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sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Guiné 63/74 - P15336: FAP (93): O impacto do Strela na actividade aérea na Guiné - III e última Parte (José Matos, historiador e... astrónomo)


Guiné > Zona Leste > Bafatá > ambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > O célebres e velhinho caça-bomradeiro T6 G, tanbémk conhecido por "ronco", na pista de aviação de Bafatá, Em primeiro plano, o fur mil at nf, da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)  Arlindo T.Roda, autor da foto. Os T 6G vão desempemhar um importante papel no final da guerra...


Foto: © Arlindo T. Roda (2010). Todos os direitos reservados. [Edição: LG].




1. Terceira (e última) parte do artigo do nosso grã-tabanqueiro José Matos sobre a "arma que mudou a guerra", o míssil terra-ar Strela, de origem russa, introduzido na Guiné depois da morte de Amílcar Cabral, na sequência da escalada da guerra. 

Recorde-se que o José [Augusto] Matos, formado em astronomia em 2006 na Inglaterra [ University of Central Lancashire, Preston, UK ], é especialista em aviação e exploração espacial desde 1992, e faz parte da Fisua - Associação de Física da Universidade de Aveiro.

Tem-se dedicado, como investigador independente, à história militar, e em particular à história da guerra na Guiné (1961/74). 




SA 7- Grail (designação NATO), 
míssil terra-ar, de origem russa (9k 32 Strela 2), desenhado por volta de 1964 e operacional em 1968. 

Caraterísticas técnicas do SA- 7 «Grail» / 9K32M Strela-2 | Míssil antiaéreo:


Fabricante: KB Machinostroyenia; função principal: defesa antiaérea próxima; alcance: até 4,2 km; velocidade: 1300 km/h; tipo de ogiva : alto Explosivo / pré-fragmentada; peso da ogiva : 15 kg.; peso total: 10 kg; comprimento: 1.47 m; diâmetro: 72 mm; sistema orientação: infravermelhos. O Strela 2 foi concebido e testado por volta de 1964. Foi dado como operacional em 1968. Com um alcance máximo de 3,7 km e problemas com o sistema de orientação, as prestações do míssil não foram consideradas satisfatórias. Rapidamente foi lançada a versão Strela-2M, em 1971. A versão melhorada podia atingir em teoria alvos a distâncias de até 4,2 km. Era eficaz contra alvos a mais de 50 metros de altura e menos de 1500 metros.

Foto: Cortesia de Wikipedia. Imagem do domínio público.



O impacto do Strela na actividade aérea 
na Guiné (III e última parte),
  por José Matos



A evolução da guerra colonial na Guiné tomou um rumo dramático em 1973-74, quando o PAIGC (Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde) adquiriu a última versão do míssil soviético terra-ar SA-7 (Strela-2M). A utilização desta arma pela guerrilha provocou profundas alterações no emprego da aviação e na eficácia das operações aéreas. Aproveitando os efeitos tácticos do míssil, que tiveram reflexos estratégicos, os guerrilheiros lançaram várias operações de grande envergadura e a guerra entrou numa fase muito delicada. Surpreendida, inicialmente, a Força Aérea tomou rapidamente várias contramedidas que reduziram a eficácia do míssil. Que impacto teve, verdadeiramente, na actividade aérea e qual o efeito das contramedidas adoptadas é o que se pretende analisar neste artigo.

(Continuação) (*)


O efeito das contramedidas


É inegável que o aparecimento do míssil na Guiné teve consequências nas operações aéreas e no uso do poder aéreo, mas as várias contramedidas adoptadas, ao longo do ano, surtem efeito, pois mais nenhum avião volta a ser abatido até ao final de 1973, embora as equipas de mísseis continuem activas dando cobertura às acções no terreno. 

Desde finais de abril até dezembro de 1973, são referenciados 15 disparos contra aviões Fiat, mas nenhum avião é atingido [36].  Este indicador mostra que os pilotos da BA12 conseguiram, ao longo do resto do ano, contornar a ameaça antiaérea e recuperar o controlo sobre a generalidade das acções de apoio que prestavam às forças terrestres.

O único abate acontece em 31 de janeiro de 1974, quando o G.91 5437,  pilotado pelo Tenente Castro Gil,  é atingido por um míssil perto da fronteira com o Senegal, numa missão de apoio a Canquelifá. O piloto consegue ejectar-se e escapar à guerrilha, regressando no dia seguinte ao quartel de Piche, à boleia numa bicicleta de um habitante local.

No relatório de análise ao incidente verificou-se que as normas de segurança foram cumpridas, mas que “o adiantado da hora (17h30), dificultando a visibilidade, contribuiu para que não fosse possível ao nº 1 detectar o lançamento do míssil” e que “o avião ainda não tinha sido pintado com tinta de baixa reflexão de infravermelhos" [37].

Nesta altura, a Força Aérea tinha já efectuado contactos em França para comprar uma tinta de baixa reflexão, de tonalidade verde escura capaz de evitar o míssil. Mas só em março de 1974 é que chegam a Bissalanca as primeiras aeronaves pintadas com a nova tinta anti-reflectiva: o Fiat 5401 e o Alouette III 9401 [38].


As acções aéreas de ataque em 1974

A análise da actividade operacional, em 1974, mostra que as acções aéreas de ataque aumentam nos últimos meses da guerra (com excepção de março), como se pode ver no gráfico seguinte.




As acções aéreas de ataque em 1974

 Este incremento deve-se, essencialmente, ao T-6G, que passa a voar com mais frequência neste tipo de missões, nomeadamente, a partir de março, em missões ATIP [39]. Uma análise deste tipo de missões, por aeronave, permite perceber que o T-6 tem um papel importante na fase final da guerra, como se pode ver no gráfico seguinte.





Este desenvolvimento resulta, em parte, da experiência adquirida no C-47. Do famoso “Flecha de Prata”, passou-se para experimentações nos “Roncos”, como eram conhecidos, na época, os T-6G. Num destes aviões, foi aplicado um derivómetro-visor. Houve que conceber e aplicar na “aeronave artilheira”, uma pala, para evitar que o pouco óleo pulverizado, que sempre sai do escape do motor, não ofuscasse o campo de visão e o retículo de pontaria do visor. Preparou-se a indispensável tabela de tiro e executaram-se, durante o dia, alguns bombardeamentos em voo horizontal, com 4 aviões em formação. Desta forma, os “Roncos” começaram a ser usados em bombardeamentos diurnos de área a 10 000 pés, servindo o “avião artilheiro” de guia para os bombardeamentos. Nestas missões, os T-6G eram armados com 6 bombas de 15 kg e voavam em formações de 4 aviões [40].

No entanto, com a excepção de janeiro de 1974, a actividade do GO1201, baixa nos derradeiros meses da guerra, como se pode ver no gráfico 9 [41].


Em busca de sistemas antimíssil

Fiat G-91, camuflado... Hoje é peça de museu...
É também na fase final da guerra, que a FAP procura equipar os Fiat com um sistema antimíssil doflare, a comprar nos EUA. Logo no início de fevereiro de 1974, um grupo de técnicos americanos da firma TRACOR desloca-se às Oficinas Gerais de Material Aeronáutico (OGMA), em Alverca, com o propósito de estudar a possibilidade de instalação de contentores para ejecção de flares nos G.91. Os técnicos americanos concluem que é possível a instalação de 4 contentores do tipo TBC-72, lateralmente, junto ao bordo de fuga dos pylons internos do Fiat e capazes de fornecer uma protecção contínua entre 4,5 a 6 minutos, conforme a cadência de disparo dos flares [42].
tipo

Pouco tempo depois, em meados de fevereiro de 1974, o novo ministro da Defesa, Silva Cunha, dá ordens para que se iniciem rapidamente as diligências conducentes à aquisição do equipamento em causa [43].  Os custos da aquisição ascendem a 19 mil contos  [, equivalente hoje  3.062.558,26 €
(LG)] e prevê-se que esta verba possa ser suportada por conta de um empréstimo de 150 milhões de rands (6 milhões de contos) [967.123.661,80 € a preços de hoje, usando o conversor da Pordata (LG)] que Portugal fez junto da África do Sul [44]. O dinheiro sul-africano destinava-se, principalmente, a reforçar o poder aéreo com a aquisição de novas aeronaves para usar nas três frentes de guerra.

Como o TBC-72 é um equipamento de origem americana e como Portugal está sujeito a um embargo de armas, tanto o Ministério da Defesa como dos Negócios Estrangeiros tentam saber se a aquisição é possível. A 22 de abril, o embaixador português em Washington recebe instruções para apurar qual a melhor forma dos americanos venderem o equipamento, embora não devendo revelar às autoridades americanas que os flares se destinam a equipar aviões em serviço na Guiné [45].  Mas, o diplomata português já não tem tempo de fazer nada, pois, em poucos dias, dá-se o golpe militar de 25 Abril e a situação político-militar em Portugal e nas colónias muda radicalmente.

No entanto, apesar da Revolução de Abril, os responsáveis militares portugueses continuam a manter, durante algum tempo, a intenção de comprar os flares e outros sistemas antimíssil. A 21 de junho de 1974, na primeira reunião do Comité de Assistência África do Sul/Portugal (POSAAC), em Pretória, é decidido incluir na lista do material a financiar por conta do empréstimo sul-africano, 167 kits anti-Strela para os helicópteros Alouette III (kits a fornecer pela África do Sul), além do sistema TRACOR.46.  Os kits para os helicópteros eram constituídos por dois escudos térmicos sobre o motor e um deflector na tubeira do escape para desviar o fluxo de ar quente proveniente do motor. Tanto a África do Sul como a Rodésia usaram estes kits nos seus Alouette III. Nesta altura, porém, a guerra na Guiné já tinha terminado e estas aquisições deixavam de fazer sentido. A guerra do Strela tinha chegado ao fim.

José Matos (2015)

O autor agradece ao Arquivo da Defesa Nacional, ao Arquivo Histórico-Militar e à Torre do Tombo, as facilidades concedidas para esta investigação. Ao General José Lemos Ferreira, ao TGen Fernando de Jesus Vasquez, ao TGen António Martins de Matos, ao MGen António Martins Rodrigues, ao Cor Miguel Pessoa, ao TCor José Pinto Ferreira e ao Ten Jorge Vasco Moura pela leitura e comentários, bem como pelas informações prestadas.

[Fixação de texto, imagens e links: LG. Temos cerca de meia centena de referências, no nosso blogue, aos mísseis Strela]
_______________

Notas do autor:

[36] Correia, José Manuel, Strela: A Ameaça ao Domínio dos céus no Ultramar Português, 2ª parte, Mais Alto n.º 393 Setembro/Outubro 2011, p. 28.

[37] Informação n.º 462 da 2ª Repartição do Estado-Maior da Força Aérea, Assunto: Avião abatido por míssil terra-ar em 31 Jan 74, 7 de Junho de 1974, ADN Fundo Geral Cx. 5074.

[38] Correia, op. cit., p. 31.

[39] Análise dos Sitreps Circunstanciados n.º 1/74 a 17/74 do COMZAVERDEGUINÉ, Bissau, ADN/F2/16/89 e AHM/DIV/2/4/295/3.~

[40] Informação prestada ao autor pelo General Fernando de Jesus Vazquez.

[41] Análise dos Sitreps Circunstanciados n.º 1/74 a 17/74 do COMZAVERDEGUINÉ, Bissau, ADN/F2/16/89 e AHM/DIV/2/4/295/3.

[42] Informação n.º 65-Pº 4.1.5/GAB do Estado-Maior da Força Aérea, Assunto: Medidas anti-míssil Strela (Sistema TRACOR), 6 de Fevereiro de 1974, ADN/F3/7/13/5.

[43] Informação n.º 355 da Secretaria de Estado da Aeronáutica, Assunto: Equipamento antimíssil Strela (TRACOR), 18 de Abril de 1974, ADN/F3/7/13/5.

[44] Memorando de 20 de Maio de 1974 do Gabinete do Chefe do Estado-Maior da Força Aérea, ADN Fundo Geral Cx. 833/9.

[45] Nota secreta do Director Geral do MNE para o Embaixador de Portugal em Washington, Assunto: Aquisição de equipamento antimíssil Strela, 22 de Abril de 1974, ADN /F3/7/13/5.

[46] Acta da 1.ª reunião da Comissão Executiva da POSAAC, Pretória, 21 de Junho de 1974, ADN SGDN/7554.3.
_________________

Nota do editor:

(*) Postes anteriores da série > 6 de novembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15333: FAP (91): O impacto do Strela na actividade aérea na Guiné - Parte I (José Matos, historiador e... astrónomo)

segunda-feira, 11 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P20963: FAP (115): O último ano do Fiat G-91 - Parte I (José Matos)



Fig. nº 1  – Recuperação do Tenente Miguel Pessoa. 

Crédito fotográfico – Capitão Delgadinho Rodrigues 







Fig. nº 2 – Destroços do Fiat G.91 5419 pilotado pelo Tenente-Coronel Almeida Brito. Crédito fotográfico: Roel Coutinho 




1. Mensagem de José Matos:

Data - sábado, 25/04, 14:20


Assunto - Fiat na Guiné

Olá, Luís.

Acabou de sair um artigo meu na Revista Militar sobre o último ano Fiat na Guiné. Foi um ano terrível e envio-te o PDF da revista e também o artigo em word para publicar no blogue. Agradecia que divulgasses dado a temática.

Este ano vai haver mais algumas novidades, pois está para breve a saída do meu livro sobre o Estado Novo e a África do Sul na Defesa da Guiné.

Ab, José Matos


O último ano do Fiat G.91 na Guiné 

por José Matos 
,
[Publicado originalmente na 
Revista Militar N.º 4 – abril 2020, pp. 395-414-
Cortesia do autor e editor]



José Matos [, foto à direita]: Investigador independente em História Militar, tem feito pesquisas sobre as operações da Força Aérea na Guerra Colonial portuguesa, principalmente na Guiné. É colaborador regular em revistas europeias de aviação militar e de temas navais. Colaborou nos livros “A Força Aérea no Fim do Império” (Lisboa, Âncora Editora, 2018) e "A Guerra e as Guerras Coloniais na África Subsariana" (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2019).

É autor, com Luís Barroso, do livro, a sair brevemente, "Nos meandros da guerra: o Estado Novo e a África do Sul na defesa da Guiné" (Lisboa, Editora Caleidoscópio, 2020).

É membro da nossa Tabanca Grande desde 7 de setembro de 2015, tendo cerca de 3 dezenas e meia de referências no nosso blogue]



O último ano do Fiat G.91 na Guiné foi o mais difícil com a perda de cinco aviões, três deles abatidos por mísseis terra-ar SA-7 “Strela”.

O impacto desta nova arma na actividade aérea foi considerável, mas rapidamente a Força Aérea Portuguesa (FAP) adaptou-se à nova ameaça continuando a voar nos céus da Guiné. Os G.91 da Esquadra 121 desempenharam, nesse âmbito, um papel importante na resposta à guerrilha, sendo o principal vector de ataque e de apoio táctico às forças portuguesas nos meses derradeiros da guerra.

No dia 25 de Março de 1973, ao começo da tarde, o quartel de Guileje, no sul da Guiné, é flagelado por fogo de artilharia. O ataque é desencadeado em plena luz do dia para provocar a reacção da Força Aérea[1] e os militares no quartel pedem apoio aéreo a Bissalanca, onde estão sempre dois Fiat G.91 de prontidão.

Passado pouco tempo, um G.91 pilotado pelo Tenente Miguel Pessoa está na área de Guileje. Voando a baixa altitude, Pessoa procura vestígios do inimigo na zona de Gandembel, um pouco mais a norte de Guileje, mas subitamente, uma explosão faz o Fiat estremecer. O piloto tenta, desesperadamente, controlar a aeronave, mas sem sucesso. O motor está morto, as superfícies de comando não respondem, e o solo aproxima-se velozmente. Pessoa puxa a alça de ejecção sobre a cabeça e sofre o impacto da ejecção, que o lança para cima e para longe, abandonado o avião condenado, que explode com o impacto no solo.[2]
 

Contudo, ejectara-se já muito tarde. Demasiado baixo para que o pára-quedas se abrisse completamente, caiu com violência entre as árvores, acabando com uma perna partida. Ninguém sabe se está vivo ou morto, mas, ao final da tarde, consegue disparar um very-light que é visto pelo Tenente-Coronel Almeida Brito que participava com um Fiat, nas buscas. [Fig. nº 1, acima]

Na manhã seguinte, desloca de Bissau um grupo de pára-quedistas, em dois aviões Noratlas e um avião Dakota, para a Aldeia Formosa com o objectivo de resgatar o piloto. Os pára-quedistas são depois helicolocados na mata e rapidamente encontram vestígios do piloto. São depois secundados por um grupo de comandos africanos que acaba por encontrar Pessoa, sendo este levado para Guileje de helicóptero e depois para Bissau.[3] 

Na altura, ainda não o podia saber, mas fora a primeira vítima dos novos mísseis terra-ar SA-7 Strela 2, de fabrico soviético e recentemente adquiridos pelo PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde).

Três dias depois, a 28 de Março, outro Fiat, desta vez pilotado pelo Tenente-Coronel Almeida Brito é também abatido por um Strela, no sul da Guiné, provocando a morte do piloto [Fig. nº 2, acima]. 


Na manhã desse dia, o Centro de Operações da Base Aérea n.º 12 (BA12) intercepta uma mensagem proveniente da guerrilha que referia a presença de uma viatura na estrada de Ché Ché para Madina do Boé, no sul da Guiné, com uma individualidade importante do PAIGC. Dois G.91 em alerta na BA12 descolam e dirigem-se imediatamente para Ché Ché. A partir daí percorrem o trilho até Madina do Boé e continuam até próximo da base Kambera, já no território da Guiné-Conakry. Não tendo descoberto nada, os dois pilotos (Tenente-Coronel Almeida Brito e Capitão Pinto Ferreira) fazem o percurso inverso, a cerca de 500 pés de altitude. Na picada entre Gobije e Madina do Boé, a 3 km da fronteira, Almeida Brito dá conta a Pinto Ferreira de uma mata suspeita. Nesse mesmo instante, o avião de Brito explode no ar atingido por um SA-7. 


Um segundo míssil é disparado contra Pinto Ferreira, que faz uma manobra brusca, passando muito baixo sobre o terreno e, saindo assim, fora do alcance do míssil. Em seguida, sobe para os 10 mil pés para identificar o local do incidente e comunica à base o sucedido.[4] 


Além de Comandante do Grupo Operacional 1201 (GO1201), Brito era um oficial experiente e muito estimado pelos restantes pilotos. A sua morte provoca grande consternação em Bissalanca. Percebe-se depois que a mensagem interceptada era falsa e que se destinava apenas a atrair os aviões a uma armadilha. Com a morte de Brito, o comando do GO1201 passa para o Major Fernando Pedroso de Almeida.

O impacto do míssil na actividade aérea dos G.91 sente-se de imediato. O número de horas voadas pelos caças passa de 30 horas na última semana de Março para 22 horas na primeira semana de Abril e para apenas 9 horas na segunda semana desse mês, quando a ameaça do míssil ganha contornos dramáticos com o abate de 2 aviões Dornier DO 27 e um T-6. 
Porém, na semana seguinte, volta a aumentar para 22 horas e atinge novamente as 30 horas, na última semana de Abril, o que mostra que os “Tigres” se adaptaram à nova ameaça.[5] 


No entanto, a perda de dois jactos afecta também o quantitativo atribuído à BA12. De 11 aviões disponíveis, os “Tigres” passam para 9. A situação leva, em Junho, a que sejam atribuídos mais 2 Fiat à ZACVG (Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné) para compensar as perdas de Março, sendo o 5428, acabado sair de IRAN, cedido pela Base de Monte Real (BA5) e o 5434, ainda em IRAN, retirado da reserva nas OGMA (Oficinas Gerais de Material Aeronáutico).[6] Os 2 aviões chegam à BA12 em meados de Julho.[7] 



Novas tácticas

O aparecimento do Strela leva a Força Aérea, logo em Abril, a informar-se sobre as suas capacidades e limitações de forma a adoptar contramedidas. Em Lisboa, a Direcção Geral de Segurança (DGS) obtém informação sobre o míssil através dos Serviços Secretos Alemães (BND), informação que depois é transmitida ao Secretariado-Geral da Defesa Nacional (SGDN) e às chefias militares, nos três cenários de guerra africanos.

A informação recolhida junto do BND indica que o SA-7 não tem capacidade de actuação acima dos 1500 metros de altitude (5000 pés) nem abaixo dos 50/60 metros (160/190 pés) - embora informações recolhidas mais tarde mostrem que o SA-7 podia actuar até aos 8000 pés (2400 metros)[8] - e que é possível evitar o míssil por meio de manobras evasivas e da adopção de altitudes de segurança. 


A informação da DGS refere também as características positivas e negativas do míssil salientando, nas positivas, o manuseamento e utilização fácil, além da alta velocidade e mobilidade da arma. Quanto às negativas, era referido que só são possíveis tiros de perseguição, e a impossibilidade de utilização em todas as condições meteorológicas, o alcance efectivo relativamente pequeno, os reflexos térmicos provenientes do solo que podiam confundir o sensor de infravermelhos, a fácil identificação pelo rasto de fumo e ainda o baixo peso da ogiva (1kg), que exigia o impacto directo do míssil para a destruição do alvo. [9]

Munidos desta informação, os “Tigres” passam então a usar novas tácticas de aproximação ao alvo e fuga, de forma a evitar os mísseis. As missões de ataque ao solo passam a ser feitas com altitudes de entrada e saída mais elevadas. 


Nas missões ATIP (Ataque Independente Planeado), o início da picada começa nos 10 000 pés com a largada de bombas a 6000 pés, sendo que o ponto mais baixo da trajectória não deveria situar-se abaixo dos 2500 pés. Nas missões ATAP (Ataque de Apoio Próximo), os Fiat podiam levar apenas bombas tendo que executar as missões nas mesmas condições de ATIP.[10] 


Além disso, a actuação em parelha passa a ser obrigatória, pois permite que um dos caças fique em posição de vigilância fora do alcance do míssil, perscrutando o solo e o espaço aéreo em torno do outro jacto, que efectua o ataque, com o intuito de detectar disparos do míssil e lançar, na frequência de intercomunicação, a mensagem de alerta de míssil. 


Relativamente ao disparo do SA-7 podia ser detectado tanto pela assinatura que deixava no terreno como também no ar. No terreno, a assinatura era caracterizada pelo aparecimento repentino duma bola de fumo muito branco, resultante da ignição e expulsão projéctil do tubo de disparo. No ar, a assinatura era formada pelo rasto de fumo da carga impulsora de combustível sólido, indiciando a trajectória do projéctil. Desta forma, quando um piloto visse um Strela a aproximar-se podia sair fora do alcance relativamente estreito do detector de infravermelhos através de uma rápida mudança de altitude e direcção.


As manobras evasivas 

A eficiência destas manobras é confirmada mais tarde, em Outubro de 1973, quando um atirador de mísseis do PAIGC, Armando Baldé, se entrega na guarnição de Tite às forças portuguesas. O ex-guerrilheiro revela então que os insucessos nos lançamentos do míssil contra o G.91 se deviam sobretudo à dificuldade do Strela em adquirir o alvo durante a picada do avião e também devido ao facto dos pilotos saírem dos passes de bombardeamento ou tiro, numa manobra de volta muito apertada, que superava as capacidades de manobra do míssil. [11] 

Esta táctica exigia, contudo, frieza e presença de espírito da parte do piloto, para executar a manobra mantendo o mais correcto equilíbrio entre a aceleração e a ascensão. Se apertasse demasiado (na gíria aeronáutica “se aplicasse muitos Gs”) o avião perdia velocidade e razão de subida, muito rapidamente. A geometria da volta passava a ser rectilínea quando olhada do solo. Caso enfrentasse um atirador de Strela experiente e calmo, podia ser abatido se o atirador atrasasse o disparo do míssil, na expectativa de que o piloto cometesse o erro descrito.

Outra excelente manobra de evasão era metralhar a picar e sair dos passes de tiro a descer em volta até ao nível um pouco acima do topo das árvores. Com esta manobra expunha-se muito menos a fonte de emissão de infravermelhos do avião, o cone de escape, à leitura do sensor de infravermelhos do míssil, comparativamente ao que acontecia quando se faziam saídas de ataque a subir, onde essa exposição era maior. A possibilidade de sobrevivência aumentava muito, conferida tanto pela velocidade como pela protecção oferecida pela baixa altitude, onde o calor irradiado pelo solo suplantava o emitido pelo avião. 


Este procedimento tinha, todavia, o problema da última aeronave a sair do passe de tiro não ter a vigilância e o aviso do outro avião, quanto a um eventual disparo do míssil. Desta forma, quando praticada, esta manobra exigia um cuidadoso planeamento da saída do último caça do passe de tiro. Com o decorrer do tempo, alguns pilotos praticaram este procedimento.[12]

 
As grandes ofensivas da guerrilha 

Sabe-se hoje que as primeiras acções com o míssil visavam sobretudo preparar o terreno para duas grandes ofensivas da guerrilha contra duas guarnições de fronteira: Guidage e Guileje.[13] [Fig. nº 3]

Em primeiro lugar, os guerrilheiros atacam e isolam o quartel de Guidage, perto da fronteira com o Senegal. O primeiro bombardeamento a Guidage acontece a 6 de Abril e aproveitando a evacuação de um ferido em DO-27, os guerrilheiros abatem dois aviões destes, além de um T-6, que participa, mais tarde, na operação de busca dos aviões abatidos.[14] O quartel fica praticamente isolado durante todo o mês de Maio. As vias de comunicação são minadas e as colunas de reabastecimento caem várias vezes em emboscadas. 


A situação leva as forças portuguesas a montar uma operação em grande escala (Operação Ametista Real), contra a base de Kumbamori, no Senegal, para a qual é mobilizada uma força de 450 comandos com o apoio de meios aéreos. A Esquadra 121 participa na operação com seis aviões Fiat, cada um equipado com duas bombas de 750 libras. Logo ao começo da manhã do dia 20 de Maio, os “Tigres” levantam voo de Bissalanca, mas um dos aviões pilotado pelo Capitão Pinto Ferreira é obrigado a regressar devido a uma colisão com um pássaro, que lhe danifica o motor. Para aterrar em segurança, o piloto larga as bombas com as cavilhas de segurança, no rio Geba. 


Entretanto, os outros cinco jactos entram em acção e bombardeiam a zona onde se supunha estar situada a base.[15] As bombas atingem alguns paióis de munições provocando rebentamentos violentos.[16] A base é depois atacada pelos comandos, que se envolvem num longo combate com os guerrilheiros. Só ao início da tarde, após duros combates, os comandos retiram da zona com o apoio da Força Aérea. A manobra de retirada é lenta e difícil e é pedido apoio de fogo aéreo e os Fiat, que tinham ficado em alerta na BA12, voltam a descolar rumo a Kumbamori para apoiar a retirada.[17] Nenhum avião é atingido, embora existissem na zona mísseis Strela. 






Fig. nº 3 – As grandes ofensivas da guerrilha na Guiné em 1973. Infografia: cortesia de Paulo Alegria.



Guidage resiste com grande custo ao cerco da guerrilha, sendo visitada, a 13 de Maio, pelo General Spínola, que desceu de helicóptero na povoação sitiada.[18] Spínola incita os militares a resistirem e sob o comando do Tenente-Coronel Correia de Campos, a guarnição aguenta o cerco até ao final de Maio, nunca abandonando a posição.[19] 

Depois de Guidage é a vez de Guileje, no sul da Guiné. Este quartel ficava situado numa zona vital da rota de reabastecimento da guerrilha e o seu abandono seria uma vitória importante para o PAIGC.

A guarnição de Guileje é sujeita a violentas flagelações, entre os dias 18 e 21 de Maio. Nesta última data, o quartel é bombardeado com intensidade e fica sem comunicações rádio com Bissau e com as Unidades mais próximas. 


Nessa altura, a 22 de Maio, o comandante da guarnição, Major Coutinho e Lima, decide abandonar Guileje com tudo o que lá havia, permitindo a entrada do PAIGC no quartel, três dias depois, sem qualquer resistência. A guerrilha permanece no quartel apenas algumas horas retirando de seguida. Os militares e a população de Guileje refugiam-se em Gadamael Porto, mas os guerrilheiros, motivados pela vitória alcançada, atacam de seguida Gadamael. 


Os primeiros bombardeamentos começam no dia 31 de Maio e prolongam-se pelos dias seguintes de forma intensa provocando grandes estragos no quartel e também a fuga de muitos militares.[20] Os Fiat actuam logo nos primeiros dias, bombardeando as posições de artilharia do PAIGC, na vizinha República da Guiné.[21] 


Quanto a Gadamael, resiste graças à intervenção de duas companhias de tropas paraquedistas enviadas para a defesa do quartel.[22] 
Depois da perda de Guileje, o comando militar em Bissau, não podia perder mais nenhum quartel no sul da Guiné, daí o empenho na defesa de Gadamael. 

Como se pode ver, mesmo no pico da crise militar, os Fiat de Bissalanca continuam a voar actuando tanto a norte na zona de Guidage e Binta, como a sul em Guileje e Gadamael, sendo flagelados algumas vezes quer por mísseis terra-ar, mas sem consequências,[23] quer pelas armas antiaéreas de Kandiafara nos ataques que fazem a esta base da guerrilha no país vizinho para aliviar a pressão sobre Gadamael. [24]

O número de horas de voo dos “Tigres” [Fig. nº 4] sobe assim de 83 horas em Abril para 128 horas em Maio. Como se pode ver pelo gráfico seguinte, a exploração operacional dos G.91 aumenta a partir de Agosto/Setembro mantendo uma média mensal de 150 horas até ao final do ano. A média dos 10 meses é, no entanto, de 130 horas mensais.[25] [Fig. nº 5]




Fig. nº 4 - Linha da frente em Bissalanca. 
Crédito fotográfico: Alberto Cruz





Fig. nº 5 - Exploração operacional: horas de voo (1973)


 

 A saída de Spínola 

A difícil situação militar leva Spínola a escrever, a 22 de Maio de 73, ao Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas (CEMGFA), General Costa Gomes, e ao ministro do Ultramar, Silva Cunha, pedindo um reforço de meios para a Guiné “não tanto em ordem à obtenção do sucesso militar, mas tão-somente à prevenção de um colapso a prazo mais dilatado.” [26] 

Spínola alerta Costa Gomes e Silva Cunha para a possibilidade de um colapso militar na Guiné, o que provoca grande preocupação em Lisboa. É então decidido enviar o CEMGFA à província para se inteirar da situação.[27] Costa Gomes desloca-se à Guiné a 6 de Junho e fala com os diversos sectores militares para diagnosticar a situação. 


No fim da visita, a 8 de Junho, preside a uma reunião no quartel-general em Bissau, com a presença de Spínola e dos principais comandantes militares no território. Durante a reunião, os oficiais presentes, defendem que a situação militar exige um retraimento do dispositivo que evite o aniquilamento das guarnições de fronteira e concentre meios na zona mais interior da província de forma a “ganhar tempo e consolidar um reduto final que “in extremis” ainda possa permitir uma solução política do conflito.”[28] 


Outra preocupação manifestada na reunião é a possibilidade da guerrilha usar meios aéreos e Spínola alerta para a “extrema gravidade que se revestirá um ataque aéreo a Bissau, dada a vulnerabilidade dos órgãos essenciais de apoio logístico.”[29] 


Face a esta análise, Spínola salienta a necessidade urgente de novos meios de combate na Guiné capazes de contrabalançar o crescente poderio militar do PAIGC. Para a Força Aérea são pedidos 8 aviões de transporte Skyvan, 12 caças Mirage, 5 helicópteros e 1 radar de detecção. A este pedido acresce ainda mais homens e material para o Exército, além de lanchas para a Marinha. No fecho da reunião, Costa Gomes refere que não é possível, por absoluta falta de meios, reforçar o teatro de operações com os pedidos feitos por Spínola, mas concorda com a remodelação do dispositivo no sentido da retracção das unidades de fronteira.[30]

A impossibilidade de fornecer novos meios de combate e a alteração no dispositivo levam Spínola a escrever uma nova carta ao ministro do Ultramar manifestando a sua discordância quanto à retracção do dispositivo militar e ao abandono de certas áreas geográficas junto às fronteiras deixando à sua sorte as populações aí residentes, solução com a qual não se identificava, embora a considerasse necessária perante a falta de meios.[31] Desiludido com a política seguida pelo Governo, Spínola terminava a carta pedindo a sua substituição, o que só aconteceria em Setembro, com a chegada à Guiné, do General Bettencourt Rodrigues.

É já com Bettencourt Rodrigues que as forças portuguesas na província recebem algum reforço militar em homens, material AA de 94 mm (obsoleto como arma antiaérea) e um navio patrulha, mas nada que permita aumentar substancialmente o potencial de combate na Guiné.[32] 


A 24 de Setembro, numa cerimónia na região do  Boé, o PAIGC proclama, perante um grande número de convidados estrangeiros, a independência da Guiné-Bissau, mas esta nova situação não tem impacto no desenrolar da guerra.

A FAP tenta recuperar a iniciativa aumentando as missões de ataque assim como o espectro de actuação das aeronaves empenhadas. Além das missões diurnas, a Força Aérea começa também a desenvolver missões nocturnas usando para esse efeito, o G.91 e um C-47 adaptado a missões de bombardeamento.
 

(Continua)

[Revisão / fixação de texto para efeitos de publicação no blogue: LG}
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Referências:

[1] Hernández, Humberto Trujillo, El Grito del Baobab, Editorial de Ciencias Sociales, Havana, 2008, p.114.
 

[2] Pessoa, Miguel, Um Fiat Abatido in a Guerra de África de José Freire Antunes, Volume 2, Círculo de Leitores, 1995, pp. 987-990.
 

[3] Rebocho, Manuel Godinho, Elites Militares e a Guerra de África, Roma Editora, 2009, p. 306
 

[4] Estado Maior da Força Aérea, Processo n.º 1242 de Averiguações por Acidente em Serviço, de José Fernando de Almeida Brito, Bissalanca, 3 de Abril de 1973, Serviço de Documentação da Força Aérea/Arquivo Histórico (SDFA/AH).

[5] Análise dos SITREPS Circunstanciados n.º 13, 14, 15, 16 e 17/73 do COMZAVERDEGUINÉ, Arquivo da Defesa Nacional (ADN) /F2/SSR.002/87.

[6] Informação nº 198 da 3ª Repartição do Estado-Maior da Força Aérea, Assunto: Atribuição de Fiats à ZACVG, 6 de Junho de 1973, SDFA/AH-SEA/Guiné 1964-1974/Fiat Processo 430.121.

[7] Análise dos SITREPS Circunstanciados n.º 28 e 29/73 do COMZAVERDEGUINÉ, ADN F2/SSR.002/87.

[8] Relatório imediato da Delegação em Moçambique da DGS, Assunto: Míssil solo-ar Strela 2, 3 de Novembro de 1973, ADN/F3/1/1/1.

[9] Informação Suplementar do Secretariado Geral da Defesa Nacional, Assunto: União Soviética: Míssil Terra-Ar individual GRAIL (SA-7), Fonte: DGS, 9 de Abril de 1973, Lisboa, ADN SGDN/5681/7.

[10] Directiva 20/73 do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné, Bissau, 29 de Maio de 1973, Arquivo Histórico-Militar AHM/DIV/2/4/228/2.

[11] Fraga, Luís Alves, A Força Aérea na Guerra de África (1961-1974), Editora Prefácio, Lisboa, 2004, p. 113 e Relatório Imediato nº 5641/73/DI/3/SC da DGS sobre o míssil solo-ar Strella-2, 31 de Outubro de 1973, ADN/F3/1/1/1.

[12] Informação prestada ao autor pelo General Fernando de Jesus Vasquez.

[13] Calheiros, José Moura, A Última Missão, Caminhos Romanos, Porto, 2010, p. 634.

[14] SITREP Circunstanciado n.º 14/73 do COMZAVERDEGUINÉ, Bissau, ADN/F2/16/87 e José Moura Calheiros, op., cit. p. 439.

[15] Catarino, Manuel, Operação Ametista Real in As Grandes Operações da Guerra Colonial, Volume 10, Presselivre, Imprensa Livre SA, Lisboa, 2010, pp. 47-52 e José Moura Calheiros, op., cit. p. 433.

[16] Relatório da Operação Ametista Real, Bissau, 26 de Julho de 1973, Arquivo Histórico Militar AHM/DIV/2/4/133/2.

[17] Catarino, op., cit. p. 54.

[18] Entrevista de António Spínola a Manuel Bernardo in Marcelo e Spínola: A Ruptura – As Forças Armadas e a Imprensa na Queda do Estado Novo, 1973-1974, 3ª Edição, Edium Editores, Porto, 2011, p. 209.

[19] Calheiros, op., cit. pp. 437-463.

[20] Calheiros, op., cit. pp. 516-521.

[21] Informação prestada ao autor pelo TGen. Martins de Matos.

[22] Calheiros, op., cit. pp. 513-545.

[23] Análise dos SITREPS Circunstanciados n.º 19, 20, 21, 22, 23, 24 e 25/73 do COMZAVERDEGUINÉ, Bissau, ADN/F2/16/87.
 

[24] Calheiros, op. cit., p. 543.

[25] SITREPS circunstanciados do COMZAVERDEGUINÉ, ADN/F2/SSR.002/87 e 88.

[26] Spínola, António, País Sem Rumo, Editorial SCIRE, 1978, p. 56.

[27] Cunha, Silva, O Ultramar, a Nação e o 25 de Abril, Atlântida Editora, Coimbra, 1977, p. 53.

[28] Acta da reunião de Comandos de 8/6/73, Secretariado-Geral da Defesa Nacional, Processo n.º 2202, Pasta A, ADN F3/17/34/4.

[29] Ibidem.

[30] Ibidem.

[31] Spínola, op., cit. pp. 60-62.

[32] Estudo do CCFAG sobre a área do Boé, Secretariado-Geral da Defesa Nacional, Processo n.º 2202, Pasta A, ADN F3/17/34/4.

[33] Informação prestada ao autor pelo General Fernando de Jesus Vasquez.

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Nota do editor:

Último poste da série > 7 de dezembro de  2019 > Guiné 61/74 - P20503: FAP (114): O helicóptero Alouette II

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3866: FAP (7): Troca de lugar no ALL III salvou-me a vida, em 25 de Julho de 1970 (Jorge Caiano, mecânico do Alf Pilav Manso)


Guiné > Região do Oio > Rio Mansoa > 1970 > Restos do Helicóptero Alloutte III, que se despenhou no dia 25 de Julho de 1970, no Rio Mansoa, em consequência das condições climatéricas. Nele morreram, além do piloto (Alf Pilav Francisco Lopes Manso), o Cap Cav José Carvalho Andrade e mais 4 deputados em visita à Província (entre eles Pinto Leite, o então chefe da Ala Liberal da Assembleia Nacional, e o guineense Pinto Bull).

Cortesia de: © Victor Barata (2008) /Blogue
Especialistas da BA12, Guiné 1965/74. Direitos reservados.
1. Mensagem do editor L.G.:

Em complemento do que já escrevi em poste anterior (*):

No passado dia 31 de Janeiro, sábado, por volta da hora do almoço, recebi um telefonema do Jorge Caiano (espero ter ouvido bem o nome) que era o mecânico do heli do Alf Pilav Manso, no dia 25 de Julho de 1970... Ele informou-me que tinha chegado ao conhecimento do nosso blogue através do blogue do Victor Barata...

O Caiano vive no Canadá, na região de Toronto, desde 1974. É, portanto, um português da diáspora. Nascido em Louriçal, Pombal, foi cedo viver para Aveiro. Tem hoje cerca de 60 anos.

Na tropa, era mecânico da FAP, esteve na BA12, Bissalanca, cerca de 22 meses (1969/70). Regressou em Novembro de 1970.

Prometeu mandar-me um mail. Não está muito familiarizado com a Internet. E eu prometi resumir, no nosso blogue, a conversa que tive com ele ao telefone. Manda um abraço para todos os camaradas da FAP e em especial para os pilotos Félix e Coelho, que ele conheceu em Bissalanca e com quem voou (mais com o Coelho do que com o Félix).

Eis, no essencial, a conversa que ele teve comigo, ao telefone, sobre o trágico acidente do ALL III, que causou seis vítimas mortais:

Por decisão do comandante da esquadrilha, o Cap Pilav Cubas, e aparentemente por uma questão de peso, o Caiano seguiu com ele e não com o Alf Manso, na viagem de regresso a Bissau... (Em princípio, era aos mecânicos que competia avaliar o peso dos helis. Mas neste caso, o Jorge teve que seguir as ordens do seu comandante).

Ia o Manso à esquerda, o Cubas ao meio, o Coelho, à direita. Os três helis voavam em formação quando foram apanhados por uma tempestade tropical. Havia muito pouca visibilidade. Mas deu para ele, Jorge Canao, se aperceber de uma pequena explosão ("uma chama") no interior do heli do Manso. Segundo a sua teoria, o passageiro ao lado do piloto (um dos deputados ? o oficial do Exército ?) deve ter accionado a alavanca do gás (sic). Por inadvertência ou pânico...

O Manso, que era periquito (tinha chegado há dois meses), deve ter perdido o conrolo da situação...

O Jorge Caiano foi testemunha deste caso em tribunal militar. E lembra que, a partir daí, a FAP proibiu que os passageiros viajassem, nos helis, ao lado do piloto, no lugar do mecânico. Os oficiais do Exército (e s0bretudo os oficiais superiores) gostavam muito desse lugar por que tinha uma vista panorâmica. Via-se muito melhor a paisagem....

O heli do Manso despenhou-se no Rio Mansoa, "por volta das 15 horas", do dia 25 de Julho de 1970 (não parece ter dúvidas sobre a data), tendo morrido ou desaparecido 4 deputados da Nação (incluindo o Dr. Pinto Leite, chefe da chamada ala liberal da então Assembleia Nacional), além do Manso e de um oficial do exército do QG. Um dos deputados era o guineense Pinto Bull, que também tinha um filho, mecânico da FAP, a cumprir o serviço militar na Guiné (Bissalanca, BA12). Por sua vez, a mulher do piloto era pressuposto chegar de Lisboa, no dia seguinte. (***)

O Jorge confessa que deve a vida ao destino, à troca de lugar, imposta pelo Cap Pilav Cubas. Essa foi a razão por que ainda hoje está vivo, diz ele, do outro lado do telefone... E acredita que o destino marca a hora. Este acidente de guerra marcou-o para toda a vida.

O Jorge vive perto do Toronto. Responde-me que a crise (económica) também já chegou lá. É amigo de alguns tipos da minha terra, Lourinhã, como o Manuel do Rosário (que ainda é meu parente afastado e é do meu tempo de escola) e do José Jorge.
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Notas de L.G.

(*) Vd. poste de 31 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3825: FAP (2): Em cerca de 60 Strellas disparados houve 5 baixas (António Martins de Matos)

ÚLtimo poste desta série > 9 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3859: FAP (6): A introdução do míssil russo SAM-7 Strela no CTIG ( J. Pinto Ferreira / Miguel Pessoa)

(**) Vd, postes do nosso blogue:

20 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3335: Controvérsias (6): O acidente aéreo de 25 de Julho de 1970 (Carlos Ayala Botto)

11 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3296: Controvérsias (4): O acidente aéreo de 26 de Julho de 1970 (Jorge Picado)

10 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3292: Controvérsias (3): O acidente de helicóptero que vitimou Pinto Leite (J. Martins / J. Félix / C. Vinhal / C. Dias)

10 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3291: (Ex)citações (4): Pinto Leite, em Bambadinca, dois dias antes de morrer em desastre de helicóptero: Não há solução militar

(***) Vd. postes no blogue so Victor Barata, sobre o malogrado Alf Pilav Manso:

4 de Novembro de 2008 > 514 - UM APELO DA IRMÃ DO ALF PILAV MANSO.

(...) Boa tarde, sou irmã do saudoso Alf Piloto Av FRANCISCO LOPES MANSO. Logo que descobri este blogue sobre os camaradas da Guiné, comecei a ler pois falavam muito vagamente no meu irmão. Era Piloto Aviador, formado na Academia Militar, e foi parar à Guiné com os helicópteros.

Nunca soubemos a verdade sobre o acidente . Os meus Pais faleceram com esse desgosto. """DESAPARECIDO""" e pronto!!!!!.

Fiquei muito sensibilizada com a sua recordação do meu querido mano Mano. Ficámos 5 irmãs com esta dúvida no nosso coração. Ele era português, nascido nos Envendos distrito de Mação em 4 de Março l944.

Muito obrigada pela recordação dele. Pois ele nem aparece no monumento aos combatentes do Ultramar.Sem o conhecer envio um abraço muito comovida.Vivi em Luanda , agora vivo em Aveiro.

Natália Maria


7 de Novembro de 2008 > 521 A RESPOSTA À IRMÃ DO MANSO

(...) No passado dia 4.11,através do Post 514, publicámos um apelo feito pela irmã do nosso companheiro Alf Pilav Francisco Manso, falecido em Mansoa, Guiné a 25.7.1970, no sentido de recolher elementos que a pudessem esclarecer melhor sobre este assunto visto à data do acontecimento,e ainda hoje,nunca ter sido indicado as causas do acidente.

Chegaram já até nós dois apontamentos que nos merecem os agradecimentos e que transcrevemos:

Salgado Gonçalves
Sarg Chefe 1ª/68 Guiné

UMA RESPOSTA PARA A IRMÃ DO ALF PILAV FRANCISCO MANSO


Companheiro Victor, na tua pessoa mais uma vez saúdo todos os companheiros. Quase diariamente passo pelo 'nosso' blog para ficar a par das novidades, hoje vi o pedido da irmã do falecido companheiro, Alf Pilav Manso.

Não tenho muito para dizer... Foi na época da minha estada na BA12 69/71, lembro-me que a missão consistia em transportar uns deputados da então Assembleia Nacional, parece-me que à povoação de Mansoa que dava nome ao rio, onde o heli caiu.Todos quantos iam no Heli faleceram além do Manso e, entre outros, ia um deputado natural da Guiné, penso que de nome Pinto Bull, não tenho a certeza. Da missão faziam parte pelo menos dois Helis, o outro julgo que era pilotado pelo comandante da esquadra Capitão Cubas.

A perda do Manso foi muito sentida por todos nós pois era uma excelente pessoa. Junto envio umas fotos do Heli depois de recuperado. Por hoje é tudo cumprimentos para toda a rapaziada.

Salgado Gonçalves, Cabo MMA 1ª 68
(...)

ARQUIVO HISTÓRICO DA FORÇA AÉREA PORTUGUESA

Exmo Senhor,

Em resposta ao Vosso email sobre o acidente do ex ALF/PILAV Francisco Lopes Manso, local do acidente, Rio Mansoa, junto à Ilha de Lisboa. Originou a morte do Piloto desaparecido e de um Capitão do Exército e mais quatro civis, o acidente deu-se com um ALLIII que caiu no Rio Mansoa derivado a um tornado e muita chuva, os corpos do CAP do Exército e dos civis apareceram sem vida e o corpo do piloto não apareceu.

Mais informo que o ex Piloto consta na lista dos falecidos da Força Aérea no Arquivo Histórico da FAP.

Com os melhores Cumprimentos
AHFA (...)


O editor do blogue, o nosso camarada Victor Barata, escreveu o seguinte, em jeito de nota final:

"A causa imputável, as condições meteorológicas. Tornado tropical: Ventos violentos com turbilhão, Chuvas, Visibilidade zero. Estas condições meteorológicas foram confirmadas por tripulações de helicópteros que voavam na proximidade da zona. A marinha efectuou busca no rio. Recuperação da estrutura, sem os corpos da tripulação, e dos passageiros". (...)

sábado, 28 de março de 2009

Guiné 63/74 - P4088: FAP (20): Efemérides: 36 anos após a morte do Ten Cor Pilav Almeida Brito, abatido por um Strela em Madina do Boé (Miguel Pessoa)

1. Mensagem do Miguel Pessoa (ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74):

Luís:

Em 28 de Março de 2009 passam 36 anos sobre a morte do Ten Cor Pilav Brito (foto, à esquerda), abatido nos céus da Guiné quando pilotava um Fiat G-91 numa missão próximo de Madina do Boé.

Apenas conheci o TC Brito na Guiné mas, nos quatro meses que mediaram entre a minha chegada e a sua morte, tive a oportunidade de apreciar as suas grandes qualidades como Piloto, como Militar e como Homem.

Fomos os dois primeiros pilotos a ser alvejados por um Strela (que passou pelo meio dos nossos dois Fiats) em Campada (na fronteira norte) no dia 20 de Março; e fomos também os dois primeiros a ser abatidos por um Strela - eu em 25 e ele em 28 de Março.

Não me esqueço da importância que ele teve na minha recuperação, pouco tempo antes de ele próprio perder a vida, em circunstâncias idênticas, mas com menos sorte do que a que eu tive.

E também não me esqueço das palavras com que me acolheu, na minha apresentação:

"Você não está aqui para ganhar medalhas, mas sim para ajudar os nossos militares que estão para aí espalhados pelo mato".

Penso ter honrado a sua memória, pois foi isso mesmo que eu tentei fazer.

Miguel Pessoa

[Cor e bold, de L.G.]

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Notas de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 25 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4077: FAP (19): Efeméride: há 36 anos sob os céus de Guileje 'Batata' procura e localiza 'Kurika' (António Martins de Matos)

(**) Vd. poste de 9 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3859: FAP (6): A introdução do míssil russo SAM-7 Strela no CTIG ( J. Pinto Ferreira / Miguel Pessoa)

sábado, 14 de março de 2009

Guiné 63/74 - P4029: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas (6): O anjo da guarda do Zé de Guidaje (Giselda Pessoa)

Guiné > Região do Cacheu > Mapa de Guidaje > Em 6 de Abril de 1973, o DO 27 em que seguia a enfermeira pára-quedista Giselda Antunes, com um ferido grave, de Guidaje para o Hospital Militar de Bissau, foi ele próprio vítima do disparo de um míssil terra-ar Strela, tendo sido obrigado a aterrar de emergência em Bigene... Foi um dia trágico, esse, para a FAP e o resto das nossas tropas.

Foto: © Miguel Pessoa (2009). Direitos reservados


1. Mensagem do Miguel Pessoa, em nome de Giselda Pessoa, Srgt Enf Pára-quedista

Caro Luís

Como já tens um texto meu por publicar (o da ejecção no Guileje), mando-te agora um da Giselda, acerca de uma evacuação no Guidaje. Não é má vontade nossa... Acontece que, pelos vistos, estes sítios davam-nos bastante trabalho... Espero que o nosso companheiro António Matos (Poste 4007) não fique desagradado com esta nossa insistência, mas não é por mal... Para compensar, de aqui a uns dias mando um sobre o Cacine - sempre é um bocadinho ao lado do Guileje...
Abraço. Miguel


2. As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas (*) >

O ZÉ DO GUIDAJE


Há quase dois anos tive a oportunidade de ser contactada pelo Zé, um velho conhecido da Guiné.

Tudo começou com um artigo publicado num jornal sobre um ex-piloto da Força Aérea na Guiné, o então Ten Miguel Pessoa, artigo esse em que era referido o facto de ele ter casado com uma ex-enfermeira pára-quedista, Giselda - eu. Contava-se também a minha ida atribulada ao Guidaje no dia em que outros aviões foram abatidos pelos mísseis Strela. Com esses dados em mão, o Zé iniciou a busca de um contacto telefónico e, tendo-o conseguido, foi-lhe fácil chegar à fala comigo.

Soube assim que o Zé era um ex-militar que tinha cumprido uma comissão de serviço na Guiné, mais concretamente no Guidaje, de onde tinha sido evacuado em 6 de Abril de 1973, e que procurava confirmar se tinha sido eu a enfermeira que tinha feito essa evacuação.

6 de Abril é uma data que está fortemente marcada na minha memória e não preciso de vasculhar papéis para saber o que sucedeu nesse dia. Dois aviões foram abatidos, um terceiro desapareceu, perderam-se três pilotos e um enfermeiro da Força Aérea, dois oficiais e um sargento do Exército, um milícia local do Guidaje. E o avião em que eu seguia para uma evacuação no Guidage quase foi abatido. Tudo isto já tem sido referido em vários sítios, até neste blogue (**).

O que não se sabe, e este telefonema veio relembrá-lo, é que o dia 6 de Abril começou para mim com uma deslocação ao aquartelamento de Guidaje, logo às primeiras horas da manhã, a fim de evacuar um militar do Exército gravemente ferido. E o mais curioso - e tocante - é que esse militar, descobria-o agora, era o Zé, o homem que estava ao telefone.

Naturalmente, tivemos uma interessante conversa, embora limitada pelo próprio meio utilizado. Mas ficou-me a ideia de poder vir a falar pessoalmente com ele, no futuro. Essa oportunidade surgiu há cerca de um ano, quando fui contactada por um responsável por uma produtora de trabalhos para o Canal História (***). Pretendia essa produtora fazer uma reportagem sobre as enfermeiras pára-quedistas em Portugal, pedindo o contributo das ex-enfermeiras para prestarem depoimentos sobre as suas experiências pessoais.

Para além de me disponibilizar para essa entrevista, lembrei-me de propor igualmente que o Zé fosse convidado a participar nessas gravações, pois certamente o seu testemunho seria interessante. Dado que concordaram, acabei por ter a oportunidade de me encontrar com o Zé em Lisboa, no decorrer dessas gravações.

O que eu me lembro, o que ele me disse e o que ficou gravado podem resumir-se, de uma forma simples, no seguinte:

O Zé encontrava-se a trabalhar na construção de um telhado de um edifício, no exterior, quando repentinamente o quartel é alvejado pelo PAIGC. Estando a descoberto naquele momento, tenta procurar um abrigo, mas quando ali chega verifica que o abrigo está cheio, principalmente com gente da população. Não tendo possibilidade de se proteger completamente, fica à entrada, meio a descoberto. Ouve de repente uma explosão muito próxima, de uma granada ou morteiro, e nesse instante sente um impacto no corpo. Leva as mãos ao corpo e retira-as cheias de sangue.

Após um período de semi-inconsciência, lembra-se de ter aberto os olhos e ver uma senhora com uma T-shirt branca e calças de camuflado, não sabendo se tinha morrido e se era o seu anjo da guarda que ali estava. Recorda ainda a evacuação no DO-27 para a BA 12 e o transporte para o Hospital. Refere-me ainda ter a plena consciência de que hoje não estaria aqui se não tivesse sido evacuado naquele momento.

Afastando a hipótese do anjo da guarda, devo concordar com ele no restante. O Zé teve a oportunidade de utilizar o único avião que nesse dia conseguiu ter êxito na evacuação de feridos do Guidaje. A gravidade do seu estado não aconselhava de modo nenhum a sua permanência no aquartelamento. O avião, em que pouco tempo depois regressei ao local, acabou por ter de aterrar de emergência em Bigene, depois de alvejado por um Strela, e não poderia tê-lo evacuado. O avião que substituiu este na missão, embora tendo aterrado no Guidaje e descolado com um ferido a bordo, desapareceu após a descolagem, nunca mais se sabendo nada do avião e das pessoas que lá seguiam. Se o Zé tivesse seguido também nesse avião, seria hoje mais uma baixa a lamentar.

O Zé deve a sua vida em grande parte à sorte, embora possa ter tido uma pequena ajuda de alguém que, não sendo anjo da guarda, estava ali precisamente para o apoiar.

Giselda Pessoa (****)

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Notas de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 8 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3999: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (5): Justamente recordadas no Dia Internacional da Mulher

(**) Vd. poste de 9 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3859: FAP (6): A introdução do míssil russo SAM-7 Strela no CTIG ( J. Pinto Ferreira / Miguel Pessoa)

(...) 5. Em 6 de Abril de 1973, agora no Norte do território da Guiné, a fortuna foi ainda mais madrasta para o Grupo Operacional 1201 da Guiné. Nesse dia, muito cedo, um DO-27 pilotado pelo Furriel Baltazar da Silva partiu de Bissalanca para uma missão de apoio a um sector de Batalhão, a norte do rio Cacheu. Numa das movimentações, transportando um médico e um sargento de Bigene para Guidaje, o avião não chegou ao destino.

Tendo-se perdido o contacto com aquele avião, de Bissalanca descolaram meios aéreos para tentar localizá-lo e, quase em simultâneo, descolou outro DO-27 incumbido de proceder a uma evacuação sanitária pedida pelo aquartelamento do Guidaje. O avião era pilotado pelo Fur Carvalho e levava a bordo a enfermeira pára-quedista Giselda Antunes.

Também este avião não chegaria ao seu destino: alvejado por
um míssil Strela, que o não alcançou por muito pouco, os comandos
do DO-27 ficaram tão danificados pela acção da onda de choque, que teve de regressar à base de origem. [Giselda Antunes e Miguel Pessoa vieram a casar mais tarde, tornando-se, com toda a probabilidade, num casal único em todo o mundo: ambos foram alvejados por mísseis terra-ar Strela, e escaparam os dois à morte.]

Entretanto, para substituir o avião danificado partiu de Bissalanca outro DO-27, pilotado pelo Fur António Carvalho Ferreira.

Tendo embarcado em Bigene o Major Mariz, comandante do Batalhão ali estacionado, este avião aterrou por fim em Guidaje, donde descolou mais tarde com quatro pessoas a bordo: o piloto, o major, um militar ferido e um enfermeiro para o assistir durante a viagem para Bissau. Apenas se sabe que, dadas as características da pista, descolou para norte, entrando por território do Senegal. Nunca mais foi visto!

O primeiro DO-27 desaparecido acabou por ser localizado algures no mato, entre Bigene e Guidaje. Transportado de imediato para o local em helicópteros, um pelotão de pára-quedistas limitou-se a constatar a morte dos quatro ocupantes. Nessa altura, voando na área em protecção da acção terrestre, o T-6 do major Mantovani foi abatido por outro míssil Strela, tendo o piloto morrido na queda do aparelho.

Manuel dos Santos, o homem que chefiara o grupo do PAIGC enviado à União Soviética para aprender a operar os mísseis, e que então acumulava as funções de comissário político da Frente Norte com as de comandante dos mísseis em todo o território, podia dar-se por satisfeito: naquelas poucas semanas do primeiro semestre de 1973, os seus homens desferiram um duro golpe na capacidade operacional do inimigo. (...)


(***) Em Agosto de 2007, o The History Channel [ O Canal História, ] exibiu um documentário dedicado à história destas mulheres intitulado "Entre o Céu e o Inferno - As Enfermeiras Pára-quedistas"... No You Tube > Terraweb podem ser visionados os 6 seis vídeos correspondentes a esta reportagem.

Enfermeiras Pára-quedistas - Parte 1/6 (9' 18'')

Enfermeiras Pára-quedistas - Parte 2/6 (9' 18'')

Enfermeiras Pára-quedistas -Parte 3/6 (8' 57'')

Enfermeiras Pára-quedistas Parte 4/6 (8' 56'')

Enfermeiras Pára-quedistas - Parte 5/6 (6' 39'')

Enfermeiras Pára-quedistas - Parte 6/6 (3' 41'')

Vd. também Wikipédia > Enfermeiras Pára-Quedistas


(****) Sobre a grafia Guidaje/Guidage (a Giselda escreve, como toda a gente... Guidage):

Vd. poste de 29 de Abril de 2008 >Guiné 63/74 - P2800: Em bom português nos entendemos (1): Guidaje e não Guidage (Luís Graça / Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa)

sábado, 8 de agosto de 2009

Guiné 63/74 - P4800: Em busca de... (85) O Fiat do Pilav Gil foi abatido em Janeiro ou em Março de 1974? (José Rocha)

1. Mensagem de José Rocha, Operador de Transmissões do BART 2857, Piche, 1968/70, emigrante em França, com data de 14 de Março de 2009, endereçada ao nosso camarada Francisco Palma:

Caro Amigo

Fui Op de TRMS do BART 2857, Piche de Nov68 a Ago70.

Como li vários comentários sobre Canquelifá de 72/74 feito por pessoas que nunca lá puseram os pés, o que eu li, feito por um operador de mensagens que esteve em Nova Lamego, que ajudou a descarregar dos helicópteros vários mortos e feridos, que os mortos ficavam lá na pista e que os feridos iam no Dakota para Bissau.

Também li que um Fiat tinha sido abatido em Março. Ora o mesmo Fiat do Piloto Gil tinha sido abatido em Janeiro e não em Março.

O Blog da Força Aérea indica que o Piloto foi a Dunane e depois até Piche e de lá para Bissau.

Será possivel saber a verdade?

Um abraço
José

Fiat G-91 da FAP
Foto de Soares da Silva, com a devida vénia



2. No dia 15 houve a seguinte troca de mensagens:

- Francisco Palma respondia ao José Rocha:

Caro J. Rocha

No meu tempo, de Agosto 1970 a Junho 1972, em Canquelifa, tivemos 4 mortos. Um em combate, 2 (1 Alferes e um milicia) por acidente com uma armadilha nossa, e outro suicidou-se.

Sofremos 15 ataques mais dois com misseis (foguetões 122) ao aquartelamento, e dois africanos foram feridos por rebentamentos de duas minas antipessoais e eu com o Unimog deflagrei uma mina anticarro, ficando eu ferido.

Em Piche ocorreu um acidente com uma roquete que rebentou dentro da caserna acionando o rebentameno de uma caixa de granadas de morteiro 60, ocasionando 4 mortos e vários feridos, 2 muito graves.

Quanto à estória do Fiat nunca ouvi nada, não posso comentar.

Houve uma Companhia de intervenção que sofreu várias baixas na nossa zona, mas não tantos para entupir a aviação de Nova Lamego.

Quanto a esses mortos que ouviste, não foram do meu Batalhão e nem ouvimos esses comentários

Um abraço e boa sorte
F. Palma


- Francisco Palma dirigia-se ao Blogue:

Bom dia Carlos Vinhal
Será possivel os arquivos do nosso blogue esclarecer melhor este nosso camarada emigrante em França?

Obrigado e um abraço
Francisco Palma


- Dirigi esta mensagem aos outros editores e ao nosso camarada Pilav Miguel Pessoa:

Boa noite a todos
Algum dos meus amigos poderá confirmar os desmentidos do camarada Rocha?

Um tri abraço e votos de uma boa semana.
Vosso camarada
Carlos Vinhal


- Resposta de Miguel Pessoa:

Caro Carlos;

O texto reproduzido há umas semanas no blogue sobre a "História do Strela na Guiné" está correcto no essencial.

O Ten. Gil foi abatido em 31JAN74, fugiu para o norte embrenhando-se no Senegal, onde dormiu; no dia seguinte chegou a uma tabanca onde negociou uma boleia de bicicleta que o levou a Dunane; não satisfeito com o pessoal do quartel (eram africanos) resolveu prosseguir até ao aquartelamento de Piche. Aí foi recuperado por um avião da Força Aérea (Dakota?) que o levou para Bissalanca.

A única dúvida que ainda tenho é sobre a identificação rigorosa de qual o aquartelamento a que o Ten. Gil fazia o apoio de fogo - Copá ou Canquelifá? Eu tinha a idéia que seria Copá, pelo que me foi dito na altura - mas estive de folga nesse dia e tenho que confiar no que o António Martins de Matos refere - Canquelifá.

Mas continuo com algumas dúvidas, pois a ejecção foi quase junto à fronteira - e quem andava aflito naquela altura era o pessoal de Copá.

Abraço.
Miguel Pessoa
__________

Notas de CV:

Sobre os Strela na Guiné, ver postes de:

9 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3859: FAP (6): A introdução do míssil russo SAM-7 Strela no CTIG ( J. Pinto Ferreira / Miguel Pessoa)

16 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4197: FAP (23): O poder aéreo no CTIG, 'case study' numa tese de doutoramento nos EUA (Matt Hurley / Luís Graça)

26 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4418: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (1): Parte I

27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4423: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (2): Parte II

27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4430: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (3): Parte III (Bibliografia)

Vd. último poste da série de 7 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4795: Em busca de... (84): André Manuel Lourenço Fernandes, ex-Fur Mil não sabe o número da sua Companhia (José Martins/Carlos Vinhal)