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sexta-feira, 28 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24261: Palavras fora da boca (3): As nossas santas ingenuidades... A propósito da violència do PAIGC nas "áreas libertadas" (Luís Cabral / Luís Graça / António Graça de Abreu / António Rosinha / Cherno Baldé)


República da Guiné > Conacri > c. 1960  > Dirigentes do PAIGC, junto ao Secretariado Geral: da esquerda para a direita:  (i) Osvaldo Vieira, (ii) Constantino Teixeira, (iii) Lourenço Gomes e (iv) Armando Ramos. 

O Osvaldo Vieira (1938-1974), também conhecido como "Ambrósio Djassi" (nome de guerra), terá morrido, de doença,  dizem,  por complicações pós-operatórias, em  31 de março de 1974 (não num hospital da ex-URSS, mas na base do PAIGC, em Koundara, Guiné Conacrii), e  sobretudo com a terrível suspeita de ter estado implicado na conjura contra Amílcar Cabral... Era primo do 'Nino' Vieira... Ironia(s) suprema(s):  repousam os dois, o Amílcar e o Osvaldo, lado a lado, na Amura; e o seu nome (e não o de Amílcar) foi dado ao Aeroporto Internacional de Bissau, em Bissalanca...

Recorde-se que o "estado-maior" do PAIGC instalara-se em Conacri em maio de 1960. A foto deve ser do ano de 1960, já que em janeiro de 1961 Osvaldo Vieira e Constantino Teixeira faziam parte do grupo de futuros históricos comandantes, mandados por Amílcar Cabral para a  Academia Militar de Nanquim, na China, para receber treino político-militar. Uns meses antes, em agosto de 1960. Amílcar Cabral em pessoa tinha-se deslocado a Pequim para negociar o treino dos quadros do PAIGC na Academia Militar de Nanquim.  

No grupo de quadros do PAIGC que vão nesse ano para a China incluem-se, além dos supracitados Osvaldo Vieira e Constantino Teixeira, os nome de João Bernardo Vieira ['Nino'], Francisco Mendes, Pedro Ramos, Manuel Saturnino, Vitorino Costa [irmão de Manuel Saturnino],  Domingos Ramos [irmão de Pedro Ramos e amigo do nosso Mário Dias], Rui Djassi, e Hilário Gomes.

Foto (e legenda): Fundação Mário Soares > Casa Comum > Arquivo Amílcar Cabral  > Pasta: 05222.000.084 (adapt por Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, 2018, com a devida vénia...)


1. Seleção de comentários ao poste P24232 (*)... A questão da "violência" (policial ou militar) no TO da Guiné, antes, durante e depois da guerra, dá pano para mangas... Mas está longe de estar (bem) documentada no nosso blogue (Pijiguiti, Samba Silate, Cassacá, chão manjaco, Conacri, Boé, Bambadinca, Cumeré, Porto Gole...).

É um tema "delicado", para não dizer "tabu" e "fracturante",  para um blogue de antigos combatentes. Está mal documentada de um lado e do outro do conflito.

Por exemplo, do lado do PAIGC:  "A luta foi difícil, mas nunca pensei em abandonar. Quanto aos desertores, a lei do Partido exigia que fossem executados… Era a lei militar” (p. 67) (**, disse  Bobo Keita  no livro de Norberto Tavares de Carvalho, "De campo a campo: conversas com o comandante Bobo Keita /Edição de autor, Porto, 2011, 303 pp., posfácio de António Marques Lopes) .

Nas suas memórias ("Crónica da Libertação", Lisboa, o Jornal, 1984) (memórias que vão até ao assassinato do líder do PAIGC, em Conacri, em 20 de janeiro de 1973), Luís Cabral também não esconde que o Partido (sic) resolveu graves conflitos internos com execuçóes sumárias e públicas, como por exemplo, em  fevereiro de 1964, em Cassacá (pág. 190).  sobre

Nem esconde também a violência que era exercida sobre as populações civis sob controlo do PAICC (mas também sobre combatentes e até dirigentes), como no caso do Morés, em fevereiro de 1966. Violència nas suas diversas formas (incluindo a violència sexual)...

 Violência essa que escapa à "santa ingenuidade" de todos os observadores estrangeiros ocidentais  que são convidados a "visitar as áreas libertadas", dos nórdicos (suecos, noruegueses, holandeses) aos italianos e franceses... para não falar dos oriundos dos países "não-alinhados",  os do "bloco soviético", sem esquecer os da China e de Cuba...Todos (a começar pelos médicos cubanos, talvez os mais cínicos)  levavam "vendas nos olhos" ou "óculos cor de rosa", como é normal em situações de conflito em que  se polarizam as posições... Ontem como hoje, a verdade é sempre a primeira grande vítima dos conflitos armados... 

Claro, neste caso, nem o governo português de então nem o Amílcar Cabral convidavam observadores independentes (a começar pelos jornalistas) para ver o que se passava no "terreno"...  Mas ambos sabiam da enorme importância que tem/tinha a "propaganda"... E nessa matéria Amílcar Cabral era uma mestre: foi muito mais hábil que os nossos "cabos de guerra", do Arnaldo Schulz ao António Spínola, para não falar do Bettencourt Rodrigues (que foi mais um erro de "casting")... De qualquer modo, temos que ter em conta a conjuntura histórica, geopolítica, da época, muito mais favorável ao discurso anti-colonialista e anti-imperialista...

(i) Tabanca Grande Luís Graça:

"O Amílcar Cabral era bom de mais", dizia o Osvaldo Vieira...

(...) Apesar da receção calorosa que ele e os cineastas italianos (***)  tiveram no Morés, o Luís Cabral (LC) não deixa de experimentar um sentimento de isolamento e desconforto: 

“Quando eu decidia mandar chamar um ou outro camarada que conhecia bem, ficava com a sensação de que ele não estava à vontade, parecia ter medo de qualquer coisa” (pág. 262).

LC irá constatar, algum tempo depois, que a “disciplina rigorosa” que prevalecia na base, por alegadas razões de segurança, implicava também o recurso (frequente) a “castigos corporais”, a única maneira de prevenir a deserção de populações e guerrilheiros.

LC ficou impressionado com uma cena que observou, de um grupo de um dezena de homens e de uma mulher com o filho ao colo. Os homens tinham as mãos inflamadas das palmatoadas que acabavam de receber, castigo de que escapara a mulher por causa da criança (uma vez que a tinha de transportar).

LC terá ficado indignado, argumentando que o AC nunca aprovaria o uso de “castigos corporais”, prática que associava ao colonialismo

O Osvaldo Vieira “insistia que a nossa gente não compreendia outra linguagem e que o Amílcar era bom de mais” (sic)… e que não se agissem assim, com dureza, quer em relação aos combatentes, quer em relação à população, nos casos de infração às regras estabelecidas, “estavam perdidos” (sic) (pág. 265). (Negritos nossos)

É uma delícia, esta explicação, a do Osvaldo Vieira, deitando por terra o “mito” das “regiões libertadas”…

19 de abril de 2023 às 13:08

(ii) Antonio Graça de Abreu:

Afinal a "disciplina rigorosa" exercida pelo PAIGC sobre a população pobre das "regiões libertadas": Palmatoadas, mãos a sangrar, violência primária sobre um humilde povo que apenas desejava pão e dignidade, e viver em paz!

Posso imaginar o sofrimento de Amílcar Cabral, resguardado na outra Guiné-Conacri, distante das "regiões libertadas". No aparente conforto, no seio dos seus correligionários, em Conacri. Se Cabral não foi ingénuo, morto pelos seus próprios homens, em Conacri, foi o quê?

19 de abril de 2023 às 14:38

(iii) Cherno Baldé:

Eu li o livro "Crónicas da libertação" do Luós Cabral em 1989, precisamente quando estava de férias em Lisboa, mas, se a memória não me falha,  o cenário que o LC descreveu foi de um grupo de pessoas (civis) que eles encontraram amarradas com cordas, estando alguns com os membros inchados e que ele teria mandado desamarrar e, tendo confrontado o caso as pessoas presentes no local, disse que ninguém teve coragem de indicar quem tinha sido o mandante que, tudo indicava, seria o Comandante Osvaldo Vieira que reinava em chefe absoluto na zona Norte. 

No fim, o LC afirmava, no livro, que ainda não tinha chegado o tempo para se falar de todas as verdades da luta do PAIGC. O livro tinha sido publicado em 1984, salvo erro.

Levar a cabo uma guerra como o fez o PAIGC por mais de 10 anos não é uma brincadeira de crianças nem de ingénuos ou inocentes, por isso e para que a luta não resultasse num redondo fracasso, foi preciso combinar a "bondade" do Amílcar Cabral com a dureza vs crueldade do Osvaldo Vieira e no final, esta última acabou por prevalecer, da mesma forma como acontece com todas as boas intençóes. 

Como disse um filósofo inglês do século XIX , "Tentem fazer o bem e as forças do mal prevalecem"

19 de abril de 2023 às 16:46
 
(iv) António Rosinha:

António Graça de Abreu, a maioria dos dirigentes dos partidos ganhadores das primeiras independências dos anos 60 em África, ou se liquidaram uns aos outros, ou escaparam a atentados, sendo eles a matar os outros.

Os que foram assassinados, tal como Amílcar Cabral, não foi por serem "ingénuos". Eles apenas arriscaram, deram o peito às balas, só que Cabral arriscou mais que qualquer outro.

Pela sua condição de ser visto como um cabo-verdiano pelos guineenses, que facilmente ficou "desarmado" quando Spínola pôs em prática a política da Guiné para os guinéus, foi com muito risco consciente que ele corria, tanto que ele mencionou as traições a que estava sujeito, dentro do próprio partido.

Mas sobre Cabral e outros "não indígenas" das ex-colónias portuguesas que optaram por formar os tais partidos ganhadores, tiveram a sua lógica anti-colonialista e simultaneamente anti-salazarista, mas haveria muito a escrever sobre eles, mas seria também muito chato.

20 de abril de 2023 às 00:59 

(v) Tabanca Grande Luís Graça:

Cherno, só agora, em 2023, li o livro do Luís Cabral, "Crónica da Libertação", edição de "O Jornal", Lisboa, 1984, 464 pp. Livro brochado, uma encadernação horrível, que se desconjunta toda. A editora já não existe, o livro é difícil de encontrar, a não ser talvez nos alfarrabistas e, claro, nalgumas bibliotecas públicas.

A cena da violência contra um grupo de população civil na "base central" do Morés encontra-se descrita nas pp.265/270. Isto passa-se por ocasião da visita, à região Norte, do realizador italiano Piero Nelli, na 1ª quinzena de fevereiro de 1966: vd. pp. 259/270. (É o autor do filme "Labanta, Negro!", premiado no Festival de Veneza desse ano.)

O Osvaldo Vieira (OV) era o responsável da Frente Norte (pág. 259). O comissário político da Inter-Regiáo do Norte era o Chico Mendes, membro do Bureau Político (tal como o Luís Cabral, LC (pág. 260). O Osvaldo trabalhou na Farmácia Moderna (diretor técnica, a dra.Sofia Pomba Guerra) (pág. 260). O Inocèncio Kani (IK), o futuro assassino de Amílcar Cabral (AC), era o "responsável da base" (pág. 267): encontrava-se pela primeira vez com o LC, tendo mostrado "um comportamento um tanto reservado". 

LC também conheceu dessa vez o Simão Mendes, enfermeiro no tempo colonial, responsável da saúde (que viria a seguir num bombardeamento à base).

Numa visita à base, o OV diz ao LC que ali teve que se impor "uma disciplina rigorosa, para neutralizar o mal que o inimigo podia fazer-lhes, partindo dos vários quartéis da região"...

É nessa visita, já depois das filmagens da fracassada emboscada, em 11/2/1966 (cito de cor), às NT na estrada Mansoa-Mansabá (que estava a ser alcatroada) e que fora preparada para "italiano ver e filmar"), o LC deu conta da existència de um pequeno grupo de civis que tinham sido maltratados:

(...) "Num pequeno largo da base, estava o Inocèncio e mais alguns camaradas de um lado, enquanto que do outro vi aproximadamente uma dezena de de homens e uma mulher com o filhinho no braço" (pág. 265).  

OV explicou "que se tratava de prisioneiros, apanhados quando se dirigiam aos quartéis inimigos da região" (sic).

"Olhando com mais atenção para os homens, verifiquei que tinham as mãos inflamadas", chamando a atenção do OV para isso. 

"Respondei que a lei estabelecida na inter-reiáo era essa e que a a mulher só tinha escapado porque tinha de carregar o filho e não podia por isso receber as palmatoadas" (sic).

O LC diz que ficou "muito impressionado com esta cena" e esperou a oportunidade para falar com o OV. Ele estava "absolutamente seguro" de que o AC "nunca daria o seu acordo a tal forma de proceder" (pág. 265)...

O OV "insistia que a nossa gente não compreendia outra linguagem e que o Amílcar era bom de mais", e que "estavam perdidos" (...) "se não agissem com dureza" tanto em relação aos combatentes como á população civil...

Na pág. 268, LC conclui que "a disciplina em Morés era (...) imposta em grande parte pela força"... e que o responsável da base, o IK, era criticado, por todos, pela sua dureza, "que muitas vezes chegava a atingir a malvadez"... Mas ele beneficiava da "confiança total" do OV... (pág. 268)...

Enfim, chega de citações, Cherno, e tira as tuas conclusóes. (Nada disto, claro, transparece no filme, de propaganda, do camarada Piero Nelli.)

19 de abril de 2023 às 22:48
 
(vi) António Graça de Abreu:

Também fui ingenuamente ingénuo. Eis a Prova, escrito há quarenta e sete anos::

Pequim, 25 de Outubro de 1977

Nas Edições de Pequim em Línguas Estrangeiras, secção portuguesa, o camarada Fu Ligang trabalha na mesma sala que eu, na mesa mais pequena, à minha direita. É uma espécie de meu secretário. O Fu estudou português em Macau, numa leva de 60 ou 70 jovens chineses que em 1964 a República Popular enviou quase secretamente para Macau, a fim de estudarem a língua de Camões.

O Fu Ligang adquiriu excelentes conhecimentos de português. Teve um professor que nunca esqueceu com o nome de Júlio Pereira Dinis. Responsável e trabalhador -- creio que é membro do Partido Comunista da China --, hoje de manhã perguntou-me:

“Então, camarada António, está a gostar de viver em Pequim, está satisfeito com a China que veio encontrar”?

Assumindo os meus antecedentes meio comunistas, na versão meio maoista, ainda com meia convicção política, respondi-lhe mais ou menos nos seguintes meios termos:

“Sim, vim encontrar um país a crescer, um povo simpático e tenho boas condições de vida e de trabalho aqui em Pequim. Depois, estou a dar o meu pequeno contributo para ajudar a construir o socialismo, para a criação do homem novo, para a construção de uma sociedade mais justa e de um mundo melhor”.

O Fu Ligang ouviu o meu discurso impassível, um levíssimo sorriso a aflorar nos lábios e, passados uns longos segundos, olhou-me pelo canto do olho e disse-me, em excelente português:

“O camarada é ingénuo.”

E não houve mais conversa. Durante o resto da manhã debruçámo-nos sobre os textos a traduzir e a corrigir.

O Fu deve ter razão. Nestes meus quatro anos de Pequim, vou tentar entender e digerir a minha ingenuidade.

20 de abril de 2023 às 13:34

[Seleção / Revisão e fixação de texto / Subtítulo / Itálicos / Negritos: LG] (****)
___________



(****) Último poste da série > 26 de abril de  2023 > Guiné 61/74 - P24252: Palavras fora da boca... (2): "Prós insultos não há contemplações nem indultos"... e também: "Quem não tem poilão, acolhe-se à sombra do chaparro"... Proverbiário da Tabanca Grande, 5ª edição revista e aumentada

sábado, 30 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P21023: Notas de leitura (1286): "A batalha do Quitafine: a contraguerrilha antiaérea na Guiné e a fantasia das áreas libertadas", edição que acaba de sair do antigo ten pilav José Nico, BA 12, Bissalanca, 1968/70

Capa do livro do ten gen pilav ref José Francisco Nico, "A batalha do Quitafaine" (Lisboa, edição de autor, 2020, 384 pp) (*).  Profusamente ilustrado, com 88 fotografias e 42 infografias / mapas. O livro pode ser adquirido através do seguinte endereço de email: batalhadoquitafine@sapo.pt . Preço de capa: 20 € (portes de correio registado: 5 €).



1. Mensagem de José Matos, com data de hoje, às 3:20:


Olá, Luís

Mando-te um pequeno review do livro do Nico que saiu esta semana e que já tenho em mãos. Quando puderes publica.
Ab


2. Nota de leitura, por José Matos:

A Batalha do Quitafine

O livro que o TGen José Nico  [José Francisco Nico, ex-ten pilav, BA 12, Bissalanca, 1968/70] (**) acabou de lançar sobre a batalha do Quitafine na Guiné é uma obra de grande interesse para quem quiser conhecer de viva voz o relato de um operacional que esteve diretamente envolvido na guerra
contra as antiaéreas que se travou naquela região da Guiné entre 1967 e 1970.

Antigo piloto de Fiat G.91 participou em várias das operações que a Força Aérea levou a cabo para desarticular o dispositivo antiaéreo que o PAIGC instalou naquela zona. Lendo o livro podemos perceber as táticas que foram usadas, os meios aéreos e as dificuldades enfrentadas.

O livro é ricamente ilustrado não só por fotos, como também por mapas e esquemas e outras ilustrações elaboradas por Paulo Alegria, um ilustrador conhecido na área, que tornam o livro muito mais interessante e permitem perceber como as operações eram executadas. 

Em suma, o autor relata como é que os pilotos portugueses conseguiram eliminar sistematicamente o armamento antiaéreo do PAIGC, tornando os guerrilheiros incapazes de restringir a liberdade de acção dos meios aéreos portugueses e esse foi o resultado final da batalha do Quitafine. 

Parece-me evidente que este livro vai tornar-se numa referência para quem quiser analisar o papel da Força Aérea no combate à guerrilha do PAIGC no período em que o autor esteve na Guiné. (***)

Como se trata de uma edição de autor os pedidos para a compra desta obra devem ser feitos diretamente para o seguinte mail:

batalhadoquitafine@sapo.pt
José Matos

[Investigador independente em História Militar, tem feito pesquisas sobre as operações da Força Aérea na Guerra Colonial portuguesa, principalmente na Guiné. É colaborador regular em revistas europeias de aviação militar e de temas navais. Colaborou nos livros “A Força Aérea no Fim do Império” (Lisboa, Âncora Editora, 2018) e "A Guerra e as Guerras Coloniais na África Subsariana" (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2019). É autor, com Luís Barroso, do livro, a sair brevemente, "Nos meandros da guerra: o Estado Novo e a África do Sul na defesa da Guiné" (Lisboa, Editora Caleidoscópio, 2020). É membro da nossa Tabanca Grande desde 7 de setembro de 2015, tendo cerca de 3 dezenas e meia de referências no nosso blogue]

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Notas do editor:

(**) Embora não sendo formalmente membro da nossa Tabanca Grande (, embora se mantenha de pé o convite do nosso editor), o ten gen ref José Nico tem cerca de 2 dezenas de referências no nosso blogue, e temos convivido, com alguma regularidade,  no âmbito da Tabanca da Linha... Vd. aqui alguns postes, da sua autoria:

sábado, 16 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19592: (D)o outro lado do combate (48): A Missão Especial da ONU na Guiné - Abril 1972 (António Graça de Abreu / Luís Graça) - III (e última) Parte: capa + pp. 9-11.


1. Terceira e última parte do relatório, de 11 (onze) páginas, policopiado, que tem por título em português "A Missão Especial da ONU na Guiné - Abril de 1972" (*). 

Trata-se de uma versão, mais resumida do original, "Report of the Mission of the United Nations Special Committee on Decolonization after visiting the liberated Areas of Guinea-Bissau (A/AC. 109/L. 804; 3 July 1972)".

A cópia, em papel, de que dispomos foi-nos fornecida, com vista a uma eventual publicação no blogue, pelo nosso camarada António Graça de Abreu, por volta de 2010, na sequência dos comentários ao poste P5680 (*).

O documento de que publicamos agora  as três últimas páginas (9, 10 e 11)  parece corresponder à seguinte referência que encontramos na base de dados bibliográfica do CIDAC - Centro De Intervenção Para O Desenvolvimento Amílcar Cabral:


BAC-051/2
CIDAC

BORJA, Horácio Sevilla ; LOFGREN, Folke ; BELKHIRIA, Kamel
A Missão especial da ONU na Guiné Bissau, Abril 72 / Horácio Sevilla Borja, Folke Lofgren, Kamel Belkhiria . - [S.l.] : PAIGC, 1972. - 11 p


A edição é atribuída ao PAIGC. Mas as partes traduzidas em (mau) português correspondem ao original em inglês. Não sabemos de quem é a tradução. Há diversos erros quer de datilografia quer de português. A autoria é atribuída aos três membros da Missão Especial, os diplomatas Horácio Sevilla Borja (Equador), Folke Lögfren (Suécia) e Kamel Belkhiria (Tunísia), os dois primeiros ainda vivos.

O António Graça de Abreu poderá explicar-nos a origem do documento. É possível que tenha circulado antes do 25 de Abril, clandestinamente. De qualquer modo, é ainda pouco conhecido, ao fim destes anos todos.   Os nossos leitores, e nomeadamente os que combatiam, nesta altura (abril de 1972), no TO da Guiné, têm direito a conhecer o documento. 

É o elementar direito à informação que nos era negada no tempo da ditadura: com o país em guerra, era impensável a censura deixar passar, na imprensa, referências detalhadas a esta Missão Especial da ONU e, muito menos, deixar divulgar o o seu relatório, considerado como "propaganda inimiga".

Por outro lado, no início de abril de 1972 ninguém sabia (nem podia saber por "razões de segurança") desta "missão", a não ser um reduzido número de pessoas do "staff" da ONU, do PAIGC e do governo da Guiné-Conacri, para onde viajaram, desde Nova Iorque, em 28 de março de 1972, os cinco membros da Missão Especial. 

Pormenor curioso: o líder histórico do PAIGC não se jutou  com a Missão Especial na visita  às "áreas libertadas", fazendo as honras à casa, como em  princípio devia... Deixou essa incumbência à estrutura político-militar do PAIGC... Foi Aristides Pereira que deu as boas vindas à Missão Especial, no dia 1 de abril de 1972, no "quartel general do PAIGC"... em Conacri, tendo depois partido para o mato no dia seguinte (entrada no sul da Guiné-Bissau, por Boké-Kandiafara).

De resto,  no início de abril de 1972, os títulos de caixa alta do "Diário de Lisboa" era a escalada da guerra do Vietname", a ofensiva do vietcong e do Vietname do Norte contra o Vietname do Sul e a  os seus aliados dos Estados Unidos: vejam-se os títulos de caixa alta dos jornais da época... "Guiné ?... Isso é longe do Vietname", ironizavamos nós, em 1969, no bar de sargentos de Bambadinca... 



Diário de Lisboa, 14 de abril de 1972 >  Pela primeira vez há uma referência à Missão Especial da Comissão de Descolonização da ONU e à sua visita ao território da Guiné-Bissau, de 2 a 8 de abril (pp. 1 e 24). A Missão Especial, de 5 elementos, afirmou que o PAIGC controlava efetivamente o território,  escreve o jornal.  Por sua vez, o delegado protuguês negou veementemente que: (i) o PAIGC controlava uma ou mais partes do território da Guiné;  (ii) que a Missão Especial  tenha entrado alguma vez no interior da Guiné.




Capas do "Diário de Lisboa", do mês de abril de1972... (Cortesia da Fundação Mário Soares >Casa Comum > Diário de Lisboa / Ruella Ramos)

Eis alguns dos títulos:

"Ofensiva em três frentes no Vietname do Sul" (segunda-feira, 3 de abril de1972)

"Vietname: avanço para Hué" (terça-feira, 4 de abril de 1972)

"Saigão apela para Nixon: a situação militar é muito critica"(quarta-feira, 5 de abril de 1972)

"A aviação americana está a bombardear o Vietname do Norte" (quinta-feira, 6 de abril de 1972)

"Hanói pede negociações secretas comKissinger" (sexta-feira, 7 de abril de 1972)

"Saigão é o alvo" (sábado, 8 de abril de 1972)

"O medo do ano 2000" (domingo, 9 de abril de 1972)

"A 100 km de Saigão: comneçou a batalhade An Loc" (segunda-feira, 10 de abril de 1972)

"Vietcong ao ataque em todas as frentes" (quarte-feira, 12 de abril de 1972)

Os três membros do Comité Especial de Descolonização da ONU, mais dois membros do "staff" da ONU (incluindo o fotógrafo Yutaka Nagata, de nacionalidade japonesa) (*),  visitaram as "áreas libertadas da Guiné-Bissau" (sic), de 2 a 8 de abril de 1972, antes da época das chuvas, a convite do PAIGC, e à revelia do Governo Português. 

Claro que a missão tinha que ser secreta, por razões de segurança. Nesse curto espaço de tempo (menos de um semana), terão percorrido "200 quilómetros", de jipe (no território da Guiné-Conacri, até à fronteira) e depois a pé, tendo visitado "9 localidades diferentes", numa parte restrita da Região de Tombali: sectores de Bedanda, Catió e Quitafine.

Os diplomatos focaram a sua atenção nas estruturas militares, tabancas, escolas e armazéns, e fizeram depois apreciações, que constam no relatório, sobre "a situação no campo do ensino, da saúde, da administração da justiça, da reconstrução da economia e da formação de uma assembleia nacional". 

Os membros da missão vestiam fardas militares, com insígnias das Nações Unidas, e tiveram escolta de um bigrupo reforçado do PAIGC (cerca de 60 homens armados) sob o comando do Constantino Teixeira. No regresso, já a 6 de abril, a escolta passou a ser de 200 homens, provavelmente com o receio de alguma ação militar portuguesa com vista a capturar os diplomatas.

A principal base do PAIGC referida no relatório, dentro do território da então província da Guiné, era na zona de Balana / Gandembel, ou seja, no corredor de Guileje. Recorde-se que Balana e Gandembel tinham sido abandonados pelas NT, por ordem de Spínola, em janeiro de 1969.

(Continuação)

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sexta-feira, 15 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19587: (D)o outro lado do combate (47): A Missão especial da ONU na Guiné - Abril 1972 (António Graça de Abreu / Luís Graça) - Parte II: capa + pp. 4-8





1. Continuação da publicação, para conhecimento e análise crítica dos nossos leitores, do relatório, de 11 (onze) páginas,  policopiado, que tem por título em português "A Missão Especial da ONU na Guiné - Abril de 1972" (*). É uma versão, mais resumida do original, "Report of the Mission of the United Nations Special Committee on Decolonization after visiting the liberated Areas of Guinea-Bissau (A/AC. 109/L. 804; 3 July 1972)".

A cópia, em papel, de que dispomos foi-nos fornecida, com vista a uma eventual publicação no blogue, pelo nosso camarada António Graça de Abreu, por volta de 2010, na sequência dos comentários ao poste P5680 (**)

O documento que agora estamos a publicar parece corresponder à seguinte referência  que encontramos  na base de dados bibliográfica do CIDAC - Centro De Intervenção Para O Desenvolvimento Amílcar Cabral:

BAC-051/2

CIDAC

BORJA, Horácio Sevilla ; LOFGREN, Folke ; BELKHIRIA, Kamel
A Missão especial da ONU na Guiné Bissau, Abril 72 / Horácio Sevilla Borja, Folke Lofgren, Kamel Belkhiria . - [S.l.] : PAIGC, 1972. - 11 p

Portanto, a edição é atribuída ao PAIGC. É uma edição tosca, para não dizer mesmo, "pirata", do relatório da Missão Especial. Mas as partes traduzidas em português correspondem ao original em inglês. Não sabemos de quem é a tradução. Há diversos erros quer de datilografia quer de português. A autoria é atribuída aos três membros da Missão Especial, os diplomatas Horácio Sevilla Borja (Equador), Folke Lögfren (Suécia) e Kamel Belkhiria (Tunísia).

Não sabemos a origem do documento: o António Graça de Abreu poderá explicar-nos. É possível que tenha circulado antes do 25 de Abril, clandestinamente. De qualquer modo, é ainda pouco conhecido, ao fim destes anos todos. No tempo da ditadura, com o país em guerra, era impensável a censura deixar passar, na imprensa, referências detalhadas a esta Missão Especial da ONU e, muito menos, ao seu relatório. 

Em abril de 1972 ninguém sabia (nem podia saber...) desta "missão". De resto, o medo dos portgueses era...  "a guerra do Vietname" e a iminente derrota militar dos Estados Unidos: vejam-se os títulos de caixa alta dos jornais da época... "Guiné ?... Isso é longe do Vietname", ironizavamos nós, em 1969, no bar de sargentos de Bambadinca...

Os três membros do Comité Especial de Descolonização da ONU, mais dois membros do "staff" da ONU,  visitaram as "áreas libertadas da Guiné-Bissau" (sic), de 2 a 8 de abril de 1972, antes da época das chuvas, a convite do PAIGC, e à revelia do Governo Português. Claro que a missão tinha que ser secreta, por razões de segurança. Nesse curto espaço de tempo (menos de um semana), terão percorrido  200 quilómetros, quase sempre a pé, visitando 9 localidades diferentes, numa parte restrita da Região de Tombali:  sectores de Bedanda, Catió e Quitafine.

Os diplomatas focaram a sua atenção nas estruturas militares, tabancas,  escolas e armazéns, e fizeram depois apreciações, que constam no relatório, sobre "a situação no campo do ensino, da saúde, da administração da justiça, da reconstrução da economia e da formação de uma assembleia nacional". Os membros da missão vestiam fardas militares, com insígnias das Nações Unidas, e tiveram escolta de um bigrupo reforçado do PAIGC (cerca de 60 homens armados) sob o comando do Constantino Teixeira. 

No regresso, já a 6 de abril, a escolta passou a ser de 200 homens, provavelmente com o receio de alguma ação militar portuguesa com vista a capturar os diplomatas.

A principal base do PAIGC referida no relatório, dentro do território da então província da Guiné, era na zona de Balana / Gandembel, ou seja, no corredor de Guileje.

Já agora ficam aqui os nomes e os cargos dos cinco elementos que compuseram a Missão:

(...) Mr. Horacio Sevilla-Borja, Deputy Permanent Representative of Ecuador to
the United Nations (Chairman)~

Mr. Folke Löfgren, First Secretary of the Permanent Mission of Sweden to the
United Nations

Mr. Kamel Belkhiria, First Secretary of the Permanent Mission of Tunisia to
the United Nations

The Special Mission was accompanied by the following Secretariat staff: 

Mr Cheikh Tidiane Gaye (Principal Secretary) and Mr. Yutaka Nagata (photographer). 

(Fonte: relatório original em inglês)

Publicam-se mais 5 páginas do documento supracitado (pp. 4-8).

Repare-se no cuidado que o PAIGC teve com a segurança dos elementos da Missão Especial:  foram escoltados, à partida, por uma força de 60 guerrilheiros, de 1 a 3 de abril; na noite de 3 de abril, na viagem, da base central em Balana (corredor de Guileje) até ao setor de Cubucaré (zona de Catió), tiveram uma escolta de mais de 400 homens armados; na tarde de 6 de abril, iniciam a viagem de volta (até à fronteira com regressso a Conacri,via Kandiafara e Boké), com uma escolta armada de 200 homens...

O PAIGC levava a sério as forças armadas portugueses... O que não o impediu de, muito possivelmente,  encenar algumas situações para "onusiano ver": a Missão especial passa pela aldeia de Botche [Boche] Djate [Jate] [, vd. carta de Bedanda], por entre ruínas  das palhotas recém-queimadas, celeiros destruídos, grande quantidade de arroz queimada... E neste cenário não podia faltar uma bomba da FAP,  daquelas que não explodiam... A Missão tomou nota das inscrições na bomba: "The bomb bore the following markings: MI-7, 61A; TNT; BPE-I-124; 8/69; 50-7KG-0.035-M3."...

Atenção: o original tem 10 anexos, onde não faltam os itinerários, as datas e as horas e locais das visitas e entrevistas, a lista (fornecido pelo PAIGC) do armamento usado pelas Forças Armadas Portugueses, o  mapa da Guiné-Bissau (fornecida pelo PAIG), a lista (parcial) de filmes, livros e artigos sobre as "áreas libertadas", as fotografias tiradas pela Missão, e até os formulários usados pela administração nas "áreas libertadas"... 

O relatório do secretário geral do PAIGC sobre "a agressão (portuguesa) contra a Missão Especial da ONU" é o anexo III, reproduzido a seguir, mas que não faz parte do corpo do relatório no original...


(Continuação) (**)






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-8-


(Continua)

________________

domingo, 2 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6296: PAIGC: Como se vivia nas regiões libertadas (1): Chegam descalças, andrajosas, às vezes com filhos pequenos às costas a chupar os peitos secos e mirrados... (António Graça de Abreu, Alf Mil, CAOP1, Canchungo, Mansoa, Cufar, 1972/74)


Guiné > PAIGC > 1970 > Algures, numa região libertada. Guerrilheiros e população. A guerra de libertação teve muito pouco de romântico. Os militares portugueses que combateram o PAIGC na Guiné, sabem quão duras eram as condições de vida, tanto dos seus combatentes como da população sob o seu controlo, nas regiões libertadas, ou seja, dentro das fronteiras do território da antiga província portuguesa da Guiné ... A foto é do fotojornalista húngaro Bara István (n. 1942) que visitou, a partir de Canacri,  algumas dessas regiões, no sul, em 1970, embebbed nas fileiras do PAIGC.

Foto: Foto Bara (com a devida vénia...; em princípio, a sua fotogaleria é do domínio público)


1. Vamos dar início a uma série sobre as condições de vida nas chamadas regiões libertadas do PAIGC. Vamos começar por relatos, documentos, testemunhos do lado dos que combatiam o PAIGC, os portugueses e os seus aliados. Infelizmente, falta-nos a versão do outro lado. Vamos fazer um esforço por reunir também aqui fotos e outros documentos do PAIGC, bem como dos seus amigos internacionais. Vamos começar com um excerto do livro de memórias do nosso camarada e amigo  António Graça de Abreu, que foi Alf Mil do CAOP 1 (Canchungo, Manosa e Cufar, 1972/74).




António Graça de Abreu > Mansoa, 3 de Maio de 1973

Na região de Mansoa, as NT capturam mais elementos IN, ou aparentados com os guerrilheiros, do que em Canchungo. Normalmente chegam ao nosso CAOP com um aspecto lastimável, a subnutrição, as doenças, a miséria têm tomado conta deste pobre povo que vive nas regiões libertadas.

Os prisioneiros são quase sempre mulheres que se deslocam às povoações controladas pelas NT, a fim de venderem por exemplo mancarra (amendoim), óleo ou vinho de palma, e são capturadas nas estradas ou nos caminhos em volta dos nossos aquartelamentos.

Chegam descalças, andrajosas, às vezes com filhos pequenos às costas a chupar os peitos secos e mirrados. Dói, só de olhar. São interrogadas, é-lhes pedido todo o tipo de informações sobre os acampamentos, o armamento, as aldeias controladas pelo IN onde vivem os seus maridos, os seus familiares. Como é natural, estas mulheres falam muito pouco e também magoa o coração ver como são tratadas. É minha tarefa comprar-lhes uns trapinhos novos para tapar o corpo, umas sandálias de plástico para protegerem os pés.

Também se capturam elementos IN dos sexo masculino. Há dias um deles, que gozava de um regime de semi-liberdade, foi apanhado a fugir do quartel, já do outro lado do arame farpado, Deu a desculpa de que ia cagar.

Alguns prisioneiros são utilizados como guias nas operações das NT contra os santuários IN. Quando começa o tiroteiro, têm o hábito de escapar e de se refugiar na mata, por isso, às vezes seguem à frente das NT levando uma corda grande amarrada em volta da cintura. Se tentam a fuga procurando desligar-se da corda, são por norma abatidos.

Fonte: António Graça de AbreuDiário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura. Lisboa: Guerra e Paz, Editores, SA, 2007, p. 94.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Guiné 63/74 - P5680: Efemérides (41): No 37º aniversário da morte de Amílcar Cabral, recordando o sucesso diplomático que foi a visita da missão da ONU às regiões libertadas, no sul, 2-8 de Abril de 1972


Fundação Mário Soares / Documentos Amílcar Cabral > s/d > Amílcar Cabral em reunião com combatentes nas Regiões Libertadas. Distinguem-se Constantino Teixeira, Aristides Pereira, Bacar Cassamá, José Turé e André Gomes.


Fundação Mário Soares / Documentos Amílcar Cabral > Abril de 1972 > Região de Tombali > "Visita da Missão Especial da ONU a Cubucaré [, a sul do Rio Cacine,] distinguindo-se Fidelis Cabral de Almada e José Araújo. Com a inscrição manuscrita a lápis no verso: Recebida, com entusiasmo pela população, a missão especial chega ao local de um grande meeting popular, em Cubucaré". Guiné-Bissau, 2 a 8 de Abril de 1972."



Fundação Mário Soares / Documentos Amílcar Cabral > Região de Tombali > "Missão Especial da ONU visita uma tabanca destruída pela aviação portuguesa. 2 a 8 de Abril de 1972."



Fundação Mário Soares / Documentos Amílcar Cabral > Rgeião de Tombali > "Grupo de diplomatas do Comité de Descolonização da ONU visita quartel destruído. 2 a 8 de Abril de 1972."

Fotos e legendas: Cortesia de Fundação Mário Soares / Documentos Amílcar Cabral (2003)


1. No 37º aniversário da morte de Amílcar Cabral (1924-1973), que se celebra hoje, tanto na Guiné-Bissau como em Cabo Verde, vale a pena evocar aqui a célebre (e inédita)  visita da de uma missão da ONU, a convite do PAIGC, às então chamadas Regiões Libertadas, missão essa que correu no sul, à actual região de Tombali  entre 2 e 8 de Abril de 1972. Foi uma maiores vitórias diplomáticas de Amílcar Cabral. A Região de Tombali engloba, hoje, os sectores de Bedanda, Catió, Como, Quebo e Quitafine, tendo  um total de cerca de 3700 km2 e 90 mil habitantes.

Segundo Carlos Matos Gomes e Aniceto Afomo (Os Anos dfa Guerra Colonial, Vol 13, 1972 - Negar uam solução política para a guerra, Matosinhos, QuidNovi, 2009,  pp. 20-21), "a missão que visitou a Guiné era constituída por três membros efectivos, representantes do Equador, Suécia e Tunísia e por dois funcionários da ONU"... 

Os diplomatas estiveram nas zonas de Catió e Quitafine onde, segundo o relatório  observaram "estuturas militares, escolas e aramazéns". Mais concretamente, do relatório "constam apreciações sobre a situação no campo do ensino, da saúde, da administração da justiça, da reconstrução da economia e da formação de uma assembleia nacional".

Segundo os autores citados, "esta visita (...) contribuiu decisivamente para uma crescente aceitação daquilo que veio a tornar-se inevitável - a declaração unilateral da independência da Guiné-Bissau", em 24 de Setembro de 1973, na região do Boé.

Ainda de acordo com os mesmos autores, entre 2 de Novembro e 14 de Dezembro de 1972, a Assembleia Geral da ONU produziu 11 resoluções  condenando abertamente a política africana do regime de Marcelo Caetano. "As mais significativas foram as 2 e 14 de Novembro e a de 12 de  Dezembro" (op. cit., p. 97)

Qual foi, entretanto,  a resposta das autoridades portuguesas à visita da missão da ONU de 2 a 8 de Abril de 1972 ?

 Sabe-se que "enquanto decorreu a visita, as forças portuguesas tentaram perturbá-la com acções militares, mas sem porem em em risco a a vida dos membros das ONU" (sic)...  Escrevem Carlos Matos Gomes e Aniceto Afonso:

"As grandes acções ocorreram após a visita. Para demonstrar  a inexistência de regiões libertadas, condição essencial para a Guiné viessse a ser reconhecida como Estado independente, foram realizadas  várias operaçõe no Cantanhez e nas zonas onde o PAIGC  tinha uma forte componente militar - regiões de Bedanda, Cabolol, Tombali, Guileje".

A 23 de Novembro de 1972, é a vez de uma missão da OUA - Organização para a Unidade Africana, tendo à frente o seu secretário executivo, o major Mbita,   visitar as mesmas regiões, durante cinco dias.  Desse dia é a Directiva 23/72,  de Spínola, com ordens para a reocupação do Cantanhez...

A Op Grande Empresa, conduzida pelo recém-criado COP 4, teve início em 8 de Dezermbro, com desembarque de forças e a  sua instalação   nas tabancas de Cadique Ialala, Caboxanque e Cadique. "Seria tmbém ocupada a região de Jemberém e construída uma estrada táctica a ligar as duas margens da península do Cantanhez" (op. cit., p. 70). Na sua mensagem de  Ano Novo 1973, Amílcar Cabral denuncia e reconhece as tentativas de reocupação do Cantanhez, aos microfones da Rádio Libertação, três semanas antes de ser assassinado (Oiça-se o registo aúdio, disponível no Dossier Amílcar Cabral, da Fundação Mário Soares).

Um dos diplomatas que visitou o sul da Guiné, de 2 a 8 de Abril de 1972,  foi o equatoriano Horácio Sevilla Borja, neste momento em visita a Cabo Verde. 

No Arquivo de Amílcar Cabral, a cargo da Fundação Mário Soares, e em boa hora disponível em linha, não há infelizmente muitas imagens desta visita. Selecionamos alguns, reproduzidas acima, com a devida vénia. A missão da ONU integrava um fotógrafo japonês... Se alguém souber como se chamava, que nos diga... Acho que já vi fotos dele tiradas no âmbito dessa visita... E, já agora, seria interessante localizar o relatório da missão, ou obter um cópia, em inglês ou espanhol....

A propósito desta efeméride (o vil asssassínio de um grande intelectual, dirigente africano, homem e cidadão do mundo), e sobre as circunstâncias e o móbil do crime - nunca totalmente esclarecidos -, leia o poste da Diana Andringa Conversas sobre Cabral, com data de hoje, no blogue Caminhos da Memória  (de cuja redacção ela faz parte, juntamente com o nosso camarada João Tunes e outros). (LG).

2. Mensagem de 18 do corrente, do nosso amigo Nelson Herbert, guineense, jornalista da Voz da América, enviando-nos o seguinte recorte de imprensa:

Embaixadores da ONU que visitaram as zonas libertadas da Guiné-Bissau em Cabo Verde



No âmbito das comemorações do dia dos Heróis Nacionais, a 20 de Janeiro, estará em Cabo Verde, a convite do Presidente da República, Pedro Pires, os embaixadores Horácio Sevilla Borja, equatoriano, e Folke Lofgren, sueco, para participarem na palestra intitulada "A Diplomacia ao Serviço da Luta de Libertação Nacional", que se realiza no próximo dia 19, pelas 17 horas na Biblioteca Nacional, tendo como oradores a antropóloga Irosanda Barros e o Professor da Universidade de Santiago, Aquilino Barbos.


Os embaixadores Horácio Sevilla Borja e Folke Lofgren são os únicos sobreviventes da missão especial da ONU enviada às áreas libertadas da Guiné-Bissau, em 1972, até então sob a administração colonial portuguesa.

(Fonte: Expresso das Ilhas, Cabo Verde >  18 de Janeiro de 2010 )


3. Mensagem de 19 do corrente, do nosso Nelson Herbert, com envio de outro recorte, que se publica em parte, com a devida vénia ao jornal  A Semana, e para o competente conhecimento dos  leitores deste blogue.

(...) Retratos >  Horácio Sevilla Borja, observador da ONU às zonas libertadas da Guiné: 'Com a nossa missão tudo mudou'

Entrevista de JVL. A Semana, 19 Janeiro 2010  (Excertos, com a devida vénia)




Há 38 anos a ONU enviou uma missão de observadores às zonas libertadas pelo PAIGC na Guiné-Bissau. Chefiada pelo equatoriano Horácio Sevilla Borja, integrada pelo tunisino Kamel Belkhiria e pelo sueco Folke Lofgren, o grupo percorreu durante oito dias o interior daquele território cujo domínio (em dois terços) era reivindicado pelo PAIGC.


Quase 40 anos depois, Sevilla Borja [, foto à esquerda,] relembra nesta entrevista os significados da missão.  (...)

Foto e texto: Cortesia de A Semana


Para os portugueses, na altura, vocês não entraram nunca na Guiné. Tudo não passou de uma ficção.

Isso realmente foi dito por eles, nomeadamente, pelo então ministro dos Negócios Estrangeiros, Rui Patrício. Mas, claro, a nossa missão estava documentada, fotografada, de maneira firme. Fomos perseguidos pelos portugueses, que nos bombardearam quase o tempo todo. Mesmo assim, caminhamos oito dias pelas zonas libertadas pelo PAIGC.

Num dado lugar, Quedanda [, Bedanda ?], se não me engano, passámos ao lado de um quartel português, a dois quilómetros. Portanto, a missão foi real, não foi uma ficção, como quiseram fazer crer. Uma decisão revolucionária,

Como é que se deu a sua escolha para essa missão?

A decisão aconteceu no âmbito do Comité dos 24, da ONU, que se ocupava da descolonização. A proposta, quando submetida à Assembleia Geral, foi aprovada por uma larga maioria. Tratou-se de uma missão inédita, um passo em frente, se quiser, uma revolução nos anais da ONU. Na altura deveríamos ir também a Angola e a Moçambique, também convidados pelo MPLA e pela Frelimo. Mas o primeiro convite surgiu do PAIGC.

Por que diz que foi uma "revolução"?

Foi uma revolução porque, pela primeira vez, na ONU, um movimento de libertação convidou a comunidade internacional a visitar um território. Até aí eram as potências administrantes a convidar as missões de visita da ONU, nelas procuravam mostrar os passos que estavam a dar em benefício dos povos por elas tutelados, com vista à sua autodeterminação e independência.

Com o convite do PAIGC, romperam-se todos os moldes, as formas de trabalho da ONU no processo de descolonização. E dada a tenacidade de Portugal de conservar as suas colónias, negando a realidade, a ONU deu um passo em frente, com a abstenção de uns poucos países que o apoiavam, dentre eles os EUA, a França, etc. Portugal se opôs por todos os meios ao seu alcance.

Vocês eram quantos?

Éramos três e estávamos apoiados por dois membros da secretaria da ONU. O secretário-geral na altura era o austríaco Kurt Waldeim. No caso do Equador a escolha recaiu sobre mim, mas também estavam os meus colegas da Tunísia [, Kamel Belkhiria, ] e da Suécia [, Folke Lofgren]. A distribuição era geográfica. Um dos elementos de apoio era do Senegal, o Sr. Gaye, e o fotógrafo era japonês. Portanto, havia gente de todos os continentes.

E foi com base no vosso relatório que o PAIGC pôde declarar a independência da Guiné-Bissau, não?

Sim. No nosso regresso dissemos que efectivamente o PAIGC controlava a maior parte do território da Guiné-Bissau. Mais do que isso, tinha organizado a sociedade. Era incrível como um movimento de libertação, em condições tão difíceis e precárias, tinha conseguido montar escolas, serviços de saúde, de abastecimento às populações, etc. Com base nisso, a ONU declarou que o único movimento representante desse povo era o PAIGC e não a potência colonial.

Diante disso também, recomendou-se a todos os estados para que reconhecessem o PAIGC como o único representante dos povos da Guiné e Cabo Verde, e se instruiu também a todas as agências da ONU a ter em conta nos seus programas esses dois territórios. A missão mudou totalmente o quadro político na Guiné-Bissau e por isso foi uma tremenda vitória diplomática do PAIGC e dos seus líderes.

 
Fora isso, também fizemos uma série de recomendações militares. Do nosso ponto de vista, os portugueses estavam entrincheirados nos seus quartéis e apenas por via aérea conseguiam mover-se, destruindo muitas vezes o que o PAIGC tinha construído ou estava a construir. Lembro-me que, depois da missão, um dia, Amílcar Cabral nos enviou um telegrama a dizer que uma dada escola no interior, que chegámos a visitar, tinha sido bombardeada e destruída, com morte de várias crianças.

Com base nisso tudo, se pediu aos Estados que ajudassem a luta do PAIGC, com as armas necessárias, para enfrentar os helicópteros e outros meios aéreos utilizados pelos portugueses. Ou seja, com a nossa missão, tudo mudou, e isso acelerou e permitiu a independência da Guiné que foi logo reconhecida por dezenas de outros países.

E pressões, tiveram muitas?

Portugal, sobretudo, exerceu muita pressão sobre o Equador. As autoridades portuguesas consideravam que a missão era um ataque a Portugal, a uma província autónoma sua, e que, portanto, um país amigo, como Equador, não devia estar numa missão a favor da independência de um dos territórios que supostamente eram parte de Portugal. Mas houve também pressões directamente contra a minha pessoa, nomeadamente, no meu Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Mas a posição do Equador era muito clara. Se lutamos há 200 anos atrás pela nossa independência, através de uma luta armada conduzida pelo nosso Amílcar Cabral – Simon Bolívar – , entendíamos que devíamos apoiar outros povos no mesmo sentido.

Convém recordar que nessa época estávamos a viver na segunda metade do século passado, em 1972, e já em 1960 a ONU havia aprovado a resolução 1542 dizendo que tinha de terminar o colonialismo.

Nessa missão à Guiné o que é que mais o marcou?

Duas coisas. Primeiro, o povo. Na missão pudemos ver e contactar pessoas, às vezes, em grandes aglomerados, vimos e falámos com responsáveis dos vários sectores (mulheres, jovens, etc.) que, apesar de muitas carestias, estavam determinadas, queriam ser independentes, para conseguirem melhores condições de vida. A outra coisa era a capacidade dos líderes do PAIGC. E não me refiro só a Amílcar Cabral.

Quem em particular?

Refiro-me, por exemplo, a Pedro Pires. Tivemos a oportunidade de falar duas vezes com ele na altura, à chegada e no fim. Mas também me recordo do José Araújo, Fidélis Cabral Almada, Nino Vieira... Lembro-me que numa noite, depois de uma longa marcha, exaustos, em plena selva, ouvindo os bombardeios, conversámos sobre filosofia, literatura, etc. com algumas desses dirigentes. Eram pessoas que tinham ideias claras, uma capacidade humana extraordinária. Nessa noite, ao mesmo tempo que ouvíamos ao fundo o som de bombardeios e discutíamos literatura, filosofia, através de um aparelho, ouvimos um concerto de J.S. Bach.

Continuou a acompanhar o processo guineense?

Sim, na medida do possível, com preocupação, os seus altos e baixos. Infelizmente, vários dos seus lideres que conheci durante a missão morreram ou foram mortos. Quem me protegeu durante toda a missão foi o Constantino Teixeira, comandante Tchutcho. Ele morreu em circunstâncias trágicas, eu soube, e isso me deixou triste. E é também com muita tristeza o que vejo o que se passa na Guiné. Em contrapartida, sinto-me confortado com Cabo Verde. (...)

[ Revisão / fxação de texto / selecção / bold: L.G.]


Recorde-se a sequência dos acontecimentos (LG):

1972 - 2 de Fevereiro

 Perante o Conselho de Segurança da ONU, reunido na sua 163ª sessão, em Adis Abeba, Cabral convida a Assembleia Geral das Nações Unidas a enviar uma delegação às 'zonas libertadas'.

 4 de Fevereiro

Resolução 312 do Conselho de Segurança sobre a situação dos territórios sob a administração portuguesa. É autorizada uma missão às regiões libertadas da futura Guiné-Bissau.

2 a 8 de Abril

Visita de um grupo de Diplomatas do Comité de Descolonização da ONU aos territórios libertados.
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terça-feira, 15 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2762: PAIGC: Instrução, táctica e logística (11): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (XI Parte): A máquina logística (A. Marques Lopes)

Guiné > Região, possivelmente do sul, controlada pelo PAIGC > Visita de uma delegação escandinava às regiões libertadas > Novembro de 1970 > Foto nº 14 > TRasnporte de sacos de arroz ... As autoridades militares portugueses subestimaram, inicialmente, o génio organizativo de Amílcar Cabral e dos demais dirigentes e militantes do PAIGC. Em 1971, num documento produzido pela inteligência militar do Estado-Maior de Spínola, reconhecia-se a real importância da logística do PAIGC, mesmo não tendo os meios (navais, aéreos e terrestres) das NT...

Guiné > Região do interior (possivelmente, no sul) controlada pelo PAIGC > Visita de uma delegação escandinva às regiões libertadas > Novembro de 1970 > Foto nº 19 > Uma pequena enfermaria ou hospital de campanha, com camas e lençóis brancos. Na foto, vê-se uma enfermeira.

Guiné > Região (no interior, possivelmente no sul) controlada pelo PAIGC > Visita de uma delegação escandinva às regiões libertadas > Novembro de 1970 > Foto nº 31 > A piroga era uma dos meios de transporte mais adequados à guerrilha, nomeadamente no apoio às colunas logísticas. Contrariamente à ideia que se fazia, na época, as colunas de reabastecimento do PAIGC eram compostas por cerca de 30 elementos civis. Julgo que por razões de segurança e dificuldades de recrutamento de carregadores. A estes elementos deveria acrescentar-se a escolta, presume-se.


Guiné > Região controlada pelo PAIGC > Novembro de 1970 > Foto nº23 > Uma consulta médica, ao ar livre. Em primeiro plano, um enfermeiro (presume-se) e a "farmácia ambulante".

Guiné -Conacri (?) > Base do PAIGC em Kandiafara ? > Visita de uma delegação escandinava às regiões libertadas > Novembro de 1970 > Foto nº 30 > Uma sala de esterilização de um hospital do PAIGC

Guiné > Região controlada pelo PAIGC, possivelmente no sul > Visita de uma delegação escandinava às regiões libertadas > Novembro de 1970 > Foto nº 25 > Progressão, na savana arbustiva, por meio do capim alto, de um grupo de guerrilheiros. Presume-se que as colunas logísticas do PAIGC tivessem segurança por parte da milícia ou do exército populares...


Guiné > Região controlada pelo PAIGC , possivelmente no sul > Visita de uma delegação escandinava às regiões libertadas > Novembro de 1970 > Foto nº 7 > Uma aldeia, possivelmente no Cantanhez (onde a tropa portuguesa não entrava desde 1966)


Guiné > Região controlada pelo PAIGC > Visita de uma delegação escandinava às regiões libertadas > Novembro de 1970 > Foto nº 29 > Aproximação de guerrilheiros a uma aldeia

Guiné > Possivelmente numa base do PAIGC, no sul, na região fronteiriça > Visita de uma delegação escandinava às regiões libertadas > Novembro de 1970 > Foto nº 28 > Transporte de sacos de arroz em viaturas soviéticas. Segundo a inteligência militar portuguesa, o PAIGC dispunha, na Guiné Conacri, de cerca de 4 dezenas de camiões russos (havia dois modelos, o Gaz e o Gil) , que faziam o transporte dos abastecimentos de Conacri até a Kandiafara e, depois de queda de Guileje, em 22 de Maio de 1973, até mesmo para lá das fronteira... Recorde-se que o corredor de Guiledje (também chamado Caminho do Povo e Caminho da Liberdade) estendia-se de Kandiafra, Simbel e Tarsaiá (Guiné-Conacry) a Gandembel, Balana, Salancaur e Unal (na Guiné-Bissau).

Este corredor foi, para o PAIGC, o maior e mais importante corredor de infiltração e de abastecimento ao longo de toda a guerra. A sua função estratégica potenciou-se consideravelmente após o assalto ao quartel de Guiledje em Maio de 1973 até sensivelmente depois do 25 de Abril, quando se instituíram as tréguas entre os contendores. Depois do 25 de Avril e das tréguas estes camiões passaram mais vezes a transpor a fronteira desde Kandiafara, passando por Gandembel e parte importante do Carreiro de Guiledje no sentido Gandembel-Salancaur e Porto de Santa Clara.

Guiné > Região controlada pelo PAIGC, possivelmente no sector de Bedanda ou Cacine > Visita de uma delegação escandinava às regiões libertadas > Novembro de 1970 > Foto nº35 > Magnífica imagem de uma bolanha, com produção de arroz. Parte da população controlada pelo PAIGC tinha que ser reabastecida, em arroz, alimentação-base, por não ser autosuficiente. Como se pode ler no Supintrep, "este reabastecimento não se processa, no entanto, de igual modo para as duas Inter-Regiões, pois que (...), enquanto a Inter-Região Sul (à excepção da Frente Bafatá/Gabú Sul) é auto-suficiente na produção do alimento base, o arroz, a Inter-Região Norte não produz hoje o necessário para se abastecer, pelo que, além das colectas efectuadas às populações controladas, se torna necessário enviar para as bases da fronteira e interior quantidades muito apreciáveis deste produto".

Guiné-Bissau > PAIGC > Novembro de 1970 > Imagens obtidas algures, nas bases sediadas na Guiné-Conacri, e nos regiões libertadas do sul (possivelmente, Cantanhez), pelo fotógrafo norueguês Knut Andreasson. Recorde-se que o fotógrafo norueguês acompanhou uma delegação sueca (tendo à frente a antiga líder do parlamento sueco, Birgitta Dahl) na visita às regiões libertadas da Guiné-Bissau, em Novembro de 1970.

Segundo o sítio da
Nordic Africa Institute (uma agência dos países nórdicos, com sede na Suécia, em Upsala ), esta visita deu-lhe oportunidade de falar com Amílcar Cabral, em pleno palco da luta pela independência, e ficar a conhecer melhor o PAIGC, a guerrilha e a sua implantação no terreno.

Andreasson e Dahl publicaram mais tarde um livro em sueco sobre essa viagem. Andreasson, por sua vez, realizou uma exposição fotográfica e publicou um álbum fotográfica sobre esta visita. A maior parte das fotos deste período foram doadas ao Nordic Africa Institute pela viúva de Andreasson. A exposição foi , por sua vez, doada à
Fundação Amílcar Cabral pelo Nordic Africa Institute, sendo apresentada por Birgitta Dahl, a antiga líder do Parlamento Sueco, por ocasião das celebrações do 80º aniversário de Amílcar Cabral, em Setembro de 2004.

A Suécia foi o país ocidental que mais apoio deu ao PAIGC, no plano político, diplomático, humanitário e financeiro. Os manuais escolares eram impressos na Suécia. Este país escandinavo, nomeadamente sob a liderança do social-democrata Olof Palme (1927-1986), também fornecia gratuitamente ao PAIGC material médico e sanitário, como se reconhece no Supintrep, nº 32, de Junho de 1971, que temos vindo a publicar.

As fotos acima ilustram alguns aspectos da máquina logística do PAIGC de cuja grandeza e complexidade muitos de nós, combatentes portugueses, no terreno, não tínhamos uma ideia exacta... Ao ler este documento, insuspeito, ficamos a saber que a população e a guerrilha do PAIGC, no interior do TO da Guiné, era abastecida regularmente (em alimentos, medicamentos, armamento, equipamento, etc.). Ficamos a saber que havia evacuações (incluindo por meios aéreos) de feridos graves para os hospitais de rectaguarda (Ziguinchor, no Senegal; Conacri, Koundara e Boké, na Guiné-Conacri). Devo, no entanto, acrescentar que foi recentemente desmentida, por uma histórica e mítica dirigente do PAIGC, Carminda Pereira - no Simpósio Internacional de Guileje (Bissau, 1 a 7 de Março de 2008) - que houvesse helicópteros ("O PAIGC nunca teve helicópteros ou outras aeronaves"). Agora também é verdade que foi fundamental para o PAIGC o apoio, sem reservas, dado pelo regime de Sékou Touré. Já no Senegal, o PAIGC não se movimentava tão à vontade.


Ficamos também a saber que havia evacuações de feridos graves, em tratamento, para outros países estrangeiros (nomeadamente, da Europa de Leste). Que nesses hospitais, na rectaguarda, havia médicos, estrangeiros, tanto ocidentais (por exemplo, holandeses) como do bloco soviético (cubanos, jugoslavos e russos). Curiosamente não se faz menção do português, natural de Angola, o Dr. Mário Pádua, médico, que desertou das fileiras do nosso exército, Angola, e dedicou parte da sua vida, como médico e como militante, ao PAIGC, no Hospital de Ziguinchor, Senegal)(Vd. o seu depoimento no filme-documentário de Diana Andringa e Flora Gomes, As Duas Faces da Guerra, 2007).

Este excerto do Supintrep sobre a logística do PAIGC deve ser lido em complemento do que já aqui escrevemos sobre a importância estratégica que tinha o corredor de Guileje e o significado da queda de Guileje (1).

Fonte:
Nordic Africa Institute (NAI) / Fotos: Knut Andreasson (com a devida vénia... e a competente autorização do NAI) (2) (As fotografias tem numeração, mas não trazem legenda. Legendagem de LG).


Continuação da publicação do Supintrep, nº 32, de Junho de 1971, documento classificado na época como reservado, de que nos foi enviada uma cópia, em 18 de Setembro de 2007 pelo nosso amigo e camarada A. Marques Lopes, Cor DFA, na situação de reforma, e a quem mais uma vez agradecemos publicamente (3):

PAIGC - Instrução, táctica e logística (11): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (Parte XI) > Logística


LOGÍSTICA

a. Generalidades


Para satisfação das necessidades resultantes da actividade desenvolvida, o PAIGC organizou nos países limítrofes (República do Senegal e República da Guiné) um “complexo logístico” com a finalidade de introduzir no nosso território os meios indispensáveis à manutenção do seu esforço de guerra. Os órgãos centrais dessa “máquina” – armazéns de víveres, depósitos de armamento e munições, de combustíveis, medicamentos, oficinas e fardamento – encontram-se em Conakry, om órgãos de menor capacidade em Boké, Kandiafara, Kambera, Foulamory e .

É pois a partir de Conakry que cerca de quatro dezenas de viaturas de fabrico soviético (marcas Gas e Gil) estabelecem a ligação entre os pontos atrás referidos, transportando pessoal, material e víveres.

Para Boké e Kandiafara e também Bissamala, onde o PAIGC dispõe de um complexo logístico de apoio ao Quitafine, é aproveitada ainda a navegabilidade dos rios Nunez e Kandiafara, os quais são percorridos por um conjunto de barcos de carga de que se destacam:

AROUCA (BI 72 L) – ex-SAGRES, é uma lancha a motor, casco de aço, casa de motor, porão e escotilhas, um mastro. O motor é Diesel Kelvin K3, n.º 26927, de 3 cilindros de 66HP e 750 RPM; tem 15,40 m de comprimento, 4,10 m de boca e capacidade para 19,700 tons. de carga.

MIRANDELA (BI 112 L) – ex-SADO, é um batelão a reboque, casco de ferro, alojamento para a tripulação com seis beliches, duas escotilhas, um porão de carga com duas coberturas de ferro corrediças que lhe servem de tampa, um mastro de ferro com dois paus de carga, motor com potência de 95/105 HP, 24,40 m de comprimento, 4,82 m de boca e capacidade para 65,054 tons. de carga.

2 BARCAÇAS – tal como são denominadas, que se julga tratar de duas embarcações tipo lancha de desembarque, talvez semelhantes às LDM da nossa marinha.

Os abastecimentos são enviados mensalmente de Conakry para as bases logísticas de apoio, sendo destinados ao mês seguinte, com níveis que se julgam bastante baixos, pois que, quando o reabastecimento se atrasa, que é frequente, logo as bases do interior insistem na sua falha. São polivalentes, incluindo géneros alimentícios, gasolina e óleos, material e munições.

Estas remessas são feitas nos últimos dias do mês, dando origem a concentrações de viaturas em Conakry.

Efectuados que são os reabastecimentos, algumas viaturas e embarcações regressam a Conakry, fazendo no retorno o escoamento dos produtos agrícolas cultivados nas “regiões libertadas” (arroz, milho, coconote...) e ainda evacuações, quer de feridos ou doentes, quer de material inoperacional.


b. Apoio exetrior à actividade logística


Em 21 de Março de 1966 foi celebrado um “protocolo” entre o Governo Senegalês e o PAIGC que estabelecia as modalidades de cooperação entre as autoridades senegalesas e os responsáveis do PAIGC, o qual, fundamentalmente, assenta nos seguintes pontos:

- Serão fixados pontos de reagrupamento obrigatórios pelas autoridades senegalesas para o estacionamento prolongado dos militantes combatentes. Os militantes combatentes detentores de armas e de munições deverão entregá-las obrigatoriamente nestes centros nas mãos das autoridades senegalesas. Toda a entrada de armas ou material destinado ao PAIGC em território senegalês deverá fazer-se com o acordo das autoridades encarregadas da segurança, que tomarão posse e assegurarão a entrega nas condições a definir.
- Para permitir aos militantes e combatentes do PAIGC abastecerem-se em território senegalês, os responsáveis designados pelo PAIGC devem dirigir-se às Autoridades Administrativas que se esforçarão para satisfazer os pedidos em toda a medida do possível. Este fornecimento de mercadoria e artigos diversos não são gratuitos.
- Os militantes e os combatentes do PAIGC doentes ou feridos beneficiam, como no passado, dos cuidados dispensados pelas formações sanitárias senegalesas.
- Para permitir a identificação dos militantes, os únicos beneficiários destas medidas, os responsáveis do PAIGC comprometem-se a entregar-lhes os documentos de identidade com fotografia e a remeter às Autoridades Senegalesas encarregadas da segurança a lista completa destas pessoas com os talões.
- Estas facilidades concedidas aos militantes e combatentes do PAIGC são susceptíveis de serem anuladas unilateralmente pelas Autoridades Senegalesas devido a factos imputáveis ao PAIGC ou devido a circunstâncias particulares.

Como se verifica analisando o teor do acordo, este, a ser cumprido, implicaria uma série de restrições que, em boa verdade, e com excepção de algumas alíneas, nunca foram totalmente impostas, continuando o PAIGC a proceder quase como se o referido acordo não existisse e com liberdade de acção em todo o Casamansa, muito provavelmente até pela força do Partido naquela região.

Muito mais amplo, no entanto, é o apoio incondicional dado pelo Governo de Sékou Touré ao PAIGC, que tem na Rep Guiné, como já se referiu, além dos órgãos de direcção central e de apoio logístico de base, uma total liberdade de circulação nos itinerários, as mais amplas facilidades de instrução militar das FARP e de educação dos futuros quadros, assistência sanitária e hospitalar, instalações e até empréstimos de material de guerra, quando o PAIGC dele carece.

Salienta-se, no entanto, que, dada a excentricidade de determinados “departamentos” fronteiriços, o que os liberta de certo modo do controle eficaz dos Governos Centrais, o apoio concedido ao PAIGC depende muitas vezes das Autoridades Civis e Militares que superintendem esses Departamentos, embora não o afectando e sendo este aspecto mais palpável na Rep Senegal.

O apoio concedido por outros países africanos não fronteiriços não tem significado, traduzindo-se apenas em manifestações de “solidariedade política”, o que, aliás, sucede com a maioria dos países e organizações internacionais, à excepção dos referidos em 3.a [do Supintrep].

c. Fabrico, confecção e manutenção


Muito pouco tem sido assinalado sobre o “fabrico, confecção e manutenção” presumindo-se, por isso, que, neste capítulo, o PAIGC está ainda numa fase muito incipiente. Admite-se que, nas oficinas referenciadas em Conakry, Boké, Kandiafara, Koudara e Ziguinchor, execute diversos escalões de manutenção do seu material auto, a qual se julga eficaz, dado que as dificuldades neste campo decorrem normalmente da quantidade e não do aspecto funcional. Igualmente se admite que as oficinas instaladas em Conakry para o efeito procedem a determinadas beneficiações no seu material de guerra, dadas as “evacuações” detectadas.

Em Boké está referenciado um estaleiro naval onde se procede a reparações nos barcos que o PAIGC possui.

Quanto ao “fabrico”, além da execução e arranjo de alfaias agrícolas e utensílios domésticos por processos rudimentares, há a referir, ligada aos Serviços de Economia e Produção e dentro do âmbito das actividades do Comité da Inter-Região Norte, a existência, algures na região do Morés, de uma pequena fábrica de sabão (marca Lolo), aproveitando a abundância da matéria prima utilizada, o óleo de palma. Muito embora não detectadas, admite-se a existência de outras fábricas deste tipo.

d. Alimentação


Mensalmente, tal como acontece com a generalidade dos reabastecimentos, são enviados de Conakry para as bases de apoio às Inter-Regiões géneros alimentícios, nomeadamente arroz, açúcar, sal e conservas, os quais são depois distribuídos pelos efectivos estacionados ao longo da fronteira e interior.

Este reabastecimento não se processa, no entanto, de igual modo para as duas Inter-Regiões, pois que, como veremos, enquanto a Inter-Região Sul (à excepção da Frente Bafatá/Gabú Sul) é auto-suficiente na produção do alimento base, o arroz, a Inter-Região Norte não produz hoje o necessário para se abastecer, pelo que, além das colectas efectuadas às populações controladas, se torna necessário enviar para as bases da fronteira e interior quantidades muito apreciáveis deste produto.

Em quase toda a Província o IN procede a colectas de arroz nas tabancas sob o seu controle. Estas colectas são feitas por tabancas ou por áreas e delas se encarrega o chefe da tabanca que faz a cobrança junto de cada morança, ou um delegado da área que tem por missão reunir o arroz colectado pelos cobradores distribuídos pelas tabancas da referida área.

Depois de reunido o arroz colectado é aguardada a chegada dos grupos que o vão buscar a cada uma das áreas ou tabancas. Estes grupos têm um efectivo de cerca de 10 elementos armados de maneira a poderem reagir a possíveis encontros com as NT. Por vezes vão efectivos maiores, cerca de 30 a 40 elementos, que se admite seja devido ao conhecimento que o IN possa ter da presença das NT na região.

A colecta exigida varia com a época do ano, razão por que na época seca as colectas são maiores que na das chuvas.

Do estudo feito a documentos bem como de declarações prestadas por elementos IN capturados pelas NT, é possível concluir da maneira como se processa o reabastecimento de géneros alimentícios às unidades IN sediadas ao longo da fronteira, bem como aos efectivos no interior. Assim:

Para as Unidades da Fronteira

Ao longo da Fronteira, as populações refugiadas encontram-se organizadas político-administrativamente, pelo que encontramos entre elas os comités de tabanca e de secção, órgãos primários da estrutura político-administrativa do PAIGC. As bases e acampamentos IN que se situam nesses locais apoiam-se nessa organização, do que resulta serem os referidos órgãos os encarregados de proverem aos reabastecimentos, efectuando colectas e, de seguida, a entrega dos géneros obtidos. Por outro lado, as unidades em deslocamentos ao longo da fronteira e em contacto com as referidas populações vão também efectuando, por sua vez, colectas.

Para as Unidades do Interior (só Inter-Região Norte)

Só a partir do corrente ano passaram a ser detectadas colunas de reabastecimento de arroz que, idas das bases logísticas do Casamansa, se destinem a prover as necessidades do interior.

Assim, a partir de Koundara o arroz é canalizado especialmente para a base de Cumbamore em colunas de viaturas, sendo depois transportado para o interior por colunas de carregadores através dos corredores de infiltração, como oportunamente se referirá.

e. Saúde

(1) O Desenvolvimento do Serviço de Saúde no PAIGC

Vencendo inúmeras dificuldades, resultantes muito especialmente da falta de quadros logo após a eclosão da luta armada, o PAIGC começou a instalar pouco a pouco em diversos pontos das Regiões Libertadas alguns postos de saúde, onde colocou os poucos enfermeiros que o Partido à data dispunha.

Sendo este número, porém, insuficiente, e segundo directivas da Direcção do Partido, estes enfermeiros procuravam dar a outros elementos recrutados nas escolas na Milícia Popular uma preparação mínima que lhes permitisse auxiliá-los no seu trabalho. Foram assim iniciados no serviço de enfermagem muitos elementos que, muito embora carecendo de preparação teórica, foram solucionando o problema até à formação e Escolas de Enfermagem no interior, entre as quais se destaca a Escola de Ajudantes de Enfermagem do Morés.

Entretanto, e dada a insuficiência a que estas escolas ainda conduzem, o Partido, no sentido da formação o pessoal qualificado necessário a um funcionamento mais eficaz dos centros de saúde, tem enviado para o estrangeiro muitos jovens que aí seguem estudos práticos de enfermagem e medicina, de modo a poder dispor, a curto prazo, de um número sempre crescente de pessoal capaz, o que irá permitir uma progressiva melhoria da actividade do Partido no domínio da saúde.

(2) O auxílio estrangeiro

Como já se referiu, o auxílio estrangeiro ao PAIGC no domínio da saúde reveste-se de uma importância muito grande, dado que é através do fornecimento de bolsas de estudo para a frequência de cursos médicos e de enfermagem que o PAIGC obtém elementos qualificados de cuja carência tanto se ressente. Assim, numerosos bolseiros do PAIGC cursam Medicina na Rússia e na Bulgária, enfermagem na Bulgária e Cuba e Profilaxia e Higiene Social na Checoslováquia.

Não termina, porém, aqui o auxílio estrangeiro ao Partido, pelo que se caracteriza também na cedência de pessoal médico, pelo que vamos encontrar médicos cubanos, jugoslavos, russos e holandeses nos principais estabelecimentos hospitalares. Este auxílio é completado com o fornecimento gratuito de medicamentos e material sanitário por parte de Cuba e dos países do Leste da Europa, revestindo-se também de particular importância a contribuição dada por particulares da Europa Ocidental, nomeadamente a Fundação Mondlane, com sede em Haia, e a Suécia.

(3) Como é prestada a assistência sanitária

A assistência sanitária aos combatentes e populações sob o controle IN é realizada através de enfermarias e hospitais existentes no interior do TO, formações sanitárias muito rudimentares, quase nunca dispondo de médico.

Os indisponíveis que denunciam casos graves são transportados em macas improvisadas desde essas enfermarias ou hospitais para as bases fronteiriças, onde normalmente o PAIGC dispõe de instalações mais apetrechadas, e daqui, em automacas ou viaturas de transporte, senão mesmo em meios aéreos, para os hospitais de Conakry, Ziguinchor, Koundara ou Boké.

No capítulo da assistência sanitária, mormente nos hospitais e enfermarias do interior, além da falta de pessoal qualificado surge ainda toda uma série de condicionamentos, nomeadamente o reabastecimento irrregular dos medicamentos, a conservação do sangue para transfusões e o transporte e feridos graves para o exterior, que muito afectam o funcionamento normal do serviço.

(4) Orgnização dos serviços de saúde (civil e militar) do PAIGC


Tanto quanto os elementos disponíveis o permitem, julga-se que estes centros sanitários (hospitais e enfermarias) se dividem em dois ramos, o civil e o militar, dependentes de entidades distintas.

No meio civil, ainda em estado incipiente de organização, compreenderá enfermarias ou mesmo hospitais existentes nas áreas libertadas, os quais se destinam a prestar assistência às populações controladas pelo IN. Estas enfermarias são accionadas nos escalões administrativos a que correspondem pelos responsáveis da Saúde dos respectivos Comités, e destacam, com o fim de efectuarem uma cobertura eficaz das respectivas zonas, brigadas sanitárias que percorrem as tabancas que não dispõem de serviço de saúde próprio. Julga-se que a saúde civil esteja dependente, a nível superior, da Direcção para os Assuntos Sociais do Departamento para os Assuntos Sociais e Cultura.

No ramo militar, o serviço de saúde encontra-se já num grau de desenvolvimento diferente, dispondo de estabelecimentos hospitalares (no exterior) de apreciáveis recursos. Julga-se que no topo de toda a organização sanitária militar se encontra o Serviço de Saúde do Departamento da Defesa, o qual acciona três Secções Sanitárias (Ziguinchor, Koundara e Boké) que abrangem todo o TO e zonas fronteiriças dos países limítrofes. Estas Secções Sanitárias corresponderam às três Frentes (Norte, Leste e Sul) em que o IN dividia o TO até à reorganização levada a efeito durante o ano de 1970, mas mantendo actualidade mesmo depois desta reorganização.

Cada Secção dispõe de um Hospital Central, dela dependendo os hospitais e enfermarias correspondentes aos Sectores e Frentes. As unidades, por sua vez, dispõem também de enfermeiros responsáveis pela assistência sanitária imediata aos guerrilheiros.

Continua

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Notas de L.G.:

(1) Vd. postes de:

2 de Fevereiro de 2008
Guiné 63/74 - P2499: Guiledje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (13): Enquadramento histórico (I): a importância estratégica de Guileje

3 de Fevereiro de 2008 >
Guiné 63/4 - P2502: Guiledje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (14): Enquadramento histórico (II): o significado da queda de Guileje

16 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2650: Uma semana involvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (6): No coração do mítico corredor de Guiledje

17 de Março de 2008 > Guine 63/74 - P2655: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (7): No corredor de Guiledje, com o Dauda Cassamá (I)

17 de Março de 2008 >Guiné 63/74 - P2656: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (8): No corredor de Guiledje, com Dauda Cassamá (II)


(2) Mensagem anterior da
Webmaster do NAI:

Dear Luís Graça, I am glad to hear that you like the photos and that you use them. Best regards,

Agneta Rodling
Information/Webb
Nordiska Afrikainstitutet
The Nordic Africa Institute
Box 1703,
SE-751 47 UPPSALA
Tel +46-18 56 22 21

Mensagem enviada hoje pelo editor do blogue:

Dear Agneta:

I have written to you recently. My name is Luis Graca. I am the founder and main editor of the Portuguese blog Luis Graca & Camaradas da Guine, centred on the individual and collective experience of Guinea Bissau colonial war / liberation struggle, during the period of 1963/74.

Please notice that I have used again some photos from your album on Guinea-Bissau (see the text posted today, on my blog; subject: PAIGC logistics during the liberation struggle)… Blog members are war veterans, ancient fighters of both sides, or their relatives and friends of Portugal and Guinea-Bissau.

I have used, with your kind permission, the following photos, taken in November 1979, by Knut Andreasson: 07, 023, 025, 029, 030, 031, 032, 035 and 038.

Our blog has no commercial purpose, it intends to be a bridge of peace, reconciliation, co-operation and friendship and but also an information and knowledge database (research and dissemination, photo and paper documentation, poetry, life stories, fiction, scientific meetings, social events…). And my self, I appreciate very much your institutional support to the people of Guinea-Bissau.

Please feel free to use also our web materials.
Many thanks.
Luís Graça



(3) Vd. postes anteriores, desta série:

22 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2124: PAIGC - Instrução, táctica e logística (1): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (I Parte) (A. Marques Lopes)

24 de Setembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2126: PAIGC - Instrução, táctica e logística (2): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (II Parte) (A. Marques Lopes)

1 de Outubro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2146: PAIGC - Instrução, táctica e logística (3): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (III Parte) (A. Marques Lopes)

8 de Outubro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2164: PAIGC - Instrução, táctica e logística (4): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (IV Parte): Emboscadas (A. Marques Lopes)

29 de Outubro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2228: PAIGC - Instrução, táctica e logística (5): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (V Parte): Flagelações (A. Marques Lopes)

4 de Dezembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2327: PAIGC - Instrução, táctica e logística (6): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (VI Parte): Minas I (A. Marques Lopes)

17 de Janeiro de 2008 >
Guine 63/74 - P2446: PAIGC - Instrução, táctica e logística (7): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (VII Parte): Minas II (A. Marques Lopes)

19 de Janeiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2454: PAIGC - Instrução, táctica e logística (8): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (VIII Parte): Minas III (A. Marques Lopes)

13 de Fevereiro de 2008
Guiné 63/74 - P2535: PAIGC - Instrução, táctica e logística (9): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (IX Parte): Defesa anti-aérea (A. Marques Lopes)

7 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2730: PAIGC - Instrução, táctica e logística (10): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (X Parte): Organização defensiva (A. Marques Lopes)