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segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13699: História do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74) (António Duarte): Parte XIII: fevereiro de 1973: (i) a população sob nosso controlo não gostava da "psícola"; corruptela de "ação psicológica"; (ii) operação de envergadura na península da Ponta do Inglês, com 5 mortos confirmados do IN e 7 feridos da CCAÇ 12, todos da secção do fur mil Duarte


Guiné > Zona Leste > Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > A helievacuação de feridos em Madina Colhido, no regresso ao Xime ... É uma imagem que se repetia  ao longo dos anos, sempre ou quase sempre que havia  operações à península da Ponta do Inglês. Desde a sua formação, em julho de 1969 e até à sua extinção, em agosto de 1974,.  a CCAÇ 12, subunidade de intervenção, esteve  às ordens de pelo menos 3 batalhões sediados em Bambadiinca: BCAÇ 2852 (1968/70), BART 2917 (1970/72) e BART 3873 (1973/74)... Depois de dar e  levar muita "porrada", a CCAÇ 12 foi guarnecer o aquartelamento do  Xime como subunidade de quadrícula, em meados de 1973, quando a CART 3494  foi colocada em Mansambo, subsetor que aparentemente se tornou-se, nesta altura (1972/74)  mais calmo do que no meu tempo (1969/71) e no tempo do Torcato Mendonça e do Carlos Marques dos Santos (CART 2339, 1968/69).

Foto: © Arlindo T. Roda (2010). Todos os direitos reservados [Edição: LG]



1. Continuação da publicação da história do BART 3873(Bambadinca, 1972/74), a partir de cópia digitalizada da história da unidade, em formato pdf, gentilmente disponibilizada pelo António Duarte.

[António Duarte, ex-fur mil da CART 3493, companhia do BART 3873, que esteve em Mansambo, Fá Mandinga, Cobumba e Bissau, 1972/74; foi voluntário para a CCAÇ 12 (em 1973/74); economista, bancário reformado, foto atual à esquerda].
O grande destaque do mês de fevereiro de 1973, a seguir à  morte de Amíolcar Cabarl (1924-1973)   vai para:
(i) É a a época das queimadas, feitas em grandes extensões tanto pelas NT como pelo IN;

(ii) A população sob nosso controlo não gosta da expressão "psicola"; corruptela de "ação psucológica";

(iii) Na Op Bate Duro (de 25, às 5h30, a 27 de fevereiro de 1973, às 15h00), no susetoro do Xime (Ponta Varela / Ponta do Inglês / Ponta João Silva / Poidom), envolvendo forças da CCAÇ 12 (3 gr Comb), CART 3494 (3 Gr Comb) e ainda os GEMIL 309 e 310 (Enxalé),  o IN soferu 5 mortos confirmados; foi, semdúvia, um  dos palcos, a península da Ponta do Inglês, um dos palcos  mais sangrentos da história da guerra colonial (ou da guerra de libertação) no TO da Guiné;

(iv) Nesta operação de patrulhamento ofensivo,  emboscadas e montagem de armadilhas, a CCAÇ 12 teve 7 feridos, todos da secção do António Duarte  (que era a da bazuca); o Duarte não participou nesta operação  por estar de férias em Bissau, mas deixou esta nota, a vermelho, na cópia do exemplar  hsitória da unidade que nos mandou,

Fevereiro de 1973: operação de envergadura na região da Ponta do Inglês / Poindom, com 5 mortos confirmados do IN e 7 feridos da CCAÇ 12.





















(Continua)



Guiné > Zona Leste > Croquis do Setor L1 (Bambadinca), que coincidia em parte com a antiga Zona 7 do PAIGC (margem direita do Rio Corubal) > 1969/71 (vd. Sinais e legendas). 

[Veja-se a localização do Ximer, Ponta Varela, Poidom  e Ponta Lu+is, topónimos acima referidos. No Arquivo Amílcar Caberal, Ponta do Inglês e  Ponta Luís Dias são sempre referiidas como Gã Dias e Gã Carnês ou Garnes.Grande parte da população (balanta) que vivia na Ponta do Inglês e  na Ponta Luís Dias tinha fugido de Samba Silate, perto de Nahbijões,  no início da guerra] (LG)

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7223: Notas de leitura (165): Crónica da Libertação, de Luís Cabral (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Novembro de 2010:

Queridos amigos,

Trata-se de um livro com muita informação, é de leitura obrigatória para quem quer juntar as peças do puzzle, ter as versões das duas forças em presença.

Considero que foi uma feliz oportunidade ler primeiro o Hélio Felgas, a seguir o Luís Cabral e estar agora a acabar a história dos fuzileiros na Guiné. Há muitas peças que encaixam, outras continuam a pedir múltiplos esclarecimentos.
 
O fundamental é deixar a informação inventariada, os historiadores, de posse de muita coisa que ora não está esclarecida (são indispensáveis apanhar relatos orais de alguns dos protagonistas ainda vivos, por exemplo) poderão aperfeiçoar o quadro e interpretá-lo, em bases científicas.

Um abraço do
Mário



“Crónica da Libertação” (2), por Luís Cabral

Beja Santos

Estamos chegados a Agosto de 1959. Luís Cabral escreve:

 “A situação das equipagens das lanchas e outras embarcações das empresas coloniais era, em 1959, bastante deplorável. Os salários variavam entre 150 e 300 escudos. O capitão da embarcação ganhava ainda menos do que o motorista, pois este em geral sabia ler e gozava do estatuto de “civilizado”. Os restantes membros da tripulação, sendo considerados “indígenas”, tinham de contentar-se com um salário de miséria, sem quaisquer regalias”. 

O descontentamento organizou-se, na manhã de 3 de Agosto, centenas de homens estacionaram no cais do Pijiguiti, estavam em greve, uma greve que escapara totalmente ao controlo das autoridades. Estas lançaram o ultimato: se à tarde os trabalhadores não retomassem o trabalho haveria um correctivo exemplar. Os trabalhadores portuários não vergaram, fecharam o portão de acesso ao cais, armaram-se de paus e pedaços de ferro. A reacção da polícia e dos soldados foi brutal, abriram fogo, indiscriminadamente. 

A partir daí, escreveram-se rios de tinta acerca do número de mortos. De acordo com alguns relatos, houve cerca de 50 mortos e muitas dezenas de feridos. (Tem o maior interesse o relato então elaborado pelo Comando da Defesa Marítima , e publicado no livro sobre os fuzileiros na Guiné por Luis Sanches de Baêna, de que iremos fazer a recensão.).

Muito provavelmente, a agitação foi liderada por Rafael Barbosa. A seguir, a polícia política iniciou a caça às bruxas: era imperioso encontrar a fonte da agitação. O grupo formador do PAIGC procura reunir-se e, em concreto, puseram fora do país um dos principais suspeitos, Carlos Correia. 

Mais tarde, Amílcar Cabral veio a Bissau, encontrou-se com Rafael Barbosa e tomou-se a decisão de acelerar a selecção dos jovens mais capazes para receberem no estrangeiro preparação para a luta da libertação. Amílcar, a seguir vai a Paris encontrar-se com os dirigentes nacionalistas das outras colónias e segue para Tunes onde se iria realizar uma importante conferência pan-africana. 

É por essa época que se dissolveu o Movimento Anticolonialista e que se criou a Frente Revolucionária Africana para a Independência Nacional das Colónias Portuguesas. Luís Cabral e Elysée Turpin encontraram-se meses depois com Amílcar em Dakar. Vem aqui uma observação ácida, generalista:

 “Muitos dos nossos compatriotas radicados no exterior há muitos anos, e até descendentes seus que nunca conheceram os nossos países, viam-se já como os grandes libertadores e dirigentes da Guiné e de Cabo Verde, sem sequer abandonarem a sua vida mais ou menos estável de emigrantes, em Dakar ou Conacri, ou mesmo na Europa”.

Luís Cabral decide partir para o exílio, reúne-se pela última vez em Bissau com os seus camaradas e dissimuladamente parte para o Senegal, chega a Dakar. Uma avalancha de jovens vem reunir-se, ele refere os seus nomes: Vitor Saúde Maria, Sanazinho e Dembazinho Mané, Samba Lamine Mané, Gil Fernandes, Arafan Mané e José Turé. 

Em Conacri, Amílcar começara a organizar o “Lar do Combatente”, onde eram instalados os jovens saídos do país. Carlos Correia, Luciano N’Dao, Mussa Fati e outros juntaram-se a esta iniciativa. Apareceram mais tarde Chico Mendes, Nino Vieira, Armindo Monteiro, entre muitos outros. 

Para ganhar a vida, Amílcar era conselheiro técnico no Ministério de Economia Rural, da Guiné Conacri. Segundo Luís Cabral, Amílcar procedeu a estudos muito importantes mas as autoridades não deram execução às suas propostas. Em Conacri, entretanto, começaram intrigas de outros compatriotas, o racismo veio à tona isto enquanto acreditados em Conacri concediam bolsas de estudo a esses “pseudomovimentos de libertação”.

Em Conacri estava igualmente instalada a base do MPLA, tendo à frente o seu presidente de então, Mário de Andrade. Amílcar Cabral faz a sua primeira viagem à China que, para o irmão, marcou uma nova etapa da vida do partido: a seguir a esta visita, seguiram para a China vários jovens para receberem preparação militar. Por essa época também a sigla PAI mudou para PAIGC (o PAI era um partido senegalês que se opunha a Senghor). Após o trabalho de agitação, começou a luta armada. Os dados revelados têm incontestavelmente uma grande importância histórica.

Após o encontro de Dakar com o grupo de Rafael Barbosa, consagrara-se a existência de uma só organização de luta. Em Bissau, continuava o recrutamento de jovens que iriam receber formação na Academia Militar de Pequim. 

Em de Dezembro de 1960 era publicado o primeiro número do jornal “Libertação” órgão de libertação do PAIGC. Em 4 de Fevereiro de 1961 eclode a guerra em Angola. A primeira fornada de quadros já está na China, alguns deles virão a ser comandantes de guerrilha e até dirigente eminentes: Domingos Ramos, Osvaldo Vieira, Constantino Vieira, Manuel Saturnino Costa, Chico Mendes, Nino Vieira entre outros. 

O trabalho acumula-se na vida de Luís Cabral, é decidido que ele deve deixar Dakar e ir para Conacri, junta-se a Amílcar e Aristides Pereira. Em Abril de 1961, em Casablanca, é criada a Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas (CONCP). Continuam a chegar jovens, novos quadros do PAIGC. Luís Cabral fala em Corca Só, que chegará a comandante da região de Madina-Belel, quando cheguei a Missirá ouvi falar no seu nome, mais tarde veio a notícia de que teria sido morto num bombardeamento aéreo. Uma nova fornada de quadros parte para a Checoslováquia.

No final de 1961, um conjunto de quadros preparados para a guerrilha e com noções teóricas ministradas na China avançam para a luta, partem para a mobilização das populações. Luís Cabral escreve:

 “Nino Vieira dirigiu o grupo do Sul, com os sectores de Quitafine, Cubucara, Unal, Como; Rui Djassi, o do Centro-Sul que incluía Tite, Cubiseco, Buba e N’Djassani; Osvaldo Vieira, Chico Mendes, Loló e Saturnino partiram para o Norte, devendo instalar-se em Morés. A área de Xitoli, Bafatá, foi confiada à responsabilidade de Domingos Ramos; Vitorino Costa, tendo Pascoal como adjunto, seguiu para o Gabu. Luciano N’Dao, Constantino Teixeira e Pedro Ramos ficaram ligados a Bissau a Zona Zero”. 

É o trabalho principiante, vão armados de pistolas, levam na bagagem uma fotografia de Amílcar, uma pequena bandeira, o emblema do partido. Começam os insucessos e os sucessos. Vitorino Costa é obrigado a retirar apressadamente. Nino encontrou no Sul uma população bastante receptiva. A população balanta ou nalu adere com facilidade. Em finais de 60, o grupo agitador da região de Bissorã é capturado. Amílcar Cabral tenta negociar com os manjacos liderados por François Mendy, que actuavam na região senegalesa. 

Em Outubro de 1961, Amílcar assinou uma carta aberta ao Governo português. No início de 1962, a PIDE desmantelou a organização do partido em Bissau. No Morés, Chico Mendes e os seus companheiros começam por ter uma vida difícil, depois chegam as adesões da população. Na região de Quínara, a situação também se tornou difícil, Vitorino Costa foi capturado e morto. Em agosto de 1962, a FRELIMO começou uma nova etapa da luta de libertação em Moçambique. 

E muito material de guerra concedido pelo Governo marroquino começa a chegar a Conacri.  Inicia-se um período de grandes tensões, as autoridades guineenses começam por desconfiar se aquele material não irá servir para um golpe de Estado no país. Alguns dirigentes do PAIGC são presos. Amílcar Cabral esclarece às autoridades, o armamento passa a entrar pela fronteira Sul, sem dificuldades. Pistolas-metralhadoras, muitas munições são descarregadas na região Sul. 

Na região do Xime, a base principal da guerrilha é o Fiofioli, junto do Corubal. Domingos Ramos e Abdulai Barry começam a ter sucesso na mobilização. Luís Cabral escreve:

"Samba Silate é uma pequena aldeia da área de Bambadinca, perto da estrada do Xime. A diferença entre esta tabanca e as outras vizinhas vem do facto de ter sido ali instalada uma representação da missão católica, com todas as vantagens sociais que ela trouxe à população local. Os jovens de Samba Silate manifestaram um grande interesse pela luta, acabando por se juntar na sua grande maioria, aos guerrilheiros do mato”. 

Mas mesmo aqui as dificuldades subsistiram, os guerrilheiros foram obrigados a retirar para mais longe, junto do Corubal, aguardando armas. Os jovens rebeldes de Samba Silate voltaram à sua tabanca, foram denunciados, conseguiram escapar por terem sido avisados pelo padre António Grillo que denunciou a violência cometida pelos agentes enviados à tabanca. Segundo Cabral, muitos desses jovens acabaram por sucumbir, vítimas de torturas, em Bambadinca e Bafatá.

(Continua)
__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 3 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7216: Notas de leitura (164): Crónica da Libertação, de Luís Cabral (1) (Mário Beja Santos)

domingo, 2 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6292: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69/ Mai 71) (10): Samba Silate


  1. Mensagem de Arsénio Puim, com data de 30 de Abril último: 

Luis:  Envio um novo trabalho, ao teu critério.
Um abraço.
Arsénio Puim 


RECORDANDO... (10):  SAMBA SILATE (*)


Um dos lugares tristemente célebres da guerra da Guiné, que eu tive oportunidade de visitar nos princípios de 1971, chama-se Samba Silate. Fica a poucos quilómetros de Amedalai, para o lado do Geba, entre Bambadinca e o Xime. Na continuação da tabanca estende-se, até ao rio, uma grande bolanha, tida como das melhores da Guiné. Para lá do Geba, fica Mato Cão e Madina.

Dantes, Samba Silate foi uma grande tabanca balanta e um importante centro de produção de arroz. Mas na altura em que lá estive, era  uma terra desabitada e completamente inculta. Dizia-se que qualquer tentativa dos Fulas para o seu aproveitamento seria gorada pelos Balantas.

Neste chão balanta, o Pe. António Grillo, missionário italiano, desenvolveu uma actividade pastoral florescente, reconhecida por muitas pessoas. Lá estava ainda, a testemunhá-lo,  uma grande cruz de cimento erguida no local, assim como uma campa, também de cimento, perto da cruz, com a inscrição de Mateus Iala, balanta, que havia falecido em 1958, apenas um mês depois de ser baptizado.

Ao rebentar a guerra houve um forte movimento de adesão e apoio, em Samba Silate, à guerrilha. A tropa, porém, acudiu atacando e matando indiscriminadamente. Mancaman, do Xime, de quem já falei anteriormente (**), disse-me que só em Samba Silate  morreram mil pessoas (***), incluindo mulheres e gente muito nova. Os que escaparam, uns foram para o mato, outros para Nhabijães, Enxalé, etc..

Pe. António viu-se implicado nos acontecimentos e, depois de preso, foi expulso, sem qualquer julgamento, para a Itália, donde não voltou mais. Constou que, mais tarde, Spínola autorizou o seu regresso, mas que a PIDE não o permitiu.

Infelizmente, os massacres nesta zona central da Guiné, perpetrados por tropas portuguesas nos começos da guerra, não se cingiram a Samba Silate. Mancaman relata  acções de extermínio também em Bafatá, Mansoa, Bissorã e Bambadinca. «Mais de 10.000 mortos. A Guiné quase ficou sem gente», referiu.

Em relação a Bambadinca, ouvi, muito casualmente, um outro nativo falar de  acções de extermínio praticadas pelas nossas tropas. Sem referir nomes, não deixou, porém, de mencionar a naturalidade e o número militar (ou um número por que era conhecido, não sei bem)  de um soldado que costumava abrir as covas das pessoas antes de as matar.

Com tristeza e espanto, constatei ainda que a palavra que denomina os habitantes naturais da minha região não era benquista em Bambadinca e incutia mesmo um sentimento de horror, pela associação que as pessoas ainda faziam de acções desta natureza a antigos militares identificados como tal.

Perante tudo isto, não posso deixar de perguntar: onde estavam, então, os capelães militares, vinculados ao Exército com uma missão de Igreja? Porventura, não existiriam ainda nessa altura e nessas zonas?

Também sei, e não podemos ignorar, que os guerrilheiros do PAIGC  cometeram igualmente acções de extermínio em situações diversas. Tenho de forma especial em mente, neste momento, as execuções sumárias de combatentes e outros nativos que estiveram nesta guerra ao lado de Portugal, designadamente elementos dos Comandos de Fá, cometidas em Bambadinca (e outras localidades) já depois do regresso das tropas portuguesas.

É triste que Portugal tenha abandonado os seus aliados africanos à sua sorte, a qual seria previsível em face do lado da guerra por que haviam optado e os moldes por vezes desregrados e sanguinários das suas acções armadas, publicamente comentados, para além da conjuntura conturbada e dificilmente controlável que se seguiria.

Intervim uma vez, na qualidade de capelão, relativamente aos Comandos africanos, por causa do lamentável e bem conhecido caso da cabeça dum homem que foi cortada (desconheço as circunstâncias do acto, embora ouvisse mais que uma versão), numa operação que esta Companhia realizou  para os lados de Madina em princípios de Outubro  de 1970. Trazida para Bambadinca e exposta, como um troféu - diga-se, com escândalo da população civil e dos nossos militares - houve um soldado português que fotografou esta cena macabra, unicamente com intuitos comerciais.

As fotos, que circularam no Quartel até ao dia em que foram superiormente mandadas recolher com as respectivas chapas – de facto,  seriam uma exposição inconveniente para a causa portuguesa se chegassem ao exterior - mostravam um homem negro ainda novo, magro, de cabelo curto e crespo, com os olhos semiabertos. Pela boca fora introduzido um lenço que saía num buraco na nuca, o qual, atado nas pontas, servia de alça para o seu transporte na mão. O autor desta acção foi um furriel felupe [, João Uloma, mais tarde graduado em alferes, e também executado em 1975, pelo PAIGC] que – dizia-se - costumava cortar e guardar as cabeças das pessoas que matava em operações militares, por razões de crenças étnicas.

Nesse dia, o referido furriel aumentava a sua colecção de 27 crânios para 28.

Como muitos companheiros militares, e na qualidade de capelão, mostrei de imediato a minha repulsa por esta acção ignóbil. E, bem poucos dias depois, quando aquela Companhia se encontrava na parada de Bambadinca, achei que devia abordar o assunto ao comandante da mesma, lamentando que tais actos pudessem ser praticados num exército que tem obrigação de ser civilizado. O graduado, referindo este ser um costume tradicional da etnia felupe, remeteu-me para a nossa acção durante 400 anos na Guiné.

Em relação aos crimes de guerra, onde quer e quem quer que sejam os seus autores,  estou totalmente de acordo com aqueles que, sem admitir a pena de morte, defendem que no mundo civilizado os homens julgam-se nos Tribunais e, através destes, os criminosos são condenados.

Arsénio Puim


2. Quem era (ou é) o Padre António Grillo ?


António Grillo é um missionário italiano, do PIME (Pontifício Instituto para as Missões Exteriores). Nasceu em 1925, em Acerenza. 

Recorro aqui ao Sítio de Paolo Grappasonni que, em finais de 1988, fez uma visita às missões italianas na Guiné-Bissau e evoca a figura do padre Anmtónio Grillo. Reproduzem-se excertos do texto "Notas de viagem à Guiné-Bissau", com a respectiva tradução em português

  Padre Antonio Grillo, di Acerenza, ha vissuto per diversi anni e con alterne vicende tra i Balanta di Bambadinca. Ha pubblicato un opuscolo nel maggio 1988 dal titolo: “I miei Balantas” dal quale traggo le sue esperienze più significative. 

O Padre Antonio Grillo,  de Acerenza, viveu durante vários anos e em diferentes períodos entre os Balanta de Bambadinca. Publicou um opúsculo em Maio de 1988 intitulada: "Os Meus Balantas" de que retiro algumas das suas experiências mais significativas.

Aveva 26 anni padre Antonio Grillo quando, il 12 settembre 1951, partì dal PIME di Milano insieme a tre missionari su una jeep americana alla volta del Portogallo e della Guinea in Africa.  Faceva parte della seconda spedizione missionaria del PIME in Guinea. Bambadinca è il distretto missionario al quale padre Grillo viene inviato insieme a padre Biasutti il 31 gennaio 1952. Dopo un anno di attesa per avere il visto dal governo portoghese, e dopo un viaggio avventuroso su una jeep e via mare, finalmente possono cominciare. 

Tinha 26 anos quando a, 12 de setembro de 1951, partiu do PIME de Milão, com três missionários num jipe americano,  a caminho de Portugal e depois da Guiné, em África.  Fazia parte da segunda expedição missionário do PIME à Guiné. Bambadinca é a região missionária para a qual o padre Grillo é enviado juntamente com o  padre Biasutti, em 31 de Janeiro de 1952. Depois um ano de espera para obter visto do Governo Português, e depois de uma viagem aventurosa por terra e mar, finalmente podiam começar.

“Purtroppo - scrive padre Grillo - abbiamo dovuto accettare di fissare la nostra residenza a Bambadinca, villaggio dove erano anche le autorità amministrative portoghesi, perché queste volevano tenerci sotto il loro continuo controllo. Già a quei tempi non permettevano facilmente neppure a noi missionari che ci addentrassimo nella foresta per entrare in contatto con le varie tribù. Avremmo preferito un grosso agglomerato abitato dai Balantas come Sambasilate perché questi erano animisti mentre la quasi totalità degli abitanti di Bambadinca era mussulmana”.
In lingua mandinga “Bamba” significa “coccodrillo”, “Dinga” significa “tana”: e veramente negli anni ‘50 il vicino fiume Geba era pieno di coccodrilli. 

"Infelizmente - escreve o padre Grillo - nós tivemos que aceitar estabelecer a nossa residência em Bambadinca, a povoação onde estavam também as autoridades administrativas portuguesas, porque eles queriam manter-nos sob o seu controle constante. Já naquele tempo não nos permitiam com facilidade, mesmo a nós, missionários,  que entrassemos na floresta para contactar  as várias tribos. Teríamos preferido uma grande aglomerado populacional de Balantas como Samba Silate porque estes eram animistas, enquanto quase todos os habitantes de Bambadinca eram muçulmanos. "

Em língua madinga, "Bamba" significa "crocodilo", "Dinga" significa "cova": e na verdade, nos anos 50 o vizinho rio Geba estava cheio de crocodilos.

Il villaggio di Sambasilate nel 1955 contava già 1750 abitanti in maggioranza della etnia Balanta, con pochi Papeis e alcuni musulmani. Sambasilate, che vuol dire “risaia”, fu la prima stazione missionaria del distretto di Bambadinca. Il motivo che spinse soprattutto padre Grillo verso questo villaggio fu proprio il numero dei suoi abitanti che, se convertiti, potevano attirare i villaggi minori
.

A aldeia de Samba Silate, em 1955, já tinha 1750 habitantes, na sua maioria do grupo étnico Balanta, com poucos Papéis e alguns muçulmanos. Samba Silate, que significa "campo de arroz", foi a primeira estação missionária na zona de Bambadinca. O motivo que levou o padre Grillo a optar por esta aldeia, foi apenas o número dos seus habitantes que, se se convertessem, poderiam atrair as outras aldeias mais aldeias. (...)

http://www.webalice.it/paolo.grappasonni/Guinea_Bissau:_appunti_da_un_viaggio.html

2.2. De um outro site, italiano, sobre os 150 anos do PIME (Pierio Gheddo - PIME 1850-2000: 150 Anni dei Missione)  retiro a seguinte informação sobre o conflito do Padre Grilo com as autoridades portugueses, em 1963, bem sobre as crescentes dificuldades dos missionários italianos na sequência da escalada do conflito militar:

(...) Pime in prima linea: l’arresto di padre Grillo (1963)

Il superiore generale p. Augusto Lombardi visita la Guinea (10 dicembre 1959 — 26 febbraio 1960) e richiama i missionari ad impegnarsi ancor più nell’aiutare il popolo guineano, evitando però accuratamente ogni gesto o giudizio politico: l’imperativo è di restare sul posto senza farsi mandare via: proprio ora i missionari stranieri possono giocare un ruolo importante a difesa dell’uomo.


(...) O PIME debaixo de fogo: a prisão do padre Grillo (1963)

O Superior Geral, padre Augusto Lombardi visita a Guiné (10 de Dezembro de 1959-26 fevereiro 1960), e incita os missionários a empenharem-se mais para ajudar o povo da Guiné, mas evitando cuidadosamente qualquer gesto ou opinião política: o imperativo é permanecer no local sem se fazerem expular: os missionários estrangeiros podiam desempenhar um papel importante na defesa do homem.

All’inizio degli anni sessanta la Guinea entra decisamente nel clima di guerra. Prima vittima è il p. Antonio Grillo (22), apostolo dei balanta a Bambadinca, per un’accusa risultata poi del tutto falsa (amico di un capo guerrigliero). 

No início dos anos sessenta, a Guiné entra significativamente em  clima de guerra. A primeira vítima é a padre Antonio Grillo, o apóstolo dos Balantas em Bambadinca, sob a acusação, que se soube mais tarde ser completamente falsa, de ser amigo de um líder da guerrilha.

Arrestato dalla polizia politica portoghese (la Pide) il 23 febbraio 1963, incarcerato prima a Bissau e poi a Lisbona, viene liberato il 4 luglio come atto di omaggio del Portogallo al nuovo Pontefice Paolo VI.

Detido pela polícia política portuguesa (Pide), a 23 fevereiro de 1963, encarcerado primeiro em Bissau e depois em Lisboa, acabou por ser libertado em 4 de julho em homenagem de Portugal, ao novo pontífice, o Papa Paulo VI.

Le missioni del Pime, nelle regioni più periferiche, sono in prima linea. Quella di Suzana è occupata dai militari portoghesi, i missionari debbono ritirarsi per non essere compromessi agli occhi dei locali (visitano i cristiani ogni mese partendo da Bafatà); Catiò è al centro della guerriglia perché vicina alla Guinea- Conakry da cui venivano armi e guerriglieri: i padri non possono più visitare i villaggi senza permesso della polizia e in città sono sottoposti a stretti controlli; Farim rimane isolata per lunghi mesi; le strade sono interrotte e si percorrono solo con i convogli militari; attacchi notturni dei partigiani e ritorsioni dell’esercito con villaggi bruciati, torture, massacri.

As missões do PIME nas regiões mais remotas, estão na primeira linha da frente. A de Suzana é ocupada pelo exército Português, os missionários têm que retirar-se para evitar ficar comprometidos aos olhos da população local (os cristãos passam a ser  visitados todos so meses a partir de Bafatá). Catió, por sua vez, está no centro da guerrilha por causa de sua proximidade com a Guiné-Conacri, de onde vêm as armas e os guerrilheiros: os padres já não podem visitar as aldeias sem a permissão da polícia e na cidade estão sujeitos a controlos rigorosos. Farim, por seu lado, permanece isolada durante longos meses, as estradas estão cortadas e só se pode viajar em colunas militares;  ataques nocturnos dos guerrilheiros e represálias do Exército, com incêndios de aldeias, tortura, massacres.

Il 10 giugno 1963 un nuovo prefetto apostolico: mons. João Ferreira, giovane entusiasta e con bei progetti, ma purtroppo resiste due anni e mezzo al clima della Guinea: ritorna in Portogallo nell’agosto 1965. Il suo successore, mons. Amãndio Neto, è anche lui su una linea moderatamente innovativa: lascia lavorare i missionari, difendendoli sempre dai sospetti dei militari e della polizia politica portoghese. 

Em 10 de junho de 1963 um novo Prefeito Apostólico: Monsenhor  João Ferreira, jovem,  entusiasta e com bons projetos, mas infelizmente resistiu apenas dois anos e meio ao clima da Guiné: Volta a Portugal em Agosto de 1965. O seu sucessor, Mons. Amândio Neto, também está numa linha moderadamente inovadora: deixar trabalhar os missionários, defendendo-os sempre a suspeita dos militares e da Pide. (...)

2.3. Recentemente, no início do ano, o Padre António Griillo  (agora com perto de 85 anos, vd. foto à direita, com a devida vénia ao blogue ) voltou a Bambadinca, com uma delegação da sua diocese de Acerenza para inaugurar uma escola a que foi dado o nosso nome... Voltou a Samba Silate, aos seus balantas. Foi recebido com grande entusiasmo, alegria e espírito ecuménico.

3. Comentário de L.G.:


É doloroso para a nossa memória, mas não podemos ignorar, esquecer, branquear, desculpar o que se terá passado em Samba Silate (e noutros locais do CTIG)... 1961, 1962, 1963... foram anos de chumbo... Não sabemos exactamente qual foi o envolvimento dos militares (****)... A Pide costuma ficar com o odioso (bem como a polícia administrativa local que fazia o "trabalho sujo")... Mas  a tropa e as autoridades administrativas  também não  ficam bem na fotografia...

Não posso quem quero generalizar, prefiro que apareçam relatos,  documentados,  circunstanciais, com datas e factos, sobre violência exercida tanto pelas NT como pelo PAIGC (ou a FLING, em 1961) sob as populações indefesas, ou sob prisioneiros... Em 1969, seis anos depois, os meus soldados da CCAÇ 12 falavam-me destes acontecimentos, com naturalidade... E eles eram insuspeitos, eram fulas, nossos aliados... Samba Silate, Poindon: são dois topónimos da Guiné que ainda hoje não esqueço e que me incomodam...

_______________

Notas de L.G.:


(***) Estes números, baseados na memória oral da população local, têm que ser lidos com reserva... Em 1955, segundo o Padre Grillo, Samba Silate tinha 1750 habitantes, quase todos de etnia balanta.  

Na história do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), HU-Cap II, p. 19, pode ler-se o seguinte Samba Silate, e a propósito dos balantas:

"Julgamos que o único modo de conseguir retirar ao controlo IN um substancial número de Balantas será criar condições de segurança nas ricas bolanhas que se encontram abandonadas; de entre todas essas, ressalta a de Samba Silate em virtude de ser uma bolanha rioca e muito grande, econtrar-se completamente deserta, ser a sua população recenseada antes do início do terrorismo superior a 1200 pessoas, saber-se que os seus antigos ocupantes se encontrarem sobre controlo IN, na área de Incala [, será a mesma, a da região de Bedanda ?, se sim, ficava claramente  fora do sector L1...], e desejarem para ali voltar"

Sobre o alegado massacre de Samba Silate, em 1963, só temos o testemunho de Alberto Nascimento (ex-sold condutor auto, CCAÇ 84, que esteve no CTIG entre 6/4/61 e 9/4/63, tendo o seu pelotão estado em Bambadinca justamente na altura em que foi preso o padre Grillo, entre Novembro de 1962 e 7 ou 8 de Abril de 1963, Bambadinca, às ordens de Bafatá)., e conversas minhas com alguns soldados da CCAÇ 12, entre eles o Abibo Jau, que seria fuzilado pelo PAIGC em 1975, juntamente com o Cap Comando Graduado Jamanca (e que já reproduzi na I Série do Blogue).

Recorde-se o que o Alberto Nascimento (que era um simples soldado condutor auto) escreveu:

(...) Sem conseguir precisar o mês,  um dia soubemos que a PIDE estava em Bambadinca  [,  sabemos agora que foi em 23 de Fevereiro de 1963],  para deter o padre António Grillo, italiano da Ordem Franciscana [, ou melhor, missionário do PIME,] acusado - não sabíamos se por denúncia se por investigação - de colaborar, proteger, e fornecer alimentos a elementos do PAIGC, a partir de Samba Silate.

Este episódio motivou a intervenção militar do Comando de Bafatá (****) com uma força equipada com as já na altura obsoletas auto-metralhadoras e lança-chamas. Essa força foi reforçada em Bambadinca com grande parte dos efectivos aí destacados [ , um pelotão da CCAÇ 84, pelo mneos,] e seguiu para Samba Silate.

Contar com pormenor o que se passou no decorrer da operação é impossível, já que fui colocado num posto de onde só podia abarcar uma pequena parte da povoação, que ocupava uma área enorme, mas o constante matraquear das auto-metralhadoras e G3 deixavam antever um morticínio.

Quando a meio da tarde o Comando deu por terminada a operação é que fui, pelo caminho, vendo a destruição provocada pelos lança-chamas, auto-metralhadoras e G3. Samba Silate estava, na sua maior parte, destruída. Num largo da povoação estavam concentrados um grande número de prisioneiros, um dos quais, talvez movido pelo desespero e terror, intentou a fuga, tendo sido abatido. Os outros foram divididos entre Bafatá e Bambadinca, de onde poucos ou nenhuns saíram.

Poindom foi o outro alvo de uma operação militar de Bafatá e Bambadinca, com o apoio da força aérea. O avanço militar terrestre fez-se pela bolanha enquanto os aviões despejavam bombas e rockets sobre a povoação e a mata que a antecedia, para anular eventuais grupos de elementos do PAIGC que poderiam impedir o avanço terrestre. Um dos aviões sobrevoava o rio [Corubal], metralhando tudo o que tentasse a travessia.

Quando consideraram que a mata estava "limpa", avançámos para a povoação que estava quase totalmente arrasada, sendo visíveis muitos corpos sob os escombros das palhotas. No interior de uma delas que ficou de pé, encontrámos um grupo de homens aterrorizados: já não me lembro se os fizemos prisioneiros ou deixámos ficar a chorar os mortos. Desta operação guardo bastantes recordações, quase todas na mente, apenas uma física, uma colher de madeira que encontrei no chão. (...)

(****) Unidades que estão em Bafatá na altura dos acontecimentos: de Samba Silate

(i) Talvez a CCAÇ 90... Mobilizada pelo R1 7, partiu para a Guiné em 2774/1961 e regressou a 12/4/1963. Esteve em Bafatá. Comandante Cap Inf Manuel Domingues Duarte Bispo, e Cap Mil Inf João Henriques de Almeida.

(II) Seguramente o BCAÇ 238. Mobilizado pelo BCAL 8, partiu em 28/6/1961 e regressou em 24/7/1963. Esteve em Bafatá. Comandante: Maj Inf José Augutso de Sá Cardoso; Ten Cor Inf Luís do Nascimento Matos.

(iii) Seguramente o EREC 385. Mobilizado pelo RC 8. Partiu a 27/7/1962. Regressou a 23/7/1964. Esteve em Bafatá. Comandante: Cap Cav José Olímpio Cajda da Costa Gomes.


terça-feira, 20 de abril de 2010

Guiné 63/74 - P6193: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69 / Mai 71) (9): Os padres missionários italianos de Bafatá

Coruche > IV Convívio anual da CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) > 27 de Março de 2010 > O ex-Alf Mil Capelão Arsénio Chaves Puim e o ex-Alf Mil Trms Antero Magalhães Pacheco da Silva.



Coruche > IV Convívio anual da CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) > 27 de Março de 2010 > O Antero Magalhães Pacheco da Silva, que vive no Porto e veio acompanhado da esposa.




Coruche > IV Convívio anual da CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) > IV Encontro-convívio > 27 de Março de 2010 > O Furt Mil Mec Auto Joaquim Lourenço Gião Vinagre. Em segundo plano, o camarada, ajudado pela respectiva família, que organizou o convívio. Ao todo, marcaram presença 96 ex-Militares, com 27 totalistas.


Coruche > IV Convívio anual da CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) > Dois camaradas de unidades adidas ao batalhão: o ex-1º Cabo Cripto Gabriel Gonçalves (CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71) e ex-Alf Mil Art Jorge Cabral (Pel Caç Nat 63, Fá Mandinga e Missirá, 1969/71).



Coruche > IV Convívio anual da CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) > O ex-Alf Mil Médico António Rodrigues Marques Vilar, que veio do Olossato - se não erro - para o BART 2917, em Março de 1971. A seu lado, a esposa. Moram em Aveiro. O Dr. Vilar é um psiquiatra reformado. Deve estar neste momento na Guiné, aonde voltou, pela primeira vez, em 2001, com o David Guimarães e outros camaradas. No almoço, sentei-me à sua frente. A meu lado esquerdo, ficou o o ex-Alf Mil José Alexandre Pereira Braga Gonçalves (recomplemento da CCS, em Janeiro de 1971). Infelizmente não tenho nenhuma foto dele.

Fotos: © Luís Graça (2010). Direitos reservados


1. Mensagem, com data de 16 do corrente, do nosso muito estimado amigo e camarada Arsénio Puim, açoriano de Santa Maria, ex-capelão do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), e com que estive, recentemente, convívio realizado em Coruche (27 de Março de 2010):

Luis:

O nosso encontro em Coruche, que me deixou muito boas recordações, quase não nos proporcionou ocasião para conversarmos. Mas outras ocasiões virão.

Mando um pequeno trabalho sobre a Igreja na Guiné, e que voltarei mais tarde a abordar no que toca aos capelães militares, o qual, como todos os outros, fica ao teu critério.

Cumprimentos à Alice. Um abraço amigo
Arsénio Puim



2. RECORDANDO... IX - OS PADRES MISSIONÁRIOS ITALIANOS DE BAFATÁ (*)
por Arsénio Puim

A Igreja na Guiné, em princípios da década de 70, tinha como autoridade eclesiástica máxima o Perfeito Apostólico (não era Bispo, nem a Guiné era então Diocese, ao contrário do que acontece hoje), com sede em Bissau e dependente directamente do Papa, em Roma.

Também em Bissau, e arredores, viviam os Padres Franciscanos, exercendo ao mesmo tempo o professorado no Liceu. Mais para o interior do território, haviam-se fixado os Padres Missionários Italianos, que tinham a sede em Bafatá e, se não erro, uma pequena extensão em Catió.

Para além destes, havia os capelães militares, dependentes do Vicariato Castrense, em Lisboa, em comissão de serviço temporária, por força da guerra existente, dispersos e isolados pelos quartéis do mato, onde às vezes existiam também minúsculos núcleos de cristãos nativos.

Normalmente, os capelães só encontravam outros colegas padres, para conviver um pouco e conversar sobre os problemas inerentes à sua actividade e difícil experiência eclesiástico militar, quando se deslocavam a Bissau, onde se situava a chefia da Capelania, que, diga-se, estava sempre aberta a todos os capelães do território. Razão, talvez, por que era apelidada de «Vaticano».

A ocasião magna, durante a minha comissão, de encontro dos 18 padres que prestavam assistência religiosa às forças militares estacionadas na Guiné foi a Reunião dos Capelães do CTIG, realizada em Março de 1971 durante três dias, a qual foi repartida por Bissau e Bolama e presidida pelo capelão chefe, Pe. Gamboa.

Para mim, que vivia na zona central da Guiné, proporcionava-se, ainda, a oportunidade, uma vez ou outra, de me deslocar à pequena cidade de Bafatá, trinta quilómetros a leste de Bambadinca, onde se encontravam, além do capelão da unidade local, os Padres Missionários Italianos.

Foi na Casa destes que me «refugiei» algumas vezes, para desanuviar o espírito do clima de guerra, para falar com outros colegas, para retemperar um bocadinho as forças e levar em diante, com a autenticidade que sempre prezei, a missão de padre da Igreja no Exército.

A primeira vez foi em meados de Junho de 1970 quando decorreu ali um encontro dos capelães militares do Sector Leste - Bafatá, Bambadinca, Galomaro, Nova Lamego e Piche – promovido e orientado pelo Capelão Chefe da Guiné.

Foram dois dias preenchidos com diversas reuniões de trabalho, onde os capelães presentes puderam, num ambiente de agradável convívio, analisar e reflectir sobre a sua missão e actividades, naturalmente vistas sob ângulos de opinião diferentes.

A encerrar o encontro teve lugar uma concelebração eucarística de ronco, um tanto ao estilo da Igreja no tempo do Estado Novo, que o Capelão Chefe Gamboa sabia muito bem valorizar, em que estiveram presentes autoridades militares e civis, assim como um bom grupo de chefes religiosos muçulmanos. À cerimónia, a que se pretendeu retirar qualquer conotação política e militar, deu-se o nome de Celebração Eucarística pela Unidade.

Lembro que ainda antes de regressarem às suas Unidades, os capelães foram brindados, pelo Comando Militar de Bafatá, com um longo roteiro pela zona norte, acompanhados dum pequeno pelotão de segurança, visitando os aquartelementos de Cantuboel, Cambaju e Fajonquito, que nos disseram ficar a cerca de 500 metros do Senegal.

Voltei a estar na hospitaleira Casa dos Padres Missionários Italianos, pelo menos, mais duas vezes, por menos tempo. Eram sempre excelentes ocasiões de repouso e de convívio, assim como de troca de opiniões sobre temas então muito actuais e vividos intensamente por muitas pessoas dentro da Igreja, como fascismo e colonialismo, Exército e Igreja, guerra e Guiné, além de outros temas de cariz religioso e eclesiástico.

Pude, assim, conhecer e aquilatar do trabalho que os Padres Missionários Italianos desenvolviam na Guiné, levados pelo seu espírito missionário arejado e contando com algum apoio financeiro do Governo Português. Um trabalho profundo, enraizado e isento, que assentou, essencialmente, na formação de cidadãos da própria Guiné, de forma que o desenvolvimento desta terra se pudesse fazer a partir de dentro, pelos próprios guineenses. Para isso, haviam fundado e dirigiam um Seminário em Bafatá, já então no terceiro ano de existência, e sei que projectavam construir um outro em Bissau, visando a formação de sacerdotes e catequistas nativos, sem os desenraizar do meio nem desafricanizar.

Uma acção que foi reconhecida por quantos tiveram oportunidade e interesse de observar o desempenho da Igreja na Guiné e dela esperavam que assumisse uma acção capaz de semear nesta terra o Evangelho, no seu espírito de justiça, liberdade e progresso.

Amílcar Cabral, numa entrevista dada depois da célebre recepção dos três líderes dos Movimentos africanos pelo Papa Paulo VI em princípios de 1971, e em que faz um forte ataque à Igreja na Guiné por considerar esta estar comprometida com a guerra colonial, não deixou de expressar o seu apreço pelos Padres italianos de Bafatá, assim como pelo Pe. António Grillo, que havia sido expulso na sequência do caso de Samba Silate. (**) Uma imprudência de Amílcar Cabral, a meu ver, por poder dar origem a certos juízos políticos, na verdade infundados.

Não sei o rumo que a grande obra dos Padres Missionários Italianos tomou após a independência do território, mas acredito que a sua eliminação ou cerceamento, a ter acontecido, terá constituído um revés para a acção missionária da Igreja neste país e para o próprio desenvolvimento da Guiné.

Arsénio Puim
____________


Notas de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 11 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5626: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69/Mai 71) (8): Recordações da Belmira, da Manjaca, da Maria, da Safi, do Jamil...
(**) Vd. poste de 11 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2930: Bambadinca, 1963: Terror em Samba Silate e Poindom (Alberto Nascimento, ex-Sold Cond Auto, CCAÇ 84, 1961/63


(...) Sem conseguir precisar o mês, um dia soubemos que a PIDE estava em Bambadinca para deter o padre António Grillo, italiano da Ordem Franciscana, acusado - não sabíamos se por denúncia se por investigação - de colaborar, proteger, e fornecer alimentos a elementos do PAIGC, a partir de Samba Silate.

Este episódio motivou a intervenção militar do Comando de Bafatá com uma força equipada com as já na altura obsoletas auto-metralhadoras e lança-chamas. Essa força foi reforçada em Bambadinca com grande parte dos efectivos aí destacados e seguiu para Samba Silate.

Contar com pormenor o que se passou no decorrer da operação é impossível, já que fui colocado num posto de onde só podia abarcar uma pequena parte da povoação, que ocupava uma área enorme, mas o constante matraquear das auto-metralhadoras e G3 deixavam antever um morticínio. (...).



Vd. também poste de 14 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3059: Memórias dos lugares ( 9): Bambadinca , 1963 (Alberto Nascimento, CCAÇ 84, 1961/63)


(...) Em frente, junto à vedação do quartel, estava o gerador que por economia só funcionava poucas horas depois do anoitecer, após o que tudo passava a funcionar a petróleo. Até a iluminação exterior do quartel era feita com alguns Petromax e vulgares lanternas. Felizmente, a geleira onde se refrescava a Sagres 7dl, só funcionava a petróleo e enquanto este não faltasse, havia cerveja fresca, isto quando havia cerveja...

Continuando na estrada, a seguir ao quartel e com vedações quase encostadas ficava a última construção, a igreja onde oficiou, até à sua detenção, o padre Grillo [, o missionário italiano, acusado pela PIDE de estar ligado ao PAIGC].

Depois a estrada continuava até à bifurcação para a direita e para a esquerda e era nesta zona que existia um cemitério. A estrada que seguia para a direita dava acesso à pista se aterragem.

Bambadinca era assim...Só isto... (...)

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5512: O meu Natal no mato (25): Apanhados em flagrante, a pôr duas minas no 'sapatinho', na estrada Xime-Bambadinca (Libério Lopes, CCAÇ 526, 1963/65)



Guiné > Zona Leste > Xime > CCAÇ 526 (Bambadinca e Xime, 1963/65) > No Xime, esteve destacado um grupo de combate.

Foto: © Libério Lopes (2008).  Direitos reservados



1. Mensagem do Libério Lopes(*), ex-2.º Sarg Mil Inf da CCAÇ 526, Bambadinca e Xime, 1963/65, 


Caro Luís,


Junto envio um pequeno texto relacionado com a actual época festiva.

Dá-lhe o destino que entenderes.

Um abraço,
Libério.

2. Uma noite de consoada no Xime

por Libério Lopes

Passaram 45 anos mas o episódio mantém-se como se tivesse acontecido ontem.

Pensávamos nós, militares do Pelotão destacado no Xime, que iríamos passar uma noite de consoada tranquila, comendo as tradicionais batatas com bacalhau, sem couves, pois era coisa que nunca vimos nos dois anos de Guiné, tudo acompanhado com umas cervejinhas fresquinhas. De seguida viriam umas horitas de lerpa, mais duas horas de ronda e por fim um sono por vezes demasiado sobressaltado pelas picadelas dos mosquitos.

Porém, as coisas nem sempre correm como o previsto. O homem do rádio traz-nos uma mensagem para decifrar e que, depois de lida, nos tira de imediato a vontade de comer e o sono.

O Comandante de companhia ordenava que se efectuasse uma emboscada entre o Xime e a tabanca de Amedalai. E como na tropa uns mandam e os outros obedecem, nada mais havia do que cumprir essa missão.

Como havia apenas 3 secções, ao anoitecer foi deixada uma delas perto de um trilho que ligava com a tabanca de Samba Silate. Ali tomou posição, pensando o Furriel Miliciano que a comandava, que iriam ser umas horas de seca (como muitas outras vezes acontecera), já que entre o Xime e Bambadinca nunca tinha havido quaisquer sinais de IN a não ser a fuga da população da tabanca de Samba Silate (raça balanta) para o mato.(**)

Pensava ainda o comandante da secção no jantar que o esperava no Xime, quando começa a ouvir vozes a cerca de 200 m e um ruído que o leva a pensar ser a abertura de um buraco na estrada. Aguentou firme e em silêncio. Esperou alguns minutos que lhe pareceram horas. Eis, senão quando um grupo de homens se aproxima e mesmo em frente da secção emboscada, resolve abrir um buraco na estrada para ali ser colocada um mina anti-carro. Antes já tinham colocado outra.

Algumas rajadas de G3 quebraram o silêncio e acabaram de vez com a “brincadeira”. Do aquartelamento saiu de imediato outra secção em seu auxílio mas não muito preocupados pois não se tinham ouvido tiros de pistola-metralhadora, arma utilizada pelo IN. Em conjunto tem-se então noção de toda a realidade.

Ainda hoje pergunto: Que sinal teve o Comandante para mandar fazer uma emboscada nesta noite e naquela zona? Como foi possível esta coincidência da colocação da mina mesmo m frente dos nossos homens ali emboscados?

Se tudo isto não tivesse acontecido, o dia a seguir, dia de Natal, estaria na nossa memória por outros motivos. Duas minas esperavam-nos as consequências, todos nós sabemos quais seriam.

É claro que a consoada no Xime festejou-se depois da meia-noite, e de que maneira! Valeu a pena o sacrifício.

Recordo, também,  que as viagens entre o Xime e Bambadinca nunca mais foram como dantes.

Termino, desejando a todos os tertulianos, Boas Festas de Natal e um Bom Ano 2010.


Libério Candeias Lopes (**)
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Nota de L.G.:

(*) Vd. postes de:

11 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3869: CCAÇ 526 (Bambadinca e Xime, 1963/65), História da Unidade (Libério Lopes)

10 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3863: Tabanca Grande (114): Libério Candeias Lopes, ex-2.º Sarg Mil Inf da CCAÇ 526 (Bambadinca e Xime, 1963/65)

(i) Mobilizada pelo Regimento de Infantaria n.º 7;

(ii) Comandada pelo Cap Inf Agostinho da Costa Alcobia, substotuído, ainda na metrópole, pelo Cap Inf  Luís Francisco Soares de Albergaria  Carreiro da Câmara;

(iii)  Foi para a Guiné no paquete Índia, em Maio de 1963, juntamente com os BCAÇ 506, 507, 599, e 600;

(iv) Até 30 de Junho esteve aquartelada em Brá, Bissau, com um pelotão destacado em Catió;

(v) Em 1 de Junho de 1963, é colocada na zona leste, ficando a depender do Batalhão de Bafatá;

(vi) É lhe atribuído um sub-sector com a área aproximada de 1.500 km2, constituída pelos Regulados de Badora, Xime, Cossé, Cabomba e Corubal (parte Norte).

(vii) O Comando da Companhia ficou instalado em Bambadinca, tendo sido destacado um pelotão para Xime, nesse mesmo dia 1 de Julho.No sector à sua responsabilidade, o IN que já actuara a Oeste e Sul de XIME até ao Rio CORUBAL, levando para os matos uma parte da população e fazendo fugir a restante, tentou expandir a sua acção para LESTE para o que atacou tabancas e quartéis, roubou culturas, emboscou as NT e procurou tornar intransitáveis as estradas;

(viii) A 15 de Julho, outro pelotão da Companhia seguiu para o Xitole em reforço das tropas ali aquarteladas. Regresso A 5 de Agosto de 1963;

(ix) Em 26 de Agosto de 1963m conhece um terceiro comandante, o Cap Inf Hleder José François Sarmento;

(x) Participou em diversas ioerações, no seu sector e fora do seu sector ("No sector à sua responsabilidade, o IN que já actuara a Oeste e Sul de XIME até ao Rio CORUBAL, levando para os matos uma parte da população e fazendo fugir a restante, tentou expandir a sua acção para LESTE para o que atacou tabancas e quartéis, roubou culturas, emboscou as NT e procurou tornar intransitáveis as estradas");

(xi) Durante os 21 meses de permanência no sub-sector, a Companhia teve 108 acções de fogo em contactos com o IN; em resultado dessas acções, o IN sofreu 48 baixas confirmadas pelas NT, havendo contudo um número muitíssimo superior de mortos e feridos referido por prisioneiros; foram apreendidas 5 espingardas, 5 pistolas-metralhadoras, 1 pistola, grande número de granadas de mão de diversos modelos e vários milhares de cartuchos;

(xii) Na tentativa de cortar os itinerários, o IN utilizou 15 engenhos A/C e 3 minas A/P; um fornilho A/C destruiu um jipe e os restantes 14 engenhos A/C foram detectados e levantados; as 3 minas A/P funcionaram, causando dois feridos: um às NT e outro à população.

A Companhia só teve duas baixas por acidente e nove feridos em combate, um dos quais evacuado para a Metrópole.

(**) Vd. poste de 11 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2930: Bambadinca, 1963: Terror em Samba Silate e Poindom (Alberto Nascimento, ex-Sold Cond Auto, CCAÇ 84, 1961/63)


(***) Vd. último poste da série:   8 de Dezembro de 2009 >  Guiné 63/74 - P5428: O meu Natal no mato (24): Boas Festas e Prósporo Ano Novo... (José Nunes, BENG 447, 1968/70)




quarta-feira, 11 de junho de 2008

Guiné 63/74 - P2930: Tabanca Grande: Alberto Nascimento, ex-Sold Cond Auto, CCAÇ 84, 1961/63



Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Ponta Brandão > 1970 > Dois velhos balantas, possivelmente sobreviventes da repressão que se abateu sobre Samba Silate e sobre o Poindom, logo no início da guerra, em 1963, dois episódios da guerra colonial aqui evocados por um camarada nosso, ex-soldado condutor auto, Alberto Nascimento, cujo pelotão, o 1º, da CCAÇ 84 (1961/63), esteve destacado em Bambadinca.

Foto do arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).

Foto: © Humberto Reis (2008). Todos os direitos reservados.


1. Mensagem de Alberto Nascimento, com data de 9 do corrente:

Caro Dr. Luís Graça:

Sou um ex-militar, soldado condutor auto, que cumpriu dois anos de serviço na então província da Guiné, entre 6 de abril de 1961 e 9 de abril de 1963, integrado na Companhia de Caçadores 84.

Como não podia deixar de ser, estes dois anos de convivência com as populações das várias etnias com quem tive contacto, mantiveram em mim o desejo de acompanhar, o mais perto possível, a vida daquele país e daquelas gentes tão maltratados antes e depois da independência.

Sou um dos visitantes assíduos do seu blogue Guiné 63/74, na tentativa de identificar alguns lugares por onde passei ou estive destacado, já que a CCAÇ 84, três meses depois de aterrar no aeroporto de Bissalanca, foi literalmente fragmentada e enviada para os mais diversos pontos do território, tendo o meu pelotão tido como último destacamento, entre Novembro de 1962 e 7 ou 8 de Abril de 1963, Bambadinca, sob o Comando de Bafatá.

O primeiro destacamento, ainda em Julho de 1961, foi Farim, após os primeiros e ainda pouco violentos ataques a Bigene e Guidaje. Seguiu-se o destacamento de Nova Lamego, conforme é dito no seu blogue (P 1292 - Contributos) onde o pelotão foi dividido por Buruntuma, Piche e Canquelifá. Só estou a mencionar o 1º pelotão da Companhia, porque à grande maioria dos camaradas dos outros pelotões só voltei a ver nos dias que antecederam o embarque para a Metrópole.

Como a memória se perde no tempo por indocumentação, ou porque a essa memória se teve medo de atribuir qualquer importância (existiam e ainda existem muitos complexos sobre a guerra colonial), resolvi dar o meu contributo para esclarecer uma dúvida colocada no seu blogue, sobre quem teria participado nos massacres de Samba Silate e Poindom, no início de 63 (*).

Sem conseguir precisar o mês, um dia soubemos que a PIDE estava em Bambadinca para deter o padre António Grillo, italiano da Ordem Franciscana, acusado - não sabíamos se por denúncia se por investigação - de colaborar, proteger, e fornecer alimentos a elementos do PAIGC, a partir de Samba Silate.

Este episódio motivou a intervenção militar do Comando de Bafatá com uma força equipada com as já na altura obsoletas auto-metralhadoras e lança-chamas. Essa força foi reforçada em Bambadinca com grande parte dos efectivos aí destacados e seguiu para Samba Silate.

Contar com pormenor o que se passou no decorrer da operação é impossível, já que fui colocado num posto de onde só podia abarcar uma pequena parte da povoação, que ocupava uma área enorme, mas o constante matraquear das auto-metralhadoras e G3 deixavam antever um morticínio.

Quando a meio da tarde o Comando deu por terminada a operação é que fui, pelo caminho, vendo a destruição provocada pelos lança-chamas, auto-metralhadoras e G3. Samba Silate estava, na sua maior parte, destruída. Num largo da povoação estavam concentrados um grande número de prisioneiros, um dos quais, talvez movido pelo desespero e terror, intentou a fuga, tendo sido abatido. Os outros foram divididos entre Bafatá e Bambadinca, de onde poucos ou nenhuns saíram.

Poindom foi o outro alvo de uma operação militar de Bafatá e Bambadinca, com o apoio da força aérea. O avanço militar terrestre fez-se pela bolanha enquanto os aviões despejavam bombas e rockets sobre a povoação e a mata que a antecedia, para anular eventuais grupos de elementos do PAIGC que poderiam impedir o avanço terrestre. Um dos aviões sobrevoava o rio [Corubal], metralhando tudo o que tentasse a travessia.

Quando consideraram que a mata estava "limpa", avançámos para a povoação que estava quase totalmente arrasada, sendo visíveis muitos corpos sob os escombros das palhotas. No interior de uma delas que ficou de pé, encontrámos um grupo de homens aterrorizados: já não me lembro se os fizemos prisioneiros ou deixámos ficar a chorar os mortos. Desta operação guardo bastantes recordações, quase todas na mente, apenas uma física, uma colher de madeira que encontrei no chão.

Sem pretender glorificar estas acções, que tiveram pouca ou nenhuma resistência, sinto que, com mais ou menos importância, elas fazem parte da história da CCAÇ 84 e do início de uma época de guerra que a maior parte do povo da Guiné e, no caso, de Bambadinca e Poindom e os muitos militares que nos sucederam nessas povoações, certamente não desejaram e que tantas vítimas causou em ambos os lados.

Se entender que este esclarecimento tem alguma importância para a história militar na zona de Bambadinca, dou por bem empregado o tempo, não por mim, mas pelo nome da CCAÇ 84 cuja existência no território está quase completamente apagada, não obstante estes e outros episódios, nomeadamente o do nosso destacamento na zona de Catió, que foi emboscado, com o resultado de vários feridos que foram evacuados para Lisboa e um morto, um militar que não pertencia à CCAÇ 84 (mas que, por opção sua, se encontrava no sítio e hora errados).

Os meus cumprimentos
Alberto Manuel do Nascimento

2. Comentário de L.G.:

Obrigado, Alberto, pela mensagem que me mandaste, e que eu tenho a obrigação de publicar. Os acontecimentos passados, no já longínquo ano de 1963, no início da guerra, na zona leste, no sector de Bambadinca, mais concretamente em Samba Silate e Poindon (subsector de Xime, no meu tempo), fazem parte da nossa história militar e da história da nossa presença na Guiné (hoje, República da Guiné-Bissau). Fazem parte da tua vida, da tua história e da história dos teus camaradas da CCAÇ 84.

Até agora não tínhamos testemunhos directos desses acontecimentos, em Samba Silate e no Poindom, que possivelmenet remonta ao 1º trimestre de 1963, nem sequer tínhamos notícias, a não ser algumas referências, um pouco difusas, imprecisas, de conversas com antigos soldados meus, guineenses, da CCAÇ 12 com quem privei, em Contuboel de depois Bambadinca, entre Junho de 1969 e Março de 1971, e em particular do Abibo Jau (fuzilado em 1974 pelo PAIGC).

O teu testemunho é importante, sendo tu contemporâneo e testemunhas dos acontecimentos. Parece ser, além disso, um testemunho sério e honesto de alguém que viu directamente os resultados da destruição da tabanca de Samba Silate pelas NT e participou na operação contra o Poindom. O teu depoimento parece-me consistente. Por exemplo, relatas a história da prisão e expulsão do missionário italiano, o Padre Grillo, história essa que eu próprio ouvi, ainda há pouco tempo, quando estive na Guiné-Bissau (29 de Fevereiro a 7 de Março de 2008). Ainda hoje essa história está na memória das gentes de Bambadinca, e seguramente entre a comunidade cristã. O Padre Grillo não terá o único sacerdote católico a ter problemas com as autoridades portuguesas, por razões políticas (Veja-se, por exemplo, o caso - embora ficcionado - do padre Francelino, de Catió, que entra na estória da Pami Na Dono, a guerrilheira, escrita pelo nosso camarada Mário Vicente ou Mário Fitas).

Como sabes (partindo do princípio que conheces as regras do nosso convívio), procuramos não fazer juízos de valor sobre o comportamento dos nossos camaradas, individualmente. Evitamos também em falar de massacres (**), por falta de informação documental, detalhada, proveniente de fontes independentes (ou, no mínimo, fidedignas). Deixamos esse trabalho aos historiadores.

De qualquer modo, temos a ideia de que, no início da guerra, as coisas passaram-se assim, um pouco por todo o lado. Praticou-se a política de terra queimada, usou-se o terror e a repressão. Atenção: de ambos os lados... Nem as NT nem o PAIGC eram meninos de coro... O próprio Amílcar Cabral admitia que a colaboração das populações locais poderia ter que ser obtida pela força, em certas circunstâncias. Nenhuma guerra, de resto, é limpa, asséptica, cirúrgica . Infelizmente, há sempre efeitos colaterais. Não sõa só combatentes, de um lado e de outro, que morrem ou ficam inválidos. Há as populações civis que são sempre as grandes vítimas da guerra, directas e indirectas. Da guerra, de todas as guerras.

Isto não serve de desculpa para excessos eventualmente cometidos tanto pelas NT como pelo PAIGC. Mas espero, ao menos, que isto te ajude, a ti e a nós todos, a exorcizar alguns dos nossos malditos fantasmas e quiçá pesadelos que ainda nos perseguem, ao fim destes anos todos.

Seis anos depois e de ti, eu próprio passei, várias vezes, por Samba Silate e pelo Poindom. Em operações, patrulhamentos, etc. Em Samba Silate ainda havia, em 1969, alguns restos calcinadados de moranças da tabanca. No Poindom, pelo contrário, eramos recebido a tiro de costureirinha, de morteiro e de RPG...

Pelo que tu nos contas, no Poindom parece ter-se tratado de uma operação militar, com aviação, napalm, etc. No caso de Samba Silate, terá havido colaboração da PIDE e da autoridade administrativa de Bambadinca com as NT (incluindo a cavalaria de Bafatá, pelo que deduzo das tuas mensagens...). As operações terão sido, por sua vez, coordenadas pelo comando de Bafatá. É isso ?

Infelizmente, também não têm aparecido, no nosso blogue, nem grandes nem pequenas notícias da tua companhia, a CCAÇ 84. Obrigado também por isso. E pela tua manifestação de simpatia e solidariedade pelos nossos dois povos, os guineeneses e os portugueses, que foram afinal as grandes vítimas desta longa, estúpida e inútil guerra.

Meu caro Alberto: ficas desde já convidado a integrar, de pleno direito, a nossa Tabanca Grande. Manda-me, se não te importares, pelo menos uma foto actual, tua, digitalizada (em formato jpg), e se possível algumas fotos do teu tempo em Bambadinca, também digitalizadas. Faz um esforço por te lembares e reconstituires mais memórias desse tempo. Julgo seres o mais velho camarada de Bambadinca. É raro aparecer malta do teu tempo (1961/63).

Um grande abraço de todos nós, teus camaradas, e em especial dos que passaram pelo triângulo Bambadinca - Xime - Xitole, e que estão bem representados na nossa tertúlia.

L.G.
_________

Notas de L.G.:

(*) Vd. referências a Samba Silate, Poindom e Nhabijões:

11 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLIII: Aos nossos queridos nharros (Zé Teixeira)

Nota de Luís Graça:

(...) "Em pleno chão fula, foram os balantas, os beafadas e os mandingas que aderiram mais facilmente (ou foram condenados a aderir) à guerrilha. Os fulas, pelo contrário, reforçaram a sua velha aliança secular com os tugas. Fulas e balantas cultivavam um ódio de estimação. Eu, pessoalmente, nunca consegui falar, olhos nos olhos, a um balanta de Nhabijões...

"Os demónios étnicos e velhas contas por liquidar vieram, infelizmente, ao de cima, a seguir à nossa saída da Guiné. Bambadinca, tal como no início da guerra, em 1963, foi depois da independência palco de crimes contra a humanidade, nomeadamanente de execuções sumárias de dirigentes fulas, de ex-comandos e outros ex-militares que estiveram integrados nas NT. Ou seja, desta vez, de sinal contrário. A extensão destes crimes está por investigar.

"Provavelmente nunca chegaremos a conhecer toda a verdade dos crimes praticados nas décadas de 1960 e 1970 na Guiné, por nós e pelo PAIGC, em nosso nome e em nome do PAIGC. Os fuzilamentos do Cumeré, de Bambadinca e de outros sítios, praticados por ou em nome dos guerrilheiros no poder, não podem todavia fazer esquecer, ignorar ou branquear a repressão exercida pelas autoridades coloniais no início da guerra: Samba Silate e Poidon, por exemplo, não honram a memória dos tugas. Foram lugares de massacres no início da guerra.

"Eu não estava lá, mas os meus meus nharros, os mais velhos, os homens grandes, contavam-me estórias desse tempo, do terror branco de Bambadinca. Terror branco ou crioulo, já que a administração colonial da Guiné era basicamente preenchida por funcionários oriundos de Cabo Verde, ou de origem caboverdiana... Na Missão do Sono de Bambadincazinha, a G-3 a tiracolo, enquanto fazíamos horas para o sol esplendoroso de África aparecer e fazer espantar os nossos medos e os nossos fantasmas nocturnos. E com aquela espécie de inocência de criança com que os fulas falavam destas coisas trágicas e macabras da guerra e da morte aos senhores da Guiné, que eram os tugas...

"Tive as relações mais afáveis, afectuosas e cordiais que me foi possível manter com os fulas, com os meus queridos nharros, mas eu sabia que as relações entre iguais, logo as relações de amizade, eram impossíveis entre nós: eu, fardado, representava uma potência estrangeira, colonial; eles, fardados, soldados de 2ª classe, pertenciam a um tempo e a mundo que já não existia... Os fulas estavam condenados pela história: infelizmente, eles não tinham alternativa... Corrompidos pelo poder colonial, conduzidos pelos seus altos dignatários a um beco sem saída, os fulas acabaram por esclher o lado errado da barricada. Nem mesmo neutrais eles poderiam ter sido...

"Enfim, especulo: que sei eu, ao fim e ao cabo, das complexas relações das principais etnias da Guiné, entre si, e com o poder colonial, durante os anos de guerra ?!... No entanto, subscrevo, de coração aberto, o belíssimo texto que o Zé Teixeira me enviou e que passo a inserir no blogue... O Zé foi talvez dos poucos que, graças ao seu papel de enfermeiro (e também por mérito pessoal e pelas suas qualidades humanas), consegui saltar a barreira da espécie: ele, tuga, foi aceite e amado pela população fula, e ainda hoje tem verdadeiros amigos fulas" (...).

28 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXCIV: Nhabijões: quando um balanta a menos era um turra a menos (Luís Graça)

(...) "Os balantas foram, segundo o testemunho insuspeito dos meus soldados (fulas), as maiores vítimas da repressão colonial nesta década. Seis anos depois (é difícil confiar na memória dos africanos que não usam calendário, mas isto ter-se-á passado em 1963, depois do início oficial da guerra), Samba Silate (cuja população terá sido parcialmente massacrada pela tropa ou pela polícia administrativa de Bambadinca, não posso precisar) e Poindom (regada a napalm pela força aérea) ainda despertam aqui [, em Nhabijões,] trágicas recordações: evocam o tempo em que todo o balanta era suspeito aos olhos das autoridades militares e administrativas, presumivelmente coadjuvadas pela PIDE (Tenho dificuldade em explicar aos meus soldados, que não falavam português quando os conheci em Contuboel, o que é isso, o que é essa sinistra polícia…).

"Há uns anos atrás, nos anos do terror, ser encontrado fora da sua tabanca ou do seu perímetro, de catana na mão ou faca de mato à cintura - que é ronco ou adorno para um balanta que se preze - , eis um belo pretexto para um balanta ser preso, levado para o posto administrativo de Bambadinca, sumarianente interrogado e às vezes, hélàs!, mais sumariamente ainda liquidado.

"A justificação era simples, segundo os meus nharros: "um balanta a menos, era um turra era menos" (sic)… Admito que haja aqui alguma dose de fanfarronice e de exagero, por parte dos fulas, históricos inimigos e vizinhos dos balantas… Mas não há fumo sem fogo: estas histórias parecem-me ter consistência…

"Donde esta hostilidade passiva que julgo poder ler nos olhos e nas atitudes da população de Nhabijões que alimenta a guerrilha, em homens e mantimentos, provavelmente mais por razões de parentesco do que por simpatia para com o PAIGC: ao avistarem-me, fardado, na sua tabanca – a mim, tuga, representante da tropa ocupante - os mais velhos baixam a cabeça ou viram-me as costas como se sentissem acabrunhados com a minha presença… Quem se sente mal, sou eu, que venho invadir-lhes a sua privacidade e perturbar os seus irãs…

"Devia ser esta, aliás, a atitude com que caminhavam para a morte: sem medo mas também sem revolta, com uma estranha dignidade ancestral, a pá e a pica em cada uma das mãos. Sim, por que o método era tão requintado como o dos nazis, a crer na descrição que me fazem alguns dos meus informadores, os mais velhos, como o Abibo, por exemplo – o Abibo, o bom gigante do Abibo, que sofre de epilepsia e tem elefantíase no escroto…

"Ou até senão mais: a própria vítima abria a estreita vala onde devia caber o seu próprio corpo, três palmos abaixo da superfície, e onde ficava deitado… à espera que o carrasco da polícia administrativa (sempre os africanos para as tarefas sujas…) se dignasse dar-lhe o passaporte para a eternidade: um tiro de pistola, uma lata de gasolina, um fósforo…

"Ter-se-á passado assim ? Um frémito de horror passa-me pela espinha acima. Recuso-me a aceitar que isto se tenha passado debaixo da bandeira verde-rubra da minha pátria, com a cumplicidade ou até o envolvimento (activo ou passivo) das tropas portuguesas ou dos representantes das autoridades portuguesas… Faço, ao menos, votos para que estes crimes sejam apenas imputados à odiosa PIDE… Enfim, nunca o saberei… Ou melhor, poderei perguntar-lhes onde era o sítio... O Adibo e outros falam-me do antigo cemitério de Bambadinca, um sinistro local de outrora onde hoje as alfaces crescem, viçosas" (...) (**).

(**) Irónica e desgraçadamente, o Abibo Jau, antigo soldado da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71), o nosso bom gigante mas também o nosso torcionário - no meu tempo, Soldado Arvorado nº 82 107 469, pertencente à 1ª secção, 1º Grupo de Combate, sob o Comando do Alf Mil Op Especiais Francisco Magalhães Moreira - será sido executado sumariamente, sem julgamento, pelo PAIGC, juntamente com o Cap Graduado Jamanca, comandante da CCAÇ 21, em finais de 1974 ou princípios de 19775, perto de Samba Silate, em Madina Colhido:

12 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLIX: O fuzilamento do Abibo Jau e do Jamanca em Madina Colhido (J.C. Bussá Biai)

(...) "Eu (com os meus quase 11 anos) e muitos outros, em 1974, vimos os militares do PAIGC em dois camiões de fabrico russo, um deles completamente tapado de toldo. Passaram por Xime, de manhã, para Madina Cudjido (Colhido, como vocês dizem). Passados uns 30 minutos ouvimos muitos tiros. Só que por volta da hora do almoço ouvimos [dizer] que foram lá fuzilados 8 pessoas. E das pessoas que nós ouvimos que tinham sido fuzilados - não sei se corresponde a verdade ou não - um deles era o tal Abibo Jau (2) que esteve na CCAÇ 12 em Xime. A outra pessoa seria o Tenente Jamanca, da CCAÇ 21 que estava em Bambadinca.

"Mas tudo isso não me espanta porque os meus irmãos e primos que cumpriram o serviço militar no exército português, em Farim e depois em Bissau e Bambanbadinca, também foram presos, mas felizmente não lhes aconteceu o pior" (...).

(3) Vd. poste de 15 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXXXV: Pidjiguiti, 3 de Agosto de 1959: eu estive lá (Mário Dias)

(...) "Antes de concluir, parece-me que o termo massacre, aplicado aos acontecimentos do Pidjiguiti, é um pouco exagerado, não por o número ser muito inferior aos 50 habitualmente referidos, mas porque o conceito que a palavra implica, se refere à chacina indiscriminada, a uma carnificina injustificada do género descrito nos livros de história como passar tudo a fio de espada.

"Com respeito aos massacres de populações balantas e beafadas na região de Bambadinca nos primeiros anos de 60, referidos no blogue-fora-nada, embora não os possa negar ou confirmar, tendo eu saído da Guiné em Fevereiro de 1966, nunca deles ouvi falar o que é estranho pois, como se diz na Guiné, noba ka ta paga cambança - aforismo com um sentido semelhante ao as notícias espalham-se depressa. Numa terra como a Guiné onde tudo se sabia e comentava, é estranho que nunca tivesse ouvido falar em tal acontecimento. Deve ter sido muito bem ocultado (...)".

18 de Novembro de 2006

Guiné 63/74 - P1292: Madina do Boé: contributos para a sua história (José Martins) (Parte I)

Companhia de Caçadores n.º 84

Ficou colocada em Bissau após a sua chegada à província em 6 de Abril de 1961, oriunda do Regimento de Infantaria nº 1, na Amadora.Em 15 de Fevereiro de 1962 foram atribuídos pelotões ao BCAÇ 238 destacados para Nova Lamego para reforço da guarnição.A unidade regressou à metrópole em 9 de Abril de 1963.