segunda-feira, 24 de abril de 2017

Guiné 61/74 - P17275: (Ex)citações (324): Quando se dizia, no final da I República, que a Guiné era uma colónia de Cabo Verde... (Armando Tavares da Silva, historiador)

1. Texto enviado em 19 do corrente por Armando Tavares da Silva, membro nº 734 da nossa Tabanca Grande, autor de “A Presença Portuguesa na Guiné, História Política e Militar (1878-1926)” (Caminhos Romanos, 2016)


Caro Luís Graça,

Notei no Post P17250 de 17 de Abril de Mário Beja Santos referente ao livro do Embaixador António Pinto da França, Em Tempos de Inocência (Prefácio, 2006) (*), alguns parágrafos que atraíram a minha particular atenção. Beja Santos escreve que o autor “está atento e regista um conflito racial que muitos pretendem iludir”, e transcreve as suas palavras:

“Muitos guineenses olham os cabo-verdianos como uma classe colonizadora que os despreza e explora e não querem nem ouvir falar em tal união, achando que já lhes basta a predominância de cabo-verdianos nascidos aqui, instalados no Governo e em todos os postos de comando. Eles foram no tempo da colónia a classe intermédia, como na Indonésia os chineses e, politicamente mais preparados, puseram de pé o PAIGC, herdando assim o poder dos portugueses”.


A terminar a sua referência ao livro de António Pinto da França, Beja Santos faz nova transcrição das palavras do autor:

"Por vezes tive a sensação de assistir a um parto dramático… Vai comigo uma suave recordação do povo guineense, da sua nobreza, da sua afabilidade, da sua hospitalidade, da sua resignação ou sofrimento. Ensinaram-me algumas coisas importantes. Passados estes anos de iniciação, na euforia da independência, tempos duros e difíceis se desenham no horizonte, toldando as esperanças dos guineenses”.



Estas palavras fazem-me pensar na sucessão de acontecimentos que têm moldado a vida da Guiné-Bissau desde a independência até aos dias de hoje, e ainda em situações e acontecimentos que tiveram lugar na Guiné muito antes da luta do PAIGC contra os portugueses, e sobre as quais se manifestaram várias autoridades com responsabilidade na administração do território.

Por exemplo, vejamos o que diz Manuel Maria Coelho (um dos revolucionários do 31 de Janeiro, governador de Angola no início da República, e que veio ainda a chefiar o governo a seguir aos acontecimentos de 19 de Outubro de 1921), que no início de 1917 fora enviado para a Guiné, por António José de Almeida (na altura presidente do ministério e ministro das colónias), como sindicante na sequência de alegadas irregularidades que haviam rodeado a campanha de Teixeira Pinto na ilha de Bissau em 1915, e ainda para esclarecimento das muitas e variadas queixas que chegavam ao ministério sobre a vida pública da colónia.

Na ausência do governador Andrade Sequeira, Manuel Maria Coelho assumiria interinamente o governo da província afastando o secretário-geral Sebastião José Barbosa, e ao fazer a análise das acusações que eram feitas a Teixeira Pinto por Andrade Sequeira, e referindo-se ao facto de Sebastião Barbosa considerar desnecessária a guerra, considera não haver nisto surpresa e que tudo era fácil de explicar. Escreve:

“Sebastião Barbosa é de Cabo Verde, ilha do Fogo, e é sobrinho, ou coisa parecida, de um célebre Caetano José Nosoliny, que foi o encarregado de ir a Lisboa pela Liga Guineense, pedir ao governo para que não fizesse a guerra aos papeis! Este Nosoliny tem sangue estrangeiro e, como quase todos os cabo-verdianos, do Fogo principalmente, não têm o menor amor a Portugal, procurando todos os que pela Guiné se encontram, com raras excepções, tomar conta desta província, de cuja administração se apoderaram e que querem conservar em seu poder como colónia de Cabo Verde, porque a não consideram colónia portuguesa”.

Vejamos ainda o que mais tarde escreve Vellez Caroço, que governou a Guiné por dois períodos consecutivos, de 1921 a 1923, e de 1924 a 1926, no seu relatório referente ao primeiro ano da sua governação, referindo-se à qualidade do funcionalismo e da organização da secretaria do governo. Depois de notar que a província se encontrava “enxameada” de empregados recrutados em Cabo Verde, acrescenta:

“Hoje é já vulgar ouvir na Guiné, entre o elemento cabo-verdiano, que nós somos estrangeiros”. E Vellez Caroço pergunta, talvez premonitoriamente: o que seria se “por qualquer motivo esta colónia amanhã deixasse de estar debaixo do domínio português?”.

Por considerar que a obra de desnacionalização da Guiné era lenta, mas era contínua e persistente, tornava-se necessário actuar para que não se não continuasse a dizer que a Guiné portuguesa era uma colónia de Cabo Verde. E, a propósito, nota que “o nativo de da Guiné tem tantos direitos como o natural de Cabo Verde, e na sua colónia até tem mais. Auxiliemo-los, pois, nesta simpática empresa. Façamos do guineense um cidadão português com plena consciência dos seus direitos e correlativos deveres”.


A influência cabo-verdiana na vida pública da província pode ser notada ainda em anos muito anteriores e mesmo como factor importante ou mesmo determinante no desencadear de alguns conflitos e operações militares, nomeadamente na ilha de Bissau nos anos 1890.

Notemos, a terminar esta pequena nota, que no grupo de fundadores do PAIGC estavam dois cabo-verdianos: Pedro Pires, também natural da ilha do Fogo, e Amílcar Cabral (nascido em Bafatá, segundo consta). E que o “conflito racial” acima referido continua presente num clima de “desconfiança e intriga” que – como recentemente me tenho apercebido – se sente na Guiné-Bissau.



2. Nota do editor:

Meu caro Armando, queria dizer "Aristides Pereira" e não "Pedro Pires", como cofundador do PAIGC, em 1956 (na altura ainda só PAI - Partido Avricano para a Indepedência, só em 1960 é que passa a designar-se PAIGC). (**)

Dos seis fundadores do PAI, só há três cabo-verdianos de nascimento: Júlio Almeida e Fernando Fortes, ambos naturais da ilha de São Vicente, e Aristides Pereira, natural da Boavista. Os restantes nasceram na Guiné: Amílcar Cabral, em Bafatá, o seu meio irmão Luís Cabral, nascido em Bissau, e Elysée Turpin, também nascido em Bissau, em 1930. Luís Cabral é o mais novo dos seis (,é de 1931), seguido de Elysée Turoin (que nasceu em 1930); todos os outros são da década de 1920: Aristides Pereira, o mais velho, nascido em 1923, seguido do Amílcar, que é de 1924, Júlio Almeida (1926) e Fernando Fortes (1929).

Amílcar e Luís são filhos do mesmo pai, cabo-verdiano, professor primário. A mãe de Amílcar era cabo-verdiana, nascida na ilha de Santiago, a mãe de Luís teve uma vivência cabo-verdiana, mas nasceu em Portugal. Ambos os irmãos têm uma dupla vivência, cabo-verdiana e guineense.

Pedro Pires é de facto da ilha do Fogo, mas dez anos mais novo do que Amílcar Cabral. Desertou da Força Aérea Portuguesa, tendo ingressado depois nas fileiras do PAIGc.

Sobre esta questão, ler a comunicação "As Trajectórias dos Fundadores do PAIGC (1923 – 1960", de Ângela Sofia Benoliel Coutinho (CESNOVA – IPRI/ UNL) in: Atas do Colóquio Internacional Cabo Verde e Guiné-Bissau: percursos do saber e da ciência, Lisboa, 21-23 de junho de 2012. [Consult 23/4/1017]. Disponível em https://coloquiocvgb.files.wordpress.com/2013/06/p03c02-angela-coutinho.pdf


3. Comentário, posterior, do Armando Tavares da Silva:

Obrigado Luís Graça pelas achegas sobre a fundação do PAIGC. Eu não investiguei a fundação deste partido, mas lembro-me de ter lido – já não sei onde – que Pedro Pires estava incluído num grupo de três pessoas que o teriam fundado. Notemos contudo que a sua biografia em http://www.barrosbrito.com/5498.html nos diz que em 1961 abandonou clandestinamente Portugal para se juntar ao PAIGC. 

Possivelmente haverá mais do que uma versão sobre os acontecimentos da altura, e António Duarte Silva, no seu trabalho que se pode ler em https://cea.revues.org/1236#tocto1n5, nos parágrafo 32 e 33 deste documento escreve:

“Segundo a versão consolidada, a 19 de Setembro de 1956, domingo à tarde, inter­vindo num círculo de amigos convidados para o efeito, Amílcar Cabral propôs a constituição de um partido político para alcançar a independência da Guiné e Cabo Verde e defender a união entre os povos guineense e cabo-verdiano, numa perspec­tiva geral de unidade africana. Seria o Partido Africano da Independência (PAI)”. E a seguir: “A reunião durou cerca de uma hora, foram poucos os presentes (a maioria de ori­gem cabo-verdiana) e não há qualquer documento comprovativo”. E acrescenta: “Elisée Turpin afir­ma que teriam sido «aprovados os Estatutos do PAI, elaborados por Amílcar», mas o tes­temunho de Turpin, habitualmente indicado como um dos seis fundadores, está posto em causa”.

Penso que podemos concluir que cabo-verdianos (ou de origem cabo-verdiana) foram determinantes na criação do movimento de oposição à presença portuguesa, e que o que se terá passado na altura não constitui hoje uma certeza.

Armando Tavares da Silva


24.Abril.2017
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Guiné 61/74 - P17274: Parabéns a você (1243): David Guimarães, ex-Fur Mil Art da CART 2716 (Guiné, 1970/72)

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Nota do editor

Último poste da série de 21 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17265: Parabéns a você (1242): António Branquinho, ex-Fur Mil Inf do Pel Caç Nat 63 (Guiné, 1969/71)

domingo, 23 de abril de 2017

Guiné 61/74 - P17273: XII Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 29 de Abril de 2017 (6): A poucas horas de terminar o prazo para aceitação de inscrições, temos 85 Combatentes e 45 Acompanhantes na lista dos inscritos



XII ENCONTRO DA TERTÚLIA DA TABANCA GRANDE

DIA 29 DE ABRIL DE 2017

PALACE HOTEL DE MONTE REAL


Terminado que está, praticamente, o prazo para aceitação de inscrições no nosso XXII Encontro, publicamos a lista actualizada às 18 horas. Somos 85 Combatentes e 45 Acompanhantes.


Abel Santos - Leça da Palmeira / Matosinhos 
Agnelo Macedo e Delfina - Lisboa 
Agostinho Gaspar - Leiria 
Albano Costa e Maria Eduarda - Guifões / Matosinhos 
Almiro Gonçalves e Amélia - Vieira de Leiria 
António Acílio Azevedo e Maria Irene - Leça da Palmeira / Matosinhos 
António Dias Pereira e Teresa Maria - Tomar 
António Duarte e Conceição Duarte - Linda-A-Velha / Oeiras 
António Fernando Marques e Gina - Cascais 
António Luís e Maria Luís - Lisboa 
António M. Sucena Rodrigues e Rosa Maria - Oliveira do Bairro 
António Maria Silva e Maria de Lurdes - Sintra 
António Martins de Matos - Lisboa 
António Osório, Ana e Maria Neves - Vila Nova de Gaia 
António Vieira - Vagos 
Armando Nunes Carvalho e Maria Deolinda - Sintra 
Armando Pires - Algés / Oeiras 
Arménio Santos - Lisboa
Artur Gil - Caldas da Rainha
Augusto Pacheco - Gondomar

C. Martins - Penamacor 
Carlos Cabral e Judite - Pampilhosa 
Carlos Vinhal e Dina - Leça da Palmeira / Matosinhos 

David Guimarães e Lígia - Espinho 
Diamantino Ferreira e Emília - Leiria 

Eduardo Campos - Maia 
Eduardo Jorge Ferreira - Vimieiro / Lourinhã 
Eduardo Magalhães Ribeiro e Carlos Eduardo - Porto 
Ernestino Caniço - Tomar 

Fernandino Leite - Gueifães / Maia
Fernando Jesus Sousa e Emília Sérgio - Lisboa 
Fernando Sousa e Maria Barros - Trofa 
Francisco José F. Oliveira - Lisboa 
Francisco Palma - Cascais 
Francisco Silva e Maria Elisabete - Porto Salvo / Oeiras 

Hélder Valério de Sousa - Setúbal
Hernâni Alves da Silva e Branca - Vila Nova de Gaia 

Idálio Reis - Sete-Fontes / Cantanhede 
Isolino Gomes e Júlia - Porto 

Joaquim Carlos Peixoto e Margarida - Penafiel 
Joaquim Gomes Soares, Maria Laura e Aurora Brito - Porto 
Joaquim Mexia Alves e Catarina - Monte Real / Leiria 
Jorge Cabral - Lisboa 
Jorge Canhão e Maria de Lurdes - Oeiras 
Jorge Ferreira - Lisboa 
Jorge Peixoto - Gondomar
Jorge Pinto e Ana Maria - Sintra 
Jorge Rosales - Monte Estoril 
José Almeida e Antónia - Viana do Castelo 
José Barros Rocha - Penafiel 
José Casimiro Carvalho - Maia 
José Eduardo R. Oliveira - Alcobaça 
José Fernando D. Mendonça - Oeiras 
José Ferreira da Silva e Maria Vergilde - Crestuma / V. N. Gaia 
José Francisco Macedo Neves e Rosa Maria - Guifões / Matosinhos 
José Henrique S. Ribeiro - Alfragide 
José Macedo e Goreti - Estados Unidos da América 
José Manuel Cancela e Carminda - Penafiel 
José Manuel Lopes e Maria Luísa - Régua 
José Miguel Louro e Maria do Carmo - Lisboa

Luís Graça - Alfragide / Amadora 
Luís Lopes Jorge - Monte Real 
Luís Moreira e Irene - Sintra 
Luís Paulino e Maria da Cruz - Algés / Oeiras 

Manuel Augusto Reis - Aveiro 
Manuel Gonçalves e Maria de Fátima - Lisboa 
Manuel Joaquim - Lisboa 
Manuel José Ribeiro Agostinho e Elisabete - Leça da Palmeira / Matosinhos 
Manuel Lima Santos e Fátima - Viseu 
Manuel Lopes e Hortense - Monte Real 
Manuel Viçoso Soares - Porto
Maria Arminda Santos - Setúbal 
Mário Magalhães, Fernanda e Afonso - Sintra 
Mário Santos - Maia
Mário Vitorino Gaspar - Lisboa 
Miguel Pessoa e Giselda - Lisboa
Moura - Maia

Ricardo Figueiredo - Porto 
Rogé Guerreiro - Cascais 
Rui Pedro Silva - Lisboa 

Silvino Correia d'Oliveira - Leiria 

Urbano Martins Oliveira - Figueira da Foz

Vasco Ferreira - Vila Nova de Gaia
Virgínio Briote e Maria Irene - Lisboa


- 85 Combatentes
- 45 Acompanhantes

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Em jeito de lembrete, aqui fica o programa do dia:

- 11h30 - Missa na Igreja Matriz de Monte Real

- Seguir-se-á a Foto de Família na imponente escadaria do Palace Hotel de Monte Real

- Cerca das 13h00 começarão a ser servidas as Entradas, se estiver bom tempo, no pátio anexo à Sala de Jantar onde irá ser servido o Almoço.

- Da parte da tarde, além do salutar convívio entre os presentes, estarão patentes alguns livros, para venda, de camaradas que publicaram as sua memórias em palavras ou em fotografias, que podem ser adquiridos pelos interessados.

- Cerca das 18h30 será servido um lanche para fim de festa. 

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Nota:
Quem se quiser inscrever após terminado o dia de hoje, fica com a sua inscrição condicionada à aceitação por parte do Hotel, que como devem compreender tem que adaptar a logística ao número de participantes.

A Comissão organizadora
Luís Graça
Joaquim Mexia Alves
Miguel Pessoa
Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 11 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17233: XII Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 29 de Abril de 2017 (5): Listagem actualizada dos inscritos (115). Lotação máxima: 200. Atenção que só faltam duas semanas para fecharmos as inscrições

Guiné 61/74 - P17272: Blogpoesia (507): "Canção da terra..."; "A riqueza das palavras..." e "O nada...", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

Foto: © Carlos Vinhal


1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) três belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Canção da terra...

Acordei enlevado.
Fui à janela.
Que linda melodia
Envolvia a terra.
Não se via donde vinha.

Acordes luminosos
Vibravam leves,
Na suave brisa
Que exalava fresca
Do mar ao pé.

Havia trinados frenéticos
Da passarada.
Vinham da mata.

E poisadas no topo dos postes,
Arrulhavam pombas
Como tenores divinos,
Tão afinados
Do alvorecer.

Até os sinos,
Do Convento ao longe,
Maravilhados, assomaram ufanos,
Entoando hinos
De extasiar.

Que linda festa,
Em apoteose,
Decorreu gratuita
Para quem quis ouvir...

Bar "Caracol" arredores de Mafra,
19 de Abril de 2017
9h30m
Jlmg

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A riqueza das palavras...

Não são uma soma de letras mortas ou adormecidas.
Têm alma.
Irradiam calor e vida.
Tanto aquecem como brasas
e refrescam as ideias
mais escaldantes.
Se atraem umas às outras
segundo leis ocultas
e imperceptíveis.
Têm cor e exalam perfumes.
como se fossem madressilvas.
São sonoras
com o encanto inebriante das sereias sedutoras.
Têm peso
e calam fundo,
quanto mais leves.
Pintam quadros
e contam histórias.
e, tão ciosas,
guardam os segredos
mais profundos.
São geométricas.
Rigorosas.
Se encaixam
em perfeitas simetrias.
Vestem tons,
de variadas cores,
em harmonia.
Dos mais claros
aos mais escuros.
Pintam a beleza em quadros belos.
Sempre prontas.
Tão afinadas,
emocionam.
Fazem rir e fazem chorar,
como, no palco,
as melhores actrizes.
Que seria da humanidade,
um dia só,
sem as palavras!...

Mafra, 21 de Abril de 2015
19h45m
Joaquim Luís Mendes Gomes

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O nada...

Tudo desaparece.
Deixa de ser real
Na escuridão total.

Até os holofotes possantes
Que tudo iluminam.

Se o sol vai,
Vem a noite com seu manto
E num instante,
Aparece o negro.
Fica só o reflexo
Na nossa mente.

A memória esquece.
Derramando esquecimento Como uma glândula.
Feroz e inclemente.

Vão-se todas as résteas de luz.
E o deserto avança.
Frio. Seco.
Sepulcro profundo.
Devorador.
Chegam os vermes.
Tudo mastigam
Reduzindo a nada.
Vai-se a fome.
E germina a ausência
Potente e eterna.
Nada germina.
É o fim.
Inclemente e cego.
Nem há fumo
Que se eleve no ar.
Até o cheiro seca.
Desfeito em cal.
Não há bem
Nem mal.
É o nada com toda a força.

Só um milagre
O fará reviver.

Mafra, 20 de Abril de 2014
21h10m
Joaquim Luís Mendes Gomes
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Nota do editor

Último poste da série de 18 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17254: Blogpoesia (506): "Mata da paz..."; "Deus é brincalhão..." e "De nada serve me armar até aos dentes", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

Guiné 61/74 - P17271: Recortes de imprensa (86): Artigo de opinião de Fátima Ascensão, no DN Madeira, de hoje, intitulado Obrigada, ex-Combatentes


Alertados pelo nosso camarada Carlos Pinheiro, lemos, e reproduzimos aqui no blogue, com a devida vénia, um artigo de opinião da jornalista Fátima Ascensão, inserto no Diário de Notícias Madeira de hoje:

Obrigada, ex-combatentes

Esta gente continua a ter no seu ADN a garra e o espírito lutador que ganharam na sua juventude

Fátima Ascensão
23 Abr 2017

A dois dias de se comemorar o 25 de Abril, dei por mim a pensar no legado que os nossos ex-combatentes nos deixaram. Homens extraordinários que viveram cenários de guerra em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau e optaram por fazer uma revolução tranquila, sem armas e sem guerra civil.

Homens que aprenderam bem cedo o que realmente é importante e tiveram a garra necessária para mudar o que era preciso mudar. Não se deixaram levar pela manipulação dos discursos e, sem grande instrução escolar, sabiam o que queriam para o futuro de Portugal.

Transformaram o país e deram os primeiros passos para a criação de um sistema democrático no nosso país. Enfrentaram um regime autoritário com mais de 40 anos que governava em ditadura e fazia uso de todos os meios ao seu alcance para reprimir as tentativas de transição para um estado de direito democrático, numa época em que ter liberdade era um sonho e não uma realidade.

Sempre que se fala no 25 de Abril, a maioria das pessoas pensa nos Capitães de Abril como os grandes mentores da revolução, mas sem o apoio dos militares de patentes inferiores, o chamado soldado raso, os líderes da revolução nada teriam conseguido.

O treino militar de então, dado aos portugueses para prepará-los para o que iriam enfrentar em campo de batalha, treinaram a sua mente para avaliar o risco e dotaram-lhes de um espírito de sobrevivência e de luta.

Os sobreviventes desta guerra voltaram para Portugal com muitos traumas. Viram os seus colegas de campanha morrer e viram o horror do conflito. Alguns foram feridos em combate, deixando mazelas para o resto da vida e todos vieram afetados psicologicamente. Se não fosse o papel das famílias que os acolheram e apoiaram no regresso a uma vida civil, não sei o que seria destas pessoas.

Face ao que fizeram pela pátria, em minha opinião, o Estado Português nunca os tratou com o devido respeito e consideração. Ainda hoje, muitos dos sobreviventes desta guerra que estão entre os 65 a 75 anos, recebem reformas miseráveis, resultado de trabalhos mal remunerados, e sem qualquer proteção face às inúmeras políticas que se vão legislando. Estão esquecidos numa sociedade que só os homenageia com flores. Preferiam uma proteção social maior...

Mas atenção, esta gente continua a ter no seu ADN a garra e o espírito lutador que ganharam na sua juventude. Einstein dizia “A mente que abre uma nova ideia, jamais retorna ao seu tamanho original”. A sorte deste país é que a sua gente prefere a paz à guerra.

O mais interessante de toda esta dinâmica no fenómeno do 25 de Abril é que estes simples cidadãos influenciaram toda uma sociedade na pressão sobre as instituições para tornar Portugal um país livre.

A acrescer a tudo isto, a pobreza, a fome e a falta de oportunidades para um futuro melhor, frutos do isolamento a que o país estava votado há décadas, provocaram um fluxo de emigração que agravava, cada vez mais, as fracas condições da economia nacional.

Fartos do abuso de autoridade, a sociedade uniu-se para fazer a mudança em Portugal. Foram as pessoas simples, os simples soldados, os heróis sem cara, que mudaram Portugal. Mudaram as organizações governativas. Mostraram-nos que quem muda as organizações são as pessoas e não os planos per si.

Por isso, muito obrigada ex-combatentes pela herança que nos deixaram de um Portugal livre e por terem proporcionado os alicerces de uma sociedade baseada numa democracia. É esta a principal missão de qualquer geração – criar condições para melhorar a sociedade em que as gerações vindouras viverão. Todos vós cumpristes a vossa missão.

A minha geração tem muito a aprender convosco. Aprender que o coração da mudança somos todos nós porque toda e qualquer mudança resulta do nosso sentimento de quer mudar. E são as pessoas que mudam as organizações e não o contrário.

Nada pode ser imposto. Tem de ser um processo natural, partilhando o que está errado, os perigos de determinadas decisões, as mentiras instaladas e partilhando o que se quer para futuro. Ouvir e ouvir. Todas as pessoas mudam. As transformações do mundo assim o exigem.
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17048: Recortes de imprensa (85): O nosso camarada Armor Pires Mota no lançamento do livro da investigadora Sílvia Torres ("O jornaliismo português e a guerra colonial", Lisboa, Guerra & Paz, 2016, 432 pp.) na sua terra natal: Anadia, 2 de julho de 2016 (Excerto do "Correio do Vouga")

Guiné 61/74 - P17270: Inquérito 'online' (107): Camarada, não sejas "dinossauro", responde à nossa pergunta: "Este ano vou ao nosso encontro, em Monte Real, em 29 de abril"... As 53 primeiras respostas: mais de metade dos respondentes (58,5%) este ano não vai ou não pode ir


Lourinhã > 22 de abril de 2017 > Frente à igreja do convento de Santo António (séc. XVI), uma réplica de "Stegosaurus" (7 m de comprimento, 3,4 de altura)... Este e outros dinossauros da Lourinhã sabemos, de certeza, que não vão ao XII Encontro Nacional da Tabanca Grande em Monte Real, no próximo sábado, dia 29... porque foram extintos há muitos e muitos milhões de anos (cerca de 150)... (Este bicho passeava-se entre a Lourinhã e Nova Iorque quando ainda não havia o oceano Atlântico a "separar-nos")... Também à geração vai acontecer-nos o mesmo, devendo por isso aproveitarmos os anos que nos restam para nos encontrarmo-nos, de vez em quando, à sombra do nosso "poilão"...




Lourinhã > 22 de abril de 2017 > Frente ao edifício da Câmara Municipal da Lourinhã > ... E quem não responder apanha com um dentada do temível "Tyrannossaurus Rex" (13 m de comprimento, 4,2 de altura)...

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2017). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



I. INQUÉRITO DE OPINIÃO:


"ESTE ANO VOU AO NOSSO ENCONTRO, EM MONTE REAL, EM 29 DE ABRIL..."



As 53 primeiras respostas (até à meia noite de ontem):


Sim, vou = 20  (37,7 %)
Não, não vou = 31 (58,5 %
Indeciso = 2 (3,8 %)
Total = 53 (100,0 %)


Razões invocadas para não ir (n=31):


(i) Não vou, porque tenho outra festa 
ou convívio nesse dia  > 9 (17,0%)

(ii) Não vou, por razões de saúde  > 3 (5,7%)

(iii) Não vou, porque é uma despesa grande  > 5 (9,4%)

(iv) Não vou, por falta de transporte  > 1 (1,9%)

(v) Não vou, por falta de interesse  > 2 (3,8%)

(vi)  Não vou, por outras razões  > 11 (20,7%)

Total > 31 (58,5%) 


II.  O inquérito termina no dia 25 de abril, às 23h40.

A resposta ao inquérito deve ser dada, "on line", diretamente, no canto superior esquerdo do deste blogue. E é importante que os nossos leitores respondam:  queremos saber: (i) se vão  ao XII Encontro Nacional da Tabanca Grande, a realizar em Monte Real, no próximo sábado, dia 29; e (ii) se não vão, porque razões não vão...

Em mais de metade dos casos (31 em 53), sabemos que os respondentes não vão ou não podem ir ao encontro, a Monte Real, fundamentalmente pelas seguintes razões: 

conflito de agendas (17,0%);
despesa elevada e falta de transporte (11,3%);
razões de saúde (5,7%);
falta de interesse (3,8 %);
outras razões (20,7 %).


O inquérito também ajuda a promover a nossa festa anual. Recorde-se que este ano celebramos os nossos 14 anos de existência enquanto blogue. O nº total de membros da Tabanca Grande, registados, é de 742 (dos quais, infelizmente, 54 já morreram).


Este ano só pudemos utilizar o  blogue e a nossa página do Facebook para divulgar o nosso encontro anual, que se tem realizado todos os anos, desde 2006. Não utilizámos o email.

Recorde-se que o prazo de inscrição no XII Encontro Nacional da Tabanca Grande termina hoje, domingo, no final do dia. (**).

Estávamos,  ao fim do dia de ontem, com 129 inscritos, ainda longe do pleno: a lotação da sala de almoço, no Palace Hotel Monte Real, são 200 lugares.

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Notas do editor

(*) Último poste da série > 20 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17264: Inquérito 'online' (107): "Este ano vou ao nosso encontro, em Monte Real, em 29 de abril"... As 35 primeiras respostas: 60% não vai este ano...


(**) Vd. poste de 7 de março de 2017 > Guiné 61/74 - P17112: XII Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 29 de Abril de 2017 (2): Abertura das inscrições que terminam: (i) a 23 de abril; ou (ii) ou quando se atingir a lotação da sala (200 lugares)

sábado, 22 de abril de 2017

Guiné 61/74 - P17269: Agenda cultural (554): 500 fotos, algumas das quais para a História... Exposição de Alfredo Cunha, o nosso grande fotojornalista, na Cordoaria Nacional, em Lisboa, até 3.ª feira, 25 de abril, entrada livre



Lisboa > Cordoaria Nacional > 5 de março de 2017 > Exposição de fotografia de Alfredo Cunha > Algumas das célebres fotos do dia 25 de Abril de 1974. O autor doou a coleção à Fundação Mário Soares.Podem ser aqui visualizadas, no portal Casa Comum > Arquivos > Alfredo Cunha / Fotografias 25 de Abril... São um total de 75, com legendas do jornalista Adelino Gomes.



Lisboa > Cordoaria Nacional > 5 de março de 2017 > Exposição de fotografia de Alfredo Cunha >  Um dos trabalhos mais recentes de Alfredo Cunha, na Guiné-Bissau (2013)


Lisboa > Cordoaria Nacional > 5 de março de 2017 > Exposição de fotografia de Alfredo Cunha > O fotógrafo é também um notável retratista: há retratos de múltiplas personalidades, de Salgueiro Maia a Spínola

Fotos: Luís Graça (2017)

TEMPO DEPOIS DO TEMPO

Fotografias de Alfredo Cunha 1970-2017


Data: de 3 mar a 25 abr/17
Horário: Terça a sexta, das 10h às 18h | 
sábado e domingo, das 14h às 18h


1. A Galeria Torreão Nascente vai estar aberta, a título excecional,  nos próximos dias 24 e 25 de Abril (segunda e terça-Feira) e encerrará no horário habitual. Entrada livre.

Alfredo Cunha é um dos maiores fotojornalistas da atualidade, foi o fotógrafo da nossa geração... Muitas das imagens que ele captou, vão ficar para a história da nossa terra. Foi ele que esteve, tal como Eduardo Gageiro, num momento único e irrepetível, da manhã de 25 de Abril de 1974, no Terreiro do Paço, quando o nosso camarada Salgueiro Maia enfrentou os tanques de Cavalaria 7 e um famigerado brigadeiro da "brigada do reumático", Junqueira Reis, que, histérico,  gritou em vão aa um pobre 1º cabo  apontador do M47, o José Alves Costa,   para disparar  sobre os revoltosos ... Recorde-se aqui, a propósito,  o livro "Os Rapazes dos Tanques" (Porto Editora, 2014), de que são autores Alfredo Cunha (fotos)  e Adelino Gomes (texto).

Ao longo de 47 anos, desde 1970, Alfredo Cunha (que tinha 20 anos no 25 de abril)  não só fixou grandes momentos históricos (o 25 de abril, a descolonização, a queda do ditador romeno Nicolae Ceauşescu, na Roménia, a guerra no Iraque, etc.) mas como também o rosto de homens e de mulheres sem história, mas sem os quais nunca se fará a História com H grande. Por que são eles a humanidade, de Portugal à Guiné-Bissau.

É uma exposição a não perder: são cerca 5 centenas de fotografias, a preto e branco, que tem levado milhares de pessoas à Cordoaria Nacional.

Intitulada "Tempo depois do tempo. Fotografias de Alfredo Cunha 1970-2017", é uma grande retrospetiva (a primeira do fotógrafo, agora reformado, mas que em 2012 tornou-se fotojornalista freelancer, tendo participado no projeto comemorativo dos 30 anos da AMI - Assistência Médica Internacional “Três Décadas de Esperança”, que o levou a percorrer países como o Níger, a Roménia, o Bangladexe, a Índia, o Haiti, o Sri Lanka, a Guiné-Bissau e o Nepal).

Grande parte das fotografias expostas, em formato grande, são inéditas, sobretudo as do séc. XXI.


2. Recorde-se, em traços largos, o CV  de Alfredo Cunha:

(i) nasceu em 1953, em Celorico de Basto, filho e neto de fotógrafos;

(ii) começou sua carreira profissional em fotografia publicitária,  em 1970, e como fotojornalista no jornal "Notícias da Amadora" em 1971;

(iii) trabalhou no jornal "O Século" e n'O Século Ilustrado (1972), na ANOP - Agência Noticiosa Portuguesa (1977) e nas agências de notícias Notícias de Portugal (1982) e Lusa (1987);

(iv) foi fotógrafo e editor-chefe no Público entre 1989 e 1997;

(v) em 1997, ingressou no grupo Edipresse como fotógrafo-chefe;

(vi) em 2000, começou a trabalhar na revista Focus;

(vii) 3m 2002, colaborou com Ana Sousa Dias no programa “Por Outro Lado”, da RTP2;

(viii) foi o fotógrafo e editor-chefe do "Jornal de Notícias" entre 2003 e 2009 e diretor fotográfico da Global Imagens entre 2010 a 2012;

(ix) a partir de então passou a  trabalhar como freelancer e está a desenvolver vários projetos editoriais;

(x) fotografou o 25 de Abril de 1974 em Portugal e, pouco depois, viajou por Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, S. Tomé, Timor-Leste e Cabo Verde, fotografando a descolonização portuguesa;

(xi) publicou diversos livros de  de fotografia: Raízes da Nossa Força (1972), Vidas Alheias (1975), Disparos (1976), Naquele Tempo (1995), O Melhor Café (1996) Porto de Mar (1998), 77 Fotografias e um Retrato (1999), Cidade das Pontes (2001), Cuidado com as crianças (2003), Cortina dos Dias (2012), O Grande Incêndio do Chiado (2013) e Os Rapazes dos Tanques (2014).
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Nota do editor:

ÚLtimo poste da série> 10 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17230: Agenda cultural (553): Convite para sessão de apresentaação do livro "Exílios: testemunhos de exilados e desertores portugueses na Europa (1961-1974)". Lisboa, Museu do Aljube, 3ª feira, dia 11, às 18h00. Apresentação de Carlos Matos Gomes, e intervenções de 2 dos 21 autores. (Confirmar presença.para info@museudoaljube.pt)´roui

Guiné 61/74 - P17268: Notas de leitura (949): “As minhas aventuras no país dos sovietes”, por José Milhazes, Oficina do Livro, 2017 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Abril de 2017:

Queridos amigos,
Por uso e costume, coligo todos os textos, declarações, referências, comentários, etc, que tenham a ver com a Guiné-Bissau, seja em que contexto for.
A obra de José Milhazes é um livro de memórias de alguém que partiu da Póvoa de Varzim, em 1977, com uma bolsa de estudos, ali se graduou, constituiu família e foi durante décadas tradutor e jornalista. Ao encontrar impressivas e dolorosas notas sobre a vida dos estudantes na Guiné-Bissau já na era Putin, entendi que elas tinham aqui pleno cabimento, importa não esquecer que depois estes licenciados virão a ser altos funcionários e até dirigentes políticos no seu país.

Um abraço do
Mário


Os estudantes da Guiné-Bissau 
na época pós-URSS

Beja Santos

“As minhas aventuras no país dos sovietes”, Oficina do Livro, 2017, é o livro de memórias de José Milhazes em que nos fala das suas vivências entre 1977 e a quase atualidade. Relato de infância e juventude em torno da Póvoa do Varzim, uma bolsa de estudos leva-o até Moscovo, em 1977, aprende russo e a conviver numa sociedade multicultural, passa férias na Polónia e descobre o anticomunismo mais virulento, repertoria os factos políticos com a minúcia de quem tem créditos firmados no jornalismo como ele, dá-nos imagens impressivas de alguma vida quotidiana, da constituição de família, colige laboriosamente os factos até assistirmos à dissolução do império soviético, a deriva de Boris Ieltsin em que se passou de um feroz estatismo para a mais espetacular bacanal da venda de um país a retalho, assim se chegando a Putin e à sua mão de ferro. 

É no contexto destes fragmentos de memória e da recolha documental que José Milhazes nos conta várias histórias africanas em Moscovo, e é nesse contexto que aparecem os estudantes da Guiné-Bissau. Vejamos o que ele escreve, a partir da página 291:

“Devido à instabilidade no país, os estudantes da Guiné-Bissau eram os mais afetados pela falta de meios. A situação chegou a um ponto em que eles ocuparam a embaixada do seu país em Moscovo. No dia 25 de Janeiro de 2005, recebi um telefonema de um dos dirigentes da Associação de Estudantes da Guiné-Bissau na Rússia, que me informou de que tinham feito refém o embaixador Rogério Herbert, a sua família e mais dois diplomatas, frisando que só os libertariam quando as autoridades guineenses pagassem as bolsas de estudo em atraso.

Dirigi-me para a embaixada, que estava instalada num duplex numa das zonas periféricas de Moscovo, por cima da representação diplomática da Somália. Quando cheguei, encontrei as salas cheias de estudantes: uns estavam sentados em sofás, cadeiras e mesas a conversar, outros dormiam onde podiam. Eram várias dezenas de jovens sem dinheiro e a passar fome.

Um dos dirigentes estudantis foi entrevistado para a SIC Notícias e ameaçou que os seus colegas poderiam atirar o embaixador da janela abaixo se não fossem ouvidos. Ora, o duplex ficava situado no décimo andar do edifício.

Eu já conhecia o embaixador e sabia que ele não vivia muito melhor do que os estudantes, porque o seu país lhe enviava poucos meios, que, muitas vezes, não chegavam para pagar a água e a luz. Fui encontrá-lo fechado na casa de banho. Os estudantes tinham-lhe tirado as chaves do automóvel e o telemóvel, mas foi sempre tratado com respeito. Depois, conversei com os estudantes e aconselhei-os a não recorrerem a ameaças nas suas declarações, pois isso podia levar a uma dura reação das autoridades russas. À noite, bateram à porta três homens à paisana, perguntaram se tudo estava calmo. Tratava-se de três agentes do Serviço de Segurança da Rússia.

Com a ajuda de funcionários do Consulado de Portugal na capital russa, conseguimos arranjar alguns meios financeiros e fomos comprar comida para os estudantes.
Esta situação continuou durante mais de uma semana e as autoridades de Bissau transferiram algum dinheiro para resolver o problema, mas apenas temporariamente. A 27 de Agosto de 2012, 22 finalistas guineenses voltaram a ocupar a representação diplomática do seu país, dessa vez porque Bissau não lhes pagava o bilhete de regresso, como tinha sido prometido. Carfa Mané, porta-voz dos estudantes guineenses, disse-me então: ‘A Rússia tem de exigir ao governo de Bissau garantias de que os estudantes que terminem os seus cursos neste país tenham bilhetes para regressar à Guiné. Estamos aqui abandonados, vivemos ilegalmente, a monte, e as nossas autoridades não cumprem o que prometem. As autoridades russas têm que pôr fim a esta tragédia humanitária, não permitir a sua repetição”. Foram precisamente estes processos que me levaram a dedicar uma maior atenção à História das relações entre a URSS/Rússia e os PALOP, sobre as quais escrevi vários livros”.
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de Abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17266: Notas de leitura (948): A Revista Panorama, editada pelo SNI – Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, dedicou o número 5/6, II Série, de 1952, à Africa Portuguesa (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Guiné 61/74 - P17267: Álbum fotográfico de Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil, CCAÇ 4740 (Cufar, dez 72 / jul 73) e Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, jul 73 /ago 74) (15): Tabancas de Cufar e Matofarroba


Foto nº 1 > Guiné > Região de Tombali > Cufar > Tabanca > 1973 > Bajuda balanta


Foto nº 2 > Guiné > Região de Tombali > Cufar > Tabanca > 1973 > Pilão do arroz


Foto nº 3 > Guiné > Região de Tombali > Cufar > Matofarroba > Tabanca > 1973 > O al ff mil imf Luís Mourato Oliveira e o alf mil médico em visita ao reordenamento feito pelas NT


Foto nº 4 > Guiné > Região de Tombali > Cufar > Matofarroba > Tabanca > 1973 > Aspeto do reordenamento feito pelas NT. Matofarroba ficava/fica, a 2km/3km, a sul de Cufar.


Foto nº 5 > Guiné > Região de Tombali > Cufar > > Tabanca > 1973 > Aspeto parcial



Foto nº 6 > Guiné > Região de Tombali > Cufar >  Tabanca > 1973 > Aspeto parcial com o fontenário à direita

Fotos (e legendas): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Luís Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro, que foi alf mil inf da CCAÇ 4740 (Cufar,  1973) e do Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, 1973/74). (*)

De rendição individual, foi o último comandante do Pel Caç Nat 52. Irá terminar a sua comissão no setor L1 (Bambadinca), em Missirá, depois de Mato Cão, e extinguir o pelotão em agosto de 1974.

Até meados de 1973 esteve em Cufar, a comandar o 3º pelotão da CCAÇ 4740, no 1º semestre de 1973. Tem bastantes fotos de Cufar, que começamos hoje a publicar.

Sobre esta subunidade, açoriana, mobilizada pelo BI 17,  há uma página na Net, criada pelo ex-furmil mec auto Mário [Fernando Lima de] Oliveira, podendo a sua história ser consultada aqui.

Sabemos, por exemplo, que em janeiro de 1973, o "alferes mil 01876771, Luís Fernando Mourato de Oliveira, substitui o alferes mil 18029168, Mário José Correia Salsinha, nomeado para as unidades africanas: CCAC 13".

Esta companhia, comandada pelo cap mil inf João Gaspar Dias da Silva teve 9 (nove!) alferes milicianos e 19 sargentos (, a maioria, furriéis milicianos). O pessoal partiu para o CTIG, em 21/6/1972, num Boeing 707 dos TAM. 

Em 22/7/1972 seguiu, em LDG, para Cufar onde, em sobreposição, realizou a rendição da CCAÇ 2797. Um mês depois assumiu a responsabilidade do subsetor. A 23/12/1972, Cufar sobreu uma flagelação com 9 mísseis ou foguetões 122 mm (os famosos Katiusha).

Em 11 de Julho de 1974 passou o último dos 690 dias passados em Cufar. No dia seguinte chega, transportada em LDM, a CCAÇ 4152/73 , ao porto de Impundega, para substituir a CCAÇ 4740.

Em 3/8/1974, chegou o finalmente a "peluda"... A CCAÇ 4740 regressa a casa: o Boeing dos TAM, com destino ao aeroporto de Figo Maduro, faz escala no aeroporto das Lajes, em Angra do Heroísmo, desembarcando aqui os militares açorianos.

2. Reuniões de convívio do pessoal da CCAÇ 4740:

1 de Dezembro de 2007 -1º Encontro Continental

21 de Junho de 2008 - 2º Encontro Continental,

10 a 14 de Junho de 2009 - 1º Encontro Açoriano, nas Ilhas Faial, Pico, Angra do Heroísmo e S. Miguel.

19 de Junho de 2010 - 3º Encontro Continental,

3 a 9 de Julho de 2010 - 2º Encontro Açoriano, nas Ilhas Faial, Pico, Angra do Heroísmo e S. Miguel.

18 de Junho de 2011 - 4º Encontro Continental,

16 de Junho de 2012 - 5º Encontro Continental,

15 de Junho de 2013 - 6º Encontro Continental,

21 de Junho de 2014 - 7º Encontro Continental,

20 de Junho de 2015 - 8º Encontro Continental,

18 de Junho de 2016 - 9º Encontro Continental,

17 de Junho de 2016 - 10º Encontro Continental.

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Nota do editor:

Último poste da série > 9 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17227: Álbum fotográfico de Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil, CCAÇ 4740 (Cufar, dez 72 / jul 73) e Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, jul 73 /ago 74) (14); Uma horta em Missirá, no regulado do Cuor

Guiné 61/74 - P17266: Notas de leitura (948): A Revista Panorama, editada pelo SNI – Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, dedicou o número 5/6, II Série, de 1952, à Africa Portuguesa (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Fevereiro de 2016:

Queridos amigos,
A revista Panorama, como é de todos sabido, era uma publicação pró-regime e muitas vezes nela apareciam artigos referentes ao Império.
Este número é dedicado à África Portuguesa e prendia-se com um acontecimento turístico, o IV Congresso Internacional de Turismo Africano, que se realizou em Lourenço Marques. O artigo referente à Guiné mostra-nos uma paisagem de Canhabaque (Bijagós), vemos habitação de Manjacos, embarcação dos Bijagós, cavaleiros Fulas do Boé e o jazigo dos régulos dos Mancanhas, em Bula.
Texto apologético para quem gostasse de safaris ou se sentisse atraído por certos prodígios da natureza, que aqui se deixam registados.

Um abraço do
Mário


A Guiné na Revista Panorama, 1952

Beja Santos

A revista Panorama era editada pelo SNI – Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo. O seu número 5/6, II Série, de 1952, foi dedicado à África Portuguesa. A Guiné foi credora de quatro páginas. Importa esclarecer que este número sobre África Portuguesa privilegiava o turismo, tudo quanto se vai ler é para o potencial turista da época.

Primeiro, o acesso. Para o articulista, é fácil e cómodo: as grandes linhas aéreas da Europa e da América do Norte para a África do Sul, e da Europa para o Brasil e Argentina, têm ponto obrigatório de aterragem em Dakar – e uma carreira semanal de aviões liga Dakar a Bissau e outra, via Ziguinchor permite a comunicação aérea com Dakar e o resto do mundo. No meu livro “Mulher Grande”, foi o itinerário que organizei para Benedita Estevão, viajou de Lisboa até Dakar, Albano Toscano foi esperá-la a Ziguinchor, dali seguiram para Susana, onde casarão.

Mas o turista também podia optar pela via marítima, havia uma carreira quinzenal direta a Bissau, regressando pela Praia e por S. Vicente, podia também passar pela Madeira.

Segundo, o leitor prepare-se para ler o incrível. “As estradas de bom piso sulcam o território em todos os sentidos, assegurando o trânsito em qualquer época, com chuvas ou bom tempo”. Nunca há empecilhos: pontes a substituir as jangadas, garantindo segurança e rapidez.


Terceiro, chegámos à exuberância da fauna e da flora: “Certas zonas são ricas de caça, aves de plumagem desvairada e berrante, antílopes, por vezes o leopardo (onça) e o búfalo, por toda a parte as formações geométricas dos patos bravos evolucionando ou descansado nos pântanos e charcos, as pintadas e pesadonas galinhas-do-mato, enormes perdizes, lebres e caçapos”. O autor, Vieira Ferreira, entusiasma-se na sua escrita mexida e remexida, é assim que ele gosta de imprimir a vivacidade às coisas: “E a teoria infindável dos monos, nas árvores, em multidão nas estradas, brincalhotando ou renhindo, baloiçando-se, pinchando acrobacias, arremedando macaquices”. Segue-se outra forma de exuberância: “Depois, a presença dos rios, canais, bolanhas e lalas, esmalta a paisagem de superfícies espelhentas, suas largas faixas lisas lentamente deslizando, em curvas longas, marginadas de compactas muralhas verdes de arvoredo altíssimo e camalhões inextrincáveis de arbustos emaranhados; e regulares bacias, onde a pauta dos regos do cultivo do arroz ondula os fundos, em pequenas dunas paralelas e longíssimas, regulares e submersas; tufos de mangal e nódoas floridas de lotos, mal escondendo esverdinhadas estagnações de águas paradas – é sempre um inesperado acompanhamento líquido, quebrando a continuidade da floresta, irrompendo por todos os lados”.


Viu-se que o articulista consultou ou seus contemporâneos, repescou uma síntese de M. Marques Mano que é de grande beleza, a propósito da influência absorvente das marés na zona litoral: “… o mar, duas vezes por dia, arremessa contra a terra, em toda a largura da costa, massas de água de 6,5 metros de altura. O volume colossal desta maré enche as bacias hidrográficas até transbordar; mas logo se escoa até as deixar esgotadas; e outra vez é arremessado com uma energia portentosa”.
“Os estuários da colónia, poderia dizer-se, são alimentados só pelo mar: não o são pelos afluentes, muito poucos e escassos. Os estuários, por sua vez, alimentam as bacias hidrográficas. Acima do nível da baixa-mar não há rios: há leitos lodosos, abertos e enxutos, que circulam entre bandas verdes de mangal no eixo das lezírias. A enchente jorra pela boca daqueles labirintos de fossos de lodo e, seis horas depois, fluem rios majestosos, amplos, abertos ao sol, em altos corredores de verdura tão sagrada que através ela se não veem as margens, em percursos tão longos que as velas levam dias a subi-los. Seis horas depois, como por encanto, os rios desaparecem e, no lugar deles, deixam uma vastíssima rede de valas lobregas. Seis horas mais tarde, os rios renascem em toda a majestade; de novo se esgotam e de novo renascem” (Visita à Guiné, no Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, Volume 2, 1947, n.º 6).

E temos igualmente o fenómeno do macaréu, mais um prodígio para aguçar o apetite do turista: “A corrente que desce, comprime a onda imensa da maré que quer subir, provocando a acumulação das águas na embocadura; depois, o mar acaba por vencer o rio, e a vaga salgada, ruidosa, indomável, altíssima, em rolo espumante, galga a superfície do rio, rugindo, alagando, invencível e brutal, de maior, descomunal volume nas marés vivas”.

Jazigo dos régulos dos Mancanhas, Bula

Muitas orientações são sugeridas ao turista, a quem se recorda que existe o tornado, pitorescas casas circulares, cada uma das etnias tem formas próprias de agrinaldar os exteriores e interiores. Há os costumes guerreiros ou pacíficos, há batuques e cerimónias, o turista que esteja atento ao vestuário e atitudes de cada um, pois são dissimilantes os de Felupe com o Balanta, O Bijagó com o Fula, há muçulmanos solenes, Bijagós com saiotes de ráfia, os Papéis mais europeizados, há alfanges e punhais. Enfim, a paisagem humana completa a paisagem natural e faz de uma visita à Guiné um raro prazer turístico. E temos a moderna Bissau com os seus pequenos hotéis, o Bissau velho ao lado da Amura. Que o leitor não abstraia de que estávamos no início da década de 1950, propõe-se ao turista que estivesse atento ao que tinha para ver: estádio, museu-biblioteca, palácio do governo, bairros residenciais, burgo comercial, avenidas de arvoredo florido e, a poucos quilómetros, o magnífico aeroporto em acabamento. E dirige-nos uma nota para aquele rincão que muito tocou: “É em Bolama – a melancólica cidade morrente – que reside o supremo encanto das povoações que os brancos ergueram nestas partes. Antiga capital, ainda hoje mostra os restos das sua senhorial grandeza, em edifícios públicos, praça do conjunto, carateres de negros e mestiços; e uma nostalgia tão doce, um tal conformismo amargo e suave com a decadência e a morte, uma atmosfera de saudade e triste resignação que nos penetra e emociona”.

Qual seria o leitor que iria resistir a tantas atrações, a tanto feitiço africano?
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Nota do editor

Último poste da série de 17 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17250: Notas de leitura (947): "Em Tempos de Inocência", por António Pinto da França, Prefácio, 2006 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P17265: Parabéns a você (1242): António Branquinho, ex-Fur Mil Inf do Pel Caç Nat 63 (Guiné, 1969/71)

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Nota do editor

Último poste da série de 19 de Abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17257: Parabéns a você (1241): Augusto Vilaça, ex-Fur Mil Art da CART 1692 (Guiné, 1967/69); Leão Varela, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 1566 (Guiné, 1966/68) e Victor Barata, ex-1.º Cabo Especialista MMA - DO 27 da BA 12 (Guiné, 1971/73)

quinta-feira, 20 de abril de 2017

Guiné 61/74 - P17264: Inquérito 'online' (107): "Este ano vou ao nosso encontro, em Monte Real, em 29 de abril"... As 35 primeiras respostas: 60% não vai este ano...


Palace Hotel Monte Real (Termas de Monte Real) > 16 de Abril de 2016 > XI Encontro Nacional da Tabanca Grande...

Foto de família © Miguel Pessoa


I. INQUÉRITO DE OPINIÃO:

"ESTE ANO VOU AO NOSSO ENCONTRO, EM MONTE REAL, EM 29 DE ABRIL..."


As 35 primeiras respostas (*):


Sim, vou  > 12 (34,3%)
Não vou > 21 (60,0%)
Ainda estou indeciso > 2 (5,7%)

Total > 35 (100,0%)



Razões invocadas para não ir (n=21):


(i) ter outra festa ou convívio nesse dia  > 6 (17,1%)

(ii) razões de saúde  > 2 (5,7%)

(iii)  ser uma despesa grande  > 2 (5,7%)

(iv) falta de interesse  > 2 (5,7%)

(v) falta de transporte  > 1 (2,9%)

(vi)  outras razões  > 8 (22,9%)


II. O inquérito termina no dia 25 de abril, às 23h40.

Queremos conhecer a intenção dos amigos e camaradas da Guiné relativamente à ida (ou não) ao XII Encontro Nacional da Tabanca Grande, a realizar em Monte Real, no próximo sábado, dia 29.

A resposta ao inquérito deve ser dada, "on line", diretamente, no canto superior esquerdo do blogue.

Como acontece todos os anos, há camaradas que se inscrevem pela primeira vez, e serão recebidos, como sempre, de braços abertos... Outros não costumam falhar, mas este ano têm conflitos de agenda, ou problemas de saúde ou outros motivos para não poder ir. Outros haverá ainda que não tiveram conhecimento do realização do encontro... Por fim, há sempre os indecisos e os que guardam a inscrição para a última hora...

A lotação da sala de almoço, no Palace Hotel Monte Real, são 200 lugares.

O inquérito também ajuda a promover a nossa festa anual. Recorde-se que este ano celebramos os nossos 14 anos de existência enquanto bloguue. O nº total de membros da Tabanca Grande, registados, é de 742 (dos quais, infelizmente, 54 já morreram).



Convém informar os nossos leitores que deixámos de poder contactar por email, em BBC, todos os membros, registados, da nossa Tabanca Grande... Os servidores de email (Gmail, Outlook...) consideram essas mensagens como SPAM (publicidade indevida e correio indesejável), e corremos o risco de nos cancelarem as contas.

Recorde-se que o prazo de inscrição no XII Encontro Nacional da Tabanca Grande termina no final do dia 23, domingo. (**). 


Estamos, no dia de hoje, ao fim da tarde, com 124 inscritos, ainda longe do pleno (200 lugares).
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Guiné 61/74 - P17263: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (28): Gostaria de lhe chamar pai, autoriza?

1. O nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), em mensagem do dia 7 de Abril de 2017 enviou-nos, desta feita, uma memória bem recente para integrar as suas outras memórias da guerra.


Outras memórias da minha guerra

27 - Gostaria de lhe chamar pai. Autoriza?

Há uns meses fui contactado por uma senhora, através de mensagem no Facebook:
- O Senhor Ferreira esteve na guerra do Ultramar?
- Sim, nos anos de 67 a 69. Estive na Guiné - respondi.
- Desculpe, eu procuro o senhor A. Ferreira que esteve em Machava, Moçambique, como Chefe de Cozinha da Marinha, nos anos de 66 a 68. Por acaso, não o conheceu?
- Não. Tive e tenho poucos contactos com malta da Marinha.
- Gostaria tanto de o encontrar. Por favor, veja se consegue ajudar-me a localizá-lo. Eu sei que é muito difícil, mas ficaria muito agradecida.

Fez-se minha amiga virtual, através do Facebook, por onde fomos dando sinais de vida. Aconselhei-a a insistir na procura, junto das entidades oficiais. Pensei que ela haveria de conseguir. Mas, por outro lado, fiquei com a ideia de que ela poderia estar a tentar fazer esse contacto apenas para alimentar alguma ligação saudosista à presença portuguesa em África. Porém, mais tarde, noutro contacto, por altura do seu aniversário, em que ela me pareceu um pouco incrédula, acabei por lhe prometer que brevemente a iria contactar, para a ajudar. Nessa altura, já eu estava a pensar que talvez conseguisse uma ampla divulgação do assunto, através dos vários grupos de ex-Combatentes que proliferam no Facebook.

O tempo correu rapidamente, enquanto eu esperava arranjar maneira de a ajudar (de verdade!), partindo do princípio de que o assunto ainda não estava suficientemente explorado pelo lado dos ex-Combatentes.

Recentemente, pelo meu aniversário, recebi dela uma mensagem:
- Muitas Felicidades para o Avô e Pai que nunca tive.

Agradeci normalmente, tal como o fizera a várias centenas de mensagens.

Passados uns dias, após algumas tentativas infrutíferas de novo contacto, li esta mensagem:
- Gostaria de lhe chamar pai. Autoriza?

Não agradeci nem respondi. Fiquei preocupado. É que eu tenho a certeza de que não deixei descendência em África. E acredito que a minha família também tenha essa certeza. (Ora, já viram o que seria quando “topassem” que alguém estranho me chamava pai?).

Propositadamente, deixei de responder a qualquer trivial cumprimento, apesar de várias tentativas. Até que hoje, pelas 17H00, fiz questão em atender, pela primeira vez, a voz da Maria do Carmo.
E ela logo perguntou:
- A sua saúde, está melhor?
- Sim. Obrigado. De onde está a falar?
- Eu sou de Moçambique, mas vivo na África do Sul.

Sem mais rodeios, acrescentei:
- Estou em falta consigo, porque prometi ajudá-la e ainda nada fiz.

E continuei:
- Por favor diga-me o que quer verdadeiramente.

Ela respondeu pausadamente e de forma bem explícita:
- Chamo-me Maria do Carmo Ferreira e procuro o meu pai A. Ferreira, que foi Chefe dos cozinheiros na Capitania Rádio Azul da Machava, Moçambique, nos anos de 66 a 68. Deve ter ido em finais de Dezembro de 1968. Nasci dois meses antes de ele regressar a Portugal. A minha mãe, Maria Teresa, dizia que ele queria que eu tivesse o nome de sua mãe, M. do C. Ferreira. Também dizia que ele me queria perfilhar e levar-me para Portugal. Ela chegou a esconder-me porque teve medo que eu fosse raptada. Minha mãe faleceu quando eu tinha 13 anos. Sempre quis conhecer a minha família de Portugal. Já procurei em vários organismos oficiais e sempre esbarro no facto de não ter documentos. Também me disseram que ele não consta como militar, que devia ser civil. Estou casada e tenho quatro filhos e dois netos. Nós seremos sempre de sangue português.

Sem ser interrompida, continuou:
- Não quero pedir outro tipo de ajuda. Vivo sem carências de maior. Mas assim nunca poderei ser feliz. Tenho 48 anos e vivo com esta amargura permanente de nunca ter conhecido o meu pai nem a minha família de Portugal.

Maria do Carmo Ferreira

Um dos filhos da Maria do Carmo

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Nota final:
O texto que acabaram de ler, embora pareça, não pretende fazer humor nem minimizar o estado de espírito da senhora que me contactou, até porque, agora, é o próprio filho (engenheiro químico) que me contacta também para os ajudar a localizar pai e avô.
Se algum de vós puder dar alguma informação que possa levar a esse camarada que prestou serviço em Moçambique, coloque-a em comentário a este post ou contacte os editores deste blogue.
O autor teve o azar (melhor, a sorte!) de se chamar “Ferreira”…
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Nota do editor

Último poste da série de 16 de março de 2017 > Guiné 61/74 - P17146: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (27): Controlo sanitário

Guiné 61/74 - P17262: Convívios (794): XV Encontro do pessoal da CART 2520, dia 20 de Maio de 2017, em Almeirim (José Nascimento, ex-Fur Mil)

1. Mensagem do nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) com data de 19 de Abril de 2017:

Caro camarada Carlos Vinhal, 
A CART 2520 vai realizar o seu 15.º convívio no dia 20 de Maio em Almeirim. 
No intuito da convocatória chegar ao máximo número de combatentes desta Companhia, agradeço a divulgação da mesma na nossa Tabanca Grande. 

Um grande abraço do 
José Nascimento


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Nota do editor

Último poste da série de 11 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17232: Convívios (793): XXII Encontro do pessoal do BCAÇ 2885, dia 20 de Maio de 2017, em Coimbra (César Dias, ex-Fur Mil Sapador)

Guiné 61/74 - P17261: (In)citações (106): Macau e Guiné-Bissau, dois pesos e duas medidas... Deu-se a nacionalidade portuguesa a cerca de 100 mil macaenses, a grande maioria incapaz de trocar meia dúzia de frases na língua de Camões... Em contrapartida, milhares e milhares de guineenses que lutaram (e muitos morreram ou ficaram feridos), nas fileiras do exército português durante a guerra colonial, foram votados a um destino cruel... (Manuel Amante da Rosa, cabo-verdiano, diplomata, ex-fur mil, QG/CTIG, Bissau, 1973/74)

1. Do nosso amigo, camarada e grã-tabanqueiro, 
ex-fur mil, QG/CTIG, Bissau,1973/74, Manuel Amante da Rosa, embaixador plenipotenciário da República de Cabo Verde em Itália desde 16/1/2013, e agora também em Malta [, foto, acima, de 2013; cortesia da RTC - Radiotelevisão Caboverdiana]



Data: 13 de abril de 2017 às 12:23
Assunto: Público-2017/04/13 (*)


Meus Caros,

Um desabafo estritamente pessoal, que não seja somente a de partilhar convosco esta reflexão, bem fora do âmbito de qualquer polémica ou publicação.

Há muito que venho seguindo este sistema de "dois pesos, duas medidas" usados pelas autoridades lusas ao tempo da descolonização. O diário português "Público", de hoje, trás nas suas páginas 12 e 13, no quadro do 30º Aniversário da transferência de Macau à China, o tratamento diferenciado dado aos africanos e, mais tarde, os dados aos residentes chineses daquele diminuto território asiático.

Curtos onze anos após as negociações para a Independência das Colónias africanas, foram concedidos nacionalidade portuguesa a cerca de uma centena de milhar de pessoas residentes em Macau. Por iniciativa negocial e visão acertada dos negociadores lusos em confronto directo com o estatuído na lei chinesa.

80% ou mais deste contingente que era visado nem a primeira estrofe do Hino Nacional de Portugal conheciam para não dizer cumprimentar e/ou trocar algumas frases na língua de Camões.

E ainda hoje, para aqueles que permaneceram na RAEM [ Região Autónoma Especial de Macau], este desconhecimento é total.

A língua portuguesa, apesar dos onerosos montantes alocados pelo Executivo macaense, continua como francamente residual e raramente usado fora das repartições e do núcleo da comunidade lusa.

Este assunto, da atribuição pertinente e massiva da nacionalidade portuguesa, foi seguido por mim com especial interesse e interrogações por ter sido militar do exército português, no seu último ano e meio e ter convivido com a violenta guerra, desde criança, porque tudo se relacionava a ela, ao fim e ao cabo. Não havia como se estar à margem do ambiente bélico.

De uma maneira geral, em todas as colónias havia forte contingente de nativos/indígenas, integrados em pelotões independentes e companhias, enquadrados por graduados e oficiais oriundos da metrópole. Mas para além das forças militares regulares, de recrutamento obrigatório, haviam ainda, numa base de voluntariado, os contingentes das forças especiais, das milícias locais, organizadas em unidades auxiliares nas unidades militares, outras constituídas em auto-defesa, contigentes de cipaios e forças para-militares (unidades de polícias).


Na Guiné, pela sua pequena dimensão territorial e humana, a contribuição dada ao exército português foi relevante em todas as frentes de combate, nas patrulhas e operações de grandes envergaduras, nas defesas dos quartéis, construções de estradas e outras infra-estruturas e até nas forças especiais.

Lógico que milhares sofressem ferimentos em combate e acidentes, outros encontrassem a morte ou e ainda outros milhares ficassem com sequelas de guerra, uns estropiados e outros com stress pós-traumático.

Mas que outros milhares fossem distinguidos com cruzes de guerra, louvados, condecorados, citados em ordens do dia, premiados e levados
para a ex-metrópole em gozo de férias.

É consabido (e conheço casos) que soldados africanos se tenham  sacrificado, tenham salvo a vida ou ajudado os seus camaradas brancos  nos confrontos da contra-guerrilha.E vice-versa, está claro!

Raros, muito raros, foram aqueles que não acabassem o período de 3 anos de serviço militar sem saberem entender ou se exprimir em português. Era de cariz obrigatório a alfabetização no exército, até  pelo menos a quarta classe. Pelo menos na Guiné. Assim como conhecer  rudimentos da história de Portugal e cantar o Hino Nacional.

Quando tenho a oportunidade de retornar à Guiné e encontro, em todo o lado, esses idosos e valorosos militares das forças armadas  portuguesas, abandonados à pressa e à sua sorte e me vem ainda ao  pensamento os milhares que acabaram fuzilados, após a guerra, sempre  me pergunto porque raio de circunstâncias o destino lhes traçou esse
nefasto rumo.


E, se por força do esforço pessoal e determinação, conseguem chegar a  Lisboa, para se radicarem ou tratarem da saúde e das sequelas da  guerra, vale-lhes mais a solidariedade, camaradagem e memórias dos
antigos oficiais ou camaradas para calcorrearem a via crucis… do que  qualquer outra instituição a que com garbo e sacrifício pertenceram. (**)

Abraços

Manuel Amante

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Notas do editor

(*) Vd. Bárbara Reis > Há 30 anos, Portugal surpreendeu a China nas negociações de Macau > Públicio, 13 de abril de 2017

(...) As negociações sobre a transferência de Macau duraram nove meses e, para Augusto Santos Silva, são “um marco na história diplomática de Portugal”. E ajudaram, 30 anos depois, a eleger António Guterres secretário-geral das Nações Unidas.(...)