Mostrar mensagens com a etiqueta universidade. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta universidade. Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Guiné 63/74 - P10052: Cartas do meu avô (9): Sétima carta: A universidade, o 25 de abril... (J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil, CCAÇ 728, Bissau, Cachil e Catió, 1964/66)

A. Continuação da publicação da série Cartas do meu avô, da autoria do nosso camarigo Joaquim Luís Mendes Gomes, membro do nosso blogue, jurista, reformado da Caixa Geral de Depósitos, ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Os Palmeirins de Catió, que esteve na região de Tombali (Cachil e Catió) e em Bissau, nos anos de 1964/66. [, Foto à esquerda, com os netos]. As cartas, num total de 13, foram escritas em Berlim, onde vivem os netos, entre 5 de março e 5 de abril de 2012. (*)

B. Sétima carta: Universidade

No princípio de Outubro de 1966, começaram as aulas de Direito. Estava ansioso. Tomei o autocarro para o Campo Grande. Estou a lembrar-me de o atravessar apressado, com uma mala, e subir a pé a alameda da universidade.


Fui o primeiro aluno a entrar no anfiteatro onde ia assistir à primeira aula. Um grande salão em escadaria de balcões, como num cinema. No palco, ficava, imponente, a secretária do professor. Tive a noção exacta de que aquele, sendo o meu curso inicial, não seria com ele que eu chegaria ao fim. E senti-me triste.

Dentro em pouco estaria casado e a trabalhar. Sabia que não ia adiar a vinda dos filhos por causa do curso. Os colegas começaram a entrar e a ocupar as cadeiras livremente. Eu escolhi uma da coxia na 4ª fila. Para poder alcançar tudo bem.


Eram todos mais novos que eu. Rapazes e raparigas. Muito tenros. Tinham acabado o liceu. Lembro-me duma colega que viria a ser célebre, a Leonor Beleza, e doutro, o… O resto era tudo desconhecido. As aulas iriam acontecer lentamente, no dia a dia. Sem provas nem frequências. Exame, só no final do ano.


Se corresse tudo bem, teria de esperar cinco anos pelo fim do curso. O ramerrame do dia-a-dia, no meio daquela turma de gente muito mais jovem que eu, era-me muito desagradável. As mentalidades eram naturalmente diversas.


Tinha de avançar noutro ritmo. Eu sabia que poderia utilizar o regime de estudante-militar. Nele, preparar-me-ia por mim, e, quando entendesse que estava habilitado, requeria exame. Em qualquer data. Era uma pequena compensação para quem tinha perdido tempo no serviço militar. Abalancei-me a utilizar esse regime.

Depressa me apercebi de que os professores não gostavam muito dos estudantes trabalhadores, muito menos de ex-militares. Tinha sido uma imposição do governo. Quem sofria éramos nós. As notas eram baixas, à partida. Muito facilmente se reprovava. Bastava um deslize estava tudo perdido. Havia que repetir. Com mais duas tentativas. Se chumbasse três vezes, estava erradicado da universidade nessa cadeira. Só noutra faculdade. A única existente era Coimbra.

Foi o que aconteceu numa das primeiras cadeiras do segundo ano. Teoria Geral de Direito. O professor era o célebre Paulo Cunha [, 1908-1986]. Um catedrático veterano, distante e pomposo. Um vozeirão de meter medo. Fui ao exame oral. A tremer de medo. Sentado diante daquela bisarma, lá em cima no seu cadeirão, varreu-se- me tudo da cabeça, à primeira questão que me pôs:
- O aluno vai dizer-me quais os vícios da vontade na formação do contrato. – foi a primeira pergunta. Dá pano para muita manga.

Eu sabia que a lista dos vícios era uma fila enorme. Ocupava folhas e folhas na sebenta.Todos muito ligados uns aos outros por ligeiras nuances que teriam de ser logo muito bem distinguidas e explicadas.

Num primeiro momento, fiquei atordoado. Não me lembrava, rigorosamente, de nenhum. Fiquei calado por instantes. Eu sabia que não podia demorar muito. Numa tentativa de me desenlaçar, respondi para o ar:
- Os vícios da vontade na formação da vontade… são sete.

Ele sorriu.
- Como os sete pecados mortais?... - gracejou.
- Bem. Então vamos ao primeiro.

Mais uns momentos de silêncio. E nada. Bom. Tenho de desistir, para não chumbar.
Foi o que fiz.
- Senhor Professor! Quero desistir…
- Porquê? Não quer tentar mais um pouco?

Fiquei calado, a ver se recuperava a memória. Afinal, eu tinha-os estudado muito bem. Não deu certo.
- Bem, então pode levantar-se. Voltará cá outra vez. - disse o professor.

Grande desaire!... A partir daí, foi uma desgraça. Eu que sempre fora um aluno superior, não habituado a chumbar, a dispensar da oral, passei a levar de todos. Tinha entrado automaticamente para o lote dos que deveriam ser escorraçados da faculdade.

A minha luta, porém, foi titânica. Nunca desarmei. Ia dando em maluco. Eu e a namorada que viria a ser a minha mulher, a breve trecho.

Andei a caminhar para a faculdade como um viciado ou que vai à missa, a todas as horas, durante anos e anos. Não havia recanto ou café de Lisboa onde não tivesse estado a estudar. Até nas maternidades, quando acompanhava a mulher, no nascimento de mais um filho. Cheguei a levar o primogénito, o Paulo Alexandre, aí com uns 3 a 4 anitos, a ver as notas dum exame, na pauta.

Os colegas que ali estavam puseram-se a brincar com ele. Nas correrias, as calças caíram-lhe pelas pernas abaixo e ficou com o rabito ao léu… foi uma risota no átrio. Nunca mais esqueci.

Entretanto, a situação política do país e a internacional, tinha evoluído muito. Com grandes manchetes. Em 1967, subitamente, Israel, sob o comando do Moshe Dyan, invade a Palestina, com um poderio bélico de tal ordem, que sufocou o adversário em meia dúzia de dias, com o espanto de todo mundo.

Cá dentro, a guerra colonial agravava-se num crescendo assustador. Como alimentá-la em material e homens?...As gerações jovens estavam cada vez mais esclarecidas. Começava a dar-se uma hemorragia preocupante, deles para o estrangeiro, na hora de se apresentarem. Portugal estava a ser flagelado nos aerópagos internacionais, pela adversidade de todos os países ocidentais. 

A polícia política exaspera-se, de dia para dia, na caça aos comunistas clandestinos que desestabilizavam as universidades e as empresas. A universidade torna-se palco de pancadaria pelos corredores e escadas, entre os “gorilas” (uma tropa de seguranças escolhidos a dedo) e os estudantes “insurrectos”. Cada vez se tornava mais difícil salvaguardar o regular funcionamento das aulas.

A mim, não me preocupava essa pancadaria. Já tinha feito a minha guerra. Não tomava partido por nada. Um clima de incerteza geral e de preocupação instala-se na universidade. Havia que concluir o curso o mais depressa possível.

Quando, em 1974 se desencadeia o vinte cinco de Abril, eu estava quase a concluir o 4º ano. Durante os dias que se seguiram ao golpe, as universidades colapsaram com as rebeliões internas. Os saneamentos dos professores, a torto e a direito, despovoaram as cátedras de mestres. Era a vingança da estudantada.

Não se sabe donde, surgem mil movimentos ideológicos que querem apoderar-se das rédeas das escolas superiores. Os confrontos, agora, passaram a ser entre os MEC {, Movimento Estudantil Comunista] e os MRPP [, Movimento de Reorganização do Proletariado Português], comunistas e maoístas…

Sucedem-se repetidas RGAS (e uniões gerais de alunos) para se obterem votações directas. Os estudantes eram quem tinha o poder de traçar rumos para a universidade. Verdadeiras batalhas campais, com muita violência, martirizavam aquelas magnas assembleias, sem se chegar a conclusão nenhuma. Só pela alta madrugada, quando já se tinham ido embora a maior parte dos estudantes, é que vinham as decisões.

Tudo foi posto em causa. Rasgaram-se os programas de ensino. Ensaiaram-se os métodos e currículos o mais utópicos que se possa imaginar. Foi uma terrível frustração geral. Parecia que nunca mais as Universidades funcionariam outra vez.
_______________

Nota do editor:


quinta-feira, 14 de junho de 2012

Guiné 63/74 - P10031: Cartas do meu avô (8): Lisboa, o primeiro emprego, o primeiro carro em segunda mão, a vida de trabalhador-estudante, o casamento... (J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil, CCAÇ 728, Bissau, Cachil e Catió, 1964/66)

A. Continuação da publicação da série Cartas do meu avô, da autoria do nosso camarigo Joaquim Luís Mendes Gomes, membro do nosso blogue, jurista, reformado da Caixa Geral de Depósitos, ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Os Palmeirins de Catió, que esteve na região de Tombali (Cachil e Catió) e em Bissau, nos anos de 1964/66. [, Foto à esquerda, em Catió].

As cartas, num total de 13, foram escritas em Berlim, onde vivem os netos, entre 5 de março e 5 de abril de 2012. (*) 


B. SEXTA CARTA > O Primeiro Emprego e Casamento


O tempo ia decorrendo. Não tinha passado um mês sequer, quando se deu o desligar absoluto da vida militar. Fui receber o último soldo ao posto da GNR da vila.

A partir daí passei a viver do pecúlio que tinha conseguido. Não era muito, pois que tive de custear as mensalidades do internato do meu irmão, num colégio do Porto,  e um tanto para o sustento da tia que tomava conta da casa e do meu irmão, seu afilhado.

Além disso ela tomou a decisão de comprar uma tira de terreno, contíguo ao da casa, para ampliar um pouco mais o quintal e afastar a proximidade do vizinho.

Daí que a necessidade de procurar emprego se pusesse prementemente.

I – O Primeiro Emprego

Teria de descer de novo até Lisboa, onde as oportunidades seriam maiores. E, onde havia de ficar? Lembrei-me de que o irmão dum furriel do 1º pelotão era padre e geria um lar de rapazes estudantes, em Lisboa, ali ao pé da Feira Popular.

Pus-me em contacto com ele. Por seu intermédio, foi-me logo franqueada a entrada para esse lar. Com cama e mesa. Um pouco puxado.

Depois, foi uma luta feroz contra o tempo. Havia que conseguir emprego a todo o custo. Bati à porta de todas as companhias de seguros. Bancos. Emissora Nacional… Sei lá mais quê.

Foi então que encontrei o meu camarada de companhia,  o Arlindo. Estava já empregado numa empresa de motorizadas. Ele sabia que a Caixa Geral de Depósitos estava a admitir pessoal e seria fácil conseguir. O vencimento não seria muito. Mas, fosse o que fosse, daria para subsistir. Até melhores dias.

E assim foi. Entrei menos de dois meses depois.  Respirei fundo.
- Vai ganhar 2.028 escudos por mês. Temos um bom apoio social e quem merece durante o ano, tem uma partilha de lucros ao fim do ano. Pode chegar a três vencimentos. Muito razoável. – adiantou o chefe de secretaria do pessoal, o Sr. Santos, quando me fui apresentar.
- Para começar, não está mal…- respondi, com ar satisfeito.
- Então, Sr. Gomes, tome esta guia e vá apresentar-se ao director dos serviços de Estatística e Actuariais, fica ali na rua do Alecrim. E muitas felicidades.
- Muito obrigado, Sr. Santos. – nunca mais esqueci o seu nome nem o seu ar de bonomia acolhedora, espelhados num rosto redondo e vermelhusco.

Essa de Serviço de Estatística e… outra coisa que nem percebi bem, é que não me caiu muito bem. Nunca tive tendências para números ou contabilidades. Estava a entrar num banco. Tudo era provável. Paciência. Não há volta a dar-lhe…- ia eu a pensar enquanto procurava a tal rua no Calhariz.
- É aquela ali… a última porta larga do lado esquerdo - explicou-me o porteiro à saída.

Mal sabia eu que estava a entrar para, talvez, a única Direcção de Serviços onde seria possível frequentar um curso superior. Tinha um chefe, licenciado, o que era raro na Caixa desse tempo, e que, talvez, por também ter tirado o curso a trabalhar, não levantava dificuldades, desde que se merecesse…

O mundo da informática estava a nascer naqueles anos sessenta. A Caixa Geral de Depósitos era das poucas instituições que possuía o último grito de computadores- um IBM 1401. [, Imagem à esquerda, cortesia de Washington University > A history of IT at UW]-

Um aparelho enorme [, um main frame,] que ocupava um espaço enorme numa sala especialmente condicionada para ele. Onde só os especialistas podiam entrar. Era um espaço hermético, quase sagrado, naqueles serviços.

Pressentia-se, quase a medo, que o futuro de tudo passaria pelo informático. Ainda não se ministravam esses conhecimentos nas escolas públicas. Era a própria instituição que desenvolvia internamente esses estudos e os fomentava em acções de formação.

O pessoal que ali trabalhava saíra dos quadros gerais do pessoal interno da Caixa. Por selecção em testes psicotécnicos muito rigorosos e exigentes. Auferiam um escalão de vencimentos superiores aos trabalhadores comuns. Por isso, aquela direcção era muito cobiçada.

Eu entrei,  não para esse quadro especial, mas sim para o corpo de trabalhadores que se dedicava ao residual de tarefas actuariais que ali restaram depois da sua assunção da informática, na mecanização de todos os serviços internos.

Por uma questão de melhoria do vencimento, ainda tentei o ingresso nesse quadro, sabendo bem que aquela matéria me era adversa. Felizmente não consegui. Assim, pude ir avançando no curso de direito a que me abalançara, decididamente.  O tal director de serviço abriu-me todas as possibilidades de o frequentar, sem compensação de horas.

Entretanto, porém, estava já em plena fase de namoro com a ex-madrinha de guerra. A enamoração em que nos envolvemos levou-me a dissipar essas facilidades excepcionais.

Também não me sentia bem integrado no ambiente académico, formado por aquela população de rapaziada novata, saída dos liceus. Eu queria chegar depressa ao fim. Por isso, preferi adoptar o regime de estudante ex-militar. Podia preparar os exames por mim próprio e apresentar-me a exame. Quando entendesse.

A A.T. estava já a acabar o seu curso e iria trabalhar. Caímos ambos num regime de vida em que não tinha a necessária concentração para um bom rendimento. Víamo-nos a toda a hora.

No segundo ano do curso, veio o primeiro chumbo numa cadeira fundamental - Teoria Geral do Direito. Quase esgotei as possibilidades de continuar. Só mudando para Coimbra. A partir daí começaram a chover chumbos em catadupa. Fui subindo a passo de caracol. Com um esforço gigantesco.

II – O Casamento

Entretanto, por outro lado, o decorrer do namoro começou a trazer ao de cima as primeiras dificuldades. Éramos dois indivíduos com uma textura pessoal muito diferente.

O ambiente social em que crescêramos era muito diferente. Eu, fui nascido e criado no norte, - onde impera uma mentalidade muito distante da mentalidade alfacinha – era filho de família pobre e, muito cedo, fiquei sem os progenitores vivos, estudei, dos 12 aos 20 anos, nos seminários. Ela era uma quase filha única dum casal burguês, crescida em Lisboa, em berço de veludo, nunca sentira dificuldades, só as do curso de biologia, em que fora das melhores alunas.

As brigas verbais surgiram e tornaram-se cada vez mais constantes. A ponto de a Mãe dela ter apelidado o café onde costumava encontrar-nos, ali no Jardim da Parada, como o “café das brigas”. Encontrava-nos sempre a discutir.

Muito dificilmente estávamos de acordo. O desenlace esteve decidido, por várias vezes, com muita convulsão pelo meio. Repetiu-se muito daquela mesma fase do Cachil… lá atrás. 
O convívio insistente, porém, que não deixava respirar, não ajudava nada a que fosse tomada uma decisão serena e objectiva.  Era propício a que se avançasse com a cabeça debaixo da areia. Da parte dela, havia uma grande pressa de avançarmos para o casamento.

Quando alcançou o seu primeiro emprego, com a ajuda do padrinho - uma alta figura do governo,  logo a seguir ao terminar do curso – com o bom vencimento que iria auferir, estavam criadas as condições financeiras para que fosse possível o casamento.

A facilidade com que se conseguia uma casa por aluguer, facilitava muito as coisas. A soma dos nossos dois vencimentos chegava, à vontade, para começar.

De novo, sem dar conta, dei por mim, já com a data de casamento, marcada. Seria em Janeiro de 1968, se o processo do registo civil, entretanto iniciado, não revelasse impedimentos.

E, dessa vez, foi de vez. Tivemos um casamento de alto nível. Com fraque e cerimónia. Uma boda de alto nível, servida no “Espelho d’Água”,  frente aos Jerónimos.

Recordo um episódio estranho que aconteceu, no dia do casamento. Horas antes, vinha eu de cortar o cabelo no meu barbeiro habitual, um corte muito bem cuidado para o efeito que era, quando ia a passar diante da igreja onde se iria realizar o casamento, fui abordado, por mera casualidade, penso, por um indivíduo desconhecido. Ainda ia para casa vestir-me de cerimónia.

Não sei sob que pretexto. Não era um andrajoso. Tinha um certo porte. Mais velho do que eu. Tive a intuição nítida de que me iria falar do casamento. Ele parecia adivinhar o novelo de dúvidas que me toldavam a cabeça. Não percebi nem nunca perceberei, como é que ele tomou conhecimento de que eu iria casar-me nessa manhã.

Num tom algo secreto e profético, advertiu-me, quase ao ouvido,… que eu visse muito bem o que iria fazer, onde me ia meter... Fingi desprezo pelo que ouvi, mas no fundo, fiquei embasbacado. Procurei não ligar.

Volta e meia, no futuro, as suas palavras, com muita verosimilhança, me acudiram à memória. Ainda hoje estou para entender o que se passou.

Também no dia anterior, me acontecera algo de estranho. Eu tinha acabado de comprar um carro em 2ª mão. Um Ami 6 [, imagem à direita, cortesia de Fórum Citröen]. Com ele eu fiz a mudança das minhas coisas do quarto alugado, onde vivia, para o apartamento que alugámos na alta de Algés.

Deslocava-me na minha última carga para o apartamento, subindo um troço de rua bastante íngreme e entrecruzado de ruas. Não conhecia ainda muito bem o carro. Era ao fim da tarde.

Eis que do meu lado direito vem uma motorizada com um fulano das obras. Gerou-se ali uma hesitação, de parte a parte. Eu não parei para ele passar, devido à inclinação do piso e porque sentira que o travão de mão não estava nas melhores condições.

Avancei e ele embateu-me no guarda-lamas da frente, do lado direito. Travei o carro com a primeira velocidade engatada para compensar o travão de mão. Sai do carro. Ele avançou para mim furioso. Em jeito de me vir espancar.

Deu tempo para me lembrar de que iria casar no dia seguinte. Por isso, procurei acalmá-lo como pude. Não queria mesmo nada aparecer todo esmurrado à cerimónia.

Fui-o entretendo. Sabia que o meu primo Carlos estava para chegar. Vinha instalar-me, creio que o esquentador.
- Ai, se o Carlos viesse agora!... pensei.

E, por milagre, ele apareceu mesmo, pouco depois, na sua carrinha Renault 4, toda branca. Respirei de alívio. O Carlos era também um peso pesado. Habituado ao duro. Ainda por cima, vinha com um ajudante, ainda mais pesado.

Já éramos três. O Carlos parou a carrinha. Deve ter-se apercebido logo de que havia problema, as coisas estavam complicadas. Apressados, vêm ter comigo e perguntam-me se estou a precisar de ajuda.
- Por acaso, até preciso. – respondi.

O sujeito olhou-nos a todos. Fez os seus cálculos e arrefeceu. Pouco depois, mas ainda a vociferar, pegou na bicicleta e desapareceu.
- Que alívio!...

Respirei fundo. Desta vez, deu mesmo certo.

No dia seguinte, depois do casamento e da boda, quando deixamos toda a gente ainda no festim, para seguirmos para a lua de mel, como costumam fazer os noivos, a A.T. perguntou pelo carro:
- Então e o carro?

Contei-lhe tudo o que se tinha passado. Desatamos a rir à gargalhada.
- Agora, apetece rir, mas ontem, as coisas estiveram muito feias. Ia ser bonito. Se ele me começasse a chegar, eu não me ficava. Estaria aqui com a cara toda esmurrada.
- Não faz mal. Vamos de comboio - adiantou.
- Até calha bem. A minha experiência de condução é pouca e o carro também não oferece muita confiança... e daqui até Viana do Castelo [,foto acima, Pousada de Viana do Castelo, Monte de Santa Luzia, cortesia de Spendia]...
- Óptimo. As coisas não acontecem por acaso - acrescentou -. A prenda dos meus padrinhos dá para tudo. Os bilhetes não custam assim tanto. E uma viagem de comboio até é romântico...
- Tens razão.

________________

Nota do editor;

(*) Último poste da série > 8 de junho de 2012 > Guiné 63/74 - P10012: Cartas do meu avô (7): Quinta carta: O primeiro encontro com... ela, e o meu regresso a casa, em Pedra Maria (J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil, CCAÇ 728, Bissau, Cachil e Catió, 1964/66)

sexta-feira, 30 de março de 2012

Guiné 63/74 - P9682: Agenda Cultural (191): Ciclo de Conferências-debate Os Açores e a Guerra do Ultramar - História e Memória(s) - 1961-1974 (Carlos Cordeiro) (11): Que promessa?, pela Prof.ª Doutora Gabriela Castro, dia 30 de Março de 2012 no Anfiteatro B da Universidade dos Açores

1. Mensagem do nosso camarada Carlos Cordeiro* (ex-Fur Mil At Inf CIC - Angola - 1969-1971), Professor na Universidade dos Açores, com data de 29 de Março de 2012:

Meu caro Carlos,
Amanhã, 30 do corrente, teremos a nossa sétima conferência do ciclo de conferências-debate "Os Açores e a Guerra do Ultramar - 1961-1974: história e memória(s)". Junto a notícia, nota biográfica e foto da conferencista, cartaz e prospeto.
Obrigadíssimo, querido amigo.
Não me puxes as orelhas por ir muito em cima da hora, please!!!

Um abraço amigo do
Carlos Cordeiro





BREVE NOTA CURRICULAR 

MARIA GABRIELA COUTO TEVES DE AZEVEDO E CASTRO é doutorada em Filosofia Contemporânea, especialidade de Estética e Teorias da Arte, pela Universidade dos Açores, com a dissertação intitulada A imaginação em Paul Ricoeur, filósofo que estuda desde 1988 e que foi também tema das suas provas de Aptidão Pedagógica e Capacidade Científica, em 1991, com um trabalho subordinado ao tema Os símbolos do trágico em Paul Ricoeur.

É directora do Centro de Estudos Filosóficos da Universidade dos Açores e docente dessa universidade, onde tem leccionado diversas disciplinas aos cursos de História, Filosofia e Cultura Portuguesa, Património Cultural e Arquitetura. Foi diretora do Departamento de História, Filosofia e Ciências Sociais daquela Universidade e tem liderado projetos investigação na área científica da sua especialidade.

É autora do livro intitulado Imaginação em Paul Ricoeur. Tem proferido conferências e comunicações em vários congressos e colóquios em Portugal e no estrangeiro, constando da sua bibliografia diversos artigos publicados em revistas da especialidade nacionais e internacionais e a colaboração em várias obras coletivas.
____________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 31 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9427: Agenda Cultural (185): Ciclo de Conferências-debate Os Açores e a Guerra do Ultramar - 1961-1974: história e memória(s) (Carlos Cordeiro) (10): Intervenção da Prof. Dra. Célia Carvalho, dia 3 de Fevereiro de 2012 no Anfiteatro B da Universidade dos Açores

Vd. último poste da série de 25 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9658: Agenda Cultural (190): A banda portuguesa Melech Mechaya em Lisboa, Cinema São Jorge, sábado, 31 de Março, 21h30... Convidada especial: Mísia...Ganda ronco! (João Graça)

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9427: Agenda Cultural (185): Ciclo de Conferências-debate Os Açores e a Guerra do Ultramar - 1961-1974: história e memória(s) (Carlos Cordeiro) (10): Intervenção da Prof. Dra. Célia Carvalho, dia 3 de Fevereiro de 2012 no Anfiteatro B da Universidade dos Açores (Carlos Cordeiro)

1. Mensagem do nosso camarada Carlos Cordeiro (ex-Fur Mil At Inf CIC - Angola - 1969-1971), Professor na Universidade dos Açores, dando-nos notícia de mais um acontecimento integrado no "Ciclo conferências-debates Os Açores e a Guerra do Ultramar – 1961-1974, história e memória(s)":

Meu caro Carlos,
Na próxima 6.ª feira teremos a nossa sexta conferência do ciclo de conferências-debate "Os Açores e a Guerra do Ultramar: história e memória(s)". Junto a notícia, nota biográfica e foto da conferencista, cartaz, prospeto (a foto do prospeto foi amavelmente cedida pelo nosso camarada e especial amigo José Câmara - encontro da CCaç 3327 "Os Nómadas", Angra do Heroísmo, Agosto de 2011), capa do livro (foto gentilmente cedida pelo camarada Humberto Reis). Acho que está tudo... e já não é pouco, para o trabalho que te estou a dar.

Um abraço do
Carlos



Ciclo de conferências-debate
Os Açores e a Guerra do Ultramar - 1961-1974
História e memória(s)

No âmbito do ciclo de conferências-debate “Os Açores e a Guerra do Ultramar – 1961-1974: história e memória(s)”, Célia Carvalho – Professora da Universidade dos Açores e Psicóloga Clínica/Psicoterapeuta, – proferirá, no próximo dia 3 de Fevereiro (6.ª feira), a conferência “Ressonâncias do passado com ecos no presente: tempo de fazer as pazes com a vida”.

Na mesma sessão será apresentado o livro, da autoria do antigo combatente Lino de Freitas Fraga, "Pátria porque nos abandonas? Sofrimentos de uma guerra".

A apresentação da obra estará a cargo de Carlos Cordeiro (foto à direita), coordenador da Comissão Científica do ciclo de conferências-debate.

O evento terá lugar no anfiteatro “B” do Pólo de Ponta Delgada da Universidade dos Açores, com início pelas 17H30, e estará aberto à participação de todas as pessoas interessadas.

Com início em Maio do ano transato, esta é a sexta conferência do ciclo de conferências-debate “Os Açores e a Guerra do Ultramar – 1961¬ 1974: história e memória(s)", uma organização do Centro de Estudos Gaspar Frutuoso do Departamento de História, Filosofia e Ciências Sociais da Universidade dos Açores.



Nota biográfica da Doutora Célia Carvalho

Natural de Coimbra, Célia Maria de Oliveira Barreto Coimbra Carvalho é licenciada, mestre e doutora em Psicologia – área de especialização em Psicologia Clínica – pela Universidade de Coimbra. A partir de 2003 passou a exercer as funções de professora da Universidade dos Açores e da Escola Superior de Enfermagem de Ponta Delgada, desempenhando, simultaneamente, atividade clínica. É também Consultora da University of Southern California, onde exerce as funções de Coordenadora Clínica das Investigações sobre as bases Genéticas da Esquizofrenia e dos Distúrbios Bipolares, a decorrer na Região Autónoma dos Açores e da Madeira. Tem integrado equipas de investigação de projetos a nível nacional e internacional.
É autora ou coautora de inúmeros artigos em revistas científicas nacionais e internacionais.

____________

Nota de CV:

(*) Vd. poste da última conferência-debate de 26 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9098: Agenda Cultural (171): Ciclo de Conferências-debate Os Açores e a Guerra do Ultramar - 1961-1974: história e memória(s) (Carlos Cordeiro) (9): Rescaldo da sessão do dia 23 de Novembro de 2011 (Carlos Cordeiro)

Vd. último poste da série de 24 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9393: Agenda cultural (184): Conferência "Voluntariado: Que futuro?" e Exposição de Fotografia "Rostos", fotos de rostos da crianças da Guiné-Bissau, a ter lugar no El Corte Inglês de V.N. de Gaia, dia 26 de Janeiro de 2012, pelas 17h00, na Sala de Âmbito Cultural, piso 6.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Guiné 63/74 - P9378: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (3): O stresse pós-traumático de guerra, em estudo da Universidade Autónoma de Lisboa (UAL), em colaboração com a Liga dos Combatentes (Hélder Sousa / João Hipólito)

1. Mensagem do nosso camarada Hélder Sousa (ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche e Bissau, 1970/72) com data de 14 de Janeiro de 2012:

Caros amigos Editores
Recebi este mail que vos reenvio, na convicção que podemos encontrar utilidade nos propósitos a que se propõe.

Por vezes são referidas as necessidades de se fazerem estudos para melhor se caracterizar os fenómenos relacionados com o stresse pós-traumático de guerra e melhor se poder relacionar com os elementos que sofrem com ele, no nosso caso particular os ainda viventes das "guerras de África".

O Prof. Dr. João Hipólito é meu amigo e já temos conversado sobre as questões relacionadas com os ex-combatentes, especialmente sobre a Guiné, pelo que sei que se trata de assunto sério e a ser tratado seriamente.

Há a questão dos envelopes a serem enviados para quem tem endereços, o que no nosso caso praticamente não existem, pelo que aqueles que se interessarem pelo assunto e quiserem colaborar nos trabalhos podem entrar em contacto através dos elementos (endereço postal, telefone e mail) indicados no final.

Pelo que está escrito também se espera que dentro de algum, pouco, tempo, o questionário esteja disponível na 'net', podendo ser respondido directamente por essa via.

Caso achem que esta divulgação tem cabimento no nosso Blogue, fica aqui à disposição.

Abraço
Hélder Sousa


2. Mensagem do Prof João Hipólito enviada ao nosso camarada Hélder Sousa:

Caro Hélder
A Universidade Autónoma de Lisboa, em colaboração com a Liga dos Combatentes está a realizar um estudo sobre o Stresse pós-traumático de guerra em particular e o da população em geral.

Estamos também a criar contactos para incluir no nosso estudos contactos de combatentes de Angola, Guiné e Moçambique que combateram quer do lado português quer do lado oposto.

Para que este estudo seja significativo precisamos do maior número possível de respostas. Por isso eu agradecia a colaboração de todas as “boas-vontades” para ajudar neste trabalho.

Neste momento nós estamos a enviar os questionários às pessoas dispostas a colaborar, combatente residindo em qualquer lugar ou não combatentes residindo em Portugal. Se nos disponibilizarem endereços de mail ou moradas nós poderemos enviar com um envelope já de resposta paga. Dentro de 2-3 semanas, deveremos ter o questionário on-line de maneira a poder ser respondido directamente pela internet.

Se os membros do vosso grupo estivessem dispostos a colaborar, seria uma enorme ajuda. Pensamos que este estudo, por um lado ainda nos ajuda agora no trabalho que fazemos com antigos combatentes em sofrimento; por outro lado na prevenção dos que actualmente estão em missões ditas de paz, e na sua integração no retorno à sociedade civil.

Muito grato pela atenção, ajuda e eventuais outros contactos que nos possam passar, apresento os meus mais cordiais cumprimentos e votos de um rico 2012 apesar da crise que no assola.

João Hipólito, MD. PhD.
Professor Catedrático
Director
Departamento de Psicologia e Sociologia
R. Sta. Marta 47 - 3º  Andar
1169-023 Lisboa
Tel.: 21 317 76 00
Fax.: 21 353 37 02
joao.hipolito@ual.pt
http://www.blogger.com/www.universidade-autonoma.pt






____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6791: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (2): Tina Kramer, etnóloga, Universidade de Frankfurt, em trabalho de campo, em Lisboa

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Guiné 63/74 - P8200: Agenda Cultural (117): Início do ciclo de conferências-debate Os Açores e a Guerra do Ultramar, 1961-1974: história e memórias(s), organizado pela Universidade dos Açores (Carlos Cordeiro) (1): Convite para o dia 6 de Maio de 2011



















1. Mensagem de Carlos Cordeiro, com data de 1 do corrente:


 Caros editores:


Com um abraço daqui do meio do Atlântico, segue a informação para, se acharem conveniente, inserirem na “Agenda Cultural”.


Um agradecimento muito especial ao Luís por me ter concedido autorização para utilizar, no material de divulgação, a belíssima foto de Arlindo Teixeira Roda, retirada do blogue.


Um abraço amigo do
Carlos (C).


Carlos Cordeiro (ex-Fur Mil At Inf – CIC – Angola - 1969-71 -, irmão do malogrado Cap Pára João Cordeiro / Prof Auxiliar com Agregação da UAC / Departamento de  História, Filosofia e Ciências Sociais)



2. Ciclo de conferências-debate intitulado “Os Açores e a Guerra do Ultramar, 1961-1974: história e memórias(s)”,




No próximo dia 6 do corrente, terá início, na Universidade dos Açores, o ciclo de conferências-debate intitulado “Os Açores e Guerra do Ultramar – 1961-1974: história e memórias(s)”, numa organização do Centro de Estudos Gaspar Frutuoso, do Departamento de História, Filosofia e Ciências Sociais daquela Universidade.


Esta primeira conferência será proferida pelo Tenente-General Alfredo da Cruz e tem por título “A Força Aérea na Guerra do Ultramar. Experiência de um piloto de combate”.


O Ten-Gen  Pilav Alfredo dos Santos Pereira da Cruz, natural de Alcobaça, foi combatente em Moçambique (1971-1973) como piloto de helicópteros AL III, [, foto à direita, fonte: EMFA, com a devida vénia,]  tendo sido condecorado com a Cruz de Guerra.


 A partir de 1989, foi nomeado para diversas comissões de serviço nos Açores, desempenhando actualmente o cargo de Comandante Operacional dos Açores.


A conferência terá lugar no anfiteatro “C” do Pólo de Ponta Delgada da Universidade dos Açores, com início pelas 17H30 do dia 6 do corrente [, 6ª feira].


Carlos Cordeiro
_____________


Nota do editor:


Último poste da série > 27 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8172: Agenda cultural (116): O documentário de Diana Andringa sobre o Campo de Chão Bom / Tarrafal passa hoje na RTP1, às 23h00: Entre 1962 foram deportados para lá 100 presos políticos guineenses, 60 foram libertados em 1964 e os restantes em 1969

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Guiné 63/74 - P8182: O Mundo é Pequeno e a Nossa Tabanca... é Grande (41): Projecto de investigação da Universidadade do Minho ["Narrativas identitárias e memória social: a (re)construção da lusofonia em contextos interculturais" ] selecciona o nosso blogue numa amostra bloguística portuguesa, brasileira e moçambicana

1. O nosso editor (e fundador do blogue) Luís Graça [, foto à esquerda,] recebeu no passado dia 23 de Março a seguinte mensagem da investigadora da Universidade do Minho, Lurdes Macedo:



Data: 15 de Março de 2011 12:00 AMCaro Prof. Luís Graça,
Obrigada pela sua disponibilidade. Terei que ir a Lisboa no início de Abril para entrevistar outros bloguistas. Por isso, organizar-me-ei de modo a entrevistar todos os bloguistas na mesma deslocação. Diga-me, por favor, em que dias da semana e em que horários tem disponibilidade para me conceder a entrevista.

Também gostaria de entrevistar alguns dos colaboradores e seguidores do seu blogue. Estas entrevistas são enviadas por e-mail. Por isso, quando eu o entrevistar, aproveitarei para lhe pedir o contacto de alguns colaboradores e seguidores. Pode ser?

Saudações,

Lurdes Macedo.


3. Tive há dias uma agradável e estimulante conversa, de mais de 3 horas, no meu local de trabalho,  com a Dra Lurdes Macedo,  e já pedi aos restantes editores e colaboradores do blogue para darem o seu OK, no seu caso de virem convidados para serem entrevistados no âmbito deste projecto... Aqui vai o meu mail enviado em 28 do corrente:Caros editores e demais conselheiros/colaboradores permanentes do nosso blogue:

Peço a vossa melhor atenção para este pedido da investigadora e doutoranda Maria de Lurdes de Sousa Macedo, da Universidade do Minho, Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS).



O projecto de investigação "Narrativas identitárias e memória social: a (re)construção da lusofonia em contextos interculturais" (coordenado pela Prof. Rosa Cabecinhas) parece-me interessante, e a equipa idónea. A lusofonia é também uma das nossas bandeiras.Dei-lhe os vossos contactos para poderem eventualmente serem contactados e entrevistados sobre a vossa experiência como antigos combatentes e como membros de nosso blogue bem como sobre a vossa percepção da importância do nosso blogue em termos de contributo para o desenvolvimento da lusofonia... Ele já esteve comigo, aqui em Lisboa, respondi-lhe a uma longa (mas interessante) lista de questões.

Um Alfa Bravo. Divirtam-se: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca é... Grande. Luis

PS - A Dra. Lurdes Macedo mora em Espinho, embora seja de Viseu. 

  
4. Comentário do nosso colaborador permanente Hélder Sousa:


Olá Luís


Esta é mais uma prova de como o nosso Blogue tem sabido ganhar créditos junto de uma ampla camada de 'observadores' que o consideram credível, passível de ser utilizado em investigações, em consultas, em parcerias. Isso deve-se à postura de grande abrangência que tem sabido manter (apesar das dificuldades) e da coerência e constância da sua linha de rumo.


O Blogue dá confiança. O Blogue transmite a ideia de rigor. Não se trata de não falhar a indicação de um dia exato para um determinado acontecimento... O rigor vem da postura da procura de apresentar os factos o mais documentados possível, sempre corrigindo, quando é caso disso e também ilustrando as situações.


Pois que contem connosco. O que interessa é que os depoimentos, as intervenções, sejam 'escorreitas', 'certinhas'. Digo isto porque não nos caberá determinar o sentido das conclusões do estudo, que será certamento o que for (la Palisse não diria melhor...) e podem até chegar a conclusões que nos pareçam desajustadas, mas o que importa é o fundo do que se vier a dizer ou escrever.


Abraço


Hélder
______________


Nota do editor:


Último poste da série > 12 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8086: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (40): O Domingos encontrou-me!.. Ele era a mascote da CCAÇ 462, Ingoré (1963/65) (J. Marques Ferreira)

domingo, 29 de novembro de 2009

Guiné 63/74 - P5372: Agenda cultural: (49): Síntese da minha comunicação no Colóquio Internacional na Universidade dos Açores (Carlos Cordeiro)




1. A propósito da sua intervenção no Colóquio Internacional Representações de África na Universidade dos Açores*, que teve lugar entre os dias 26 e 28 de Novembro de 2009, recebemos estas duas mensagens do nosso camarada Carlos Cordeiro**:



Esta no dia 27 de Novembro de 2009:

Meu caro Carlos,
Obrigado por tudo. Foi um incentivo muito especial ter-te encontrado como amigo e ter feito outros amigos (muito em especial o José Câmara) para avançar com este trabalho que, afinal, irá crescer em fôlego. Agora pude dizer pouco: em 20 minutos diz-se pouco. Tinha, como se imagina, algum receio. Estava entre os "meus pares" historiadores (eu considero-me somente "aprendiz de historiador") que têm grandes reservas sobre esta coisa de apresentar uma comunicação exclusivamente baseada num blogue e recursos da Internet (como fiz gala de repetidamente afirmar).

No fim, o coordenador da mesa disse: "cuidado - não tentem fazer esta experiência em casa". Foi a brincar, evidentemente. Mas... lá estava um colega a defender(-me) que os historiadores de hoje não podem deixar de ter em conta os blogues, até porque, como são abertos, estão sujeitos ao contraditório. Uma colega de Estudos Culturais e Comunicação comentou que nunca tinha aberto qualquer blogue com um "livro de estilo" e regras de conduta ética como o nosso.

O Tomás esteve presente (aliás, também como técnico) e depois conversámos sobre a minha comunicação.

Correu bem, mas exigirá, para a publicação, de umas quantas noitadas. Oxalá não venha mais tarde a pagar caro estas aventuras...

Um abraço amigo do
Carlos


E esta, hoje dia 29:

Caro Carlos,
O prometido é devido! Segue um pequeno resumo da minha comunicação. Em 20 minutos não se pode dizer grande coisa e eu, ainda por cima, não falo muito depressa e gosto de cumprir o tempo que me dão, pois também sou rigoroso quando presido a este tipo de sessões. Além disso, quis também aproveitar para apresentar alguns dados sobre a participação de militares açorianos na Guerra do Ultramar.

Como poderás ver, não disse nada de especial para nós, que acompanhamos o blogue diariamente. Como estava entre historiadores profissionais e alunos, achei que devia trazer a debate esta importante questão dos relatos de guerra na "primeira pessoa", nas suas potencialidades e reservas.

Não houve críticas (expressas) à comunicação. As duas intervenções de assistentes foram no sentido positivo. Uma, salientando o facto de os historiadores dos tempos modernos não poderem alhear-se das informações dos blogues, até porque são espaços abertos e, portanto, sujeitos constantemente ao contraditório, e outra (muito positiva para o blogue) a destacar o ineditismo (pelo menos para a colega que interveio) de um blogue com "livro de estilo".

Para a publicação, irei então desenvolver a temática, apresentando exemplos. Vou ter que percorrer o blogue com cuidado.
Desculpa o arrazoado.

Um abraço


Síntese da comunicação do nosso camarada Carlos Cordeiro

O Dr. Carlos Cordeiro, num instantâneo, durante a sua intervenção

[…]
A ideia de apresentar esta comunicação surgiu-me depois de, por razões de ordem particular, ter consultado o blogue “Luís Graça & Camaradas da Guiné”, que passei a acompanhar assiduamente […].

Nesta comunicação procura conhecer-se e, talvez, numa fase posterior, avaliar-se a importância da “massificação” do acesso à Internet enquanto elemento enriquecedor do acervo de fontes históricas à disposição do investigador e, no caso concreto, para a história da Guerra do Ultramar […].

O blogue “Luís Graça & Camaradas da Guiné”, constitui a II série do “blogue-fora-de-nada”, iniciado por Luís Graça, no ano de 2004. A partir de Abril de 2005, Luís Graça, como antigo combatente, começa a dar relevo especial à guerra na Guiné, acabando, a partir de Junho do mesmo ano, a blogue dedicado exclusivamente a assuntos ligados à guerra e aos ex-combatentes que ali estiveram em comissão militar[…].

A partir daí, não parou de aumentar a participação no blogue, do que resultou a incapacidade de armazenamento da informação – textos, fotografias, mapas. Ao fim de um ano de existência e com 825 entradas ou postes, passou a ser alojado noutro servidor, com o título “Luís Graça & Camaradas da Guiné”. Dadas as exigências do crescente trabalho de edição, Luís Graça passou a contar com três co-editores, também antigos companheiros (ou camaradas, na terminologia militar) da Guiné. Nesta altura, e já convencido da importância que o blogue vinha assumindo, o editor apelava:

Junta as tuas às nossas fotos, divulga e salvaguarda os teus aerogramas, cartas, relatórios, diários, documentos militares ou papéis esquecidos guardados no sótão, num velho baú, reconstitui as tuas memórias, recorda os sítios por onde passaste, viveste, combateste, sofreste... Ajuda os teus ex-camaradas a reconstituir o puzzle da memória da Guiné (1963/74)... Faz-te bem, a ti e a eles, a todos nós, ex-combatentes, portugueses ou guineenses... Além disso, prestas um pequeno serviço à geração dos teus filhos e dos teus netos... Para que eles, ao menos, não possam dizer, desprezando o teu sacrifício: "Guiné?... Guerra do Ultramar? Guerra Colonial? Guerra de libertação ?... Não, nunca ouvi falar!".

Como critérios éticos que os participantes devem respeitar, são defendidos, entre outros, os seguintes: respeito mútuo; partilha da informação; respeito pelo povo da Guiné e pelo “inimigo de ontem”, recusa da auto-culpabilização e da responsabilidade colectiva; não intromissão na vida política interna da República da Guiné-Bissau; respeito, acima de tudo, pela verdade dos factos; liberdade de pensamento e de expressão e respeito pela propriedade intelectual e direitos de autor3.

Feita a breve apresentação do blogue, convém ainda apontar alguns dados estatísticos:

- Até 23 de Novembro tinham sido publicados 5214 postes.

- No ano de 2008 foram publicados 1208 postes, número já ultrapassado no corrente ano. O número de tertulianos ultrapassa já as três centenas, cerca de 70% dos quais antigos alferes, furriéis e capitães milicianos.

Evidentemente que, como anteriormente se referiu, é elevado o número de páginas e blogues da Internet que se referem a assuntos da guerra do Ultramar e aos ex-combatentes. Considerámos este como exemplo, dada a sua relevância enquanto fonte para o conhecimento do contexto da guerra na Guiné, permitindo o cruzamento de informações, o acesso a fotografias de época, a consulta de relatórios (alguns confidenciais) o complemento ou correcção de informações oficiais (por exemplo, relatórios oficiais de operações) com as vivências de quem esteve no terreno, as condições de vida nos aquartelamentos, a convivência com as populações, tudo isto pontuado pelas recordações dos momentos de aflição e de descontracção. O que não há (salvo um ou outro caso sem relevância) é a reivindicação de actos heróicos próprios. O heroísmo, quando surge, é geralmente atribuído ao camarada do lado […].

Não estamos, naturalmente, perante fontes totalmente fiáveis. Grande parte da participação resulta de memórias pessoais, com as lacunas e imprecisões próprias da passagem de, no mínimo, 35 anos. Mesmo estas falhas são, amiúde, completadas e corrigidas por outros participantes, quer nos comentários, quer em novos postes, o que, em diversas situações, chega mesmo a despertar polémicas e controvérsias muito significativas, como, por exemplo, o caso da retirada (ou fuga, para alguns) de Guileje. Mas há também transcrições de diários de guerra e de correspondência nos fornecem informações “em cima da hora” […].

Seriam inúmeros os exemplos de textos e fotografias (algumas carregadas de dramatismo) que viriam, ao menos, abrir o debate sobre contextos e episódios da guerra do Ultramar como a historiografia os tem abordado […].

Saliente-se, por outro lado, que, mesmo tendo em consideração a liberdade de pensamento e de expressão como um dos valores defendidos pelo “livro de estilo”, o certo também é que se pede “respeito, acima de tudo, pela verdade dos factos”. E, neste sentido, a equipa editorial não se exime à responsabilidade de, em situações duvidosas, solicitar esclarecimentos adicionais aos respectivos autores.

Quanto às representações de África e dos africanos [tema geral do colóquio], “Luís Graça & Camaradas da Guiné” é riquíssimo. Se, por um lado, o relato das memórias factuais – situações de tensão e perigo, vida nos aquartelamentos, actividades operacionais, etc., são, em grande parte, carregadas de pessimismo, por outro, nas situações de descontracção, a escrita assume o carácter de quase fascínio por aquela terra e aquelas gentes. Isto, aliás, é bem patente nas viagens de saudade e solidariedade que muitos desses tertulianos fizeram e continuam a fazer à Guiné. A visão do povo é também a do carinho, estima e compreensão […].

Continuando esta viagem pelos caminhos da Internet, pude verificar que, quer quanto à quantidade quer quanto à qualidade, a informação disponibilizada possibilitaria, por exemplo, a elaboração de quadros sobre a participação de unidades militares mobilizadas pelos BII17 (Angra do Heroísmo) e BII18 (Ponta Delgada). O sistema de busca facilita, sem dúvida, a investigação. É evidente que os dados são retirados da Resenha Histórico-militar das Campanhas de África, da responsabilidade da Comissão para o Estudo das Campanhas de África, mas isto não lhes retira qualquer valor. Um outro recurso muito importante, também disponibilizado pela Internet é a lista de mortos na guerra do Ultramar.

Concluindo: o que se pretendeu com esta comunicação foi apresentar à discussão a possibilidade de aproveitamento de informações de blogues como fontes históricas, nomeadamente quanto às vivências de guerra, contadas na primeira pessoa, de centenas de milhar de portugueses que passaram pela guerra do Ultramar. Evidentemente que há o recurso a outras metodologias, como a realização de entrevistas, inquéritos, consulta da documentação existente no Arquivo Histórico Militar e nas unidades mobilizadoras, não esquecendo também a imprensa, etc.. É, no entanto, de ter em conta que, naqueles fóruns os participantes se sentem como “iguais” (no blogue que analisámos o tratamento é obrigatoriamente por tu e camarada) e, de algum modo, compreendidos e solidários e, portanto, mais “verdadeiros” no que relatam. Mas também estamos conscientes das fragilidades deste tipo de investigação e da necessária filtragem e crítica da informação. Além disso, a esmagadora maioria dos participantes tem um nível de instrução ou de posição socioeconómica que ultrapassa a generalidade dos militares que estiveram na guerra, já que são na sua maioria ex-furriéis e alferes milicianos.

Pretendemos também testar páginas da Internet sobre a guerra do Ultramar para procurar verificar o tipo e qualidade de informação que de lá podíamos aproveitar para um estudo sobre as unidades militares açorianas nos três TO. O certo é que, com algumas falhas sem significado, conseguimos obter informações sobre as unidades militares mobilizadas, os teatros de operações onde prestaram serviço, o número de mortos em campanha e concelhos de onde eram naturais. Não se trata da solução para o trabalho do investigador, mas de mais uma ferramenta de que pode servir ao historiador para desenvolver o seu trabalho.


Dr. Carlos Cordeiro, Professor de História Contemporânea na Universidade dos Açores, Ilha de S. Miguel, Ponta Delgada, usando da palavra.


2. Comentário de CV:

Face a esta fatia sintetizada da intervenção do nosso camarada Carlos Cordeiro no Colóquio realizado muito recentemente na Universidade dos Açores, na dupla qualidade de estudioso da História Contemporânea e ex-combatente na guerra colonial, onde salientou o papel do nosso Blogue como repositório de memórias dos ex-combatentes da Guiné, qualificando os nossos propósitos e salientando o modo como convivemos entre nós, só nos podemos sentir orgulhosos por esta exposição num meio especializado de historiadores. Foi aceite que os Blogues não podem ser ignorados como fonte de informação, principalmente quando, modéstia à parte, como o nosso, apresentam um grau de qualidade e veracidade comprovada, e discutida abertamente por todos os intervenientes e leitores. Todos os nossos depoimentos estão sujeitos à crítica e aos reparos, se algo que não estiver totamente de acordo com a realidade vivida então.

Por outro lado, estamos gratos ao Dr. Carlos Cordeiro, na sua qualidade de historiador, por levar até junto dos seus pares o conhecimento da nossa existência.

A partir de hoje devemos sentir ainda mais orgulho no nosso trabalho, e ganhar forças para prosseguir esta tarefa, que só terminará quando o último de nós já não souber sequer o seu próprio nome. As nossas memórias têm que passar para ciberespaço, quanto antes, para ficarem acessíveis a quem delas se quiser servir no futuro.

Em frente camarigos.

Aos que ainda não se apresentaram à Tabanca Grande julgando que as suas memórias são deprezíveis, convido a vir até nós, porque todos somos poucos e cada testemunho é um acontecimento que fará parte da História que alguém há-de compôr.
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 23 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5325: Agenda Cultural (46): Colóquio Internacional Representações de África na Universidade dos Açores (Carlos Cordeiro)

(**) Carlos Cordeiro é um ex-combatente em Angola, onde fez a sua comissão de serviço como Fur Mil At Inf no Centro de Instrução de Comandos, nos anos de 1969/71.
Vive em Ponta Delgada, Ilha de S. Miguel, onde é professor de História Contemporânea na Universidade dos Açores.

Vd. último poste da série de 25 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5341: Agenda Cultural (48): Lançamento do livro Era uma vez... Ciência e Poesia no Reino da Fantasia, de Regina Gouveia (José Teixeira)

terça-feira, 3 de julho de 2007

Guiné 63/74 - P1916: Álbum das Glórias (16): O Doutor Leopoldo Amado... ou a segunda derrota de Spínola (João Tunes)

Universidade de Lisboa Faculdade de Letras > Reitoria > 28 de Maio de 2007 > Provas Púlicamento em História Contemporânea > O Leopoldo Amado defendendo a sua tese Guerra colonial 'versus' guerra de libertação (1963-1974): o caso da Guiné-Bissau (1).

O Leopoldo no meio do júri das suas provas de doutoramento. O principal arguente, o coronel na reforma, Afonso Aniceto, é o terceiro a contar da esquerda.

Dados biográficos sobre Aniceto Afonso: (i) Tenente-Coronel do Exército, na reserva desde 1985; (ii) Curso da Academia Militar em 1963; (iii) Comissões em Angola (1969-1971) e Moçambique (1973-1975); (iv) Licenciatura em História pela Faculdade de Letras de Lisboa em 1980; (v) Mestrado em História Contemporânea de Portugal pela mesma Faculdade em 1990; (vi) Professor de História Militar na Academia Militar de 1982 a 1985; (vii) Director do Arquivo Histórico Militar (Lisboa) desde 1993 (até 2007); (viii) Membro da Comissão Portuguesa de História Militar desde 1998.

O Lepoldo entre os seus dois orientadores, a Prof Doutora Isabel Henriques, e o Prof. Doutor João Medina, do Departamento de História da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

O João Tunes e o Leopoldo, ou melhor, o João Tunes (2) "transmitindo a Leopoldo Amado aquilo que, nestas situações, pode fazer de melhor um amigo e admirador: absoluta confiança no reconhecimento dos seus esforçados méritos"... Acho que não há melhor legenda (LG).

Luís Graça e o Leopoldo, ou melhor, o Luís Graça, em nome da Tabanca Grande, manifestando a sua solidariedade, apreço e regojizo a um grande lusoguineense, no culminar de um processo que o levou, brilhantemente, a obter mais um grau académico, motivo de orgulho para os seus amigos e familiares, mas também para os seus irmãos guineenses...

1. Mensagem do Leopoldo Amado, membro da nossa tertúlia, nosso amigo, agora Doutor em História Contemporânea pela Universidade de Lisboa:

Em jeito de eterna gratidão, envio-te algumas fotos como testemunho da tua solidariedade nos dias das minhas provas públicas de Doutoramento.

Um abraço

Leopoldo Amado

2. Tomo a liberdade de reproduzir aqui, para conhecimento dos demais tertulianos, o texto que o João Tunes publicou no seu blogue, de homenagem ao novo Doutor em História Contemporânea, o seu (e nosso) amigo Leopoldo Amado. É uma maneira única e muito original de fazer um elogio a um amigo e a um povo (que vale pelos filhos que tem, mesmo aqueles que são obrigados a viver na diáspora):

Água Lisa (6) > 29 de Maio de 2007 > O Leopoldo saldou-me as contas (O destaque a bold e a cores é da responsabilidade do editor do blogue, L.G.)


Desses dois anos (1969-1971) enfiado dentro de um fato camuflado a olhar gentes e bolanhas num país ocupado e metralhado, gastando - num equivocado paradoxo - tempos que seriam bem melhor aproveitados a podar a árvore da vida quando esta me oferecia seiva para dar e vender, a apanhar porrada de criar bicho, mandado por um general educado pelos nazis em Estalinegrado e que nunca perdeu o ademane de actor em artes de militarismo prussiano que sinalizava com um vidrinho pendurado num olho, auto-reduzindo-me à expressão mínima de jovem mal fardado feito parvo e perdido a mando colonial de um país a mudar de ditador sem que a lucidez acordasse e varresse os podres do fascismo tuga de raiz católico-clerical, estou finalmente vingado. Porque o Leopoldo pagou-me as contas e deixou-me em dia ao tirar-me da garganta a espinha atravessada da guerra colonial.

Ao olhar e ouvir o presidente de um júri de doutoramentos da Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa comunicar que o Leopoldo - que antes ali tinha depositado e brilhantemente defendido o seu labor de tese sobre a guerra na Guiné, acrescentando história à memória, permitindo que a ignomínia daquela guerra seja vista pelos dois lados e outros que se queiram acrescentar -, era um novo Doutor em História Contemporânea aprovado com distinção, senti-me com as contas feitas.

E logo ali, naquela solenidade académica herdada do velho regime, feita para lustre dos bonzos académicos que engraxavam as botas do salazarismo tardio e onde formatavam novas fornadas de elites para as orgias de domínio nos banquetes da opressão fascista-colonial, mas cuja arquitectura (o que aquela Cidade Universitária tem para contar…) muitas vezes escutou os gritos de revolta estudantil a preferir a aventura da liberdade ao bolor da reprodução de castas e os seus muitos passos ligeiros e acelerados da fuga ao trote das botas cardadas da polícia de choque que guardava o regime da iniquidade, um historiador, um guineense, um preto bem preto, um humilde e sábio africano enobrecido com a grandeza da dignidade africana que desafia, pelo saber, a arrogância do academismo eurocêntrico, trazendo consigo a herança da sabedoria longa feita praxis do génio de Amílcar Cabral, desdobrando em tese demonstrada como é que um grupo de nacionalistas africanos derrotou a poderosa máquina do exército colonial português, sem esperar pelo 25 de Abril, pois quando ele se deu já a Guiné-Bissau era um país independente reconhecido por mais Estados que os que tinham relações diplomáticas com o decrépito Estado de Portugal.

E quando aquela tão clássica Universidade doutorou o Leopoldo, foi como se Spínola, o grandioso General Spínola, lá no sossego do seu túmulo, levasse com a sacudidela da segunda derrota na Guiné. A definitiva, a que lhe pode dar, se ele a aceitar, o descanso eterno.

Caro Doutor Leopoldo Amado, guineense de cepa e meu caro amigo, obrigado, muito obrigado. Pagaste a minha conta, ela está paga. Falta o livro, venha o livro.

_____________

Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 29 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1794: Blogoterapia (21): Falar da guerra, com pudor... e com alegria do novo Doutor, Leopoldo Amado (Luís Graça)

(2) Vd. post de 15 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - CXC: João Tunes, o novo tertuliano

quinta-feira, 24 de maio de 2007

Guiné 63/74 - P1783: Tese de doutoramento de Leopoldo Amado: Guerra colonial 'versus' guerra de libertação (João Tunes)


Guine > Região de Tombali > Guileje > 1970 > "Junto foto do meu arquivo referente a uma das alturas em que estive em Guileje, datada de Maio de 1970. Em primeiro plano, a rede de protecção em arame farpado. Atrás, abrigos e porta de armas. Vêm-se ainda os telhados, da esquerda para a direita, da caserna, do refeitório e do posto de transmissões"

Foto e legenda: © João Tunes (2006). Direitos reservados


Com a devida vénia transcrevo aqui a excelente peça bloguística, produzida pelo nosso camarada João Tunes, e inserida no seu blogue - Água Lisa (6) - , com data de 21 de Maio de 2007. 

O João, que foi Alf Mil Trms, no Pelundo e em Catió (1969/71), é um dos nossos camaradas que mais tem reflectido sobre o contexto político e ideológico em que se desenrolou a guerra colonial (1971/74). 

Às vezes, polémico, crítico, contundente, incómodo, cultivando a frontalidade, o João é sobretudo um cidadão militante e livre, um homem de grande lucidez e generosidade, absolutamente indispensável como maître à penser nesta nossa Tabanca Grande. 

Tenho saudades tuas, João. Visita-nos mais vezes. Ou melhor: não precisas de pedir licença para entrar, que a casa também é tua, pese embora nem sempre te sintas confortável nos espaços fechados, exíguos e às vezes clautrofóbicos, desta caserna da tropa, preferindo desenfiares-te para a bolanha, a savana arbustiva, o rio ou a floresta-galeria... (LG)


Segunda-feira, 21 de Maio de 2007 > GUERRA COLONIAL / GUERRA DE LIBERTAÇÃO
por João Tunes 

(Subtítulos e links da responsabilidade de L.G.)



A guerra colonial ainda resiste como tabu contornado na sociedade portuguesa. A abordagem deste drama, que durou treze anos, marcando, em perdas e danos, muitas dezenas de milhares de portugueses hoje acima dos 55 anos de idade mas que se repercutiu nos seus familiares, deixando assim marcas em várias gerações, não alcança, em termos de ocupação de memória e de evidência histórica, comparado com o espaço memorialista, narrativo e analítico ocupado pelo drama conexo e consequente da descolonização, uma repartição similar. E o filtro do ressentimento gerado pelo drama da descolonização foi e é um formidável gerador de preconceitos que actua como espécie de coveiro de memória relativamente ao drama colonial (antes da guerra e durante esta). Como se, para a maioria dos portugueses, se tivesse descolonizado aquilo que não se colonizou e se resistiu a permitir a separação, persistindo-se assim no mito salazarista difuso do Portugal “do Minho a Timor”, prolongando um ressentimento colectivo por nos terem arrancado, à má fila, bocados que “eram nossos”.

Guerra colonial, guerra do ultramar, guerra de libertação...

Mas os portugueses que falam e escrevem sobre a guerra colonial (alguns preferem chamar-lhe “guerra no ultramar”, o que tem uma marca política evidente, enquanto para os africanos ela é denominada como “guerra de libertação”, o que também significa muito) têm ainda, independentemente do enquadramento político e ideológico sobre ela, uma visão inevitavelmente eurocêntrica. Ou seja, é sempre um olhar sobre este sofrimento (ou gesta, para os “patriotas”) sedimentado da experiência ou da percepção interpretativa do "lado do colono" (no mínimo, do ponto de vista cultural), mesmo quando esse "colono" procura, o mais possível com o que melhor sabe, colocar-se na pele do "colonizado" e adoptar a sua causa.

Mia Couto, um escritor moçambicano de pele branca, exemplificou bem as diferenças quando referiu que enquanto os portugueses falam de "descolonização", os africanos não usam este termo porque para eles o que existiram foram "independências" (ou seja, não foram os europeus que descolonizaram, foram os africanos que conquistaram as independências dos seus países).

[É elucidativo que, quanto ao Campo de Concentração do Tarrafal, em Cabo Verde, esse mimetismo maior feito pelo salazarismo relativamente à perfídia do nazismo, depois replicado em vários outros locais de África, haja, entre a literatura do antifascismo militante, uma constância de referência ao período 1936-48, em que lá estiveram internados prisioneiros políticos europeus, quase se silenciando que o mesmo e odioso Campo foi reaberto em 1961, por despacho de Adriano Moreira, esse hoje notável e venerando professor de boas práticas democráticas, onde dezenas de milhar de africanos penaram até 1974. Quase parecendo que, nessa mesma iniquidade, um africano anticolonial sofreu menos que um antifascista europeu, quando o inverso é que foi verdadeiro.]

Um enorme défice de produção documental e de investigação historiográfica, do lado africano

Entretanto, da parte africana, muito mais escassa ainda é a produção de registos memorialistas e trabalhos históricos sobre as guerras de libertação. Por variadas e evidentes razões (altas taxas de analfabetismo e ileteratícia; atribulações políticas; falta de arquivos; fragilidade das estruturas e meios académicos; menor horizonte de vida que levou a que muitos dos que combateram já tenham falecido; maiores preocupações em sobreviver, consolidar a independência e garantir o futuro que lidar e fazer registo do passado).

Neste quadro, se os “antigos colonos” perdem pouco tempo a lembrar e pensar o passado colonial, os “antigos colonizados” ainda menos o fazem, o que beneficia o alargamento (conveniente para uns tantos) do “buraco histórico” que a guerra colonial / guerra de libertação representa na memória dos portugueses e dos africanos que têm como pátrias suas as antigas colónias portuguesas, sobrando, inevitavelmente, o espaço para os mitos e os ressentimentos, maus conselheiros para a saúde cívica dos povos.

Daqui que considere um facto notável, remando contra o silêncio das memórias, o trabalho persistente e competente do historiador guineense Leopoldo Amado (na foto de cima). Que, constituindo uma importantíssima e honrosa excepção, submete, no próximo dia 28, a um júri de doutoramentos da Universidade Clássica de Lisboa, em sessão pública, o seu notável trabalho de investigação sobre a guerra na Guiné (1963-1974) e que culminou num estudo comparado da mesma quanto aos dois lados da contenda (a mais dura no quadro das três guerras coloniais) e em que foi orientado pelo Professor João Medina (*) (**). Demonstrando, em boa tese, que os mitos e os ressentimentos abatem-se pelo saber.

_________

(*) Assim reza a nota informativa da Universidade Clássica de Lisboa:

Doutorando/a: Lic.º Leopoldo Victor Teixeira Amado
Doutoramento: Doutoramento em História - História Contemporânea
Título da Tese: “Guerra Colonial versus Guerra de Libertação (1963-1974): O Caso da Guiné-Bissau”
Data/Hora: 28 de Maio, 10H00
Local: Reitoria - Sala de Doutoramentos, Cidade Universitária, Lisboa


(**) – O meu elogio antecipado ao trabalho académico de Leopoldo Amado fundamenta-se no conhecimento prévio de que beneficiei, mercê da sua amizade que muito me honra, e para o qual, modestamente, dei o meu singelo contributo de mera opinião crítica na fase de elaboração final, valendo-me, como suporte, da memória registada no meu corpo e na minha alma, proveniente de dois registos contraditórios e num paradoxo que me empalou a juventude - o de antigo combatente na Guiné nas fileiras do exército colonial e o de militante activista contra a guerra colonial.

domingo, 25 de fevereiro de 2007

Guiné 63/74 - P1548: As cartas do nosso (des)contentamento (A. Teixeira-Pinto / Luís Graça)

Guiné > Bissau > Postal da época. Estátua de Teixeira Pinto. Foto: © João Varanda (2005). Direitos reservados.

 
1. Do Prof Doutor A. Teixeira-Pinto, da UTAD - Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, recebi a seguinte mensagem (creio tratar-se do Prof. Doutor Amândio Teixeira-Pinto, do Departamento de Engenharias da UTAD, Vila Real). Os negritos são da responsabilidade do editor do blogue: 

 Caro Colega: Vi a Carta da Região de Teixeira Pinto (agora Cachungo) na Guiné, que considero um excelente documento. Já não posso concordar com a preocupação que espelha em não ofender os guinéus, como se a publicação de uma carta ou a divulgação da nossa História e de antepassados (de que pessoalmente me orgulho) pudessem ser ofensivos para quem quer que seja (1). 

 A divulgação é feita em Portugal, não na Guiné, e parece-me perfeitamente descabida essa referência de "que não pretende por em causa a independência ou soberania do povo irmão da Guiné". Desta feita jamais poderíamos falar no nosso passado por esse Mundo fora, sem ter de pedir desculpa de lá termos estado. É perfeitamente lamentável e indesculpável esse tipo de atitude. Não precisamos de fazer qualquer exorcismo para nos redimirmos do passado. Quer queiramos quer não, ele pertence-nos com defeitos e virtudes, não o podemos renegar. Não conheço outro País onde se ande permanentemente a pedir desculpa do que fomos e dos pretensos males que fizemos no passado

Como investigador de História, como creio que é, basta lembrar o quase extermínio dos índios americanos, a questão dos aborígenes na Austrália e dos maoris na Nova Zelândia, o tratamento miserável que os árabes ainda hoje dão aos negros, as guerras fratricidas selváticas entre tutsis e hutus, os problemas do Darfur, entre tantas e tantas outras situações. 

 Muito para além das opiniões em que todos nós, Portugueses, somos tão pródigos, fala a realidade da herança cultural e humana que deixámos por onde andámos: os testemunhos que colhi em Malaca, em Goa e em Damão, no Uruguai ou em Timor, são suficientes. O que os outros dizem de nós (a gente simples sobretudo) é que conta. Não o que tristemente denegrimos na nossa alma. 

 Atentamente A.Teixeira-Pinto, professor universitário 

  2. Comentário do editor blogue: 

 Caro professor e colega A. Teixeira-Pinto: Não sou, como sugere, historiógrafo nem historiador. Profissionalmente, sou docente universitário (ENSP/UNL), na área da sociologia e saúde pública. Sem ter na minha árvore genealógica antepassados recentes tão ilustres e valorosos como o Capitão Teixeira Pinto (2), sinto-me tão português, nem pior nem melhor, como qualquer outro. 

 Tenho também para com os guineenses uma atitude de respeito, de apreço e de amizade. Passei quase dois anos da minha juventude na terra deles, numa guerra conduzida por uma elite (portuguesa) cuja legitimidade contestava. Mas isso, para o caso, não importa. 

Queria apenas frisar que não faço questão de mostrar nenhuma atitude de falsa superioridade nem de complexada inferioridade em relação aos nossos amigos da Guiné-Bissau, que falam a mesma língua do que eu... (E esse é um dos traços de união que nos aproxima, a par da história, dos bons e maus momentos do nosso convívio histórico). 

 Sobre o pomo da discórdia em relação às cartas da Guiné: é preciso, no entanto, contextualizar a divulgação do documento a que você faz referência, e que aplaude, a carta de Teixeira Pinto (h0je, Canchungo). 

Transcrevo abaixo o teor da nota que acompanha a divulgação, na Net, das cartas da Guiné, que eu próprio reconheci serem uma obra-prima da nossa cartografia militar (3). É bom dizer, urbi et orbi, que essas cartas foram usadas por nós, soldados portugueses, durante a guerra colonial (ou do Ultramar, como queira) para fins militares. O inimigo de ontem (os nacionalistas do PAIGC) sabe-o bem. É natural que da parte dos guineenses - não gosto do termo guinéu, quiçá um pouco arcaico e paternalista, muito usado por Spínola - possa haver ainda alguma susceptibilidade quando confrontados com a divulgação dessas velhas cartas na Internet. Pelo menos, por parte da geração dos guineenses que, com brio e coragem, nos combateram de armas na mão... 

 Há uma dúzia de anos atrás foi exigida, ao meu camarada e amigo Humberto Reis, uma autorização escrita (!) da Embaixada da Guiné-Bissau para poder adquirir a totalidade das cartas da Guiné... portuguesa. Ele nunca quis saber porquê, mas a verdade é que sem isso o Centro de Documentação e Informação do Instituto de Investigação Científica e Tropical, em Lisboa não as vendia, ao meu amigo ou a qualquer outro português, em viagem de turismo ou de negócios à Guiné-Bissau. 

 Ao digitalizarmos essas cartas e ao pô-las, na Internet, ao dispor dos antigos combatentes da guerra da Guiné (portugueses e guineenses), eu e o Humberto estavamos apenas a afirmar o direito à memória que cada um de nós tem, indivíduos e povos. 

 Fiz questão de lembrar, para os mais distraídos, que a Guiné-Bissau é hoje um país independente. É, de resto, esse o sentido da expressão, usada por mim (e que o Prof. A. Teixeira Pinto não gostou): a divulgação da carta (geográfica) de Teixeira Pinto (hoje, Canchungo) bem como as demais cartas desenhadas pelos cartógrafos portugueses, durante os anos 50 e 60, não tinha outro propósito senão o de ajudar à reconstituição, reorganização e preservação da memória dos lugares e das experiências (humanas) dos ex-combatentes portugueses que estiveram aquartelados e/ou envolvidos em operações nos mais diversos sítios da Guiné até desde os anos 60 até à independência. 

 Para um melhor entendimento da atitude e dos valores que nós defendemos aqui, neste blogue colectivo, convido o Prof. Teixeira-Pinto a ter a gentileza de nos ler com tempo e vagar - refiro-me à tertúlia dos amigos e camaradas da Guiné (3).

Saudações académicas
____________ 

 Notas de L.G.: 

 (1) Vd. nota que acompanha a divulgação da Carta da Região de Teixeira Pinto (agora Cachungo): 

  Quando voltou à Guiné-Bissau, em 1996, em viagem de negócios (mas também em romagem de saudade), o Eng. Humberto Reis (ex-furriel miliciano da CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71) já tinha adquirido as 72 cartas da antiga província portuguesa, à escala de 1/50.000. 'Em Dezembro de 94 já me custaram 450$00 cada uma'. O mapa geral custou 600$00. 

Para os eventuais interessados, essas cartas podem ser adquiridas no Centro de Documentação e Informação do Instituto de Investigação Científica e Tropical, em Lisboa. Algumas cartas podem já estar esgotadas. Na altura foi exigida ao Eng. Humberto Reis uma declaração da embaixada da República da Guiné-Bissau, a qual se transcreve, como simples curiosidade, com data de 29 de Dezembro de 1994: 

'A Embaixada da República da Guiné-Bissau em Portugal declara, para os devidos efeitos que está o sr. Eng. Humberto Simões dos Reis autorizado a adquirir cartas geográficas da Guiné-Bissau. Para que não haja nenhum impedimento a tal objectivo, se passou a presente declaração que vai ser
 assinada e autenticada com o carimbo a óleo em uso nesta Missão Diplomática'. Presumimos que esta exigência de autorização da embaixada da Guiné-Bissau para um turista levar consigo cartas geográficas do país seja ditada (ou fosse ditada na época) por razões de 'segurança de Estado'. 

A divulgação desta carta de Teixeira Pinto (actualmente, Canchungo) de modo algum pretende pôr em risco a independência e a soberania do país irmão. Nem muito menos pode ser interpretada como uma provocação. Também não tem quaisquer propósitos comerciais ou outros, de índole lucrativa. Pretende-se apenas prestar um serviço útil aos ex-combatentes da guerra colonial, e nomeadamente aos membros da nossa tertúlia e a todos os demais amigos do povo guineense. 

Esta carta, apesar de algumas lacunas (tem já meio século), é fundamental para a reconstituição da memória dos lugares e a reorganização das memórias dos ex-combatentes portugueses que estiveram aquartelados e/ou envolvidos em operações no chão manjaco. Fica também aqui a nossa homenagem aos valorosos cartógrafos militares portugueses. 

Esta e outras cartas da Guiné resultam do levantamento efectuado em 1953 pela missão geo-hidrográfica da Guiné – Comandante e oficiais do N. H. Mandovi. A fotografia aérea é da aviação naval (Março de 1953). Restituição dos Serviços Cartográficos do Exército. Fotolitografia e impressão: Lit Barrault, s/d. A edição é da Junta das Missões Geográficas e de Investigações do Ultramar, do antigo Ministério do Ultramar, s/d. Digitalização efectuada na Rank Xerox (2006). 

(2) Sobre a figura do Cap Teixeira Pinto e a sua campanha de pacificação da Guiné, vd. post de 18 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P882: Infali Soncó e a lenda do Alferes Hermínio (Beja Santos) Consultar também: Carlos Bessa - Guiné. Das feitorias isoladas ao 'enclave' unificado. In: Manuel Themudo Baraa e Nuno Severiano Teixeira, ed. lit - Nova Históira Militar de Portugal. Vol. 3. S/l: Círculo de Leitores. 2004. 257-270. João Teixeira Pinto - A ocupação militar da Guiné. Lisboa: Agência Geral das Colónias. 1936. 


  (...) A termos uma bandeira, será sempre a nossa, a da nossa Pátria (Portugal ou Guiné-Bissau) que cada de um nós amava e ama, à sua maneira. O nosso comportamento, agora como… tertulianos, deve apenas pautar-se por critérios éticos ou valores tais como: 

 (i) respeito uns pelos outros, pelas vivências, valores, sentimentos, memórias e opiniões uns dos outros (hoje e ontem); 

 (ii) manifestação serena mas franca dos nossos pontos de vista, mesmo quando discordamos, saudavelmente, uns dos outros; 

 (iii) consagração do blogue (Luís Graça & Camaradas da Guiné > Blogue-fora-nada, 1ª série, até Maio de 2005; Luís Graça & Camaradas da Guiné, 2ª série, a partir de Junho de 2005) como ágora ou como praça pública para a manifestação (aberta, franca, assertiva, leal, serena) dos nossas eventuais críticas e divergências de pontos de vista (se houver roupa suja, discute-se primeiro na caserna...); 

 (iv) socialização/partilha da informação e do conhecimento sobre a história da guerra colonial/guerra de libertação da Guiné; 

 (v) carinho e amizade pelo povo da Guiné (que ganhou a guerra mas não ainda a paz) (e vice-versa: idem, pelo povo português, que não se confundia com o regime político de então, como sempre fez questão de lembrar Amílcar Cabral); 

 (vi) respeito pelo inimigo de ontem (que, sempre o disse, nunca lutou contra o povo português, mas contra um regime político); 

 (vii) recusa da auto-culpabilização e da responsabilidade colectiva: nenhum povo pode ser culpado, em termos colectivos, pelas decisões e acções da sua elite dirigente, dos seus políticos, do seu Estado; 

 (viii) não-intromissão na vida política interna da República da Guiné-Bissau, salvaguardado sempre o direito de opinião de cada um de nós, como cidadãos (portugueses, europeus, globais...); 

 (ix) respeito acima de tudo pela verdade dos factos; (x) liberdade de pensamento e de expressão... Entre nós não há dogmas nem tabus... (xi) e, por fim, mas não menos importante, respeito pela propriedade intelectual, pelos direitos de autor...