quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21431: FAP (121): Cor pilav Gualdino Moura Pinto, comandante da BA 12 (1971/73), já falecido: "um grande líder" (Victor Barata, fundador e editor do blogue Especialistas da Base Aérea 12, e membro sénior da nossa Tabanca Grande)


Guiné > Bissau > Bissalanca > B 12 > 1973 > Esta foto recorda um dia de aniversário do Clube de Especialistas, em Bissalanca, tendo sido convidado o comando da BA 12 (1971/73), o  cor pilav Gualdino Moura Pinto (à esqureda) e o ten cor pilav José Lemos Ferreira (à direita)

Foto (e legenda): © Victor Barata (2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Victor Barata: (i) foi especialista de Instrumentos de Bordo, 
esteve na BA 12, Bissalanca (1971/73), na linha da frente das DO 27"; 
(ii) terrou em tudo o que era bocado de pista;  
(iii) membro da Tabanca Grande desde maio de 2006.

1. Com a devida vénia, reproduzimos a seguir um excerto de um poste do blogue Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74, da autoria do nosso amigo e camarada Victor Barata, membro  da nossa Tabanca Grande da primeira hora (com mais de três dezenas de referências), fundador e editor daquele blogue:

Blogue Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74 > Quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012 > Voo 2730:  O Grande Comandante  Moura Pinto:


(...) Companheiros, há personagens na nossa vida que pela sua conduta, e pelas mais variadas acções, nos marcam para sempre.

(...) Pois bem, vou falar do Coronel Moura Pinto, como um verdadeiro líder, homem de poucas falas, alto, magro, com grandes qualidades humanas. (*)

Remonta ao ano de 1973, quando entre Março e Abril, a nossa Força Aérea perdeu Grandes Homens, companheiros do dia a dia dia que lutavam pela mesma causa que nós mas que o destino quis que partissem primeiro: ten cor pilav Brito, major pilav  Montovani, furriéis mil pil Baltazar e Ferreira. 

A instabilidade estava instalada, o receio, principalmente em quem operava com aeronaves de pequenas velocidades, apoderou-se, por se desconhecer o tipo de arma utilizada pelo PAIGC para abater os nossos aviões.

É nestas ocasiões que se distinguem os grandes Comandantes: o coronel Moura Pinto mandou reunir na sala de operações os 42 pilotos presentes na Base e, com a serenidade que lhe era virtude, foi dizendo:

"Havia garantia de que a arma utilizada pelos guerrilheiros para abater as nossas aeronaves era um míssil”.

Em seguida afirmou ter duas certezas, uma, fruto das suas convicções pessoais, outra, resultado da sua experiência de oficial: a primeira era muito subjectiva e resumia-se numa frase: Só é atingido pelo míssil quem tiver esse destino traçado. A segunda, também se dizia em poucas palavras: 

"Ninguém pode ter medo do míssil, porque o piloto que vai voar com medo está mais vulnerável e acaba por ser atingido."

Depois para reforçar a sua argumentação linear, recordou o ditado latino: "A sorte protege os audazes".

Estas afirmações no ambiente tenso que pairava na sala, tiveram um impacto extraordinário. Gerou-se uma descompressão colectiva, embora estivessem todos ainda apreensivos. Faltava na sala um único piloto, Furriel Santos, por se encontrar de serviço ás operações.

Nesse momento a porta do fundo da sala abriu-se e entrou o piloto em falta, pedindo licença para falar. Toda a assembleia virou a cabeça em sua direcção. O comandante Moura Pinto autorizou-o a falar. Com desenvoltura,o furriel Santos informou ter recebido um pedido de evacuação de feridos graves de um Batalhão do Exército que tinha sido atacado. Vinha pedir instruções. 

Diz-lhe o Coronel Moura Pinto:

"Responda que se vai fazer a evacuação. Mande preparar o helicóptero. Quem faz essa evacuação sou eu".

Voltou-se para a assistência e perguntou: 

"Meus senhores quem quer colocar alguma questão? "

Reinou o silêncio entre toda a gente; 

"Se não têm perguntas, eu já disse tudo, e, como há  coisas mais importantes a fazer, vou-me embora." (#)

Foi fazer a evacuação.

O desfecho desta reunião teve impacto fortíssimo no moral dos pilotos, o ânimo passou a falar mais alto, abafando os últimos resquícios do medo natural.

Descanse em paz, meu COMANDANTE! (**)
Victor Barata
Melec/Av Inst

(#) Nota: Esta passagem foi retirada do livro "A Força Aérea na Guerra de África: Angola, Guiné e Moçambique 1961-1974",  de autoria de Luís Alves de Fraga, ,Coronel da FAP na reserva (Editora Prefácio, 2004, 158 pp.).

Postado por Especialistas da BA 12 às 22:29:00

[Revisão / fixação de texto para efeitos de publicação no nosso blogue: LG]

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Guiné 61/74 - P21430: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (75): procuro mais notas biográficas sobre o cor pilav Gualdino Moura Pinto, dado erradamente como morto no acidente do avião da TAP, TP425, no Funchal, em 19/11/1977 (Santiago Garrido, jornalista, "La Voz de Galicia")



Gualdino Moura Pinto, cor pilav, 
Comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, 
Comandante da Base Aérea nº 12, em 1973
(Fotografia de Arnaldo Sousa, quando se despediu da Guiné
 como Comandante da Zona Aérea e Piloto, junto de pessoal 
que compunha a linha da frente dos Fiat... Com a devida vénia...) (*)


1. Mensagem de Santiago Garrido Rial, jornalista de "La Voz de Galicia":


De: Santiago Garrido Rial <santiago.garrido@lavoz.es>
Date: terça, 22/09/2020 à(s) 18:34
Subject: Galicia 

Estimado Luís

Soy Santiago Garrido, periodista de La Voz de Galicia. Le escribo en castellano porque lamentablemente no sé hacerlo en portugués (sí en gallego, si le resulta más cómodo). En caso de no entender algunas palabras o frases, se las traduciré.

He llegado hasta su página buscando información sobre el comandante Gualdino Moura Pinto, del que leí un artículo sobre su fallecimiento en el accidente de la TAP en Funchal en 1977. Y muchos más de sus numerosos méritos.

Cuando era joven, con apenas 25 años, en 1950, tuvo que realizar un aterrizaje forzoso en una finca de labranza de Ponteceso (Provincia de A Coruña). Fue un hecho muy comentado, ya que no le pasó nada, ni a él, ni al avión. Había salido de Bragança y, por diversas circunstancias, llegó a este punto de Galicia.

Me gustaría reconstruír algún dato sobre él, tal vez hablando con su hijo, que veo que también es aviador en el Ejército del Aire. O alguna foto... No sé si usted podría ayudarme.

En todo caso, muchas gracias por su atención. (**)

Santiago Garrido Rial
La Voz de Galicia, Redacción Carballo
981704210, 606 968 683
@santiagogrial




Título de caixa alta do Diário de Lisboa, de 21 de novembro de 1977. Cortesia de Fundação Mário Soares, Casa Comum, Documentos Ruella Ramos.

Citação:
(1977), "Diário de Lisboa", nº 19511, Ano 57, Segunda, 21 de Novembro de 1977, Fundação Mário Soares / DRR - Documentos Ruella Ramos, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_22565 (2020-10-7)

2. Resposta do editor Luís Graça:

Sugerimos ao Santiago Garrido Rial que explore o blogue Especialistas da Base Aérea 12 Guiné 65/74 onde há mais informação sobre o cor pilav Gualdino Moura Pinto, que era Comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, e Comandante da Base Aérea nº 12, Bissalanca, em 1973.

No nosso blogue não temos muito mais informação sobre ele. Pode ser que algum dos nossos leitores possa ajudar. Boa sorte nas pesquisas e nos contactos. Sabemos que, em 2016, o filho, António Gualdino Ventura Moura Pinto, era Coronel de Infantaria, mas de quem, infelizmente, não temos o contacto.

3. Correção à nossa inf0rmação inicial:

O cor pilav Moura Pinto não morreu nesse acidente aéreo, mas sim de doença, em data, que não podemos precisar. 

Houve uma lamentável troca de identidades, numa notícica dada pela APTCA- Associação do Pessoal Tripulação e Cabine, ao referir a Homenagem aos Tripulantes e Passageiros vitimados no acidente da TAP, 30 anos após, por iniciativa do SNPVAC - Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil... Na lista dos tripulantes mortos vinha o "técnico de voo" Gualdino Maria Moura Pinto... Ora o técnico de voo (TV) que morreu no Funchal, era de apelido Encarnação. Este assunto está, de há muito,  esclarecido no blogue Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 65/74.


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Notas do editor:


(**) Último poste da série > 9 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21242: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (74): Canábis - II (e última) Parte : Efeitos psicoativos, imediatos e a longo prazo

Guiné 61/74 - P21429: Brunhoso há 50 anos (14): A Despensa - Adega do Zé (Francisco Baptista, ex-Alf Mil da CCAÇ 2616 e CART 2732)

Adega do Zé de Remondes

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Baptista (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), autor do livro "Brunhoso, Era o Tempo das Segadas - Na Guiné, o Capim Ardia", com data de 6 de Outubro de 2020 com mais uma memória de Brunhoso:

No tempo das candeias quase todos os bens alimentares se guardavam nas despensas que pela sua situação um pouco abaixo do rés-do-chão, tinham uma temperatura amena, quer no inverno quer no verão, propicia à sua conservação.

Lembro-me que os grandes pães de trigo e de centeio, cozidos no forno de lenha pela minha mãe, se conservavam por muito tempo, quinze dias. A maioria dos outros produtos conservavam-se durante um ano, o melhor prazo para os lavradores já que as colheitas eram anuais. 

O vinho guardado em pipas de carvalho durava um ano, por vezes começava a "atirar" ou envinagrar pois os lavradores não lhe punham conservantes ou por não os conhecerem ou porque bebendo-o todos os dias não se davam conta da acidez que aumentava gradualmente.

O presunto dos porcos caseiros, depois de curado, duraria muitos anos mas os porcos eram mortos à medida da necessidade anual de cada família. O presunto que combina bem com o vinho, tal como ele, guardado, numa boa adega, em condições ideais, durante alguns anos melhora a qualidade. 
 
O toucinho, a parte mais gorda e menos nobre do porco atingia o seu melhor paladar na transição do Verão para o Outono, no tempo das sementeiras. O azeite era lá guardado em grandes talhas de barro ou de cimento, para consumo da casa, o excedente era vendido, com mais de um ano ficava velho e podia ganhar ranço. 

Os salpicões e as linguiças, depois de passarem algum tempo no fumeiro, eram guardadas em talhas de barro com azeite.

Na despensa guardavam-se ainda as batatas e as cebolas, e guindas penduradas em cacho.  O queijo era guardado em armários de rede fina, por causa das moscas e mosquitos.  A "gradura",  casulas, feijões, o grão de bico, os "chicharros", ou feijão frade também tinham lá lugar pendurados em sacos ou dentro de arcas de madeira. 

As castanhas eram igualmente guardadas em talhas de barro e conservavam-se sãs até ao Verão.

Para alguns lavradores, a despensa era também um local de convívio ocasional para onde convidavam alguns amigos a beber um copo acompanhado com pão, azeitonas, cebola ou até mesmo presunto.

Até à instalação da eletricidade nessas aldeias, já tarde, no século anterior, as dispensas, também assim chamadas, eram indispensáveis, passe o pleonasmo, depois continuaram a ser utilizadas por muitos, pois sabiam que não havia melhor frigorífico, embora tenham adquirido também um eléctrico para alimentos mais frescos.

Em Brunhoso na adega ou despensa do Zé, tive convívios agradáveis com bons acepipes caseiros. Porém as fotografias que acompanham este texto, foram tiradas na adega do Zé de Remondes que tem também sempre bom vinho, presunto, e outros petiscos para os amigos.

Só quem já foi a uma adega destas, um pouco abaixo do nível do chão, e longe na idade e longe da cidade, beber dois copos de vinho e petiscar, sabe avaliar quanto é bom reviver o passado.

As fotos retratam em parte as despensas do passado, pois embora o espaço seja o mesmo, agora há uma miscelânea de coisas antigas e modernas. 

Antigamente não havia plásticos de qualquer feitio, para acondicionar os produtos havia recipientes de barro, madeira, vime e alguns de cimento.

A funcionar há dezenas de anos como adega-despensa, agora para o José é também um museu onde guarda objetos caseiros e ferramentas agrícolas que herdou dos pais e avós e um espaço para arrumar outros bens mais actuais.
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Nota do editor

Último poste da série de 7 de fevereiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18294: Brunhoso há 50 anos (13): Viagens de comboio ao Porto (Francisco Baptista, ex-Alf Mil da CCAÇ 2616 e CART 2732)

Guiné 61/74 - P21428: Parabéns a você (1876): Luís Mourato Oliveira, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 4740 (Guiné, 1972/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 4 de Outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21413: Parabéns a você (1875): Artur Conceição, ex-Soldado TRMS da CART 730 (Guiné, 1965/67) e Inácio Silva, ex-1.º Cabo Apont Armas Pesadas da CART 2732 (Guiné, 1970/72)

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21427: Historiografia da presença portuguesa em África (234): “África Ocidental, notícias e considerações”, por Francisco Travassos Valdez; impressas por ordem do Ministério da Marinha e Ultramar, 1864 (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Julho de 2017:

Queridos amigos,
Dentre os relatos de viagem mais impressivos, ao longo do século XIX, avulta, pela qualidade de observação e o rigor de análise a narrativa deste viajante qualificado que conhecia algumas parcelas o império. Vem confirmar os preciosos documentos de Honório Pereira Barreto e o abandono a que tínhamos votado a Senegâmbia; fica um claro registo do pouco espaço ocupado, dos negócios efetuados e até das dificuldades previsíveis. Não se esqueça que o livro é dedicado ao rei D. Luís I, o funcionário pretende ir mais além e sensibilizar a Coroa para a triste situação da Senegâmbia, que só em 1879 será desafetada de Cabo Verde, e terá então governador e capital em Bolama.

Um abraço do
Mário


Francisco Travassos Valdez e a Senegâmbia (1)

Beja Santos

O
livro intitula-se “África Ocidental, notícias e considerações”, por Francisco Travassos Valdez, impressas por ordem do ministério da Marinha e Ultramar, 1864. Primeiramente, a publicação surgiu em Londres com o título "Six years of a traveller’s in western Africa, 1861". Francisco Travassos Valdez tem um curioso currículo: ex-árbitro das comissões mistas luso-britânicas e do Cabo da Boa Esperança; ex-Secretário da Comissão Especial de Colonização e Trabalho Indígena das Províncias Ultramarinas; Secretário do Governo da Província de Timor.

O volume é apresentado como 1.º, abarca as seguintes descrições: Porto Santo e Madeira; Canárias; Cabo Verde (ilhas de Barlavento), Cabo Verde (ilhas de Sotavento); Senegal e Senegâmbia (Guiné Portuguesa). Nesta recensão trata-se exclusivamente do que o viajante viu e sentiu na Senegâmbia, mais tarde reportaremos o que do Senegal tem interesse relevante para a Guiné do século XIX. Falando da extensão do território, faz um registo singular: “Desde o Cabo Roxo começa a notar-se diferença na cor das águas, passando de um azul carregado a um verde-claro ou amarelo turvo, que se conserva em todo o litoral. São estes mares junto à costa de difícil navegação pelos numerosos parcéis (escolhos recifes), por diversas correntes de sensível velocidade, pela sujeição das marés nas entradas dos canais e pela irregularidade dos ventos; apesar destas circunstâncias, há alguns práticos tão experimentados, que tendo vento ou maré, navegam a qualquer hora da noite, e por escuro que seja, e com o poderoso auxílio da sonda marcam precisamente a posição relativa do navio em um dado momento”.

É um viajante que não escamoteia o que lhe vai mexendo nos sentidos, o barco aproxima-se e nesta aproximação dá-se um maravilhamento que ele passa a escrito: “Quando principiamos a avistar as viçosas ilhas do arquipélago e a costa da Guiné, notamos quanto contraste há com as ilhas de Cabo Verde! Nestas, as massas basálticas, as montanhas enegrecidas pelas terras vulcânicas, quase todo o ano privado de vegetação, mostrando uma aridez e uma esterilidade que por fortuna não se dá nas aprazíveis e viçosas ribeiras do interior; na Guiné, pelo contrário, tudo denota ao viajante um país muito rico de produtos da natureza, terras baixas e extensas, literalmente cobertas de uma vegetação pomposa”. Feita a aproximação, entra-se no Ilhéu do Rei, e logo o autor observa que é opinião de muita gente que se deveria ter colocado o estabelecimento comercial que existe em Bissau aqui, em consequência do ilhéu ser mais saudável, ser arborizado e de bonita aparência. Mas informaram-no de uma dificuldade insuperável: “O busílis era haver ali uma proliferação de árvores sagradas, inclusivamente a china, que é a maior de quantas existem no território dos Papéis, aqui se dirigem anualmente milhares de negros na mais devota romaria, durante a lua cheia do mês de Março”. Fica impressionado com o que vê no ilhéu, a sua importância: “A feitoria do senhor Nazolini está no referido Ilhéu do Rei desde 1847, é o mais importante de todos os estabelecimentos portugueses na Senegâmbia: 300 escravos empregados em cultivar quase todo o ilhéu, nas oficinas e no carregamento da mancarra (…) A casa de habitação e da mais pitoresca aparência, bem edificada e muito cómoda, dando-lhe os alpendres de que se acha cercada um tipo próprio daquelas regiões, e proporcionando-lhe igualmente agradável frescura”.

Regista igualmente certas singularidades do clima: “As trovoadas começam em meados de Maio e duram até ao fim de Outubro; são imponentes e majestosas, principalmente para quem não está acostumado a presenciá-las. Primeiramente forma-se uma forte aglomeração de nuvens no horizonte, e segue-se logo o fuzilar ao longe com uma constância e frequência incríveis; em seguida, vem o tufão com tal violência que arranca árvores frondosas, desloca as telhas e faz tal barulho com o bater de todas as portas e janelas que levanta, que parece realmente a quem pela primeira vez presenceia este fenómeno que as casas vão ser destruídas. Muitos navios estando bem fundeados no porto têm feito da quilha portaló. A este tufão segue-se a trovoada que parece estalar sobre a cabeça, e depois a chuva, caindo os raios com frequência”.

Do Ilhéu do Rei passamos para Bissau, vejamos a opinião do viajante: “A sua perspectiva é agradável pelo arvoredo que a adorna e pelos seus arrabaldes atapetados de verdura, de modo que o viajante, para não perder a ilusão e a saúde, fica talvez melhor em limitar-se a ver a terra de bordo. Aceitou-se o obsequioso convite que nos fez o opulento Comendador Honório Pereira Barreto”. No ato do desembarque, fica muito mal impressionado com o grande número de tubarões que ali nadam à superfície das águas. Contrafeito e um tanto timorato atravessa uma ponte com sinais de pouca segurança até chegar a terra firme, informa-nos que o edifício da Alfândega fica no largo da Mãe Júlia, fronteiro à porta da Praça de Bissau. Registou o exótico da sua chegada: “O que mais atrai as vistas são as bajudas ou donzelas, que pelo seu estado são excessivamente modestas no vestuário, que se compõe unicamente de avental de dimensões microscópicas, avental que, como o pedacito de coiro ou o búzio que os mancebos usam adiante suspenso por um barbante nem sempre lhes oculta de todo o que a decência manda recatar!”. Faz depois a descrição do comércio na rua principal onde os vendedores estão enfileirados e acocorados ao longo da rua, ali se trocam objetos, fundamentalmente exerce-se ali uma economia de troca, mas há exceções: “Às vezes admitem também algum patacão, como chamam à nossa antiga e incómoda moeda de 40 reis, que aqueles negros reservam unicamente para a manufactura dos seus grosseiros artefactos”.

Desembarcou, percorreu interessado o comércio na rua principal, vai agora falar-nos de Bissau: “A Praça de S. José, com os seus poilões, árvores gigantescas que se erguem com majestade nos quatro baluartes, e que os abrigam com a sombra, está situada na foz do rio Geba, e foi construída no ano de 1756, no reinado de D. José I”. Tece comentários à sua construção, que terá custado a vida a mais de 2 mil portugueses e que ficou num estado miserável, dá-nos também a notícia de que ultimamente têm tido o incremento algumas obras militares. Diz igualmente que aquela Praça não passa de uma povoação mal alinhada, com algumas casas palhoças, outras de barro e bem poucas de sólida construção. Há por ali um problema elementar, a fonte que fornece a água de consumo à Praça fica no Pidjiquiti, a cerca de uma milha, quando há desacatos e cercam a Praça levanta-se um problema sério de abastecimento de água. É franco na descrição das condições hígio-sanitárias, são deploráveis. E daí entender-se a descrição que faz do hospital: “Para se fazer ideia da desgraça a que chegaram os enfermos na Guiné basta dizer que só há bem pouco, com melhoramento muito importante, se compraram 12 camas de ferro para o hospital, a fim de se armarem com cortinas para evitar o flagelo dos mosquitos!”.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 30 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21405: Historiografia da presença portuguesa em África (233): “Guiné, Alguns aspetos inéditos da atual situação da colónia”, por A. Loureiro da Fonseca; Sociedade de Geografia de Lisboa, 1915 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P21426: Notas de leitura (1313): "O Cântico das Costureiras", de Gonçalo Inocentes (Matheos) - Parte IV (Luís Graça): as primeiras minas e fornilhos A/C



Guiné > Região de Quínara > São João > CCAÇ 423 (1963/65) > Os efeitos devastadores das primeiras minas e fornilhos A/C no CTIG, na estrada Nova Sintra-Fulacunda.


Fotos (e legenda): © Gonçalo Inocentes (2020) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Capa do livro

1. Continuação da apresentação do último livro do Gonçalo Inocentes (Matheos),  "O Cântico das Costureiras: crónicas de uma vida adiada, Guiné, 1964/65" (Vila Franca de Xira, ModoCromia, 2020, 126 pp, ilustrado).

Recorde-se que o autor do livro, de que já publicámos três notas de leitura (*),  Gonçalo Inocentes (Matheos), membro nº 810 da nossa Tabanca Grande, foi fur mil, CCAÇ 423 e dpois da CCAV 488 / BCAV 490, de rendição individual, tendo passado por Bissau, Bolama, S.João, Jabadá e Jumbembem, entre 8 de abril de 1964 e 14 de agosto e 1965... 
 
Nasceu em 1940, em Nova Lisboa (hoje, Huambo, Angola). Está reformado da TAP e vive em Faro.

Esta CCAÇ 423, "independente",  é uma das primeiras subunidades a ser mobilizada para a Guiné: pertencia ao RI 15, partiu em 16/4/1963 e regressou, dois anos depois,  em 29/4/1965. Esteve em São João e em Tite, mas também em Jabadá (1 grupo de combate). O comandante era o cap inf Nuno Gonçalves dos Santos Basto Machado.

Segundo o nosso autor, terá sido a primeira a conhecer o pesadelo das minas A/C e dos fornilhos:

"As minas form um pesadelo desde os primeiros dias da companhia. Quase todas as baixas resultaram  do rebentamento destes engenhos" (...) "O IN percebeu cedo de sua eficiência e começaram até a juntar aos fornilhos bombas que a nossa força aérea lançava e não rebentavam" (p. 60).

A nossa  historiografia militar (por ex., Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes) aponta para a segunda metade do mês de outubro de 1964 para o início do emprego generalizado de minas e fornilhas anticarro.

 No Leste, na região de Bafatá, o primeiro engenho a explodir acontece na estrada Bambadinca-Xitole. É desta época a debandada de várias tabancas fulas e futa-fulas, nomeadamenet do regulado do Corubal e Xime, que se refugiam em Bambadinca. Intensifica-se a atuação do PAIGC nas margens, esquerda e direita do rio Geba, nas áreas de Jabadá, Porto Gole, Enxalé, Xime, Bambadinca.

Os fornilhos, permitindo atuar à distância através de um fio ou arame, e selecionar a viatura (, em geral a do meio) cujo rebentamento provocaria mais estragos.  resposta das NT foi deixar de  de fazer colunas auto, deixando as viaturas no quartel e optando por operações a pé. Os picadores começaram a detetar minas antigas e criou-se então o "vício" de as levantar por causa do "ronco" e do prémio monetário.

Tudo indica que nos primeiros fornilhos e minas  A/C, a provocar baixas mortais entre as NT, tenham sido postos na estrada Nova Sintra-Fulacunda. E que as primeiras vítimas tenham sido os nossos camaradas da CCAÇ 423. 

Veja-se a lista, publicada pelo nosso camarada A. Marques Lopes sobre os militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (**)





Guiné > Região de Quínara > CCAÇ 423 > c. 1964 > S/l> O fur mil Arménio Dias de Almeida a levantar uma mina A/C... Será morto, por ferimentos em combate, na zona de São Jioão- Nova Sintra, em 9 de janeiro de 1964. Estas podem ser das últimas fotos dele.

Fotos (e legenda): © Gonçalo Inocentes (2020) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Na pág. 61 do seu livro, o autor publica três fotos do furriel [Arménio Dias de] Almeida a levantar uma mina A/C. Será mais tarde abatido pelo IN, em 9/1/1964, sendo o seu corpo ficado inumado em Bolama, conforme lista que se reproduz a seguir, com os mortos da CCAÇ 423, de 3/7/1963, 18/7/1963 e 9/1/1964.


NOME e POSTO / UNIDADE / DATA DA MORTE / LOCAL DA MORTE / CAUSA D MORTE NATURALIDADE / LOCAL DA SEPULTURA (**)

António Augusto Esteves Magalhães, 1.º Cabo / CCaç 423 / 03.07.63 / Estrada Nova Sintra-Fulacunda, HM241 / Ferimentos em combate / Amares / Cemitério de Bissau, Campa 291, Guiné.

Alberto dos Santos Monteiro, Soldado / CCaç 423 / 03.07.63 / Estrada Nova Sintra-Fulacunda / Ferimentos em combate / Rio Tinto, Gondomar / Cemitério de Fulacunda, Guiné.

José Rato Casaleiro, Soldado / CCaç 423 / 18.07.63 / Estrada Tite-Nova Sintra / Ferimentos em combate / Freiria, Torres Vedras / Cemitério de Bissau, Campa 360, Guiné.

Arménio Dias de Almeida, Furriel / CCaç 423 / 09.01.64 / São João, Nova Sintra / Ferimentos em combate / Vila Cova de Perrinho, Vale de Cambra / Cemitério de Bolama, Campa 3/64, Guiné.


De qualquer modo, a situação nas estradas e picadas de Quínara tornaram-se um terror para as NT, ao ponto da "Maria Turra" , na "Rádio Libertação", em Conacri, considerá-las já como "áreas libertadas"... 

Daí ter sido decido, por ordem de Bissau, já no tempo de Schulz, fazer uma "demonstração de força", em 13 de outubro de 1964, realizando-se para o efeito de uma coluna de carros que fizeram o percurso Nova Sintra-Serra Leoa, ida e volta. 

O moral do pessoal estava em baixo, Mas a operação realizou-se,  com detetores de minas na frente e levando as viaturas  troncos de palmeira e sacos de areia para amortecer o impacto dos fornilhos e minas A/C (p. 171).

Felimente nenhum  engenho explosivo foi accionado desta vez. Mas no regresso a São João, via Nova Sintra, , o pessoal da CCAÇ 423 foi surpreendido com fogo cerrado de "costureirinha" e "kalash". 

Regressou-se a São João, com o moral mais em alta, apesar de um Unimog ter capotado e ter havido feridos cuja gravidade obrigou a helievacuação.

(Continua)

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PS - O livro pode ser adquirido pelo correio, com pagamento por transferência bancária. Preço de capa com portes incluidos: 15 (quinze) euros.


Email do autor: Goncalo Inocentes <rpeixoto.inocentes@gmail.com>


NIB - 0018 0000 0160 5800 0013 9

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Notas do editor:

(**) Vd. poste de 28 de abril  de 2008 > Guiné 63/74 - P2799: Lista dos militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (1): De 1963 a 1964 (A. Marques Lopes)

terça-feira, 6 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21425: Efemérides (337): O 4 de Outubro, dia do meu mentor espiritual, Francisco de Assis (1181-1226)... É uma ocasião também para lembrar os 7 capelães do Exército, no CTIG, que eram da Ordem dos Frades Menores (João Crisóstomo, Nova Iorque)


João Crisóstomo, luso-americano, natural de Torres Vedras, conhecido ativista de causas que muito dizem aos portugueses: Foz Côa, Timor Leste, Aristides Sousa Mendes... Régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona; ex-alf mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): vive desde 1975 em Nova Iorque; tem  cerca de 120 referências no nosso blogue.


1. Mensagem do João Crisóstomo 
 
Data - 04/10/2020, 21:01
Assunto - 4 de Outubro, Dia de São Francisco de Assis


 Caríssimos irmãos:

Entre telefonar para Montariol, Varatojo, Portela de Leiria e Seminário da Luz escolhi o velho Varatojo para um abraço mais directo.  Falei com o sr. P. Vitor Melícias que me prometeu transmitir ao P. Castro e demais residentes o meu abraço de saudades e de Paz e Bem. E como não dá para falar a todos vocês pelo telefone tenho mesmo de usar estas possibilidades que as novas tecnologias de múltiplos endereços proporcionam.

Este abraço vai pois para todos vocês também, para que o espírito do Pai Francisco continue a nortear as nossas vidas e o nosso viver.

E se todos os membros de outras ordens justificadamente lembram e celebram os seus fundadores, é gratificante verificar o lugar especial de carinho e afecto com que "o nosso" Francisco de Assis é celebrado: 

 Num mundo tão egoista como este em que vivemos hoje, o seu desinteresse por coisas “materiais’, o seu amor pela natureza em todas as suas vertentes é de tal maneira inspirador que até o próprio Papa achou pertinente escolher o nome de Francisco. E se não de outra maneira, pelo menos como protector dos animais ele já era conhecido de muita gente, agora verifico com muita satisfação a maior relevância com que em toda a parte neste dia o seu espírito de simplicidade e de desinteresse é lembrado e apontado como exemplo.

Regozijemo-nos todos os que logo de pequenos tivemos a sorte de dele ouvir falar e o termos agora como guia e mentor do nosso viver.

Um apertado abraço de PAZ e BEM.

João Crisóstomo
Nova Iorque

2. Comentário do editor LG:

João. como sabes o nosso blogue é ecuménico, mas "laico",  cabem cá todos os crentes e não-crentes, homens e mulheres de paz e boa vontade... 

Não sabia que o teu "mentor espiritual" tinha sido o Francisco de Assis (c. 1181-1226) (... a par do padre Vitor Melícias).  A maneira como falas dele é tão genuina que eu achei por bem publicar o teu poste, de resto sabendo que tu e outros milicianos que fizeram a guerra colonial na Guiné passaram pelos seminários da Ordem dos Frades Menores (OFM), ou Franciscanos. (**)

É, de resto,  o clero regular mais representado (, são 7 ao todo), na nossa  amostra de capelães militares, publicada no poste P19023.

E de entre esses sete é de destacar o nosso amigo comum (e meu parente)  Horácio Neto Fernandes, nascido em Ribamar, Lourinhã: o nº 42 da lista, era também franciscano (, fui à sua Missa Nova, em 1959), e esteve lá dois anos, primeiro em Catió e depois em Bambadinca e Bissau, de novembro de 1967 a novembro de 1969.

C0mo já tive ocasião de escrever, há aqui um pormenor intrigante: nunca nos encontrámos em Bambadinca, nem eu conheci nenhum capelão, entre julho de 1969 e maio de 1970, em Bambadinca, no primeiro batalhão, a que esteve adida a minha companhia, a CCAÇ 12: refiro-me ao BCAÇ 2852 (1968/70). 

Sabemos que, ainda mais do que os médicos, os  capelães militares eram em número insuficiente para as necessidades do exército, no TO da Guiné. E o batalhão a seguir, que eu servi, o BART 2917 ficou sem capelão ao fim de ano:  era o nosso Arsénio Puim... Um e outro são membros da nossa Tabanca Gramde.

Além do Horácio Neto Fernandes (nº 42) (, que esteve no CTIG de 1/11/1967 a 3/11/1969), cite-se mais os seguintes capelães, da Ordem dos Frades Menores (OFM), por ordem alfabética:

José António Correia Pereira (nº 84): de 26/3/1972 a 21/3/1974;

José de Sous Brandão (nº 79): de 25/9/1871 a 22/12/1973:

José Marques Henriques (nº 97): de 28/4/1974 a 9/10/1974):

Manuel Gonçalves (nº 58): de 19/7/1969 a 30/6/1971;

Manuel Maria F. da Silva Estrela (nº 11): de 27/9/1963 a 14/8/1965;

Manuel Pereira Gonçalves (nº 91): de 28/5/1968 a 29/6/1974):

Pode ser que algum leitor nos ajude a localizar o batalhão a que pertenceram estes capelães franciscanos.


(**) Último poste da série > 6 de outuibro de 2020 > Guiné 61/74 - P21423: Efemérides (336): No dia 5 de Outubro, homenagem aos Antigos Combatentes de Guifões falecidos em campanha e depois de regressados da Guerra do Ultramar (Albano Costa, ex-1.º Cabo At Inf da CCAÇ 4150)

Guiné 61/74 - P21424: Os nossos seres, saberes e lazeres (414): Adão Cruz expõe as suas pinturas na Taberna do Doutor - Rua da Firmeza, Porto

© Adão Cruz


1 - Mensagem do nosso camarada Adão Cruz, médico, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, (Canquelifá e Bigene, 1966/68) com data de 3 de Outubro de 2020:

O meu amigo Zé Carlos, dono da Taberna do Doutor, olhou-me bem nos olhos e disse-me: 

Por que é que você tem os quadros no corredor encostados à parede, em vez de os expor aqui na Taberna? 

Eu respondi: Na Taberna…? Oh!...


A mais bestial das galerias! Eles aí estão. São 21.

Por baixo deste quadro que aqui reproduzo, aquele com que verdadeiramente me identifico, expus o meu resumo curricular. Só me esqueci de referir, no final, que o vinho verde tinto, na minha aldeia e na minha infância, foi o meu segundo leite.

********************


ADÃO CRUZ


- Nasceu em Vale de Cambra há oito décadas.

- Licenciado em Medicina e Cirurgia pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

- Médico generalista em Vale de Cambra durante seis anos.

- Médico na Guerra Colonial da Guiné.

- Médico cardiologista, subespecializado em Eco-Doppler cardíaco, tendo sido um dos pioneiros desta técnica em Portugal. Foi quem adquiriu o primeiro Ecocardiógrafo Bidimensional que entrou em Portugal.

- Ex-Assistente Hospitalar de Cardiologia graduado em Chefe de Serviço.

- Fez o essencial da sua formação no Porto, Lisboa, S. Paulo, Madrid, Barcelona, Corunha, Santiago de Compostela, Paris, Roterdão e Bordéus.

- Sócio da Sociedade Portuguesa de Cardiologia.

- Foi Sócio da Sociedade Europeia de Cardiologia, com cartão de Cardiologista Europeu.

- Ex-sócio da Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos.

- Sócio e colaborador do Sindicato dos Médicos do Norte.

- Sócio da Sociedade Portuguesa de Escritores e Artistas Médicos.

- Escreve desde jovem e pinta desde a década de oitenta.

- Frequentes colaborações em jornais, revistas e blogues.

- Tem doze livros publicados, entre poesia, contos e pintura, e mais um sobre assuntos de cardiologia.

- Tem quadros seus a ilustrar capas de livros de outros autores.

- Convidado para três bienais.

- Fez diversas exposições individuais e colectivas em Portugal e fora de Portugal.

- Tem quadros seus em sete países.

- Vem referido e comentado na Parte II, Vol. V, da enciclopédia “O Mundo Fascinante da Medicina”, ilustrando os seus quadros outros volumes, nomeadamente uma boa parte do Volume II da mesma Parte II.

- Convidado com poesia e pintura para o livro comemorativo dos noventa anos da BIAL.

- Convidado com texto e pinturas para o livro comemorativo dos vinte e cinco anos da abertura da Unidade de Cuidados Intensivos de Cardiologia do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia.
 

Guiné 61/74 - P21423: Efemérides (336): No dia 5 de Outubro, homenagem aos Antigos Combatentes de Guifões falecidos em campanha e depois de regressados da Guerra do Ultramar (Albano Costa, ex-1.º Cabo At Inf da CCAÇ 4150)


1. Mensagem do nosso camarada Albano Costa (ex-1.º Cabo da CCAÇ 4150, Bigene e Guidaje, 1973/74), com data de 5 de Outubro de 2020:

Hoje, dia 5 de Outubro, dia da implantação da República, os ex-Combatentes na Guiné, da Vila de Guifões, comemorariam o seu 25.º convívio, mas o estado actual em que nos encontramos devido ao Covid-19, fez com que o nosso convívio ficasse adiado para o próximo ano.

Mesmo assim não quizemos deixar passar o dia sem prestarmos uma singela homenagem a todos os combatentes do ultramar que já nos deixaram, e pelas 10 horas, em frente ao nosso monumento na Vila de Guifões, foi colocada uma coroa de flores, gentilmente oferecida pela senhor Eng. Pedro Gonçalves, Presidente da União de Freguesias de Custóias, Leça do Balio e Guifões.

Um abraço
Albano Costa

Seguem-se as fotos alusivas ao acto.

____________

Nota do editor

Último poste da série de 28 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21399: Efemérides (335): Cumpre-se hoje 28 de Setembro, 53 anos da minha chegada à Guiné no HC-54 Skymaster 7504. Uma memória com mais de meio século (Mário Santos, ex-1.º Cabo MMA)

Guiné 61/74 - P21422: Questões politicamente (in)correctas (53): Doação / colheita de órgãos para transplante em Portugal: esclarecimento para tranquilizar o nosso amigo Cherno Baldé, que está em Bissau, bem como os guineenses muçulmanos que utilizam (ou podem vir a utilizar) os nossos hospitais públicos ou privados

 
Imagem reproduzido, com a devida vénia, de SNS 24 > Transplante de órgãos (Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)



1. O nosso querido amigo e colaborador permanente Cherno Baldé (Bissau) levantou aqui, a propósito do aproveitamento energético dos fornos crematórios na Suécia (*), uma questão muito delicada e sensível mas muito importante, sobre a colheita de órgãos (e tecidos) para transplante em Portugal...


Para que não restem  quaisquer dúvidas sobre a legislação, a ética e a prática da colheita de órgãos (e tecidos), nomeadamente em dador cadáver, aqui fica, a seguir, um pequeno texto de esclarecimento da Sociedade Portuguesa de Transplantação.

Sobre esta questão da colheita e doação de órgãos e tecidos para transplante já houve, de resto, mais inyervenções dos nossos leitores (Valdemar Queiroz, C. Martins, José Belo, entre outros). É uma questão, por outro lado, que nos interessa a todos porque todos somos potenciais dadores, em vida ou post mortem.


2. Comentários de Cherno Baldé:

(i) Caro José Belo,


Uma técnica muito eficiente que corresponde, também, a uma sociedade muito "avançada" e despida de dogmas religiosos.

Tenho um vizinho, antigo emigrante em Portugal, que regressou definitivamente, porque, segundo ele, não queria ser desposado dos seus órgãos internos depois da sua morte. As razões de fundo, a crença na ressurreição após a morte. Diz-me ele:

- No dia da grande chamada, em que estaremos diante do Senhor, não quero apresentar-me deficiente, incompleto, compreendes? Claro que eu o compreendia. O que compreendo menos é a mentalidade do ocidental que, todos os 100 anos muda de filosofia de vida. (*)


(ii) Caro amigo Luís,

Cada vez mais os nossos emigrantes desconfiam que estejam a "roubar" alguns orgãos aos parentes falecidos em hospitais na capital portuguesa com a justificação de fazer autópsias geralmente não solicitadas.


Há uma vaga de medo em crescendo, sobretudo entre os muçulmanos que vivem com o dilema do medo de morrer em Portugal e a falta de condições de tratamento médico no país de origem.

Em relação aos médicos nos tais hospitais com necessidades gritantes de órgãos para transplante, faz lembrar a história da relação entre os vagomestres e os fulas criadores de gado, durante a guerra na Guiné, que eram sempre muito relutantes a vender o seu gado a tropa. Logo nunca matavam para comer e também não vendiam.

Mas, ainda assim, antes roubados do que cremados. (**)

3. Esclarecimento da Sociedade Portuguesa de Transplantação sobre o conceito de Dador Cadáver (Reproduzido com a devida vénia) (***)

Dador Cadáver

Qualquer pessoa, ao falecer, é um potencial dador de órgãos ou tecidos para transplante, desde que, em vida, não se tenha manifestado contra esta possibilidade, nomeadamente através de inscrição no Registo Nacional de Não-Dadores. 

(No caso de se tratar de uma pessoa menor de idade ou mentalmente incapaz, é válida a vontade de quem detenha o poder paternal). 

No entanto, para que possa haver doação de órgãos têm que reunir-se um conjunto de circunstâncias:

● o dador tem que falecer num Hospital;

●  depois de se verificar a paragem irreversível das funções cerebrais ou cardio-respiratórias, o corpo tem que ser mantido artificialmente, desde o momento da morte até ao momento da extracção dos órgãos,

● é necessário que se conheça, com exactidão, a causa da morte.

Não são aceites como dadores indivíduos que sejam, na altura da morte, portadores de uma doença infecto-contagiosa, de um tumor maligno ou de uma doença com repercussão nos órgãos a transplantar. 

Também são contra-indicações, embora relativas, para a doação, uma história clínica de Hipertensão Arterial, de Diabetes ou a idade avançada.

No que respeita à idade, os dadores mais desejáveis são os que têm entre 15 e 55 anos, mas a idade é valorizada caso a caso, de acordo com o tipo de órgão a utilizar e com o conhecimento da história clínica do dador.

Uma vez certificada a morte, e se o cadáver tiver características adequadas à doação (ou seja, se os seus órgãos puderem ser úteis para curar ou melhorar a saúde de outras pessoas), o coordenador hospitalar para a transplantação tem a obrigação de se informar, por todos os meios ao seu alcance, sobre a vontade expressa em vida por aquele indivíduo em relação à doação. Para este efeito, são consultados o Registo nacional de Não-Dadores e, sobretudo, os familiares próximos do falecido.

No caso de não existirem objecções, prosseguir-se-á com o procedimento de colheita. O que acontece depois da extracção de órgãos ou tecidos de um cadáver? 

Não há qualquer diferença em relação a outra morte em contexto hospitalar. A extracção de órgãos ou tecidos é feita num Bloco Operatório, em condições de assepsia, e consiste numa intervenção cirúrgica realizada por uma equipa médica e de enfermagem especializada.

O corpo não fica desfigurado e é sempre tratado com o máximo respeito. Depois desta intervenção, o cadáver é transferido para a morgue do hospital, como qualquer outro cadáver. 

Quanto aos órgãos colhidos, são mergulhados num líquido de preservação e enviados para o hospital onde irá ser feito o transplante.

[Revisão / fixação de texto para efeitos de edição neste blogue: LG]


4. Segundo notícia do SNS, de 16/7/2020, e com base em d
ados divulgados pelo IPST - Instituto Português do Sangue Transplantação,  "o número de órgãos transplantados atingiu os 878 em 2019, mais 49 (5,9%) face ao ano anterior, tendo o transplante pulmonar registado o maior aumento de sempre". 

(...) “Os resultados da atividade nacional de doação e transplantação de órgãos em 2019 foram globalmente positivos, seguindo a tendência crescente dos últimos cinco anos”, refere o IPST em comunicado.

“A doação de órgãos (total de 430 dadores) manteve a sua tendência ascendente, com uma subida de 3,4%”, adiantam os dados da Coordenação Nacional da Transplantação, adiantando que as causas de morte, no dador falecido, foram em 80% dos casos por doença médica e destas, 82% por acidente vascular cerebral.

O IPST observa que, em 2019, se atingiu um novo limite com o dador mais idoso, com 90 anos, que foi dador de fígado e o órgão foi transplantado com sucesso. (...).

Guiné 61/74 - P21421: Memórias cruzadas: relembrando os 24 enfermeiros do exército condecorados com Cruz de Guerra no CTIG (Jorge Araújo) - Parte II

Foto nº 1 > Guiné >  Zona Leste >Região de Bafatá >  Sector L1 > Xime > Madina Colhido >  «Operação Boga Destemida» realizada em 9 de Fevereiro de 1970 pelas CART 2520 (1969/70) e CCAÇ 12 (1969/71). Momento da Heli evacuação de feridos, em Madina Colhido, ocorrência registada no itinerário de regresso ao aquartelamento do Xime. Junto ao Heli pode ver-se, com t-shirt branca e de costas, uma enfermeira paraquedista. [Foto do álbum de Arlindo T. Roda - P19240], com a devida vénia.



Foto nº 2 > Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L5 > Galomaro > CCS/BCAÇ 3872 (1971/74). Equipa de "saúde" em missão de prevenção durante a realização de uma «Operação». [Foto do álbum de Juvenal Amado - P11764], com a devida vénia.



Foto nº 3 > Guiné > - Região do Óio > Mansoa > 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4612 (1972/1974). Momento da Heli evacuação de feridos, vítimas da emboscada ocorrida na estrada de Farim-Mansabá-Mansoa, em 15 de Julho de 1973. [Foto do álbum de Jorge Canhão - P11260], com a devida vénia.

 


O nosso coeditor Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger,CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/1974), professor do ensino superior; vive em, Almada: acaba de regressar de Abu Dhabi, Emiratos Árabes Unidos, onde foi "apanhado" durante vários meses pela pandemia de Covid-19; tem mais de 260 registos no nosso blogue... e já está a preparar o próximo ano letivo, que não vai ser fácil paar ninguém: professores, e demais pessoal da conunidade escolar: pessoal não docente,alunos, pais e encarregados de educação, etc. Espera que este ano lectivo (2020/21) seja o último, antes de se reformar.


MEMÓRIAS CRUZADAS

NAS "MATAS" DA GUINÉ (1963-1974):

RELEMBRANDO OS QUE, POR MISSÃO, TINHAM DE CUIDAR DAS FERIDAS CORPOREAS PROVOCADAS PELA METRALHA DA GUERRA COLONIAL: «OS ENFERMEIROS» 

OS CONTEXTOS DOS "FACTOS E "FEITOS" EM CAMPANHA DOS VINTE E QUATRO CONDECORADOS DO EXÉRCITO COM "CRUZ DE GUERRA", DA ESPECIALIDADE "ENFERMAGEM"

PARTE II

 

► Continuação do P21404 (30.09.20) (*)


1.   - INTRODUÇÃO


A emergência do presente trabalho de investigação surge por indução de um duplo significado. O mais recente, associado à «Expressão Pandémica do Covid-19 (2020)», uma situação de "saúde pública" que não nos preocupa só a nós como, igualmente, à globalidade dos povos dos cinco continentes. O segundo, o mais remoto, por estar a uma distância temporal superior a meio século, vivido pela geração dos ex-combatentes na designada «Guerra Colonial / Guerra do Ultramar / Guerra de África» (1962-1974), cujo nome não é relevante para o caso, procura enfatizar o importante papel desempenhado pelos nossos camaradas da "saúde militar" (e igualmente no apoio a civis e população local) – médicos e enfermeiros/as (as paraquedistas; por exemplo a da foto nº 1) – na nobre missão de socorrer todos os que deles necessitassem, quer em situação de combate, quer noutras ocasiões de menor risco de vida (medicina geral), mas sempre a merecerem atenção e cuidados especiais. [Vd. também fotos nºs 2 e 3}.

Recorda-se, a propósito da estrutura global do trabalho, que este foi/está dividido em partes, onde procuramos descrever cada um dos contextos da "missão", analisando "factos" e "feitos" (os encontrados na literatura) dos seus actores directos "especialistas de enfermagem", onde cada caso acabaria por influenciar a Chefia Militar na argumentação para um "louvor" e que se transformaria, depois, em "condecoração" com «Cruz de Guerra», maioritariamente de 3.ª e 4.ª Classe. Para o efeito, a principal fonte de informação/consulta utilizada foi a documentação oficial do Estado-Maior do Exército, elaborada pela Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974).


2.   - OS "CASOS" DO ESTUDO


Como referido anteriormente, foram vinte e quatro os militares "condecorados", no TO do CTIG (1963/1974) com a «Cruz de Guerra» pertencentes aos «Serviços de Saúde Militar», três dos quais a «Título Póstumo», distinção justificada por "actos em combate", conforme consta no quadro nominal elaborado por ordem cronológica e divulgado no primeiro fragmento – P21404. (*)

Como complemento demográfico, apresenta-se no ponto abaixo o quadro de distribuição de frequências referente ao universo dos "casos" do estudo, segundo as variáveis: "ano da ocorrência" e o "posto" do militar condecorado, bem como o competente gráfico relacionado com a segunda variável: "posto".


2.1         - QUADRO E GRÁFICO DOS MILITARES DE ENFERMAGEM DO EXÉRCITO CONDECORADOS COM «CRUZ DE GUERRA» POR "ACTOS EM CAMPANHA (COMBATE) NO CTIG 1963-1974) – (N=24) 





Quadro 1 – Da análise ao quadro supra, verifica-se que o número total de indivíduos do Exército, com formação específica na área dos «Serviços de Saúde Militar», condecorados com medalha de «Cruz de Guerra» por "actos" em combate, e considerados como fazendo parte da população (universo) deste estudo, é de 24 (vinte e quatro), todos eles pertencentes a diferentes Unidades de Quadrícula em missão no TO.


Verifica-se, também, que desse universo, 1 era Alferes médico (4.2%), 4 eram Furriéis enfermeiros (16.6%), 15 eram 1.ºs Cabos Enfermeiros (62.5%), 1 era 1.º Cabo maqueiro, 1 era Soldado auxiliar de enfermagem (4.2%) e 2 eram Soldados maqueiros (8.3%).

É relevante o facto de entre os anos de 1968 e 1971 não ter havido "condecorações" na mesma especialidade do grupo do estudo, assim como no último ano do conflito (1974), uma vez que no 1.º triénio (1963-1965) foram registados 7 casos (29.2%) e no 2.º triénio (1966-1968) os distinguidos foram 15 (62.5%).

É de relevar, ainda, que durante o 1.º sexénio (1963-1968), foram contabilizadas 22 condecorações (92% dos casos), equivalente à soma dos dois primeiros triénios, enquanto no 2.º sexénio (1969-1974) só se verificaram, apenas, duas (8%).


● O que se terá passado nos anos de 1968 a 1971, em relação a condecorações?

 



Gráfico 1 – Representação gráfica da população do estudo agrupada na variável "posto".


3.   - OS CONTEXTOS DOS "FEITOS" EM CAMPANHA DOS MILITARES DO EXÉRCITO CONDECORADOS COM "CRUZ DE GUERRA", NO CTIG (1963-1974), DA ESPECIALIDADE DE "ENFERMAGEM" - (n=24)

 

3.3        - MANUEL PIRES MONTEIRO, 1.º CABO AUXILIAR DE ENFERMEIRO DA CART 565, CONDECORADO COM A CRUZ DE GUERRA DE 4.ª CLASSE 



A terceira ocorrência a merecer a atribuição de uma condecoração a um elemento dos «Serviços de Saúde» do Exército, esta com medalha de «Cruz de Guerra» de 4.ª Classe, por sinal a primeira e única registada no ano de 1964, foi atribuída pela qualidade do desempenho com que executou as funções de enfermagem até ao momento em que o militar em título sofreu ferimentos graves provocados pelo rebentamento de uma mina anticarro sob a viatura que o transportava, no decurso de uma coluna em Fulacunda, em Agosto de 1964, que determinaram a sua evacuação para a Metrópole.


► Histórico




◙ Fundamentos relevantes para a atribuição da Condecoração

▬ Portaria de 24 de Maio de 1965:


"Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro do Exército, condecorar com a Cruz de Guerra de 4.ª Classe, ao abrigo dos artigos 9.º e 10.º do Regulamento da Medalha Militar, de 28 de Maio de 1946, por serviços prestados em acções de combate na Província da Guiné Portuguesa: O Primeiro-Cabo, auxiliar de enfermeiro, n.º 658/59, Manuel Pires Monteiro, da Companhia de Artilharia 565 [CART 565] – Batalhão de Caçadores 599, Regimento de Infantaria n.º 15."

● Transcrição do louvor que originou a condecoração:


"Louvo o 1.º Cabo auxiliar de enfermeiro, n.º 658/59, Manuel Pires Monteiro, da CART 565/BCAÇ 599, por se ter revelado, em quaisquer situações, muito cumpridor, desembaraçado, disciplinado, dedicado e competente, encarando com grande entusiasmo as suas funções, salientando-se no entanto a sua actividade no âmbito da acção psicossocial.

Tomando parte em inúmeras acções de combate, em que manteve inalteráveis estas suas qualidades, revelou ainda ser corajoso, indiferente ao perigo, socorrendo todos os seus camaradas em quaisquer circunstâncias e mesmo debaixo de fogo.

Posteriormente, em 27 de Agosto de 1964 [no decurso de uma coluna em Fulacunda], veio a sofrer ferimentos graves em virtude do rebentamento de um fornilho sob a viatura em que o transportava, determinando a sua evacuação para a Metrópole.

Esta praça, pelos serviços prestados e pelas suas qualidades militares, é digna de estima e consideração dos seus camaradas e superiores." (CECA; 5.º Vol; Tomo II, p 434).




CONTEXTUALIZAÇÃO DA OCORRÊNCIA


Para melhor contextualização da ocorrência que originou e fundamentou a atribuição da condecoração ao 1.º Cabo auxiliar de enfermeiro, Manuel Pires Monteiro, socorremo-nos da entrevista dada ao «cmjornal» pelo camarada da mesma Unidade – CART 565 – José Carlos Marques, condutor auto rodas, publicada na edição de 26 de Abril de 2015, com o título: "Mina matou seis dos nossos" – "Fiquei gravemente ferido na explosão de uma mina".


Como testemunha desta ocorrência, por nela ter estado envolvido, José Carlos Marques conta que em Julho de 1964, foi necessário organizar uma coluna auto, a fim de transportar uma força militar [n/n] para uma unidade aquartelada a cerca de trinta km de Fulacunda.




Refere que, "dessa vez não houve problema, mas o pior aconteceu quando fomos buscar os militares, um mês depois. Eu conduzia o Unimog que fechava a coluna de sete viaturas. Eram 16h00 do dia 27 de Agosto de 1964 (5.ª feira). Chovia torrencialmente quando a viatura que eu conduzia pisou uma mina anticarro. Foi um estrondo enorme, a viatura voou e eu fui projectado a mais de 30 metros. Fiquei ferido com gravidade, mas havia colegas em pior estado. Seis dos nossos homens morreram ali, no terreno [foram cinco, como se demonstra no quadro abaixo].


Instintivamente, disparei a G3 para o capim, procurando evitar que o inimigo nos atacasse, o que conseguimos. Naquelas condições meteorológicas, era impossível o helicóptero vir buscar os feridos, pelo que tiveram de ser transportados a pé e depois nas viaturas do resto da coluna. Passei quatro meses a recuperar no Hospital de Bissau (HM 241). Quando tive alta, segui outra vez para Fulacunda, para cumprir mais seis meses de comissão. (…)".


(Fonte: http://www.cmjornal.pt/mais-cm/domingo/detalhe/mina_matou_seis_dos_nossos), com a devida vénia.




(Fonte: CECA; 8.º Vol., Tomo II, pp 71/73)

 


Foto 4 - Região de Quinara > Fulacunda (1964): Elementos do 4.º GrComb da CART 565; (foto do álbum de José Carlos Marques). [fonte: http://www.cmjornal.pt/mais-cm/domingo/detalhe/mina_matou_seis_dos _nossos], com a devida vénia.

 

3.3.1    - SUBSÍDIO HISTÓRICO DA COMPANHIA DE ARTILHARIA 565

= BISSAU - FULACUNDA - NHACRA - SAFIM (1963-1965)


Mobilizada pelo Regimento de Artilharia Pesada 2 [RAP2], de Vila Nova de Gaia, a Companhia de Artilharia 565 [CART 565], embarcou em Lisboa, em 12 de Outubro de 1963, sábado, a bordo do N/M «Índia», sob o comando do Capitão de Artilharia Luís Manuel Soares dos Reis Gonçalves, tendo chegado a Bissau seis dias depois.


3.3.2    - SÍNTESES DA ACTIVIDADE OPERACIONAL DA CART 565


Após a sua chegada a Bissau, a Companhia Independente «CART 565» foi atribuída ao BCAÇ 600 [18Out63-20Ago65; do TCor Inf Manuel Maria Castel Branco Vieira], a fim de substituir a CCAÇ 152 [28Jun61-18Out63; do Cap Inf Carlos Alberto Blasco Gonçalves] no dispositivo e manobra de segurança e protecção das instalações e das populações da sua área, estabelecendo a sua sede na Capital.


Em 18Dez63, foi transferida para Fulacunda, rendendo por troca a CCAÇ 274 [28Jan62-17Jan64; do Cap Inf Adérito Augusto Figueira], ficando integrada no dispositivo e manobra do BCAÇ 599 [18Out63-28Ago65; do TCor Inf Carlos Barroso Hipólito], com vista à actuação em patrulhamentos, batidas, emboscadas e segurança das populações naquela zona de acção.


Em 10Ago65, foi substituída no sector de Fulacunda pela CCAÇ 1420 [06Ago65-03Mai67; do Cap Inf Manuel dos Santos Caria (1.º); Cap Inf Herberto Amaro Vieira Nascimento (2.º) e Cap Mil Inf Adolfo Melo Coelho de Moura (3.º)], seguindo para o subsector de Nhacra, com um Gr Comb em Safim, onde rendeu a CART 495 [22Jul63-24Ago65; do Cap Art Ângelo Rafael Leiria Pires, em 12Ago65, ficando então integrada no BCAÇ 1857 [06Ago65-03Mai67; do TCor Inf José Manuel Ferreira de Lemos]. Em 26Out65, foi substituída no subsector de Nhacra pela CCAV 1484 [26Out65-27Jul67; do Cap Cav Rui Manuel Soares Pessoa de Amorim] e seguiu para Bissau, a fim de efectuar o embarque de regresso, ocorrido em 28 de Outubro de 1965, a bordo do N/M «Niassa». (CECA; 7.º Vol; p. 44).


3.4   - JOSÉ SOARES BISCAIA, 1.º CABO AUXILIAR DE ENFERMEIRO DA CCAV 703, CONDECORADO COM A CRUZ DE GUERRA DE 4.ª CLASSE 


A quarta ocorrência a merecer a atribuição de uma condecoração a um elemento dos «Serviços de Saúde» do Exército, esta com medalha de «Cruz de Guerra» de 4.ª Classe, que seria a primeira de quatro distinções contabilizadas durante o ano de 1965, teve origem no desempenho tido pelo militar em título durante os ataques de que a sua Unidade [CCAV 703] foi alvo em Cufar, nos dias 23 e 25 de Janeiro desse ano.


► Histórico



 



◙ Fundamentos relevantes para a atribuição da Condecoração

▬ O.S. n.º 31, de 16 de Abril de 1965, do QG/CTIG:


"Agraciado com a Cruz de Guerra de 4.ª Classe, nos termos do artigo 12.º do Regulamento da Medalha Militar, aprovado pelo Decreto n.º 35667, de 28 de Maio de 1946, por despacho do Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, de 19 de Março de 1966: O 1.º Cabo, auxiliar de enfermeiro, n.º 2555/63, José Soares Biscaia, da Companhia de Cavalaria 703 [CCAV 703] – Batalhão de Cavalaria 705, Regimento de Infantaria n.º 7."


● Transcrição do louvor que originou a condecoração:


"Louvo o 1.º Cabo auxiliar de enfermeiro, n.º 2555/63, José Soares Biscaia, da CCav 703, porque sempre mostrou espírito de abnegação no desempenho da sua missão.


Em todas as operações em que tomou parte e principalmente durante os ataques de que a Companhia foi alvo no estacionamento de Cufar, nos dias 23 e 25 de Janeiro [1965], não se poupou a esforços no sentido de estar sempre presente onde eram necessários os seus serviços como enfermeiro.


Sob o fogo Inimigo, transportou feridos de uma zona desabrigada e intensamente batida pelo fogo IN, para o posto de socorros, indiferente a qualquer perigo, regressando imediatamente para junto do seu Pelotão.


Pela ajuda grande e generosa que sempre assegurou a todos que do serviço da sua especialidade necessitaram, tornou-se não só credor da amizade e simpatia de todos os camaradas como, ainda, merecedor de toda a estima a admiração da parte dos seus superiores." (CECA; 5.º Vol; Tomo III, p. 187).


CONTEXTUALIZAÇÃO DAS OCORRÊNCIAS




De acordo com os fundamentos que estão na origem da condecoração supra, foram vários os contextos onde o 1.º Cabo enfermeiro, José Soares Biscaia, deu provas da sua indiferença pelo perigo, mostrando sempre uma total disponibilidade e entrega à missão que dele era esperada, em particular daqueles que, por efeito da "metralha", necessitaram dos seus serviços de enfermagem.


No quadro das diferentes missões em que esteve envolvido, que validaram o merecimento da distinção, são relevantes os seus desempenhos na «Operação Tomado", realizada na região do Cantanhez, de 19 a 21Set64; na «Operação Base", efectuada na região do Óio, de 04 a 07Out64, e nas «Operação Rescaldo", «Operação Flores» e «Operação Notável», realizadas na região do Morés-Óio, de 04 a 23Nov64, sob o comando directo do BCAV 705. 


Para concluir a lista de ocorrências, merece destaque a actividade desenvolvida na "mata de Cufar Nalu", na região de Catió, entre 19 e 22Dez64, seguida da «Operação Campo», com o objectivo da ocupação e instalação em Cufar da CCAV 703, onde se manteve de 17Jan65 a 18Mar65.


Depois de instalada em Cufar, a Companhia viria a sofrer dois ataques: o primeiro em 23Jan65, sábado, e dois dias após, o segundo, em 25Jan65, 2.ª feira.


Relativamente à última missão do ano de 1964, recupera-se o depoimento do camarada Manuel Luís Lomba, sobre a "batalha" pela ocupação da mata de Cufar Nalu – P10508.


"A primeira surtida da CCav 703 à mata de Cufar Nalu ocorreu em 19 e 20 de Dezembro de 1964, em interacção com aquela unidade e subunidade de quadrícula e fomos três vezes repelidos, não obstante a simultaneidade da acção dos Paraquedistas e os bombardeamentos da aviação mais a Sul, na área de Cafine, a condicionar Nino Vieira ao envio de reforços, acoitados em Quitafine. O capitão Fernando Lacerda estava de licença e não comandou essa operação. Será o comandante da ocupação das ruínas da fábrica de descasque de arroz, a quinta de Cufar e a nomadização da CCAV 703, entre Janeiro e Marco de 1965 – Operação Campo." (Manuel Lomba).


3.4.1    - SUBSÍDIO HISTÓRICO DA COMPANHIA DE CAVALARIA 703

= BULA - CUFAR - FULACUNDA - NOVA LAMEGO - BURUNTUMA (1964-1966)


Mobilizada pelo Regimento de Cavalaria 7 [RC7], de Lisboa, a Companhia de Cavalaria 703 [CCAV 703], a segunda unidade de quadrícula do BCAV 705, do Cmdt TCor Cav Manuel Maria Pereira Coutinho Correia de Freitas [1919-2003], embarcou em Lisboa, em 18 de Julho de 1964, sábado, a bordo do N/M «ÍNDIA», sob o comando do Capitão de Cavalaria Fernando Manuel dos Santos Barrigas Lacerda, tendo desembarcado em Bissau em 24 do mesmo mês.


3.4.2    - SÍNTESES DA ACTIVIDADE OPERACIONAL DA CCAV 703



Após a sua chegada a Bissau, a Companhia de Cavalaria 703 [CCAV 703], bem como as suas "irmãs" CCAV 702 e CCAV 704, cumpriram um curto período de treino operacional no sector de Bula, sob orientação do BCAÇ 507, regressaram a Bissau, onde ficaram instaladas com a função de intervenção como reserva do Comando-Chefe.

Nessa condição, foram utilizadas em diversas operações de maior vulto, nomeadamente na «Operação Tomado», realizada na região do Cantanhez, na dependência do «CDMG» [Comando de Defesa Marítima da Guiné], de 19 a 21Set64, na «Operação Base», realizada na região do Óio, na dependência do BART 645, de 04 a 07Out64 e nas Operações «Rescaldo», «Flores» e «Notável», realizadas na região do Morés-Óio sob o comando directo do seu Batalhão, de 04 a 23Nov64.


Depois, como reforço do BCAÇ 507, para intervenção na região de Bula, participou na «Operação Fisga», de 03 a 07Dez64. Seguidamente em reforço do BCAÇ 619, na região de Catió, de 19 a 22Dez64, continuada com a «Operação Campo», com consequente ocupação e instalação em Cufar, onde se manteve de 17Jan65 a 18Mar65, sendo substituída pela CCAÇ 763.

Nesta última data, recolheu a Bissau, dondo seguiram, em 01Abr65 para Bolama, tendo cedido dois Grs Comb ao BCAÇ 513 para operações em Fulacunda. Tomou, ainda, parte na «Operação Razia», na região de Cufar, de 09 a 23Abr65, em reforço do BCAÇ 619, após o que recolheu a Bissau.

Em 28Mai65, foi colocada em Nova Lamego, para intervenção em reforço do BCAÇ 512 e depois do seu Batalhão. Em 24Jun65, rendendo a CART 731, assumiu a responsabilidade do subsector de Buruntuma, igualmente integrada no dispositivo e manobra do seu Batalhão. Em 08Mai66, foi rendida pela CCAÇ 1418, recolhendo a Bissau para embarque de regresso, que ocorreu em 14 de Maio de 1966 a bordo do N/M «UIGE», (CECA; 7.º Vol; pp 256-258).



Foto 5 - Região de Tombali > Cufar > Gr Comb da CCAV 703 (1964-1966), durante um patrulhamento encabeçado pelo fur mil Simas. [foto do álbum de Manuel Luís Lomba – P16580], com a devida vénia.


Continua…

► Fontes consultadas:


Ø  Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 5.º Volume; Condecorações Militares Atribuídas; Tomo II; Cruz de Guerra, 1962-1965; Lisboa (1991).


Ø  Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 7.º Volume; Fichas das Unidades; Tomo II; Guiné; 1.ª edição, Lisboa (2002).


Ø  Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 8.º Volume; Mortos em Campanha; Tomo II; Guiné; Livro 1; 1.ª edição, Lisboa (2001).

Ø  Outras: as referidas em cada caso.

Termino, agradecendo a atenção dispensada.


Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.

Jorge Araújo.

03OUT2020


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Nota do editor:


(*) Último poste da série >  30 de setembro de  2020 > Guiné 61/74 - P21404: Memórias cruzadas: relembrando os 24 enfermeiros do exército condecorados com Cruz de Guerra no CTIG (Jorge Araújo) - Parte I