terça-feira, 6 de novembro de 2018

Guiné 61/74 - P19171: A galeria dos meus heróis (11): O Zé Nuno, o Tony Mota e o Belmiro Mateus, três amigos, três destinos – Parte I (Luís Graça)



Luís Graça, Contuboel,  CCAÇ 2590 / CCAÇ 12, julho de 1969

A Galeria dos Meus Heróis (11): O Zé Nuno, o Tony Mota e o Belmiro Mateus, três amigos, três destinos – Parte I (Luís Graça)




− Meu caro Belmiro, dá-me cá um valente quebra-costelas, como se diz lá em baixo no meu Além... Tejo!

− E tu, como vais, meu velho ? – respondeu efusivamente o Belmiro, ao abraço apertado e prolongado do António, Tony para os amigos.

− Cá vamos andando, menos mal!...Velhos, carecas e gordos! – replicou o Tony.

− Cá vamos andando, como dizem os mouros cá de cima, de Riba... Tejo.

Em muito pouco tempo, em escassas semanas, era a segunda vez que se encontravam, depois de longos anos sem se verem, o Belmiro Mateus, advogado, e o António Mota, professor de história do ensino secundário, dois conterrâneos agora separados pelo Tejo.

− Cada um para seu lado, Belmiro. O nascimento aproximou-nos, a vida ou a história afastou-nos. Bolas, e se éramos amigos de coração!

− Como irmãos, Tony, como irmãos!... É verdade, não se escolhe pai e mãe, e a terra natal é aquela que nos calha na rifa da sorte!

− ... aquela que nos calha na rifa da sorte, dizes bem!

Reencontravam-se agora no cemitério da terra natal, pela segunda vez em dois meses, o que queria dizer “por circunstâncias infelizes”. Desta vez, vinham acompanhar um amigo comum, o Zé Nuno, “até à sua última morada”.

− Que raio de sítio – pragejou o António – para o reencontro de dois velhos amigos, conterrâneos, vizinhos… e condiscípulos!

− E manos, acrescebta aí!

O Belmiro, ainda hoje supersticioso, confessou que, quando era novo, tinha um medo que se pelava de passar por aquelas bandas, sozinho, à noite, fora das muralhas que delimitavam o casco velho do antigo burgo medieval.

O cemitério tinha sido construído há cento e tal anos, no tempo do senhor Dom Luís de boa memória, e localizava-se no início da lezíria, que era o grande celeiros da vila ribatejana.

− À noite, só de pensar nos fogos fátuos, nas corujas, nas bruxas, nas almas penadas, nos lobisomens... ficava com os cabelos em pé!

− Eu, também, confesso, nessas coisas era um medricas… Mas, lembras-te, Belmiro ?!... As nossas patifarias, tais como caçar lagartos no muro do cemitério...


−... com anzóis de pesca e bocados de pão, embebidos em leite!... Para o que nos devia de dar!... Esses lagartos, hoje, foi espécie que desapareceu.

− Espera, não eram lagartos, eram sardões! Eram verdes, podiam medir um ou dois palmos.

O Belmiro lembrava-se que o bando de garotos de escola enfiava um laço à volta do pescoço do bicho, e com um cordão comprido passeavam-no pelas ruas e vielas da terra, metendo medo aos mais fracos, as crianças mais pequenas,as raparigas, as mulheres e os velhotes…


− Acho que éramos sádicos e cruéis como todos os miúdos na pré-puberdade, a aprender a ser machos!

− Mas, já agora, Belmiro, acrescenta ao rol dos nossos crimes de malvadez partir os vitrais da rosácea da velha igreja matriz… À pedrada, imagina!

− Se me lembro, Tony, ainda hoje carrego essa culpa, por crime de lesa-património. Bolas, era (e é) uma magnífica igreja, gótica, monumento nacional, um lugar sagrado, a casa de Deus!... Que estupores!... Meninos de coro e escuteiros, ainda por cima. E, tens razão, era a casa de Deus!

− Se bem que fechada ao culto, na altura estava para obras, com andaimes...

E aqui o Belmiro reconstituiu a cena do grupo de “peles vermelhas”, ululantes, montados nos seus cavalos de cabo de vassoura, comandados pelo grande chefe “Língua de Víbora”, um primo mais velho do António, que há-de, logo a seguir, em meados dos anos 50,  emigrar com a família para o Canadá.


− Montados em cavalos de cabo de vassoura, como os das bruxas,  e disparando saraivadas de setas com arcos de pau de tramagueira!...

− Mas que terrorista,  esse meu primo, filho de uns tios-avós. O gajo safou-se, mesmo a tempo, de ir parar mais tarde, com os quatro costados à Índia ou a até a Angola...

O “Língua de Víbora”!... O Tony nunca conhecera, no seu tempo de escola, miúdo mais endiabrado, mal educado, traquinas, se não mesmo mau e perverso, como o seu primo em segundo grau.

A alcunha cabia-lhe que nem uma luva, tinha-lhe sido dada, ninguém sabe por quem, devido às patifarias que ele pregava e sobretudo às asneiras que ele deitava pela boca fora. Todos os palavrões que o Tony sabia (e que usou pela vida fora...) tinha-os aprendido com o primo, mais velho uns três ou quatro anos... Era expulso com frequência da escola e da catequese pela sua insolência e má-criação. E, no entanto, a mãe era uma santa senhora, daquelas que iam à missinha todos os dias. O pai, pelo contrário, era um carroceiro.

− Mas, sabes, eu tenho saudades dele e do nosso bando de "índios" – atalhou o Belmiro. – Dele e toda essa malta, rapazes e raparigas que fizeram parte da nossa infância e que, já em plenos  anos 50, começaram ir-se embora, uma parte deles para o Brasil, a América, o Canadá!...

− Cá tens, o exemplo de um mau líder de grupo que faz maus rapazes. O "Língua de Víbora", há séculos que não sei dele, espero que não se tenha perdido no Novo Mundo… Oxalá ainda esteja vivo!

− Ficas a saber, Tony, que eu nunca tive a coragem de confessar ao padre frei Batista esse grave pecado, o de atirar pedras aos vitrais da igreja. Para mim, puto, era um pecadilho, daqueles que não dava condenação ao inferno, apenas simples castigo no purgatório.

E foi logo recordado por ambos os amigos a figura do bom frei Batista, mais tarde missionário, franciscano, barbaramente assassinado,  a golpe de catana, em março de 1961, no norte de Angola.

− Que raio de memórias, fomos buscar!... Mas, voltando ao que aqui nos traz hoje, o doloroso dever de homenagear o nosso já saudoso amigo Zé…

− Já se foi, António, já aqui está na terra da verdade… Horrível, um cancro, fulminante, que em poucos meses o levou…

− É tramado, Belmiro… Um rapaz da nossa geração, da nossa colheita...

O Zé Nuno era ligeiramente mais velho, uma meia dúzia de meses, que o Tony e o Belmiro. Fez o antigo curso de engenharia técnica em Lisboa e depois alistou-se na Marinha. Ficou na Reserva Naval e foi mobilizado para Moçambique onde desempenhou funções de imediato de uma orveta da Marinha.

− A imagem que eu tenho dele era o moço de forcados, rijo pegador de touros, marialva, “bon vivant”...

− Bom garfo, melhor copo, mas… mau cavaleiro! Não tinha jeito nenhum para montar, até eu, que não tinha cavalos, montava melhor do que ele…

− Mas valente como ninguém na cara dos touros... Enfim, é o lídimo representante de uma geração que está a desaparecer.

− Inteiramente justo o que dizes, Tony.

− Como sabes, Belmiro, eu nunca fui amante da festa brava, que continua a ter muitos aficionados na nossa terra, em todo o nosso Ribatejo e o nosso Alentejo.

− Eu sei, Tony, os amigos não têm que ter todas as afinidades. Como eu gosto de dizer, no círculo estreito da amizade cabemos todos com tudo o que nos une e até com aquilo que nos pode separar... E as touradas (e já agora a bola e a política) são algumas delas...

− Sim, Coisas que nos podem separar, a política, a religião, o futebol…, o que no cômputo final representa 90% das nossas conversas de machos…

− Mete aí também o tempo, passamos a vida a falar do tempo que faz, ora sol ora chuva, ora calor ora frio... Mas isso é inócuo, é conversa da treta... De qualquer modo, o Zé tinha outras vivências e origens sociofamiliares. Os touros, o fado, os cavalos, o marialvismo, a boémia... eram coisas que ele tinha bebido no leite materno...

− ... e que estavam nos genes do pai. De qualquer modo, vai-nos fazer falta, o Zé, a todos nós – lamenta o António.

− Vai fazer falta à terra, ao grupo de forcados, à festa brava, à malta que gosta do fado e sobretudo à família e aos amigos. Era um coração aberto, generoso como poucos…

Fez-se um silêncio, entre ambos, sentados, ali no muro do cemitério, a "relembrar os bons velhos tempos"... O Belmiro continuou a conversa:

− Sabes, fico sempre jeito, nestas ocasiões. Eu que tenho a mania que falo bem, e de improviso, com tantos anos de barra nos tribunais, nunca encontro as palavras certas para consolar a família e os amigos mais íntimos... Sim, o Zé era o mais afável de todos os nossos amigos de infância, e se calhar o melhor de todos nós. Aquelas mãos brutas e aqueles braços compridos de pegador de touros, e sobretudo aqueles dedos mágicos de dedilhar a guitarra,  também sabiam dar afagos e xicorações, como ninguém… Era uma joia de moço, um encanto...


E esclarece:

− Foi meu companheiro de caça durante muitos anos, se bem que a política nos tenha afastado um pouco, antes e depois do 25 de Abril. Ele teve dificuldade em lidar e aceitar o meu esquerdismo dos verdes anos... Foi também para Lisboa, estudar, mas raramente nos encontrávamos lá, eu em direito, ele em engenharia... Sei que o seu sonho era ir para o curso de regentes agrícolas em Santarém, tinha lá amigos do grupo de forcados... Mas o pai, homem autoritário, achava que seria borga a mais... De resto, o irmão mais velho, o "Morgadinho", é que começou cedo a tomar conta da herdade. Dizia que não tinha cabeça para estudar...

− Autoritário e mulherengo, o pai, acrescenta aí. Nunca foi, aliás, das minhas relações – arrematou o Tony.

− Infelizmente, a casa agrícola, outrora próspera, prestigiada, com tradições republicanas, está de pantanas, hipotecada aos bancos... Confirma-se a velha teoria de que em três gerações dá-se cabo do  património de uma empresa, neste caso agrícola, uma das maiores e melhores do nosso concelho.

− Olha, costuma-se dizer "coitado é de quem cá fica", refiro-me em concreto à viúva, que encontrei, ontem, no velório, lavada em lágrimas...

− Era uma miúda muito gira, talvez a mais bonita da terra. Destroçou corações...

− Disso já não me lembro, Belmiro. É bastante mais nova do que nós, e eu mal a conheço.

Para o Belmiro, o advogado, estes não eram tempos bons para um gajo bater a bota e deixar a família em maus lençóis.

O Zé tinha casado tarde, ficou solteirão até aos quarenta, mantendo uma tradição que remontava até ao bisavô, republicano, amigo e admirador do José Relvas, da Golegã.

− E, ao que sei, deixa ainda um filho a estudar em Coimbra. E outro com problemas de saúde mental, creio que é bipolar.

− A desvantagem de se viver num vilória como a nossa: não há vida privada – concluiu o Tony. 
– Vai parar tudo à praça pública, até os segredos de padre no confessionário e do clínico no consultório...

E prosseguiu:

− O raio da gadanha da morte não escolhe idade nem condição, ceifa o pobre, ceifa rico, o jovem e o velho, o homem e a mulher… Também não sabia que ele tinha passado por África, pela guerra colonial…

O António tinha perdido o contacto com a malta do seu tempo, da escola primária Conde de Ferreira e do colégio João XXIII, os que ficaram pela terra e sobretudo os que partiram... E foram muitos, não só para a França e a Alemanha, como até para o Novo Mundo (Brasil, EUA, Canadá)... Um ou outro fixou-se em Angola e Moçambique, depois de terminado a comissão de serviço militar.

− Além da grande Lisboa, os felizardos, como tu e o Zé, que tiveram possibilidade de prosseguir os seus estudos…


O António, Tony para os amigos da terra, estudara até ao 5º ano do liceu no colégio João XXIII, com grande sacrifício do pai, que tinha uma pequena oficina de serralharia. 

Depois, aos 16 anos, tinha tido uma “crise mística” e decidiu ir para o seminário. Fez a filosofia e parte da teologia, envolvendo-se no 10º ano com um grupo da JUC – Juventude Universitária Católica que, na associação de estudantes,  tirava a “stencil” uns panfletos contra a guerra colonial. 

Numa noite, foi apanhado pela PSP a colar "papéis subversivos" nos candeeiros, junto às esplanadas dos cafés da Avenida de Roma... Terá havido uma denúncia de algum empregado mais zeloso da propriedade alheia ou, o que era mais provável,  de algum bufo da PIDE… As mensagens eram "pacifistas", o que não  livrou o Tony, já "quase padreco"(siv), de passar uma noite na António Maria Cardoso, juntamente com mais dois ou três rapazes do grupo da JUC. O caso chegou aos ouvidos do Patriarcado de Lisboa e foi comunicado ao seminário dos Olivais. 

O silêncio da Igreja em relação à guerra colonial e aos católicos presos por "motivos políticos" levaram o Tony a questionar a sua vocação. Saiu do seminário, aos 20 anos. E aos 21 estava em Mafra a fazer a recruta. Escassos meses depois era mobilizado, em rendição individual, para a Guiné, como alferes miliciano de infantaria, para uma companhia de caçadores, independente, composta por praças do recrutamento local.


 [Continua]

Guiné 61/74 - P19170: Parabéns a você (1520): Jorge Cabral, ex-Alf Mil Art, CMDT do Pel Caç Nat 63 (Guiné, 1979/71)

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Nota do editor

Último poste da série de 3 de novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19162: Parabéns a você (1519): Tenente-General PilAv António Martins de Matos, ex-Tenente PilAv da BA12 (Guiné, 1972/74)

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Guiné 61/74 - P19169: Notas de leitura (1117): “Racismo em português, o lado esquecido do colonialismo”, por Joana Gorjão Henriques; Tinta-da-China, 2016 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Maio de 2016:

Queridos amigos,
O trabalho da jornalista Joana Gorjão Henriques apareceu inicialmente no Público, foi um projeto de cinco reportagens nas cinco ex-colónias africanas. Quarenta anos passados sobre a independência das ex-colónias, importava questionar até que ponto o racismo afeta ainda hoje as relações sociais, políticas e económicas nesses países. Reconheço o mérito do trabalho, mas confesso que o mesmo merecia tratamento caleidoscópico, por isso introduzi uma questão de peso para Angola e Moçambique, os brancos de primeira e de segunda. Acresce que também era útil questionar como é que a descolonização, ao olhos dos portugueses afeta as nossas relações com esses países, também tem que se medir o pulso aos antigos colonizadores e sua descendência para saber como se pôde descomplexar e erradicar as relações sociais em que o branco aparecia sempre em superioridade.

Um abraço do
Mário


Racismo em português, o lado esquecido do colonialismo: 
O testemunho da Guiné-Bissau

Beja Santos

“Racismo em português, o lado esquecido do colonialismo”, por Joana Gorjão Henriques, Tinta-da-China, 2016, é uma reportagem em que 40 anos depois da descolonização a jornalista foi perguntar até que ponto persistem ainda hoje as ideias de raças espalhadas por Portugal nesses países, como é que as populações dos países colonizados olham para o papel de Portugal enquanto colonizador, trabalho feito em cinco viagens às cinco ex-colónias portuguesas. A autora conta-nos como trabalhou: “Em cada país escolhi uma amostra de entrevistados, proporcional ao número de habitantes. O objetivo era reunir vozes que representassem as diferenças existentes: de classe social, de género, de situação profissional, de origem geográfica, de experiência pessoal, de interpretação. Interessou-me ouvir o passado e saber que marcas persistem desse passado ainda hoje”.

Como seria de esperar, há narrativas similares e naturais dissemelhanças decorrentes do processo descolonizador. Veja-se Angola: houve segregação racial em autocarros para brancos e para negros; havia brancos, assimilados e indígenas. A autora não entra em pormenores, mas havia duas categorias de brancos, os de primeira e de segunda, como Jerónimo Pamplona em “Angola Noutros Tempos, Por Terras do Golungo e de Ambaquistas”, Pangeia Editores, 2016, claramente refere: os naturais da colónia e os oriundos da metrópole, brancos europeus e brancos de segunda, estes nascidos nas colónias. A identidade de cada um fixava-se nos documentos oficiais, para os brancos com indicação do território colonial de origem e a menção de não indígena ou europeu para os nascidos na metrópole. E adianta: “O regime colonial português construiu uma hierarquia racial baseada no cruzamento de dois conceitos distintos – raça e naturalidade. Os brancos naturais de Angola foram oficialmente classificados de euroafricanos a fim de os distinguir dos metropolitanos, eram os brancos de segunda”. Os assimilados e indígenas assumiam a inferioridade que lhes era ditada pelo colonialismo. A partida do colonialismo não significou o fim da discriminação, continuam a existir os musseques e desenvolveram-se os arranha-céus para a classe dirigente.

Vejamos os testemunhos que Joana Gorjão Henriques recolheu da Guiné-Bissau. A primeira marca era ditada pela cidade onde podiam viver os civilizados e os assimilados e a periferia onde se espalhavam os bairros indígenas. Pelas seis da tarde, uma sirene recordava a todos que a cidade de Bissau passava a pertencer exclusivamente a brancos, mestiços, comerciantes, enfim, gente que comesse à mesa, que usasse garfo e faca, tivesse um salário ou modo de vida e um estilo de vida português. Quando uma pessoa requeria o estatuto de assimilado tinha de provar que se vestia como um europeu e que já não praticava as cerimónias tradicionais. Leopoldo Amado, diretor do INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa, lembra a época em que um sinal dava ordem de entrada e saída da população negra na cidade, no porto havia um muro para separar as populações africanas dos moradores. Os assimilados mudavam de nome, quem fosse Fodé ou Braima passaria a ser Fernando ou João.

A potência colonial nunca hostilizou a região muçulmana, pelo contrário, construiu mesquitas e apoiou financeiramente as peregrinações a Meca. Há muitas explicações para este comportamento de uma visível tolerância religiosa: o cristianismo claudicou logo nos primeiros séculos, o missionário sentia a adversidade do clima e a absoluta falta de meios; a colonização portuguesa só se torna efetiva depois das campanhas de Teixeira Pinto e da montagem de uma estratégia de convivência interétnica assente no acicate de clivagens entre elas, dando a certas etnias prerrogativas especiais, caso dos Fulas e dos Mandingas, sociedades verticais, pouco interessadas em aberturas políticas. A administração colonial recorria ao trabalho forçado para a construção de estradas, subtraía o sentimento de resistência junto das populações locais evidenciando os benefícios do avanço nos meios de comunicação.

Durante muito tempo pretendeu-se iludir a natureza e a proveniência dos colonizadores, com a luta armada fingiu-se que não havia uma profunda hostilidade do guineense face ao cabo-verdiano. Saico Baldé, atualmente a fazer um doutoramento sobre os migrantes guineenses em Portugal lança alguma luz sobre a questão: “Quem eram os administradores? Raramente eram os lisboetas, muitas vezes eram os cabo-verdianos. Aliás, 70% dos funcionários coloniais em 1971 eram cabo-verdianos: não lidámos com o colono diretamente, mas com o subcontratado. Isto deixou outra marca, a rivalidade entre a ala originária de Cabo Verde e a da Guiné. Os restantes 30% estavam cá em cima: quem lidava com o nativo não era o colono da metrópole era o cabo-verdiano vindo de S. Vicente ou da Praia”.

Chicoteava-se quem não pagava o imposto de palhota, o que nos remete para um outro colaborador do colono: o sipaio, que pressionava as populações para acatar as ordens ou para pagar o imposto, para trabalhar nas estradas e nas construções. E não podemos esquecer os grumetes, cristianizados, vistos como próximos dos brancos, também eles paus para toda a colher ajudando os colonos, combatendo ao lado dos portugueses em todo o período da ocupação.

A jornalista comete por vezes imprecisões graúdas, caso de atribuir os disparos do Pidjiquiti, em 3 de Agosto de 1959 à PIDE, foi a PSP quem avançou e disparou, a PIDE vem mais tarde.

O sistema educativo era irracional, os alunos eram obrigados a aprender de cor os rios e serras de Portugal (como nós aprendíamos de cor todos os principais rios e linhas de caminho-de-ferro do Império), a realidade local era praticamente obliterada. Nota comum aos inquiridos é ninguém acreditar que o colonialismo português tenha sido brando, é evidente que o governador Sarmento Rodrigues trouxe alterações de tomo, a seguir à II Guerra Mundial e que nomeadamente o período de Spínola foi marcante no desenvolvimento, mas era demasiado tarde. Há quem interprete a postura de Cabral em relação ao colonialismo defendendo que o inimigo do povo da Guiné-Bissau não eram os portugueses mas o sistema como o acontecimento decisivo para a harmonia no relacionamento entre portugueses e guineenses.

Na sua reportagem à Guiné-Bissau, Joana Gorjão Henriques refere a rota da escravatura que teve o seu ponto central no porto de Cacheu. Aqui a repórter comete outra imprecisão grave, diz que Cacheu chegou a ser a capital da Guiné-Bissau, a Guiné só teve duas capitais: Bolama e Bissau, Cacheu não foi que sede de capitania. Teve um papel importantíssimo no resgate de escravos. Era um comércio em que havia intermediários entre os armadores e os régulos africanos. E refere-se à Companhia de Cacheu e Rios de Guiné (1676), à Companhia de Cabo Verde e de Cacheu (1690) e à Companhia do Grão-Pará e Maranhão (1755). Na Igreja de Nossa Senhora da Natividade, criada no século XVI, chegou-se a converter 600 a 800 africanos num dia, afirma Leopoldo Amado. Com a abolição da escravatura, Cacheu definhou e a potência colonial teve que reorganizar a economia da Guiné, centrou-se na agricultura, findo o século do comércio de escravos. Leopoldo Amado lembra que a Guiné-Bissau foi uma colónia de exploração, não de fixação e acrescenta textualmente que era um território que alimentava o comércio de escravos de Cabo Verde, o arquipélago prosperou, a Guiné não. Os portugueses nunca tiveram uma política de conquista e de fixação e não se podiam medir com a resistência dos povos africanos. Era uma presença espúria, os portugueses nunca tiveram o domínio exclusivo do comércio de escravos dos rios da Guiné, nunca houve meios para dissuadir as investidas dos espanhóis, franceses e holandeses. Depois construiu-se a fortaleza de Cacheu, a seguir à Restauração, contribuiu para que o resgate de escravos pudesse florescer. Leopoldo Amado refere o número de 3 mil escravos por ano e conclui: “Se considerarmos que esse resgate durou cerca de 3 séculos, estaremos em condições de dizer que esse forte permitiu que pudesse sair cerca de um milhão de escravos de Cacheu e de povoações vizinhas. Por isso, a importância de Cacheu sobreviveu até aos nossos dias através da história lendária das suas grandes famílias que prosperaram e se multiplicaram”.

Importa não descurar que um dos objetivos do trabalho de reportagem de Joana Gorjão Henriques era o de questionar se os portugueses terão sido mais brandos e menos racistas do que as outras potências coloniais, igualmente questiona o silêncio que mantemos quanto ao trabalho escravo que existiu em parcelas do Império até 1974 e tece por último uma interrogativa que não é menos inquietante: “O que revela esta perspetiva de brandura de olhar sobre nós próprios, portugueses?”.
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Nota do editor

Último poste da série de 2 de novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19161: Notas de leitura (1116): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (58) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P19168: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (São Domingos e Nova Lamego, 1967/69) - Parte XLIX: Mensagem de parabéns enviada à namorada, pelo seu 21º aniversário, em noite de luar, em São Domingos, em 5 de novembro de 1968


Matosinhos > Tabanca de Matosinhos > Restaurante Espigueiro (ex-Milho Rei) > 5 de setembro de 2018 > Almoço de homenagem à memória do nosso saudoso camarada Joaquim Peixoto (1949-2018) > Virgílio Teixeira e a esposa Manuela... Vieram, pela primeira vez, à Tabanca de Matosinhos. Moram em Vila do Conde.


Foto (e legenda): © Luís Graça (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]





Foto nº 3  > Eu, olhando para a Lua às 10,30h da noite  do dia 5 de Novembro de 1968, em São Domingos.


Foto nº 1 > A Lua Cheia fotografada às 10,30 horas da noite do dia 5 de Novembro de 1968



Foto nº 2 > O Luar já visto através de arvoredo, sensivelmente à mesma hora e no mesmo dia.







Foto nº 4 > Uma das muitas fotos de preparação e teste feitos no dia anterior, em 4 de Novembro de 1968



Foto nº 5 > A Lua vista entre o arvoredo, na mesma hora e dia (5 de Novembro de 1968, 10h30)


Foto nº 11 > Foto do arame farpado, com as luzes de presença, e a noite sempre negra e sempre um mistério (São Domingos, 5 de Novembro de 1968)





Foto nº 6 > Depois da sessão exterior, e já com outra máquina e rolo com slides, no quarto, escrevendo o que me veio à cabeça, à minha namorada que fazia 21 anos



Foto nº 7 > Posto de observação e controlo da Pista de São Domingos (c. Janeiro - Fevereiro de 1969).


 
Foto nº 8 > Vista aérea da vila de São Domingos, sede do Batalhão e da Circunscrição local (c. Janeiro-Fevereiro de 1969)



Foto nº 10  > No meu quarto – dos oficiais milicianos – antiga maternidade de S. Domingos, deitado e pensativo. Como estava à civil, estaria à espera da hora do jantar ou talvez num Domingo (s/d)



Foto nº 10A >  Deitado na minha com o retrato da minha namorada na mesa de cabeceira



Foto nº 9 > O meu retrato com farda camuflada, oferecido à minha mãe e à minha namorada. (São Domingos, Novembro de 1968)



Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]



Virgílio Teixeira
CTIG - Guiné 1967/69 - Álbum de Temas:

T511 – MENSAGEM DE PARABÉNS ENVIADA À NAMORADA
ATRAVÉS DA LUA DE ÁFRICA – NO NORTE DA GUINÉ, NUMA NOITE EM SÃO DOMINGOS, A 5 NOVEMBRO 1968





Para a minha mulher e minha companheira, Manuela:

Neste dia há 50 anos atrás, eram 10 e meia da noite, conforme previamente combinado, olhamos os dois para a Lua, e assim te enviei os Parabéns pelo teu 21º Aniversário.

Havias atingido a ‘maioridade’, pois nesse tempo era aos 21 anos e não 18, como hoje.

Foi um momento de grande emoção, pois a distância que nos separava fisicamente, ficou mais curta com a LUA a fazer a ligação.

E hoje, já mais perto, com esta mensagem conseguida pelas novas tecnologias, desejo que tenhas um dia muito feliz, com saúde, alegria, a tua coragem e a força que te move com os teus 71 anos, na companhia daqueles que mais amas no mundo – A Nossa Família.

Estas fotos que são postadas hoje, são os 50 anos que separam essa simbólica efeméride.

Espero que gostes e aprecies.

Um grande beijo com amor, do teu Virgílio

Em 05 Novembro 2018.



I - Anotações e Introdução ao tema:

Não sei se este tema é do agrado de alguns, mas sei que não é de todos, seguramente, nem se é compatível com o objecto deste Blogue.

A origem deste assunto como tantos outros, são fruto da nossa solidão e isolamento duma vivência dita normal. Esta vida lá no extremo profundo da Guiné, não foi fácil para ninguém, qualquer que fosse a função de cada um. Nas várias centenas de dias passados no mesmo local, cada dia com 24 horas, 60 minutos, 60 segundos, é de ficar ‘apanhado pelo clima’.

Assim cada um à sua maneira e segundo as suas posses, ia passando o tempo que sobrava das funções diárias obrigatórias, ora dormindo, ora jogando, bebendo e fumando, pouco mais havia que fazer, depois de escrever a sua carta diária.

Eu virei-me para as fotos, fui-me tornando um viciado e apreciador das fotos, coisa que nunca tinha tido antes, era uma novidade na minha mão.

A minha namorada, que sempre adorou e adora festejar os seus anos e os dos outros, pode ter escrito algo, com a aproximação desta data, estando eu longe dela, mas hoje não sei como surgiu esta ideia.

Combinamos por carta, que no dia 05-11-68 pelas 10 horas e meia da noite, ela estaria a olhar para a Lua na porta da sua casa, a mesma que também nos iluminava a nós, e através desta dava-lhe os parabéns e uma mensagem de amor, claro.

Mas sem dizer nada, eu fui preparando outra surpresa, fui estudando com antecedência, como ficavam as fotos da Lua à noite, com diversos tempos de exposição, mandei revelar e vi mais ou menos como devia fazer no dia certo.

E assim foi, a essa hora, no silêncio da noite, sozinho, com o meu tripé e demais equipamentos, fui tirando as fotos, várias, com diferentes tempos, e assim seleccionei estas, bem como as do dia anterior, em que a Lua estava bem cheia, pois se falhasse no dia seguinte, já tinha outras.

Depois foi só guardar e enviar por correio, as fotos da noite de 5 de Novembro de 1968, captadas em São Domingos, junto à fronteira do Senegal.

São imagens e sentimentos daquela época, claramente de amor, sem pieguices ou lamechas.

II - Legendas das fotos:


F01 – A Lua Cheia fotografada às 10,30 horas da noite do dia 5 de Novembro de 1968. Foto conseguida com recurso ao apoio da Máquina num Tripé, com disparador automático, com cerca de 10 a 15 segundos de abertura total do diafragma e sem flash. Foram feitos vários testes com bastante antecedência para apanhar a melhor Lua e Luar.


F02 – O Luar já visto através de arvoredo, sensivelmente à mesma hora e no mesmo dia. Foto conseguida nas mesmas condições da anterior.

F03 – Olhando para a Lua às 10,30h da noite do dia 05Nov68. O olhar para a Lua com o pensamento na mensagem que estava a transmitir mentalmente à minha namorada.

Foto conseguida com recurso a máquina e tripé, disparador automático, com temporizador de 10 segundos e com flash. Abertura do diafragma quase a meio, e velocidade de fecho de talvez cerca de 5 segundos. Não sei ao certo.

F04 – Uma das muitas fotos de preparação e teste feitos no dia anterior, em 4Nov68. Foto conseguida nas mesmas condições da foto F01.

F05 – A Lua vista entre o arvoredo, na mesma hora e dia da foto F01. SD, 05Nov68.

F06 – Depois da sessão exterior, e já com outra máquina e rolo com slides, no quarto, escrevendo o que me veio à cabeça.  Note-se que cada carta, com envelope e selo pagos, levava sempre várias folhas, e algumas fotografias do meu álbum. Pode ver-se alguns roncos, arcos, flechas, lanças e outras coisas do artesanato local.

Foto conseguida com recurso a máquina e tripé, disparador automático, com temporizador de 10 segundos e com flash. Abertura do diafragma a 16mm, velocidade 1/500.

F07 – Posto de observação e controlo da Pista de São Domingos, entre Jan-Fevereiro de 1969. Para complementar esta reportagem, é a amostra da pista, tempo seco, e o mais usual meio de saída daquela terra, por via aérea. Estava de Oficial de Dia, novamente.

F08 – Vista aérea da vila de São Domingos, sede do Batalhão e da Circunscrição local.

O objectivo é mostrar a principal porta de saída de SD, para a maioria do pessoal, militar e civis, era a via fluvial, o Rio São Domingos e depois o Rio Cacheu, até ao grande estuário em Bissau. A faixa branca mais comprida, é a pista com 1200 metros. Tem uma faixa branca, que vem do centro na direcção do cais e rio. À Direita pode ver-se a serração, à esquerda da rua as moranças da população.

O plano quadrado que se vê mais em cima, são as instalações da Companhia de intervenção, e neste caso era a CART1744, do Capitão Serrão, Alferes Gatinho e outros.

Por entre árvores e poilões, estavam as instalações diversas do aquartelamento e do pessoal. A cerca de 2-3 quilómetros, a Norte era a terra de ninguém e a seguir o Senegal, e os santuários dos terroristas.

F09 – O meu retrato com fardamento a rigor, oferecido à minha mãe e minha namorada. Foto captada em Novembro de 68.

F10 – No meu quarto – dos oficiais milicianos – antiga maternidade de S. Domingos, deitado e pensativo. Como estava à civil, estaria à espera da hora do jantar ou talvez num Domingo.

A minha cama de ferro, com apenas 2 lençóis brancos. Uma luz fraca, num pequeno candeeiro de mola agarrado às barras de ferro, para poder ler e escrever sem incomodar os outros parceiros de quarto. A mesa-de-cabeceira de madeira, não sei como a arranjei, talvez mandasse fazer na serração. Um dia quando abri as gavetas onde tinha papelada e livros, sai uma grande molhada de baratas, escondidas entre os papéis, que deu comigo em doido, depois mandei fazer uma desinfestação total ao quarto, e já não apareciam muitas.

Em cima da mesa, sempre a moldura que levei comigo com a fotografia da minha então namorada, que nunca deixou de estar junto de mim. Ao lado um frasco de comprimidos, parecem da marca ‘Roche’, devem ser antibióticos, ou comprimidos para dormir. Ao lado o meu desodorizante da minha marca preferida em tudo, a saudosa ‘Old Spice’. E também a minha pasta com o caderno de folhas finas, das minhas cartas, para enviar por avião.

No chão uma ‘esteira’ a servir de tapete, era um luxo. Ainda se vê no chão a minha inseparável lanterna, para sair à noite, nunca a deixava. Várias pilhas velhas espalhadas pelo chão. Botas da tropa e sapatos, bem como os primeiros chinelos de pé ‘havaianas’. Hoje não percebo como toda a gente, a população local, usava já este tipo de chinelos que depois foram baptizados por havaianas. Bem como uma das minhas 3 ventoinhas, por vezes ligava-as todas durante a noite e trabalhavam se e quando havia energia.

Nas paredes alguns roncos do artesanato local, não tudo o que tinha. Só não vejo aqui a minha arma que estava sempre na cabeceira da cama. E falta a máquina fotográfica, que está com outro camarada a tirar a foto, ou no tripé, sendo isto já uma espécie de ‘self’.

A foto, tendo em vista o meu bigode e o fim da carecada, pode ter sido captada entre fins de 1968 e inícios de 1969, não sei ao certo.

F11 – Uma foto do arame farpado, com as luzes de presença, e a noite sempre negra e sempre um mistério.

É uma foto na sequência das outras de 05-11-68.

«Propriedade, Autoria, Reserva e Direitos, de Virgílio Teixeira, Ex-alferes Miliciano do SAM – Chefe do Conselho Administrativo do BATCAÇ1933/RI15/Tomar, Guiné 67/69, Nova Lamego, Bissau e São Domingos, de 21SET67 a 04AGO69».

NOTA FINAL DO AUTOR:

# As legendas das fotos em cada um dos Temas dos meus álbuns, não são factos cientificamente históricos, por isso podem conter inexactidões, omissões e erros, até grosseiros. Podem ocorrer datas não coincidentes com cada foto, motivos descritos não exactos, locais indicados diferentes do real, acontecimentos e factos não totalmente certos, e outros lapsos não premeditados. Os relatos estão a ser feitos, 50 anos depois dos acontecimentos, com material esquecido no baú das memórias passadas, e o autor baseia-se essencialmente na sua ainda razoável capacidade de memória, em especial a memória visual, mas também com recurso a outras ajudas como a História da Unidade do seu Batalhão, e demais documentos escritos em seu poder. Estas fotos são legendadas de acordo com aquilo que sei, ou julgo que sei, daquilo que presenciei com os meus olhos, e as minhas opiniões, longe de serem ‘Juízos de Valor’ são o meu olhar sobre os acontecimentos, e a forma peculiar de me exprimir. Nada mais. #

Acabadas de legendar, hoje,

Em, 2018-10-22

Virgílio Teixeira
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Nota do editor:

Último poste da série > 24 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19132: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XLVIII: Metralhadoras e lança-granadas

domingo, 4 de novembro de 2018

Guiné 61/74 - P19167: Efemérides (295): Dia de Finados - Romagem aos Talhões Militares da Liga dos Combatentes nos cemitérios de Leça da Palmeira e Matosinhos

Como vem sendo tradição, o Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes e a União de Freguesias de Matosinhos e Leça da Palmeira promoveram no passado dia 2 de Novembro, Dia de Finados, mais uma romagem aos Talhões Militares da Liga existentes nos cemitérios das duas localidades.

Cerimónia singela, ameaçada por chuva que felizmente poupou os participantes.

Com a presença de antigos combatentes, a cerimónia teve início às 10 horas da manhã em Leça da Palmeira onde foi depositada um coroa de flores, seguindo-se o toque de silêncio e a oração aos mortos.
Por fim foi lida uma mensagem do Presidente da Liga, Ten-General Chito Rodrigues, a propósito da data que ora se comemora, o Centenário da assinatura do Armistício, que conduziu ao fim da I Grande Guerra (1914-1918), cujo tratado de paz foi assinado em 28 de Junho de 1919.

Cerimónia idêntica se promoveu pelas 11 horas no Talhão do Cemitério de Sendim em Matosinhos.

Talhão do Cemitério n.º 1 de Leça da Palmeira - O Combatente José Trindade, com o Estandarte do Núcleo de Matosinhos da LC

Talhão do Cemitério n.º 1 de Leça da Palmeira - Momento da deposição da coro de flores pelo representante da União das Freguesias Matosinhos e Leça da Palmeira, senhor Fernando Monteiro, e pelo Combatente Ribeiro Agostinho, em representação do Núcleo.

Talhão do Cemitério n.º 1 de Leça da Palmeira - Antigos Combatentes sempre presentes

Talhão do Cemitério n.º 1 de Leça da Palmeira - Oração dos Defuntos pelo Diácono Raul Almeida, também ele um antigo Combatente
 
Talhão do Cemitério n.º 1 de Leça da Palmeira - O SAj Joaquim Oliveira do Núcleo de Matosinhos da LC lê a mensagem do Presidente da Direcção Central, Ten-General Chito Rodrigues

Talhão do Cemitério n.º 1 de Leça da Palmeira - O representante da União de Freguesias quando se dirigia aos presentes.
 
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Talhão do Cemitério de Sendim em Matosinhos

Talhão do Cemitério de Sendim em Matosinhos - Momento da deposição de uma coroa de flores por Ribeiro Agostinho, Mesa da Assembleia Geral, e Francisco Oliveira, Direcção do Núcleo de Matosinhos da LC

Talhão do Cemitério de Sendim em Matosinhos - Momento da deposição de uma coroa de flores pelo senhor Fernando Monteiro, em representação da União de Freguesias

Talhão do Cemitério de Sendim em Matosinhos - Os toques de homenagem aos mortos estiverem mais uma vez a cargo do Bombeiro, senhor Francisco Silva, dos Bombeiros Voluntários de Matosinhos-Leça

Fotos: José Trindade
Edição e legendagem das fotos: Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 26 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19139: Efemérides (294): Há 49 anos, neste dia 24 de Outubro, no RAP 2, soube que estava mobilizado para a Guiné (António Tavares, ex-Fur Mil SAM)

Guiné 61/74 - P19166: Convívios (877): Convite para o 40º convívio da Magnífica Tabanca da Linha, Algés, Restaurante "Caravela de Ouro"... Ementa: Bacalhau à Lagareiro... Dia 22 de novembro, 5ª feira, das 12h30 às 15h30 (Manuel Resende)

Manuel Resende
1. Mensagem do Manuel Resende, régulo da Tabanca da Linha:

Date: sábado, 3/11/2018 à(s) 22:27

Subject: Convite para 40º Convívio da Magnífica Tabanca da Linha


Prato principal será BACALHAU À LAGAREIRO", com batatinhas a murro, grelos e saladas. Os antes e os depois já todos conhecem.

Inscrições, por todas as formas já habituais (facebook, email, sms ou telemóvel), para Manuel Resende (telem 919458210) até ao fim do dia 19, segunda-feira. 


Jorge Rosales
Desta vez o [Jorge]  Rosales meteu baixa e por isso está dispensado, mas creio que no dia 22 estará presente.

Quando se inscreverem digam o nº de pessoas.

A partir deste momento aguardo as vossas inscrições.

Informo que quem usa a Via Verde pode baixar o aplicativo "ESTACIONAR" da via Verde e utilizá-lo para estacionamentos, sem moedas. O local está abrangido por este sistema.

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Nota do editor:


Guiné 61/74 - P19165: Blogpoesia (593): "Bateria", "Poesia da Poesia" e "Tempo dos ardinas", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Bateria

Bem matraca a bateria, só, contra aquele bando encantador de violinos de cordas tensas.
Destoa tanto da melodia.
Nada a ver.
Não tem voz.
Se sente a mais.
Apenas rufa.
Thrunthun... Thrruntun...
Thum e Thum...
Só metralha, sem tom nem cor.
Nem mais nem menos.
Tem paletó, com paus nas mãos,
o seu autor.
Se sente importante.
É um senhor.
Bater pancadas,
O seu papel.
Thrrun thunn thun...
Refreia a orquestra.
Marca-lhe o ritmo,
Com pundonor.
Tem jus às palmas
Como os demais...

Berlim, 28 de Outubro de2018
10h15m
Jlmg

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Poesia da Poesia

Escrever poesia sobre a poesia é abrir o coração para ouvir o que vai na alma.
Falar da alegria que o inunda e da tristeza que o aflige.
Espalhar a paz se nele ela reinar.
Saborear a harmonia da temperança e equilíbrio.
Regar o jardim da consciência com o bálsamo das virtudes.
Colorir o céu com as cores do arco-íris.
Aliviar as dores de quem sofre, por amor ou injustiça.
Tratar as feridas que o mal deixou.
Ouvir quem vem para desabafar.
Repartir do que há mesmo que que não de para sobrar.
Saber calar até que a verdade acabe por falar.
Esperar em paz até que chegue tarde a boa hora.

Berlim, 30 de Outubro de 2018
9h1m
Jlmg

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Tempo dos ardinas

No tempo dos ardinas pelas ruas de Lisboa.
Um saco cheio de jornais.
Na cabeça um boné surrado, à banda.
Olhos piscos e uma pisca na boca,
À janela.
Primeiro os fregueses certos, nem vinham à janela.
Com uma mão certeira, o jornal voava para a varanda.
Os pregões na voz cavernosa do cigarro.
- Olha o Século!
- Olha o Notícias!
- Olha O Diabo!
- A Capital!...
Dava a volta ao bairro, até acabar.
Jardim da Parada.
Jardim da Estrela.
Pelas manhãs.
Iam cheios os eléctricos.
O 28. Dos Prazeres à Baixa e ao Castelo,
Num vai-e-vem sem fim.
Inverno e Verão.
Era assim, a Lisboa em paz.
Bem conheci.
Lisboa das floristas e das castanhas,
À venda pelos passeios.
Lisboa alegre dos jardins
E das varandas abertas sobre o Tejo.
Almada longe.
O Cristo-Rei.
Havia fado pelas vielas.
E badaladas nas igrejas espalhadas pelas colinas.
Voavam felizes em liberdade as pombas
Pelas praças.
Bebiam água fresca nos chafarizes.
E os sinaleiros empertigados em tamboretes,
marcavam ritmo ao trânsito sem pistola. Só apitos.
Tudo corria bem na velha Lisboa alegre dos ardinas...

ouvindo Carlos Paredes - Divertimento
Berlim, 3 de Novembro de 2018
10h6m Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 1 de novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19156: Blogpoesia (592): "1 de Novembro", da autoria de Joaquim Luís Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

sábado, 3 de novembro de 2018

Guiné 61/74 - P19164: Os nossos seres, saberes e lazeres (291): Primeiro, Toulouse, a cidade do tijolo, depois Albi (10): Uma exposição memorável no Museu dos Augustins, a Toulouse do Renascimento (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Agosto de 2018:

Queridos amigos,
Era um dos momentos mais esperados nos passeios por Toulouse, uma cidade recheada de surpresas ao nível da arquitetura e das Belas-Artes, visitar as esculturas românicas no Museu dos Augustins, o guia Michelin dá-lhe 3 estrelas e exalta todo aquele esplendor escultórico. Houve sobretudo duas surpresas, a magnífica exposição sobre Toulouse no Renascimento e o talentoso trabalho de museologia e museografia do cubano Jorge Pardo na sala de escultura românica, vejam e digam se não é um fenómeno de criatividade.

Um abraço do
Mário


Primeiro, Toulouse, a cidade do tijolo, depois Albi (10): 
Uma exposição memorável no Museu dos Augustins, a Toulouse do Renascimento

Beja Santos

O viandante entra no museu pronto a deglutir uma requintada refeição cultural, contemplar os capitéis românicos, grande parte deles talhados com mármore cinzento dos Pirenéus, vieram de claustros demolidos no século XIX, caso de Saint-Sernin, da Daurade e de St-Étienne, falamos de trabalhos escultóricos principalmente do século XII, não têm paralelo, e os maiores museus do mundo disputariam encarniçadamente a posse destes tesouros. Mas logo na receção uma surpresa: a zona das Belas-Artes está em obras, a contrapartida é visitar a exposição «Toulouse no Renascimento», logo advertem o viandante que não sairá dececionado, estão ali em exibição os tesouros artísticos de uma cidade rica, poderosa e criativa, entre os anos 1490 e 1620. É um momento único para apreciar a renovação do gosto na arquitetura, na pintura, na escultura, mas também na iluminura, a tapeçaria, o vitral, a ourivesaria, a imprensa, a carpintaria. Ao tempo, Toulouse é a capital do Languedoc, vive uma idade de ouro, a despeito de estar no centro de tumultos religiosos e políticos que culminarão com a conquista de Henrique de Navarra.





É um período de prosperidade económica sem precedentes, Toulouse é uma cidade universitária, possui numerosos colégios, as tipografias instalaram-se na proximidade destes colégios, ganharão fama universal. Ao longo da exposição, o visitante vê a evolução de uma cidade rica e poderosa, a afirmação de um gosto novo, são manifestações de um renascimento com obras audaciosas, na escultura, na iluminura, até nos relicários. O guia da exposição aponta para obras de valor incontornável como os vitrais da catedral de Auch, tapeçarias monumentais, manuscritos iluminados, incunábulos. Museus de grande prestígio como o Louvre e o museu Fitzwilliam, de Cambridge, emprestaram obras. O resultado é excecional.



E chegou o momento de percorre a sala de escultura românica do século XII, é um deslumbramento, imagine-se que o viandante até julgou que estava na mesquita de Córdoba, e depois percebeu que tinha havido um trabalho excecional de museologia e museografia, dele se encarregou um artista cubano, Jorge Pardo, criou uma atmosfera única destas coleções da arte românica, o artista é internacionalmente reconhecido pela sua obra colorida onde a arte, o design e a arquitetura se interligam. A sala ganhou uma completa identidade pelo enquadramento, o tecido complexo de interações, os capitéis românicos falam entre si, beneficiam de uma decoração espantosa, da azulejaria, de três modelos originais de lampas, as colunas de suporte são os pilares encantatórios por onde o visitante contempla obras-primas da escultura, ali predominam os temas bíblicos, estamos no tempo em que a iliteracia é superada pelo uso da imagem, os capitéis possuem essa característica vigorosa, o visitante anda à roda e encontra sempre um arrendado, uma espantosa figura de vestiário, um testemunho dos Evangelhos. Só por esta sala, diz o viandante para os seus botões, valeu a pena vir a Toulouse.







Permita o leitor que se tome a decisão de continuarmos com este esplendor escultórico antes de se passar para a sala de escultura gótica onde nos aguarda uma obra-prima, a Pietà de Récollets, outra obra incomparável. E finda a visita caminha-se para outro museu, o da arqueologia, o faustoso Museu Saint-Raymond, ninguém se sentirá dececionado.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 27 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19140: Os nossos seres, saberes e lazeres (290): Primeiro, Toulouse, a cidade do tijolo, depois Albi (9): A viagem de regresso, tijolo e muito Património da Humanidade (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P19163: Agenda cultural (656): Hoje na RTP1, às 21h00, início da minissérie, de 3 episódios, "Soldado Milhões", o herói português da I Guerra Mundial (realização de Gonçalo Galvão Teles e Jorge Paixão da Costa)

Aníbal Augusto Milhais
(Murça, Valiongo, 1895 - 1970)
Cortesia de dnoticias.pt, de 23out2015
1. Minissérie de 3 episódios, na RTP 1, com início hoje às 21h00

O herói português da Primeira Guerra Mundial

Aníbal Augusto Milhais nada mais queria do que viver em paz, mas foi perseguido até ao fim pela aura de heroicidade, atribuída pelos que matou em nome de Portugal.

A história surge das memórias de guerra, atiçadas no decorrer de uma caçada [ao lobo]. Nesta busca, Milhões guia-nos na sua luta pela sobrevivência 20 anos antes, em plena Primeira Guerra Mundial. Na madrugada de 9 de Abril de 1918, dezenas de divisões alemãs irromperam pelo sector defendido pela segunda divisão do Corpo Expedicionário Português (CEP). 

Em poucas horas, naquela que ficaria conhecida como Batalha de La Lys, perderam-se mais de 7.500 homens. Milhais recusa as ordens do Capitão e fica sozinho, frente a um regimento de soldados alemães, para salvar os companheiros em retirada. Isolado e perdido em território inimigo apenas com a sua metralhadora "Luisinha" [, Lewis,] e o seu amuleto da sorte, o lenço oferecido pela amada, Milhais enfrenta o seu maior desafio.

Pela coragem demonstrada no campo de batalha, Aníbal Augusto Milhais, foi premiado com a mais alta honraria nacional: a Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito. 

A 5 de Julho de 1924, o Parlamento alterou o nome da povoação de Valongo, a sua aldeia natal, no distrito de Vila Real, para Valongo de Milhais, em sua honra. 

No ano em que se assinala o centenário do fim da Primeira Grande Guerra (1914-1918), acompanhamos o percurso do soldado que "se chamava Milhais, mas valia milhões".

[Vd. aqui trailer oficial do filme que estreou nas salas de cinema em abril de 2018]

Próximas emissões: 

03 Nov 2018 21:00 | RTP1

03 Nov 2018  21:19 | RTP Internacional

04 Nov 2018 05:07 | RTP Internacional América

04 Nov 2018 09:58 | RTP Internacional Ásia

06 Nov 2018 22:35 | RTP África


Ficha Técnica:
Cartaz do filme (2018)


Título Original. Soldado Milhões - Minissérie, de 3 episódios

Intérpretes: João Arrais, Miguel Borges, Raimundo Cosme, Isac Graça, Tiago Teotónio Pereira, Ivo Canelas, Graciano Dias, Nuno Pardal, Lúcia Moniz, António Pedro Cerdeira.

Realização: Gonçalo Galvão Teles, Jorge Paixão da Costa.

Produção: Ukbar Filmes.

Autoria: Argumento: Mário Botequilha, Jorge Paixão da Costa

Música: Pedro Janel

Ano 2018.

Duração: 45 minutos


2. Ver também:

RTP Ensina > A Batalha de La Lys do Soldado Milhões

(...) Aníbal Augusto Milhais foi soldado do Corpo Expedicionário Português e, na sequência dos seus feitos durante a Batalha de La Lys, recebeu a mais alta condecoração militar portuguesa. Oiça a história relatada pelo próprio.

Leonida Milhões, filha de Aníbal Augusto Milhais, o Soldado Milhões, preservou durante mais de cinco décadas uma bobina com uma gravação em que o pai conta a sua versão dos acontecimentos ocorridos durante a Batalha de La Lys. Uma equipa da RTP realizou uma reportagem utilizando essa gravação.

O Portal Ensina, para além do trabalho de reportagem, deixa-lhe também algumas passagens mais extensas desta história. (...)


Ficha Técnica
Título: A Batalha de La Lys do Soldado Milhões
Tipo: Reportagem
Autoria: Sandy Gageiro/ Carlos Guerreiro
Produção: RDP / Ensina RTP
Ano: 2014

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Guiné 61/74 - P19162: Parabéns a você (1519): Tenente-General PilAv António Martins de Matos, ex-Tenente PilAv da BA12 (Guiné, 1972/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 2 de Novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19158: Parabéns a você (1518): Abílio Magro, ex-Fur Mil Amanuense do CSJD/QG/CTIG (Guiné, 1973/74)