados passou á roupa, separando-a de forma a ficar em pequenos montes. Fumava cigarro atrás de cigarro. Berrou um nome qualquer.

Pouco depois apareceu um outro sujeito, mais magro e macilento. Entregou ao homem um pequeno saco, talvez com artigos de higiene, uma máquina fotográfica e um rádio. Não trocaram palavra e nem se olharam.

Meteram a roupa e os outros objectos dentro do saco verde. O homem trouxe mais dois outros livros. Embrulhou-os numa espécie de rede mosquiteira e ficaram, os três, no cimo do saco. O sujeito macilento fechou o saco militar e trouxe-o, juntamente com a caixa para junto de outra bagagem a ser carregada numa viatura.

Pouco depois ouviu vozes, ordens de marcha e sentiu, habituado que estava, ao início de uma outra viagem. Conseguia ver, por entre as malhas da rede, a picada, a mata não muito densa e os militares com armas na mão, rostos fechados, olhares atentos.

Tentou falar com os outros livros. Um era bem maior que ele e o outro não tanto. Só falava francês e não foi entendido. Calou-se. Não demorou muito a viagem, talvez duas horas ou nem tanto. Ouviu gritos e risos de meninos, o vozear alegre de outros homens, em língua desconhecida para ele. Apercebeu-se terem chegado a uma aldeia.

Tiraram o saco e a caixa da viatura colocando tudo, com cuidado, numa palhota. Sentiu o cheiro a medicamentos. Ouvia, cá fora, risos e conversas em voz alta. De repente entrou o homem com mais papéis. Abriu a caixa e meteu tudo lá dentro. De seguida abriu o saco de onde tirou os livros, a máquina fotográfica e o rádio. Colocou-os sobre uma espécie de mesa, junto á caixa de madeira e afastou-se.

Tinha agora, daquele local, uma melhor visão do que o rodeava no pequeno espaço de uma palhota. Quase diariamente era lido pelo homem. Folheava-o cuidadosamente, com carinho mesmo, tomava apontamentos e, de quando em vez, trocava-o pelos outros; ou, mais frequentemente pelo outro, o mais pequeno, apesar de maior que ele.

O maior era menos lido. Outras vezes escrevia nos cadernos. Pressentia ser, aquela palhota (tabanca ou morança, como lhe ouvira chamar) o centro da aldeia. Tudo girava á volta dela, até a pequena enfermaria.

Os dias passaram rápidos. Voltou a viajar e foi entregue a outro homem. Era o seu destino, a razão da sua existência numa contínua e eterna peregrinação.

Ficção com factos reais, senão ouça:

O homem era militar da 2339 com base em Mansambo. Viajou primeiro para a Tabanca em autodefesa de Candamã e Afia com o seu Grupo reforçado; posteriormente viajou para Bambadinca, sede do BCAÇ de que estava dependente, apesar de pertencer a uma Companhia Independente. Como gostava de ler levou três livros, matava o tempo e suavizava o mau viver em condições difíceis. Se bem me lembro, os livros foram todos emprestados. O Livro era: Révolution dans la Révolution de Régis Debray; outro, um pouco maior, era Terra Ocupada de Urbano Tavares Rodrigues e, o maior não me recorda o nome, tratava de guerra, das suas tácticas etc., escrito por um militar, Coronel ou perto desse posto, chamado Hermes de Oliveira.

Estive, entre quinze dias e um mês, em Candamã e depois passei por Bambadinca antes de regressar a Mansambo. Aproveitei para beber um uísque com gelo, tomar um duche há muito adiado, uma refeição decente e dormir numa cama. Indicaram-me o quarto, talvez com mais camas, naquele edifício em forma de U.

Apesar da confiança protegi com roupa a caixa de madeira (antes era cunhete de granadas, agora tinha documentos confidenciais) e desfiz o saco. Descuidei-me com os livros. Fui tomar um duche e devo ter cantado e demorado. Demorado muito certamente, sentindo o prazer da água a escorrer-me pela encardida e curtida pele. Certamente voltei e arrumei tudo, livros incluídos.
Sabia bem das relações de R. Debray com Guevara na Bolívia e do que tratava o livro sendo desnecessário aqui focar; ou dizer que Urbano T. Rodrigues não morria de amores - suave - pelo regime, nem a censura por ele. Quanto ao outro livro não comento.

Talvez uma semana depois voltei a Bambadinca. Fui chamado ao Comandante. Certamente trazia documentos para ele e vice-versa. Depois das saudações, foram tratados os diversos assuntos. Na parte final da reunião fez-me, no entanto, uma pergunta normal mas, a sua formulação alertou o meu sexto sentido.
- Sei que gosta de livros. O que está a ler agora? (Pois…)
- Um livro sobre guerrilha de Hermes de Oliveira e outro do francês Jean Laterguy, sobre guerra na Argélia. (pois…)
- Claro, claro. Escrito em francês?
- Não meu comandante. Já foi traduzido claro. Está em português.
- É preferível. Não gosta de ler em francês pois não? Sorriu, por detrás do bigode de galã de filme italiano dos anos 60. E mais não disse (o Comandante era o Tenente Coronel Pimentel Bastos). Não respondi.

Talvez tenha esperado um pouco e pedido autorização para sair. Talvez tenhamos almoçado na mesma sala. Certo é nunca ter sabido quem fora o bufo*. Se houve denúncia… não era a primeira vez…Pululavam, os bufos, por toda a parte… talvez fossem mais abundantes que os jagudis. ** Preferia os últimos. Eram úteis!

E neste dia frio e húmido paramos. A noite entra devagarinho. O Sol há muito que se escondeu por detrás dos montes. Aqui, no vale ou no sopé destas serras a rodearem-me por todos os lados, anoitece mais rápido. Por isso, não só por isso, a necessidade de rumar ao meu Sul.

Amanhã, ou noutro dia qualquer continuo… um dia de cada vez…. Esperando o seguinte… como outrora lá e agora, não há muito tempo, cá…

__________

Notas de Torcato Mendonça:

*Bufo: - espécie da família das corujas. Maiores, olhos grandes e amarelos. Certas “pessoas” recebiam esse nome… porque seria? O Império; o Império…e a Metrópole… a Metrópole…
** Jagudi: - (crioulo) espécie de abutre. Ave de rapina e necrófaga muito útil. Nunca se abatia tal ave… (….).
__________

Notas de vb: legenda da foto da responsabilidade do co-editor. Ver artigos de

19 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2558: Blogoterapia (44): Pensar em voz alta (Torcato Mendonça)
e de:

14 de Março de 2007> Guiné 63/74 - P1594: Estórias de Mansambo (Torcato Mendonça, CART 2339) (1): A dança dos capitães

16 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1666: Estórias de Mansambo (Torcato Mendonça, CART 2339) (2/3): O Zé e o postal da tropa

25 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1785: Estórias de Mansambo (Torcato Mendonça, CART 239) (4): Burontoni, mito ou realidade ?

27 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1892: Estórias de Mansambo (Torcato Mendonça, CART 2339) (5): O Casadinho e o Bessa, os mortos do meu Gr Comb, os meus mortos

7 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1929: Estórias de Mansambo (6): Matilde

17 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2055: Estórias de Mansambo (Torcato Mendonça) (7): Eleições à vista...

21 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2122: Estórias de Mansambo (Torcato Mendonça) (8): Marcha, olha para mim, com ódio, peito erguido, cabeça levantada...

28 de Setembro de 2007 >Guiné 63/74 - P2139: Estórias de Mansambo (Torcato Mendonça, CART 2339) (9): Amigos mais velhos

15 de Dezembro de 2007 >Guiné 63/74 - P2353: Estórias de Mansambo (Torcato Mendonça, CART 2339) (10): Devolvam o bode ao dono... e às cabras de Fá Mandinga, terra de Cabrais

14 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1278: Estórias de Bissau (3): éramos todos bons rapazes (A.Marques Lopes / Torcato Mendonça)

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Guiné 63/74 - P2558: Pensar em voz alta (Torcato Mendonça) (8): Correio do Torcato Mendonça


Pensar em Voz Alta


1. Correio do Torcato Mendonça.
Deixemo-lo discorrer, pensar em voz alta, sem comentários, limitando-nos apenas a sublinhar uma ou outra passagem.


Meus Caros Editores,

Escrevi uma mensagem com um "esqueleto". Deixou de o ser e segue devidamente coberto. Se presta ou não é outro assunto. É uma terapia, blogoterapia…as madrinhas de guerra não seriam uma aeroterapia?

Neste dia de chuva e mais chuva tratei de vários atrasos…acabei por passar pelo blogue e lembrei-me de mandar este escrito. Foi antes junto a outro – O Livro – em esqueleto coitado. Se está vestido, vai…

Li o Texto do ex- paraquedista Rebocho e, se me é permitido, faço (...) breves considerações:

1- O acesso à correspondência de alguém, só deve ser invocada se antes o " dono dela " deu autorização. Ou não ficou esclarecido ou eu não percebi. Há uma autorização a outra pessoa.

2- Um furriel e um alferes milicianos eram praticamente iguais. Um tinha 3 vês, virados para baixo a que chamavam divisas (salvo erro), o outro tinha um traço chamado galão. Iam para a tropa para o CSM ou COM por terem habilitações literárias diferentes. A instrução era igual ou pouco diferia. Estou certo ou errado?

Conheci furriéis que deviam ser eles a comandar os que o comandavam a eles… No CIOE os cabos milicianos mandavam os aspirantes fazer uma completa de x… Meu aspirante uma… olha toma.

Porque não podia o Casimiro saber…. Bem se fosse dissertar política internacional com o Professor Adriano Moreira – por quem tenho o maior respeito – certamente era diferente…pois…presunção e água benta…

3- Isto é que vai aqui uma moenga…é do tempo. MAS: OS MILICIANOS SÃO MILICIANOS E OS DO QP SÃO DO QP. E AQUI HÁ UM PROBLEMA DO QP!

O 1º Sargento da minha Companhia tinha um trauma por nunca poder ter galões… O Parreira Fur Comando conheceu-o noutra comissão em Bigene, creio eu! Ora eu gosto e respeito muita gente que é ou foi do Quadro Permanente ou do QP.

Malhas que o Império teceu… e ainda hoje faz eco…
Um abraço,
Torcato Mendonça
torcatomendonca@gmail.com

PENSAR EM VOZ ALTA

A - (História; Guileje; a Verdade necessária Sempre)

1 – Bissau; - hoje, 23 de Janeiro 08. Já é passado. Estamos a 27, na rápida voragem dos dias.

Dizia eu nesse dia 23, em mensagem desabafo, ao Virgínio Briote:

Virgínio Briote,

hoje, pela manhã, como é meu hábito, abri o blogue. Li o Post sobre a diáspora. Àquela hora tinha intenção de o fazer a correr. Mas não, voltei atrás e reli. No dia anterior, se não me engano, aconteceu-me ler, parar e voltar atrás, reler e ler até ao fim um escrito de um ex-combatente de Mondim de Basto. Agora, embora por razões diferentes voltei a fazê-lo.
Nos últimos dias, comecei, perante o que leio, o teor dos assuntos abordados e por outras razões ou motivos a questionar-me sobre o blogue. Fiz aquele comentário ao P 2456 – finito.

Ontem li no JN, pag. 60, Olhares cruzados…uma visão de Diana Andringa sobre a guerra colonial. O M. Lopes mandou e-mail com o que o jornalista escreveu. Diz ela ao jornalista: … lá não há nenhum ódio aos portugueses…há uma espécie de turismo sentimental…!
Concordo com o turismo, desconheço os ódios. Não os tenho pessoalmente a ninguém, mas isso não interessa.
Leio o Post da diáspora; a troca de mensagens, a ausência de quadros guineenses, a Crónica de um Descrente e o poema relatando o Bissau de hoje, os comentários que depois aparecem – quer sobre estas questões, quer sobre o Simpósio – concordo, não ignoro o que naquela terra se passa e penso: de facto isto fortalece as minhas dúvidas dos últimos tempos.

Havendo, para mim, situações dissonantes “fiz” um escrito. Chamar-lhe-ia – Heróis Obscenos ou Geração do Hummer ou Da Mata ao Dancing. Perdeu o titulo o interesse, fiz delete e tudo se esfumou… é melhor assim.
O escrito ficou na cabeça. A idade vai diluir e escrever não se faz quando queremos… Acho o meio milhão de visitas uma vitória, vista de vários prismas, de um homem – o Luis Graça. Mesmo que ele queira partilhar com outros; o livro do Beja Santos um acontecimento bonito; o Simpósio será o que os homens de boa vontade quiserem e oxalá sirva o desenvolvimento de uma terra de que gosto, mas não é minha e, a palavra principal é dos guineenses… um país com uma mortalidade infantil de 200 em cada 1000 nados-vivos, um país que lutou de armas na mão… Bem, não continuo.

É certamente ilegítimo questionar assim. Mas vejo um pastor católico (sou anticlerical) ir fazer, com outros, uma viagem para entregar um Jeep, medicamentos e etc. Oxalá tudo corra bem para eles. Incongruência minha? Talvez! Mas porque não ficam com um Hummer? Gasta muita gasolina? Ou podem dizer: pois é mas tu (eu) nunca mais voltas á Guiné.
Certo. Eu sei que não posso voltar. Nada me inibe, contudo, de criticar ou lutar pela ajuda de um povo que merece uma vida melhor e desmerece certos compatriotas…páro mesmo… concordo com o teu comentário e a resposta; com o Descrente e o Poeta esperando que se tornem crentes e não tenham, no futuro, razão para escrever assim.
Espero sair uns dias, talvez ainda esta semana. Não sei ainda ao certo, como não sei a minha relação bloguista. Depois de meados de Fevereiro se verá. Escrevo, sobre vários assuntos e acrescento a Guiné. Tenciono, recomeçar as Estórias de José II e fazer uma análise, em abordagem diferente, à minha participação, como Militar e graduado do Exército Português.
Estive no lado errado da História? Nada disso! Causa injusta? Bem, vamos fazer a abordagem por aí…
Não faço cc, como é meu hábito, ao Luis Graça e por isso o endereço é diferente. Talvez guarde e reencaminhe depois. Não o chateio agora. Eram só duas palavras. Assumo-as todas Camarada. Sempre.
Um abraço,

Depois destas palavras, podia e devia estar mudo e quedo deixando fluir os acontecimentos. Não vou, com qualquer escrito travar ou desviar minimamente algo do seu normal percurso. Posso até parecer um sujeito sem prática solidária. Mas:

Continuo, neste pensar em voz alta, correndo o risco ou tendo a certeza de estar a mensagem fora de contexto do que, a seguir abordo.
Talvez não tenha sido explícito. O que a seguir escrevo não ser a continuidade do atrás escrito. Prefiro contudo continuar a pensar em voz alta.

2 - Hoje, 27 de Janeiro, no Suplemento P2 do jornal O Público, a páginas 3, vem uma frase de Konrad Adenauer – “A História é a soma das coisas que poderiam ser evitadas”. Concordemos ou não com ele, politicamente ou nesta frase, se a adaptarmos á Guerra – Colonial ou do Ultramar – sentimos haver, nesta definição, algo de verdade e correlacionada ela.

Efectivamente, a história poderia ter sido escrita de outra forma se a soma das coisas tivessem sido evitadas. Foi uma guerra que, se não fosse o autismo da classe dirigente, mesmo depois de iniciada, poder-se-ia ter evitado. A generalização a toda a classe dirigente pode ser injusta. Houve quem pensasse, nesse tempo, de forma diferente.

Não cabe aqui e agora fazer história. Deve-se, isso sim, relatar as memórias, os factos vividos, da forma mais fiel e real que nos for possível.
O somatório desses relatos levará, quem de direito a fazer uma análise historiográfica correcta. No caso concreto, serão pois os historiadores a juntar essas coisas. Contudo, aqui interessa focar mais a Guiné, sabendo antecipadamente a impossibilidade de dissociar uma parte do todo. Conscientes disso, sabendo as limitações para uma análise de uma guerra na qual participamos, pretensioso seria ir mais além do que comentá-la de forma ligeira. Vejamos então:

Na Série Televisiva – RTP1 – A Guerra, do jornalista Joaquim Furtado, existem depoimentos importantíssimos para se compreender a Guerra nos vários cenários.

Pode ser um trabalho valioso e um contributo importante para o estudo futuro desse período da nossa história. É um trabalho jornalístico, parece-me não pretender ir mais além, tendo, nesta I Série, valiosa pesquisa documental e importantes depoimentos.

São relatos, com opiniões divergentes de participantes de um e do outro lado. Essa riqueza de informação será determinante, no futuro, que se quer breve, juntamente com outros trabalhos, para compreender e escrever, essa parte da nossa história e dos outros povos intervenientes.

Esperamos pela II Série, pois, certamente, no seguimento da primeira mais esclarecedora e rica se tornará, propiciando os tais importantes elementos de estudo.

O filme de Diana Andringa e do guineense Flora Gomes – As Duas Faces da Guerra – tem abordagem diferente e dá-nos, da guerra na Guiné, uma visão mais profunda.

É um documentário que mostra a guerra, como o título indica em, pelo menos, duas visões diferentes. Há analogia no título com uma moeda, o verso e o reverso. Não é moeda de “Eixo Vertical”. Ou seja, ao passarmos do verso para o reverso temos a visão diferente e livre a abrir-nos caminhos para, no futuro ou porque não já agora, serem exploradas as vivências de quem esteve dos dois lados do conflito e tem dele, logicamente, opinião ou visão diversa.

É um Documentário importante. Sentido fortemente por quem assiste ao filme. Principalmente pelos que viveram aqueles acontecimentos. Sem nos apercebermos somos para lá transportados.
Os relatos são feitos de forma pausada, clara, objectiva. Fala-se da ausência de ódios, entre os antigos intervenientes – não sejamos ingénuos, entre a maioria deles – ou ainda do sonho de Amílcar Cabral. Como seria a Guiné sem o seu desaparecimento?
Temos outro relato importante sobre a internacionalização da guerra e a participação de Cubanos, Jugoslavos, Russos e outros.
Pena não termos uma mais forte amostragem ou depoimentos sobre a chacina de muitos Guineenses que ao nosso lado lutaram.
É um documentário a merecer reflexão e debate. É imprescindível para a análise da nossa memória colectiva futura.

No Blogue, Luis Graça e Camaradas da Guiné, existem já inúmeros depoimentos, comentários e relatos de vários acontecimentos importantes do conflito. Felizmente nem sempre convergentes. Alguns, a que foram chamadas questões fracturantes, essas divergências são mais fortes. Noutros, sobre questões diversas, a crítica, se correctamente feita, é sempre salutar, repõe ou aproxima-se, assim mais da verdade.

Curioso, foi ler a chamada de atenção a um tertuliano (creio eu) menos atento, de Diana Andringa sobre a I Série de A Guerra, esclarecendo a interrupção e a vinda de uma II Série. Desse modo, defende o seu colega Joaquim Furtado. Não com o intuito de defesa mas, quanto a mim, com o objectivo de esclarecer.

De forma diferente temos o esclarecimento, correcto e oportuno, do nosso Camarada de Artilharia e dos Comandos a um Camarada Paraquedista. Entre militares parece mais agreste a resposta. Nada disso, quanto a mim claro.
Efectivamente não há peças de artilharia 10,6. Havia, isso sim, obuses 10,5. Quanto a quem era ou não o Comandante do CAOP 5 foi, pelo Coronel Nuno Rubim, novamente e documentalmente esclarecido.

Talvez seja o acontecimento mais dramático da guerra na Guiné. Por isso, o cuidado no relato dos factos do que efectivamente aconteceu. Em debate sereno, certamente com opiniões diversas dos acontecimentos vividos pelos intervenientes, procurando consensos pois, só assim, se poderá descrever, em verdade, esse período.

É difícil relatar tão dramáticos acontecimentos. Mesmo feito por quem os viveu. Até a semântica pode adulterar o relato. Abandonar versus fugir.

A decisão de abandonar, de sair de um aquartelamento militar deve ser terrível, dificílima para ser tomada. Mas esse acontecimento tem que ser relatado. Analisado com os depoimentos das duas partes. Não só aquele, outros daquela guerra devido á sua importância, merecem tratamento profundo porque alguns são determinantes no desfecho da mesma.

Temos os exemplos do Como, de ficar e mais tarde abandonar Cachil, Balana, Madina do Boé e do desastre do Cheche. Ou acontecimentos passados em Gadamael e, no Norte, em Gudaje, ou o assassinato de quatro oficiais e outros militares – mais conhecido pelo caso dos 3 majores – ou certas tomadas de posição militar e política; por uma Guiné melhor, não bombardear ou não emboscar em certas ocasiões.
Por isso a necessidade de serem os intervenientes, se possível de ambos os lados, a relatar o outrora acontecido, sem receios de criticas, de divergências, de fracturas. A guerra, contada por quem a fez será certamente, para o futuro histórico mais fiel.

Devemos aceitar com humildade as vivências diferentes, a critica, sempre salutar se objectiva – repito –, para contribuir no esclarecimento do período 1961/74, na Guiné 36/74, aqui mais focado.

Não o podemos dissociar de toda a Guerra Colonial, do Ultramar ou de Libertação e incluir o estudo da história da colonização daqueles territórios, das suas gentes e, se feita agora, mais de trinta anos depois da independência, tentar entender o que se tem passado, sem análise tida com ingerência, ou que se passou nos anos de pós independência.

Daí a importância que dou, de forma subjectiva claro, ao Simpósio de Guilije. Pode abrir-se uma porta de futuro. Pode a nossa geração – a que fez a guerra – ou, porque não todos os que o desejarem, contribuir par um desenvolvimento conjunto, partilhado em liberdade, em desenvolvimento sustentado, pois disso estão, ainda hoje, carentes os nossos Povos.

Não queria, por razões óbvias – apesar da minha ínfima participação – falar da importância do Blogue Luis Graça e Camaradas da Guiné. Parece-me contudo ser, para o relato histórico desse período – 63/74 – de enorme importância.

É difícil ou utópico mesmo pensar que a verdade plena vai ficar plasmada no relato histórico. Será o relato mais fiel e verdadeiro possível. Era óptimo conseguir isso.

Vou fazer uma citação: - de quantas mentiras se faz uma verdade – de J. Eduardo Águalusa.
Aproveitamento meu, em parte desconstextualizada do que ele quis dizer. Serve-me no entanto para a minha visão histórica de muitos acontecimentos e isso não o queria para estes.
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Revisão / Fixação de texto / Sublinhados: vb

domingo, 20 de janeiro de 2008

Guiné 63/74 - P2461: Pensar em Voz Alta (Torcato Mendonça (7): Dois heróis, dois homens com valores, Domingos Ramos e Mário Dias

Guiné-Bissau > Nota de cem pesos, já fora de circulação, com a efígie de Domingos Ramos, herói nacional, e amigo do nosso Mário Dias. Em primeiro plano, a imagem também de uma moeda, com a efígie do Domingos Ramos (1).

Foto: © Torcato Mendonça (2008) . Direitos reservados.


1. Mensagem do nosso amigo, camarada e habitual colaborador Torcato Mendonça (Fundão):

Caro Editor e Co-Editores:

Podia não escrever; podia anexar só a foto com um abraço; podia ficar mudo e quedo, como o fiz após a leitura do Post – 2435, de 12 de Janeiro último (Série PAIGC - Quem foi Quem), sobre Pansau Na Isna, herói da Guiné e cujo teor, em parte discordo, noutra interrogo-me e, noutra ainda, prefiro nada mais dizer.

Questionei-me só no seguinte: quantos portugueses, tão letrados como o tal guineense, sabem quem foi D. João I, II, IV ou VI, ou o Aristides Sousa Mendes, o General Sousa Dias, ou citar o posto e o nome de 6 (seis), 5 (cinco) ou 4 (quatro) Capitães de Abril… Podem começar, como geralmente começam: Senhor Coronel…

Outras Vidas de Tantas Vidas… só queria mandar a foto… Haverá heróis portugueses da dita guerra do ultramar, colonial ou de libertação!?

Há um, perdão dois Homens, que são a principal razão do escrito: um o que tem o seu rosto na moeda e na nota, e o outro o nosso Camarada Mário Dias. Dois Homens com uma História fabulosa e digna de figurar como Símbolo da Grandeza de Homens que foram Combatentes.

Foi, curiosamente, um ex-comando (6ª, 7ª Companhia de Comandos, Angola e Moçambique?) meu velho amigo, proprietário de uma lojita de antiguidades e afins que, sabendo-me coleccionador numismático, ajuntador de eteceteras e ex – combatente da Guiné me mostrou hoje, entre outras, estas duas peças. De pronto as agarrei e fiz agora a foto.

Quem for a Guileje deve, com facilidade, encontrar estes espécimes mas, encontrem ou não, envio a foto em humilde e singela Homenagem a dois Homens, Amigos/Irmãos, a servirem de exemplo a todos os ex-combatentes, num Mundo tão carenciado de certos valores…

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Notas dos editores:

(1) Vd. poste de 12 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2343: PAIGC - Quem foi quem (5): Domingos Ramos (Mário Dias / Luís Graça)

(2) Vd. postes de:

2 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCI: Domingos Ramos, meu camarada e amigo (Mário Dias)

2 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCIII: Domingos Ramos e Mário Dias, a bandeira da amizade (Luís Graça / Mário Dias)

2 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCIV: O segredo do Mário Dias, ex-sargento comando

quarta-feira, 4 de julho de 2007

Guiné 63/74 - P1921: Pensar em Voz Alta (Torcato Mendonça) (6): Vidas, tantas vidas!

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Mansambo > CART 2339 > 1968 > Fotos Falantes II > 31 > Alf Mil Torcato Mendonça e o seu papagaio amestrado.

Fotos: © Torcato Mendonça (2007). Direitos reservados.



O 1900, por Torcato Mendonça

Caro Luis Graça: Lembrei-me de te dar os parabéns (1). Os dias passam, os assuntos empurram-me de um lado para o outro e nada. Hoje li o post do jovem, transportado, quando tinha dez ou onze anos até ao Ultramar (2). Pois é, pois é… daqui se conclui que, se a História tivesse sido bem ministrada, hoje, os que lá não foram, teriam uma visão diferente. Repito-me mas digo: nós (povo português) nunca fizemos o ajuste de contas com o passado. Mesmo com o que se passou após o 25 de Abril. Por isso estamos como estamos. Não é qualquer tomada de posição politica. Isto é transversal a toda a sociedade; concordemos, discordemos, sejamos indiferentes. Procuro escrever do modo mais simples possível, não tomar qualquer posição aqui (é-me estatutariamente vedado). Só que, a memória está a ser relatada de forma diversa, em busca da verdade, com tolerância, de forma aberta e despretensiosa. Pode haver excepção. Claro, se há regra… mas cada vez há mais pessoas, mais gentes a lerem, a informarem-se, a reflectirem sobre o tema. Não sinto qualquer complexo em pertencer á geração dos últimos Guerreiros do Império, para uns ou aos tipos que entregaram as Províncias Ultramarinas ou uma parte da Pátria ao inimigo. Admito e respeito as posições. Mesmo as provenientes do raciocínio do absurdo.

Assim:

1º- Recebe os meus parabéns pelo post 1900 (já vai no 1914) e pelos 300 Mil visitantes (hoje 30 mil e seiscentos; mais de mil/dia!? (1). É obra meritória, pelos temas abordados ou tratados e, principalmente para que a verdade seja reposta. As memórias, nas diferentes maneiras de ver e recordar o passado, são descritas por quem as viveu. Está este Blogue a fazer memória futura. Renovo os parabéns!

2º- O trabalho do Editor, do Carlos Vinhal, de outros colaboradores mais directos tem sido fantástico. Seleccionar, tratar, publicar n textos e fotos diariamente é um trabalho de loucura. Só encontrei, melhor, fizeram encontrar-me o site, há um ano e pouco. Sinto contudo as diferenças. Além disso quem esteve em África, de um modo geral, não esquece a terra, os cheiros, as Gentes e a magia gerada que, a nós Europeus, ao princípio se estranha mas depois se entranha (como outro dizia) para sempre.

3º- O Jorge Cabral (3). São textos magníficos, são obras de arte em crítica com bonomia, com humor, com alívio de tensões a uma guerra estúpida, como todas, que é aqui relatada, a maior parte das vezes com um dramatismo enorme, real contudo, que nos transporta facilmente ao passado então vivido naquela terra. Ele viveu igualmente mas, com os seus escritos, alivia tensões, alegra-nos e, por momentos encaramos a realidade de outra maneira. Se estiveres com ele, dá-lhe um abraço meu, um bem-haja pelo que escreve. Eu leio e releio. Ele disse-me, em Pombal, que meia Tabanca de Fá está na periferia de Lisboa. Quantos Cabrais andarão por lá… se calhar…? Brinco… só que o meu desejo é continuar a ler os escritos do Homem de Fá.

4º- Uma das riquezas deste site, além dos temas tratados, é a diversidade, a diferente forma de descrever, quantas vezes a mesma situação. Os posts, a bold, são óptimos e tão diferentes. O Vitor Junqueira (4) tem uma forma forte e vigorosa de escrever. Deu-me com este texto, disse-o na altura, o conhecer um homem diferente do que, até aí, imaginava. O Virgínio Briote (5) com este texto fez-me parar no tempo, voltar a um passado, não da Guiné, mas talvez com ela relacionado. Depois de o ter lido, fiquei quieto a mente a retroceder… depois abri as Minhas estórias do José, procurei a Matilde, nome fictício, porque o Briote falava nesse nome, li o que escrevera então e, como não tenho a certeza, envio-te para, se um dia tiveres dois minutos, passares os olhos.

Há vidas … há tantas vidas! Perdemos parte dos nossos verdes anos, dos nossos amores e desamores. Talvez tenhamos perdido algo mais e, porque não, ganho também qualquer coisa.
Breve nota - Li agora o 1916. O Leopoldo Amado (6) merece o meu respeito, admiração e fiquei tremendamente feliz com o seu Doutoramento. Por ele, por quem lhe é querido, por todos os meninos das Tabancas do meu tempo. Por aquele Povo, pelo meu Povo, pois com ele a História será o relato em verdade do que se passou, principalmente entre 63/74.

SÓ. Simplesmente SÓ isto.

Torcato Mendonça

__________

Notas de L.G.:

(1) Vd.post de 1 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1905: Blogoterapia (22): Mais de 1900 posts, mais de 300 mil visitas (Luís Graça / Carlos Vinhal)

(2) Vd. post de 25 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1881: Estórias de vida (1): N.R., aliás, Nuno Rodrigues, nascido em 62, filho de sargento do BCP 12, aluno do liceu Honório Barreto

(3) Vd. post de 29 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1900: Estórias cabralianas (25): Dois amores de guerra e uma declaração: Não sou pai dos 'piquinos Alferos Cabral' (Jorge Cabral)

(4) Vd. post de 31 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1475: A chacun, sa putain... Ou Fanta Baldé, a minha puta de estimação (Vitor Junqueira)

(5) Vd. post de 18 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLV: Teresa: amores e desamores (Virgínio Briote)

(6) Vd. post de 3 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1916: Álbum das Glórias (16): O Doutor Leopoldo Amado... ou a segunda derrota de Spínola (João Tunes)

sexta-feira, 30 de março de 2007

Guiné 63/74 - P1638: Pensar em Voz Alta (Torcato Mendonça) (5): Um abraço a um camarada comando

Texto do Torcato Mendonça:

Amílcar Mendes: dou-te um abraço de Camarada.

Tenho muito respeito pelos Comandos. Não interessa agora o porquê. Viveste fortemente, violentamente, situações, ainda jovem, que te marcaram e dificilmente esqueces. Como tu muitos de nós. Eu tentei esquecer durante muitos anos. Puro engano! O melhor, quanto a mim, é mandar cá para fora.

Este Blogue proporciona a todos nós fazermos essa terapia: lendo, escrevendo ou não, revivemos, recordamos e libertamos, em revolta por vezes, os recalcamentos há muito reprimidos.

Estamos entre Camaradas, entre amigos, entre homens unidos pela violência de uma guerra, que foram obrigados a participar numa parte da sua juventude. O que nos une é demasiado forte. Este espaço na Net é demasiado importante para muitos de nós.

Compreendo-te, Camarada, não recalques e manda cá para fora o que sentes… Sou mais velho, estive em 1968/69, havia violência mas… Guileje e Guidaje e os anos de 73/74 são marcos naquela guerra.

Quando escrevo a algum Camarada dou C/C ao nosso Comandante Luís Graça. Assim não quebro regras do Blogue. Foste Comando (continuas sempre Comando) e compreendes bem o que eu quero dizer.

Camarada, um abraço do
Torcato Mendonça

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Nota de L.G.:

(1) Vd. post de 28 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1633: Guidaje na TVI: Um murro no estômago (A. Mendes, 38ª CCmds)

quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

Guiné 63/74 - P1476: Pensar em Voz Alta (Torcato Mendonça (4): Mulher tua

Luís Graça

Acabei de ler o que o Vítor Junqueira escreveu, sobre uma Mulher que foi sua na Guiné (1).

Confesso que, só depois de ler este texto lindo, compreendi o Vitor Junqueira. Estava enganado. Pensava que ele era diferente… nunca lho disse. Li coisas que ele escreveu e não gostei. Hoje emocionei-me, estou emocionado e turva-se a visão das teclas.

Sabes, senti algo do meu passado a vir, a instalar-se aqui e agora, junto de mim… Nem só de África, sei lá.. Tantas vidas!

É tarde, não quero escrever mais… deixo-me embalar no que, após a leitura, senti…Obrigado Vítor… Não se julgue ninguém de modo precipitado… Uma desculpa.

Um abraço para os dois do,

Torcato Mendonça
Fundão

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Nota de L.G.:

(1) Vd. post de 31 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1475: A chacun, sa putain... Ou Fanta Baldé, a minha puta de estimação (Vitor Junqueira)

terça-feira, 12 de dezembro de 2006

Guiné 63/74 - P1361: Pensar em Voz Alta (Torcato Mendença (3): Os meninos de Candamã, os meninos de África, um dia hão-de ser felizes

Guiné > Zona leste > Sector L1 > Bambadinca > Mansambo > CART 2339 (1968/69) > Candamã > 1969 > Os meninos de Candamã... O Alf Mil Torcato Mendonça e o seu Grupo de Combate estiveram aqui em reforço do sistema de autodefesa da tabanca fula de Candamã, pertencente ao regulado do Corubal. A população balanta e biafada do regulado estava sob controlo do PAIGC, desde o início da guerra, vivendo ao longo da margem direita do Rio Corubal. A população fula sobrevivia e resistia (mal) em meia dúzia de tabancas, pobres, em decadência, dipersas, a leste da estrada Bambadinca-Mansambo-Xitole, nomeadamente depois da contra-ofensiva lançada pelo PAIGC como resposta à grande operação (1300 homens) que foi a Operação Lança Afiada (Março de 1969). Em Candamã, o Torcato Mendonça animou a escola local (LG) (1)...

Foto: © Torcato Mendonça (2006). Direitos reservados.

Luís Graça: abri, passei os olhos e vi os meninos (2)... Os meus meninos não se digladiavam por comida... faziam fila e, quando havia comida… recebiam. Na escola aprendiam, menos letras, mais determinados princípios… Atingia também os pais…Na ginástica brincavam, jogavam… depois iam ao banho e riam, felizes, naqueles breves momentos, os meninos de Candamã, Afiá…e outras tabancas…Poucas... Em Mansambo haviam poucos meninos. Assim se ensinavam regras de higiene – a sarna era endémica, e era tanta a doença… Por vezes uma simples aspirina determinava a cura.

Na primeira selecção [de fotos] não enviei crianças. Eram as principais vítimas. Eles e as mães, por isso o meu trauma de que, parece-me, já te terei falado.

Os meninos cresceram e os seus filhos têm hoje mais fome…fogem da Guiné – onde os Todo-o -Terreno de luxo são da minoria do privilégio. Fogem os menos meninos, os jovens de uma África sofrida, dantes partilhada, esquartejada pelas potências europeias…Hoje os privilegiados, os corruptos, os…os… Tanto sofrimento!!!

Paro, caro Luís…paro… escrevo e o que escrevo nunca terá eco, [pelo contrário será] recebido com sorrisos dos safardanas de um Poder qualquer e dos seus lacaios, sempre ávidos das migalhas que tombam. Como os poderes de desmando são efémeros, adularão, depois, outros senhores…

Um dia os meninos vão sorrir felizes... vão ser felizes os meninos!

Um abraço,

Torcato Mendonça (3)

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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 11 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1167: Fotos falantes (Torcato Mendonça, CART 2339) (4): Candamã, uma tabanca em autodefesa

(2) Vd. post de 5 de Dezembro de 2006> Guiné 63/74 - P1342: Poema: os meninos da Ilha de Luanda (... pensando nos meninos de Bolama, de Chamarra, de Mansambo ou de Saré Ganá) (Luís Graça)

(3) Vd. post anterior > 5 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1340: Pensar em Voz Alta (Torcato Mendonça (3): o meu segundo país

terça-feira, 5 de dezembro de 2006

Guiné 63/74 - P1340: Pensar em Voz Alta (Torcato Mendonça) (2) : o meu segundo país

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Mansambo > Novembro de 2000 (1) > Crianças de Mansambo, à beira da nova estrada... alcatroada. Tal como há 30 e tal anos: a única diferença é que não havia estrada... alcatroada.

No meu tempo (1969/71) e no tempo do Torcato Mendonça (1968/70) não havia população de Mansambo. Apenas existiam, a viver dentro do arame farpado, meia dúzia de famílias, as dos guias e picadores que trabalhavam para as NT... Estes e restos da malta da destroçada CCAÇ 12 ficaram por lá, depois da independência... (LG)


Foto: © Albano Costa (2006). Direitos reservados.

Mensagem do Torcato Mendonça (ex-Alf Mil da CART 2339, Mansambo, 1968/69). Na série Blogoterapia publicam-se textos sobre a nossa tertúlia e o nosso blogue, apresentam-sos novos amigos e camaradas da Guiné. Tem um registo mais intimista. O termo foi usado por mim em Junho de 2005 para dar um título a um post do Torcato Mendonça em que ele terminava nestes termos: "Desculpa este desabafo. Estou mais calmo. Será isto uma terapia?" (2).

Caro Leopoldo Amado:

Quebro uma regra ao responder directamente a um post. Abri o blogue e leio as aventuras de Missirá (3). Continuo e aparece-me outro post. É-me, em parte, dirigido. Mais, pede-me para eu escrever sobre a minha passagem pela Guiné (4). Engano? Os meus escritos são simples, despretensiosos, mas sentidos e procurando relatar a minha guerra. Partindo do princípio que não houve engano, digo-te:

Procurei esquecer aqueles tempos, aquela terra, aquelas gentes. Foi impossível. Felizmente, tenho hoje o Blogue do Luís Graça e Camaradas da Guiné. É o meu segundo País, eu que sou um pouco de vários sítios. Não fui santo nem diabo. Comandei Homens, meus irmãos de armas, europeus ou africanos. Para mim só há uma espécie – A Humana.

Escrevo quando me dá na bolha e ao correr da pena ou tecla. De quando em vez, mando algo ao Luís Graça. Por vezes penso que mando e aí fica.

Falas em miúdos (4). Gostava muito deles, o riso nas escolas que inventávamos, a ginástica e o banho com Life Boy ? – um sabonete - , o rancho partilhado… e a beleza dos bebés… Os Futa-Fulas …lindos…

Passou, meu caro e nem tudo foi mau. A nostalgia, a lentidão no bater da tecla e, por que não, um apertozito e uma humidade no olho…

Caro Luís, perdoa o quebrar da regra. Coisas de velho militar duro que o tempo amoleceu… Ainda bem…

Caro Leopoldo, conta a História dos nossos Povos… Gosto de história e, se não a conhecermos, não sabemos quem somos!

Um abraço,

Torcato Mendonça
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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 5 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXIII: Mansambo revisitado (Novembro de 2000) (Albano Costa)

(2) Vd. post de 1 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1331: Blogoterapia (9): Quando a Pátria não é Mátria para ti (João Bonifácio, Canadá, antigo vagomestre da CCAÇ 2402)

(3) Vd. post de 30 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1329: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (22): A memória de elefante do 126, o Queta Baldé

(4) Vd. posts de:

30 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1328: Blogoterapia (8): É hora de pensar no nosso primeiro... blook (Leopoldo Amado)

25 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P907: Pensar em Voz Alta (Torcato Mendonça) (1): A nossa blogoterapia

domingo, 25 de junho de 2006

Guiné 63/74 - P907: Pensar em Voz Alta (Torcato Mendonça) (1): A nossa blogoterapia

Mensagem do Torcato Mendonça (ex-Alf Mil da CART 2339, Mansambo, 1968/69), um algarvio qu foi parar à terra da melhor cereja do mundo, o Fundão, e que há dias teve a gentileza de fazer uma visita de cortesia à minha irmã mais nova, Ana Isabel Henriques, que é enfermeira especialista no centro de saúde local... Torcato: obrigado pela parte que me toca. Apreciei muito o texto sobre o Malan Mané que, como sabes, foi gravemente ferido a meu lado. Só hoje publiquei as tuas "duas estórias para duas fotos" (o texto é teu, as fotos do Cardoso e o correio foi o Carlos Marques dos Santos). Mesmo com atraso, cá chegou ao meu SPM. Espero que continues a blogar, que é uma boa terapia. Por mor de todos nós, como se diz no Norte. Entretanto, cuida-me bem desse coração... (LG)

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Caro Luís

Há algum tempo que estou na Guiné. Não enlouqueci. Só que li o que escrevestes e, principalmente o que o Beja Santos escreveu. É duro, sabes - um voltar ao passado em segundos ou minutos, eu nem sei. Lastimo o falecimento do David Payne (1); lastimo todas as vitimas daquela brutalidade. Até que ponto não fui também corresponsável. Até que ponto não estive mais com Marte e menos com a razão?

Hoje estive na Assembleia Municipal. Não trocaram ideias. Preferiram insultos. Quando cheguei a casa tentei jantar mas desisti.Telefonei aos filhos. Depois abri a Televisão, liguei o portátil e fui ao Blogue. Parei no tempo… ou fui até lá… quase que senti os cheiros!

Quando estou tenso a música clássica, em som alto, acalma-me. Hoje é tarde para o fazer. Desde sempre que a música, mesmo no rádio, me acompanha. Ici rádio Abdijan…. Só que era música africana. Gostas de Bach. Sei que o Beja Santos era melómano e ficou sem os discos. Nunca falámos nisso. Talvez a guerra fosse mais importante…Talvez!

Desculpa este desabafo. Estou mais calmo. Será isto uma terapia?

Um abraço,

Torcato Mendonça

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Nota de L.G.:

(1) Alferes Mil médico, da CCS do BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70). Era psiquiatra. Referido pelo Beja Santos no seu último post, de 24 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P904: SPM 3778 ou estórias de Missirá (3): carta a Alcino Barbosa, com muita intranquilidade (Beja Santos)

(...) "Não sei se deva contar como foi a nossa retirada até Finete, para vir buscar reforços. Os soldados válidos ficaram a tomar conta dos feridos. Retirei com crianças, com uma granada em cada mão. Em Bambadinca, encontrei a solidariedade do costume, regressei a Finete com o médico, David Payne (já falecido) e com o Alferes Reis, o sapador (nunca se recompôs da guerra, aparece-me no meu trabalho de vez em quando, sofre da mania da perseguição) e no dia seguinte, após a vossa evacuação por helicóptero, regressei a Missirá. Era minha intenção escrever-te, e depois visitar-te no Hospital Militar" (...).