segunda-feira, 9 de março de 2009

Guiné 63/74 - P4005: Para amenizar, quem conhece a NEP das abelhas? (J. Mexia Alves)

1. Caros camaradas, atentemos à mensagem do nosso camarada Joaquim Mexia Alves(*), com data de 6 de Março de 2009, que nos traz uma questão, que tempos idos teria uma importância primordial. Felizmente hoje as nossas abelhas são bem mais pacíficas, eu que o diga pois experimentei ataques daqueles insectos lá e cá.

Quem estiver em condições de esclerecer o nosso camarada Mexia Alves, faça o favor de se apresentar.


Caros Luis, Virgínio, Carlos e todos os camarigos.

Vamos lá então amenizar a coisa que isto por aqui está muito denso!

E então lanço um desafio aos camarigos que souberem da coisa, para darem ao conhecimento da Tabanca, uma célebre NEP, de que no meu tempo muito se falava na Guiné.

Era conhecida pela NEP das abelhas e eu nunca a vi e nunca a li, mas ao que me diziam, continha coisas de "bradar aos céus".

Segundo diziam, a NEP preconizava entre outras coisas, em caso de ataque de abelhas, a entrada imediata no curso de água mais perto...

Dizia-se também que a mesma aconselhava o rebentamento de granadas de fumo, talvez com o intuito de dar a conhecer ao inimigo a nossa posição!!!

Não sei se a NEP existia ou não e se continha tais "conselhos", mas embora nunca tenha tido nenhum ataque de abelhas, sei que era uma coisa terrivel, que fazia o pessoal atacado entrar num descontrole total e lembro-me de ouvir referir, que um Alferes de uma Companhia Independente teria morrido na mata de vido às multiplas picadas de um ataque de abelhas.

Alguém sabe alguma coisa sobre isto, da NEP, ou mortes causadas pelas abelhas?

Abraço camarigo a todos do
Joaquim Mexia Alves

(*) Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil Op Esp, CART 3942 (Xitole), Pel Caç Nat 52 (Mato Cão / Rio Udunduma) e CCAÇ 15 (Mansoa)
__________

Nota de CV:

Vd. poste da última intervenção de Joaquim Mexia Alves de 2 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3965: Nuvens negras sobre Bissau (7): Ao combatente Nino Veira, um poema de Joaquim Mexia Alves

Guiné 63/74 - P4004: Memória dos lugares (18): Cafine, no Cantanhez, ocupada pela 2ª CCAÇ / BCAÇ 4610 (Manuel Maia)




Guiné > Região de Tombali > Cantanhez > Cafine > 2ª CCAÇ / BCAÇ 4610 (1972/74) , Os Terríveis > Imagens da 'ocupação' de um dos lugares míticos de uma região libertada que era então um verdadeiro 'ex-libris' do PAIGC, aparentemente inexpugnável desde 1966 até finais de 1972.

Fotos: © Manuel Maia (2009). Direitos reservados


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cacine > Cadique > Junho de 2007 > Não confundir com Cafine... Pedras que falam da CCAÇ 4540 - Somos um Caso Sério - que esteve aqui, em Cadique, em pleno coração do Cantanhez, na margem esquerda do Rio Cumbijã, de 12 de Dezembro de 1972 a 17 de Agosto de 1973. (**)


1. Mensagem do Manuel Maia, ex-Fur Mil, 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine (1972/74) (*)

Caro Luis não sei se cheguei a enviar estas fotografias de Cafine que evidenciam termos sido "os primeiros" (fizemos o quartel...) numa das paredes do forno que lá construímos, bem como o problema que representava "circular" por trás da cozinha. Só de barco!

Numa dessas fotos pode ver-se o saudoso Lima que morreu de acidente juntamente com o Afonso (outro furriel) na semana do regresso (***).

Um dos jacarés fora abatido por ele [, o Fur Mil Lima].

Um abraço.

Manuel Maia

P.S. - Sabes alguma coisa mais do pessoal que foi em missão de solidariedade [à Guiné-Bissau] ? Tenho um amigo, e conterrâneo, entre eles (Tabanca de Matosinhos), e gostaria de saber se está tudo bem.


2. Comentário de L.G.:

Manuel:

(i) Obrigado, pelas imagens de Cafine (que eu estou sempre a confundir com Cadique). Temos poucas imagens do Cantanhez, do tempo da guerra.

(ii) A malta está bem, está de volta, por terra (falei com o José Manuel Lopes, ao telefone; tenho falado também Luisa Valente Lopes). Devem chegar na 3ª feira. O Carvalho era pressuposto vir de avião [, no sábado passado ou no próximo ?] .

(iii) Vocês aguentaram Cafine até quando ? Foram rendidos por outra sub-unidade ? Se sim, sabes qual ?

(iv) Explica-me melhor essa história da "captura fortuita" do Rafael Barbosa, primeiro presidente do Comité Central do PAIGC, preso pela PIDE em Fevereiro ou Março de 1962, deportado para a Ilha das Galinhas, libertado por Spínola e, mais tarde, depois da independência, acusado de estar envolvido na conspiração que levou ao assassinato de Amílcar Cabral. Condenado à morte, viu a pena ser comutada em prisão perpétua, por Luís Cabral... 'Nino' Vieira, de etnia papel, como o Rafael Barbosa, mandou-o libertar... Morreu em 2007.

Um abraço, Luís
__________

Notas de L.G.:

(*) Vd.poste de 14 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3890: Tabanca Grande (119): Apresentação de Manuel Maia ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610 (Guiné, 1972/74)

(...) Fui Furriel Miliciano da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610 que rumou, depois do necessário IAO do Cumeré, para Bissum/Naga.

Aí nos mantivemos uns sete a oito meses para sermos apanhados na famosa operação do Cantanhez que implicou a ida de dois Grupos de Combate, (entre os quais o meu...) para Cafal - Balanta, ficando adstritos à Companhia residente (que ali se encontrava apenas há dias...) vivendo em condições infrahumanas em buracos escavados no solo sem a possibilidade de protecção de "tecto" pois o homem do monóculo não autorizava senão panos de tenda e folhas de palmeira.

Esta parceria com Cafal durou uns três a quatro meses até à chegada do resto da minha Companhia que foi destacada para Cafine (distando cerca de 2 km dali...)

Então, já reunidos, passámos a viver em tendas de campanha até termos concluída a feitura dos reordenamentos, consubstanciada em largas dezenas de habitações para a população. Só então procedemos à construção de mais algumas para serventia da companhia...

Foi um trabalho insano, mas que nos deu plena satisfação e que permitiu, estou certo, - a juntar ao episódio da captura algo fortuita de Rafael Barbosa, líder guinéu do PAIGC (em rota de colisão com os dirigentes caboverdeanos...) - a saída precoce da região, a título de prémio, creio bem...

Foram nove ou dez meses ali passados, naquela zona minguada de tudo menos de mosquitos e balas... (...)


(**) 22 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2871: Excerto do Diário do ex-Alf Mil A. Nunes Ferreira (CCAÇ 4540, Cadique, 31/1/73 a 20/2/73)

(...) 20 de Fevereiro de 1973:

(...) Amanhã vamos sair novamente em missão operacional e há notícias de que o Caco Baldé vem aqui mais uma vez a Cadique, desta feita acompanhado de uma equipe da TV alemã para filmar alguns aspectos do destacamento e o andamento dos trabalhos de construção da estrada Cadique – Jemberém. (...)

(***) Vd. poste de 20 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3915: Cancioneiro do Cantanhez (1): De Cafal Balanta a Cafine, Cobumba, Chugué, Dugal, Fatim... (Manuel Maia)

Vd. outros postes do Manuel Maia:

13 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3886: Tabanca Grande (118): Manuel Maia, ex-Fur Mil, o poeta épico da 2ª Companhia do BCAÇ 4610/72, o Camões do Cantanhez

23 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3928: PAIGC: O Nosso Livro da 1ª Classe (Manuel Maia, 2ª CCAÇ / BCAÇ 4610, Cafal Balanta / Cafine, 1972/74)

Guiné 63/74 - P4003: Tabanca Grande (125): Júlio Pinto, ex-2.º Srgt Mil da CART 1769/BART 1926 (Angola, 1967/69)

Júlio Pinto, ex-2.º Srgt Mil da CART 1769/BART 1926, Angola 1967/69

1. Estamos a apresentar formalmente o nosso tertuliano, Júlio Pinto, que apesar de ter cumprido a sua comissão de serviço em Angola, segue o nosso Blogue com atenção, onde já teve algumas intervenções(1) quer em postes quer comentando aquilo que se escreve.

Júlio Pinto vem assim engrossar o grupo de tertulianos militares que não tendo combatido na Guiné, se interessam pela história da guerra naquele TO, a par de outros tertulianos civis que por uma ou outra razão têm afinidades com a actual Guiné-Bissau.

Com muito prazer recebemos estes tertulianos pois a diversidade de opiniões só enriquece o conteúdo histórico do nosso Blogue.

Não sendo o Júlio Pinto propriamente um periquito na nossa Tabanca, aqui deixamos as nossas saudações de boas-vindas, esperarando a continuação da sua colaboração.

2. Para evitar mal-entendidos, vou comentar a mensagem do nosso camarada Júlio Pinto, que se segue:

De:
Júlio Pinto
Sent: Sunday, March 01, 2009 6:17 PM
Subject: Tertúlia

Amigos
Sabeis quão grande é a minha admiração por todos aqueles que combateram na Guiné, já o manifestei publicamente no blogue do Luís Graça.
Mas pelos dois motivos que apresento a seguir não me parece muito provável que possa vir a integrar a tertúlia:

1º - Não participei na guerra da Guiné. Estive em Angola de 67 a 69;

2º - Como não estive na Guiné, o meu comentário feito ontem no Post 3951, não foi publicado. Julguei que teria direito a manifestar-me pois o artigo da Visão não me parece que diga só respeito aos combatentes da Guiné, assim a todos que participaram duma maneira ou de outra na Guerra Colonial, do Ultramar ou de África.

3º - O comentário que enviei não devia ter a qualidade literária necessária e por isso não mereceu ser publicado.

Tudo bem, na tertúlia já vi que não, mas convosco SANTOS OLIVEIRA e MAGALHÂES RIBEIRO; estarei sempre PRESENTE, convosco e em mémória do JÚLIO LEMOS.

Um grande, grande XI
Júlio Pinto
ex- combatente em Angola 67/69

Caro Júlio:

1.º - Ser ou não ex-combatente da Guiné, ou até ser ex-combatente, não é conditio sine qua non para se ser tertuliano no nosso Blogue. Exemplo disso são alguns civis que temos o prazer de contar como nossos amigos, como gostamos de dizer.

2.º - O aparecimento ou não dos comentários no Blogue não depende de nós. Se se seguir todos os passos pedidos, o comentário aparece imediatamente no respectivo Poste. Qualquer pessoa que aceda ao Blogue tem a hipótese de se expressar independentemente das suas intenções, poderá, infelizmente, até ser inconveniente se o quiser.

3.º - Logo os comentários não são seleccionados pela qualidade literária, nem por qualquer outro filtro.

Julgando que te tínhamos desconsiderado, foste algo injusto connosco, mas entre camaradas devemos ser francos e dizer aquilo que pensamos ou sentimos.

Se futuramente continuares a ter dificuldade em publicares os teus comentários, dar-te-ei umas dicas.
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Notas de CV:

(*) Vd. postes de:

17 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3213: O Nosso Livro de Visitas (28): Homenagem aos ex-combatentes da Guiné (Júlio Pinto)

18 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2115: Em busca de...(12): Notícias do desaparecimento de Júlio Lemos, ex-Fur Mil da CCAÇ 797, Tite, 1965/67 (Júlio Pinto)

13 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3617: Em busca de... (55): Ex-combatentes da CCAÇ 594 (Guiné, 1963/65) (Júlio Pinto/Artur da Costa Rodrigues)

27 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3670: As Boas-Festas da Nossa Tabanca Grande (11): Mais algumas mensagens dos nossos tertulianos (Carlos Vinhal)

9. Amigos Carlos Vinhal e Luis Graça
Venho desejar-vos e à vossa família um santo Natal e um Prospero Ano Novo.

Ao mesmo tempo quero desejar a todos os ex-combatentes da Guiné, de Angola e Moçambique um Santo Natal.

Eu estive na Guerra de Angola de 1967/69, mas consulto todos os dias a vossa página e felicito-vos por através de vós, se estar a contar a verdadeira história da guerra na Guiné, todos estes depoimentos que narram as vivências dos ex-combatentes da Guiné deviam ser transportas para livro e esse livro ser adoptado nas escolas de modo a que os vindouros ficassem a saber o que os seus avós e bisavós passaram e as páginas gloriosas que escreveram com o seu suor e sangue.

Bom Natal a toda a Tabanca

Um abraço deste ex-combatente de Angola da CART 1769
Júlio Pinto


Vd. último poste da série de 8 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3998: Tabanca Grande (124): José Belo, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70), actualmente Cap Inf Reformado a viver na Suécia

Guiné 63/74 - P4002: Nino: Vídeos (2): O amigo de Cuba... e de Portugal, que em Março de 2008 pedia mais professores de português (Luís Graça)




Guiné-Bissau > Bissau > Palácio Presidencial > 6 de Março de 2008 > Excerto da audiência que o Presidente João Bernardo 'Nino' Vieira (1939-2009) deu, por volta das 12 horas, a cerca de duas dezenas de participantes estrangeiros do Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, 1-7 de Março de 2008).

O grupo incluía 3 cubanos, Oscar Oramas e Ulises Estrada (acompanhados do respectivo embaixador na Guiné-Bissau) e três ou quatro guineenses.

Uma boa parte eram ex-combatentes da guerra colonial, portugueses... Estiveram também presentes o Dr. Alfredo Caldeira, da Fundação Mário Soares, a Diana Andringa, jornalista e cineasta, e o José Carlos Marques, jornalista do Correio da Manhã. Creio que o Prof Doutor Patrick Chabal, o melhor biógrafo de Amílcar Cabral, também estaria presente. Há outros camaradas que fizeram parte da delegação, e que poderei mencionar mais tarde: por exemplo, o Coutinho e Lima e o Carlos Silva. Ao todo, não estariam na sala mais do que vinte pessoas (, número máximo imposto pela segurança presidencial).

A audiência foi decidida à última hora, ao que parece por vontade expressa do 'Nino' Vieira. Não estava prevista no programa do Simpósio, se bem que uma hora antes, fomos também recebidos pelo então 1.º Ministro, Martinho N'Dafa Cabi. Não estava prevista, de resto, qualquer intervenção do Presidente da República, que fazia apenas parte da comissão de honra (**).

Escusado será dizer que, nesta audiência, cada de um de nós se representava a si próprio. À entrada do edifício da Presidência fomos todos cumprimentados pelo Gen Tagme Na Waie que, se bem me lembro, não assistiu à audiência: julgo que ele não falava português, apenas crioulo... A sua presença não era, porém, de todo acidental: o Simpósio agitou as águas mornas de Bissau, e nomeadamente remexeu as memórias dos velhos combatentes... A essa hora, no Hotel Palace, havia comunicações em crioulo de gente que combatera em Guileje, do lado do PAIGC...

Como em todos os rituais de poder, o Presidente fez-se esperar, enquanto os seguranças e o homem do protocolo nos distribuíam pelos lugares disponíveis da sala, à volta da mesa em U. 'Nino' chegou e pôs-nos logo à vontade, tendo cumprimentado, um a um, todos os presentes à volta da mesa. E ao mesmo tempo ia metendo conversa com este e com aquele. Em resultado disso, eu não tive direito a um bacalhau... Enfim, o senhor passou à frente... Mas era visível a sua satisfação pessoal por estar ali, numa certa cumplicidade e furando o protocolo de Estado, a conversar com os antigos 'tugas' (a expressão é minha, ele nunca a usaria naquela circunstância)... 

Curioso: "circunstância da vida" é uma expressão que ele vai usar duas ou três vezes, e uma delas para comentar a decisão de Coutinho e Lima de retirar de Guileje... e lamentar a sua sorte... "Morto por circunstância da vida" poderia ser também o epitáfio a pôr, amanhã, no mausoléu onde será sepultado...

Ao lado de 'Nino', à sua esquerda estava um coronel, seu assessor e homem de confiança (João Monteiro, se não me engano). Dos portugueses, falaram a Diana Andringa e o Cor Art Ref Coutinho e Lima. Creio que também houve uma pequena intervenção do Carlos Silva, um homem que vai regularmente à Guiné e já tinha sido em tempos recebido pelo 'Nino'. (É advogado e tem clientes guineenses. Por brincadeira, chamo-lhe o régulo de Farim). Falou também o cubano Oscar Oramas e a guineense na diáspora Fernanda de Barros, intervenções de que não fiz registo.

Neste excerto de vídeo, de menos de 9 minutos, 'Nino' Vieira aborda três ou quatros temas:

(i) saudação aos representantes cubanos, cuja participação na luta foi evocada com apreço e reconhecimento, com destaque para apoio a nível dos serviços de saúde militares (o PAIGC nem sequer tinha enfermeiros e muitos feridos em combate morriam de infecções e falta de assistência (até 1' 45'');

(ii) a Op Amílcar Cabral, contra Guileje (18 a 25 de Maio de 1973), a evocação do famigerado 'Corredor da Morte' onde o PAIGC tinha frequentes baixas, a manifestação de apreço e admiração pelo comportamento do então major Coutinho e Lima que poupou vidas de um lado e de outro, e que ia ao encontro do pensamento de Amílcar Cabral que não queria a guerra (de 1' 45'' a 5'00);

(iii) a importância do ensino do português e da cooperação com Portugal e a CPLP; a confissão de ele, 'Nino', ter sido obrigado a emigrar para Conacri, para poder singrar na vida, antes de aderir ao PAIGC, pedido do presidente em exercício da CPLP para Portugal mandar mais professores de português para a Guiné-Bissau (de 5' 01'' até ao fim).

Desta audiência há ainda mais três pequenos vídeos que iremos aqui apresentar, sendo este o segundo. Embora de fraca qualidade, os vídeos poderão ter algum interesse documental, agora que morreu e vai a enterrar o último dos grandes combatentes da luta de libertação levada a cabo pelo PAIGC, o partido do Amílcar Cabral (1924-1973). O malogrado Tagme Na Waie, embora também um histórico da guerrilha, no sul, não tinha a mesma dimensão e estatura.

Uma nota final: Os vídeos não foram editados, alindados, cortados/censurados... Foram apenas divididos em partes inferiores a 10 minutos, o tamanho suportado pelo You Tube. Amigos e camaradas: façam com eles o que bem entenderem... Às vezes uma imagem vale mais do que mil palavras...

Vídeo (8' 43''): © Luís Graça (2008). Direitos reservados.

Alojado em You Tube > Nhabijoes


Guiné-Bissau > Bissau > Palácio Presidencial > 6 de Março de 2008 > Audiência do Presidente João Bernardo 'Nino' Vieira a um delegação dos participantes estrangeiros do Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, 1 a 7 de Março de 2008) > Um aspecto da sala de audiências, em forma de U. Ao fundo da sala, um segurança; no lado direito da foto, identifico dois camaradas nossos, do nosso blogue, o José António Carioca, ex-Fur Mil de Transmissões e Cripto, e Abílio Delgado, ex-Capitão Mil, ambos da CCAÇ 3477, Gringos de Guileje (Guileje, 1971/72). No lado esquerdo, a Professora Doutora Fernanda de Barros, uma feminista guineense na diáspora (vive no  Brasil, em São Paulo), e mais um ex-combatente português que não consigo agora identificar.

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Da esquerda para a direita: Sérgio Manuel Silvestre de Sousa, ex-Fur Mil At, CCAÇ 3477 (Gringos de Guileje, 1971/72), Diana Andringa (RTP), Alfredo Caldeira (Fundação Mário Soares), Oscar Oramas (antigo Embaixador de Cuba na Guiné-Conacri, em 1973), Ulises Estrada (antigo combatente cubano, nas fileiras do PAIGC, 1966) e o embaixador de Cuba em Bissau.


Da esquerda para a direita: José Rocha, ex-Alf Mil, CART 2410, Os Dráculas, e Alexandre Coutinho e Lima, antigo Comandante do COP 5 (1973).

À saída do edifício da Presidência da República, a então Ministra dos Antigos Combatentes da Liberdade da Pátria, Isabel Buscardin, de costas; e um elemento da comissão organizadora do Simpósio, presidente da Assembleia Geral da AD - Acção para o Desenvolvimento, Roberto Quessangue.

Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Palace > Simpósio Internacional de Guileje > 3 de Março de 2008 > Os participantes cubanos Oscar Oramas, antigo embaixador de Cuba na Guiné-Conacri em 1973, e Ulisses Estrada, antigo 'combatente internacionalista' que integrou, como voluntário, as fileiras do PAIGC.

Ambos manifestaram o seu regozijo por voltar a encontrar antigos camaradas de armas (guineenses e cabo-verdianos) mas também também portugueses que estavam do outro lado da barricada... No final do Simpósio, Ulises Estrada fez um belíssimo improviso sobre o "momento histórico" que se estava a viver, ao juntar-se antigos inimigos, hoje reconciliados, num seminário "científico mas também político" que honrava e premiava "a qualidade do ser humano" (sic) (***)...

Fotos: © Luís Graça (008). Todos os direitos reservados
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Notas de L.G.:

(*) Vd. poste anterior desta série > 8 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3996: Nino: Vídeos (1): Ouvindo a versão do Coutinho e Lima sobre a retirada de Guileje (Luís Graça)

(**) Recorde-se a composição do Comissão de Honra do Simpósio [A página já não está disponível. LG, 3/11/2014]

Presidente da República da Guiné-Bissau, General João Bernardo Vieira
Dr. Francisco Benante, Presidente da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau
Dr. Martinho N’Dafa Cabi, Primeiro-Ministro da Guiné-Bissau
Doutor Nuno Severiano Teixeira, Ministro da Defesa de Portugal
Doutor João Cravinho, Secretário de Estado da Cooperação Internacional de Portugal
Professor Doutor Patrick Chabal, docente da King’s College, Londres, Grã-Bretanha
Professor Doutor Luís Moita, Vice-Reitor da Universidade Autónoma de Lisboa, Portugal
Doutor Óscar Oramas, Ex-Embaixador de Cuba na Republica da Guiné-Conakry.
Professor Doutor João Medina, Professor Catedrático da Universidade de Lisboa, Portugal
Flora Gomes, Cineasta guineense
Professor Doutor Peter Mendy, docente no Rhoad Islands College, Boston, USA.

(***) Vd. poste de 24 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3090: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação do cubano Ulises Estrada

Guiné 63/74 - P4001: Nuvens negras sobre Bissau (19): 'Nino' Vieira (1939-2009): tão bom combatente como mau político (Virgínio Briote)


Guiné-Bissau > Bissau > Presidência da República > 6 de Março de 2008 > 'Nino' em pose de Estado... Fotos extraídos de vídeos feitos durante a audiência que o Presidente João Bernardo Vieira 'Nino' (1939-2009) deu a cerca de duas dezenas de participantes estrangeiros do Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, 1-7 de Março de 2008).

Fotos: ©
Luís Graça (2008). Direitos reservados.


1. Com a devida vénia, fomos ao blogue do Gil Duarte (pseudónimo literário do nosso co-editor Virgínio Briote), Guiné, Ir e Voltar, Tantas Vidas, e repescámos esta nota biográfica sobre o 'Nino' Vieira, cujos restos mortais vão a sepultar, na próxima 3ª feira, em enterro de Estado... Recorde-se que no sábado passado foi enterrado no Cemitério Municipal de Bissau o general Tagmé Na Waie, o Chefe de Estado Maior das Forças Armadas, outro histórico da guerrilha, no sul.

O nosso querido co-editor, VB, tem andado um pouco mais arredado do nosso blogue, por razões de saúde... A publicação, à revelia dele, destas notas, é também uma pequena homenagem ao um amigo e um camarada que, tanto quanto eu sei, já desistiu diversas vezes da tentação de fechar, definitivamente, o dossiê Guiné (1963/74). É que houve um ir e voltar, mas há sempre um ir e voltar, haverá sempre uma eterno retorno... A Guiné é uma espécie de segunda pele que ficou colada ao nosso corpo...

O VB tem vindo a fazer, no seu blogue, a recolha e a divulgação de pequenas mas preciosas notas biográficas dos principais protagonistas do PAIGC... Como é sabido, faltam-nos biografias (sérias) destes homens e mulheres que nos combateram, ou melhor, combateram um sistema e um regime, e que são os pais-fundadores e as mães-fundadores da República da Guiné-Bissau. (LG)


Nino Vieira (1939/2009) passa à história como o símbolo da guerrilha na luta pela independência da Guiné-Bissau.

João Bernardo Vieira, 'Nino' Vieira, 'Nino' ou 'Kabi Nafantchammma', como também era chamado, foi uma personalidade que nos acompanhou ao longo dos anos que durou a guerra. Uns só ouviram falar dele, outros, principalmente os que estiveram no sul do território, sentiram na pele as acções em que directa ou indirectamente esteve envolvido.

Nino nasceu em Bissau, em 27 de Abril de 1939. Em Janeiro de 1961 partiu para a China, integrado num grupo de dez camaradas (Domingos Ramos, Osvaldo Vieira, Rui Djassi, Vitorino Costa, Constantino Teixeira, Hilário Gomes, Pedro Ramos, Manuel Saturnino da Costa e Chico Mendes) escolhidos por Amílcar Cabral, a fim de receber treino militar. Foram esses os primeiros comandantes da guerrilha.

Com 25 anos apenas, Nino já era o Comandante Militar da zona sul, que abrangia a região de Catió até à fronteira com a Guiné-Conacri. Aliás, foi quase sempre no Sul que actuou durante a luta, transformando esta zona, que abrangia o Cantanhez e o Quitafine, num dos mais duros, senão o mais duro, de todos os teatros de operações em que as forças portuguesas estiveram empenhadas e do qual ainda restam nomes míticos como Guileje, que ele veio a ocupar em 25 de Maio de 1973, Gadamael, Gandembel, Cacine, Catió, Cufar, Cadique, Bedanda e tantos outros.

Embora se tenha dedicado principalmente à actividade operacional, como comandante de unidades de guerrilheiros, Nino Vieira ocupou os mais altos cargos na estrutura do PAIGC, sendo membro eleito do bureau político do seu Comité Central desde 1964, vice-presidente do Conselho de Guerra presidido por Amílcar Cabral em 1965, acumulando com o comando da Frente Sul, e ainda comandante militar de todo o território a partir de 1970.

Foi eleito deputado em 1973 e, posteriormente, Presidente da Assembleia Nacional Popular, que proclamou no Boé a República da Guiné-Bissau, em 24 de Setembro de 1973.

Após a Independência foi Comissário do Estado para as Forças Armadas. Em 1980, Nino após o golpe que levou à destituição do Presidente da República, Luís Cabral, assumiu os cargos de secretário-geral do PAIGC e a Presidência da República.

As consequências do golpe levaram ao fim do projecto de Amílcar Cabral, a união dos povos guineense e cabo-verdiano. Em 1984 foi aprovada uma nova Constituição e só em 1991 terminou a proibição dos partidos políticos.

Com o novo regime, as primeiras eleições tiveram lugar em 1994. Nino Vieira, concorrendo contra Kumba Yalá, foi eleito Presidente da República à 2ª volta, tomando posse em 29 de Setembro de 1994. Quatro anos depois, ainda conseguiu suster um golpe que visava a sua destituição. Mas não por muito tempo.

A propósito de um nunca esclarecido fornecimento de armas para a guerrilha de Casamansa, em Junho de 1998 travou-se uma violenta guerra civil entre partidários de Ansumane Mané e forças fiéis a Nino. Mané destituiu-o em 7 de Maio de 1999, substituíu-o por Malan Bacai Sanhá, e Nino Vieira foi obrigado a refugiar-se na Embaixada Portuguesa em Bissau, de onde só saiu em Junho para Portugal.

Fazendo jus à sua antiga imagem de combatente, Nino regressou a Bissau em 2005 para anunciar a candidatura às presidenciais de Junho de 2005, que venceu à 2.ª volta contra Malan Sanhá. Mas a sorte, que tantas vezes o protegeu, estava prestes a abandoná-lo.

Há guineenses que dizem que, depois do regresso de Portugal, Nino nunca mais conseguiu recuperar os poderes políticos e militares que antes detivera. Que o poder militar se mantinha nas mãos dos que o tinham exilado e que, apesar das várias tentativas para fazer e compor alianças, o poder político se manteve longe dele. Outros afirmam que Nino foi tão bom combatente como mau político.

Certo é que, nos últimos trinta anos, Nino sempre esteve no centro das muitas crises que têm afectado a vida da ainda jovem República. E na sequência de mais um grave conflito político-militar, Nino Vieira morreu, em 2 de Março de 2009, às mãos de alguns militares das Forças Armadas de que foi um dos principais criadores.

Ironias do destino: os corpos de 'Nino' Vieira e o do general Tagme Na Waié, também vítima de uma explosão violenta no seu gabinete, ambos companheiros na luta pela independência, repousaram juntos, bem perto um do outro, na morgue do Hospital Simão Mendes, em Bissau, antes de serem sepultados.

[Título do poste e bold, a cor, são da responsabilidade do editor L.G.]
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Nota de L.G.:

(*) Vd. 7 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3992: Nuvens negras sobre Bissau (18): Um povo afável e generoso que ainda nos recebe com um sorriso... (Torcato Mendonça)

domingo, 8 de março de 2009

Guiné 63/74 - P4000: Blogoterapia (94): Que faço eu no meio disto tudo? (José Teixeira)

1. Em mensagem do dia 5 de Março de 2009, recebemos este trabalho do nosso camarada José Teixeira(1), pacifista convicto e militante, que na Guiné se recusava a transportar a G3, por achar que a sua arma era o equipamento de saúde inerente à sua função de Enfermeiro:

O Magalhães Ribeiro, num comentário ao poste 3985(2) escrito pelo Joseph Belo, levanta uma questão sobre onde e quando houve descarga de napalm na Guiné.
Socorrendo-me do meu diário reproduzo o que escrevi em 16 de Janeiro de 1969 sobre um ataque a um lugar, que pela direcção, nos pareceu ser Gadamael.
Mais tarde soube que foi em Nhacobá e o ano passado tive oportunidade de confirmar com o Rocha em Guiledge que efectivamente foi em Nhacobá, à data sem população (?) e se tratou de Napalm. Creio que o Rocha foi um dos que comandou o grupo de reconhecimento ao local e poderá testemunhar.

Eu, na Chamarra fui testemunha auditiva. A história dos acontecimentos tal como a escrevo, resultou do que ouvi nos dias seguintes.
Com isto que estou a escrever, não pretendo de modo algum culpabilizar seja quem for, muito menos os camaradas da FA que apenas cumpriam ordens superiores. Responderei apenas o que ouvi o ano passado e já em 2005 da boca de antigos guerrilheiros sobre os seus ataques às povoações onde se encontravam, inclusivé, seus familiares - "Tissera! guerra é guerra, mas kaba manga di tempo".

Janeiro 1969/Chamarra/16
Gadamael foi teatro de uma das maiores lutas no Ultramar entre a Força Aérea e o IN. O resultado, pelo que dizem demonstra bem o poder da aviação e sobretudo mostra que os homens se matam sem compaixão e mesmo neste caso em que as nossas forças lutam para manter a ordem não há homem, creio eu, que não sinta o coração sangrando, quando vê o inimigo a sofrer, numa luta desigual.

Gadamael estava a ser atacada como nunca qualquer outra população da Guiné. Muitos homens, com as melhores armas, algumas utilizadas pela primeira vez. Atacavam de longe ao ponto de os colegas de Gadamael pensarem que o ataque se dirigia a um sítio de ninguém, daí pediram à FA para bater a zona.

Quando os Fiat sobrevoaram o IN foram metralhados por uma quádrupla anti-aérea. Deixaram 200 kg da sua carga mortífera e foram buscar mais. Os bombardeiros T6 apareceram também e durante duas horas foi um descarregar de bombas. Nós só víamos os aviões à distância e ouvíamos o estrondo dos rebentamentos, mas calculamos que tenha sido uma luta terrível, tal a quantidade de sakalata que estourou. Eu imagino o chão juncado de cadáveres, regado com o sangue dos mortos e feridos, imagino os gritos lancinantes dos feridos ao verem a vida a fugir-lhe. Parece-me que estou a ver os que ficaram ilesos carregar os mortos.

Dentro de mim há uma confusão tremenda. A paz consegue-se fazendo a guerra, impondo-a até certo ponto através das armas que matam. É certo que aqueles queriam fazer guerra, estavam a atacar uma população que quer a paz, que quer ir para o seu trabalho na Bolanha sem arma, sem medo que alguém lhe surja no caminho com intenções assassinas. Uma população que quer viver na sua Tabanca despreocupada, sem precisar de correr a toda a hora para um abrigo e dormir debaixo de terra para não ser surpreendida, uma população que quer viver sem precisar de matar, mas haverá homens com coração de pedra que não sinta tanta morte, homens que foram levados talvez à força ou com uma dose maior de vinho de palma, como consta que acontece muita vez...

Dizem-nos que temos de fazer a guerra para impôr a paz, que aqueles que morreram e os que ainda estão vivos, são um perigo para a sociedade guinense. Eu e os meus camaradas, tantos outros, já sofremos muito por sua causa. Arriscamos a nossa vida a todo o momento por causa dessas mãos assassinas, cujo prazer é matar. Um prazer cego ao ponto de verem os seus camaradas morrerem às dúzias e continuarem a luta. Será prazer, ou será a convicção da sua razão que os faz lutar?

Porque é que estes homens querem a guerra, quando podiam viver em paz, do seu trabalho, na sua Tabanca, no seu lar com os seus filhos?

Que os faz lutar?

Que faço eu no meio disto tudo?

Zé Teixeira


(*) Ex-1.º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada, 1968/70.
__________

Notas de CV:

(1) Vd. poste de 3 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3975: Sr. jornalista da Visão, nós todos somos combatentes, não assassinos (12): José Teixeira, ex-1.º Cabo Enf da CCAÇ 2381

(2) Vd. poste de 5 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3985: De Estocolmo com amizade: Joseph Belo (3): Por que não fui desertor

Vd. último poste da série de 3 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3972: Blogoterapia (93): O que é difícil é ficar calado (José Brás)

Guiné 63/74 - P3999: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (5): Justamente recordadas no Dia Internacional da Mulher (Miguel Pessoa)

Fotogaleria > Sítio do Ministério da Educação Nacional > Dia Internacional da Mulher

(Reproduzido com a devida vénia...)

1. Mensagem do Miguel Pessoa (ex-Ten Pilav, BA12, Bissalanaca, 1972/74):

Luís

Mando-te (espero eu, que nunca fiz isto antes...) a folha do MDN [Ministério da Defesa Nacional]que reporta a cerimónia de hoje, comemorativa do Dia Internacional da Mulher.

As enfermeiras pára-quedistas (*) foram convidadas mas, talvez por terem sido avisadas em cima da hora (6ª feira), só seis estiveram presentes (a Giselda foi lá). Nas fotos pode ver-se, na de baixo à esquerda, Céu Pedro; na de baixo, à direita, Zulmira.

Abraço. Miguel

2. Excerto da 1ª página do MDN, de hoje:

Ministro da Defesa Nacional comemora Dia Internacional da Mulher com mulheres da Defesa Nacional e das Forças Armadas

(...) No âmbito do Dia Internacional da Mulher, o ministro da Defesa Nacional, Nuno Severiano Teixeira, convidou um conjunto de mulheres para uma cerimónia dedicada às “Mulheres na Defesa Nacional e nas Forças Armadas”.

Esta iniciativa teve lugar no Forte São Julião da Barra, em Oeiras, pelas 12h15 de 8 de Março, e contou com uma intervenção da professora Helena Carreiras, figura de referência na investigação sobre esta matéria.

Entre as convidadas, civis e militares do universo da Defesa Nacional e das Forças Armadas, encontravam-se algumas das primeiras mulheres que aderiram às Forças Armadas. Trata-se das enfermeiras pára-quedistas que, voluntariamente, prestaram serviço em África, entre Maio de 1961 e Junho de 1974.

Hoje, são mais de cinco mil as militares que integram os três Ramos das Forças Armadas, o que representa 14% do seu universo. Onze atingiram já o posto de Tenente-Coronel/Capitão de Fragata.


3. Comentário de L.G.:

Obrigado, Miguel. Parabéns, Giselda. Não me esqueci do dia (que se celebra desde 1910). Pessoalmente, comemorei o dia, homenageando as mulheres que se dedicam às artes plásticas, um campo que também foi durante muito tempo um bastião dos homens...

Fico feliz por o Ministro da Defesa Nacional ter também convidado as nossas queridas enfermeiras pára-quedistas do tempo da guerra colonial, para a cerimónia evocativa do Dia Internacional da Mulher.

Afinal, elas foram as primeiras a dar o exemplo, a abrir uma brecha nas fileiras das Forças Armadas, começando pela Força Aérea... (Fileiras que - lembre-se - eram 'cerradas' pelos machos, nosso tempo...). Tanto quanto sei, elas começaram por ser enfermeiras civis, graduadas... E ao todo, não ultrapassavam a meia centena... O seu exemplo pioneiro deve ser aqui justamente recordado.

Hoje somos, ao que parece, um dos países da NATO com maior taxa de feminização (14%) das Forças Armadas.

De acordo com a investigadora Helena Carreiras (Igualdade de oportunidades nas Forças Armadas Portuguesas - O papel das políticas de integração de género. Comunicação apresentada no Institituto Nacional de Defesa, em 27 de Junho de 2007), era a seguinte a taxa de feminização dos militares, por ramo, excluindo o serviço militar obrigatório (2006): Força Aérea (16,0%), Exército (13,5%), Marinha (6,%)...

Mesmo assim, estamos longe dos 47% de mulheres médicas, dos 50% de mulheres advogadas, dos 47% de mulheres magistradas judiciais - dados de 2006 - ou até mesmo dos 28% de mulheres diplomatas (em 2005)... Fonte: CIG - Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género.

________________

Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 7 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3994: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (4): Uma civil, e transmontana de Sabrosa, na tropa (Giselda Pessoa)

Guiné 63/74 - P3998: Tabanca Grande (124): José Belo, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70), actualmente Cap Inf Reformado a viver na Suécia

José (Joseph) Belo, ex Alf Mil Inf da CCAÇ 2381, Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70:


1. Estamos hoje a apresentar formalmente o nosso camarada José (Joseph) Belo (*), ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2381 que esteve na Guiné entre 1968 e 1970, que calcorreou Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada. Hoje encontra-se na situação de Cap Inf Ref e vive na Suécia.

A sua colaboração no nosso Blogue é já muito extensa, seja por contacto directo, quer por intermédio do nosso camarada e seu companheiro de Companhia José Teixeira, encarregue de corrigir a grafia do teclado internacional para o teclado português.

Como sabem, a nossa grafia tem muitos acentos que não são usados internacionalmente e os nossos camaradas da diáspora têm alguns problemas com isso. Quase diria que o problema é nosso, pois temos que corrigir toda a acentuação. Mas é sempre com o maior prazer que efectuamos esse trabalho.

Caro José, não te dou as boas-vindas, porque já és da casa, mas deixo-te os melhores votos de muita saúde e boa estadia na Suécia, país que escolheste para viver.

Infelizmente as fotos que enviaste não têm a melhor qualidade, talvez um dia te disponhas a enviá-las de novo, desta vez digitalizadas individualmente.

Um fraterno abraço da Tertúlia para ti.
__________

Notas de CV:

(*) Vd. alguns postes do nosso compatriota e camarada José (ou Joseph) Belo:
17 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2954: A guerra estava militarmente perdida? (18): José Belo 

Guiné 63/74 - P3997: Agenda cultural (3): O pintor Manuel Botelho no semanário "Sol". V. Briote
























Manuel Botelho na oficina.


A Arte da Guerra

por Manuel Botelho



Manuel Botelho, no semanário Sol. Revista “Tabu”, 28 de Fevereiro de 2009
Em Setembro de 2006, dirigiu-se ao Museu Militar. Recebido “calorosamente” pelo director, o Coronel Ribeiro de Faria, expôs o que o lá levava: fotografar tudo o que pudesse sobre o tema da Guerra.
Teve acesso às armas (“às tantas, o chão estava coberto delas”), e foi-lhe disponibilizada uma sala para trabalhar.
O seu local de trabalho foi ali, no Museu, até Novembro de 2007.
Fotografou G-3 e Kalashs, FNs e Mausers. Vestiu-se de soldado, encenou situações de guerra, num cenário de terra e plantas secas. Para compor o cenário, percorreu a feira da Ladra, à procura de camuflados, facas de mato, cantis..
Depois de expor o seu trabalho em três locais, Manuel Botelho continuou a aprofundar a temática da Guerra na sua casa, em S. Pedro do Estoril.
 
"A terra, ao contrário da nossa, é vermelha viva, cor de tijolo, a erva de um vermelho profundo..."

"Estou farto da cor verde: fardas verdes, viaturas verdes, paisagem verde, aviões verdes, camuflados verdes, tudo verde. A água dos autoclismos é verde limosa. A urina e o ranho são esverdeados, até o vinho é verde. As casernas são verdes também. E as portas e janelas. E o lado de dentro das paredes..."

Despedida ou reencontro?

Manuel Botelho inaugurou a 1ª exposição, a que deu o nome “Aerogramas”, no passado dia 7, no Porto, na Galeria Fernando Santos.

“São desenhos para olhar, mas também para ler – incluem excertos de depoimentos e correspondência de onde sobressai a presença ou o discurso feminino, visto tratar-se de mensagens trocadas entre os militares e suas mães, namoradas, mulheres ou madrinhas de guerra.”

“Madrinha de Guerra” é o título da 2ª exposição de fotografia a inaugurar no dia 14, no Centro Cultural de Lagos.
__________

Notas de vb:

1. Texto e fotos extraídos da Revista, semanário "Sol", de 28 de Fevereiro de 2009. Coma vénia devida aos autores.

2. Artigo referido em
6 Março 2009 > Guiné 63/74 - P3989: Agenda cultural (2): O pintor Manuel Botelho expõe no Porto e homenageia o malogrado Sold Cond Soares, da CCAÇ 12 (Beja Santos)
.

Texto de Vladimiro Nunes e fotografias de António Pedro Santos.

“Manuel Botelho ganhou renome a desenhar e a pintar, mas para fazer arte com a guerra colonial, precisou do realismo da fotografia.”

“Nasci em 1950 e a guerra começou quando eu tinha 11 anos. Aos 12 ainda não tinha acabado, aos 13 também não, nem aos 14, aos 15, aos 16…O tempo ia passando, a guerra nunca mais acabava e eu vivia no terror do que ia acontecer quando fosse mobilizado. Só não fui porque estava a acabar o curso de arquitectura e tive a sorte monumental de, entretanto, ter vindo o 25 de Abril. Mas, quase até aos 24 anos, vivi num terror pavoroso de i para a guerra. Foi o pesadelo da minha adolescência”.

Manuel Botelho quis levar mais longe o tema da Guerra, que começara a tratar numa série de desenhos e pinturas que expôs em 2006, na Galeria Lisboa 20.

Guiné 63/74 - P3996: Nino: Vídeos (1): Ouvindo a versão do Coutinho e Lima sobre a retirada de Guileje (Luís Graça)


Guiné-Bissau > Bissau > Presidência da República > 6 de Março de 2008 > A audiência que o Presidente João Bernardo 'Vieira, 'Nino', de seu nome de guerra (1939-2009), deu a cerca de duas dezenas de participantes estrangeiros do Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, 1-7 de Março de 2008), incluindo 2 cubanos, Oscar Oramas e Ulisses Estrada (acompanhados do respectivo embaixador)... 

 A maior parte dos membros da delegação (que foi constuída espontaneamente) eram portugueses (e antigos combatentes da guerra colonial)... A audiência foi decidida à última hora, ao que parece por interesse expresso do 'Nino' Vieira. Não estava sequer prevista no programa do Simpósio. 

Uma hora antes, fomos também recebidos pelo então 1º Ministro. Escusado será dizer que cada de um de nós se representava a si próprio. Estiveram também presentes o Dr. Alfredo Caldeira, da Fundação Mário Soares, a Diana Andringa, co-realizadora do filme "As Duas Faces da Guerra" (Portugal, RTP, 2007), e o José Carlos Marques, jornalista do Correio da Manhã

 À entrada do edifício da Presidência fomos todos cumprimentados -. o que pareceu estranho e nada protocolar - pelo Gen Tagmé Na Waie que, se bem me lembro, não assistiu à audiência. Não foram tomadas especiais medidas de segurança. Não fiz fotos com flash mas gravei grande parte da audiência, em condições deficientes de luz. A audiência decorreu ao fim da manhã. 

 Ficámos sentados numa mesa, comprida, em U. Ao lado de 'Nino', à sua esquerda estava um coronel, seu assessor (João Monteiro ?). À audiência assistiu também a então Ministra dos Antigos Combatentes da Liberdade da Pátria, Isabel Buscardini, bem como um elemento da comissão organizadora do Simpósio, presidente da Assembleia Geral da AD - Acção para o Desenvolvimento, o meu amigo Roberto Quessangue. 

 Neste vídeo, o Cor Art Ref Coutinho e Lima faz uma saudação ao presidente da República, e recorda a 'batalha de Guileje' bem como a sua decisão (polémica) de, como comandante do COP 5, mandar retirar as NT em 22 de Maio de 1973. Homenageou também todos os mortos desta guerra, guineenses, cabo-verdianos e portugueses, mas também cubanos. 

 Desta audiência há cinco pequenos vídeos que iremos aqui apresentar, sendo este o primeiro. Os restantes quatro são excertos da intervenção do 'Nino' Veira que, embora em pose de Estado, deixou transparecer o seu agrado e até prazer em estar no meio de antigos combatentes... 

 Embora de fraca qualidade, os vídeos terão algum interesse documental, agora que morreu e vai a enterrar o último dos grandes combatentes da luta de libertação levada a cabo pelo PAIGC, o partido do Amílcar Cabral. O malogrado Tagmé Na Waie, embora também um histórico, não tinha a mesma dimensão e estatura que o comandante Nino. 

 Vídeo (5' 10'): © Luís Graça (2008). Direitos reservados. 

 Alojado em You Tube > Nhabijoes

sábado, 7 de março de 2009

Guiné 63/74 - P3995: Memórias de Copá (2): Os bravos de Copá e um caso de... 'abuso de confiança' (António Graça de Abreu / António Rodrigues)


Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Ambulância, de origem russa, capturada ao PAIGC em Copá, Fevereiro de 1974. Foto de Joaquim Vicente Silva, soldado do BCav 8323, residente actualmente no concelho de Mafra.

Foto: Cortesia do nosso camarada António Graça de Abreu (2009)


1. Texto enviado pelo nosso amigo e camarada António Graça de Abreu, com data de 19 de Fevereiro último:

Para entendermos Copá, Fevereiro de 1974

por António Graça de Abreu

1. Em 22 de Fevereiro de 1974, em Cufar, eu escrevia no meu Diário:

Regressei (de Bissau) no Nordatlas, na viagem certinha até cá abaixo. Tudo calmo em Cufar. No nordeste da Guiné, em Copá, junto à fronteira, é que tudo vai mal. Mal para as NT, bem para o IN. Ouvi falar num ataque com cem foguetões, valha-lhes Deus! Começa a ser insustentável aguentar Copá.

Em Portugal as coisas também aquecem, com manifestações contra a carestia de vida organizadas pelos maoístas do MRPP. Houve pancadaria da grossa, três polícias feridos, um deles levou uma pedrada na cabeça. O povo não anda bom.

Em Bissau rebentou uma bomba no quartel-general. E que dizer do novo livro de António de Spínola Portugal e o Futuro? O antigo Caco Baldé, meu ex-comandante-em-chefe, propõe soluções federalistas para a resolução dos conflitos do Ultramar. O livro vai ter sucesso entre os liberais, o grupo do Balsemão e do Expresso, e também entre alguma da Oposição. Abençoadamente, agitará os espíritos de muitos portugueses.

O Marcello Caetano começa a ficar exasperado. No essencial, o mestre de Direito limitou-se a dar continuidade à política de Salazar e não sabe, ou esqueceu-se, como diz o Bob Dylan que “the times, they are a’changin” [os tempos estão a mudar]. O general Spínola aponta caminhos enviesados, é verdade, mas indica possíveis saídas para o pântano fétido em que vivemos.

Que futuro para Portugal?


Foi este o meu balanço do dia.


2. Que acontecera em Copá?

Reconheço que durante trinta e tal anos não soube ao pormenor com que linhas se coseram e descoseram as NT em Copá. Foi preciso o blogue do Luís Graça para regressar a muitas das interrogações que a guerra da Guiné me colocava (coloca ainda!) e para procurar encontrar respostas. Sempre no campo militar, porque quanto à natureza política da guerra, estamos entendidos. Sabia há trinta e cinco anos, como sei hoje que aquela guerra, injusta como quase todas, em termos puramente políticos estava perdida.

Tenho uma casinha humilde em S. Miguel de Alcainça, a meio caminho entre a Malveira e Mafra. Há quase um ano atrás, descobri que o homem do único talho existente na aldeia tinha na montra (o talho de Alcainça tem uma montra!) dois pratos de faiança pintada comemorativos de encontros do seu BCav 8323, que esteve na Guiné em 1973/74 (Paunca, Pirada, Bajucunda, Buruntuma, Copá).
- Então como é, meu caro amigo e camarada, conte-me estórias dessa fase final da guerra na Guiné. Eu também por lá andei e escrevi um livrinho sobre esse período que talvez tenha curiosidade em ler.

Acabei por trocar o meu Diário da Guiné por um quilo de bifes do lombo e um quilo de costoletinhas de borrego, tudo tenrinho e delicioso.

Selámos uma amizade.

E o soldado Joaquim Vicente Silva, meu camarada, dono do talho de Alcainça, fez-me chegar (fotocopiei tudo!) o testemunho escrito em 1984, dez anos após o regresso da Guiné, por um dos homens de Copá, o soldado condutor auto-rodas António Rodrigues. O texto chama-se Memórias de um Soldado e li as fotocópias de um fôlego.

Como tinha algumas dúvidas sobre pormenores da descrição do António Rodrigues, pedi ao Joaquim Vicente do talho de Alcainça o contacto do Rodrigues. Telefonei para o Porto, falei com o António Rodrigues e fiquei a saber que as Memórias de um Soldado do António Rodrigues haviam sido publicadas em livro “escritas” por um tal Benigno Fernando, sob o título O Princípio do Fim.

Com a justificação de corrigir um ou outro erro de português e melhorar o estilo, o Benigno Fernando, nascido em 1960 e que nunca foi à Guiné, apropriou-se da prosa excelente, sentida, do António Rodrigues e, quase sem mudar uma palavra do texto, transformou-a num livro em que passa por ser o autor, com o semi-bombástico título de O Princípio do Fim.

Para mostrar a sua “honestidade”, o Benigno Fernando, no fim da “sua obra”, pag. 75, numa linha do posfácio despercebida entre muitas outras, escreveu: "Esta história só foi possível ser escrita com a colaboração do António Rodrigues, ex-combatente da guerra colonial na Guiné”.


3. O António Rodrigues entendeu a sacanice que lhe fora feita e não gostou.

Leiam como o António Rodrigues descreve o seu regresso a casa, pós a Guiné, e o encontro com os pais e os irmãos:

“Eu aluguei um táxi (em Braga) para me levar a Gondizalves que fica a 3 km da estação. O meu pai e o amigo seguiam de motorizada, eu meti-me no táxi com a minha bagagem e lá fui em direcção a casa. Quando lá cheguei, não calculam qual foi a alegria da minha Mãe quando me viu entrar de novo a porta da casa. Ela veio ao meu encontro, abraçou-me e beijou-me com todas as suas forças e sentiu-se com certeza muito feliz, tal como o meu Pai e meus irmãos.”
António Rodrigues, Memórias de um Soldado, texto policopiado, pag 61.

Agora leiam a descrição do sucedido, pelo tal Benigno Fernando:

“ O Rodrigues também alugou um táxi para o levar a Gondizalves que ficava a 3km de distância da estação. O pai e o amigo seguiram de motorizada e lá foram em direcção a casa. Quando lá chegaram foi uma alegria para a mãe ao vê-lo entrar pela porta. Foram ao encontro um do outro, abraçando-se e beijando-se com todas as suas forças. Sentiram-se muito felizes bem como o pai e os irmãos.”
Benigno Fernando, O Princípio do Fim, Porto, Campo das Letras, 2001, pag. 72.

Creio que estamos entendidos quanto ao trabalho do “escritor” Benigno Fernando. Copiou todas palavras, mudando apenas o tempo verbal. Rodrigues escrevera na primeira pessoa, Fernando assume-se como narrador externo e reescreve tudo na terceira pessoa.

Sentido, amachucado, ludibriado, o António Rodrigues enviou-me o livro “escrito” pelo Benigno, um aldrabão intelectual, com a seguinte dedicatória:

Ao meu especial amigo António Graça de Abreu:

Este é um testemunho da minha participação na guerra colonial na Guiné, incorporado no Batalhão de Cavalaria 8323, formado em Estremoz, a que tive a honra de pertencer e cuja divisa era “Cavalaria p’rá Frente”.

O propósito desta narrativa é dar a conhecer às gerações vindouras que a possam vir a ler, que esta guerra existiu e teve episódios muito duros e violentos, nalguns dos quais eu participei no terreno, e que a minha geração e as que me antecederam tivemos de enfrentar com muito sofrimento, mas também com coragem, honra e dignidade.

Com um abraço amigo, ao dispor.

António Rodrigues, ex-combatente
Porto, 3 de Julho de 2008
 

4. O livro da “autoria” do Benigno Fernando

O livro teve recentemente breves abordagens no blogue, feitas pelo José Martins e pelo Hélder de Sousa, e foi já objecto de uma recensão literária da responsabilidade do Mário Beja Santos, poste 1409, a 8 de Janeiro de 2007. Aí lemos, nas palavras do Mário, o outro autor de um Diário da Guiné, (o dele mais completo do que o meu, porque tem dois volumes):

(…) Benigno Fernando dá-nos aqui o melhor relato com os ataques de fim do ano e os primeiros meses do cerco implacável do PAIGC. Copá é sistematicamente flagelada até os soldados enlouquecerem e fugirem para Pirada e Canquelifá. Em Março um avião português é abatido, as estradas minadas, as pontes destruídas.

(…) Quem amanhã fizer a história detalhada do desmoronamento do Leste precisará deste relato do Benigno Fernando.



5. Não quero entrar mais em polémicas com o Mário Beja Santos, nem com ninguém.

Interessa-me o que realmente aconteceu em Copá. Mas o Mário fala de um “cerco implacável” a Copá, (onde é que eu já ouvi falar em mais cercos que nunca existiram?...) dos soldados que “enlouqueceram”, do “desmoronamento do Leste”, etc.

Não nos entendemos. É sempre a tese falsa da superioridade militar do PAIGC na fase final da guerra da Guiné.

Vamos então ao relato verdadeiro, vivido e sentido pelo António Rodrigues.

Copá era um pequeno destacamento, menos de quarenta homens, no extremo nordeste da Guiné, junto à fronteira. Os aquartelamentos mais próximos eram Canquelifá, a 12 quilómetros, e Buruntuma, a 22 quilómetros de distância.

As estradas de terra batida entre Copá e os dois aquartelamentos costumavam ser feitas sem grandes precauções, embora todos soubessem que os guerrilheiros podiam aparecer a qualquer altura, nestes problemáticos destacamentos ou aquartelamentos junto à fronteira. Todos tinham consciência das minas nas picadas e das emboscadas, do muito sangue que já correra, mesmo em zonas relativamente calmas.

O soldado condutor António Rodrigues tinha um Unimog distribuído e conta, em finais de 1973:

“Outro serviço que também fiz muito com a viatura em Copá foi transportar o milho ou mancarra ou amendoim da população de Copá que vivia precisamente dentro do mesmo arame farpado que a tropa.

"Esse milho e mancarra ia eu com os respectivos donos africanos buscá-lo aos seus campos e trazíamos para junto das suas tabancas que eram casas feitas de barro, canas e palha, e posso dizer que aquelas populações eram na sua maioria pessoas de bem. Queriam sempre agradecer-me o serviço que lhes prestava com qualquer coisa, por vezes apesar das suas poucas posses ofereciam-me um frango ou uma galinha.

"Este serviço fazia parte da psícola do Exército Português em África e inserido nessa mesma psícola íamos também de vez em quando a outras populações vizinhas, nomeadamente a Orimonde e Oribode levar principalmente medicamentos. Estas povoações ficavam situadas entre Copá e Canquelifá"
(...).
António Rodrigues, Memórias de um soldado, pag. 19.



6. Em Janeiro de 1974, o PAIGC concentrou esforços sobre Copá.

Situada apenas a quatro quilómetros do Senegal, é de estranhar que em onze anos de guerra o destacamento (em que ano foi criado?), com apenas 30 a 40 homens de guarnição, tenha sido relativamente pouco incomodado. Em Janeiro e Fevereiro as coisas iam mudar e toda aquela terra ia ser sujeita a tremendas flagelações.

Vamos ler o testemunho do soldado António Rodrigues:

"Nessa noite de 7 de Janeiro de 1974 (…) teve início mais uma hora e cinco minutos horrorosos, infernais e terríveis de enfrentar. Aí o inimigo estava 10 metros à nossa frente e trazia uma táctica que estava muito bem montada, tinha junto ao arame farpado três secções separadas alguns metros, o que lhe permitia fazer fogo de armas ligeiras, ininterruptamente durante 1 hora e 5 minutos, porque o fazia por secções e quando uma estivesse sem munições, a outra já estava preparada para disparar, e assim sucessivamente.

"Mas, para além destas secções de homens armados de metralhadoras, tinham um auto-blindado junto a uma das secções a apoiá-la com os disparos do seu canhão e na retaguarda destas secções tinham toda a artilharia com que nos tinham atacado durante a tarde. Esta encontrava-se a 1 km também apoiada por outro auto-blindado.

idem, pag. 28.

Agora o meu comentário.

Com um tal poder fogo, com tal superioridade de meios (foguetões 122, morteiros 120, dois blindados, talvez até a ajuda de tropas regulares do exército do Senegal ou da Guiné-Conacri) poderíamos imaginar que os guerrilheiros do PAIGC arrasaram Copá e massacraram os trinta e tal militares portugueses que resistiram até ao sacrifício das suas vidas.

Nada disto aconteceu.

Continuemos com a sequência da descrição do soldado António Rodrigues:

"Mas agora a coisa mudava de figura, ainda estávamos todos vivos e de saúde, e por isso, como estávamos frente ao inimigo, tínhamos armas para lhes dar resposta adequada, embora tivéssemos poucas munições.

"Uma das primeiras coisas que fizemos, a mando de um furriel, foi lançar uma granada de bazuca de tipo iluminante que, na realidade, por uns momentos iluminava tudo por onde passava, o que nos permitiu ver claramente a posição do inimigo o que nos ajudou a cumprir a nossa missão com a maior objectividade possível.

"Começámos então a disparar na direcção adequada dilagramas, granadas de bazuca, de morteiro 81 e 60, além de todas as metralhadoras e G3. A luta era quase corpo a corpo e muito renhida. A secção que estava do lado norte apoiada pelo blindado estava já a abrir uma entrada para penetrar no nosso aquartelamento. É aqui que o meu camarada Antunes (sold Manuel Vicente Antunes) se enche de coragem, pega em meia dúzia de granadas de morteiro 60, salta para fora da vala, debaixo de fogo, e atira-as todas sobre o blindado que tentava entrar, o que o terá feito recuar, mas a confusão era enorme e não sabíamos bem o que se passava com o restante do nosso pessoal.

"A dado momento aproximou-se do nosso posto o Demba, um soldado africano do nosso exército, que nos disse que o alferes Brás (alf mil Manuel Joaquim Brás, que comandava o destacamento de Copá) já estava preso e nós ficámos ainda mais baralhados e confusos. Dissemos até uns para os outros: 'Se calhar esta noite vamos ser feitos prisioneiros pelo PAIGC'.

"Mas felizmente o alferes Brás não estava preso e ninguém, com a ajuda de Deus, estava ferido, aguentámos aquela hora infernal de tiros e granadas sobre as nossas cabeças e continuámos a defendermo-nos principalmente através de dilagramas e morteiro 81. Este último teve papel importante nessa noite, cujo artilheiro o tirou do tripé para o poder manobrar da melhor maneira e foi esse morteiro 81 que veio a causar os maiores problemas ao inimigo que ao fim de 1 hora e 5 minutos teve de retirar possivelmente com alguns mortos, (no dia seguinte os homens de Copá confirmariam dois mortos IN, fora do arame farpado do destacamento.) Em Copá ficavam enormes incêndios com tudo a arder em grandes chamas e nós, os militares e população tínhamos vivido horas amargas e terríveis.

"(…) O PAIGC não conseguiu os objectivos a que se tinha proposto".

idem, pag. 29.


7. Dois dias depois destes formidáveis combates – era mesmo guerra, meus amigos! -, aterram em Copá oito helicópteros carregados de mantimentos e munições.

Com eles vem um pelotão de tropas pára-quedistas. Os páras permanecem uma semana em Copá. Nestes dias, o destacamento não sofre nenhuma flagelação e do IN, nem cheiro. Talvez se tivessem ido reabastecer ao Senegal e à outra Guiné.

Depois, Copá volta a ser flagelada, com grande intensidade. Quatro militares de Copá, em pânico, fogem do destacamento e caminham até Canquelifá. Ao entenderem que deixaram sozinhos, a resistir heroicamente, os seus trinta e tal camaradas de armas, com a ajuda da tropa de Canquelifá, acabam por regressar a Copá.

As flagelações continuam.

Mas os comandos africanos, com o Marcelino da Mata, fazem uma operação em redor de Copá que se prolonga por vários dias. Aliviam a pressão do IN sobre Copá. É então capturada a famosa ambulância do PAIGC, com matrícula da Guiné-Conacri, que, apesar da sua cruz vermelha, de se destinar a evacuar os feridos da guerra, estava carregada de minas anti-carro e anti-pessoal, e ainda de alguns cadernos com a descrição exacta dos lugares no leste da Guiné onde os guerrilheiros haviam colocado minas.

A aviação continua a bombardear em volta de Copá. A 31 de Janeiro de 1974, um míssil Strela abate um Fiat pilotado pelo tenente Gil. O piloto ejecta-se, salva-se e consegue chegar a pé a um dos nossos aquartelamentos na zona.

O destacamento de Copá, menos de 40 homens, junto à fronteira, não justifica tamanhos sacrifícios. Os militares portugueses estão no limite da resistência. Os comandos-chefe de Bissau decidem retrair o dispositivo militar e ordenam o abandono de Copá. Todo o destacamento é armadilhado e, no dia 14 de Fevereiro de 1974, os resistentes de Copá vêem chegar os seus camaradas de Bajucunda que os vêm buscar e levar para um aquartelamento mais seguro.

Sofreram o inenarrável mas foram valentes, não tiveram um morto, graças também à sorte e à protecção de Deus, de Nossa Senhora, da imensidão dos deuses criados por Deus ou pelos homens. Os trinta e cinco homens, leram bem, 35 militares portugueses - um alferes, quatro furriéis, cinco 1ºs cabos e vinte e cinco soldados - foram todos louvados também porque, ao contrário do que acontecera no ano anterior num aquartelamento no sul da Guiné, não voltaram as costas ao inimigo.

Recordo as palavras já acima transcritas do soldado António Rodrigues, o meu amigo que viveu todo este tempo de Copá, na dedicatória no livro que me enviou: “Esta guerra existiu e teve episódios muito duros e violentos,(…) que tivemos de enfrentar com muito sofrimento, mas também com coragem, honra e dignidade”.

8. Mês e meio depois, a 31 de Março de 1974, partia de Bajocunda para Copá, a pé, uma grande coluna de tropas portuguesas.

Era uma operação de quatro dias da responsabilidade do BCav 8323. Seguiram dois pelotões da companhia de Pirada, dois pelotões de Bajocunda e um pelotão de milícias, cerca de 130 homens.

Um dos soldados que participou nessa operação chamava-se, chama-se, Joaquim Vicente Silva. É o meu camarada e amigo dono do talho de S. Miguel de Alcainça, Mafra, aqui a quatrocentos metros da minha casa na aldeia.

O Joaquim Vicente contou-me toda a história. Avançaram com dificuldade e algum receio, havia minas na picada, dormiram no mato, mas chegaram em paz a Copá. Para sua surpresa verificaram que os guerrilheiros não haviam entrado no destacamento. Continuava tudo armadilhado, os homens do PAIGC não haviam tocado em nada.

Patrulharam a região em volta de Copá e não só não encontraram ninguém como não tiveram qualquer contacto com o IN. Três dias depois, já no regresso, perto de Bajocunda foram flagelados com tiros soltos de Kalashnikov, disparados a partir de uma bolanha, sem quaisquer consequências.

Faltavam vinte dias para o 25 de Abril de 1974.

Agradeço aos meus camaradas soldados António Rodrigues e Joaquim Vicente Silva, do BCav 8323, as informações preciosas e detalhadas que me disponibilizaram para a elaboração deste texto. Qualquer erro factual que possa eventualmente surgir (nunca sabemos tudo!) é apenas da responsabilidade deste vosso camarada,

António Graça de Abreu
S. Miguel de Alcainça, 19 de Fevereiro de 2009
Ano do Búfalo
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Nota de L.G.:

(*) Sobre Copá, vd. postes de:

11 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3871: Em busca de... (65): Pessoal de Copá, 1ª Companhia do BCAV 8323/73 (Helder Sousa)

28 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3810: Copá, abandonado em 14/2/1974 (José Martins) (3): Unidades de comando em Bajocunda

28 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3809: Os últimos dias do destacamento de Copá, Janeiro/Fevereiro de 1974 (Helder Sousa / Fernando de Sousa Henriques)

26 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3797: Copá, abandonado em 14/2/1974 (José Martins) (2): Unidades de intervenção no subsector de Bajocunda

26 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3795: Copá, abandonado em 14/2/1974 (José Martins) (1): O princípio do fim, a história do Soldado António Rodrigues

30 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3817: Copá, abandonado em 14/2/1974 (José Martins) (4): Unidades de coordenação na Zona Leste

Vd. ainda sobre Copá (destacamento das NT abandonado em 14/2/74):

8 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1410: Antologia (57): O Natal de 1973 em Copá (Benigno Fernando)

27 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1216: A batalha (esquecida) de Canquelifá, em Março de 1974 (A. Santos)

30 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P3004: PAIGC: Op Amílcar Cabral: A batalha de Guileje, 18-25 de Maio de 1973 (Osvaldo Lopes da Silva / Nelson Herbert)

13 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2937: A guerra estava militarmente perdida? (16): António Santos,Torcato Mendonça,Mexia Alves,Paulo Santiago

26 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3795: Copá, abandonado em 14/2/1974 (José Martins) (1): O princípio do fim, a história do Soldado António Rodrigues

16 de Julho de 2007 >Guiné 63/74 - P1958: Vídeos da guerra (1): PAIGC: Viva Portugal, abaixo o colonialismo (Luís Graça / Virgínio Briote)

(... ) Referência ao vídeo da televisão francesa, a antiga ORTF, disponível em INA - Institut National de l' Audiovisuel

GUINEE : LA GUERILLA AU GRAND JOUR MAGAZINE 52 ORTF - 04/07/1974 - Video 12' 32'' / DVD 3 €