quinta-feira, 26 de outubro de 2023

Guiné 61/74 - P24794: As nossas geografias emocionais (9): Imagens recentes de Bambadinca e Nhabijões (fotogramas do viajante e criador de vídeos Paulo Cacela, Cabo Verde)


Foto nº 5


Foto nº 4


Foto nº 6


Foto nº 7


Foto nº 8


Foto nº 1 


Foto nº 3


Foto nº 2

Fotogramas do vídeo de Paula Cacela (2923) : "Dentro da Maior Tabanca da Guiné-Bissau". 
(Editados e reproduzidos com a devida vénia...)



Fotos: © Paulo Cacela (2023). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Paulo Cacela é  um jovem engenheiro civil portuguès (formou-.se em 2006, no ISEP - Instituto Superior de Engenharia do Porto). Mudou-se para Cabo Verde em 2010. 

Até 2019 trabalhou na área da construçáo civil.  E formou lá família. Com a pandemia de Covida-19 , decidiu viajar e mostrar as ilhas do arquipélapo de Cabo Verde (vencendo a fobia de viajar de avião). Tornou-se "youtuber", criador de vídeos. 

Mais recentemente, em meados de 2023, esteve na Guiné-Bissau, país de que se tornou rapidamente um apaixonado, Os seus vídeos (sobre Bissau, Bubaque, Bafatá, Bambadinca, Saltinho...) merecem ser vistos, 

C0mo forma de o ajudar a tornar este projeto sustentável,  sugerimos que subscrevam o seu canal. Tem já cerca de 23 mil subscritores, cerca de 190 vídeos de viagens. O número de visualizações atinge já os 3,5 milhões. Aderiu ao You Tube em 2013 (@PauloCacela). Tem também página no Instagram e no  Facebook (aqui com 13 mil seguidores).

Há dias divulgámos um dos seus recentes vídeos, justamente sobre Bambadinca, a que ele chamou "a maior tabanca da Guiné-Bissau" (*).

Hoje tomamos a liberdade de reproduzir, com a devida vénia, alguns dos seus fotogramas, com destaque para a parte do vídeo em que visitou os Nhabijóes e a "máe-de-água" de Bambadinca. 

A nossa legendagem complementar também  pretende ajudar a perceber melhor o conteúdo  do vídeo de cerca de uma hora,  e o seu contexto.  Para quem, como nós conheceu Bambadinca e os seus arredores, no tempo da guerra (incluindo Nhabijões, "de má memória", já que caímos lá em duas minas anticarro, em 13 de janeiro de 1971, na altura em que se estava a construir o respetivo reordenamento), este "regresso" é sempre emocionante... São lugares que pertencem às nossas geografias emocionais (**)


2. Transcreve-se o nosso comentário (*), agora enriquecido com os oito fotogramas do Paulo Cacela, reproduzimos acima (com a devida vénia) (trata-se de capturas de écrã):

Aconselha-se a ver o vídeo com legendas. O vídeo começa em Bafatá, onde o Paulo Cacela apanha uma carrinha de transporte público (tipo "toca-toca") para Bambadinba (ele diz "Babadinca", como toda a gente).

O alcatrão do tempo da tropa, na estrada Bafatá-Bambadinca, já desapareceu, em muitos troços... Parece haver bastante trânsito de camiões (de e para o leste, Gabu). Há paisagens que nos vêm, de imediato à memória (fot0 nº 1), das muitas viagens que fizemos entre junho de 1969 e março de 1971, ao temp0 em que estivemos em Contuboel (oito semanas) e depois em Bambadinca (21 meses). 

Na altura, o único troço de estrada alcatroada na zona leste (Regiões de Bafatá e de Gabu) eram justamente  os 30 km entre Bambadinca ("a cova do lagarto") e Bafatá ("a princesa do Geba").

Faz depois uma visita a Bambadinca, que o surpreendeu pela seu "mercado" e "formigueiro humano" (a expressão é nossa, o Paulo fala em "grande confusão", de gentes e viaturas) (Bambadinca tornou-.se a maior tabanca da Guiné, cresceu imenso depois da independência, 15 ou 20 vezes mais, hoje deve ter c. de 35 mil habitantes), e muito também graças à "eletrificação" operada em 2013/2014, com a instalação de um sistema fotovoltaico.

Na visita ele faz-se transportar de motorizada, conduzida por um futuro jovem professor, Sandji, que está ligado a uma ONG que apoia uma escola local e os direitos das mulheres (não conseguimos saber o nome dessa ONG)...

Depois o Paulo quer "conhecer uma tabanca", e o Sandji leva-o a Nhabijões  ou Nha Bidjon (o grande reordenamento do nosso tempo, com cerca de 300 casas, está bastante modificado, e há novas moranças) (fotos nºs 2, 3, 4 e 5).

Balantas e muçulmanos (mandingas e outros) estão separados, enquanto comunidades... Na foto nº 2, vè-se uma mesquista (que pendsamos ser do tempo da construção do reordenamento), e na º 3, uma escola corânica ou muçulmana ("madraça"),,, (A maior parte da população é balanta, mas havia um núcleo mandinga. que professa a religião muçulmana).

Podem-se ver aqui algumas das mais belas paisagens da Guiné: a grande bolanha de Nhabijões ("Nabedjon"), o cultivo do arroz, as mulheres a mondar, o duro trabalho braçal dos jovens, munidos do "radi", a enxada balanta, etc. (Fotos nºs 4 e 5).

A seguir o Paulo, sempre conduzido pelo Sandji, vai conhecer a instalação fotovoltaica que desde 2013/14 pôs Bambadinca no mapa. "Bafatá ficou parado no tempo", diz o jovem encarregado de gerir o sistema (que está com problemas de eficiència por falta de manutenção: as baterias atingiram o seu prazo de validade, já não funcionam, à noite e em dias sem sol tem se recorrer ao gerador e ao gasóleo...).

Mas em Bambadinca há luz, só há outra comunidade na Guiné (não se diz qual. ,mas julgamos ser Contuboel) que beneficia de luz eléctrica durante todo o dia e à noite até à meia noite.

O vídeo, de quase uma hora, termina na "mãe de água" que alimenta Bambadinca (pelo menos, a antiga zona colonial) e cuja localização exata ainda não descobrimos, numa primeira visualização rápida do vídeo... (E não temos ideia de a ter visitado, em 1969/71; a possível referència ao BART 3873, gravada no cimento, aparece ao minuto 53, já quase para o fim do vídeo). (Fotos nºs 7 e 8).

A paisagem (onde se localiza esta captação de água, do tempo colonial) é luxuriante. O "poço " ou "mina" está muma cota mais elevada (cerca de 50 metros, diz o Paulo, que é engenheiro). A água chega à antiga "baixa" de Bambadinca", a tabanca do nosso tempo, junto ao rio, por gravidade... 

Reconhecemos, isso, sim, o fontenário de Bambadinca, de 1948 (do tempo do grande governador Morais Sarmento) , agora pintado de branco e azul (foto nº 8), que aparece no fim, e que continua a dar água aos bambadinquenses, desde há 75 anos! (vd. poste P10806).

PS - Ainda não conseguimos localizar esta nascente... Pode ser, na carta de Bambadinca, um lugar chamado "Água Verde", entre Bambadincazinho (reordenamento onde ficava a "Missão do Sono") e o rio Geba, à cota 35. A distància até ao fontenário de 1948, na "baixa", na antiga tabanca de Bambadinca, seria de menos de 2 km.Pelo mapa vê-se que havia diversas "pontas" ao longo da margem esquerdo do rio Geba. A região é fértil em água. 
 ____________

quarta-feira, 25 de outubro de 2023

Guiné 61/74 - P24793: Historiografia da presença portuguesa em África (391): Grandes surpresas na publicação "As Colónias Portuguesas", Revista Ilustrada (6) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Março de 2023:

Queridos amigos,
É com desgosto que acaba esta leitura de uma publicação que não suspeitava existir há 1 mês. O arco cronológico tem imensa curiosidade, corresponde a um período de grande desinteresse com a Guiné, apostava-se forte e feio em Angola e Moçambique, em Bolama, o governador não tinha meios militares para intervir energicamente na guerra do Forreá, que estilhaçou completamente toda a economia da região Sul. No Casamansa, a França prosseguia a sua política implacável de nos enxotar, assim se chegou à convenção luso-francesa de 12 de maio de 1886, aumentou a superfície da colónia, perdeu-se a nossa presença nos rios Casamansa e Nuno, irá estiolar o nosso comércio na Serra Leoa. Os correspondentes da revista referem-se a estes acontecimentos, chegara-se mesmo ao cúmulo de entregar a colónia a uma companhia majestática ou de ali sair de armas e bagagens, por falta de meios. Tenha-se em conta a diatribe de Alexandre Herculano sobre a questão do Casamansa. Entretanto, procura-se fazer crescer a nossa influência no arquipélago dos Bijagós. A década de 1890 iniciara-se com uma crise financeira internacional que irá devastar as instituições monárquicas, uma crise que fará estremecer o nosso Terceiro Império, o Africano. Por artes do surto ultranacionalista, durará até à descolonização.

Um abraço do
Mário



Grandes surpresas na publicação As Colónias Portuguesas, revista ilustrada (6)

Mário Beja Santos

A publicação As Colónias Portuguesas, Revista Ilustrada, publicou-se entre 1883 e 1891, era inequivocamente dirigida à classe política, não descurava a atração de investimentos, procurava dar informação aos funcionários da administração colonial e a potenciais estudiosos do Terceiro Império. Comecei, na Biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa, por percorrer o volume referente a 1883 e a 1884. Não posso esconder o entusiasmo que sinto ao folhear estas páginas, elas comportam informações que, por um lado, corroboram o que a historiografia vai lavrando, e, por outro lado, temos inesperadamente acesso a testemunhos que se afiguram genuínos, um dos redatores efetivos, António A. F. Ribeiro terá montado uma rede de contactos e o que vai aparecer sob a forma de correio parece-me de insofismável valor.

Como se advertiu o leitor, estamos no derradeiro volume da Revista, são os números correspondentes a 1890 e 1891, o estado de muitas páginas é deplorável, dada a inequívoca importância desta publicação espera-se que um dia ela venha a ser digitalizada, comporta elementos que nenhum investigador desdenhará tomar nota.

Já não há imagens da Guiné, as que aqui se mostram pertencem a outro universo colonial, atenda-se ao retrato do então major Dias de Carvalho, no fim do século o distinto oficial-general permanecerá na Guiné um bom lapso de tempo e deixará um relatório do maior valor; e peço a atenção do leitor para o início de uma noticia sobre a Guiné, mostra o que era o estado de espírito da elite colonial, o propósito confessado era ministrar uma aprendizagem aos indígenas que servisse o comércio e a indústria.

Curioso me pareceu o que foi escrito no número referente a 31 de maio de 1890, passo a transcrever:
“O Sr. M. F. Galibert, que fazia parte da comissão destinada a fixar, de acordo com a comissão portuguesa, os limites da Guiné, escreveu um interessante artigo com o título ‘En Sénegambie’, que encontramos publicado no Bulletin de la Societé de Géographie Commerciale de Paris. E então destacam-se alguns trechos, julgam-se os mais pertinentes do artigo.
Buba caíra; e caíra desde que o Governo português, conhecendo a sua importância comercial julgou dever estabelecer ali um posto aduaneiro. Na sua queda arrastara Bolama à qual fornecia toda a riqueza. Dez anos de centralização, de funcionalismo militar, excluindo qualquer outra cooperação, tinham bastado para chegar a este resultado. E fala assim de Geba:
Este país está em formação. E em mãos inteligentes seria de uma riqueza inesgotável. Portugal parece havê-lo compreendido; e tem feito sacrifícios excecionais em favor de Geba.
Tem sustentado guerras para expulsar das suas vizinhanças as tribos inimigas, substituindo-as por povos pacíficos. Mas Geba não tem defesa. É uma grande aldeia com três mil habitantes e quinhentas casas feitas de adobe e cobertas de colmo.

Galibert revela-se surpreendido com a adaptação dos guineenses, tece as seguintes observações.
Entre os que compreenderam os seus deveres para com a civilização, os que mais títulos têm de reconhecimento dela, é, com toda a justiça, Portugal. A língua portuguesa fala-se desde a Serra Leoa até à Gorêa; é a língua comercial. A pequena Guiné está cheia de agrupamentos portugueses, em que a civilização, inseparável da expansão do cristianismo, mostrou a sua eficácia e desmentiu a suposição de que o negro é rebelde ao aperfeiçoamento. Em 1878, a Guiné, explorada pelo comércio francês, estava de tal maneira florescente que se lhe deve a sua autonomia. A política dos concelhos locais, de que os interessados, os franceses, eram rigorosamente excluídos, consistiu desde então em vexar em impostos todo o comércio estrangeiro. Como os franceses eram os únicos que tinham bens prediais no país, o valor das suas propriedades sofre. Os franceses retiram-se quase todos. Só ficou a casa Blanchard, que tinha grandes interesses comprometidos em grande número de propriedades, que podem avaliar-se em 50 mil hectares. No lugar dos que abandonam o país, Portugal não pôs lá ninguém.”

Documento do maior interesse me parece outra notícia, também sem assinatura sobre o arquipélago dos Bijagós, reza o seguinte:
“De um bem escrito relatório do Sr. Joaquim da Graça Correia e Lança, governador interino da Guiné Portuguesa, vamos escolher algumas informações interessantes relativas aos Bijagós.
A ilha das Galinhas tem 600 habitantes e 3 povoações. O gentio é pacífico. Os habitantes vão em canoas a Bolama, Bissau e às feitorias do Rio Grande comprar tabaco, aguardente, armas, pólvora e tecidos, em troca de laranjas, galinhas, arroz, azeite de palma e chabéu (fruto da palmeira). A permutação faz-se em geral do seguinte modo. Por 1 folha de tabaco trocam-se 4 laranjas, por 1 barril de pólvora de 4 libras 6 galinhas, por fazenda no valor de 360 reis 1 galão de azeite, por fazenda no valor de 960 reis 1 bushell de arroz. É uma das ilhas que mais se presta a uma larga exploração agrícola. Possui muito boa água, extensas pastagens, gado em abundância. Correia e Lança escreveu que esta gente procede dos antigos escravos de D. Aurélia Correia, que em 1833 para ali fora habitar com o seu marido, Caetano José Nozolini, levando de Bissau, do ilhéu do Rei, todos os escravos da sua casa que ascendiam a uns 400. Como era uma das principais casa de Bissau, fácil lhe foi fazer uma das melhores instalações na ilha das Galinhas.”


O artigo procede com mais comentários sobre a ilha das Galinhas, a salubridade da região e as expectativas de uma riquíssima exploração agrícola, o governador interino elenca as madeiras exóticas como a calabaceira, o poilão, a goiaba brava e o pau carvão. Mais adiante, fala na ilha de Orango, teria 8.260 habitantes e 29 povoações. “O rei de Orango é absoluto e déspota. Ninguém na ilha pode negociar, nem possuir bens; só ele possui canoas que manda a Bissau. É com ele que os negociantes se entendem para os negócios comerciais.” E deste modo termina a notícia: “Há no arquipélago vários outros ilhéus sem importância. O número total das ilhotas e ilhéus é de 53. Este arquipélago pode, convenientemente explorado, concorrer em grande escala para a prosperidade e largo desenvolvimento da Guiné.”

E aqui findam as notícias sobre a Guiné porque desapareceu a revista que neste período há que o confessar, tem o seu enfoque nos acontecimentos do ultimato britânico, detalha minuciosamente o tratado feito com Inglaterra, Angola e Moçambique são as colónias a que dá verdadeiro realce, compreende-se, foram desencadeadas as campanhas de pacificação e ocupação, de acordo com os ditames da Conferência de Berlim, encetava-se a prosperidade da nossa África Austral.

____________

Nota do editor

Último poste da série de 18 DE OUTUBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24768: Historiografia da presença portuguesa em África (390): Grandes surpresas na publicação "As Colónias Portuguesas", Revista Ilustrada (5) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P24792: Excertos dos melhores escritos de António Eduardo Ferreira (1950-2023), ex-1º cabo cond auto, CART 3493 / BART 3873 (Mansambo, Cobumba e Bissau, 1972/74) - Parte II: partida de avião para Bissau, em 24 de janeiro de 1972, deixando a mulher e um filho na maternidade

1. Série com pequenos excertos dos melhores postes do António Eduardo Ferreira (1950-2023) (ex-1.º Cabo Condutor Auto da CART 3493 / BART 3873, Mansambo, Cobumba e Bissau, 1972/74). O nosso camarada era natural de Moleanos, Alcobaça. (*)

II. Partida de avião para Bissau, em 24 de janeiro de 1972, deixando a mulher e um filho   na maternidade (**)


(...) Dia 22 de Janeiro de 1972 [, sábado,] pela madrugada fui levar a minha esposa ao hospital do Sítio da Nazaré (ao tempo a maternidade que dava apoio às parturientes da nossa terra) onde poucas horas depois viria a nascer o nosso primeiro filho, o Paulo.

Ao fim da tarde fui à visita, mesmo sabendo não os voltar a ver nos tempos mais próximos… na hora da despedida disse apenas até amanhã! Embora soubesse que na manhã do dia seguinte  [, domingo,haveria de tomar o autocarro até Lisboa a fim de embarcar para a Guiné.

E assim aconteceu, cheguei a Lisboa por volta das 14 horas. Apresentei-me no Depósito Geral de Adidos, onde me foi dito que a nossa partida estava prevista para as cinco horas da madrugada. Como não havia transportes rápidos, como acontece agora, nada mais me restava que não fosse passar esse tempo divagando pela cidade de Lisboa, tentando esquecer, esquecer tudo… creio que por momentos cheguei a esquecer-me que existia!

Fui até à rua Gama Barros, onde tinha umas pessoas de família, estive por lá até próximo da meia noite, como a viagem ia ser feita de avião, foi-me pedido por um familiar, para levar dois frangos assados para o irmão que estava a prestar serviço no Hospital Militar de Bissau, estava muito frio, (à hora da partida estavam quatro graus em Lisboa), fiz o trajecto da rua Gama Barros até ao quartel na Calçada da Ajuda a pé, levando comigo apenas os frangos que me tinha comprometido a entregar quando chegasse a Bissau. 

Era meia-noite, mais ou menos a meio da avenida João XXI, estava uma porta aberta de onde saiu um cão «pastor alemão» investindo contra mim, não sei se ele teria vontade de me fazer mal, mas o medo que tive foi muito, quando chegava perto de mim eu parava, ele parava também mas não deixava de ladrar, eu começava a andar ele investia de novo, eu já não sabia que fazer, pensei… e a única maneira que via de me ver livre dele talvez fosse dar-lhe os frangos, mas será que a pessoa com quem me havia comprometido a levá-los ia acreditar nesta verdade que cheirava a mentira?... 

Era natural que deixasse dúvidas, mas à medida que me ia afastando da porta de onde o cão tinha saído, ele voltou para casa, para meu grande alívio e os frangos lá chegaram ao destino.

Cerca das cinco horas 
da manhã [, do dia 24 de janeiro, segunda-feira,embarquei no avião (creio ter sido um DC6) que me levou até Bissau, tendo antes feito escala em Cabo Verde no então aeroporto dos Espargos na ilha do Sal, viajou no mesmo avião uma enfermeira pára-quedista que eu desconhecia existirem, ignorância minha.

Foi para mim o primeiro grande choque de temperaturas, em Lisboa estavam quatro graus, ao chegar a Cabo Verde estavam trinta, o primeiro aviso que a partir dali tudo ia ser diferente, passado uma hora voltamos a voar até Bissau, onde à tardinha aterramos no aeroporto de Bissalanca.

Ao desembarcar foi para mim a confusão total, uma temperatura elevadíssima para quem horas antes partira de um sítio muito frio, ver os nativos das mais variadas etnias trajando de forma impensável para mim, carregados de amuletos, brincos nas orelhas, arames no nariz, nos braços, outros com a cara pintada… coisa por mim nunca antes vista, e a que eu e alguns menos esclarecidos, atribuíamos a povos primitivos (que dizer agora da nossa juventude!?). 

Quando saímos do aeroporto estavam à nossa espera viaturas militares que nos levaram para o Depósito Geral de Adidos em Brá, onde eu viria a estar cerca de um mês.

Depois de me ter apresentado no quartel, fui levar os frangos que horas antes tivera na iminência de dar ao cão, a cada minuto que passava, a confusão na minha mente era ainda maior… para além da temperatura, os muitos negros que eu não estava habituado a ver, todo aquele movimento militar que eu também não fazia ideia que fosse assim. 

António Eduardo
Jerónimo Ferreira
(1950-2023)
Viaturas carregadas de homens com o respectivo material de guerra, entrando e saindo da cidade, os helicópteros subindo e descendo junto ao Hospital Militar, soldados por todo lado, uns, prestando serviço em Bissau, outros que vinham de férias para a cidade, outros ainda para a metrópole, e alguns que se encontravam à espera de embarque para regressar ao mato. E os que tinham a comissão cumprida, e esperavam o dia mais desejado… o do regresso à Metrópole.

Durante cerca de um mês estive neste ambiente sem ter qualquer notí
cia da terra, com a agravante de não saber nada da minha mulher e do meu filho, que tinham ficado na maternidade e eu apenas tinha visto durante alguns minutos. 

Depois chegou o dia de partir para o mato onde me fui juntar à minha Companhia, que tinha seguido alguns dias antes por via marítima, tendo ido tirar a IAO (instrução de adaptação operacional) nos subúrbios de Bissau. (...)

António Eduardo Ferreira (2012) (Excertos) (**)

(Seleção / Revisão e fixação de texto / Negritos: LG)

terça-feira, 24 de outubro de 2023

Guiné 61/74 - P24791: Vídeo sobre Bambadinca, da autoria do youtuber Paulo Cacela, chegado até nós através de Mário Conceição, onde se pode ver uma referência ao BART 3873

1. Mensagem do nosso leitor Mário Conceição com data de 21 de Outubro de 2023, enviada através do Formulário de Contacto do Blogger:

Viva!

O Youtuber Paulo Cacela (https://www.youtube.com/@PauloCacela), um Eng Civil Português que reside em Cabo Verde, está a atualmente a fazer uma série de vídeos na Guiné.

Há dias esteve em Bambadinca e os habitantes foram mostrar-lhe uma nascente que abastece a Tabanca Grande(*), onde se encontra a inscrição "3873 TIRES".

Resolvi pesquisar e foi então que encontrei o vosso Blog. Acredito que alguns camaradas que lá estiveram irão gostar das imagens que o Paulo nos mostra.

O vídeo onde mostra a inscrição (por volta do minuto 47) pode ser visto aqui:

Mário Conceição




Paulo Cacela@PauloCacela | 22,8 mil subscritores | 186 vídeos 
(Reproduzido aqui com a devida vénia...)
____________

Nota dos editores (CV/LG):

(*) - Tabanca Grande de Bambadinca. 

Aconselha-se a ver o vídeo com legendas. O vídeo começa em Bafatá, onde o Paulo Cacela apanha uma carrinha de transporte público (tipo "toca-toca") para Bambadinba (ele diz "Babadinca", como toda a gente).

 O alcatrão do tempo da tropa,  na estrada Bafatá-Bambadinca,  já  desapareceu, em muitos troços...  Parece haver  bastante trânsito de camiões (de e para o leste, Gabu).

Faz depois uma visita a Bambadinca, que o surpreendeu pela seu "mercado" e "formigueiro humano" (a expressão é nossa, o Paulo fala em "confusão total") (Bambadinca tornou-.se a maior tabanca da Guiné, cresceu imenso depois da independência, 15 ou 20 vezes mais, hoje deve ter c. de 35 mil habitantes). 

Na visita ele faz-se transportar de motorizada, conduzida por um futuro jovem professor, Sandji, que está ligado a uma ONG que apoia uma escola local e os direitos das mulheres (não conseguimos saber o nome dessa ONG)... 

Depois o Paulo quer "conhecer uma tabanca", e o Sandji leva-o a Nhabijões (o grande reordenamento do nosso tempo,  com cerca de 300 casas, está bastante modificado, e há novas moranças)... Balantas e muçulmanos (mandingas e outros) estão separados, enquanto comunidades... Podem-se ver aqui algumas das mais belas paisagens da Guiné: a grande bolanha de Nhabijões ("Nabejon"), o cultivo do arroz, as mulheres a mondar, o duro trabalho braçal dos jovens, munidos do "radi", a enxada balanta, etc. 

A seguir o Paulo, sempre conduzido pelo Sandji, vai conhecer a instalação fotovoltaica que desde 2013/14 pôs Bambadinca no mapa. "Bafatá ficou parado no tempo", diz o jovem encarregado de gerir o sistema (que está com problemas de eficiència por falta de manutenção). Mas em Bambadinca há luz, só há outra comnunidade na Guiné  (não se diz qual) que beneficia de luz eléctrica durante todo o dia e à noite até à meia noite.

O vídeo, de quase uma hora, termina na "mãe de água" que alimenta  Bambadinca (pelo menos, a antiga zona colonial) e  cuja localização exata ainda não descobrimos, numa primeira visualização rápida do vídeo... (E não temos ideia de a ter visitado, em 1969/71; a possível referència ao BART 3873, gravada no cimento,  aparece ao minuto 53, já quase para o fim do vídeo).

A paisagem (onde se localiza esta captação de água, do tempo colonial) é luxuriante. O "poço " ou "mina" está muma cota mais elevada (cerca de 50 metros, diz o Paulo, que é engenheiro).  A água chega à antiga "baixa" de Bambadinca", a tabanca do nosso tempo, junto ao rio, por gravidade...  Reconhecemos, isso, sim, o fontenário de Bambadinca, de 1948 (do tempo do grande  governador Morais Sarmento) , agora pintado de branco e azul,    que aparece no fim, e que continua a dar água aos bambadinquenses (vd. poste P10806).


Guiné 61/74 - P24790: Efemérides (408): Já lá vão 55 anos! (Carlos Pinheiro, ex-1.º Cabo TRMS, Op MSG, STM/QG/CTIG)

1. Mensagem do nosso camarada Carlos Pinheiro (ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70), com data de 23 de Outubro de 2023:

Já lá vão 55 anos!

Como recordar é viver, há dias que nunca esqueceremos, e o dia 23 de Outubro de 1968 é um desses dias.
Era meio-dia em ponto quando o UÍGE silvou várias vezes a querer dizer que estava pronto para mais uma viagem.
O pessoal já tinha embarcado ao som de marchas militares. Os cumprimentos oficiais, da praxe, já tinham sido feitos. As escadas já tinham sido retiradas. O cordame também já tinha sido recolhido. E os dois rebocadores que o haviam de levar até ao meio do Tejo já estavam a postos.
No cais a multidão ainda era imensa. Os lenços acenavam das varandas da gare a corresponder aos lenços que das amuradas do barco também acenavam. Eram as despedidas.

Navio Uíge - Com a devida vénia a http://navios.no.sapo.pt/

A banda militar estava a acabar os seus acordes e o UÍGE lá se encaminhou para o melhor local do Tejo para iniciar mais uma viagem de 5 dias até às terras da Guiné. Depois foi o passar sobre a Ponte Salazar a caminho do Oceano e tudo isso pareceu muito rápido. Depois foram cinco dias de mar e céu, com mais ou menos acompanhamento dos chamados peixes voadores, a passagem relativamente perto das Canárias e a chegada ao largo de Bissau a 28 de Outubro.
A Ponte Salazar em 1966 - Com a devida vénia a http://www.skyscrapercity.com/

Foram só cinco dias, mas dias inesquecíveis. E como a maioria viajou nos porões, nessas grandes caves fechadas de onde só se via a luz do dia pela buraco por onde entrávamos, nem vale a pena dizer nada sobre essas “maravilhosas” acomodações.

Foi um bom princípio, sem dúvida, para o que nos estava guardado. Depois, bem depois, foram vinte e cinco meses e dez dias, passados todos naquela terra quente que, ao fim deste tempo todo, nunca mais consegue encontrar a paz a que tem direito e de que tanto precisa.

Carlos Pinheiro
23.10.2012

____________

Nota do editor

Último poste da série de 6 DE SETEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24624: Efemérides (407): Rescaldo da homenagem aos Antigos Combatentes da Guerra do Ultramar naturais da União das Freguesias de Felgueiras e Feirão, Concelho de Resende, levada a efeito no passado dia 2 de Setembro de 2023 (Fátima Soledade / Fátima Silva)

Guiné 61/74 – P24789: Coisas & loisas do nosso tempo de meninos e moços (14): A minha viagem para o Seminário (Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf)

Miradouro do Vale do Sabor

Foto: Câmara Municipal de Moncorvo, com a devida vénia


1. Em mensagem de 22 de Outubro de 2023, o nosso camarada Francisco Baptista (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616 / BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), enviou-nos mais um excelente texto, desta feita, a sua ida para o Seminário:

A minha viagem para o Seminário

Até aos doze anos, para oeste de Brunhoso, nunca passei além do rio Sabor, que banhava esses limites da minha aldeia, onde ia por vezes no Inverno a ajudar à apanha da azeitona da Barca, no Verão a apanhar a amêndoa do Picão ou a apanhar os figos, dumas figueiras que a minha mãe tinha herdado, na ribeira das Picotas.

Para norte na direcção do planalto mirandês ia muitas vezes às feiras quinzenais de Mogadouro, por um caminho de terra batida, eram só cinco quilómetros, tocava com a vara vacas e vitelos que o meu pai queria vender, nas feiras quinzenais, que se realizavam num descampado enorme, onde se juntavam muitos animais, os seus donos ou os filhos deles e os compradores e intermediários, o mais conhecido tinha por alcunha o "Chispas", homem falador e irrequieto, natural da vila.

Nunca fomos ricos mas nesses anos com os meus pais em princípio de vida comum, era difícil esticar a manta para tapar umas necessidades pois outras podiam ficar a descoberto.

Recordo-me da casa onde nasci, eu e os meus três primeiros irmãos, todos varões, terei vivido lá dois anos. Casa muito humilde só com duas divisões, uma sobrelevada onde estava a cozinha e a lareira, coberta de telha vã, sem chaminé, o fumo saía por uma abertura que podia ser tapada, no caso de muita chuva ou neve, com uma chapa de metal. Descendo cinco degraus de madeira era o quarto, único, bastante espaçoso e forrado a madeira. Esta casa, contígua à casa grande dos seus sogros, terá sido herdada pela minha avó paterna, de uma parenta pobre chamada Maria "Pequena", casada mas sem filhos.

Anos difíceis para os meus pais, com poucos bens para se governarem, somente algumas terras de cultivo de cereais, emprestados pelos pais deles, e uma pequena horta, os filhos nasceram ao ritmo de um por ano, o nosso pai de compleição atlética mas a ter que tratar-se de doenças quase incuráveis para a época, uma delas a tuberculose, da outra não falo.

Sem saber se pelas condições insalubres da casa, o vento, o frio e calor a que estávamos sujeitos, ou pela falta de assistência médica, morreram dois desses meninos, outros viriam e meninas também, já nascidos em casas maiores, mais arejadas e confortáveis.

Para além dos produtos da horta e da carne de um ou dois porcos que a nossa mãe criava com farelo, castanhas, batatas e hortaliças, de que se curavam os toucinhos e os presuntos, e se faziam muitos enchidos, criava também galinhas e perus que davam ovos, que eram bons cozidos, em omeleta, ou estrelados com algum açúcar no final eram um manjar para mim, davam também boa carne para ocasiões especiais e festas, e para as alheiras que só podiam levar carne de aves ou de vitela, de porco não, segundo a tradição judaica.

Poucos produtos alimentares se compravam para a dieta alimentar da família, para além de algum peixe que a vizinha, tia Clementina, vendia na época própria, que poderia ser sardinha ou chicharro dividido para dois ou três, conforme o tamanho, para dar mais sabor às batatas e às couves, aos tomates, às vagens, aos pimentos e a outras hortaliças que a horta produzia com abundância.

A década de sessenta do século passado, depois do restabelecimento dos povos e das nações após o cataclismo da Segunda Guerra Mundial, foi muito fértil em acontecimentos sociais, políticos e artísticos. Portugal,  um pequeno país, guardado de influências externas pelo Oceano Atlântico, a ocidente, e pela Espanha franquista, fascista e imperial a leste, protegia-se da liberdade, da cultura e do progresso, pela vontade férrea de Salazar, um velho ditador puritano e asceta, durante muitos anos educado num seminário e que não querendo ser bispo, tinha uma ambição maior, ser um rei absoluto de Portugal, como os reis da Idade Média que recebiam o poder de Deus, através do Papa que os legitimava. Sem poder ser rei, tinha sangue plebeu, Salazar enquanto governante comportou-se como um rei absoluto sem coroa, tal como o ditador Francisco Franco em Espanha.

Não havia progresso, para além da agricultura e pastorícia, pois ele crente ou já descrente estava a viver nos tempos bíblicos das suas leituras religiosas que tinha vivido também na paz e bucolismo da sua infância.

Os lavradores, refiro-me a todos os que sozinhos ou com a ajuda de familiares ou pagando a trabalhadores, tinham as mãos calejadas e as sujavam na terra, com mais conhecimentos e instrução, já quase todos tinham a quarta classe, dão-se conta que com tantos filhos nascidos depois da última grande guerra, que os poucos hectares de terra que possuem, cada vez mais dividida pelos filhos, em herança, após a morte deles, mal lhes dariam alimento que bastasse a todos.

Sem máquinas agrícolas ou meios técnicos que possam pagar e sem trabalhadores agrícolas, que no limite da pobreza, estavam em fuga para a Europa rica para lá dos Pirinéus, sem terem meios económicos para pagarem a educação dos filhos em colégios ou pagarem a sua hospedagem nas cidades ou vilas onde havia os estabelecimentos de ensino oficiais, mandam os filhos a estudar para os seminários, onde os custos são menores. Tenho pensado que nos finais da década de cinquenta, Salazar terá conversado com o seu amigo e colega do Seminário, o Cardeal Cerejeira, duas faces da mesma moeda, em conhecimentos e sagacidade, um e outro, quando os seus olhos vivos, perscrutavam a sociedade, Salazar com a ajuda da polícia secreta e dos informadores, começam a dar-se conta que a juventude se afasta da Mocidade Portuguesa, da Igreja e de outros convívios "saudáveis". Muitos estudantes universitários contestam a autoridade e o Estado Novo, influenciados por ideologias de esquerda.

Será especulação ou hipótese académica, ambos conservadores religiosos e políticos, terão concluído que para afastar a juventude das ameaças das ideologias de esquerda que a podem corroer como um cancro, o melhor será franquear as portas dos seminários para educar e formar jovens mais às suas imagens e semelhanças.

Nesses meus verdes anos, dei-me conta na realidade de que houve uma mobilização de párocos e de padres de ordens religiosas a querer entusiasmar os jovens nesse sentido, com o agrado das mães contentes por poderem vir a ter um filho padre e os pais a terem um filho a estudar com poucos gastos.

Se chegassem a padres teriam um futuro, digno, sagrado segundo mães, se não conseguissem esse objectivo, muito difícil, poucos o conseguiam, poderiam fazer alguns estudos por preços bastante económicos que lhes poderiam dar acesso a um emprego no Estado, num banco, nos seguros ou nalguma empresa, que os poderia libertar da dureza do trabalho da terra e poderiam aspirar a uma vida mais limpa e digna, com outro prestígio aos olhos dos seus concidadãos e com mais vantagens económicas.

Dos seminários saíram poucos padres mas muitos estudantes, alguns com os estudos liceais completos, outros a meio ou perto do fim, muitos deles nas décadas de 60 e 70, foram preencher as necessidades de quadros milicianos militares da guerra colonial, alferes, furriéis e até capitães, na sua maior parte o regime confiava que eles não tivessem sofrido influências das doutrinas de Marx, Lenine, Mao-Tse-Tung ou dos reformadores republicanos e socialistas.

Alguns tiraram cursos superiores, da minha aldeia, o padre Neto, falarei dele adiante, formou-se como padre nos anos quarenta, nos anos cinquenta o meu amigo Francisco Carvalho, depois de muitos anos de seminário saiu e doutorou-se em filosofia e nos anos oitenta saiu padre o meu parente José Cordeiro. Os três estiveram na congregação dos Salesianos tal como eu e outros mais.

Quando no primeiro trimestre de 1969, o Batalhão de Cadetes milicianos de Mafra, na foz do Lizandro, atroou os ares, nessa noite escura e trágica, com gritos de assassinos e vamos embora, pela morte de três camaradas por incúria e desleixo dos instrutores, responsabilizando o comandante que tinha ficado no quartel, quem deu as palavras de ordem foram os estudantes universitários do Porto, Coimbra e Lisboa. Conheci bem um dos mortos, era um ex-seminarista, educado, afável, humilde, dormia perto de mim na camarata, no corredor oposto ao meu, foi o meu primeiro camarada conhecido a morrer nessa maldita guerra, recordo-o ainda com mágoa.

Somente depois de fazer a quarta classe, para meu gosto e desgosto, obedecia, os meus pais mandavam, fiz uma grande viagem para o Seminário de Mogofores, na Beira Litoral, onde o meu irmão mais velho já tinha estado um ano, os outros mais novos teriam como primeira grande viagem destinos semelhantes. Eu gostava de ir estudar, ir para o seminário nem tanto, nunca gostei de rezar mas o dinheiro era pouco. Os seminários faziam preços económicos para alojamento e alimentação, poderia até ser grátis para os filhos dos mais pobres.

No meu caso, quem me procurou entusiasmar para ir para de Mogofores foi o padre Neto da congregação dos Salesianos, amigo da casa dos meus pais, como a família dele. O pai dele era um homem respeitável na comunidade, tal como a sua mãe. O pai era um barbeiro, de ar calmo e sabedor em fazer curativos e aconselhar pomadas e chás para outros problemas. A mãe era uma senhora delicada, muito religiosa, socialmente muito estimada.  Tiveram também uma filha freira, da mesma congregação religiosa.

Pela vida fora eu e o padre Neto, fomos sempre amigos, sendo eu adolescente e ele um homem já perto dos quarenta anos, sentia-me lisonjeado por ele me tratar, tu cá, tu lá, como um igual.

Em textos anteriores já enfatizei a beleza das minhas viagens pela linha do Sabor e do Douro. O vale do Douro português será provavelmente um dos vales mais belos do Mundo.

O vale do Sabor é belo, emociona-me, arrepia-me, é o meu vale de lençóis, de águas bravas, águas azuis, verdes, castanhas cinzentas, hoje com a construção da barragem, de águas calmas, de ladeiras cobertas de oliveiras, amendoeiras, de salgueirais, troviscais, reflectidas em grandes espelhos de água.

Esta é sobretudo uma viagem no tempo, a idade não me permitia muita independência de espírito, estava muito ligado à terra, para a adjetivar com palavras belas. Dos montes da minha terra, dos vales, rios e ribeiros, gostava sem o saber, como gostava dos meus pais e irmãos, sem que que lho confessasse. O rio Douro tinha maior caudal e maiores arribas do que o Sabor.

Mal recordo a cidade do Porto, terei mudado logo, na estação de S. Bento para linha do Norte em direcção a Mogofores. Na linha do Norte, espreitei o mar que com curiosidade, nunca o vira, ter-me-ei dado conta da transformação da paisagem, sem montes, tão plana, tão diferente da transmontana.

Ainda hoje estranho um pouco as paisagens planas, dá-me a impressão que mudei de país. A região de Aveiro pela planura e pela ria lembra-me sempre a Guiné.

A linha do Sabor, que seguindo o rio a alguma distância, não o mostrava, já não existe, foi abandonada como todas as outras linhas dos afluentes do Douro, por ordem de um governante iluminado do poder central de Lisboa, com poucos protestos da capital do Norte. Não há norte ou sul, em Portugal há interior e litoral, no litoral vivem os cidadãos e no interior alguns indígenas em fase de extinção.

Na minha viagem para o seminário de Mogofores, terei ido só ou acompanhado, já não me lembro, sei que levava uma grande mala de cartão, não havia outras, com roupa marcada pela minha mãe, com as minhas iniciais, lençóis e toalhas também. Levava roupa para um ano, as distâncias eram grandes, os comboios lentos, não haveria férias de Natal ou da Páscoa.

Sendo um filho obediente, com um espírito rebelde, aceitava a necessidade de ir para o seminário, atendendo às dificuldades económicas da família que crescera, já éramos sete irmãos. A vida na agricultura nesse tempo era dura, além disso eu gostaria de aumentar os meus conhecimentos.

A minha predisposição à partida seria idêntica à dos meus conterrâneos, novos ou velhos, quando partiam para o Brasil e dos outros que saltaram fronteiras em direcção à França, a necessidade de melhor futuro fazia-nos partir a todos.

Não gostei da vida do seminário, muita igreja, logo pela manhã depois de levantar, muitas rezas, muitas filas por longos corredores húmidos, frio, fazia-me falta uma lareira, padres muito religiosos mas com pouca alma. Por vezes falava com o cozinheiro para matar saudades, era da minha aldeia, surdo, tinha aprendido a escrever, a falar e a arte da cozinha, numa casa de apoio para rapazes com dificuldades, no Colégio dos Órfãos no Porto dirigido por essa congregação.

Perto do Natal terei cometido uma barbaridade, um erro grave, um grande pecado que não consigo lembrar, por esse motivo fui chamado ao Prefeito, o padre que administrava a justiça com severidade, por quem fui punido com a dureza que se impunha, fortes reguadas. No final do castigo, furioso lancei o meu grito de revolta e disse a esse padre vermelhusco, mirandês de Ifanes, que ele não era meu pai e que portanto não tinha direito de me maltratar assim.

No dia seguinte fui falar com o Director, um padre naturalmente, a dizer que queria regressar a casa. Não me deixaram, obrigaram-me a passar o ano nesse "quartel", frio e húmido, o pior que conheci na minha vida.

Não gostei de Mafra, o tenente de instrução do meu pelotão era um sádico, que nos meses frios e húmidos do Inverno, nos tratava como animais, para meu desgosto era natural do Nordeste Transmontano.

O frio húmido do litoral entrava-me dentro pela carne e pelos ossos, o frio dos meus montes era mais agreste mas mais seco, era um ar frio que me afagava, ainda hoje é assim.

Nesse tempo os seminários condicionavam mais a personalidade dos jovens adolescentes do que a vida militar, pela disciplina excessiva, pelas práticas e o ensino religioso, tão obsoletos. Para os seminários iam jovens pré-adolescentes mais fáceis de moldar, para a tropa iam jovens já adultos, quase homens feitos.

No século passado, os seminaristas eram reconhecíveis por terem um semblante demasiado sério, quase triste, como se os anos de recolhimento e clausura lhes tivessem roubado, a alegria, a imaginação e os sonhos. A Igreja é uma instituição hierárquica, tal como a tropa que foi copiar a organização à Igreja. Em ambas se cultiva o poder e a ostentação para dominar e impressionar os simples cidadãos, há bispos, arcebispos, padres, generais, coronéis, capitães, todos muito vaidosos e vistosos, Deus, um velho já cansado a todos absolve.

Salazar esteve quarenta anos no poder, pela sua graça, de alguns polícias demoníacos e com a ajuda da Igreja e das Forças Armadas.

____________

Notas do editor

Último poste da Francisco Baptista de 6 DE JUNHO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24374: (In)citações (246): O regresso dos Soldados (Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf)

Último poste da série de 24 DE OUTUBRO DE 2023 > Guiné 61/74 – P24787: Coisas & loisas do nosso tempo de meninos e moços (13): 50 ofícios e profissões de antigamente, extintos ou em vias de extinção (Luís Graça, Lourinhã)

Guiné 61/74 - P24788: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (27): Em louvor do filme "Fogo no Lodo", de Catarina Laranjeira e Daniel Barroca, passado na tabanca de Unal, no antigo corredor de Guileje... Infelizmente a sessão de amanhã, no Doclisboa, na Culturgest, está esgotada


Guiné > Região de Tombali > Carta de Guileje (1956) (Escala 1/50 mil) > Posição relativa de Unal, a nordeste de Guileje, no corredor de Guileje... Outros topónimos: Salancaur, Nhacobá, Bricama, Lenguel, Samba Só e Cumbijã e Colibuía... No final da guerra, estava em construção a estrada Aldeia Formosa (Quebo) - Nhacobá.

Inforgrafia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné 2023)


1. Mensagem de hoje, às 10:07, do 
Patrício Ribeiro (nosso correspondente em Bissau, colaborador permanente da Tabanca Grande para as questões do ambiente, economia e geografia da Guiné-Bissau, onde vive desde 1984, e onde é empresário, fundador e diretor té
cnico da Impar Lda; tem mais de 130 referências no blogue; autor da série, entre outras, "Bom dia desde Bssau") (U*)

Luís,

V
ale a pena ver o filme, "Fogo no Lodo", da Catarina Laranjeira e Daniel Barroca(**), não é o que pensam, é sim um belo documentário sobre a vida real numa tabanca balanta.

A Catarina andou pela Guiné muitos anos, no mato, a fazer recolhas e a falar com antigos combatentes do PAIGC, para as suas teses.

Não é um trabalho fácil, percorrer as picadas em mota alugada, por vezes chegar a minha casa em Bissorã, cheia de sangue das quedas que dava no caminho, na zona de Oio, e eu e o meu filho tínhamos que fazer de enfermeiros.

Como ela, há muitas outras a fazer as suas investigações nestas condições, os rapazes agora não querem este sacrifícios.

Como eu lhes digo... No meu tempo, mandavam os rapazes com a nossa idade, para os matos da Guiné, com uma arma às costas; agora vêm as meninas com um computador debaixo do braço ...

Outros tempos...
Abraço
Patricio Ribeiro


2. Comentário do editor LG:

Patrício, infelizmente a sessão de amanhã está esgotada, segundo informação da realizadora Catarina Laranjeira. A lotação do Pequeno Auditório da Gulturgest é apenas dc 145 lugares.  Estaremos atentos ao anúncio de próximas apresentações. 

Boa sorte para o filme na Competição Portuguesa, nesta edição do Doclisboa - 21º Festival Internacional dc Cinema onde concorrem 9 filmes (portugueses), 7 em estreia mundial, como é o caso do "Fogo no Lodo".
____________

Guiné 61/74 – P24787: Coisas & loisas do nosso tempo de meninos e moços (13): 50 ofícios e profissões de antigamente, extintos ou em vias de extinção (Luís Graça, Lourinhã)


O "Pitrolino". Foto e legenda: Cortesia do Museu da Lourinhã


(...) "A função do Petrolino, designado como “e;pitrólino”e; devido à pronúncia local, era percorrer as aldeias do concelho nas “voltas”, constituídas pelo alvará, carroça, macho, reservatórios, líquidos e produtos em armazém. Vendia azeite e petróleo assim como sabão e aguardente. O petroleo era originário da BP-Britum Petroleo e da Vacuumm, que pertencia ao Sr. José Maria de Carvalho, e o azeite era proveniente de Castelo Branco.

"Esta actividade foi transmitida pelo Sr. Veríssimo, de Poiares – Coimbra, ao Sr. José António Mateus que doou, juntamente com o filho, a totalidade da exposição presente no museu." (...)




O "amolador". Foto e legenda: Cortesia do Museu da Lourinhá

(...) As peças em exposição foram pertences do Sr. Garcia, conhecido como “Espanhol” e doadas por este ao Museu da Lourinhã. O Sr. Garcia, galego e natural da zona de Orense, veio para Portugal fugido da Guerra Civil Espanhola, assim como muitos dos seus conterrâneos, procurando melhor vida. 

Estes exerciam, na generalidade, dois tipos de profissão: Amoladores, na qual eram mestres, arranjando chapéus de chuva, amolando facas e tesouras, actividade que lhes deu o nome, colocando “gatos” (espécie de agrafos) em loiça partida, etc.; e Taberneiros, comprando carvoarias, transformando-as mais tarde em tabernas e depois em restaurantes.

O Sr. Garcia foi disso um exemplo típico. Fixou-se na Lourinhã em 1955 executando sempre a actividade de amolador e adquirindo mais tarde uma taberna, na antiga praça, que era conhecida como “Taberna do Espanhol”.

Da exposição sobressai a roda do amolador, roda essa que o Sr. Garcia doou para o Museu e vinha amolar facas e tesouras na presença dos visitantes, como na foto. (..)



1. Camaradas, que aqui têm escrito, na série "Coisas & Loisas do Nosso Tempo de Meninos e Moços" (*)... 

Já aqui falámos de alguns ofícios e profissões que desapareceram na voragem do tempo ou estão em vias de extinção, mas de que guardamos memórias; ceifeiras, mondadeiras, almocreves. ferradores, nomeadamente no sul do país, na terra do Zé Saúde, Aldeia Nova de São Bento, Serpa. 

Mas havia também usos e costumes que se perderam ou estão a perder, como a vindima (manual), a pisa (das uvas), as desfolhadas do milho, a matança do porco,  as feiras, as nossas primeiras viagens de comboio ou de camioneta até à "cidade grande", etc.

Lembremos aqui (porque também fazem parte da nossa identidade, da nossa infància, das nossas memórias..)  outros ofícios e profissões que desapareceram, no campo e na cidade, com as mudanças operadas pelo desenvolvimento da econonia de mercado, a motorização dos transportes, a mecanização e automitazação do trabalho, a urbanização, o consumo de massa, etc.:

Deixem-me acrescentar mais alguns ofícios e profissões que desapareceram com a industrialização e o êxodo da população rural para as cidades e para o estrangeiro... E dentro das próprias cidades, com a "modernização" (caso do aguadeiro e do limpa-chaminés, por exemplo).

(i) leiteiro e/ou queijeiro que vendia porta a porta (queijos de cabra e ovelha)

(ii) aguadeiro (nas vilas e cidades, antes do saneamento básico) (em Lisboa eram galegosó,  depois dos negros e antes dos escravos)

(iii) cocheiro  (condutor de carroças, charretes, carruagens); falando dele, temos que falar do segeiro, o construtor de veículos de tracção animal, ambos vítimas do automóvel; nas casa ricas o cocheiro passou a "chaufeur" ou chofer...

(iv) correeiro (faz arreios,  albardas para os cavalos, machos e burros) 

(v) sapateiro / sapateiro-remendão (fazendo calçado novo ou só consertos)

(vi) latoeiro / funileiro (no Norte, diz-se caldeireiro; no Norte; trabalha o cobre, a folha de Flandres, faz alambiques, caldeiras, artigos de latoaria...)

(vii) limpa-chaminés;

(viii) borreiro / sarreiro  (limpava comprava as as borras e o sarro dos depósitos do vinho. nomeadamente na regiáo do Oeste e Ribatejo);

(ix) tanoeiro (nas regiões vinicolas)

(x) amola-tesouras / amolador ( oficío muito ligado aos galegos);

(xi) parteira/aparadeira (quando os partos eram em casa, até tarde, ao final dos anos 60)

(xii) barbeiro-sangrador (profissão oficialmente extinta, com a proibição da flebotomia ou sangria m 1875!);

(xiii) boticário (fábricava medicamentos "caseiros" ou segundo formulários  codificados, a pedido do médico,  antes do desenvolvimento da indústria farmacêutica)

(xiv) alfaiate (o pronto-a-vestir matou o alfaiate, que agora só existe na alta costura)

(xv) chapeleiro

(xvi) taberneiro

(xvii) carvoeiro (vendedor de carvão)

(xviii) oleiro

(xix) lavadeira (no rio ou lavouro público ) e engomadeira  (que passava a ferro com ferro aquecido a carvão, hoje "ferro elétrico")

(xx) caiador (no sul, pintavam-se as casas com cal)

(xxi) varina / vendedora de peixe (que se fazia notar pelos seus pregóes e a canastra à cabeça)

(xxii) saltimbanco (ambulante), animando as ruas e praças de vilas e aldeias)

(xxiii) vendedor de água fresca e capilé (nomeadamente nas cidades, no verão) (ver aqui foto do grande fotógrafo portuguès Joshua Benoliel, de 1918)

(xxiv) quinquilheiro (feirante, em geral, que vendia quinquilharia, bugigangas, miudezas...)

(xxv) capelista (vendedor, em loja de quinquilharias ou materiais usados na costura e enfeites de vestuário, como fitas, linhas ou botões, etc.)

(xxvi) vendedor de banha da cobra nas feiras

(xxvii) outros vendedores ambulantes ou em feiras (muitas vezes sazonais, adaptaram-se aos tempos modernos: o assador e vendedor de castanhas, por exemplo; ou o vendedor de gelados e bolas de berlim, nas praias)

(xxviii) ardina (vendia jornais, não confundir com jornaleiro, trabalhador agrícola pago à jorna, como o cavador de enxada)

(xxix) modista / costureira / alfaiate (na realidade eram ofícios distintos, o ultimo era exercido por homens, fazia fatos para homens);

(xxx) bordadeira

(xxxi) ajuntadeira (costureira de botas, sapatos, artigos de pele)

(xxxii) moleiro (no sul, há moinhos de vento;no norte, engenhos movidos a água; engenhos de linho, engenhos de farinha)

(xxxiii) fotógrafo "à lá minuta" (tiraram-nos os primeiros retratos quando éramos miúdos)

(xxxiv) telefonista dos correios

(xxxv) boletineiro (entregava os telegramas)

(xxxvi) engraxador de sapatos (na cidade)

(xxxvii) calceteiro (trabalha no empedramento de estradas, ruas, passeios, etc.).

(xxxviii) canteiro (edreiro ou artífice que trabalha a pedra de cantaria)

(xxxix) matador de porcos, castrador, açougeiro e equivalentes

(xl) pastor / guardador de rebanhos ( adueiro (pastor de porcos)

(xli) regente escolar (do tempo em que não havia em número suficiente professores/professoras diplomadas pelas Escolas do Magistério Primário)

(xlii) regedor (antiga autoridade administrativa de uma freguesia civil; função extinta com o advento do 25 de abril de 1974; era uma #"figura camiliana")


(xliii) sacristão (que ajudava à missa e tocava o sino)

(xliv) carpideira (Mulher ou grupo de mulheres a quem se pagava para chorar ou prantear nos velóriso e enterros, nas aldeias)
(xlv) alcoviteira / casamenteira (arranja ou arranjava casamentos; não confundir com proxeneta)

(xlvi) mineiro (de pá e pica)

(xlvii) alambiqueiro (trabalha na destilação por alambique)

(xlviii) carcereiro (agora "guarda prisional")

(xlix) dactilógrafa/o

(l) vedor (pesquisador de nascentes de água, munido de uma varinha)...


2. A lista não é exaustiva e algumas destes ofícios e profissões, nomeadamente manuais,  podem ser recordados, por exemplo, no Museu da Lourinha, na secção de Etnografia

E em todas as terras da província as alcunhas estavam muitas vezes relacionadas com as profissões (Luís Sapateiro, Jorge Funileiro, o Capelista, Ambrósio Correeiro, o Pitrolino ) ou a naturalidade (Zé Penicheiro, a Bimba, o Espanhol).
__________

Nota do editor

segunda-feira, 23 de outubro de 2023

Guiné 61/74 - P24786: Agenda cultural (843): Doclisboa - 21º Festival Internacional de Cinema: 25 de outubro, 4ª feira, às 10h30, na Culturgest, Pequeno Auditório, projeção do documentário português (119'), "Fogo no Lodo", filmado na aldeia de Unal, a sul de Buba, seguida de debate com os realizadores, Catarina Laranjeiro e Daniel Barroca


Fotograma do filme "Fogo no Lodo", 
de Catarina Laranjeiro e Daniel Barroca (119 minutos)



 

21º Doclisboa | Competição Portuguesa | Fogo no Lodo | Catarina Laranjeiro, Daniel Barroca | 119'

Trailer do filme | 1' 27'' (Cortesia de Doclisboa > You Tube


1. A sugestão chega-nos por mail de hoje do Patrício Ribeiro, âs 10h05:

Recomendo verem no cinema, Culturgest, dia 25, realizado pela Catarina Laranjeiro e Daniel Barroca, o documentário "Fogo no Lodo", feito no sul da Guiné, sobre a tabanca de Unal, a sul de Buba; sobre a realidade atual da tabanca, o que passaram na guerra colonial, e a cultura do arroz de bolanha.

Ontem tive oportunidade de o ver no cinema S. Jorge, em Lisboa.

Abraço, Patrício Robeiro.


2. Sobre o evento, reproduzimos aqui o destaque lhe é dado na página oficial do IHC - Instituto de História Contemporànea, da FCSH/NOVA (Faculdade de Cièncias Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa):


Out 14, 2023 : Destaque, notícias > Catarina Laranjeiro 

Fogo no Lodo, realizado por Catarina Laranjeiro e Daniel Barroca vai estrear no Doclisboa — 21º Festival Internacional de Cinema, no dia 22 de Outubro, no Cinema São Jorge, estando a concurso na Competição Portuguesa.

O documentário retrata a localidade guineense de Unal, uma aldeia de cultivadores de arroz, cuja população desempenhou um papel crucial na luta de libertação contra o colonialismo português, na Guiné-Bissau, os primeiros a envolver-se na luta armada, mobilizando espíritos ancestrais, os Irãs. 

Ainda hoje, cada gesto do ciclo do arroz é assombrado pela memória da guerra, trauma também inscrito nos seus rituais, corpos, paisagem e música. Fogo no Lodo é, assim, uma abordagem envolvente a uma complexa dinâmica onde formas religiosas e turbulências políticas se cruzam e fundem, para reivindicar o futuro desta comunidade na Guiné-Bissau contemporânea.

Os realizadores, em nota de imprensa, contam que “a experiência histórica da aldeia de Unal no decorrer da guerra de libertação contra o colonialismo português na Guiné-Bissau foi o que nos levou a realizar o documentário”. 

O “interesse comum sobre a complexa experiência humana da guerra através do cinema, naquela geografia específica do sul da Guiné-Bissau” foi o que juntou Catarina e Daniel, neste projecto conjunto. 

“O filme tornou-se um projeto mais amplo sobre a memória da guerra de libertação, a atual tensão entre a comunidade e o estado, a complexa diversidade religiosa, e o trabalho nos arrozais que é um dos pilares económicos da comunidade.”

Além da sessão de estreia, na manhã do dia 25 de Outubro haverá uma outra projecção do documentário, desta feita na Culturgest, à qual se seguirá a sessão inaugural do ciclo 2023-2024 da Oficina de História e Imagem do IHC, onde o público terá a oportunidade de conversar com Catarina Laranjeiro e Daniel Barroca sobre o processo de realização deste projecto que também foi de investigação.

O filme foi produzido por Rui Ribeiro, Elsa Sertório e Ansgar Schaefer (Kintop), com produção executiva de Catarina Laranjeiro e financiamento do ICA – Instituto do Cinema e do Audiovisual (Ministério da Cultura).
___________

Nota do editor:

Último poste da série > 19 de outubro de 2023 > Guiné 61/74 - P24772: Agenda cultural (842): Pré-apresentação do novo livro do nosso camarada José Teixeira, "O Universo Que Habita Em Nós", prefaciado pelo Prof. Júlio Machado Vaz