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terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Guiné 61/74 - P20558: Manuscrito(s) (Luís Graça) (176): Manel Djoquim, o homem do cinema ambulante, o último africanista - Parte I


Guiné > Região de Bafatá > Contuboel > 1969 > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > Rua principal de Contuboel, vendo-se à direita a célebre carrinha Ford do Manel Djoquim. Esta foto, sendo de 1969, foi tirada no tempo seco... Portanto, só pdoe ser do 1º semestre de 1969. O Valdemar Queiroz esteve em Contuboel, no Centro de Instrução Militar, entre fevereiro e julho de 1969. O nosso editor Luís Graça também lá esteve, mas já no inicío da época das chuvas (de 2 de junho a 18 de julho de 1969).  O "homem do cinema" fazia uma paragem, ficando retido em Bissau ou fazendo férias em Lisboa, no pico da época das chuvas (, o que coincidia com as férias grandes escolares das filhas na capital do Império, com a mãe,  Julinha, e a empregada cabo-verdiana). (Esta e a foto de baixo foram reproduzidas no livro de Lucinda Aranha (O homem do cinema: a la Manel Djoquim i na bim. Alcochete: Alfarroba, 2018), na pág. 96.




Guiné > Região de Bafatá > Contuboel > 1969 > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > O Valdemar Queiroz a ver os cartazes, espetados numa árvore, do filme da semana : Riffi em Paris, película francesa, de 1966, dirigida por Denys de La Patellière e com Jean Gabin no principal papel... Filme de gângsters, popular na época... Chegava à Guiné três anos depois...Melhor do que nada... Hoje os guineenses não têm uma única sala de cinema..

Uma ternura (e uma preciosidade), esta foto!... A "fábrica de sonhos", ambulante, era a da nhô Manel Djoquim. Com ele, a "sétima arte" chegava a sítios recônditos de África...

Fotos (e legendas): © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Notas de leitura:

Lucinda Aranha - O homem do cinema: a la Manel Djoquim i na bim. Alcochete: Alfarroba, 2018, 165 pp.

Prometi a mim mesmo, e à autora, fazer uma nota de leitura, mais detalhada e pessoal, deste livrinho que só agora, ao longo do verão passado, fui lendo e anotando, de lápis na mão, como eu (ainda) gosto de ler os livros, em papel.

Devo, de resto, à autora, minha vizinha e nossa grã-tabanqueira, uma palavra de apreço e agradecimenhto pela oferta do livro com a seguinte dedicatória:


Cortesia de: Lucinda Aranha Antunes -
Andanças  na Escrita
"Para o Luís Graça com os meus agradecimentos pela ajuda que o seu blogue me deu. Lucinda Aranha Antunes."

Este agradecimento ela tornou-no também público na sua página do Facebook, Lucinda Aranha Antunes - Andanças na Escrita28 de maio de 2019:

"Agradeço à Tabanca Grande e ao blogue luisgracaecamaradasdaguine o apoio que me deram nas fases de investigação e divulgação do meu novo livro."

A autora vive na Praia de Santa Cruz, no vizinho concelho de Torres Vedras, é licenciada em História, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. É professora, reformada, do ensino secundário. É coautora de programas e guias de apoio orientadores de trabalho de alunos e professores. É autora dos livros "Melhor do que cão é ser cavaleiro" (2009) e "no Reino das orelhas de burro"(2012), editados pela Colibri.  Integra a nossa Tabanca Grande, desde 15 de abril de 2014.

O livro "O homem do cinema: a la Manel Djoquim i na bim"  (e o seu "making of") suscitou um bastante interesse no nosso blogue e já foi objeto, na devida altura,  de uma excelente recensão do nosso crítico literário, Mário Beja Santos (*).

2. Destaco, entretanto,  aqui, outros comentários publicados no nosso blogue. Por exemplo, Valdemar Queiroz contribuiu com duas preciosas fotos, que documentam a passagem, por Contuboel, no 1º semestre de 1969, do homem do cinema, e que ele fez chegar à autora (, voltando nós  a reproduzi-las, acima).

 E, a este propósito, o Valdemar Queiroz escreveu o seguinte, como comentário no poste P1299 (**);

"Li com muito interesse o seu texto no nosso blogue. Julgo ter conhecido o sr. Manuel Joaquim Prazeres, pois vi alguns filmes em Contuboel e Nova Lamego que deviam ter sido exibidos por ele. Não devia de haver outra pessoa, em 1969/70, a exibir os filmes e até falei com ele. 

"Falámos do critério do preço dos bilhetes: um soldado pagava um valor, o cabo outro valor e assim diferia conforme a patente. Ele dizia-me que havia alguns sargentos e oficiais que tiravam os galões para pagarem menos pelo bilhete. Também falámos da maneira despreocupada como ele se deslocava, de terra em terra, na sua carrinha, com um criado e, apenas, uma pequena espingarda para matar alguma lebre, como ele dizia. Agora, lendo o seu texto, percebemos a razão da facilidade com que o Sr. Manuel Prazeres se movimentava naquelas paragens.

"No meu álbum fotográfico e nas fotos de Contuboel aparece na foto da rua Principal, no lado direito, a carrinha que o Sr. Prazeres se deslocava e noutra foto os cartazes do filme 'Rififi em Paris' por ele exibido." (*)

Eu próprio, Luís Graça,  também já tinha feito, em 16/4/2014, muito antes do livro sair, o seguinte comentário (**):

"Que vidas!... Que histórias de vida!... Manuel Joaquim dos Prazeres só pode ser um descendente direto dos 'lançados', dos grandes aventureiros de Quinhentos, do 'tuga' que ama a África e os grandes espaços, e as suas gentes... E que sabe fazer a ponte entre a natureza e a cultura, a geografia e a história, o real e o imaginário, os bichos e os homens...

"Vi, por certo, algum filme dele, projetado na parede das instalações do comando ou no refeitório das praças, em Bambadinca e, antes, em Contuboel, entre junho de 1969 e março de 1971...

"Que belo texto, Lucinda!... Fico com ganas de ler o livro (...).

"Lucinda, mesmo não sendo tu filha de um combatente (em termos técnicos), és filha de alguém, que amou muito aquela terra, bem como Cabo Verde, e que foi uma testemunha privilegiada de uma época privilegiada... Até pelas figuras que conheceu!... És bem vinda à nossa Tabanca Grande, onde nos tratamos por tu, os camaradas... Mão me levas a mal que o faça, contigo, amiga, isso ajuda a encurtar distâncias... e a seguir a picada a direito... Bom sucesso para o livro!".

Por sua vez, o nosso camarada e escritor Alberto Branquinho também se apressou a saudar a Lucinda e o seu projeto literário. Ele tem memórias vivas dessas sessões de cinema ambulante que chegavam ao mato:

"Olá, Lucinda: Como agora se usa dizer, principalmente entre mulheres (com pedido de desculpas...), é um texto muito 'giro'. Se alguém disser isto do seu texto, considere um insulto. É mais!


"Pois aqui estou para lhe dizer, enquanto este post está 'vivo', que tive oportunidade de conhecer o seu pai em Bambadinca. Só podia ser ele, pois não havia outro, concerteza, calcorreando a Guiné naqueles tempos arriscados, deslocando-se de barco ou nas colunas militares. A Bambadinca chegou de barco (vindo de Bissau?). Montou a tenda de lona e esteve dois ou três dias. Num extremo o projector e no outro extremo a tela/écrã. Os espectadores acomodados sobre a direita e a esquerda da projecção. Havia uns quantos bancos no espaço central, onde ele acomodava oficiais e sargentos.
O problema não era cobrar os bilhetes na porta/abertura que a lona tinha para esse efeito, era controlar/impedir as 'entradas' da garotada entre a lona e o chão, a toda a volta. Ele tinha um ou dois ajudantes, se bem me lembro para esse efeito (e, concerteza, para a montagem da estrutura).
"Lembro-me de estar a projectar um filme francês ( que não era muito antigo e a cópia tinha uma boa imagem) e de repente: pló!,  ficámos às escuras. O seu pai, que estava mesmo por baixo do projector, desatou aos berros contra a garotada, que ria às gargalhadas e fugia. Retirou a manga (extremamente madura) da lente, fez uma limpeza sumária, enquanto emitia uns desabafos, e a projecção continuou até final.

"Gostei que tivesse feito recordar o que atrás escrevo, desejo-lhe felicidades e sucesso para o livro."


3. Vejo, com agrado, que a autora soube  tomar boa nota destas e doutras observações e memórias  (e integrá-las no seu livro), destes e doutros dos nossos leitores, que ainda conheceram o personagem, "Manel Djoquim". Foi o caso, pro exemplo,  dos "djubis" guineenses, Cherno Baldé (Fajonquito) e Vital Sauane (Gabu) (***). 

Tanto um como o outro, não só o conheceram como têm para com ele uma "dívida de gratidão" e guardam  memórias muito impressivas de alguns dos filmes que ele projetou quer em Fajonquito (no norte da Guiné, setor de Contuboel), quer no leste, na antiga Nova Lamego (hoje, Gabu).

Quero aqui voltar a destacar dois desses comentários desses "miúdos", fascinados pelo cinema ambulante do "Manel Djoquim". 

O Vital Suane está grato ao "Manel Djoquim" porque foi ele uma das pessoas que lhe mostrou, indiretamente, a importância que tinha a escola, para um jovem guineense.  Foi o cinema que, de certo modo.  lhe abriu as portas da escola ou o levou até aos bancos da escola:

(...) "Cara Lucinda Aranha: (...) Venho por este meio agradecer ao seu pai, porque eu adorava cinema, era muito novo, estava perto de completar os 5 anos aproximadamente, lembro-me sempre de pedir dinheiro a minha mãe para ir ver os filmes, na maioria das vezes não pagava porque os guardas da Casa Gouveia conheciam-me porque levava leite de vaca para os donos da Casa Gouveia [, em NovaLamego].

"Os filmes eram projectados no quintal da Casa Gouveia, eu não queria ir à escola porque não era tradição na minha família alguém ir para escola, mas estava sempre a perguntar o que se passava nos filmes e, como as pessoas estavam muito concentrados para ler a legenda,  não dava para me explicarem sempre o que se passava. Uum dia disse para a minha mãe que gostaria de perceber o que se passava nos filmes porque ninguém me explicava nada, ela disse me: 'Então chegou altura de pensares seriamente em ir para a escola'... Aceitei de imediato porque percebi de que sem a escola não poderia interpretar os filmes."

"Comecei a ter explicação numa senhora portuguesa que era professora primária, morava ao pé da minha casa, nunca mais abandonei a escola, não sou ninguém,  mas pelo menos sou aquilo que sou graças ao seu pai, talvez se o senhor Manel Djoquim nunca tivesse chegado a Nova Lamego eu seria uma outra pessoa, até poderia ido à escola mas não seria da forma que aceitei e gostei da escola.

"Hoje passado todo este tempo recordo-me dos bons tempos da minha cidade, e como o seu pai nos ajudou a ver o mundo, nem rádio tínhamos em casa, de repente a começar a ver filmes, Tarzan, Sandokan, o Tigre da Malásia, Pierre Brice & Les Barker, como nos ensinou a ver outro lado do mundo através dos filmes... O seu pai era um homem bom, nunca ralhava com as crianças, sempre que notava que as crianças estava a furar a barreira,  fazia de conta que não estava a ver, ele amava a sua profissão, gostava do povo, sentia o povo, com os seus calções que ficaram eternizados mesmo depois da sua partida, calções de Manel Djoquim." (...)

Outro testemunho emocionado é o do Cherno Baldé (***):

(...) Eu conheci o Sr. Manuel Joaquim desde os meus 8/9 anos de idade em Fajonquito. Ele vinha à nossa aldeia, pelo menos, uma vez, em cada 2/3 meses, no seu velho camião carregado da sua máquina de sonhos para nos alegrar, e foi graças a ele que fomos descobrindo grande parte da cultura ocidental estilizada em gestos ousados, olhares atrevidos, carícias públicas e mil pedacos de um universo que entrava pouco a pouco dentro da nossa forma de ser e estar na vida.

"Pessoalmente, para o resto da minha vida estaria marcado pela postura e coragem dos actores (Cowboys e Índios indomáveis), o que, no fundo, era muito parecido com aquilo que nos tentavam inculcar nas nossas cerimónias iniciáticas designadas de Fanado tradicional.

"Dele ainda recordo-me dos seus enormes calções, meias esticadas até aos tornozelos e chapéu de abas largas, tipo Cipaio. A certa altura, um dos seus ajudantes era o Camões (zarolho) e por isso acreditavámos que com esta limitação visual podiamos sempre aproveitar para entrarmos sem que ele nos visse. Normalmente eramos apanhados e soltos de seguida dentro do recinto fechado para a projeção do filme.

"Naquela idade não precisávamos de cadeiras, e quando a projeção se iniciava, pouco a pouco, enchíamos o recinto, acabando por nos sentarmos mesmo por baixo do pano das imagens, importante mesmo era entrar e assim poder participar, no dia seguinte, de mais um episódio marcante, uma história de vida que só voltaria a acontecer passados 2 ou 3 meses.

"Quem não ficava contente com a chegada do Manel Djoquim eram as nossas pobres mães, pois sabiam que ele vinha, por certo, roubar, através dos seus filhos as pequenas economias conseguidas durante semanas ou meses com muito suor e canseira. (...)


4. Está visto que a história do nhô Manel Djoquim, caçador, fotógrafo, homem dos sete ofícios, empresário de cinema ambulante em Cabo Verde (1929/1943) e depois na Guiné (1943/73), finalmente posta em biografia (ficcionada) pela sua filha Lucinda Aranha Antunes (que só tem vivências indiretas de Cabo Verde e da Guiné), dava um belo filme como o inesquecível "Cinema Paraíso" (1988), escrito e dirigido por Giuseppe Tornatore, com música de Ennio Morricone, filme que já vi e revi três vezes.

De resto, como já aqui sublinhámos diversas vezes, tanto Cabo Verde como a Guiné desses tempos têm "matéria-prima" para grandes filmes... Oxalá os nossos realizadores (portugueses, guineenses, cabo-verdianos...) tivessem condições para pegar em histórias, algo riocambolescas mas ternurentas como esta... Estamos a falar do tempo colonial e da guerra colonial, tempos que pura e sinplesmente não podem ser "diabolizados", fazendo tábua da "petite histoire" dos homens...

Manuel Luís Lomba também se recorda do "Manel Djoquim" e faz-nos esta confidência, algo insólita, em comentário, de 18/12/2018 ao poste P19302 (***):

(...) "No meu tempo [, 1964/66,]  dizia-se que o PAIGC concedia a livre circulação a duas individualidades da Guiné, no entanto não alinhadas: ao Dr. Maurício, pela sua missão de erradicar a lepra,  e ao Manuel Joaquim, no seu negócio de projecção de filmes, que também serviam para 'animar' a malta do PAIGC. 

"Não só não os atacavam como não raro lhe apareciam a desviá-los das minas A/C [, anti-carro]. Nem a carrinha Peugeot do Dr. Maurício nem o Ford 'machimbonbo'  do Manuel Joaquim alguma vez foram molestados. Lembro-me do Manuel Joaquim circular sem escolta entre Bafatá, Nova Lamego e terá ido a Bajocunda e Canquelifá. Conheci a Dr.ª Lucínda num encontro da Tabanca Grande em Monte Real e aproveito para a felicitar pelo seu livro e desejar-lhe Boas Festas" (...).



"Manel Djoquim"... Cortesia
de Lucinda Aranha Antunes (2018)
5. Manuel Joaquim dos Prazeres (1901-1977) é a figura central deste livro, de difícil classificação quanto ao género: Romance ? Sim, mas também biografia, historiografia, memórias de família...

A autora. filha do "Nequinhas" (nominho do empresário e homem do cinema, homem dos sete ofícios) disse-nos que se tratava de uma "biografia ficcionada". Mas há muitos factos e personagens que aqui se evocam e descrevem, que estão suficientemente documentados pelo álbum fotográfico do arquivo da família, pela pesquisa documental e pela memória oral.

Não é apenas a biografia, mais ou menos romanceada, de um pequeno empresário, "self made man", africanista, o último dos africanistas, que leva o cinema a todos os recantos da Guiné entre 1946 e 1971, depois de ter vivido e trabalhado duas décadas em Cabo Verde, é também a saga de sua família (ou famílias), narrada, com muita ternura, imaginação  e humor,  pela filha mais nova do 2º casamento (com a Julinha), a Lucinda.

A Lucinda,  no livro, e se não erro na minha leitura, aparece como um "alter ego", a Maria do Carmo, a "rádio Andorra" (p. 14), "sempre sintonizada nas últimas notícias,  difundindo dramas que chegavam invariavelmente aos ouvidos do pai [, de sete filhos, 1 rapaz e 6 raparigas, de dois casamentos,]  e resultavam em novos dramas,  novos sermões, novos castigos"... Um pai ausente e presente, à distância, que regressava todos os anos, a Lisboa, na época das chuvas, deixando em Bissau, em repouso, por escassos meses,  a sua velha Ford e a tralha toda do cinema ambulante. Aproveitava a estadia em Lisboa não só para compensar a família das longas ausências no mato como para escolher e alugar. às distribuidoras, os filmes da próxima temporada.


sexta-feira, 2 de agosto de 2019

Guiné 61/74 - P20027: Tabanca Grande (483): Lúcio Vieira, ex-fur mil, CCAV 788 / BCAV 790 (Bula e Ingoré, 1965/67), natural de Torres Novas, jornalista, poeta, dramaturgo, encenador: senta-se à sombra do nosso poilão, no lugar nº 794


O fur mil cav Lúcio Vieira, da CCAV 788  / BCAV 790 (Bula e Ingoré, 1965/67),  no rio Mansoa 


O fur mil cav Lúcio Vieira, CCAV 788 / BCAV 790, em Bula... A barrica parece ter a seguinte inscrição: "Água Brasuca" (ou será "Água Dragões" ?)...O Vieira estava de sargento de dia...


O fur mil cav Lúcio Vieira, CCAV 788 / BCAV 790, em São Vicente, com o "exótico Machado" 


Fotos (e legendas): ©Lúcio Vieira (2019). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. O Lúcio Vieira, ex-furriel miliciano de cavalaria,  BCAV 790 / CCAV 788 (Bula e Ingoré, 1965/67), aceitou o nosso convite para integrar, formalmente, a Tabanca Grande,  formulado por ocasião do nosso XIV Encontro Nacional, realizado em 25 de maio último, em Monte Real. Costuma também participar, com o seu amigo e camarada Carlos Pinheiro, nos convívios da Tabanca do Centro.

Será o grã-tabanqueiro n.º  794. E é, obviamente, bem vindo.  Não tínhamos até à data nenhum representante da CCAV 788. (*)

O Lúcio Vieira, além de uma nota curricular (, assinada elo seu amigo Américo Brito), e das fotos da praxe, mandou-nos textos para oportuna  publicação e também a seguinte informação sobre o seu batalhão e a sua companhia:

(...) "O Batalhão, o BCAV 790,  formou-se em Cavalaria 7 (Calçada da Ajuda - Lisboa) e foi comandado pelo então Ten.Coronel Henrique Calado. Quinze dias após o desembarque, saímos de Bissau (BAT 600) e fomos colocados em Bula, juntos com a CCS do Batalhão, como Companhia de intervenção. 

Após seis meses e porque a Companhia, a CCAV 788,  acusava algum desgaste, fomos render a Companhia que se encontrava no Ingoré. E foi pior do que o tempo de intervenção em Bula.

Comandava a 788 o,  já falecido, Capitão Costa Ferreira, oriundo de Castelo Branco.
Regressámos em Janeiro de 1967." (...)

O Batalhão editou o jornal "Clarim". Diretor: Ten-Cor Cav Henrique Calado.


2.  Lúcio Vieira, síntese curricular, por Américo Brito

António Lúcio Coutinho Vieira - Poeta, Dramaturgo, Encenador, Investigador e  Jornalista

Após os estudos académicos concluiu, anos mais tarde, um curso intensivo no Centro de Estudos Psicotécnicos, em Lisboa e, posteriormente, um outro de Relações Públicas.

Foi responsável, ao longo de treze anos, pelo departamento de Comunicação e Relações Públicas do CEP 4 ( ex-Rodoviária Nacional ). 

Em paralelo com as funções profissionais, das quais nunca se afastou, desenvolveu, ao longo dos anos, uma vasta actividade, nas áreas da cultura e da comunicação, principalmente nos sectores do Teatro, do Jornalismo, do Audiovisual e da Rádio.

Ocupou o cargo de Vice-presidente do Cineclube de Torres Novas, o de director-encenador no Centro de Juventude e, posteriormente, na Casa de Cultura da cidade, ambos na área do Teatro.

Fundou e dirigiu o Grupo de Jograis da USTN, o Grupo Cénico Claras, o TET-Teatro Experimental Torrejano e o Teatro Estúdio, nos quais, ao longo de vários anos, encenou textos de autores portugueses e estrangeiros, em cuja lista se incluem, para além do próprio autor, entre outros os nomes de Gil Vicente, Miguel Torga, Luís-Francisco Rebello, Carlos Selvagem, Jaime Salazar Sampaio, Luís de Sttau-Monteiro, Sófocles, Molière, Marivaux.

Das várias montagens que assinou, algumas em obras de sua autoria, destacam-se a estreia universal da farsa de Jerónimo Ribeiro, Auto do Físico ( séc. XVI ), uma arrojada versão da Antígona, de Sófocles e a célebre farsa de Luís de Sttau Monteiro, "A Guerra Santa", que haveria de marcar politicamente, em Portugal, o Verão de 1977 e a farsa trágica, "Dulcinea ou a Última Aventura de D. Quixote", de Carlos Selvagem. 

Adaptou obras teatrais, clássicas e contemporâneas e é autor de vários originais de teatro, alguns para o público infanto-juvenil.

Iniciou, na SPA–Sociedade Portuguesa de Autores, as 1ªs. Jornadas de Interpretação Teatral, onde pontuaram actores como Rogério Paulo e Canto e Castro, entre outros. A sua peça "Aldeiabrava" – 2º. lugar "exaequo", no concurso nacional promovido pela ATADT ( 1967 ) - viria a ser escolhida pela SPA, para representar o teatro português, numa mostra de livros portugueses em Moscovo.

Ao longo dos anos, vários títulos haviam de integrar a lista de obras dramatúrgicas do autor: "A Flor Mágica do Sábio Constelação" e "A Ilha das Maravilhas" – ambas destinadas ao público infanto-juvenil -, "O Vértice", "Aldeiabrava" (com  prefácio de Luíz-Francisco Rebello). Ou a "Odisseia", "A 7.ª Guerra Mundial", "SOS - Sistema Optimizado de Saúde", ou o monólogo "Eu, Sofredor me Confesso", são alguns desses títulos. 

Destinado a estudantes do ensino secundário surgiu, recentemente, uma colectânea de curtas peças, sob o título genérico de “Pequeno Teatro Académico”.

No prefácio à sua peça "Aldeiabrava", o então presidente da Sociedade Portuguesa de Autores, teatrólogo e dramaturgo, Luiz-Francisco Rebello, amigo pessoal do autor, compara essa sua obra, nos aspectos temático e de conteúdo, a "O Exército na Cidade", de Jules Romains, a "Numancia", de Cervantes e a "Fuenteovejuna", de Lope de Vega.

É autor de vasto número de letras de canções e fados, principalmente de parceria com Paco Bandeira e com o maestro António Gavino e de vários temas da banda sonora da telenovela "Filhos do Vento"  (RTP-1997). Para além de Paco Bandeira, gravaram igualmente os seus poemas, António Mourão, Vasco Rafael, Margarida Bessa, Maria Amélia Proença, os solistas das Orquestras Típicas, Scalabitana e de Rio Maior, entre outros.

No prefácio que dedicou ao seu livro de poemas "Re Cantos", outro velho amigo do autor, Pedro Barroso, deixa escrito que, lendo-se a sua poesia “sentimos o fulgor de uma enorme explosão de beleza pessoal; passa por ali o génio dos grandes” (...) “este livro fica aí para ler-se toda a vida como consultor e conselheiro. Como terapeuta das horas e breviário dos sentidos (...)”. 

Já o Prof. António Matias Coelho, presidente da Associação Casa-Memória de Camões, em Constância e membro do júri que elegeria como vencedora a obra “25 Poemas de Dores e Amores”, diria a propósito deste seu último livro: “(…) Senti que lia um grande poeta. Esta é da melhor poesia que já li (…)”

Foi redactor principal no semanário "O Almonda", publicou reportagens na revista "Domingo Magazine", do diário "Correio da Manhã" e colaborou, ao longo dos anos, com vários jornais regionais.

É autor do script e da realização de curtas-metragens de cinema de ficção para a Equipa Fotograma e de vários documentários em vídeo. Foi director de estação e director de programas, em diversas estações regionais de rádio.

Vencedor de alguns festivais de canção de âmbito regional, obteve o 2.º  lugar no Festival Nacional da Canção de Leiria ( 1987 ), possui prémios de rádio (programa Auditório – RCL ) e de teatro: "Aldeiabrava" viria a obter o 2º. lugar, "ex aequo", no Concurso Nacional da ATADT (Portugal) vencendo o Festival de Teatro Português de Toronto (Canadá) em 1990.

António Lúcio Vieira foi distinguido, em 1997, com os diplomas de Mérito e de Louvor, pela Casa do Ribatejo, em Lisboa.

Em 2015 o Município de Alcanena atribuiu-lhe a Medalha de Ouro de Mérito Cultural.

É Prémio de Poesia “Médio Tejo Edições” ( 2017) para “25 Poemas de Dores e Amores”. É membro da SPA – Sociedade Portuguesa de Autores.

sábado, 2 de fevereiro de 2019

Guiné 61/74 - P19463: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XII: cap inf Izidoro Azevedo Gomes Coelho (Vila Real, 1936 - Ambriz, Angola, 1964), cmdt da CCAÇ 539, morto por uma mina A/C com mais 7 dos seus homens





Eis os mortos desse dia, para além do capitão:

Agostinho Arromba Soares Fonseca,  1º cabo;
Alberto José Fernandes Machado,  fur mil;
Joaquim Gonçalves de Magalhães,  sold;
Armando Augusto Oliveira Moreira, sold;
Manuel Fernando Alves Nogueira, 1º cabo;
Augusto Martinho Rodrigues, sold.



1. Continuação da publicação da série respeitante à biografia (breve) de cada um dos 47 Oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar que morreram em combate no período 1961-1975, na guerra do ultramar ou guerra colonial (em África e na Ásia)Trabalho de pesquisa do cor art ref António Carlos Morais da Silva, instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael, entre 1970 e 1972. Foi cadete-aluno nº 45/63, do corpo de alunos da Academia Militar.


___________

Nota do editor:

Último poste da série > 29 de janeiro de 2019 > Giné 61/74 - P19453: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XI: cap cav António Lopo Machado Carmo (Coimbra, 1933 - São Domingos, Guiné, 1963), comandante da CCAV 252 (1961/63)

sábado, 26 de janeiro de 2019

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Guiné 61/74 - P19327: Notas de leitura (1134): “O Homem do Cinema, A la Manel Djoquim i na bim”, por Lucinda Aranha Antunes; edição da Alfarroba, 2018 (2) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Dezembro de 2018:

Queridos amigos,

Oxalá o realizador guineense Flora Gomes encontre inspiração nesta bela narrativa para fazer um filme único sobre o homem do cinema que encheu os confins da Guiné com risos e lágrimas.

Manuel Joaquim teve vários requisitos que permitiriam um filme assombroso: as mudanças operadas na Guiné com as comunicações e depois com a guerra; a relação que manteve com a administração e os colonos no mato; o caçador e o comerciante; e aquela espantosa vida familiar, a família em Lisboa e ele a chegar ao aeroporto da Portela na época da chuva sempre em calção, para fúria da Julinha, e temos o meio familiar desse colono que ele julgava vigiar noite e dia, pura ilusão.
Que belíssima narrativa!

Um abraço do
Mário


Com o Manuel Joaquim, o cinema chegou a toda a Guiné (2)

Beja Santos

É possível questionar se a obra “O Homem do Cinema, A la Manel Djoquim i na bim”, por Lucinda Aranha Antunes, edição da Alfarroba, 2018, é um romance, um relato memorial ou uma investigação de caráter biográfico. Um homem dos sete ofícios, apaixonado pela mecânica, parte da Europa para Cabo Verde e daqui para a Guiné, já com família constituída. A narrativa de Lucinda Aranha Antunes começa num quase presente e num quase presente desagua, num tumulto de revelações e mágoas. É um texto intercultural, o crioulo está sempre presente, Manuel Joaquim e Julinha, a sua amada esposa, pontificam, com filharada, criadagem, amigos certos e desertores nas horas incertas.

Manuel Joaquim não era só o homem do cinema, desenrascava no setor público e no setor privado, a autora conta uma história bem curiosa:

“Certa vez, em 1964, a Central Elétrica de Gabu teve uma avaria que deixou a cidade às escuras por quinze dias. Em desespero, o secretário Barros e o administrador Faria Leite mandaram-no chamar.

Chegou, pela manhãzinha, mandou desmontar o motor, viu as avarias, reparou-as e supervisionou a montagem do motor. Pelas seis horas, já ao lusco-fusco, deu-se o milagre da luz. A criançada, em círculo, batia palmas, dançando e gritando a compasso, Manel Djoquim, Manel Djoquim. O Aguinaldo Évora, o encarregado da Central, dizia para quem o queria ouvir, é um mecânico de mão-cheia, o melhor de toda a Guiné. A ele recorria a própria Central Elétrica de Bissau para a produção de peças, porque não tinha grandes oficinas (…) Pelo trabalho de iluminar a Guiné não cobrava nada, mas em troca os governantes facilitavam-lhe a projeção dos filmes, publicitavam a sua chegada e, frequentemente, encarregavam-se mesmo de fazer vender os bilhetes”.

A sua chegada a qualquer local gerava uma atmosfera de euforia, fosse qual fosse o destino onde arribasse, tocava duas buzinadelas, o altifalante jorrava música. “Era único. A miudagem, de cabeça perdida, batia latas e entoava uma música que corria por toda a Guiné e que marcava o início do momento solene, a chegada do cinema:

A la Manel Djoquim i na bimA la Manel Djoquim cú seu cinema
Olalé, olelá.”

A administração tocava o tantã, o homem do cinema merecia todas as honras:

“Os administradores e os chefes de posto encarregavam-se de anunciar a vinda de Manuel Joaquim, os sipaios, alguns feitos homens-sanduíches, publicitavam o cinema em todas as localidades, os régulos também avisavam toda a gente, afixavam-se cartazes nas árvores. Caso a publicidade não chegasse, lá estavam os sipaios para ir buscar, forma simpática de dizer, os espectadores às tabancas”.

Manuel Joaquim era um moralista, escolhia nos catálogos segundo critérios cinematográficos rigorosos, nada de beijos prolongados, havia cuidados com a toilette, evitava a todo o transe excessos indecorosos.

“As escolhas recaíam em musicais, dramas românticos, comédias, filmes históricos, bíblicos, de capa e espada, de guerra, de aventuras, de terror (…) Eram êxitos garantidos os filmes do Charlot ou do Tarzan, cujo grito de guerra a criançada e até muitos adultos imitavam, e em que a Chita era uma mais-valia, as comédias portuguesas, o Cantinflas, o Totó, o Fernandel, o Jerry Lewis, com gargalhadas a esmo, o Joselito, que fazia sempre as senhoras verterem lágrimas copiosas”.

A narrativa de Lucinda Aranha Antunes multiplica-se em pormenores, em peripécias, assistimos às grandes alterações de Bissau, a luta armada, no início, parecia que não ia bulir com o homem do cinema, as dificuldades surgiram, em Lisboa, a família começa a aperceber-se por quem chegava dos imensos riscos, nas longas temporadas que passava na metrópole Manuel Joaquim levava a família a reboque para passeatas. Regressava à Guiné e a guerra passou a ser um assunto sempre presente nas andanças, a autora desvela o que mudava no território e na sociedade, a própria comunicação social dera muitas voltas, desenvolvera-se a rádio, Bissau tinha cinema na UDIB e no quartel-general. Manuel Joaquim meteu-se em negócios ruinosos, a saúde começou a faltar, começaram os tempos difíceis, os falsos amigos desertaram, um AVC derrubou o homem do cinema, é um rosário de intrigas, de desfeitas, de mudanças radicais.

É uma bonita homenagem que se presta ao homem do cinema da Guiné, mostrar um mapa da colónia e apercebermo-nos que ele percorria todo aquele território com filmes de todos os géneros, deu alegria e alimentou sonhos, jamais se repetiria tão espantosa experiência desse senhor que tinha a sua própria carripana, com atitudes de autossuficiência, mecânico exímio, caçador e negociante, guiava-se por um amor extremo à vida do mato, fugia ao aliciamento citadino e na época das chuvas desembarcava em Lisboa em calções, meia alta e sapato grosso, para desespero da Julinha, pouco dada a exibicionismos.

Lucinda Aranha Antunes dá-nos o contexto familiar em pinceladas sóbrias, onde não falta o colorido das observações em crioulo. E temos os cenários dessa Bissau que se desenvolve e prospera na economia da guerra, um Bissau velho pejado de coisas fartas, há muito dinheiro para as comprar. E também o desânimo desse colono com princípios que era prestável, ingénuo nos negócios e nas amizades, só se apercebeu de muito oportunismo de quem com ele se relacionava nos tempos difíceis, derrubado pela doença. Um percurso humano de alguém que desde criança adorava desmontar máquinas, se embevecia com o celuloide e encheu os matos da Guiné com horas de fantasia, entre a comédia e o drama. Uma belíssima narrativa que devia chegar rapidamente a Cabo Verde e à Guiné, tão poderoso é o texto intercultural e a mensagem inerente a este audaz homem do cinema.

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Notas do editor:

Poste anterior de 17 de dezembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19300: Notas de leitura (1132): “O Homem do Cinema, A la Manel Djoquim i na bim”, por Lucinda Aranha Antunes; edição da Alfarroba, 2018 (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 21 de dezembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19313: Notas de leitura (1133): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (65) (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 2 de novembro de 2018

Guiné 61/74 - P19160: Recortes de imprensa (98): In Memoriam - Professor Doutor Carlos Cordeiro - Homenagem no Jornal Correio dos Açores (3) - Biografia por Carlos E. Pacheco Amaral

Chegou ao conhecimento do Blogue, através do nosso camarada José Câmara, a publicação no Jornal Correio dos Açores de 21 de Outubro de 2018, de depoimentos de homenagem ao Professor Doutor Carlos Cordeiro, ilustre camarada que, como Furriel Miliciano, fez a sua Comissão de Serviço em Angola, falecido no passado dia 19 de Setembro.

Com a devida autorização do Director do prestigiado, e quase centenário, jornal Correio dos Açores, Américo Natalino Viveiros, deixamos o recorte da Biografia de Carlos Cordeiro, por Carlos E. Pacheco Amaral.





 Com a devida vénia ao Jornal Correio dos Açores
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Nota do editor

Último poste da série de 1 de Novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19155: Recortes de imprensa (97): In Memoriam - Professor Doutor Carlos Cordeiro - Homenagem no Jornal Correio dos Açores (2)

sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Guiné 61/74 - P17743: Notas de leitura (993): “A verdadeira morte de Amílcar Cabral”, por Tomás Medeiros, althum.com, segunda edição revista, 2014 (2) (Mário Beja Santos)

A Verdadeira Morte de Amílcar Cabral, por Tomás Medeiros


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Março de 2016:

Queridos amigos,
Compreende-se como a análise de Tomás Medeiros é muitíssimo mal aceite por todos aqueles que se mantêm convictos sobre as bondades da unidade Guiné-Cabo Verde. Medeiros conviveu intimamente com Amílcar Cabral na Casa dos Estudantes do Império, ficaram amigos.
Neste ensaio faz o escalpelo da formação do jovem Cabral em Cabo Verde, revela o estado de espírito dos estudantes africanos em Lisboa naquele pós-guerra em que já não se podia dissimular a ascensão anticolonial. E todo este heroísmo que representou pôr o PAIGC de pé, dar-lhe consistência sob a fórmula da unidade, ruiu quando se anteviu a independência da Guiné, acenderam-se todos os sinais de alarme, Cabral, na sua doce ilusão, fingia não entender.
Não há neste trabalho uma inovação absoluta mas vale a pena atender ao que escreve Tomás Medeiros sobre os desentendimentos de fundo.

Um abraço do
Mário


A verdadeira morte de Amílcar Cabral (2)

Beja Santos

“A verdadeira morte de Amílcar Cabral”, por Tomás Medeiros, 2.ª edição revista, althum.com, 2014, é o testemunho de um companheiro são-tomense que conviveu com Amílcar Cabral e outros líderes de movimentos de libertação. É um estudo que devemos ter em conta no quadro mitigado dos documentos e investigações centrados no pensamento e obra de Cabral. A razão é simples. Medeiros insere a educação de Cabral no mundo cabo-verdiano, a sua preparação universitária no tempo certo do pós-guerra em que o anticolonialismo deixou de ser balbuciado a medo, tornara-se num fenómeno ascendente com as independências asiáticas e como arma de arremesso da Guerra Fria. Temos igualmente identificado o partido original concebido por Cabral e a resposta da mobilização, o seu olhar visionário para a natureza da luta armada num espaço que era propício a atacar e desaparecer no meio de pântanos e florestas cerradas. Igualmente Medeiros nos dá uma síntese rigorosa de resposta encontrada por Cabral através da forma da unidade Guiné-Cabo Verde. Mas era suficiente esta formulação de ter quadros cabo-verdianos associados aos aguerridos soldados guineenses, era indispensável uma resposta coesa na organização partidária, como Cabral deixou escrito:  
“A direção político-militar da luta é única: é a direção política da luta. Nós na nossa luta evitamos criar o que quer que seja de militar. Somos políticos, e o nosso Partido, que é uma organização política, dirige a luta no plano civil, político-administrativo, técnico e portanto militar. Os nossos combatentes definem-se como militantes armados. É o Bureau Político do Partido que dirige a luta armada e a vida, tanto nas regiões libertadas como nas que o não são, e onde temos os nossos militantes. Ao nível de cada frente existe um comando de frente. Ao nível de cada setor existe um comando de setor”.
Os meios urbanos tornam-se nesta luta armada lugares secundários. O laboratório do “homem novo” reside no interior das matas, onde há escolas, hospitais improvisados, espaços de abastecimento que se irão tornar em Armazéns do Povo. A lógica da liderança é a de que se é militar por acidente, é-se militar por razões da luta armada e da libertação. É um processo de gradual capilaridade, fazer chegar o partido a todos os níveis, fazer funcionar a justiça. A capacidade militar demonstrada ao longo dos anos, o natural prestígio de Cabral que é recebido e apreciado como um dos principais líderes revolucionários mundiais têm que ser tomados em conta na vida interna do PAIGC e em todo o processo montado para a proclamação unilateral da independência.

E chegamos assim à morte de Cabral e à narrativa mais polémica de Medeiros. A sua memória viaja até aquela encruzilhada de gente universitária das colónias em Lisboa. Cabral preparou-se a fundo para denunciar o que era o colonialismo português na Guiné: a imposição da cultura do amendoim; como podiam ser valorizadas as matérias-primas agrícolas e a indústria florestal. Cabral conhecia as divisões étnicas e a dinamite em que se podiam transformar, opondo-se umas às outras. Mas o suporte conceptual de Cabral tinha fragilidades de monta.
Primeiro, Cabo Verde estava mais próximo de Portugal do que da Guiné. Como um dia disse Germano de Almeida ao Jornal de Letras, em 2001: “O simples facto de falarmos a mesma língua, permite que saiamos de Cabo Verde, cheguemos a Portugal e nos sintamos em casa. Dificilmente penso que vou para o estrangeiro. Estrangeiro é o resto. O povo que vem para cá viver vem à procura de trabalho por uma questão de sobrevivência. Na pequena burguesia dos serviços, sobretudo, muitos vieram porque não concordavam com a independência nem com as ideias políticas do PAIGC. Mesmo agora, vem muita gente que se chateia, quando se sente perseguida”.
Segundo, a participação cabo-verdiana na luta de libertação na Guiné-Bissau teve muitas brumas, esteve longe de ser pacífica. Os jovens trotskistas entraram muito cedo em rota de colisão com o PAIGC guineense. A luta revolucionária era aliciante mas os cabo-verdianos não tiveram dificuldade em reconhecer desde cedo que culturalmente estavam nos antípodas: separados pelos hábitos alimentares, pelas práticas da mesa, pela formação, pela religião, pela natureza das paisagens, e muito mais. E quem se envolvia na luta armada apercebia-se de outra realidade: o rancor surdo guardado ao longo dos séculos, os guineenses sabiam que os cabo-verdianos ali aportavam como altos funcionários, administradores, técnicos sem concorrência, identificados com o trabalho colonial, com a edificação de empresas e exploração da agricultura, sempre a chefiar guineenses, numa atitude mental de indiscutível superioridade.

Daí as conclusões polémicas de Medeiros: a morte de Cabral já estava anunciada. Ele tinha que morrer porque tudo aquilo que o movia não interessava, aos quadros e aos combatentes. É redundante continuar à procura dos porquês daqueles indivíduos que deram os tiros. A pequena burguesia cabo-verdiana não estava interessada em suicidar-se, como Cabral preconizava. A guerra evoluía e havia indícios e que era possível vencer. Aí, quem dirigia efetivamente a luta eram os guineenses, eram os guineenses que davam corpo o corpo ao manifesto, sentiam-se os verdadeiros donos da luta. E Medeiros escreve: “Quem morria era os guineenses negros, os cabo-verdianos não morriam. Os comandantes da Guiné, sobretudo Nino Vieira e Osvaldo, assumiram uma ascendência em relação a Amílcar porque ele estava na frente”. Havia igualmente o problemas etnias, Cabral bem procurou encontrar traços de união entre as principais, não foi completamente bem-sucedido. E, mais adiante, escreve: “Ele morreu e não deixou um único seguidor, porque entre Amílcar e os colaboradores havia uma diferença cultural muito grande. Entre ele e o irmão e Aristides Pereira não havia semelhanças possíveis. Os que estavam mais próximos de Amílcar eram bastante conotados com o Partido Comunista Português, no caso de Vasco Cabral”. Os países afastaram-se, o sonho de Amílcar morreu. E na Guiné deixou de haver ideais mas ambições dos chefes militares. Um fenómeno do que ninguém fala é que os quadros e os intelectuais guineenses eram cabo-verdianos. Os quadros superiores da Guiné também eram. A Guiné não tinha nada. Na Guiné o território e as várias etnias não permitem a criação de uma unidade. Medeiros fala de Cabral como um bem-intencionado utópico que recorria a juristas e economistas jugoslavos para programar a constituição e o modelo económico de desenvolvimento da Guiné. Os quadros foram partindo, os quadros cabo-verdianos regressaram em peso à sua terra. Tudo acabou.

E assim termina o seu ensaio: “A verdadeira morte de Amílcar Cabral está no que ele foi e quis que o seu povo fosse e não se cumpriu, não está na sua morte física e circunstancial. E o silêncio que sobre ele e as suas teorias se abateu a seguir ao seu desaparecimento é a sua segunda morte”.
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Nota do editor

Último poste da série de 4 de setembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17729: Notas de leitura (993): “A verdadeira morte de Amílcar Cabral”, por Tomás Medeiros, althum.com, segunda edição revista, 2014 (1) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Guiné 61/74 - P17729: Notas de leitura (993): “A verdadeira morte de Amílcar Cabral”, por Tomás Medeiros, althum.com, segunda edição revista, 2014 (1) (Mário Beja Santos)

A Verdadeira Morte de Amílcar Cabral, por Tomás Medeiros


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Março de 2016:

Queridos amigos,
Aquando da primeira edição, aqui se fez referência a este trabalho. Esta segunda edição comporta alterações, quem se interessa pela temática tem a ganhar com esta nova leitura.
Temos poucos biógrafos de Amílcar Cabral em língua portuguesa: Julião Soares Sousa (o mais importante), António Tomás, Daniel Santos e Tomás Medeiros, a despeito de numerosíssimas referências em ensaios, estudos e até trabalhos sobre a história do movimento de libertação na Guiné.
As reflexões de Tomás Medeiros têm uma singularidade: concentram-se num jovem de cultura cabo-verdiana que triunfou nos estudos em Lisboa no exato momento em que a problemática da descolonização preocupava estas jovens elites africanas. E há o pensamento de um líder inflado por um sonho utópico que acabou por matar o seu criador: a unidade Guiné-Cabo Verde, uma bela consigna para juntarem a melhor mão-de-obra revolucionária e o mais destrutivo explosivo para juntar no mesmo país gente que não esqueceu o passado, tantas vezes doloroso.

Um abraço do
Mário


A verdadeira morte de Amílcar Cabral (1)

Beja Santos

Tomás Medeiros é nome incontornável no movimento anticolonial português. Conviveu de perto com os futuros líderes dos movimentos de libertação e tem sobre os mesmos uma ideia sobre o seu valor e a importância do seu desempenho. Acompanhou e fez um estudo aturado do pensamento e obra de Amílcar Cabral. O seu trabalho intitula-se “A verdadeira morte de Amílcar Cabral”, Tomás Medeiros, althum.com, segunda edição revista, 2014. Já aqui se fez referência à primeira edição, acabo de comprovar que esta revisão dada a público inclui elementos importantes para a ponderação da vida e obra do mais consagrado dos líderes revolucionários africanos das colónias portuguesas.

Tomás Medeiros começa por enquadrar o tempo histórico após a II Guerra Mundial e traça a emergência da descolonização, da negritude, revela com rigor esse novo estado de espírito das elites africanas a estudar nas universidades europeias. Medeiros vinha de S. Tomé e aproximou-se desses estudantes do Império que ganhavam notoriedade, caso de Amílcar Cabral, Mário de Andrade, Francisco Tenreiro. Segundo nos diz na introdução, pretendia ir muito mais longe nas suas investigações mas foi apanhado por doença prolongada e diz que o que hoje se publica constitui a síntese de um projeto que precisa de ser desenvolvido a longo prazo.

Recorda que a juventude de Amílcar Cabral ficou indelevelmente associada a Cabo Verde, um ambiente africano arquipelágico particular, com fomes cíclicas, dentro de uma intelectualidade crioula que se exprime sem equívocos na sua iniciação poética, atravessada pelo modernismo e um naturalismo de cariz africano.

Segue-se a descrição de Lisboa em 1945, aonde chega o estudante de agronomia que vem com o firme propósito de ser um bom poeta e de aprender o que for necessário para lutar contra as crises de Cabo Verde, não terá sido por acaso que foi atraído desde cedo pela erosão dos solos. Convive, mas com distâncias, com o MUD Juvenil, lê afincadamente, e discute com o mesmo afinco, o que lhe cai às mãos sobre colonialismo, africanidade e sopros da descolonização. Vai emadurecendo e quando regressa a Cabo Verde em 1949 mostra um grande entusiasmo em palestras radiofónicas sobre soluções para o problema das secas. Enquanto tira a licenciatura no Instituto Superior de Agronomia frequenta os diferentes espaços por onde transitam os estudantes africanos das diferentes colónias. Medeiros refere a Casa dos Estudantes do Império, o Centro de Estudos Africanos, na residência da família Espírito Santo, no primeiro andar do n.º 37 da Rua Actor Vale, ali para os lados da Fonte Luminosa, por ali circulam Alda do Espírito Santo, Amílcar Cabral, Mário de Andrade, Agostinho Neto, Francisco Tenreiro.

Concluído o curso, parte em 1952 com a mulher para a Guiné, leva na bagagem uma série de trabalhos de agronomia, de valor científico: o problema da erosão dos solos; contribuição para o estudo da região de Cuba (Alentejo); o conceito de erosão – projeto para o estudo dos solos em Cabo Verde. Revela-se um funcionário público metódico e inovador, publica na imprensa local as sínteses das atividades que desenvolve sobretudo em Pessubé, uma estância experimental agrícola onde surgem algumas maravilhas. O seu nome aparece ligado a um projeto da Associação Desportiva e Recreativa dos Africanos, não aceite pelas autoridades. Terá tido encontros com os dirigentes do MING – Movimento de Independência da Guiné, que tinha à frente os nomes de Rafael Barbosa, Aristides Pereira, Fernandes Fortes, Abílio Duarte, e alguns mais. O MING, no dizer de Aristides Pereira era um movimento que não andava. Entretanto, vão crescendo nos países limítrofes organizações políticas que vão sendo conhecidas e discutidas na Guiné Portuguesa.

Em 1955, a sofrer de paludismo, regressa a Lisboa. Tomás Medeiros assegura que Amílcar Cabral esteve na Guiné em 1956 e 1958, o que Julião Soares Sousa contesta, Cabral não terá assistido à fundação do PAI e era impossível em 1958 ele ter passado pela Guiné. Cabral esteve a trabalhar em Angola na cartografia de solos, o seu trabalho foi muitíssimo apreciado, é um trabalho que ele abandona em 1959. Em Angola, escreve propaganda anticolonial e colabora na redação do manifesto que leva à fundação do MPLA. É o tempo em que toma decisões de fundo, parte para a clandestinidade. As diferentes organizações ligadas à luta de libertação criam o MAC – Movimento Anticolonial, o desempenho de Cabral é decisivo. Em Setembro de 1959 regressa a Bissau, no rescaldo dos acontecimentos de 3 de Agosto. Tiram-se ensinamentos de que não há condições para a luta urbana, são fundamentais militantes que precisam de ser recrutados no interior da Guiné. A estratégia do partido fica definida: luta armada para a obtenção da liberdade nacional. Cabe a Cabral desenhar o diagnóstico que irá levar à formulação estratégica: uma parte da direção estará no exílio, em Conacri, a outra parte dirige a sublevação e o envio dos novos quadros para Conacri. Logo no seu primeiro diagnóstico, Cabral enuncia que a vanguarda é caracteristicamente pequeno-burguesa, mais tarde este raciocínio será desenvolvido numa frase ainda com consonância explosiva: a pequena burguesia revolucionária deve ser capaz de se suicidar como classe para ressuscitar como trabalhador revolucionário, inteiramente identificado com as aspirações mais profundas do povo a que pertence.

Os contornos da luta armada que Medeiros refere acompanham de perto tudo aquilo que é hoje conhecido e considerado. E depois aborda o problema da unidade Guiné-Cabo Verde, e cita Cabral: “Nós na Guiné e nas ilhas de Cabo Verde somos as mesmas gentes, temos a mesma língua e temos o mesmo partido". Noutro registo, deve-se a Cabral a seguinte apreciação: “Somos pela unidade africana, à escala regional ou continental como meio necessário para a construção do progresso dos povos africanos, para garantir a segurança e a continuidade deste progresso (…) A liquidação total do colonialismo e das suas sequelas, a conquista prévia da independência nacional de cada país ou colónia, a transformação das estruturas económica e sociais e a aproximação das novas estruturas criadas nos países, deverão, na nossa opinião, constituir a base fundamental da realização da unidade africana”.

(Continua)

Em maré de sorte, este achado na Feira da Ladra, um mapa da Guiné, presumivelmente de trabalhos cartográficos aí pelos anos 1930. Envolvida pela Senegâmbia, o que leva a querer que a colónia francesa do Senegal ainda não se distingue da colónia britânica da Gâmbia. Quem vê este mapa é capaz de pensar que mais de metade do país era ocupado por Fulas, vejam com atenção. No Sul, preponderavam os Biafadas, o que não era totalmente incorreto, os Fulas tinham empurrado os Biafadas para o Litoral, os Nalus e os Sossos, por exemplo, tinham pouca expressão. Não há uma só referência a Mandingas nem a Papéis, parece que essas etnias eram puros epifenómenos. E vale a pena estudar a toponímia. Do que me foi dado ver e viver, na região centro-leste Goli corresponde a Porto Gole, Malafo era nome de rio mas não de povoação, Enxalé fica em frente ao Xime. Em frente a Bambadinca vêm referidas povoações inexistentes em 1960: Sambel Nhanta, que fora a sede do régulo do Cuor, tinha desparecido, Caranque Cunda era um pequeno lugar, que fora importante para acantonar as tropas macuas, em 1908, mas rapidamente perdeu importância. E Checibá talvez seja Madina. Podemos questionar se houve tantas migrações em escassas décadas. O ponto assente é que este mapa tem muitíssimo pouco a ver com a Guiné que conhecemos. O mapa terá sido produzido pelo Istituto Geografico de Agostini – Novara: talvez queira significar que os padres italianos já estavam a caminho.

Beja Santos
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Nota do editor

Último poste da série de 1 de setembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17718: Notas de leitura (992): Relatório científico do Aspirante de Artilharia Wilmer Delgado Pinto para o Mestrado em Ciências Militares na Especialidade de Artilharia, Academia Militar, 2014 (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17457: Notas de leitura (967): Honório Pereira Barreto (Notas para uma biografia), por Joaquim Duarte Silva (Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Fevereiro de 2016:

Queridos amigos,
É bem verdade que quem muito procura sempre alcança. De há muito que andava a vasculhar em prateleiras e caixotes a ver se encontrava este documento, singelo mas de uma enternecida admiração pelo pai fundador do território da Guiné. Nele vem a imagem do seu túmulo em Bissau, desconheço como ele é tratado e sentido pelos guineenses, por acasos interpretativos do anticolonialismo, enviesadamente Honório Pereira Barreto foi tratado e exprobado como agente de colonialismo, coisa mais tola não pode ser dita por quem olha para a História como um retrato do momento, ignorando as mentalidades e o sentido do amor pátrio. Tenho para mim que a República da Guiné-Bissau teria tudo a ganhar no preito a este político admirável que comprou do seu bolso território e foi um político desinteressado, sempre a fustigar os mandriões e corruptos.
Para que conste.

Um abraço do
Mário


Honório Pereira Barreto, por Joaquim Duarte Silva

Beja Santos

Creio tratar-se da primeira biografia do notável político guineense. Surgiu na Coleção pelo Império em 1939, editada pela Agência Geral das Colónias. Não vale a pena aqui repetir-se o que tem sido amplamente difundido sobre o retrato do ilustre político guineense, usando o texto de Joaquim Duarte Silva retomemos a argumentação brilhante deste esforçado que quis defender intransigentemente a Senegâmbia com que ele sonhou. Primeiro, a exortação a favor de Ziguinchor, logo na sua primeira passagem pelo governo da Guiné. Por política enviesada de Lisboa, a Convenção de 12 de Maio de 1886 ofereceu de mão beijada o antifo presídio e toda a margem esquerda do Rio Casamansa e toda uma larga faixa de terreno situado a um Norte do paralelo do Cabo Roxo aos franceses. Vejamos o que ele escreveu:
“Os franceses, em Abril de 1837, não atendendo ao protesto que, segundo minhas instruções, fez o comandante de Ziguinchor, passaram este presídio e foram comprar terrenos aos Mandingas de Sejo, para fundar uma feitoria. Eu, que era governador destas possessões, oficiei ao governador de Gorêa, queixando-me de tal procedimento, e declarando muito positivamente que jamais reconheceria aquele estabelecimento, que fora feito por meio da força; e dirigi-me ao governador da Gâmbia, confiando no Tratado de 1661, um navio de guerra para a ir a Casamansa fazer valer os direitos de Portugal. O governador de Senegal, respondendo ao ofício que eu enviei ao governador de Gorêa, me disse que aquela feitoria fora colocada por ordem do governo francês e baseada nos tratados celebrados entre Portugal, França e Inglaterra; e o governador da Gâmbia me escreveu asseverando-me que não podia anuir ao meu pedido, sem ordem expressa do seu governo. Vendo eu que nada podia fazer, porque só tinha à minha disposição um mal lanchão de governo, remeti ao governador-geral toda a correspondência que houve a este respeito, e ele a transmitiu à Corte; e até agora nenhum resultado tem havido, e creio que nunca o haverá.

. . . . . . . . . . .

Tenho passado pelo desgosto de ver invalidar (ainda que indiretamente, mas com bastante clareza), o protesto que eu então fiz em nome da Rainha e da Nação; pois aos meus sucessores tem ordenado aos comandantes de Cacheu e de Ziguinchor que oficiem ao oficial francês, que está no Sejo, dando-lhe o título de comandante do Estabelecimento francês em Sejo; este título importa virtualmente, a meu ver, o reconhecimento da legalidade daquela usurpada feitoria.
Desde o dia em que li o discurso de um senhor deputado, cujo nome me não lembra “por que não merece ser lembrado pelos habitantes destas possessões”, em que dizia que as câmaras não se deviam ocupar do negócio de Casamansa, por ser um nome bárbaro, e que não vi os ministros levantarem-se como uma só pessoa para combater tais expressões, desde esse dia fiquei persuadido que os estrangeiros podiam, quando quisessem, roubar as nossas possessões; e que os habitantes de Ziguinchor, sendo-lhes impossível sustentar a concorrência nos mercados gentios, ver-se-iam obrigados a abandonar o presídio que têm defendido com o seu sangue e dinheiro. Eis o prémio daqueles que prestam serviços relevantes nestas possessões!”.

E escreve Joaquim Duarte Silva:
“Esta questão de Casamansa perdemo-la por não terem sido fornecidos ás autoridades da Guiné os meios indispensáveis para a execução das patrióticas determinações de Sá da Bandeira. Perdemo-la por indiferença da Metrópole, por não terem sido estudados convenientemente os nossos direitos e por não termos tomado em face da França a mesma atitude decidida e enérgica que, poucos anos depois tomámos em face da Inglaterra e nos evitou a perda da Ilha de Bolama”.

Ratifica a nossa soberania em Bolama. A 25 de Dezembro de 1837 assinou com o régulo Ondontô, de Bissau, um acordo que equivale a um auto de vassalagem e em Novembro do ano seguinte comprou ao referido régulo o Ilhéu do Rei e parte do Rio de Bissau. Escreve então ao Governador-Geral de Cabo-Verde, Brigadeiro Marinho, uma carta memorável:
“Tenho a glória de incluir juntos dois autos da compra do Ilhéu denominado do Rei, fronteira a esta praça, e de parte do rio pertencente ao Rei. Eu excedi as ordens de V. Ex.ª, porém com vantagem para a Nação; incluía também na compra a parte do rio pertencente ao Rei de Bissau, para estorvar a entrada dos franceses por ele dentro. Tendo dado conta da minha melindrosa comissão, está acabada a condição com que continuei neste governo, e, portanto, está a chegar o tempo de V. Ex.ª cumprir a sua palavra de honra, dando-me minha demissão”.
Honório Pereira Barreto desembolsara 440 mil réis fortes nas aquisições e ofereceu-as ao Estado. Tempos depois, Barreto voltou a instar pela sua exoneração, assim escrevendo:
“V. Ex.ª muito bem sabe que eu aceitei o posto de Tenente-Coronel, Comandante do Batalhão de Voluntários Caçadores Africanos e o cargo do Governador Civil e Militar de Bissau com a expressa condição de servir enquanto V. Ex.ª governasse esta província: no exercício do meu cargo fiz todos os serviços que podia só em atenção a V. Ex.ª, porque quando uma província é governada por um homem como V. Ex.ª todos os cidadãos devem ajudá-lo; cedi metade do meu ordenado além dos oferecimentos pecuniários de que tenho dado participações a V. Ex.ª; ao menos despertei o zelo e atividade dos governadores daquelas possessões até agora dormentes, e os meus sucessores devem decerto acabar a obra que me glorio ter começado”.

Barreto vai ainda confrontar-se seriamente com o Tenente da Marinha de Guerra inglesa Arthur Kellet, Comandante do Brigue Brisk, e deixa nova prosa memorável:
“O comandante do Brigue Brisk, desembarcado nesta ilha (Bolama) foi, junto com 19 marinheiros pelo mato dentro e aí tomou uma porção de escravos que se ocupavam na lavoura, e depois à força de pancadas fizeram embarcar outros que estavam dentro da casa do Major Nosolini, querendo levar até gente livre, e dirigindo-se ao ponto onde estava o destacamento militar desta ilha cortaram com machados o mastro da bandeira, e chegaram ao ponto de tirarem a bandeira portuguesa das mãos de um soldado nosso, cuspindo nela e metendo-a depois dentro de uma caixa de vinho, a levaram para bordo, ação esta nunca vista entre nações civilizadas. Exijo de V. Ex.ª uma satisfação completa, sem a qual ficará a dúvida a equidade da vossa nação" (Ele dirige-se ao comandante da colónia inglesa da Serra Leoa).

Seguir-se-á a peça fundamental de Honório Pereira Barreto, o opúsculo publicado em 1843 intitulado "Memória sobre o estado atual da Senegâmbia Portuguesa, causas da sua decadência e meios de a fazer prosperar” que noutro texto aqui nos mereceu largo desenvolvimento(*). Um dado secundário: nunca quis fotografar-se, dizendo: “Sou muito feio e não quero que mais tarde as senhoras da minha família metam medo aos filhinhos, apontando-lhes o meu retrato”.


Os anos passam e continuo sem entender como é que em 2016 a Guiné-Bissau ainda não recuperou aquele que, de acordo com a regras do patriotismo do seu tempo ofereceu à República independente as suas fronteiras.
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Notas do editor

(*) - Vd. poste de 5 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14118: Notas de leitura (665): “Memória sobre o estado atual da Senegâmbia portuguesa, causas da sua decadência e meios de a fazer prosperar”, por Honório Pereira Barreto (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 9 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17449: Notas de leitura (966): Anuário da Província da Guiné, ano de 1925 - Um documento histórico incontornável (2) (Beja Santos)

terça-feira, 22 de novembro de 2016

Guiné 63/74 - P16746: Agenda cultural (521): "Amílcar Cabral (1924-1973): vida e morte de um revolucionário africano", nova edição, revista, corrigida e aumentada (622 pp.): convite da embaixada guineense para o lançamento do livro do prof doutor Julião Soares Sousa, na Universidade Lusófona, Lisboa, sábado, dia 26, às 15h00


Capa do livro do historiador guineense Julião Soares Sousa, "Amílcar Cabral (1924-1973): vida e morte de um revolucionário africano", edição revista, corrigida e aumentada,


1.  Mensagem da Embaixada da Guiné-Bissau:

De: Embaixada Guiné-Bissau 
Universidade Lusófona, Lisboa, Campo Grande

Data: 22 de novembro de 2016 às 10:10

Assunto: Convite para o Lançamento do Livro do Professor Doutor Julião de Sousa, na Universidade Lusófona [. foto à direita]

Ilustre,

Quatro anos depois da sua primeira apresentação, o livro "Amílcar Cabral, vida e morte de um revolucionário africano", do historiador guineense Julião Soares Sousa, está de volta às bancas, em versão revista, corrigida e aumentada.

A obra, que ganhou o prémio,  da Fundação Calouste Gulbenkiam, da História Moderna e Contemporânea de Portugal, traz agora novos dados num estudo apontado como das mais rigorosas biografias do fundador  das nacionalidades guineense e cabo-verdiana.

A apresentação de "Amílcar Cabral, vida e morte de um revolucionário africano", de Julião Soares Sousa, acontece no sábado, dia 26 de novembro, às 15 horas, no auditório Agostinho da Silva, da Universidade Lusófona de Lisboa.

A obra será apresentada pelo jornalista Waldir Araújo. Uma organização a cargo da Embaixada da Guiné-Bissau em Portugal, com apoio da RDP-África.

Contamos com a sua ilustre presença!

Cordialmente,  Ana Semedo, adida.

Com os melhores cumprimentos.

Embaixada da República da Guiné-Bissau
Rua de Alcolena, Nº 17A, 1400-004
Lisboa;

Telef.: 00351 210 739 165


2. Informação adicional dos editores:

JULIÃO SOARES SOUSA

(i) nasceu em  1966, em Bula, Guiné-Bissau; vive em Portugal desde os 16 anos; reside atualmente em Pampilhosa;

(ii) concluiu, em 2008,  o doutoramento em história contemporânea na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC); (foi, de resto, o primeiro guineense a doutorar-se pela Universidade de Coimbra, de acordo com notícia que demos, na altura no nosso blogue); 

(iii)  mestre em História Moderna (FLUC, 1997); licenciado em História (FLUC, 1991);

(iv) trabalha como investigador no Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX, Universidade de Coimbra;

(v) é investigador associado do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas da Guiné-Bissau (INEP);

(vi) distinguido com o prémio Fundação Calouste Gulbenkian de História Moderna e Contemporânea de Portugal, da Academia Portuguesa de História (2011), pelo livro "Amílcar Cabral (1924-1973) Vida e morte de um revolucionário africano" (Lisbnoa, Nova Vega, 2011);

(vii) projeto de investigação pós-doc:  a cisão sino-soviética e as suas implicações nos movimentos de libertação das colónias portuguesas de África;

(viii) tem cerca de duas dezenas e meia de referências no nosso blogue.


3. Entrevista ao Jornal da Mealhada > 30 de junho de 2015 >  “Vida e morte de Amílcar Cabral”, de Julião Soares Sousa, apresentado na Mealhada  (excertos, com a devida vénia)
 
(...) “A reedição da obra sobre Amílcar Cabral foi aumentada e tem mais informação do que as duas outras publicadas em Portugal e uma outra em Cabo Verde, que foi uma edição exclusiva só para este país”, declarou, ao Jornal da Mealhada, Julião Soares Sousa, sobre a nova publicação, que tem seiscentas e vinte e duas páginas e que alguns críticos, garante Julião Sousa, a consideram “a biografia definitiva”.

(...) “Trata-se de uma biografia política de um dos grandes africanos do século XX e impulsionador do projeto de unidade da Guiné com Cabo Verde. Condensa toda a etapa evolutiva desde o nascimento até ao seu assassinato”, explica o autor, que numa das edições anteriores chegou a receber o Prémio Fundação Calouste Gulbenkian História Moderna e Contemporânea de Portugal, da Academia Portuguesa da História, em 2011.

Nesta “nova” edição o capitulo sobre o assassinato de Amílcar Cabral foi alterado, tornando-se “maior e mais profundo”. “Sei que os leitores ficarão surpreendidos com este alargamento”, acrescentou ainda o autor que garante: “É uma história muito procurada pelas pessoas”.

Apesar de Julião Soares Sousa “ter intenção de não voltar a pegar na história”, recorda que a obra “começou na tese de doutoramento” e “obrigou-o” a intensas viagens por vários países, tais como, Dinamarca e Suécia, bem como a consulta “a vários Arquivos em Portugal e no estrangeiro”.

A obra, que já foi apresentada três vezes no Porto e será também em Coimbra e em Lisboa, tem já o dia estipulado para a sessão na cidade da Mealhada. (...)

Julião Soares Sousa já publicou outra obra intitulada “Guiné-Bissau: A destruição de um país – Desafios e reflexões para uma nova estratégia”, que se refere “às crises políticas nos últimos anos”. “É um livro de reflexão pessoal que faz apologia ao diálogo e algumas criticas à gestão”, concluiu o autor, que tem em fase terminal “cinco, seis obras”, estando para breve, tudo indica que até ao final do ano, a apresentação de “A cisão sino-soviética e as suas implicações nos movimentos de libertação das colónias portuguesas de África”.

“As minhas histórias centram-se sempre nas Guerras Coloniais”, confessa Julião Soares Sousa, que não esconde também “que está para breve o seu regresso, quem sabe definitivo, à Guiné”. “É o sitio onde está toda a minha família e o calor, que tanta falta me faz…”, concluiu, ao Jornal da Mealhada, o autor.  (...)

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Nota do editor:

Último poste da série > 21 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16743: Agenda cultural (514): O nosso camarada Paulo Cordeiro Salgado vai estar no programa Mar de Letras - Artes e Cultura - Artes e Letras, no dia 23 de Novembro de 2016, pelas 21h30, na RTP África

segunda-feira, 25 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P16015: Agenda cultural (476): Lançamento do livro “Ten-General Alípio Tomé Pinto – O Capitão do Quadrado”, de Sarah Adamoupoulos, levado a efeito no passado dia 7 de Abril de 2016, no Palácio da Independência (José Eduardo Oliveira)

1. Mensagem do nosso camarada José Eduardo Oliveira (JERO) (ex-Fur Mil da CCAÇ 675, Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), com data de 19 de Abril de 2016, dando-nos conta do lançamento do livro biográfico "Ten-General Alípio Tomé Pinto - O Capitão do Quadrado", da autoria de Sarah Adamoupoulos, ocorrido no passado dia 7 de Abril:


Lançamento do livro “Ten-General Alípio Tomé Pinto – O Capitão do Quadrado”

Em Lisboa, o lançamento do livro decorreu no passado dia 7 de Abril no Palácio da Independência, onde estiveram presentes algumas das principais figuras nacionais e internacionais, presenteando o biografado com uma sala absolutamente cheia.


A obra em causa é da autoria de Sarah Adamoupoulos, que também esteve na mesa de honra.
Por motivos profissionais, o General António Ramalho Eanes, que prefaciou o livro, não pôde estar presente. No entanto, o Gen. Alexandre de Sousa Pinto leu na altura o discurso que o antigo Presidente da República tinha preparado e do qual destacamos o seguinte: "Tomé Pinto é, para mim – que o conheço há décadas – não só, como o próprio afirma nesta obra, um Militar por paixão, mas, sobretudo, um militar de sonho e aventura, de vocação, ambição e missão, um dos melhores entre os melhores, e não só na Instituição Militar, mas, também, no Pais (Portugal)"

Na mesma cerimónia, o Gen. Alexandre de Sousa Pinto aproveitou também para proferir algumas palavras sobre o biografado: "O exercício da profissão de militar exige uma vocação; tal como o sacerdote, o militar que não tenha verdadeira vocação será sempre um infeliz e, mais grave, fará infelizes os subordinados que tenham que o aturar."

O “Capitão do Quadrado, que conta hoje uns invejáveis 80 anos, deslocou-se no fim de semana seguinte a Angola, para fazer o lançamento do seu livro, que teve lugar na Fortaleza em Luanda, no passado dia 12 de Abril.


Alípio Tomé Pinto, hoje General na reforma e que anda a plantar árvores em Maçores, no planalto Mirandês, ficou conhecido como o “capitão do quadrado”. Quando chegou à Guiné, no comando da CCAÇ 675, já tinha desnorteado a “senhora morte”. Fora alvejado numa patrulha a São José do Enconge, no coração dos Dembos, em Angola. A bala atravessou o maxilar e alojou-se junto à carótida. Foi-lhe administrada a extrema-unção mas recuperou. A lenda de Tomé Pinto, também conhecido pelo Capitão de Binta, começa com os primeiros trinta dias em que chegou ao aquartelamento e se pôs a patrulhar toda a região, os guerrilheiros cultivavam à volta de Binta, aproveitavam-se do temor da tropa que anteriormente ali estivera.


Há já obras publicadas sobre esta CCAÇ 675, nomeadamente do então Furriel Milº. Enfermeiro José Eduardo Oliveira que escreveu sobre o primeiro ano de atividade desta Companhia. É o caso inédito de um diário com olhar coletivo publicado em tempo praticamente real.

O Capitão do Quadrado voltará a ser ferido em combate e o cronista destes acontecimentos escreverá com imensa ternura, como soperasse a dor coletiva: “Todos queriam pegar na maca para o transportar; um despia o casaco camuflado para lhe aconchegar melhor a cabeça; outro dava-lhe o seu concentrado de frutos da ração de combate; outro ainda quase que o obrigava a beber água do seu cantil”.


Regressará a Binta semanas depois e lança-se na atividade operacional. Abandonará a Companhia para fazer o curso do Estado-Maior do Exército. O seu sucessor desabafará: “Envergonho-me de comandar os homens de Tomé Pinto. No meio deles, sinto-me um soldado, pois eles não precisam de ordens, nem as esperam. Têm tal conhecimento da zona, tal sentido de orientação e tal intuição do perigo que se movem ordeiramente para qualquer lado". Tomé Pinto chegara a Binta a 29 de Junho de 1964 e no relatório de 24 de Dezembro já registavam 51 ações de fogo sobre o seu comando. Alguns dos seus militares dos tempos de Binta estiveram presentes na cerimónia de Lisboa.

No emblema da CCaç. 675 a inscrição que permanece viva diz: “Nunca Cederá”.

No dia 8 do próximo mês de Maio, o “Capitão do Quadrado” e os seus homens de Binta deslocar-se-ão a Évora para comemorar os 50 anos do seu regresso a Portugal.

JERO
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Último poste da série de 20 de abril de 2016 Guiné 63/74 - P15994: Agenda cultural (475): Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes, amanhã, 21, às 16h00, no auditório da biblioteca municipal da Covilhã: Juvenal Amado apresenta o seu livro "A Tropa Via Fazer de Ti um Homem"; confirmada a presença do prof Pereira Coelho, que foi um dos médicos do BCAÇ 3872, em Galomaro, 1971/72