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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

Guiné 61/74 - P21917: Da Suécia com saudade (86): Portugueses ilustres que aqui viveram...antes de mim: 1º Visconde Soto Maior (Rio de Janeiro, 1813 -Estocolmo, 1893) (José Belo)







Suécia > Estocolmo > Um dos mais luxuosos e famosos restaurantes locais, o Salão Berns, Berns Asiatiska, onde o diplomata português Soto Maior tinha mesa privativa...

Fotos enviados pelo José Belo. Fonte: Berns Asiatiska  (2021), com a devia vénia

António da Cunha Sotomaior Gomes Ribeiro de Azevedo e Melo (Rio de Janeiro, 18 de Novembro de 1813 - Estocolmo, 19 de Janeiro de 1893), 1.º Visconde de Sotomaior, foi um diplomata português.O título de 1.º Visconde de Sotomaior foi-lhe concedido por Decreto de D. Luís I de Portugal de 12 de Maio de 1865.   Foi encarreado português de negócios na Suécia entre 1869 e 1892. Afeiçou-se tanto à Suécia que recusou nomeações para postos diplomáticos de maior importância. Morreu em Estocolmo, em 1893.(Fontes: Wikipedia e  Portugal > Portal Diplomático)


1. Texto e fotos enviados pelo José Belo, régulo da Tabanca da Lapónia:

Date: terça, 9/02/2021 à(s) 00:58
Subject: Soto Maior

José Belo


A tabanca da Lapónia


Filho de um diplomata português da família Soto Maior no Brasil, foi primeiro militar e posteriormente político, membro da Câmara do Reino.

Tanto pelo temperamento como pelo espírito boémico,  tornou-se menos "conveniente" tanto para a família como para a alta sociedade portuguesa. Falou-se em aventuras amorosas com senhoras casadas pertencentes a famílias do mais alto nível no Reino. De qualquer modo, foi enviado como embaixador para a convenientemente distante Suécia.  

Dispondo a sua família em Portugal de avultados bens,  ele depressa se tornou uma figura de referência na boémia da mais alta sociedade sueca da época. Para além da impecável elegância com que sempre vestia, era também célebre pela sua generosidade económica tanto em festas como nos locais mais exclusivos das Noites de Estocolmo. Depressa as meninas da alta sociedade local lhe arranjaram um apelido exclusivo,  fazendo um trocadilho de Soto Maior para....."Söta Majorn"....ou seja : "Doce Major " em sueco. 

Frequentador assíduo de um dos ainda hoje mais luxuosos e renomados restaurantes de Estocolmo, o Salão Berns, Berns Asiatiska,  a sua mesa favorita ainda lá se encontra,agora adornada com elegante placa de prata com as suas referências pessoais.

Como uma das figuras centrais da sociedade local em fins do séc. XIX, acabou por vir a ser ainda hoje recordado nas ementas de restaurantes conhecidos em toda a Suécia que servem o seu, então, prato favorito, "Gös file Soto Maior" (Fileé de perca ou Lúcio, à Soto Maior).

Como elegante modelo do mais exclusivo vestuário da aristocracia inglesa,  fazia inveja com a sua infindável coleção das típicas gravatas de  1800,  sempre decoradas com alfinetes de peito feitos de jóias célebres pelo seu preço e trabalho de ourivesaria.

Nos numerosos jantares e festas na sua residência particular fazia sempre questão de se ausentar da mesa em cada intervalo dos inúmeros pratos servidos . Fazia-o para então mudar de gravata e respectivo alfinete de peito na busca de surpreender os convidados. Isto sucedia cinco vezes, ou mais, em cada banquete!

O seu temperamento não aceitava atitudes menos correctas e, apesar  da sua frágil estatura, com facilidade acabava em duelos.

Cita-se como exemplo um tal Sr. Baker, diplomata inglês, que se referiu de modo menos correcto quanto falava de uma amiga de Soto Maior. O Sr. Baker sobreviveu ao duelo mas.....sem uma orelha!

Acabou por falecer com 81 anos, só,  na sua residência de Estocolmo, sem qualquer família ou contactos próximos em Portugal.

J. Belo
________

Nota do editor:

Último poste da série > 2 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21602: Da Suécia com Saudade (85): A base aérea de Beja e o apoio alemão ao esforço de guerra de Portugal em África (José Belo)

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21451: Da Suécia com Saudade (82): A Reforma Agrária no Reino da Suécia... e Palácios e Casas Senhoriais (José Belo, ex-alf mil, CCAÇ 2381, Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70)


José Belo 

1. Mensagem de  
José Belo [ ex-alf mil, CCAÇ 2381 (Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70); cap inf ref;  jurista;  autor da série "Da Suécia com Saudade";  vive na Suécia há mais de 4 décadas; régulo da  Tabanca da Lapónia; tem 175 referências no nosso blogue]

Enviado: 14 de outubro de 2020 11:10
 Assunto: Palácios e Casas Senhoriais suecas

Caro Luís

Tenho exagerado nos "protagonismos" quanto aos últimos comentários (*) porque, em verdade, são estes que nos permitem comunicar... à distância.

Infelizmente para alguns funciona como capa de toureiro frente à cabeça da alimária.

Nas crónicas desde a Suécia mais não tenho que procurado esclarecer certas ideias espalhadas pela Europa do Sul.

É sempre interessante verificar que as opiniões sobre este país são sempre extremadas. Os que odeiam e criticam, ao mesmo tempo que outros olham o tal paraíso mitológico feito de socialismos permeantes.

Os progressos sociais, económicos, falta de corrupcão (não menos política!), e principalmente educacionais, não necessitam de mitos cor-de-rosa para efectivamente terem significado real.

A Suécia vive no seu dia a dia uma situação que em outras sociedades ainda se não antevê em... futuros distantes.

Os exemplos citados no texto sobre "A Reforma Agrária e as Famílias Senhoriais Suecas" que enviei, vêm mostrar claramente que a tal governação socialista permeante (de quase um século) tem sabido muito pragmaticamente se adaptar às realidades sociais.

Não menos, às realidades "histórico-sociais".

Aqui, neste extremo do extremo Norte Europeu, já existe muita neve no solo, é noite escura às duas da tarde, e as temperaturas noturnas são bem negativas.

Altura de mais uma estadia no outro lado do pequeno charco que é o Atlântico, na solarenga Key West, [Flórida, EUA].

Agora já com o Sloppy Joe's Bar reaberto, com as novas regras locais da pseudo pós-pandemia.

(Há semanas, quando lá estava, recebi na caixa do correio da minha casa um papel de propaganda política relativo às eleições próximas que dizia mais ou menos isto: "Quem vota num palhaco... gosta de Circo".

Um grande abraço, J. Belo.


2. Mensagem do José Belo, enviada a 6/10/2020 à(s) 19:09:


Data -  
terça, 6/10/2020, 17:15 

Assunto - A Reforma Agrária no reino da Suécia (**)


Meu Caro:

Não sei se terá qualquer interesse para os seguidores dos blogues de ex-combatentes mas de qualquer modo mostra outras facetas da tão mitológica Suécia, talvez inesperadas para muitos.

Consultando-se as estatísticas oficiais, registos prediais e arquivos agrários actuais, verifica-se que um grande número de proprietários agrícolas de origem aristocrática vivem ainda em palácios e administram as vastas propriedades dos seus antepassados, a maioria das quais adquiridas nos séculos XVII e XVIII.

Propriedades então adquiridas livres de impostos ou resultantes de convenientes casamentos entre ricas famílias nobres.

Ao contrário das ideias hoje existentes de que as grandes propriedades agrícolas não são rentáveis ou se encontram em inexorável decadência, verifica-se que, na Suécia, formam um importante grupo, resistente, activo, inteligente tanto administrativamente como na área jurídica.

Estes aristocratas da lavoura constituem um fortíssimo grupo de influência junto dos centros políticos de decisão.

Nas áreas geográficas com melhores condições agrícolas, centro e sul, estão bem no topo das listas quanto às extensões das suas propriedades. Na zona centro-norte possuem mais de 400.000 hectares, e no total estão registados mais de 750.000 hectares.

Estes números são ainda mais significativos se tivermos em conta que a classe nobre não representa hoje mais que 2,5 (não por cento mas por mil !) da população sueca.

Equivalente às antigas leis do “Morgadio” em Portugal, tem na Suécia o nome de “Fideicomisso”. 
Segundo a qual, e de acordo com tradição importada das tradições germânicas por altura da guerra dos trinta anos, as propriedades deverão ser unicamente herdadas pelo filho varão mais velho.

Estas leis terminaram em França aquando da Revolução em 1792. Um século depois a Holanda, Bélgica, Espanha e Portugal terminaram também com as mesmas (1830-1840).

Em 1810 legislou-se na Suécia o fim dos “Morgadios"... mas mantiveram-se (!) todos os até então existentes.

Depois de inúmeras voltas e reviravoltas parlamentares sem resultados radicais chega-se a 1930 e à política social-democrata quanto às modernas formas agrícolas.
Mas em 1959 continuam a existir cento e onze famílias nobres abrangidas pelas leis dos “Morgadios”.

No início dos anos sessenta volta ao Parlamento uma moção segundo a qual estas leis deveriam deixar de existir, por privilegiarem uma classe social em contradição com os direitos de todos os cidadãos de igualdade perante a lei.

Em 1964 (!) foi decidido no Parlamento que estes direitos dos morgados terminarão quando do falecimento dos actuais detentores.

O morgado passa a ter direito a metade da herança total, enquanto a outra metade fica sujeita às regras relativas às heranças.

No entanto, o morgado além do direito à metade tem também direito à sua parte quanto à divisão da outra metade.

A lei é específica nestas regras.
Diz textualmente que deverá ser levado em conta o facto de o “morgado” ter sido até então "preparado"  para uma vida tradicional como herdeiro único. (Quase incrível!)

Em 1994 surge nova oportunidade para os “Morgados” circundarem as novas leis.
Surgem as directivas sobre as garantias de preservação da Herança Cultural ligada aos palácios de famílias nobres, obras de arte e propriedades familiares históricas.

Baseando-se na SOU-1995:128, comissões culturais a nível estatal passam a analisar os requisitos necessários para que estas famílias continuem a dispor dos privilégios anteriormente estabelecidos.

Surge então, não uma nova legislação, mas antes uma nova... interpretação da mesma! O resultado é uma nova legitimação que vai inteiramente ao encontro dos interesses deste grupo.

Nos tempos de hoje, esta continuada procura de afastamento dos herdeiros “femininos” destas muito consideráveis fortunas mais não é que uma reminiscência feudal que, mais de 40 anos depois das moções dos anos sessenta, continua a existir ao longo de sucessivos governos social-democratas. 
Pragmatismos.

Os mesmos pragmatismos que levam a que os mesmos sucessivos (!) governos não cumpram o estabelecido no seu programa partidário, onde está escrito como objetivo a eliminação da monarquia.

Inquéritos à opinião pública em anos sucessivos mostram claramente que a percentagem de cidadãos que desejam manter a Casa Real é sempre superior a 80%.

Comparada com as percentagens de votos partidários de cerca de 30% no máximo, compreendem-se os... pragmatismos !

Um abraço do J.Belo

PS - Boas e interessantes fotos de palácios suecos em:

(i) Svenska Slott. (Boa variedade)

(ii) Svenska Hergard och Slott



3. Comentário do editor LG:

Meu caro José, vem mesmo a propósito... Afinal, estamos a comemorar os 200 anos da revolução liberal que pôs fim, progressivamente,  ao "Antigo Regime" ou "sociedade senhorial"...

Uma história muito mal conhecida dos portugueses, até porque em 1828-1834 tivemos umas das mais sangrentas guerras civis... (Deve ser lembrada para descontruir o mito do "povo de brandos costumes"...). 

Vou arranjar maneira de referir e comemorar essa efeméride, até porque em 1821 a "joia da Coroa", o Brasil tornou-se independente.

Um "abracelo" (abraço com cotovelo)...

PS - Tens de explicitar melhor o que entendes por "socialismo permeante"... Do verbo "permear" ?
________

permear | v. tr. | v. intr.

per·me·ar 
(latim permeo, -are, atravessar, penetrar)

verbo transitivo

1. Fazer passar pelo meio. = ATRAVESSAR

verbo intransitivo

2. Estar ou meter-se de permeio. = INTERPOR-SE, INTERVIR, MEDIAR

sábado, 16 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20351: Agenda cultural (713): Mesa-redonda: Arquivos e Fontes para o Estudo dos Contextos Coloniais Data: 27 de novembro 2019, às 17:00. Local: Lisboa, ISCTE-IUL, Sala C1.01




Mesa-redonda: Arquivos e Fontes para o Estudo dos Contextos Coloniais

Data: 27 de Novembro 2019, às 17:00
Local: ISCTE-IUL (ISCTE-IUL, Lisboa)



O Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa (CEI-IUL) e o Centro de História da Universidade de Lisboa (CH-ULisboa) organizam, no próximo dia 27 de Novembro, uma mesa redonda sobre: 

“ARQUIVOS e FONTES para o ESTUDO dos CONTEXTOS COLONIAIS”.

Partindo do debate sobre a utilização, por Mário Beja Santos, no seu livro “Os Cronistas Desconhecidos do Canal de Geba: O BNU da Guiné” (Edições Humus, 2019), dos relatórios dos gerentes da filial do BNU na então Guiné Portuguesa, esta mesa redonda alarga o âmbito da discussão e procura pôr em confronto virtualidades de diferentes tipos de arquivo, nomeadamente as que advém da riqueza própria das fontes neles guardadas.

A mesa redonda contará com a participação dos especialistas em arquivos e fontes:


Ana Canas (AHU e CH-ULisboa;

Augusto Nacimento (CH-ULisboa e CEI-IUL);
 

João Figueiredo (CEDIS, FD-UNL);
Maria João Vaz (CIES-IUL, ISCTE-IUL);
 
e Mário Beja Santos; 

e será moderada por Carlos Almeida (CH-ULisboa) e Eduardo Costa Dias (CEI-IUL, ISCTE-IUL).

A sessão será de entrada livre, na sala C1.01 pelas 17h00.

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Nota do editor:

quinta-feira, 21 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19608: (De)Caras (124): João Bacar Jaló (1929 -1971), ex-cap 'comando' graduado... Em Príame, c. 1965, na sua casa, ricamente decorada (João Sacôto / Cherno Baldé)


Guiné > Região de Tombali > Catió > CCAÇ 617 (1964/66) > Tabanca de Príame > 1965 > Da esquerda para a direita Alf Gonçalves, João Bacar Jaló,  Alf Farinha, Mamadu,  milícia muito próximo do João Bacar,  e eu. As crianças eram duas das várias filhas do João que também tinha várias mulheres, como era hábito cultural entre os Fulas.



Guiné > Região de Tombali > Catió > CCAÇ 617 (1964/66) > Tabanca de Príame: eu, à porta da casa de João Bacar Jaló, uma morança com um fabuloso mural de motivos geométricos, de inspiração. oriental. Um notável eexemplo da arte afro-islâmica. O que será feito hoje desta morança ?

Fotos (e legendas): © João Sacôto (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Comentários ao poste P19604 (*):


(i) Cherno Baldé

Caros amigos Luís e João Sacoto,

Muitos séculos antes da chegada dos Europeus a África, nesse caso, dos Portugueses em particular, a influência da cultura e da civilização oriental já tinha conquistado o seu espaço nas práticas e manifestações culturais dos africanus, em especial dos povos situados no interior da região do Sudão ocidental (Impérios ou grandes estados) com a expansao dos poderes imperiais que foram concomitantes à expansao da religião islâmica.

Quando vi as imagens do poste com as pinturas, a minha primeira reacção foi pensar que se tratava de uma mesquita, pois os motivos são claramente orientais e com ligações às grandes religiões monoteístas (Muçulmana e Judaica).

Entre os Fulas originários de Futa Djalon (Futa-Fulas dos apelidos Djaló, Baldé ou Bah e Barry) mais cultos e letrados, na altura, era muito frequente o embelezamento das suas residências com tais pinturas de motivos orientais (em que não entravam imagens de animais ou de pessoas banidos pela religião) e em que, também, entravam pequenos textos de filósofos Gregos e Arabes e até Salmos biblicos davidianos.

A estrela que se ve nas pinturas simboliza a estrela do rei David a quem os Fulas, por razões que não sei explicar, consideram um dos seus patriarcas da antiguidade,  facto que os faria primos afastados dos Judeus, mas isso ja é outra história que precisa ser investigada por especialistas.

O Português que melhor tentou desenvolver este tema sobre os Fulas e outras etnias da Guiné é o Landerset Simões, autor do livro "Babel Negra, Etnografia, Arte e Cultura dos Índigenas da Guiné", edição do autor, impresso pelas Oficinas do Comércio do Porto, 1935.

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

PS - Para quem ainda não leu, recomendo vivamente, pois é dos melhores livros que eu li de um Português colonial, que viveu e trabalhou em principios do sec. XX.

(ii) João Sacôto

Caro Cherno Baldé:

Obrigado pelo esclarecimento. Pelo que dizes, se alguma dúvida tivesse quanto à casa referida, ela está completamente dissipada. Pois trata-se de uma casa em Priame, Catió, tabanca Fula, onde, tenho a certeza, não havia, naquela altura (1964/1965), naquele lugar, nenhuma mesquita.

Por outro lado o João Bacar Jaló era,  para além do mais, um homem rico e importante em Priame. É, portanto à porta dele que eu estou.e  eventualmente, até pode ter sido ele quem disparou a fotografia.

Um abraço, JS

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 20 de março de  2019 > Guiné 61/74 - P19604: Álbum fotográfico de João Sacôto, ex-alf mil, CCAÇ 617 / BCAÇ 619 (Catió, Ilha do Como, Cachil, 1964/66) e cmdt da TAP, reformado - Parte VI: Em Príame, a tabanca do João Bacar Jaló (1929 - 1971)

domingo, 3 de fevereiro de 2019

Guiné 61/74 - P19466: Agenda cultural (670): As Rotas da Escravatura, série de 4 episódios na RTP 1: 2ª feira, dia 4/2/2019, 4º (e último) episódio > 1789-1888: As Novas Fronteiras da Escravatura




RTP1 | 2ª feira, 4 Fev 2019 | 23h43

Género > Documentário - História


1789-1888: As Novas Fronteiras da Escravatura 
| Episódio 4 de 4 | 

Duração: 53 min


Sinopse>

Em 1790, o tráfico negreiro atinge o seu zénite. Mais de 100 000 cativos são deportados todos os anos.

No advento do séc. XIX, a violência dos negreiros dita a condenação do tráfico transatlântico. Doravante, a Europa terá de encontrar um meio de enriquecer sem recorrer a este tráfico, agora, imoral.

Nos anos que se seguem à proibição do tráfico, os europeus vão fazer recuar as fronteiras da escravatura.

O Brasil guarda nele a herança dos últimos anos da escravatura.

No momento em que o comércio de escravos é proibido, uma segunda vaga de deportações de cativos chega à Baía do Rio de Janeiro.

Com mais de dois milhões de escravos desembarcados no séc. XIX, o Rio tornou-se o maior porto de tráfico do mundo.


Rever últimos episódios no RTP Play

1620-1789: Do Açúcar à Revolta  | Episódio 3 | 28 Jan 2019


Ficha Técnica

Título Original: Les Routes de l´esclavage
Realização: Daniel Cattier, Juan Gelas, Fanny Glissant
Produção: Compagnie des Phares et Balises, ARTE France, Kwassa Films, RTBF, LX Filmes, RTP, Inrap
Música: Jérôme Rebotier
Ano: 2017
Duração de cada episódio: 53 minutos

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sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Guiné 61/74 - P19438: Agenda cultural (669): As Rotas da Escravatura, série de 4 episódios na RTP 1: 2ª feira, dia 28/1/2019, 3º episódio > 1620-1789: Do Açúcar à Revolta




Na primeira década do séc. XVI, um em cada dez habitantes de Lisboa era negro, ou seja,  de origem africana, sem contar com os seus descendentes... Igual proporção foi encntrada em outras cidades da península ibérica, como Sevilha, Barcelona, Málaga... Fotogramas do 2º episódio (com a devida vénia)




1. A história da escravatura do séc. VII até aos dias de hoje: documentário em 4 episódios, na RTP1... Absolutamente a não perder. Trata-se dum série documental francesa, de que a RTP é umas das produtoras... Levou mais de cinco anos a fazer, e teve a colaboração de quatro dezenas de especialistas.

Pode ler-se no "Público", de 21 de janeiro de 2019, o seguinte sobre os realizadores da série:

(...) Os três autores, Daniel Cattier, Juan Gélas e Fanny Glissant, têm ligações ao tema em causa. Daniel Cattier, filho de pai belga e mãe zimbabueana, tem colocado África e a exploração das questões de identidade no centro da sua filmografia, em que se inclui o documentário animado Kongo: Grand Illusions​.​ Juan Gélas tem no currículo Noirs de France, série documental sobre a História da população negra de França. Já Fanny Glissant, descendente da relação entre uma escrava e o seu proprietário, tem aqui a sua estreia na realização. Há também segmentos animados, uma bem-vinda companhia para os depoimentos recolhidos e para as imagens de arquivo, a cargo de Olivier Patté.(...) 

(...) No segundo episódio, 1375-1620: Por Todo o Ouro do Mundo, o foco são os portugueses. São entrevistados, entre outros, investigadores e historiadores como António de Almeida Mendes, da Universidade de Nantes, Isabel Castro Henriques, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Filipa Ribeiro da Silva, do Instituto Internacional da História Social, em Amesterdão, bem como Izequiel Batista de Sousa, da Universidade de Reunião, que vem de São Tomé, uma ilha muito importante nesta parte da história. Ao longo das próximas duas semanas, analisar-se-ão as plantações de açúcar e algodão, os Estados Unidos e os tempos em mudança que trouxeram com eles a abolição. (...) 


As Rotas da Escravatura

2º episódio disponível "on ine" (durante 7 dias, desde 21 de janeiro de 2019)  >

1375-1620: Por Todo o Ouro do Mundo, 52m

Documentários - História

RTP 1 > 2ª feira, 21 janeiro de 2019

Sinopse:

No século XIV, a Europa abre-se ao mundo e apercebe-se de que se encontra à margem da mais importante zona de trocas comerciais do planeta.

Este mapa, o "Atlas catalão", aguça o apetite de conquistas dos europeus. Mapa dos ventos, o Atlas guia os marinheiros como viajantes por terra firme. Mapa político faculta informações sobre as forças em presença. Por fim, como mapa económico, indica as rotas comerciais com destino a África e aos seus recursos.

Um pequeno reino é o primeiro a lançar-se ao assalto das costas africanas: Portugal. Na sua esteira, desenha-se uma nova rota da escravatura.


Próximos episódios:





1620-1789: Do Açúcar à Revolta

A escravatura moldou a nossa história. Na Ilha de São Tomé, os portugueses inventaram um modelo económico de rentabilidade inigualável: a plantação de cana-de-açúcar.


No século XVI, toda a Europa procura imitá-los. Uma demanda pelo lucro que vai mergulhar todo um continente no caos e na violência. Perto de 13 milhões de africanos são apanhados nas redes da escravatura e levados para o Novo Mundo onde ingleses, franceses, espanhóis e holandeses esperam tornar-se ricos... imensamente ricos. Mais viciante do que a pimenta ou a canela, o açúcar alastra pela Europa como um rastilho de pólvora. A partir do séc. XVII, o alimento raro e dispendioso faz virar as cabeças.


Episódio 3 > 28 Jan 2019




1789-1888: As Novas Fronteiras da Escravatura


Em 1790, o tráfico negreiro atinge o seu zénite. Mais de 100 000 cativos são deportados todos os anos.

No advento do séc. XIX, a violência dos negreiros dita a condenação do tráfico transatlântico. Doravante, a Europa terá de encontrar um meio de enriquecer sem recorrer a este tráfico, agora, imoral.

Nos anos que se seguem à proibição do tráfico, os europeus vão fazer recuar as fronteiras da escravatura.

O Brasil guarda nele a herança dos últimos anos da escravatura [, que só será abolida em 1888, no grande país sul-americano...].

No momento em que o comércio de escravos é proibido, uma segunda vaga de deportações de cativos chega à Baía do Rio de Janeiro.

Com mais de dois milhões de escravos desembarcados no séc. XIX, o Rio tornou-se o maior porto de tráfico do mundo.


[... Mas a escravatura não se extinguiu: haverá ainda 40 milhões de escravos, em todo o mundo,  segundo as estimativas das Nações Unidas.]

Episódio 4 > 5 Fev 2019

quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

Guiné 61/74 - P19406: Agenda cultural (668): Absolutamente a não perder: RTP1, todas as 2ªs feiras, às 23h45, a partir de 14/1/2019, "As Rotas da Escravatura", em 4 episódios de 53 m cada... Do séc. VII até hoje, a África foi o epicentro de um gigantesco tráfico global de seres humanos: mais de 20 milhões de africanos foram deportados, vendidos e submetidos à escravatura: Núbios, Fulas, Mandingas, Songais, Sossos, Akans, Iorubás, Igbos, Bacongos, Ajauas, Somalis...



Fotograma do vídeo de apresentação do documentação (1º episódio, RTP1, 14/1/2019) (com a devida  vénia...)


A história da escravatura do séc. VII até aos dias de hoje: documentário em 4 episódios, na RTP1




Esta é a história de um mundo onde o comércio de escravos desenhou os seus territórios e as suas próprias fronteiras. Um mundo onde a violência, a opressão e o lucro impuseram as suas rotas.
A história da escravatura não começou nos campos de algodão. É uma tragédia muito mais antiga que se desenrola desde os primórdios da Humanidade.

A partir do séc. VII e durante mais de mil anos, a África foi o epicentro de um gigantesco tráfico global. Este sistema criminal moldou o nosso mundo e a nossa história. A amplitude deste tráfico é tal que, durante muito tempo, foi impossível explicar todos os seus mecanismos.

Nesta série documental volta-se a percorrer as rotas da escravatura, abordando as suas consequências na sociedade contemporânea.

Segundas, às 23h45, na RTP1, a partir de 14/1/2019

As Rotas da Escravatura

1º episódio > 476-1375: Para Além do Deserto,  14 jan 2019 [Pode ser revisto aqui no prazo de 7 dias]

Sinopse:

A partir do séc. VII e durante mais de mil anos, a África foi o epicentro de um gigantesco tráfico global. Núbios, Fulas, Mandingas, Songais, Sossos, Akans, Iorubás, Igbos, Bacongos, Ajauas, Somalis... Mais de 20 milhões de africanos foram deportados, vendidos e submetidos à escravatura. Este sistema criminal moldou o nosso mundo e a nossa história. A amplitude deste tráfico é tal, que durante muito tempo foi impossível explicar todos os seus mecanismos.

2º episódio: 1375-1620: Por Todo o Ouro do Mundo, 22 jan 2019

Sinopse:

No século XIV, a Europa abre-se ao mundo e apercebe-se de que se encontra à margem da mais importante zona de trocas comerciais do planeta.

Este mapa, o "Atlas catalão", aguça o apetite de conquistas dos europeus. Mapa dos ventos, o Atlas guia os marinheiros como viajantes por terra firme. Mapa político faculta informações sobre as forças em presença. Por fim, como mapa económico, indica as rotas comerciais com destino a África e aos seus recursos.

Um pequeno reino é o primeiro a lançar-se ao assalto das costas africanas: Portugal. Na sua esteira, desenha-se uma nova rota da escravatura.

Sinopses dos próximos episódios (nº 3 e 4) ainda não disponível

Ficha Técnica

Título Original:  Les Routes de l´esclavage
Realização:  Daniel Cattier, Juan Gelas, Fanny Glissant
Produção: Compagnie des Phares et Balises, ARTE France, Kwassa Films, RTBF, LX Filmes, RTP, Inrap
Música: Jérôme Rebotier
Ano: 2017
Duração de cada episódio: 53 minutos

segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19042: Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias (António Graça de Abreu) - Parte XXXIX: Petra, Jordânia, com o Lawrence da Arábia como cicerone, e o Indiana Jones como guarda-costas...



Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3

Petra, Jordânia,  s/d, dezembro de 2016


Fotos (e legendas): © António Graça de Abreu (2018). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação das crónicas da "viagem à volta ao mundo em 100 dias" [3 meses e oito dias], do nosso camarada António Graça de Abreu


Escritor, poeta, sinólogo, ex-alf mil SGE, CAOP 1 (Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), membro sénior da nossa Tabanca Grande, e ativo colaborador do nosso blogue com cerca de 220 referências, é casado com a médica chinesa Hai Yuan, natural de Xangai, e tem dois filhos, João e Pedro. Vive no concelho de Cascais.

[Foto à esquerda: Hai Yuan e António Graça de Abreu]


2. Sinopse da série "Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias" (*)

(i) neste cruzeiro à volta do mundo, o nosso camarada e a sua esposa partiram do porto de Barcelona em 1 de setembro de 2016; [não sabemos quanto despenderam, mas o "barco do amor" deve-lhes cobrado uma nota preta: c. 40 mil euros, no mínimo, estimamos nós];

(ii) três semanas depois de o navio italiano "Costa Luminosa", com quase três centenas de metros de comprimento, sair do Mediterrâneo e atravessar o Atlântico, estava no Pacífico, e mais concretamente no Oceano Pacífico, na Costa Rica (21/9/2016) e na Guatemala (24/9/2017), e depois no México (26/9/2017);

(iii) na II etapa da "viagem de volta ao mundo em 100 dias", com um mês de cruzeiro (a primeira parte terá sido "a menos interessante", diz-nos o escritor), o "Costa Luminosa" chega aos EUA, à costa da Califórnia: San Diego e San Pedro (30/9/2016), Long Beach (1/10/2016), Los Angeles (30/9/2016) e São Francisco (3/4/10/2017); no dia 9, está em Honolulu, Hawai, território norte-americano; navega agora em pleno Oceano Pacífico, a caminho da Polinésia, onde há algumas das mais belas ilhas do mundo;

(iv) um mês e meio do início do cruzeiro, em Barcelona, o "Costa Luminosa" atraca no porto de Pago Pago, capital da Samoa Americana, ilha de Tutuila, Polinésia, em 15/10/2016;

(v) seguem-se depois as ilhas Tonga; visita a Auckland, Nova Zelândia, em 20/10/2016; volta pela Austrália: Sidney, a capital, e as Montanhas Azuis (24-26 de outubro de 2016);

(vi) o navio "Costa Luminosa" chega, pela manhã de 29/10/2016, à cidade de Melbourne, Austrália; visita à Austrália Ocidental, enquanto o navio segue depois para Singapura; o Graça de Abreu e a esposa alugam um carro e percorrem grande parte da costa seguindo depois em 8 de novembro, de avião para Singapura, e voltando a "apanhar" o seu barco do amor...

(vii) de 8 a 10 de novembro. o casal está de visita a Singapura, seguindo depois o cruzeiro para Kuala Lumpur, Malásia (11 de novembro); Phuket, Tailândia (12-13 de novembro); Colombo, capital do Sri Lanka ou Ceilão ou Trapobana (segundo os "Lusíadas", de Luís de Camões. I, 1), em 15-16 de novembro. de 2016;

(viii) na III (e última) parte da viagem, Graça de Abreu e a esposa estão, a 17 de novembro de 2016, em Cochim, na Índia, e descobrem a cada passo vestígios da presença portuguesa; a 18, estão em Goa, seguindo depois para Bombaím (20 e 21 de novembro de 2016);

(ix) com 2 meses e 20 dias, depois da Índia, os nossos viajantes estão no Dubai, Emiratos Árabes Unidos, passando por Muscat, e Salah, dois sultanatos de Omã, em datas que já não podemos precisar (, as fotos deixam de ter data e hora...), de qualquer modo já estamos em finais de novembro/ princípios de em dezembro de 2016;

(x) tempo ainda para visitar Petra, na Jordânia, e atravessar os 170 km do canal do Suez (Egito), antes de o "Costa Luminosa" entrar no Mediterrâneo; a viagem irá terminar em Civitavecchia, porto de Roma, antes da chegada do novo ano, 2017
.


3. Viagem de volta ao mundo em 100 dias > Patra Jordânia, s/d, dezembro de 2016] (pp. 22-25], da terceira e última Parte, que nos foi enviada em formato pdf]


Petra, Jordânia

Segunda visita a estas paragens, agora com entrada triunfal pelo mar Vermelho e pelo golfo de Aqaba. Estranhas terras de majestosas paisagens e retorcida História.

Desta vez trago como cicerone, a viajar sozinho e quase incógnito numa suite no nono piso do nosso Costa Luminosa, o cidadão inglês Thomas Edward Lawrence, mais conhecido por Lawrence da Arábia. Desembarco em Aqaba, o lugar certo, com o cicerone certo num país incerto. A oeste, o Egipto, com as terras massacradas do Sinai, do outro lado, os desertos da Arábia Saudita cheios de petróleo. No fim do golfo, duas cidades encostadas ao rebordo das montanhas, olhando-se no espelho uma da outra. São Eilat, território de Israel e, em frente, o burgo jordano de Aqaba, conquistada aos otomanos em 1917 pelo meu cicerone, o loiríssimo inglês de olho azul, o tal Lawrence da Arábia disfarçado de Peter O’Toole.

 Atravessada Aqaba, é altura de rumar a Petra, para norte, escondida entre montanhas róseas. Desta vez avanço por uma estrada diferente. Em lugar do chamado “Caminho dos Reis”, percorrido em 2008, seguimos pela recém construída auto-estrada do Deserto, pelo meio de montanhas quase surreais, por povoados pobres em solos secos e inóspitos, ao lado do inacreditável deserto de Wadi Rum. Lawrence, o cicerone, pisca-me o olho. Foi nestes vales – que de Wadi Rum conduzem a Aqaba – , que ele organizou os 5 mil homens que aqui haveriam de derrotar os otomanos.

Hoje os tempos são outros, temos carros de polícia e soldados espalhados estrategicamente ao longo dos 110 quilómetros de estrada, até chegarmos a Petra. Por cima da Jordânia ficam o Iraque e a Síria, terras ensanguentadas pela insensatez dos homens onde impera a lei do canhão e da bala. Só o Costa, o navio, despachou 1.600 turistas em 45 autocarros para a visita a Petra. A necessária segurança – imaginem o que seria os radicais islâmicos metralharem um dos nossos autocarros –, parece funcionar.

Perto da cidade rosa, iremos encontrar dois helicópteros estacionados numa plataforma ao lado da estrada e soldados de espingarda, aí de trezentos em trezentos metros. Não será apenas por nossa causa. Estamos mais protegidos porque neste mesmo dia visita Petra o rei Carlos Gustavo, da Suécia.

Chegamos à cidade de Wadi Musa. Estacionado o autocarro, uma caminhada curta e iniciamos a descida suave para o desfiladeiro apertado entre rochas que se elevam até ao céu, em pedra cor-de-rosa, meia translúcida, mágicos rubores, e mil cores. De súbito, quilómetro e meio adiante, abre-se a garganta na montanha e aí está, numa apertada clareira, o Al-Khazneh, o Tesouro, mais a sequência das ruínas da que foi, há dois mil anos, e continua a ser hoje, uma das mais espantosas urbes construída pelo engenho dos homens. 

Avanço pelo espaço de uma cidade quase mais velha do que o tempo, ainda envolta em mil mistérios. Quem foram os nabateus, o povo que construiu Petra? Seriam provavelmente berberes, ou beduínos do deserto que por aqui se fixaram há dois mil e quinhentos anos, sendo então Petra um entreposto de caravanas nas rotas de norte para sul, de leste para oeste em terras do que viria a ser a Arábia. 

Verdade é que os nabateus se eclipsaram, desapareceram do mundo e vieram os romanos, mais tarde os bizantinos. Todos abandonaram Petra e a cidade, abalada por terramotos, pela falta de água, pela mudança do itinerário das caravanas, acabou quase em ruínas. O perpassar dos séculos cumpriu o seu dever, foi reduzindo os palácios a pedras caídas e a pó, os túmulos, a buracos suspensos nas falésias que unem céu e terra, as casas a montes informes de lajes pelo chão.

Redescoberta em 1812 por um explorador suíço, de nome Johannes Burkhart, Petra voltou a existir, mas ninguém estava preocupado em desvendar os seus segredos. Foi preciso um senhor norte-americano, de nome Steven Spielberg e sua equipa se lembrarem, em 1989, de Petra e do Al-Khazneh para aí esconderem o segredo do Graal, no terceiro filme da saga Indiana Jones e colocarem o Harrison Ford, no fim da película, a sair vitorioso a cavalo do espantoso Al-Khaznek. 

Petra começou então a ser conhecida em todo o mundo. Com vinte séculos de idade, o Al-Khaznek, miraculosamente conservado, seria, segundo os arqueólogos, o lugar onde se esconderia o valioso tesouro de um faraó, ou abrigaria talvez o túmulo de um rei nabateu, ou poderia ainda ser um templo dedicado a um deus desconhecido. Tem 43 metros de altura, seis colunas helenísticas encimadas por uma espécie de três grandes nichos decorados e resguardados por telhados, tudo recortado na rocha cor-de-rosa. O Al-Khaznek, revisitado, deixa-me outra vez suspenso nas asas coloridas do assombro.

Existe mais Petra continuando a caminhada. Há um teatro romano do século I, todo talhado no vermelho escuro da pedra, com capacidade para sete mil pessoas, há mais palácios e conjuntos de túmulos em fachadas monumentais rasgadas na falésia, há restos de um templo e de uma igreja bizantina, do século VI. 

Lá longe, depois da subida difícil de 800 degraus cortados quase ao acaso na pedra, chegamos a Ad-Deir, o Mosteiro construído no século II, outro gigantesco edifício com semelhanças com o Al-Khaznek, e que é a segunda maior atracção de Petra. Chamam-lhe o “Mosteiro” porque no interior foram encontradas não sei quantas cruzes bizantinas, provável evidência de que no século VI terá sido transformado em igreja ou mosteiro. Visitei-o na viagem de 2008, mas agora, com as pernas mais delapidadas pelo avançar dos anos, não valeria a pena o esforço de subir outra vez ao Ad-Deir.

 No regresso a Wadi Musa e ao autocarro, andei à procura do cicerone, o tal inglês loiro, o Lawrence da Arábia que desaparecera na chegada a Petra. Disseram-me que havia partido montado num camelo, a toda a brida, em direcção ao deserto de Wadi Rum onde tinha um encontro com o seu amigo Ali Abn el Karish, disfarçado de Omar Sharif, para porem a conversa em dia e beberem um chá no deserto.

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Nota do editor:

terça-feira, 1 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18590: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (55): Explicar a guerra colonial e o 25 de Abril aos alunos do 12º ano, da escola secundária Miguel Torga, Massamá (Jorge Araújo)


Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3
Fotos (e legendas): © Jorge Araújo (2018). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



O nosso coeditor Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger,
CART 3494 (Xime-Mansambo, 1972/1974).


"DA GUERRA COLONIAL AO 25 DE ABRIL" - PALESTRA NA ESCOLA SECUNDÁRIA MIGUEL TORGA, EM 23 DE ABRIL DE 2018 (Jorge Araújo)


Nota prévia:

Na Foto nº 1, acima, vê-se a entrada principal da antiga Escola Secundária de Massamá, hoje Escola Secundária Miguel Torga [pseudónimo de Adolfo Correia da Rocha (1907-1995)] nome atribuído de acordo com o Despacho 68/SEAE/96. Este complexo escolar foi implantado no ano lectivo de 1985/1986, num terreno de cultivo com uma área de 14 mil metros quadrados.

Dez anos depois da sua construção, a então Escola Secundária de Massamá, localizada na Freguesia de Monte Abraão, em Queluz, Sintra, escolheu para seu patrono o poeta, contista e memorialista Miguel Torga (Prémio Camões de 1989, o mais importante da língua portuguesa), tendo por fundamentos os constantes no Despacho 68/SEAE/96, e que seguidamente se transcrevem:

“A História que era preciso ensinar nas escolas não devia mostrar Carlos, O Temerário, a morrer diante de Nancy. Devia mostrar mas é esta junta de bois aqui á minha porta, atrelada a um carro, à espera que o dono acabe de beber um copo. Que importa lá à humanidade a bazófia do senhor francês? (Diário, 26105144) – Quem o afirma é Miguel Torga, exemplo de poeta, pensador, cidadão de corpo inteiro, que nos deixou uma das obras mais marcantes deste século em Portugal [séc. XX].

Como disse David Mourão-Ferreira (1927-1996), a posição de Miguel Torga “nas nossas letras continua a ser a de um grande isolado – que, no entanto, ou por isso mesmo, consubstancia e representa, da forma mais directa ou através de inevitáveis símbolos, quanto há de viril, vertical, insubornável no homem português contemporâneo”. Que melhor exemplo para educadores e educandos?

O contributo que deu à literatura e cultura portuguesas e a referência da sua vida e obra para todos e, em particular para a juventude portuguesa são as razões positivas de sobra que estiveram na origem da proposta do Conselho Directivo da Escola Secundária de Massamá, Sintra, com a concordância da Câmara Municipal, no sentido da atribuição do nome de Miguel Torga ao referido estabelecimento de ensino.

Assim e preenchidos que estão os requisitos e demais finalidades previstos no Dec.-Lei 387/90, de 10/12, determino:

1 - A Escola Secundária de Massamá, Sintra, passa a denominar-se Escola Secundária Miguel Torga, Massamá, Sintra.

2 - A Escola referida no número anterior constará da portaria a que se refere o nº 1 do artº 8 do Dec.-Lei 387/90, de 10/12, com a denominação que lhe é atribuída nos termos do presente despacho.


Em 2-7-1996, o Secretário de Estado da Administração Educativa, Guilherme de Oliveira Martins”.

1. INTRODUÇÃO
Feita a apresentação das razões que deram o nome à actual Escola Secundária Miguel Torga, importa agora referir a minha participação na palestra em título, realizada nessa Escola no passado dia 23 de Abril, 2.ª feira, a propósito das comemorações do 44.º Aniversário do “25 de Abril de 1974”. O evento organizado pelo Departamento de História da Escola tinha por destinatários os alunos de três turmas do 12.º Ano [cartaz elaborado para o efeito, ao lado].

O convite surgiu por intermédio da Professora Helena Neto, que em parceria com a Professora Conceição Carpinteiro lideraram este projecto enquanto docentes da Disciplina de História. Por ser nossa amiga de longa data e saber da minha condição de ex-combatente na Guiné, logo ela se lembrou de mim para essa (boa) causa.

Aceitei o convite, sem dificuldade, uma vez que tinha disponibilidade de agenda para esse dia.


2. A SESSÃO

O meu encontro com a comunidade escolar, alunos e corpo docente, decorreu no auditório da Escola, num ambiente de grande empatia, certamente pela novidade dos conteúdos aflorados, tendo-se registado uma participação de sete dezenas de indivíduos.

Durante duas horas, das dez ao meio-dia, abordei várias temáticas relacionadas com a evolução histórica do conflito, sinalizando algumas das minhas experiências, entre as mais “pesadas” e as mais “levezinhas”, acumuladas ao longo dos dois anos da comissão ultramarina, justamente até ao 25 de Abril de 1974, uma vez que nessa data ainda era militar, pois havia chegado a Lisboa, a bordo do N/M Niassa, vinte dias antes.

No final da apresentação dos pontos estruturados para a sessão, dei a palavra aos presentes, os quais colocaram diferentes e pertinentes questões, com relevância para os alunos de origem africana (Guineenses, Cabo.verdianos e Angolanos) incluindo, caso interessante, uma aluna luso-timorense. Como curiosidade, um dos presentes prometeu enviar-me os contactos do seu avô, também ele ex-combatente na Guiné, que, segundo crê, teria sido mobilizado durante a segunda metade dos anos sessenta.

Coincidindo com o aniversário da «Tabanca Grande», que aproveitei para o referir, os conteúdos do blogue foram também utilizados como “pano de fundo”, por um lado, para complementar algumas das minhas abordagens e, por outro, como fonte de informação privilegiada para a elaboração dos trabalhos que os alunos terão de apresentar no âmbito da Disciplina de História, e na sequência desta Reunião plenária.

Creio que os jovens e as jovens ficaram satisfeitas com o que ouviram… Vamos ver o que nos reservam os seus trabalhos finais.

Para encerrar este texto, ao jeito de ‘reportagem’, apresento acima duas fotos [nºs 2 e 3] que me foram cedidas relacionadas com o evento.

Com um forte abraço de amizade.
Jorge Araújo.
27ABR2018
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Nota do editor:

Último poste da série > 22 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18446: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (54): A "mindjer grandi" Maria da Graça de Pina Monteiro, nascida em 1900, e que viveu em Bafatá e depois em Bissau... Conhecida pela Mariquinha, era casada com um chefe de posto português, sr. Eiras (Vieira), e tinha 3 filhas, e entre elas a Judite e a Linda Vieira... "Meus amigos da Tabanca Garandi, alguém por acaso chegou de conhecer algum membro dessa família?" (Ludmila Ferreira)

segunda-feira, 26 de março de 2018

Guiné 61/74 - P18460: Notas de leitura (1052): “Guiné-Bolama, História e Memórias”, por Fernando Tabanez Ribeiro; Âncora Editora, 2018 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Março de 2018:

Queridos amigos,
O memorável quadro de recordações de infância em Bolama não salvaguarda o leitor de perceber que o empreendimento de Tabanez Ribeiro não chegou a bom porto, havendo hoje vasta bibliografia sobre tudo o que ele escreve desde navegações atlânticas até às amarguras de um Estado independente que não consegue dar ao mundo uma imagem de governação responsável, onde a classe política prima pelo seu poder autofágico, porquê discorrer longamente sobre matéria consabida, porquê mais do mesmo, porquê não ter carimbado umas memórias únicas partindo da peculiar circunstância do que viu na sua infância e juventude e experimentou na sua comissão militar? É mistério insolúvel, e assim se escrevem livros com elevada carga dececionante.

Um abraço do
Mário


Guiné-Bolama, História e Memórias, por Fernando Tabanez Ribeiro (2)

Beja Santos

“Guiné-Bolama, História e Memórias” por Fernando Tabanez Ribeiro, Âncora Editora, 2018, despertava a curiosidade atendendo à circunstância de que o autor vivera uma parte da sua juventude na Guiné, a ela regressando como oficial da Armada. Mas o relato das suas memórias não resistiu à tentação de respigar um elenco de dados históricos sobre as navegações atlânticas portuguesas, a questão da escravatura na área da Senegâmbia, a figura dos lançados, a questão de Bolama no século XIX, o relevante papel histórico do Honório Pereira Barreto, as guerras da pacificação lideradas pelo Capitão João Teixeira Pinto, a questão da religiosidade na colónia da Guiné e depois Bolama, tão carinhosamente recordada, não hesito em dizer que é o ponto alto do seu registo do que viu e sentiu e agora passa a escrito.

Nada ficaremos a saber sobre a sua comissão militar, era compreensível a expetativa, foi oficial imediato de uma Lancha de Fiscalização Grande, impossível não haver recordações que possibilitassem um arco entre o passado da sua mocidade e a prova de armas.

Entendeu o autor que se devia debruçar sobre a problemática da independência, o papel de Amílcar Cabral, o seu assassinato, o projeto de união política entre Guiné e Cabo-Verde, deplorar como a República da Guiné-Bissau se mantém um país adiado, e fazer um balanço da historiografia da Guiné e da colonização.

Começa por conjeturar o que seria o resultado que teria hoje uma sondagem à população guineense no sentido de avaliar o respetivo grau de satisfação. Para surpresa de muitos, têm sido feitos trabalhos neste domínio, aguarda-se que a antropóloga alemã Tina Kramer consiga fazer um resumo em língua portuguesa da sua tese de doutoramento sobre a reconciliação dos guineenses quarenta anos após a independência. Num resumo já publicado no blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné a cientista deixou perfeitamente claro o desapontamento de vencedores e vencidos, se estivermos a falar dos que militaram ativamente nas fileiras do PAIGC e daqueles que apoiaram a soberania portuguesa. Ninguém pode esperar regozijo dos brutais ajustes de contas, do esbanjamento e pilhagem de recursos, da má utilização dos financiamentos da cooperação e dádivas para projetos de desenvolvimento, o compadrio étnico na assunção dos cargos públicos e parcialmente nas Forças Armadas, nas execuções sumárias, na indignidade à testa dos assuntos públicos, para já não falar do acinte entre forças partidárias que põe em primeiro lugar a cupidez no exercício do mando, relegando para as calendas o bem-estar das populações. Ninguém desconhece esta situação calamitosa, Carlos Schwarz da Silva, à frente da AD, que foi uma das mais influentes ONG guineenses, contou tudo nos seus relatórios, como são exemplares os relatórios da Liga Guineense dos Direitos do Homem, basta ir ao seu site e ler o relatório Quarenta anos de impunidade na Guiné Bissau. E a própria literatura não ilude toda esta conflitualidade, basta ler o grande escritor Abdulai Silá.

A história de Amílcar Cabral, até à biografia incontornável que lhe dedicou Julião Soares Sousa, tinha uma componente mítica onde não faltavam lendas descaradas. O historiador interroga frontalmente a questão da fundação do PAI em 19 de setembro de 1956, sabendo-se, como a documentação atesta, que Amílcar Cabral nunca falou do PAI antes de 1959, mais concretamente depois de ter ido a Bissau e dividido tarefas com Rafael Barbosa. Nunca o governador da Guiné expulsou Amílcar Cabral, ele regressou a Portugal com a mulher muito combalidos com malária, não foi forçado a ir trabalhar para Angola, foi um antigo professor do Instituto Superior de Agronomia que o indicou para o projeto angolano onde trabalhou em Cassaquel, com resultados brilhantes. Um dos seus hagiógrafos, Oleg Ignatiev, pôs a circular a lenda, continua a render. Não houve fuzilamentos no congresso de Cassacá (fevereiro de 1964) por divergências ideológicas, convergem os testemunhos de que se tratava de um conjunto de guerrilheiros que procediam selvaticamente com as populações, forjando até episódios de feitiçaria para matar pessoas. Ter, como aconteceu durante décadas, acusado a PIDE de estar associada à conjura do assassinato de Amílcar Cabral, hoje é manobra completamente desacreditada. O que os arquivos da PIDE mostram e o próprio Fragoso Allas, ao tempo seu dirigente confirma, é que tinha sido montada uma rede de informação ao mais alto nível em Conacri, Dakar e Ziguinchor, sobretudo, os comerciantes deslocavam-se nesses círculos e colhiam informações valiosas, transmitiam com regularidade as notícias do acréscimo de tensões entre guineenses e cabo-verdianos. É chão que deu uvas incriminar a PIDE, como as coisas são nunca aparecerão as peças fundamentais do processo e temos que acreditar no que escreveram Óscar Oramas, Bobo Keita e Aristides Pereira, este na última fase da sua vida. A lenda do assassinato ainda faz o seu percurso, continua-se a falar em Sekou Touré como instigador do assassinato, ele que no início da manhã daquele dia 20 de janeiro de 1973 enviou um embaixador até Amílcar Cabral avisando-o que estava iminente um golpe, Cabral desvalorizou. Quanto ao significado do ditador da Guiné Conacri ter recebido, a altas horas da noite, os conjurados, como poderia ser de outra maneira? O complô ocorre em território estrangeiro, basta ter dois dedos de testa para perceber que os conjurados precisavam de se legitimar, saiu-lhes o tiro pela culatra. O resto é lenda.

E quanto a um outro tipo de solução que conduzisse a uma transição mais frutuosa para a Guiné, é esquecer que Salazar e Caetano recusaram qualquer entendimento com os dirigentes do PAIGC, está tudo escrito, é comovente responsabilizar a forma insensata como se deu a transferência de soberania, os próprios dirigentes do PAIGC lembram que foram instigados pelos dirigentes do MPLA e da FRELIMO, tinham que ser completamente independentes já para que os processos de descolonização não entravassem em delongas neocoloniais, os dirigentes do PAIGC aceitaram a governação do país sem dinheiro nem quadros, vinham encadeados pelo sonho da ajuda socialista, o sonho caiu na água. Tudo isto é já conhecido, questiona-se o que leva Tabanez Ribeiro a recuperar a história devidamente anotada.

Não se pode deixar de saudar o ato de coragem do autor no enaltecimento que faz de René Pélissier, é de facto o mais influente historiador de língua francesa sobre os acontecimentos coloniais portugueses, a despeito de verrinas e de algumas injustiças que comete, uma das quais o autor recorda pela sua gravidade, a maneira como Pélissier desconsidera Marcelino Marques de Barros, um pioneiro da cultura, da língua, da etnografia e da etnologia guineenses. Concorda-se com a sua opinião quanto à importância do levantamento documental feito por Hermano Tavares da Silva quanto à presença portuguesa na Guiné, história política e militar entre 1878 e 1926. É um grande trabalho, de facto, mas onde há dois erros palmares, inacreditáveis, ao dizer que se constata neste período ter havido uma espécie de luta de classes entre o Governo/administração e os comerciantes e de que alguns levantamentos deste período preludiam o que vem a acontecer com a luta armada, não há qualquer sintonia possível entre guerras localizadas e o projeto de independência de que Amílcar Cabral foi a bandeira. Mas também os grandes estudiosos cometem os seus dislates, é preciso é não os aplaudir…
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Notas do editor

Poste anterior de 19 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18434: Notas de leitura (1050): “Guiné-Bolama, História e Memórias”, por Fernando Tabanez Ribeiro; Âncora Editora, 2018 (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 23 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18451: Notas de leitura (1051): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (27) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 19 de março de 2018

Guiné 61/74 - P18434: Notas de leitura (1050): “Guiné-Bolama, História e Memórias”, por Fernando Tabanez Ribeiro; Âncora Editora, 2018 (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Março de 2018:

Queridos amigos,
Não se trata de uma expetativa defraudada, se bem que o autor possui um currículo que lhe teria permitido uma obra abalançada entre as suas recordações da juventude (escritas com nostalgia e candura, adiante-se) e a sua experiência militar ao serviço da armada, entre 1971 e 1973.
Entendeu Tabanez Ribeiro tecer considerações da sua lavra mexendo (melhor, remexendo) em matéria consabida, conta-nos o que vem em dezenas e dezenas de livros, mesmo quando é agradável ouvi-lo exaltar momentos de enorme dimensão colonizadora como foi a governação do Comandante Sarmento Rodrigues. São esparsos, apesar de alguns deles muito interessantes, estruturalmente desequilibrados, basta pensar na quantidade de prosa dedicada aos pioneiros da aviação, omitindo-se a evolução das infraestruturas, por exemplo. Mas uma coisa vos digo, poucas vezes se faz uma leitura tão intensa das nossas recordações de infância como as que ele nos dá de Bolama, nem a Fernanda de Castro, que ali viveu com o pai, capitão de porto, foi tão capitosa nas suas memórias.

Um abraço do
Mário


Guiné-Bolama, História e Memórias, por Fernando Tabanez Ribeiro (1) 

Beja Santos

Cada um de nós é um produto de circunstâncias e Tabanez Ribeiro teve a singularidade de fazer a escola primária e o antigo 1.º ciclo dos Liceus na modalidade de ensino particular em Teixeira Pinto e Bolama, tirou o curso de Engenharia Química em Lisboa e cumpriu o serviço militar na Armada entre 1971 e 1973, tendo sido mobilizado para a Guiné como oficial imediato de uma Lancha de Fiscalização Grande. Foi pois com a maior das curiosidades que me atirei à leitura do seu livro “Guiné-Bolama, História e Memórias”, Âncora Editora, 2018.

Começo pela exultação daquilo que considero a originalidade do seu testemunho, a Bolama da sua meninice, a descrição da cidade, a localização dos edifícios, as pessoas, o funcionalismo, os comerciantes, as figuras típicas, as brincadeiras, o cinema, a praia de Ofir, lê-se e é percetível a saudade e a ternura que perpassam por aquelas páginas, não lhe resisto a transcrever o que ele escreve com o título de “A rapaziada”:
“À tardinha, já pela fresca, por volta das cinco da tarde, chegava a hora da brincadeira e lá ia eu, porta fora. Passava em primeiro lugar pelas vendedeiras alinhadas junto ao portão do mercado, do lado da Praça do Fontanário (ou da Imprensa), a quem comprava uma ou duas medidas de mancarra, com que enchia os bolsos dos calções, e então ala, era saltar e correr a caminho do porto, ao encontro da rapaziada, saboreando os amendoins torrados.
Recordo, especialmente de entre os meus companheiros, uns vivos e outros já falecidos: o Luís Augusto R. F. Júnior e o irmão Eduardo Fernandes, o António Júlio Estácio e a irmã Guida(inha), o Jaime(inho) Cabrita e o irmão Fernando, o Júlio Vilela, o Anwar Saad e a irmã Hedla, o Hélder Barbosa e a irmã Guida, o Tozé Pinto e o irmão Rui, os manos José Francisco (Zeca) e o Carlos Eduardo Castro Fernandes (Carlitos), o Elgar do Rosário e a irmã, os manos António Fernando Almeida, João e Miguel por ordem de idades, o Jorge Rivière e as irmãs Maria Alexandra e Nani, o Vítor Alvoeiro Neves, o Cécil e o irmão Ildo, o Alexandre e os seus irmãos guinéus da família Nunes Correia, etc. Rapazolas mais velhos eram o Zezé Macedo, o Campitche, às do futebol local e ídolo da criançada miúda, o Romualdo, o Petronilho, o Lourenço Pina (Lorencinho) e muitos mais.
Havia inúmeros locais de brincadeira para além do Porto, a exemplo do Parque Infantil, dos recintos cimentados para o basquetebol na área anexa à Administração e nos Bombeiros para a patinagem, ou ainda em casa uns dos outros ou onde calhava.”

Com este percurso curricular, era esperável que o autor contrapusesse com o seu regresso à Guiné e da sua experiência militar nos desse conta, era o arco perfeito para uma narrativa sem precedentes na nossa literatura, parece-me. Mantém-se o enigma, após duas leituras que fiz ao seu documento: a que público, em que sala de conversa ele se põe para falar de uma história da Guiné aos solavancos, glosando descrições já referenciadas em inúmeras obras, tudo contado até à exaustão, tudo documentado e conhecido? Não se consegue entender.

Cada um é livre de forjar o seu auditório com as navegações atlânticas dos portugueses, com negócios dos escravos, com a existência dos “lançados”, a ação de Honório Pereira Barreto, a questão de Bolama, a Liga Guineense, as campanhas Teixeira Pinto e a colaboração de Abdul Indjai, seja. Como o autor cita na sua bibliografia que consultou obras recentes, é de questionar se não se deve relevar documentação científica abonatória do que era a Guiné quando lá chegaram os portugueses. O historiador guineense Carlos Lopes tem publicado a sua tese de doutoramento “Kaabunké – Espaço, Território e Poder na Guiné-Bissau, Gâmbia e Casamance Pré-Coloniais”, editado pela Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Lisboa, 1999, há igualmente a Guiné da literatura de viagens, logo com André Alvares de Almada, o mais primoroso de todos pelo vigor descritivo, a Guiné é muito mais do que aquilo que consta em Zurara, Donelha e Lemos Coelho, historiadores como José Silva Horta e Eduardo Costa Dias abriram janelas para a presença portuguesa na Senegâmbia a partir do século XVI, repertoriaram trocas civilizacionais de grande importância, património da historiografia luso-guineense de valor incalculável. Não se percebe igualmente por que é que surge a preocupação em voltarmos a falar no tráfico de escravos para desassombrar a colonização portuguesa não foi pioneira na escravatura. No prefácio do livro, o general Sousa Pinto vem dizer:  
“Considero muitíssimo interessante e em conformidade com o que se acaba de dizer a abordagem histórica feita sobre a escravatura na área do Golfo da Guiné onde, ao contrário do que o politicamente correto em História nos tem vindo a querer convencer, se mostra claramente que, sendo sem dúvida Portugal nesta época o pioneiro do comércio escrava entre a África, as Américas e a Europa enquanto deteve o monopólio da navegação nesta área geográfica, são atores principais e parceiros no negócio os reis, régulos e potentados locais, negócio em que logo se foi larguissimamente ultrapassado por Holandeses, Franceses, Ingleses e até mesmo por Espanhóis que forneciam e financiavam os navios para o transporte e pagavam aos negreiros portugueses e cabo-verdianos fora da lei que, em contrapartida, lhes asseguravam toda a logística e os contatos com os negociantes e angariadores no terreno”.

Há dezenas de anos, desde o trabalho incontornável de Vitorino Magalhães Godinho que se sabe tudo isto. Ainda recentemente, o historiador Arlindo Caldeira no seu livro “Escravos e Traficantes no Império Português: O Comércio Negreiro Português no Atlântico durante os Séculos XV a XIX”, Lisboa, Esfera dos Livros, 2013, descreve primorosamente o tráfico negreiro e todos os seus agentes, tanto na região da Senegâmbia como mais abaixo, no Golfo da Guiné, não se sabe de que fantasma do politicamente correto se pretende falar quando a historiografia tem vincado a natureza do tráfico em toda a sua amplitude.

Não temos qualquer narrativa sobre a comissão militar de Tabanez Ribeiro mas ele vai tecer considerações sobre a luta de libertação, o assassinato de Amílcar Cabral, tecerá vastas referências à historiografia da Guiné e da colonização, há sérios reparos a fazer-lhe.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 16 de Março de 2018 > Guiné 61/74 - P18423: Notas de leitura (1049): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (26) (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 15 de março de 2018

Guiné 61/74 - P18417: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (50): Adelise Azevedo, de 14 anos, a viver em Wattrelos, no norte da França, neta do ex-combatente José Alves Pereira (CCAÇ 727, Bissau, Nova Lamego, Canquelifá, Piche, 1964/66) agradece a nossa ajuda para a realização de um trabalho escolar sobre a história do conflito que opôs o PAIGC e as Forças Armadas Portuguesas entre 1963 e 1974



França > Wattrelos > Colégio "Saint Joseph  La Salle" > Proposta de trabalho escolar para efeitos de avaliação em EPI  [Ensinamentos Práticos Interdisciplinares] "Passeurs de Memoire", apresentada a (e aceite por) os professores das disciplinas de Geografia e História. Nome da aluna: Adelise Azevedo [, 14 anos]. Ano/turma: 3D

Título do projeto: "A guerrilha na Guiné-Bissau (1963-1974)". 

Descrição detalhada: criação de um livro ilustrado com fotos sobre o conflito que opôs o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde [PAIGC] e as forças armadas portuguesas; inclui o testemunho do meu avô que foi soldado na Guiné, então portuguesa, de 1964 a 1967".

Apresentação, oral, individual,marcada para 16 de maio de 2018.  Assinatura da aluna. Assinatura dos pais. Data: 19/11/2017



França > Wattrelos > Colégio "Saint Joseph  La Salle" > Informação para a aluna / estrutura da prova e critérios de avaliação. O trabalho,  a ser avaliado por  um júri de pelo menos 2 docentes, consiste numa prova oral de 15 minutos: apresentação (5 m) e discussão do trabalho (10 minutos). A avaliação (100 pontos) é assim distribuída: 50 pontos para o domínio da expressão oral (neste caso em francês)  + 50 pontos para o domínio do assunto.

Infografia: Adelise Azevedo / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)


1. Resposta da nossa leitora Adelise Azevedo (*), com data de 11 do corrente:

Agradeço-lhe da atenção que você tem concedido ao meu pedido. Você não pode imaginar a alegria que senti quando eu vi que você respondeu a minha mensagem.

Eu queria agradecer também o seu camarada e critico literário, Senhor Mário Beja Santos. O livro que ele me enviou em pdf será um elemento de trabalho essencial para a realização do meu projeto de exame. Apenas lendo as primeiras frases do livro encontro o tema principal do exame « PASSEURS DE MEMOIRES » (« à memória de Ruy Cinatti, a quem prometi, logo em 1970, que trataria com carinho este dever de memória, incluindo os testemunhos literários de combatentes e estudiosos. »).

Quando ele evoca o amigo dele que possui uma biblioteca surpreendente em tesouros da história e da literatura guineenses, faz me lembrar quando eu era pequena e ainda hoje, que a minha mãe [, Isabel Pereira,] me dizia « Adelise, toma cuidado dos teus livros porque eles são tesouros. »

Eu vou seguir os seus preciosos conselhos, fazendo pesquisa no link que você me comunicou e no blogue Luis Graça & Camaradas da Guiné.

Eu li a sua mensagem ao meu avô, ele ficou muito emocionado… e ele não era o único, toda a minha família ficou afetada por sua gentilidade [gentileza] e consideração…

O meu avô já me tem contando alguns episódios de momentos que ele passou na Guiné, são sempre momentos fortes em emoção… E com muita alegria que vamos lhe mandar, o meu avô e eu, uma foto de nós os dois.

Meus professores validaram a escolha do meu projeto (ver anexo) [, acima reproduzidos, com a devida vénia...]. Eu vou ter que passar uma prova oral na frente de um júri. Eu tenho que explicar como é que eu fiz para con[se]guir obter informações sobre o meu tema. Tenho que realizar a prova oralmente, com recurso a suporte. Minha professora de História Geografia (Madame Fourrier) está ansiosa de descobrir o conteúdo da minha realização, descobrir este período da história da Guiné, que não é muito conhecido dos meus professores na França.

Eu vou fazer um livro que incluirá toda a história da guerrilha na Guiné ilustrado com imagens e fotos…Vou também incluir uma parte, que se referirá a história da Guiné antes de ser uma colónia portuguesa. Este livro vai ser o meu suporte durante a minha prova.

Eu escrevo para você em português com a ajuda dos meus pais. eles dizem que às vezes eu falo e escrevo PORTUGNOL (meio português e meio espanhol). E você tem razão, falar e escrever português, é muito importante para o meu futuro e também é um grande tesouro.

Eu também devo no dia do meu exame dizer o que esse trabalho permitiu-me de aperfeiçoar no meu conhecimento e competência em certas disciplinas.

Eu percebi que a Língua portuguesa é muito importante na realização do meu projeto. Tem outras disciplinas como a Geografia, o Francês (escrito / oral) e a História.

Um grande beijinho para você e para as pessoas que você meteu em cópia da mensagem, principalmente para o senhor Mario Beja Santos.

Obrigado novamente por sua preciosa ajuda…

Adelise


2. Resposta do editor LG / Réponse de l'éditeur LG:

Parabéns, Adelise, a ti, à tua mãe Isabel Pereira, ao teu avô e nosso camarada da CCAÇ 727, José  Alves Pereira. Pela originalidade e o desafio do projeto.  Pelo teu entusiasmo. Pelo amor que tens aos teus pais, avós e às suas raízes, a velha nação que se chama Portugal. Parabéns também pelo teu português...

Vamos ver se te arranjamos mais materiais, nomeadamente mapas, fotos e resumos cronológicos.  Não queremos que te percas com tanta informação. E estamos certos de que vais tirar uma bela nota no exame de EPI (Ensinamentos Práticos Interdisciplinares). 

Um beijinho para ti, um "alfabravo" (ABraço) para o teu avô materno Pereira. Esperamos pelas vossas fotos...

Salut, Adelise, je te félicite, à toi, à ton collège, à tes enseignants, aussi à ta mère Isabel Pereira, à ton grand-père, José Alves Pereira, notre camarade de la compagnie de chasseurs de infanterie 727 (Guinée portugaise, 1964/66),

Je te félicite pour l'originalité et le défi de ton projet, l’enthousiasme, et surtou l'amour pour ta famillie qui n'oublie pas ses racines, c'est à dire, l'ancien et beaux pays qui s'appelle le Portugal. Félicitations aussi pour ton portugais écrit.

Nous irons trouver et t'envoyer d’autres supports d’information, utiles pour toi, y compris des cartes, des photos et des résumés chronologiques. Nous ne voulons pas que tu t' effondres avec d' autant d'information. Nous sommes sûrs que Madame Fourrier te donnera une belle note, le 16 mai prochain, à la suite de l'examen d’ EPI.

Bisou pour toi, un "alfabravo" [Abraço] pour ton grand-père maternel Pereira. Nous attenderons vos photos de famille.  Luís Graça,
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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 8 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18392: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (49): Adelise Azevedo, de 14 anos, a viver em Wattrelos, no norte da França, neta do ex-combatente José Alves Pereira (CCAÇ 727, Bissau, Nova Lamego, Canquelifá, Piche, 1964/66) pede-nos bibliografia e outra documentação para um trabalho escolar, "Passeurs de Mémoires", sobre a guerra colonial na Guiné