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terça-feira, 4 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6309: Controvérsias (72): Uma Página Negra (José Manuel Matos Dinis)


1. O nosso Camarada José Manuel Matos Dinis* (ex-Fur Mil At Inf da CCAÇ 2679,  Bajocunda, 1970/71), enviou-nos a seguinte mensagem, complementando a informação prestada no poste P 6261, da autoria do Mário Pinto:

Uma Página Negra

A propósito de um poste subscrito pelo Camarada Mário Pinto, que perguntava onde tinha andado a maioria dos capitães do QP durante os anos da guerra, [circulou internamenet, por mail, na nossa Tabanca Grande] um  carta e um estudo subscritos pelo Sr. Coronel António Carlos Morais da Silva que pretende contrariar aquela interrogativa.

Em seguida (durante o dia 28/Abril) recebi uma mensagem do Jorge Teixeira (Portojo), que referia ter sido eliminado do blogue o poste referido. Face à surpreendente notícia, contactei o Mário Pinto, que me referiu ter condescendido com a retirada do poste a pedido dos editores, porque estaria a dar granel. Mau!!??

Ainda agora se comemorou o 25 de Abril, cuja melhor herança foi e é a liberdade.

Por outro lado, é divisa do blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné, não deixarmos que sejam os outros a contar a história da guerra por nós, o que implica a abordagem de qualquer assunto implícito, sem tabus de qualquer ordem, como decorre de reiteradas intervenções do nosso Comandante. Apenas se exige respeito pelas regras editoriais.

Do que me lembro, o texto continha uma interpretação enviesada, mas apresentava-se educado e respeitoso. Aliás, alertado para o equívoco, o Mário prontamente esclareceu o erro e, humildemente, pediu desculpa.

Às vezes o preconceito tolhe a capacidade de pensar e aclarar ideias sobre factos e acontecimentos. E neste caso demos uma flagrante prova de incapacidade para resolver um assunto interno, que nem sequer alterava o sentido do poste, nem punha em causa a linha do Blogue, pois abriu-se a porta à auto-censura.

Havia que analisar a carta e o estudo que vieram baralhar a situação.

Optei por apreciar, primeiro a carta e, depois, o estudo contestatário de uma tese de doutoramento que, também ela aborda a matéria, e coteja a evolução relativa dos números de capitães do QP e milicianos no comando de companhias operacionais, ou de combate.

Diz o senhor Coronel (que não integra a família do Blogue) ter contestado junto do Reitor e do júri da U. de Évora - que fez a apreciação da tese "As elites militares em Portugal de 1900 a 1975", da autoria de Manuel Rebocho, Sargento-Mor Pára-Quedista, entretanto licenciado e doutorado em Sociologia - com base nas seguintes afirmações em diferentes trechos da tese, que podem ser verificados pela divulgação que a carta teve entre nós:

1 - "Na medida em que os capitães de carreira pretenderam seguir outras funções que não as de combate...";

2 - "A clivagem deu-se pela formação diferencial...";

3 - "Estes oficiais com dois anos de formação e sem vocação/motivação aferida, tiveram menor formação do que os oficiais que ingressaram na E.E. entre 1938 e 1958...";

4 - "Também se provou que a partir de 1966 os capitães de carreira se foram afastando do comando destas companhias, retirando-se para locais longe da Guerra e para actividades ditas de retaguarda...";

5 - "Os oficiais dos anos 60 fugiram da Guerra... a Academia Militar falhou na selecção e na formação psicológica das futuras elites militares...";

6 - "O Exército cometeu mais um erro ao colocar nas funções de Estado-Maior, oficiais sem capacidade de adaptação e sem experiência, quer da tropa, quer da guerra, pois nunca lá tinham estado, ou pretendiam vir a estar...";

7 - "a fuga dos oficiais combatentes para os Serviços de Apoio constituiu o maior entrave, não só à eficiência, mas também à formação do espírito militar que se ordena e inspira em valores básicos de humanidade...".

Em conclusão da carta ainda de lê:

- É iniludível o enxovalho do QP do Exército praticado em acto público.

- Contrariamente ao que a Universidade de Évora aceitou, sem questionar, os números apurados permitem concluir que os Capitães do QP não fugiram à guerra.

- Cumpriram o dever assumido no juramento de Bandeira que fizeram, voluntariamente.

- Cuidaram da Pátria e não da Fazenda.

A carta, ao contrário do que inspirava, não apresenta argumentos contrários que demonstrem a invalidade dos 7 pontos da tese referenciados. Acaba com as quatro frases lapidares transcritas.

A demonstração do contrário ao explanado na tese, parecia estar consignado no estudo que o Sr. Coronel anexou, e devia refutar expressamente o conteúdo da tese. Fui ver.

Verifiquei que relativamente aos três TO, Guiné, Angola e Moçambique, durante o período de 12/8/1959 a 01/11/1975, segundo o estudo, foram mobilizados 2368 capitães para 1876 companhias de combate (pg.17), sendo que 57,8% foram do QP.

Mas, adiante, com gráficos evolutivos, (pg.22), conclui alguns aspectos relevantes;

1 - De 1965 a 1868 o efectivo de Capitães do QP tem uma quebra de 30 pontos percentuais estabilizando na vizinhança de 57% até 1971;

2 - Nos anos de 1972 e 1973 registam-se quebras de efectivos do QP na ordem dos 15%;

3 - O ano de 1972marca o inicio da queda acentuada do efectivo de capitães do QP, o número de capitães milicianos passa definitivamente a ser superior ao de capitães do QP por razões que adiante são expostas;

Prosseguindo, talvez no âmbito das "razões expostas", refere-se: "Não encontrei justificação para a disparidade entre Moçambique onde 82% das companhias tiveram comando único e a Guiné onde tal valor se situou nuns modestos 65%"- pg.23.

A página 27 refere-se "em 1971 e 1972 não há novos capitães para render os que embarcaram em 1969 e 1970 tendo inicio a intensificação do recurso a capitães milicianos".

E, por fim, na pág. 28 referem-se outros aspectos relevantes:

1 - De 1963 a 1971 pelo menos um terço do stock de capitães QP (Inf, Art, Cav) comandou companhias de combate";

2 - A partir de 1973 tal esforço deixou de ser possível pelas razões já carreadas;

Deste estudo, na parte escalpelizada, pode inferir-se:

1 - Desde o inicio da guerra na Guiné houve recurso a capitães milicianos;

2 - No período de 1963 a 1971, cerca de 70% das companhias de combate foram comandadas por capitães milicianos;

3 - A partir de 1972 essas percentagens afastaram-se, por força do aumento do número de capitães milicianos, por razões, afinal, não explicadas, porque se os capitães antes formados não tinham abandonado o QP, alguma razão pertinente aconteceu para que não voltassem a comandar companhias em campanha, tirando partido da experiência anterior.

Porque o número de capitães não baixou drasticamente, eles terão sido colocados em repartições e serviços de retaguarda;

4 - Nesse caso, com que resultados para a condução da guerra? Sobretudo na Guiné;

5 - A carta do Sr. Coronel, em contestação da tese antes referida, afinal, vem ao encontro das conclusões ali explanadas - na tese, não podendo por isso oferecer-lhe oposição de argumentos. Vide a coincidência de conclusões;

6 - Decorrente do anterior, o poste subscrito pelo Mário Pinto assenta em constatações que, no essencial, tanto a tese de doutoramento, como o estudo do Sr. Coronel, confirmam.

Voltando à carta do Sr. Coronel, refere no final, que foi "iniludível o enxovalho do QP do Exército praticado em acto público", e "que os capitães cumpriram o dever assumido no juramento de Bandeira".

Mais uma vez, sublinho, não se pode tomar a nuvem por Juno, e todos temos notícia de algum capitão merecedor da admiração daqueles que comandou, e dos que disso tiveram conhecimento.

Em lugar de ter utilizado o termo enxovalho, a leitura do estudo que o Sr. Coronel concluiu e divulga, conduz à ilação do grande erro de estratégia por não ter sido aproveitada a experiência dos capitães em segundas comissões para comandar companhias de combate, ou, na ausência de outras explicações, ter-se-á que concluir pela aceitação tácita no preenchimento de serviços na retaguarda.

Mas, neste caso, levanta-se a questão de saber que efeitos positivos advieram para a condução da guerra. E, se aí, na retaguarda, a esmagadora maioria dos capitães do QP cumpriu o seu dever, não foi eficientemente, porque as companhias de combate sempre evidenciaram terríveis necessidades.

Um abraço,

José Dinis

Fur Mil At Inf da CCAÇ 2679
____________

Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

2 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6297: Controvérsias (71): Contemos as nossas experiências e deixemos as especulações para quem não esteve lá (Carlos Vinhal)

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5871: Da Suécia com saudade (22): As portas que Abril me abriu e as que me fechou (José Belo)

União Europeia > Reino da Suécia > 2009 > O José Belo é o mais setentrional (e, portanto, ex-cêntrico) dos membros da nossa Tabanca Grande > A sua tabanca fica na Lapónia, a 198 quilómetros a noroeste de Kíruna, em plena reserva natural de Abisko, a maior do país dos Vikings. Nascido em Lisboa, foi educado no Estoril. Foi alferes na região de Quínara, na Guiné (1968/70). Foi Capitão de Abril. E por Abril conheceu os caminhos da diáspora. É gerente da Tabanca da Lapónia. Escreve regularmente no nosso blogue. (LG)


1. Mensagem de José Belo, com data de 8 do corrente (*):

Aqui vão algumas tentativas de resposta a algumas das perguntas levantadas (**).

Quando alguns Camaradas Militares decidiram "reeducar-me" na Prisão de Custóias, mais para meu bem pessoal do que por outra razão juridicamente válida, (pois não foi provada qualquer implicação no 25 de Novembro de 75 em Conselho Superior de Disciplina do Exército a que fui sujeito cinco anos depois)... era de esquerda!

Era inconveniente! Chegou! A minha carreira militar foi interrompida desde o dia 27 de Novembro de 75 até fins de 1980 em que me mantiveram inactivo cerca de cinco anos com o ordenado completo(!).
Durante este longo período de involuntárias férias pagas (segunda fase reeducativa?), colaborei activamente no Conselho Português para a Paz e Cooperação, viajando por tudo o que mundo era, desde a Índia à Etiópia, do Vietname ao Iémem, e a tudo que era Pais Europeu do Leste e Ocidente. Tive oportunidade de conhecer pessoas, bem interessantes, em locais de "acesso difícil" noutras situações.

Acabei por estabelecer contactos vários na Suécia que se tornou, então, a minha segunda casa. Em fins de 1980 fui chamado de novo ao serviço, sendo colocado no Regimento de Mafra a frequentar um curso de actualização para promoção. (Talvez por já devidamente reeducado?).
Depois de curtas semanas de contactos fraternos com os meus queridos e respeitados superiores, verifiquei ter grandes dificuldades em assimilar algumas das aulas dadas, principalmente por alguns dos camaradas professores regressados há pouco de cursos intensivos nos Estados Unidos.

Recordo como exemplo típico destas minhas limitações atávicas, a dificuldade sentida quando me referenciavam continuamente a fronteira de defesa a Norte do meu querido Portugal como situada no rio Reno, na Alemanha Ocidental, e eu só encontrava na minha carta... o rio Minho como fronteira do Norte português!

Perante tais incapacidades geográficas resolvi pedir passagem imediata à Reserva e autorização para me ausentar... definitivamente para a Suécia, invocando razões de ordem particular. Ambos os requerimentos foram deferidos em tempo que, conhecendo a Instituição, creio que será recorde, de 48 horas! Voltei de imediato para a Suécia onde me tenho mantido até hoje.
Interessado por Direito Internacional, acabei por ter uma sólida e acelerada carreira profissional que me levou bem mais longe do que seria de esperar (aqui seria melhor não referenciar o facto de ter casado com a filha única do dono da empresa multinacional onde trabalhava !).

A decisão de viver actualmente na Lapónia (a 198 quilómetros a noroeste de Kíruna mais propriamente) tem mais a ver com o facto de termos herdado uma muito boa casa de férias, situada precisamente na área da maior reserva natural sueca, e uma das mais selvagens, bonitas, isoladas, ricas em fauna e pesca. Chama-se Abisko.

Isto em conjunto com uma discreta aproximação de reforma, tanto da minha parte como da minha mulher, que nos veio possibilitar tempos livres para utilizar estes espaços infindos. Daí que, ao contrário do que poderia aparentar, este isolamento é mais que voluntário.

Como não fui, propriamente, um menino de sacristia durante os anos anteriores a Abril de 74 e até finais dos anos setenta, sinto-me muito bem nas distâncias que resolvi tomar em relação a acontecimentos, e coisas, em que participei, ou de que tenho muito bom conhecimento, e que hoje só me fariam vomitar a gargalhar, não fora o grande respeito que sinto por alguns que tudo sacrificaram pelos seus ideais de solidariedade com os mais desfavorecidos.

Na Guiné fui mais um dos muitos que comandaram destacamentos isolados no Sul, junto a Gandembel, que fizeram colunas de abastecimentos de Buba/Aldeia Formosa/Gandembel, e que aprenderam a conhecer-se a si próprios em condições extremas.

Hoje... para Lusitano de Lisboa, educado no Estoril, posso garantir que sou um bom conhecedor de renas, e de tudo relacionado com a criação e pastoreio das mesmas. Quem me diria!

Um grande abraço do José Belo.

2. Mensagem posterior, respondendo às dúvidas sobre o carácter eventualmente (in)publicável do texto anterior:

Caro Amigo e Camarada.

É claro que tudo sobre mim é acessivel a todos os que se possam interessar, tendo sincera consciência de que não serão lá muitos! Os detalhes, menos convenientes para Senhoras, menores, alguns Exmos. Srs. reformados, e camaradas mais sensíveis das nossas Tropas Especiais, estão, por certo, criteriosa e inteligentemente arquivados nas repartições respectivas... a Bem da Nação.

Duas coisas que não referi no meu E-Mail anterior, mas que suscitaram curiosidades de alguns quando agora aí estive na reunião da Tabanca do Centro: a primeira é o porquê de aparecer sempre ao lado do Otelo, em muitas das fotos, livros e reportagens de TV relacionadas com esta personagem... Somos familiares (primos em segundo grau pelo lado da minha mãe), tendo esse facto nos aproximado pessoalmente tanto em 74 como em 75.

Aquando da campanha eleitoral para a Presidência da República, a primeira a seguir a Novembro de 75, fui responsável pela segurança montada em redor do Sr. candidato Otelo, tendo-o acompanhado por tudo o que era Portugal, do Minho ao Algarve, Madeira e Açores... Daí a identificação efectuada por muitos.

Tornei-me depois, já a viver na Suécia, muito crítico das vias escolhidas por alguns companheiros que levaram a um muito infeliz arrastamento(?) deste político para aparentes meios de acção de resultados mais que dúbios, para não lhes chamar de contraproducentes, principalmente na identificação e utilização do nome, e referências, a Abril.

Publiquei, então, alguns artigos menos convenientes (pois creio ter sido o único que se atreveu), a este respeito, no Diário de Lisboa. Um, em 11/7/84, intitulado "As armas e as Mãos: Carta ao Otelo Amigo" (aquando da prisão deste), e outro em Outubro de 1984 intitulado "As FP-25 de Abril... e as miragens". Sei que não foram muito bem recebidos em alguns círculos mais... extremados.

A segunda pergunta que alguns me fizeram foi:
- Porquê Capitão Reformado quando todos os outros nas mesmas condições e situação pertencem hoje à Classe dos Srs. Coronéis Reformados, depois de as suas carreiras militares terem sido reexaminadas devido a consequências políticas de 74/75, com actualizações de postos e reformas (E isto inclui Militares do antes e depois, desde a mais extrema esquerdalhada à mais "patriótica" direitada!).

Pela única razão de, tendo escolhido viver em esplêndido isolamento na Escandinávia, não recebi qualquer informação da existência de tais leis e decretos. Quando finalmente, um bom amigo e camarada militar, se preocupou comigo e me informou, já os prazos legais para tais requerimentos tinham há muito encerrado, tendo recebido por parte das Autoridades burocráticas responsáveis um rotundo... NIET!

De qualquer modo identifico-me totalmente com os termos Capitão de Abril. E, como as PORTAS QUE ABRIL ABRIU... o foram por Capitães... sinto-me bem na denominação!

Um grande abraço do José Belo.

3. De adenda em adenda até à mensagem final, o Zé Belo escreveu ainda no passado dia 8:

Caríssimo Amigo. Podes publicar tudo, ou o que achares por bem. Tenho grande admiração pelo Vosso trabalho... No arame... e sem rede, no que diz respeito a sortear de maneira conveniente o que serve melhor os objectivos do blogue.

Com tantas primas donas de terceira idade (com tudo o que isso acarreta) a enviarem contributos, encontrar um rumo médio é trabalho de... full-time num blogue com as dimensões da Tabanca Grande. Tenho estado ocupado nas últimas horas a enviar uns videos do YOU TUBE, um pouco quentes, para o Amigo Vasco da Gama e para o Miguel Pessoa, que têm francamente sentido de humor.

Na tua próxima visita à Escandinávia, e como por aqui andaste, sabes que a natureza é fantástica, deverás tentar ir até Narvik, porto norueguês bem ao norte, e daí tomar a estrada para a Suécia até Kíruna. A partir dos fins de Maio, até meio de Julho, (O Curtíssimo Verão!), tendo-se a sorte de apanhar Sol e céu azul, é viagem inolvidável para o resto da vida. Bem-vindo!
Um grande abraço do José Belo.

[ Revisão de texto / fixação / título: L.G.]
_____________

Notas de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 17 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5829: Da Suécia com saudade (19): O privilégio de ter a Tabanca Grande... em comum (José Belo)

(**) Comentário ao poste de 6 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5773: Parabéns a você (77): José Belo, se o calor da nossa amizade chegasse a Kiruna, a tua Lapónia era o Alqueva (Os Editores)

Meu caro José Belo:

Para além das tuas queridas renas, a gente sabe pouco sobre ti, meu luso-lapão...

Quando foste exactamente para a Suécia, e porquê... Por onde andaste, o que fizeste, como sobreviveste, como resististe... Afinal, que crime cometeste para te mandarem para a Lapónia... Como e quando chegaste a Kiruna ?

Sabemos também pouco da tua história de vida no TO da Guiné...

Claro, tens o direito ao sigilo, ao anonimato... Mas já que entreabriste a porta... Sabes como é o portuga, põe logo o pezinho na porta, para que tu não a feches...

Mais importante: quando voltas, este ano, a este jardim à beira-mar plantado ?

Espero que te tenhas divertido, no mínimo, com o nosso texto, atabalhoado, de parabéns...

Luís

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Guiné 63/74 - P5073: Tabanca Grande (178): O ex-Cap Art Gualberto Passos Marques, CCS/BART 2917, Bambadinca, 1970/72

Guiné > Zona leste > Sector L1 > Bambadinca, > CCS/BART 2917 (1970/72) > "Eu, o Furriel Durães e mais pessoal da CCS do BART 2917 em acção psicológica junto das populações"...

O Benjamim acrescenta (e corrige): "O ex-Capitão Passos Marques e alguns militares do PEL REC (1º Cabo Rodrigues, já falecido, o 1º Cabo Ribas e o 1º Cabo Fonseca que era o barbeiro, e mais dois militares, que eram sapadores mas não consigo identificar. O Durães nessa foto não está)"... Não é indicado nem o lugar nem a data... (LG)

Foto: © Gualberto Magno Passos Marques (2009). Direitos reservados


1. Mensagem do Gualberto M. P. Marques, com data de hoje (*):

Caro amigos:

Foi com imenso prazer que vos digo que aproveitei a oportunidade de estar com o Benjamim Durães, após a comissão na Guiné.

Passaram quase 40 anos de maneira que é tempo mais que suficiente para modificar a nossa fisionomia...e por vezes fazer-nos passar uns pelos outros sem que nos reconheçamos.

O camarada Luis Graça foi muito amavél no comentário que fez à minha pessoa e ao convidar-me a participar no Blog, que tão eficientemente dirige.

É muito provável que em Bambadinca tivéssemos conversado e tocado opiniões, como camaradas que se encontravam em serviço na mesma zona. Sou franco em admitir que já não me recordo bem das feições dos muitos amigos e camaradas que naquela altura convivíamos com idênticos problemas e preocupações.

Não quero deixar de aproveitar a oportunidade para saudar todos os amigos, camaradas e colegas que acedem ao Blog Tabanca Grande e expressar o meu agradecimento por tudo que fazem em prol do espírito de fraternidade, camaradagem e convívio.

Aos colegas,amigos e camaradas do BArt 2917, desde já envio um abraço e desejos de saúde e muito sucesso nas suas vidas.

Para terminar envio ao Benjamim Durães e ao Luís Graça um grande abraço e um Bem Haja... por tudo o que fazer por altruísmo tendo em vista a manutenção dos laços de amizade e fraternidade de todos aqueles que caminharam pelas picadas e bolanhas da Guiné.


SAUDAÇÃO

À Tabanca Grande saúdo, com emoção,
Ao recordar os camaradas e amigos
Que, em momentos de perigo e aflição,
Nunca deixaram de permanecer unidos.

Maduros e serenos, nossos corações,
Vamos continuar a apertar as mãos,
Evocando amigos e boas recordações
Numa vida de dor, saudade e solidão.

Éramos filhos e hoje somos avós,
No entanto nunca estivemos sós,
Em qualquer outra contingência.

Agora vamos brindar, a uma só voz,
Conscientes que permanecem em nós
Os que infelizmente marcam ausência.


Um abraço

Faro, 7 de Outubro de 2009
G.M.

[Fixação / revisão de texto: L.G.]

2. Saudação do Jorge Cabral:

Um Grande Abraço para o Passos Marques!

Já o conhecia de Vendas Novas e sempre o considerei um Amigo. Há tempos encontrei o Agordela, capitão de Mansambo. Fico feliz quando constato que os rapazes do meu tempo continuam em forma...Qualquer dia mandarei um estória com estas duas personagens...

Jorge Cabral



3. Comentário de L.G.:

Caríssimo Gualberto... Não sei como tratar-te, de acordo com as regras da civilidade romana em vigor no nosso blogue... Gualberto, Magno ou Passos Marques ? Ou só Gualberto Marques ? Logo o dirás, na volta do correio.

E agora vamos agradecer a tua caloroso e brilhante saudação em forma de soneto. Não te conhecia esta faceta. Como te agadeço as fotos, com legenda, que tiveste a gentileza de nos enviar, através do camarada Durães. Faltam, agora, as pequenas/grandes histórias do nosso tempo em que vivemos juntos, como bons vizinhos, em Bambadinca, desde pelo menos Maio de 1970 a Março de 1971 (eu, tu, a tua CCS e a nossa CCÇ 12)... Eu depois regressei a penates, e tu ficaste lá no planalto, a gerir a tua CCS, com uma incursão pelo Xime (que hás-de um dia explicar, se para tanto tiveres engenho, arte e sobretudo motivação)...

Abreviando, é uma honra, um privilégio e sobretudo um prazer ter-te aqui, nesta caserna virtual, ao nosso lado. Hoje, como no passado... Fica bem, acomoda-te, arranja aí um cantinho, tão confortável, no mínimo, como aquele que tinhas no nosso hotel de Bambadinca... Espero dar-me um Alfa Bravo no próximo encontro, o quinto, da nossa Tabanca Grande, em 2010. Luís Graça

_____________

Notas de L.G.:

(*) 5 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5055: Tabanca Grande (177): Carlos Cordeiro, ex-Fur Mil At Inf (Centro de Instrução de Comandos - Angola, 1969/71)

(**) Vd. postes de:

6 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5060: Memória dos lugares (45): Bambadinca, BART 2917, 1970/72, ex-Cap Art Passos Marques (Benjamim Durães)

7 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5070: Memória dos lugares (46): Bambadinca, ao tempo da CCS / BART 2917: O Arsénio Puim e o Abel Rodrigues (Passos Marques)

7 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5071: Memória dos lugares (47): Bambadinca, a bela Helena no meio de Oficiais & Cavalheiros (Passos Marques)

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Guiné 63/74 - P2481: Guileje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (11): Malan Camará... e a maldição dos 3 G + 1 J (Manuel Rebocho)

Guiné > Região de Tombali > Cantanhez > Cachambas Balantas, próximo de Jemberém (hoje, ois guineenses dizem e escrevem Iemberém)> CCP 123 / BCP 12 (1972/74) >12 de Fevereiro de 1973 > O Cabo Álvaro, o militar à esquerda na fotografia, pouco depois da captura do mais prestigiado chefe da Guerrilha no Cantanhez, o Comandante de Bigrupo Malan Camará, ferido por um disparo de Sneb (1), "que eu próprio mandei disparar" (Manuel Rebocho).


Foto: Costa Ferreira (gentilmente cedida pelo Manuel Rebocho) (2007).


Malan Camará, um antigo guerrilheiro do PAIGC, que operou na zona do Cantanhez, um dos convidados especiais do Simpósio Internacional de Guiledje. No âmbito do Projecto Guiledje, foi entrevistado pelas equipas de investigadores da AD - Acção para o Desenvolvimento (que gravaram o seu depoimento em DVD). O Manuel Rebocho quer saber se é o mesmo Malan Camará, da foto de cima, ferido e capturado pelo seu Grupo de Combate da CCP 123 / BCP 12, em 12 Fevereiro de 1973. Acontece que Malan é um nome vulgar, entre fulas e mandingas, e Camará é também um apelido muito frequente entre os fulas... Na CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71) tínhamos vários Malan e vários Camará, embora nenhum Malan Camará (que julgo ser nome de mandinga) (LG).

Foto: Guiledje - Simpósio Internacional (2007) (com a devida vénia...).


1. Texto do nosso camarada Manuel Rebocho, ex-sargento paraquedista da CCP 123 / BCP 12 (Guiné, Maio de 1972/Julho de 1974), hoje Sargento-Mor Pára-quedista, na Reserva, e doutorado pela Universidade de Évora em Sociologia da Paz e dos Conflitos (tese de doutoramento: "A formação das elites militares portuguesas entre 1900 e 1975") (2).


Amigos Luís Graça e Pepito:

Na sequência da publicação, no nosso blogue, de algumas fotografias, de antigos guerrilheiros do PAICG, verifiquei, particularmente, a de Malan Camará (3). Enviei um e-mail para o Pepito solicitando a gravação das declarações de Malam Camará.

O Pepito respondeu-me, de imediato dizendo:

“Conto passar por Portugal no final de Março e nessa altura dar-te-ia a gravação da entrevista do Malan Camará. Vou pedir que me façam uma gravação em DVD.
abraço
pepito”


No meu mail não especifiquei a razão do meu interesse. O que eu pretendo saber é se o Malam Camará que surge no blogue, é o mesmo que está na fotografia em anexo, a qual consta na minha obra de doutoramento.

No blogue diz o Pepito hoje, dia 25 de Janeiro de 2008, referindo-se à apresentação pública do Simpósio sobre Guiledje:

“Como o assunto era relativo à História e Cultura, a televisão nacional e a RTP África, sempre mais preocupadas em dar relevo a outras questões mais relevantes como o narcotráfico e a presença da AL-QAEDA, primaram pela ausência. Critérios....”

Naturalmente que é assim, e assim será no futuro, pois não te esqueças que as histórias são sempre contadas pelos vencedores. E, nem os vencedores (PAIGC), nem os heróis portugueses, de Guiledje e Gadamael, integram “a classe de poder em Portugal”. Nota, que classe de poder não significa classe no poder, são classes diferentes.

As discussões que envolvam Guiledje, Gandamael Porto e Guidaje (os três G’s, como define o nosso amigo Leopoldo Amado) e ainda Jemberém, que eu lhe acrescento, não interessam àqueles que se consideram “os donos do 25 de Abril” e que, a partir de méritos que não são seus, se constituem na classe de poder em Portugal.

Só uma pequena achega para ilustrar um pouco esta ideia que é científica, pois resulta da minha tese de doutoramento, na qual me foi atribuída a classificação máxima.

Na sequência do abandono de Guiledje, em que as tropas portuguesas fugiram para Gadamael Porto, no dia 22 de Maio de 1973, ficaram instalados neste último Destacamento cerca de 600 homens, 4 companhias, o equivalente a 1 Batalhão, a que correspondia 1 Tenente-Coronel, 2 Majores e 4 Capitães. No entanto, aqueles homens eram comandados apenas por dois Capitães, e estes milicianos, naturalmente.

Os capitães milicianos foram feridos e evacuados no dia 30 de Maio de 1973, do que resultou que aquelas 4 companhias, ou aquele amontoado de militares portugueses, ficassem tão só sob o comando de um Alferes miliciano, ou de ninguém, para ser mais preciso.

Ao mesmo tempo, em Jemberém, que fica a cerca de 18 km a oeste de Gadamael Porto, no coração do Cantanhez, como sabemos, estavam colocadas duas companhias, também elas, comandadas por um Alferes miliciano (já nem os Capitães milicianos queriam estar nas zonas de combate, sobrava já tudo para os Alferes milicianos).

Se a guerra tivesse continuado, só lá ficavam os Soldados, estou certo. Como afirmo na minha tese de doutoramento, os Oficiais de carreira fugiram literalmente das zonas de combate.

No dia 22 de Maio de 1973, o dia da fuga de Guiledje, Spínola enviou uma nota ao Ministro do Ultramar, dizendo que não tinha meios para continuar a guerra. Em resposta, o governo fez publicar, no dia 13 de Julho seguinte, o Decreto-Lei n.º 353/73, onde determinava uma nova metodologia de formar Capitães, o que desagradou aos Capitães da Academia, que se viam recambiados para o mato, onde eles não queriam estar.

Para combater esta decisão, que não lhe agradava, revoltaram-se contra quem os formou e lhe atribuiu o estatuto que possuíam. Afirmando-se então, que tal revolta, tinha origens em princípios democráticos, o que não era verdade.

Por tudo isto, há que silenciar estes 4 nomes, [(Guiledje, Gandamael Porto, Guidaje (onde estava colocada uma Companhia de nativos, a 19.ª, cujos graduados eram europeus milicianos, e onde a vergonha ainda foi maior) e Jamberém] que eu não apago da minha memória, mas que, como disse, incomodam a classe de poder.

Portanto, meu amigo Pepito, não estranhes e conta só com o silêncio. Mas nem tudo será mau, contas com muitos amigos e com o nosso blogue que não se cala.

Percebeste um pouco da minha mágoa em não estar no “teu/nosso Simpósio”, mas também percebeste porque não posso.

Nota:

Se o Malan Camará das duas fotografias é o mesmo, posso adiantar-te que o ferimento lhe foi provocado no dia 12 de Fevereiro de 1973, nas Cachambas Balantas, próximo de Jemberém (4), por um disparo de Sneb, que eu próprio mandei disparar – era ele, ou eu e os meus homens – foi assim a guerra, que só a conheceu quem a fez.

Malan Camará, ou os homens sob o seu comando, mataram-me um soldado, o Azinheirinha, e feriram gravemente o Alferes, razão pela qual assumi o comando do pelotão.

Mas como vês, ou se pode ver, Malam Camará foi tratado e evacuado de helicóptero para o Hospital Militar de Bissau, onde foi bem tratado. E não foi evacuado por engano, eu pedi uma quarta aterragem de helicóptero, dizendo expressamente que era para evacuar um elemento IN ferido. O General Spínola, que estivera no local falando connosco, ouviu as comunicações rádio e não se opôs, o que permite que eu afirme que este género de humanidade era assumido pela mais alta hierarquia. (*)

Hoje, os que fugiram da guerra, para o ar condicionado, dizem de Spínola “cobras e lagartos”, mas têm mais defeitos do que ele, enquanto o não assemelham nas virtudes.

A guerra em que eu participei, foi uma guerra violenta, mas humana, dentro do possível claro. Não a do ar condicionado nem a da violência gratuita.

Um grande abraço aos dois

E que o nosso Simpósio seja um sucesso

Manuel Rebocho

________________

Notas de L.G.:

(*) Bold da responsabilidade do editor

(1) SNEB: rocket antipessoal, de calibre 37 mm, que equipava o T-6 e que também era usado pelos pára-quedistas (e depois, por outras forças) como LGFog.

(2) Vd. postes do Manuel Rebocho:

14 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P877: Nós, os que não fazemos parte da história oficial desta guerra (Manuel Rebocho)

"(...) tomei contacto com o vosso/nosso blogue, através do então Furriel Miliciano José Casimiro Carvalho, da CCAV 8350 (a que abandonou Guileje, em 22 de Maio de 1973), o grande herói de Gadamael Porto, que, não obstante isso, também não faz parte da história oficial da Guerra da Guiné"(...).

28 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P919: Vamos trasladar os restos mortais dos nossos camaradas, enterrados em Guidage, em Maio de 1973 (Manuel Rebocho)

21 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1099: O cemitério militar de Guidaje (Manuel Rebocho, paraquedista)

4 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1150: Carta a Pedro Lauret: A actuação do NRP Orion na evacuação das NT e da população de Guileje, em 1973 (Manuel Rebocho)

5 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1151: Resposta ao Manuel Rebocho: O papel do Orion na batalha de Guileje/Gadamael (Pedro Lauret)

17 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1187: Guidaje: soldado paraquedista Lourenço... deixado para trás (Manuel Rebocho).

22 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1453: Ninguém fica para trás: uma nobre missão do nosso camarada ex-paraquedista Manuel Rebocho

(3) Vd. poste de 24 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2478: Guileje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (9): Inimigos de ontem, amigos de hoje

(4) O Victor Tavares, que pertenceu à CCP 121 / BCP 12, camarada do mesmo batalhão e da mesma arma do Manuel Rebocho (CCP 123 / BCP 12) , já referiu o mesmo episódio, mas as datas não batem certo. Ele diz que quem capturou o Malan Camará foi a sua unidade, a CCP 121, em 22 de Dezembro de 1972. Será o mesmo Malan Camará ? Trata-se de um nome vulgar, mas também já é muita coincidência...

(...) 22 de Dezembro de 1972: captura do comandante do bigrupo de Malan Camará

Dia 22 de dezembro, o primeiro bigrupo da CCP 121 parte para mais um patrulhamento desta vez com destino as Caxambas Balantas, depois de andadas algumas horas atravessando matas, bolanhas e rios alguns de difícil passagem derivado ao imenso lamaçal e arvoredo rasteiro ou Tarrafo aonde nos enterrávamos até à cintura e por vezes mais a cima, tendo que ser ajudados pelos camaradas que mais rapidamente chegavam a margem segura.

(...) Referenciámos três pessoas desarmadas que seguiram o seu destino. Aqui montámos uma emboscada. Passados cerca de 10 minutos aparece uma mulher com uma criança as costas também no mesmo sentido. Poucos minutos passaram e aparecem pela mesma picada mas no sentido inverso 4 Guerrilheiros armados. Quando estes se aproximavam dos nossos homens da frente , estes abriram fogo abatendo de imediato 2 guerrilheiros ferindo os outros dois, tendo um deles conseguido fugir. Capturámos o outro, sendo ele o comandante de bigrupo de Simbeli, Malan Camará. (...)


Vd. poste de 15 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2051: Os pára-quedistas no mítico Cantanhez: Operação Tigre Poderoso (II parte) (Victor Tavares, CCP 121 / BCP 12)

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Guiné 63/74 - P2134: História de vida (6): A minha convocação para o Curso de Capitães Milicianos (Ferreira Neto)

Ferreira Neto, ex-Cap Mil, CART 2340 (Canjambari, Jumbembem e Nhacra, 1968/69).



1. É sabido que um dos grandes problemas do Regime para manter a Guerra Colonial, foi, a certa altura, arranjar Capitães para comandar o grande número de Companhias enviadas para os Teatros de Operações.

Os Capitães do Quadro Permanente tinham, na sua maioria, efectuado já duas e três Comissões de Serviço, e já apresentavam um desgaste físico e psicológico muito acentuado. Os que não conseguiam evitar mais uma Comissão, tudo faziam para baixar aos Hospitais Militares depois de mobilizados.

Como os Capitães que baixavam e que posteriormente eram abatidos ao efectivo das Companhias, não eram substituídos em tempo útil, eram os Alferes Milicianos que aguentavam a guerra como podiam. Como por vezes também os Alferes baixavam, até os Furriéis Milicianos comandavam Pelotões.

A solução encontrada pelas Chefias Militares foi recorrer aos Oficiais Milicianos na situação de Disponibilidade, que por sorte (ou azar) não tinham sido mobilizados durante o tempo normal de Serviço Militar Obrigatório.

Eram chamados de surpresa para frequentar um Curso acelerado de Capitães Milicianos e lá iam comandar Companhias Operacionais, tendo muitos deles deixado para trás a família já constituída e uma vida profissional estabilizada.

Esta situação foi vivida pelo nosso camarada Ferreira Neto, ex-Cap Mil, Comandante da CART 2340 (1).



2. A minha convocação para o Curso de Capitães Milicianos
Por Ferreira Neto

Terminado o meu serviço militar obrigatório em 15 de Fevereiro de 1959, iniciei a minha vida profissional em Novembro.

Com a vida estabilizada, casei-me em 18 de Agosto de 1960.

Entretando, em 4 de Fevereiro de 1961, os movimentos separatistas nas nossas colónias iniciaram a suas actividades.

Como tinha passado à disponibilidade, havia menos de um ano atrás, fiquei na expectativa de ser mobilizado para a guerra. Expectativa que continuou por muitos meses, com o adicional desconforto na minha vida. No entanto, com o passar dos meses esse estado foi-se desvanecendo, até porque, o número de cursos de oficiais milicianos era maior, e por consequência a quantidade que se interpunha entre mim e uma possível mobilização tornava cada vez mais distante. A consequente probabilidade de ser alistado diminuía a olhos vistos para meu descanso e da restante família. Assim fui progredindo na minha vida profissional e melhoria de proventos do meu trabalho.

Para minha surpresa, em Dezembro de 1966 fui convocado para me apresentar em Mafra, como Tenente, para frequentar o Curso de Capitães Milicianos, que se iniciaria em Janeiro do ano seguinte.

E assim foi, com a consequente diminuição dos meus proventos do trabalho, que passaram a ser muito menos de metade do que auferia até então, separação da família que só me era possível ver aos fins-de-semana, acrescido das despesas de viagem para tal acto.

Nesta altura tinha já um filho com 5 anos de idade. Com a minha mulher, tínhamos planeado ter mais um rebento. A situação descrita iria fazer com que tivessemos que optar por três hipóteses:
(i) - desistir da ideia de ter mais filhos,
(ii) - de os ter depois do meu regresso, ou
(iii)- de iniciar antes da minha partida.

A primeira hipótese não nos agradava, a segunda seria um intervalo bastante grande de idades entre os dois, o que não era aconselhável, pelo que optámos pela terceira, fazendo preces para que eu regressasse vivo.

Tal aconteceu, só que a minha mulher não teve o acompanhamento sempre desejado do marido, eu tinha embarcado para a Guiné no dia 10 de Janeiro de 1968. Nasceu uma menina em Julho desse mesmo ano. Felizmente tive oportunidade de, em Setembro, aquando da minha primeira licença, assistir ao seu baptismo.

Em Fevereiro de 1969, na segunda licença já a cachopinha se encontrava com seis meses e toda bonitinha à custa da minha mulher que teve que se haver quase só com a criação da criaturinha.

Eis o que me aconteceu e também em circunstâncias piores a centenas de outros e consequentes traumas de guerra, ainda hoje precariamente atendidos.

Ferreira Neto
Ex-Cap Mil
CART 2340
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Nota do co-editor CV:

(1) Vd. post de 14 de Agosto de 2007> Guiné 63/74 - P2046: Tabanca Grande (31): Apresenta-se Joaquim Lúcio Ferreira Neto, ex-Cap Mil (CART 2340, Canjambari, Jumbembem, Nhacra, 1968/69)