domingo, 20 de junho de 2010

Guiné 63/74 - P6618: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (4): No separar é que está o ganhar (António Martins de Matos)


O nosso Camarada António Martins de Matos (ex-Ten Pilav, BA12, Bissalanca, 1972/74, hoje Ten Gen Pilav Res), enviou-nos, em 28 de Junho Último, a seguinte mensagem a propósito do dia 10 de Junho:

Camaradas,

A propósito do título acima, escrevi um pequeno texto que deixo à vossa consideração.
Penso que é um tema que eventualmente poderá ser apresentado a 26 Junho.

No separar é que está o ganhar

O 10 de Junho, o António Barreto e a Ana Duarte (poste P6591) obrigaram-me a uma reflexão sobre o que é ser um antigo combatente por oposição ao que deveria ser.

Comecemos pelo princípio, pelas perguntas:

Porque razão não estão os antigos combatentes unidos?
Porque se reúnem uns em Belém outros na Batalha, outros em Faro?

Porque se reúnem uns a 9 de Abril, outros a 10 de Junho, 11 Novembro?

Porque marcham apenas quando “alguém” os deixa marchar?

Porque ficam contentes quando “alguém” lhes passa a mão pelo ombro, seja uma choruda contribuição monetária de 150 euros anuais, ou o direito para alguns de marchar atrás da tropa, mas desde que não desfilem com os guiões?

Porque razão se contentam com a cerimónia de Belém no 10 Junho, com umas entidades oficiais a mostrar solidariedade mas a enquadra-los não vá o diabo tecê-las, com uns discursos bacocos e um almoço tipo piquenique (os piqueniques patrocinados pelos supermercados levam mais gente).

Porque deixam que, passados 36 anos do fim da guerra, os nomes de inúmeros mortos pela Pátria continuem ausentes na parede do Monumento?

E para terminar, porque aceitam que o Monumento fique ali, naquele lugar, escondido das vistas, não vá perturbar alguma mente mais sensível?

Quem tem as respostas, qual pedrada no charco, não é o António Barreto, o Presidente das Comemorações ou a Liga dos Combatentes, mas sim a Ana Duarte quando diz que, “no separar é que está o ganhar”.

Ou, por outras palavras, vejam lá se morrem para acabarmos com estes problemas.

Que diabo, não somos capazes de nos unirmos?

Unidos não precisamos de andar a pedir, podemos exigir:

  • Exigir a inscrição imediata no Monumento do nome de todos os que morreram pela Pátria, independentemente de posto, credo ou cor da pele;
  • Exigir ter uma cerimónia nossa, não a reboque das cerimónias ditas “oficiais”;
  • Exigir marchar em continência ao Monumento, não os habituais Paras, Fusos ou Comandos mas todos os antigos combatentes, à semelhança do que se faz em Inglaterra no Remembrance Day.

No dia 26 vamos juntar 145 amigos para um almoço tipo “Remembrance”.

Que me dizem se no próximo ano formos todos a Belém, não para assistir passivamente a mais do mesmo mas sim para marchar em homenagem aos que morreram pela Pátria.

E 145 um ano, 1000 no seguinte, só precisamos de vontade e uma banda.

Que surpresa seria para as “forças vivas”.

E quando formos 1000 a desfilar poderemos dizer:

  • Queremos o Monumento mudado para um lugar mais condigno, onde a Pátria honre verdadeiramente os seus mortos.

PS: Porque não para o cimo do Parque Eduardo VII, trocamos com as pedras do Cargaleiro.

Um Abraço,
António Martins de Matos
Ten Pilav na BA12
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Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:

13 de Junho de 2010 >

Guiné 63/74 - P6591: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (3): O dia do ex-combatente devia ser comemorado noutra data (Ana Duarte)

Guiné 63/74 - P6617: Tabanca Grande (225): João Santos, ex-Alf Mil Rec Info, CCS/BCAÇ 2852, e BENG 447 (1970/71)

João Santos, ex-Alf Mil Rec Info da  CCS/BCAÇ 2852 e BENG 447 (1970/71)

1. Mensagem e fotos do João Santos:

Data: 19 de Junho de 2010 18:33
Assunto: Dados para o Blogue

Boa tarde, amigo.
Sou João António Leitão Simões Santos, natural do Cartaxo, residente no Cartaxo, nascido a 19/07/1948, e fui Alferes Miliciano de Reconhecimento e Informações na CCS do BCAÇ 2852 em Bambadinca. Sou o Oficial "não identificado", na foto nos Nhabijões, onde está o Major Sampaio, o Alferes Vacas de Carvalho e o Alferes Médico Saraiva.

Fui eu que fiz o levantamento topográfico e a implantação do reordenamento dos Nhabijões e acompanhei bastante de perto toda a sua construção.

Quando o BCAÇ 2852 terminou a sua comissão [, em Maio de 1970], fui colocado do BENG 447, na Secção de Reordenamentos que, em conjunto com o QG, na Amura, coordenava o envio de materiais de construção para os reordenamentos.

A minha formação académica à data era Regente Agrícola

Saudações
João Santos


2. Nota de L.G.:

João Santos, sê bem vindo ao nosso blogue. Obrigado por teres entrado em contacto connosco. Mas vamos querer saber mais pormenores sobre o reordenamento de Nhabijões, um dos maiores efectuados na Guiné. Conheces as nossas regras do jogo. Põe-te à vontade.  Ficamos a aguardar as tuas histórias ou memórias.

Um Alfa Bravo.
Luís Graça
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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 15 de Junho de 2010 Guiné 63/74 - P6596: Estudos (1): Guerra de África - O QP e o Comando das Companhias de Combate (António Carlos Morais da Silva, Cor Art Ref) (VI e última parte)

sábado, 19 de junho de 2010

Guiné 63/74 - P6616: In memoriam (44): Victor Condeço (1943-2010), um camarada discreto, amável, afável, prestável, generoso (Luís Graça / Benito Neves / Juvenal Amado)

Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART  1913 (1967/69) Quartel > Álbum fotográfico do Victor Condeço Foto 19 > "O Fur Mil Victor Condeço no varandim da velha messe de sargentos".



Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) Quartel > Álbum fotográfico do Victor Condeço Foto 24 > 2No bar antigo de sargentos, os Fur Mil Condeço, Fausto, Arménio e o barman Cabo Valadares".


Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Vila > Álbum fotográfico do Victor Condeço > Foto 38 > "Na rua frente ao Bar Catió, os conterrâneos Furriel Pára-quedista Josué e Fur Mil Condeço".




Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Vila > Álbum fotográfico do Victor Condeço > Foto 37 > "Furriel Pára-quedista  Josué e Fur Mil Condeço, conterrâneos, no interior do Bar Catió".



Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Vila > Álbum fotográfico do Victor Condeço > Foto 21 >  "Fur Mil Victor Condeço em frente da habitação do administrador,  ao cimo da avenida".



Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Vila > Álbum fotográfico do Victor Condeço > Foto 11 > "Victor Condeço tendo por fundo a Rotunda e o início de uma rua".
 
 
 

Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Vila > Álbum fotográfico do Victor Condeço > Foto 8 > No centro da Rotunda, da esquerda para a direiuta, tyrês furriéis miliciano, o primeiro, de cujo nome não me lembro,  o Cabrita Gonçalves e  oV. Condeço, com casas tipicamente coloniais por fundo"

   
 
Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Porto Interior > Álbum fotográfico do Victor Condeço > Foto 8 >" Porto interior de Catió no rio Cadime, em dia de reabastecimentos. Em primeiro plano o Fur Mil Condeço em passeio Dominical, no porão o Sarg Dias e outros trabalhavam".
 
 
 
Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Porto Interior > Álbum fotográfico do Victor Condeço > Foto 7 > "O porto interior de Catió.,  no rio Cadime, fazia parte dos nossos passeios de Domingo".
 
 
 

Guiné > Região de Tombali > Catió > CCS / BART 1913 (1967/69) > Porto Exterior > Álbum fotográfico do Victor Condeço>  Foto 2 >  "Lancha de Fiscalização Canopus no porto exterior de Catió,  no rio Cagopere,  afluente do Cobade. Da esquerda para direita no cais, o Fur Mil Machado, o civil sr. Barros e o filho, o Fur Mil Victor Condeço, e o Fur Mil Viriato Dias; em cima o Fur Mil Mendonça, um marinheiro africano e o Comandante da lancha".
 
Fotos (e legendas): © Victor Condeço (2010). Direitos reservados.
 
 
1. Queridos amigos e camaradas da Guiné 

A fatal e temível notícia chegou... O Victor morreu, ontem à noite, no mesmo dia em que também morre outro grande ribatejano e português, o escritor José Saramago (1922-2010). Daqui, neste espaço que também era dele, faço chegar à família do Victor (acho que a malta de Catió o tratava, com toda a ternura, por Vitinho) a manifestação da nossa tristeza mas também da nossa solidariedade, enquanto seus camaradas da Guiné.

O funeral é amanhã, no Entroncamento. O corpo está em câmara arte na Igreja da Sagrada Família, perto da sua casa. Foi a informação que me deu o genro, esta manhã, quando estava fora de Lisboa. Já pedi ao Benito Neves, seu grande amigo, que me represente a mimm aos demais editores e demais membros do blogue, no caso dele (que mora em Abrantes) se deslocar amanhã ao Entroncamento.

Não conheci pessoalmente o Victor. Falei com ele, ao telefone, algumas vezes. A última, na véspera do início do seu tratamento no IPO... Foi tudo tão rápido, brutal...

Publiquei muitas coisas dele, nomeadamente as suas belíssimas fotos  de Catió, meticulosamente legendadas...Ainda tenho materiais dele. Vamos pedir, no dia 26, em Monte Real, no nosso V Encontro Nacional, um minuto de silêncio por ele e por outros camaradas que este ano nos deixaram...

O Victor começou a ter sintomas da doença que o vitimou, a partir de Fevereiro. Lúcido e corajoso, sabia o que tinha, em mail de 10 de Maio em que falava das suas diligências para encontrar o hipotético irmão da Marisa Tavares.... A última vez que falei com ele, foi justamente no início deste mês. Estava apreensivo e ansioso, ia começar no dia seguinte o tratamento de radioterapia no IPO... Tarde de mais...

Era uma homem discreto, afável e prestável, que colaborou connosco de diversas maneiras: disponibilizando fotos de Catió; fornecendo elementos sobre a família Brandão, em resposta a um pedido da nossa amiga Brandão; ajudando guineenses da diaáspora, filhos de Catió, como o Suleimane Silá;  desejando-os as Boas festas de Natal e Ano Novo mas também mais recentemente, respondendo amavelmente às dúvidas e inquietações da Marisa Tavares, filha do Júlio da Silva Tavares, o Madragoa. 

 Ontem, às 23h33, o Benito Neves preparava-nos para o pior (não fazendo já referências a outras mensagens que ele pediu para não publicar):
 
Na sequência do mail que vos enviei na passada 4ª. feira, informo que, ainda naquele dia, o Victor foi transferido do Hospital de Abrantes para o Hospital de Torres Novas (mais perto da sua residência), onde ainda se encontra internado.

O seu estado de saúde foi reavaliado. Face ao resultado de exames feitos e após uma reunião entre cirurgião, anestesista e cardiologista, ontem, pelas 23H00, foi comunicado à filha que a medicina nada podia fazer. A doença tem progredido com uma velocidade quase inacreditável e, portanto, o seu estado é de cada vez pior.


Há que aguardar, agora, que o tempo se esgote e que, se Deus existe, que o poupe a um maior sofrimento.


Apesar dos avanços da ciência, é revoltante sabermos a impotência que existe para combater estas situações, mas a vida é assim, de quando em vez prega-nos umas partidas.


Para quem é católico apenas resta rezar.
Um abraço
BNeves

Vinte e cinco minutos, às 23h59, dava-nos a fatal notíca:

Acabo de receber a notícia já esperada e não desejada: O Victor Condeço deixou-nos! Paz à
sua alma. Os amigos ficam mais pobres, mas recordá-lo-sempre.

Fiz questão de dizer ao Benito:

Tu foste mais do que um excepcional amigo e camarada, foste também um grande irmão. Acompanhaste o Victor no doloroso processo da sua doença. Temos para contigo uma dívida de gratidão. Obrigado, amigo, camarada e irmão. Luís

O Victor estava connosco desde Dezembro de 2006, mas descobriu o blogue em Março desse ano (*).

Para a família (a esposa, a filha, o genro e as netas) deixo aqui a expressão do nosso grande apreço pelo Victor e o nosso grande pesar pela sua morte prematura. Peço licença ao Juvenal Amado para dedicar à família um belíssimo poema que ele escreveu a propósito camarada que morreu em combate, na flor da idade, deixando uma viúva e uma filha que ele nunca conheceu. As circunstâncias não importam, a morte em qualquer idade é sempre uma perda irreparável e causa-nos um atroz sofrimentom, aos que cá ficam e têm que fazer o luto.
 
2. SÓ DEUS TEM OS QUE MAIS GOSTA (**)
por Juvenal Amado

O vazio que ficou,
A dor que nos atingiu,
Vão transformar-se em ausência
E mais tarde saudade.

O calor, o suor,
O cheiro adocicado do sangue e carne queimada
Não nos largarão mais.
As bocas abertas falam, mas ninguém ouve.
Os gritos estão presos na garganta,
As lágrimas ameaçam soltar-se e cair em cascatas,
Abrindo sulcos entre o pó acumulado nos rostos.

Se pudéssemos,
Voltaríamos atrás uns breves minutos,
Alteraríamos o rumo da história.
O calor que nunca nos dá descanso.
O que não daríamos para poder escolher,
Escolhermos outro caminho,
Não fazermos da mesma forma.

As mãos estão negras
Em volta dos punhos das armas.
O silêncio é opressivo,
De nada vale tentar ouvir
Se até a natureza se calou
Perante a violência,
De que só o homem é capaz.

Ali jazem sonhos anseios futuros aguardados.
As últimas cartas ainda queimam no bolso,
Não vai haver resposta.
Os rostos jovens nas fotos nunca vão envelhecer.
O tempo passará para todos,
Menos para quem está naquelas fotos.

O que somos
Será sempre reflexo das nossas vivências passadas?
Há quem defenda que é um Carma.
Viemos completar com a passagem por esta vida,
Mais um elo para a nossa eternidade
Ou vida melhor noutra dimensão.
Aquele é o filho de...
Marido de...
O pai de...

Alguém escreveu que o que separa a Paz e a Guerra
São os enterros.
Em Paz os filhos enterram os pais...
Em Guerra os pais enterram os filhos...
Invertem-se assim os valores,
Tidos como certos pela ordem natural das coisas.
Como diz a canção,
«Só Deus tem os que mais gosta».
Que este pensamento minimize a dor de todos
Os que  viram partir os seus na flor da idade.

Juvenal Amado

[Fixação / revisão de texto: L.G.]

3. Comentário de L.G. a este belíssimo texto poético do Juvenal Amado:

A todos os camaradas e amigos que perderam alguém querido, no contexto ou não da guerra colonial, e a propósito de "luto": a palavra quer dizer isso mesmo, "dor pela perda de alguém que nos é/era querido" (mas também por animal de estimação, ou um objecto que tem um grande simbolismo, carga afectiva, para nós: por exemplo, a casa da infância)... "Fazer o luto" é literalmente passar pela dor, para além da dor...

Em condições normais, fazemos (quase todos nós) esse processo de luto, que é doloroso, mas que temos de fazer...Há o suporte social (o apoio da família e dos amigos, dos vizinhos, da comunidade) é fundamental... Mas também há "terapias" que nos podem ajudar: umas delas é a "blogoterapia" que utilizamos aqui, no nosso blogue.

Verbalizamos, exteriorizamos, partilhamos os nossos sentimentos, contamos e recontamos as nossas histórias de dor e de luto, sentimos as palavras, dizemo-las em voz alta (ou pomo-las em letra de forma)...

Obrigado ao Juvenal Amado por este belíssimo texto, que deve ser lido em voz alta... Faz-nos bem, faz bem todos os camaradas e amigos que têm (ou tiveram) dificuldade em "fazer o luto", pela perda de alguém, na guerra ou noutro contexto...

Aconselho a visita uma sítio na Net, que conheço há anos, e que foi criado para dar apoio aos pais que perderam os seus filhos: A NOSSA ÂNCORA - Apoio a pais em luto
http://www.anossaancora.org/

Quem são as pessoas que estão por detrás desta iniciativa ? Pais que perderam os seus filhos: "O número vertiginosamente crescente e assustador de jovens que anualmente perdem a vida no nosso país (cerca de 5.000 dos 0 aos 30 anos), por razões de ordem vária, deixa as famílias que sofrem tal perda totalmente destroçadas" (...)

Vale a pena fazer uma visita a este sítio e explorar os recursos que disponibiliza...

Sábado, Abril 18, 2009.
_____________

Notas de L.G.:


(*) Vd. poste de 3 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1335: Um mecânico de armamento para a nossa companhia (Victor Condeço, CCS/BART 1913, Catió)

(...) Sou assíduo frequentador desde Março de 2006, altura em que, procurando por mapas da Guiné, me deparei com este excelente sítio. Raro é o dia que o não visite, já li também a grande maioria dos postes mais antigos, onde recordei ou fiquei sabendo de acontecimentos que já não lembrava ou nunca soubera.


[...] Sou um velho combatente (63 anos feitos ontem, dia 18 de Novembro), estou aposentado, meu nome é Victor Manuel da Silva Condeço, ex-Furriel Miliciano 00698264, do Serviço de Material – Mecânico de Armamento e, por isso mesmo, sem grandes histórias de guerra para contar. Este blogue teve a virtude de me despertar recordações, umas boas, outras menos boas, mas que nem por isso deixam de ser uma forma de reviver um passado de há quase quarenta anos.

Participei na Guerra da Guiné por obrigação, como aliás quase todos nós, desde 1 de Maio de 1967 a 3 de Março de 1969, fazendo parte da CCS do BART 1913 que era constituído também pelas CART 1687 (Cachil e Cufar), CART 1688 (Bissau e Biambi) e CART 1689 (Fá, Catió, Cabedú e Canquelifá).

Estive na região do Tombali na Vila de Catió, Comando de Sector, pertencente ao Comando de Agrupamento de Sectores de Bolama. As unidades deste sector eram: Bedanda, Cabedú, Cachil (i), Cufar e o destacamento de Ganjola (i), por todas passei em serviço.

Desembarquei em Catió a 2 de Maio de 1967, os vinte e um meses de comissão foram aqui cumpridos, até 20 de Fevereiro de 1969, data em que regressei a Bissau. (...)

(**) 18 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4207: In Memoriam (20): Para o António Ferreira e demais camaradas mortos no Quirafo (Juvenal Amado)

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Guiné 63/74 - P6615: Depois da Guiné, à procura de mim (J. Mexia Alves) (6): Sem Título 3





1. Em mensagem do dia 17 de Junho de 2010, o nosso camarada Joaquim Mexia Alves*, ex-Alf Mil Op Esp/RANGER da CART 3492, (Xitole/Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52, (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), 1971/73, enviou-nos mais um "Sem Título" para a sua série "20 Anos depois da Guiné, à procura de mim".





DEPOIS DA GUINÉ, À PROCURA DE MIM

20 ANOS DEPOIS (6)

SEM TÍTULO 3


Mas eu não pedi nada a ninguém,
Nem a vida, nem o estar aqui,
Nem esta dor que me alcança todos os dias,
Desta vida sem sentido.
Não pedi esta ânsia
Que não me deixa dormir
O sono dos satisfeitos.
Não pedi esta paixão
Por uma vida a querer morrer.
Não pedi ao menos sequer
Esta estranha maneira de ser.
Não pedi este desespero
De viver, sem ter vivido.
Mas deram-me tudo
Sem nada ter pedido.
Obrigaram-me a viver
A suportar-me
E até a gostar de mim.
Fizeram-me sentir
O que nunca devia ter sentido.
Fizeram-me olhar e gostar
De quem nunca devia ter gostado.
Fizeram-me acreditar
Que um dia alcançaria
Aquilo que é impossível.
Fizeram-me viver cada dia
Na esperança de ser amanhã.
Esgotaram-me a esperança,
A vida, o amor,
Abriram-me o peito dorido
E nele plantaram a flor
Do horror do dia a dia.
Deram-me até às vezes,
E só para me enganar,
Momentos de alegria.
Estou morto e ninguém sabe!
Pensam que ainda falo,
Mas já não sou eu a falar.
Pensam que ainda olho,
Mas já não sou eu a olhar.
Pensam que ainda rio,
Mas não me apetece já rir.
Pensam que ainda choro,
Mas já não posso chorar.
Querem-me aqui e agora,
Agarram-me, prendem-me,
Suplicam-me o meu martírio
Mas eu já me fui embora…

92.01.21

Um abraço amigo
Joaquim
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 10 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6574: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (1) (Inácio Silva / Joaquim Mexia Alves)

Vd. último poste da série de 10 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6572: Depois da Guiné, à procura de mim (J. Mexia Alves) (5): Sem Título 2

Guiné 63/74 - P6614: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (3): Gente de Cacoca e outros

1. Mensagem de António José Pereira da Costa*, Coronel, que foi comandante da CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/74, com data de 16 de Junho de 2010:

Camarada
Aqui, em anexo, encontrarás a minha terceira tentativa de colaboração. Espero que gostes...

Seguem tambem três fotos para anexares. São duas da Ami - a menina de quem falo - e uma da malta da companhia num dia em que o caçador matou um pangolim. Um espécie de animal pré-histórico que come formigas.

Um Ab. do
António Costa



A Minha Guerra a Petróleo (3)

Gente de Cacoca e Outros


Em 1968, Cacoca era um daqueles lugares onde parecia não haver guerra. Dependente da Companhia sediada em Sangonhá, era um destacamento de nível GCOMB, resumindo-se a uma pequena tabanca com pouco mais de duzentos habitantes. O quartel era um pequeno recinto, quase um quintal, com uma vivenda de alvenaria, tipo colonial, ao centro. Nessa vivenda tinha funcionado uma daquelas lojas que só existiam ou ainda existem em África. Um daqueles estabelecimentos onde era possível comprar livros do Erskine Caldwel ou pregos de meia-galeota; garrafas de vinho verde ou pilhas para lanterna; panos com que as mulheres se cobriam ou tabaco americano que não se encontrava em Lisboa, enfim tudo ou quase tudo...

A loja ou “cantina” pertencera a um comerciante europeu a quem chamavam o Toneca e que, naquela altura, já só tinha estabelecimento em Cacine, onde vivia sem família, encarnando a figura do “lançado” no sertão. Tinha tido mais uma loja em Sangonhá, da qual se desfizera, e outra em Campeane que fora saqueada, logo no início da guerra. O Toneca era um homem só, longe dos seus que, ao que parece, andavam ali por Leiria. Aviava-nos com uma lenta eficácia, desencantando o que lhe pedíamos nas prateleiras junto ao tecto, ou no mais recôndito da arrecadação. Raramente falhava. À noite, a loja era um misto de tasca e café, onde se podia “meter uns copos”, ao balcão, ou tomar ar, em duas ou três mesas colocadas no alpendre. Um daqueles alpendres elevados e altos, tão frequentes, circundando as casas de um só piso. Assim teria sido também a loja de Cacoca que agora era uma instalação multiusos, misto de alojamento para pessoal, posto de socorros, posto de rádio, talvez depósito de géneros... etc., etc... e etc...

Não tenho memória de que tenha sido atacada com armas pesadas ou “ao arame”, com armas ligeiras, embora se situasse a cerca de 2km da fronteira. Nunca mais esquecerei o meu primeiro contacto com essa casa onde, quando entrei para falar com o alferes que comandava o destacamento, se ouvia, num gira-discos a pilhas, o Gianny Morandi a cantar (bem alto) o “Non son degno di te”. A “máquina de fazer barulho” pertencia ao cabo maqueiro que, momentos depois discorria, em voz bastante alta, sobre “Os Operacionais”, como ele, versus os “CêCê-Ésses”, que eram os outros. Via-se claramente que era um operacional pelo modo expedito como remendara um rasgão enorme nos fundilhos das calças do camuflado, recorrendo a um emplastro de adesivo daqueles com orifícios circulares, para a pele respirar... Expedientes de campanha ou o velho “desenrascanço dos portugueses” sempre presente aqui, ali ou em qualquer outro lado.

Quem viesse de Cacine, ao chegar ao “Cruzamento”, virava à direita e seguia paralelamente a uma pista de aterragem de terra batida (pouco operativa, na altura). O terreno era aberto e deixava ver, ao longe, a vivenda, emergindo da tabanca, cujos telhados de capim e cibe formavam uma espécie de arranjo floral de plantas secas à volta de uma flor ainda com viço. À direita e à esquerda a vegetação era densa, com todos os tons do espectro do verde, mas onde surgiam outros tons: de cinzento, de castanho e – para quem olhasse com vagar e detalhe – em salpicos mal semeados, de vermelho e amarelo.

A CArt 1692, à qual eu agora pertencia, guarnecia Cacine, mas antes tinha andado pelo sector de Sangonhá e Cacoca, e o Duarte – alferes da minha companhia, ex-seminarista como outros houve – assegurava que por ali era possível caçar pombos verdes e outras bichezas comestíveis que se manifestavam com certa abundância. A população de Cacoca dava-se bem com os soldados e parecia haver uma certa amizade entre os jovens militares e os habitantes, independentemente das suas idades. Fiquei com a ideia de que a população colaborava na vivência da tropa de modo espontâneo e franco. A actividade operacional resumia-se a garantir a possibilidade de comunicar com a sede da Companhia.

Malta da CART 1692 segura um pangolim abatido

A chegada do General Spínola à Guiné alterou profundamente a condução da guerra e as visitas que realizou a todos os aquartelamentos, por diminutos que fossem, ouvindo os “residentes”, como nunca tinham sido ouvidos, causaram boa impressão, embora constituíssem, para quem expunha os problemas, como que uma espécie de exame prático das soluções adoptadas.

Havia chegado há pouco tempo quando foi a Cacine e eu assisti a uma conversa com o capitão Veiga da Fonseca em que pretendeu saber, naquele sector, quais as posições que deveriam ser abandonadas, se pretendesse recuperar tropa “de quadrícula” para dispor de mais unidades “de intervenção”. O nosso Batalhão – o BArt 1896 – tinha, então, seis Companhias no terreno – Cacine e Cameconde, Sangonhá e Cacoca, Gadamael e Ganturé, Guileje, Mejo e Gadembel e Ponte do Balana (acabados de construir) – e, obviamente, a CCS sediada em Buba. O capitão respondeu-lhe que, para não perder o controlo da estrada para Guileje e depois Mejo, não deveria abandonar nenhuma posição, mas se a ideia era aquela, então que abandonasse Cacoca e Sangonhá. A decisão veio alguns dias depois e passámos a “fazer sector” com a unidade de Gadamael. Os quartéis de Cacoca e Sangonhá foram simplesmente abandonados e a população aceitou bem a decisão (pareceu-me, pelo menos,) e repartiu-se, segundo as suas afinidades e desejos, entre Gadamael e Cacine, o que levou à realização de mais de 30 colunas em 20 dias, com as viaturas ajoujadas de carga e passageiros. Transportámos tudo o que se podia mover. Com os homens, mulheres e crianças, seguiram as mobílias, as roupas e os alimentos, os animais domésticos e até os telhados das casas (capim e as rachas de cibe). Uma autêntica migração realizada prioritariamente para Cacine, onde havia mais recursos, espaço e melhor protecção contra as actividades dos guerrilheiros.

Num daqueles dias, a coluna estava a organizar-se em Cacoca. As viaturas, colocadas paralelamente à pista e já viradas para rolarem em direcção ao “cruzamento”. Por cima das bagagens amontoadas nas caixas de carga, as famílias procuravam concentrar-se e instalar-se o mais comodamente que fosse possível. Quando já não houvesse mais ninguém para subir para as viaturas de carga, eu daria o sinal de partida. Naqueles últimos minutos, distraía-me a olhar a paisagem, à qual um dia sem sol parecia querer diminuir a beleza. A atmosfera, húmida e carregada de tons de cinzento, deixava prever que a chuva tropical não tardaria a chegar. Estávamos sentenciados a chegar a Cacine encharcados, mesmo que nos apressássemos a partir. Senti, então, um toque no braço. Quando me virei para ver quem era, ela disse:

- Meimuna, pariu um fio qui tin dez dia. Quer pa nossalfere arranja mim lugar sintada.

Transportava nos braços, com grande cuidado, um enrolamento de mantas que deveria conter qualquer coisa de precioso. Eu não vi o que fosse, mesmo quando mo emprestou, por alguns segundos. Acompanhei-a ao Unimog onde eu iria e ajudei-a a subir para o lugar ao lado do condutor. Encostei o embrulho ao peito e ela apoiou-se com dificuldade naquela espécie de degrau circular que a roda da viatura tinha, depois no próprio pneu, usando o meu ombro como corrimão. Sentou-se no banco de lona e eu passei-lhe o pacote que deixou calor no meu peito. Ali perto, um grupo de homens – dos grandes – assistiu à cena e eu, ainda hoje, rendo homenagem àquela mulher que fez valer os seus direitos de mãe, mesmo sem o apoio daquele grupo de “respeitáveis”.

Fiz a coluna em pé entre a Meimuna e o “Alcochete” o condutor. Nesse dia choveu bastante durante o percurso e chegámos a Cacine molhados “até aos ossos”. Vim depois a saber que era a mulher de Alfa Bá, caçador muito hábil, que abastecia de carnes a CArt 1692.

Pertenciam a uma família curiosa, em parte já residente em Cacine. Eram voluntariosos e activos, mas não se empregavam em nenhuma actividade relacionada com a guerra. A essa família estava também ligado o ferreiro de Cacoca. Era um hemiplégico. Arrastava-se pelo chão, vestindo uma espécie de calções de cabedal donde lhe emergiam as pernas finíssimas, e sentado numa almofada também de cabedal. Da cintura para cima tinha o físico clássico de um ferreiro. À sua volta, funcionalmente dispersas pelo chão, as ferramentas de que necessitava e a fornalha engenhosamente montada no chão. Assim podia acendê-la, atiçá-la e alimentá-la, quando necessário, graças a um fole também apoiado no solo. A bigorna estava cravada no chão, a pouco mais de um palmo de altura e nem abanava quando a utilizava. Aquele homem era um exemplo de tenacidade. Lembro-me de o ver a trabalhar sob um telheiro de colmo e, o que mais me admirava era a certeza dos seus movimentos, que eu não supunha possíveis para quem trabalhava numas condições tão invulgares. Contudo, a adaptação das ferramentas que utilizava à sua condição deficiente – como hoje diríamos – não ia muito além dos cabos dos malhos que eram um pouco maiores do que o habitual.

A essa família pertencia um alfaiate já residente em Cacine, antes da “migração de Cacoca” cuja mulher tinha uma profissão muito vulgar, naquele tempo: lavadeira da tropa. Sei de casos em que esta profissão de tempo de guerra foi considerada uma forma de colaboracionismo. É discutível e jamais alguém conseguirá dizer onde termina a simples luta pelo pão-de-cada-dia (e mais ainda em tempo de crise ou guerra) e onde começa e o que era, naquelas circunstâncias, o colaboracionismo. E muito mais “numa luta em que uma parte da população enfrenta as autoridades de direito ou de facto constituídas”. O marido sofreu um contratempo grave e não sei que marcas lhe terá deixado. Por volta de Março ou Abril de 1968, começámos a abrir à esquerda da estrada, como quem vai para Cameconde, uma área desmatada, com cerca de 50 metros de largura destinada a evitar que o inimigo conseguisse instalar-se a curta distância da estrada. Já tinha havido e voltou a haver, depois da nossa saída, emboscadas às colunas que iam de Cacine a Cameconde. Aqueles 8 quilómetros de estrada eram diariamente percorridos: todas as manhãs e nos dois sentidos, por um pelotão de milícia, e pela coluna auto que saía e retornava a Cacine, sem horários marcados. A população colaborava diariamente, com mais ou menos vontade, nos trabalhos de desmatação com o objectivo de criar uma área de terreno cultivável e sob a vigilância de um grupo de combate, lá ia, formada em linha, cortando e abatendo tudo o que fosse vegetação. Num desses dias de trabalho, o alfaiate afastou-se do grupo de capinadores e, sem dizer nada a ninguém, internou-se no mato. Tanto bastou para que o “Lameiras” lhe caísse em cima e o prendesse por suspeita de ir contactar com alguém. Em vão protestou que apenas ia ariau u cauça (arriar as calças) mas, de pouco lhe valeu. As coisas teriam ficado por ali não fosse a presença em Cacine de um inspector da PIDE que, no terreno, pretendia colher informações que pudessem orientar as acções da 5.ª de Comandos e da CArt na tentativa de combater o inimigo. É que, nesse tempo – passados cinco anos sobre o início da guerra – e naquela zona, os campos já estavam divididos e quem apoiava o PAIGC, mesmo residindo em Cacine, fazia-o platonicamente ou de um modo muito clandestino e quem preferia a tropa já renunciara a contactos mesmo com os amigos ou conhecidos que tinham optado de modo diferente. Por conseguinte, era muito complicado obter informações. O inspector tinha muito tempo de África e, ao que parece, vinha de S. Tomé, o que não era um cartão de visita muito abonatório. Num grupo de cinco militares onde me inclui, fomos, um dia à tarde prender o alfaiate. Fiquei no exterior da casa atento a uma possível fuga, dele ou de alguém que com ele estivesse, enquanto três entravam e o outro passava para as traseiras. Enfim, tudo como mandavam os livros. Estava concentrado no que se ia passando e, subitamente ouvi uma restolhada, como se alguém mexesse em palhas. Virei-me e apontei a arma na direcção do ruído. Era uma criança que arrastava uma esteira. Uma menina linda que não devia ter mais de quatro anos. A partir daí ficou a temer-me e não o escondia, mesmo quando eu falava com alguém da família dela, quer fosse o alfaiate, a mulher dele, o Alfa ou outra pessoa. Era a Ami Silá de quem guardo uma fotografia e que nunca me perdoou a arma que lhe apontei.

A pequena Ami Silá

O alfaiate foi interrogado pelo PIDE e torturado no posto administrativo, quase em público, com um cipaio que lhe dava reguadas nas mãos com uma “menina-de-cinco-olhos”, como havia nas escolas desse tempo, mas esta tinha uns dois centímetros de espessura. Depois ficava de mãos no ar enquanto respondia às perguntas que lhe eram feitas. Não tinha grande coisa ou nada mesmo a dizer. Por isso voltava a apanhar e a ficar com as mãos no ar. Os resultados foram desanimadores e o homem da PIDE acabou por desistir. Terá continuado as suas investigações por outras vias e acabou por fazer uma descoberta sensacional e que surpreendeu toda a gente: o bazookeiro do 4.º Pelotão negociava em fotografias pornográficas. Quem diria?

O mais insólito sucedeu no dia em que fomos atacados da ponta Cabascane. Devido às suas luzes, Cacine referenciava-se bem de longe e os serventes do PAIGC estavam inspirados, naquele fim de tarde. Por isso, algumas morteiradas caíram dentro do quartel. A flagelação teve lugar imediatamente antes do jantar, na altura em que, na varanda da vivenda que servia de messe, estávamos a apanhar fresco e beber um aperitivo. Cada um fugiu para o seu sítio e o gravador Akai do capitão continuou a tocar indiferente à flagelação. Era um gravador de fitas, com duas colunas grandes que davam um som óptimo (para o tempo). A mesa onde comíamos estava colocada a um canto da casa (um sítio bastante seguro) e o PIDE, sem lugar definido em caso de ataque, acabou por entrar em casa e esconder-se debaixo da mesa. Dali gritava para que alguém lhe “apagasse a música”. Porém, ninguém voltou atrás para essa tarefa. Depois do ataque, ao jantar, explicava que “não se deve brincar com a providência” e que aquela música, no meio das explosões, o enervara sobremaneira. Daí a sua respiração ainda resfolegante...

As casas para a população de Cacoca e Sangonhá foram construídas, na área da antiga “Missão do Sono”, então desactivada pela erradicação da doença. O auxílio muito empenhado do pessoal da companhia foi essencial e foi a primeira vez que vi casas cuja construção começou pelo telhado. Tudo começava com a construção de uma estrutura que suportava o telhado. Depois, este ia sendo construído e coberto de capim. Por fim, eram as paredes que resultavam de um espécie de rede de paus mais curtos e espetados no solo que faziam ângulos de rectos com outros mais compridos dispostos na horizontal. No recticulado que assim se formava iam sendo colocadas, pela face interior, “chapadas” de lama que, secando, iam constituindo as paredes das habitações**.


O quartel de Cacoca ficou incluído no nosso sector e, de vez em quando íamos para aqueles lados. Até para que o In não o tomasse como seu. Como era um ponto bem marcado no terreno e observável desde “o cruzamento” utilizámo-lo uma vez numa regulação de precisão de fogos de artilharia, com observação terrestre. Como observador avançado, instalado numa árvore, eu ia transmitindo as observações e tinha ordem para suspender o tiro logo que fossem visíveis efeitos no alvo. Assim ao primeiro tiro que atingiu o objectivo, dei a regulação por terminada. Não sei como é que a guerra continuou a passar por ali, mas já vi o estado da região, no “google”, e fico feliz por aquela terra ter voltado a ser ocupada.

Que será feito da “cantina” do Toneca?
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 24 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6462: Humor de caserna (19): Nha Carlota, uma mulher de armas (António J. Pereira da Costa)

(**) Vd. poste de2 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3013: Reordenamentos (1): Gadamael, o primeiro, na sequência da retirada de Sangonhá e Cacoca em meados de 1968 (António J. Pereira da Costa) 

Vd. último poste da série de 12 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5803: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (2): Os guias e picadores, mandingas, do Xime, Malan e Mancaman: duas maneiras diferentes de ser e de estar na guerra...

Guiné 63/74 - P6613: Patronos e Padroeiros (José Martins) (10): Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra - Nossa Senhora do Sameiro



1. Mensagem de José Marcelino Martins* (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), com data de 15 de Junho de 2010:

Caros Camaradas
Mais um Patrono para a Galeria dos Patronos e Padroeiros.

Um abraço
José Martins




Patronos e Padroeiros - X

Padroeira da A.P.V.G. - Associação Portuguesa de Veteranos de Guerra


Nossa Senhora do Monte Sameiro


D. Sebastião de Matos de Noronha, nascido em 1586, e falecido em Lisboa, na Torre de Belém, enquanto prisioneiro de D. João IV, em 14 de Junho de 1437, à data Arcebispo de Braga, jurou defender o privilégio da Imaculada Conceição da Virgem Nossa Senhora, cujo dogma só viria a ser proclamado em 8 de Dezembro de 1854, por Sua Santidade o Papa Pio IX, beatificado pelo Papa João Paulo II em 3 de Setembro de 2000 [Pio IX nasceu em 13 de Maio de 1792, falecendo em 7 de Fevereiro de 1878. O Cardeal Giovanni Maria Mastai-Ferretti iniciou o pontificado em 16 de Junho de 1846, adoptando o nome de Pio IX].

A primeira pedra do Santuário, construído por iniciativa do Padre Martinho Silva, vigário de Braga, foi lançada no dia 14 de Julho de 1863, no monte Sameiro sobranceiro à cidade de Braga, constituído por uma imagem da padroeira, em mármore, que assentava num amplo quadrado.

Em 10 de Agosto de 1877 é sagrada a Igreja que, um ano mais tarde recebe a imagem de Nossa Senhora do Sameiro, esculpida por Eugénio Maccagnani, escultor italiano.

A construção da cúpula é iniciada em 12 de Julho de 1936 e, cinco anos mais tarde, no mesmo dia, é sagrado o altar da Basílica do Sameiro. O cruzeiro monumental, da autoria do arquitecto David Moreira da Silva foi inaugurado em 7 de Junho de 1953 e, em 13 de Junho do ano seguinte, são inaugurados os monumentos ao Sagrado Coração de Jesus e ao Papa Pio IX. A cripta, construída sob a igreja original, foi inaugurada em 17 de Junho de 1979.

Na visita a Portugal em 1982, Sua Santidade o Papa João Paulo II visita o Santuário do Sameiro onde, dois anos depois, em 3 de Junho, é inaugurada uma estátua ao Sumo Pontífice.

Em 8 de Dezembro de 2004, na comemoração do 150.º aniversário da proclamação do dogma da Imaculada Conceição, o Papa João Paulo II através de um seu delegado do Vaticano distingue o santuário com a Rosa de Ouro.

Nossa Senhora do Sameiro é Padroeira da APVG – Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra e a sua festa foi fixada em 12 de Junho, dia em que S. Pio X coroou oficialmente a imagem de Nossa Senhora da Conceição


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A Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra (A.P.V.G.), com o NIPC 504330330, com sede no Largo das Carvalheiras 52/54, da cidade de Braga, é uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) e foi fundada por escritura pública de 18 de Março de 1999.

É uma Associação que agrega ex-combatentes (Veteranos) da Guerra Colonial de todos os Ramos das Forças Armadas;

Foi reconhecida como pessoa colectiva de utilidade pública de âmbito social e secundariamente de saúde, por despacho de 26/06/2001 publicado no DR III série n.º 160 de 12/07/2001;

Possui actualmente 45.500 associados efectivos, distribuídos por todo o território nacional.

A APVG tem ainda 14 Delegações e 70 Delegados concelhios;
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 12 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 – P6581: Fichas de Unidades (7): Companhia de Artilharia 2673 - CART 2673 (José Martins)

Vd. último poste da série de 7 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6550: Patronos e Padroeiros (José Martins) (9): Força Aérea Portuguesa - Nossa Senhora do Ar

Guiné 63/74 – P6612: Estórias avulsas (89): Guidaje em revolta após Abril (Manuel Marinho)

1. Em mensagem de 15 de Junho de 2010, Manuel Marinho* (ex-1.º Cabo da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4512, Nema/Farim e Binta, 1972/74), dá-nos conta de um momento de tensão em Guidaje, já depois do 25 de Abril, resolvido à custa do regresso da sua Unidade ao local onde jamais pensariam voltar. 





  Guidaje em revolta após Abril


As lacunas que ainda não se conseguem preencher por falta de informação do lado africano, não impedem que envie este texto para se perceber as dificuldades que certas Unidades na Guiné tiveram depois de Abril. 

 Com o tempo já decorrido as situações vividas na altura esbatem-se na memória mas estão muito próximas da realidade vivida então na altura. O que abreviou o texto (tinha apontamentos já feitos de forma dispersa), foi o facto de eu ter acabado a leitura do livro do Amadú Bailo Djaló, em especial a parte por ele descrita pós Abril, fez com que eu resolvesse contar mais este episódio. 

 Em Binta depois do 25 Abril, e esperando o desenrolar das negociações do cessar-fogo, então em discussão e a não saída do aquartelamento em termos operacionais (finais de Maio), o tempo começou a andar muito devagar para quem esperava sair depressa da guerra, mas nós ainda teríamos que por à prova os nossos recursos “diplomáticos”, com os nossos camaradas de armas guineenses para uma saída honrosa para ambas as partes. 

 A estrada que tínhamos andado a construir tinha ficado já muito perto do Cufeu, e nós apenas esperávamos a nossa vez de ir embora. Havia pelo menos acordos tácitos de cessar-fogo, e as armas esperavam a vez de serem entregues, isso não impediu o PAIGC de no dia 8 Maio/74, talvez para nos lembrar que era o 1.º aniversário do começo da ofensiva a Guidaje no ano anterior, de nos enviar umas morteiradas a partir do seu acampamento de Fátima? do lado do K3, quando estávamos a comer, o que implicou que todos os palavrões existentes, fossem gritados para o lado de lá do rio a par de resposta adequada para dizermos que ainda estávamos vivos. 

 Depois da entrega das nossas armas, esperávamos o regresso a Bissau para o embarque para casa, mesmo sabendo que havia Unidades que mais novatas que a nossa Companhia iam mais depressa embora, ou pelo menos seguiam para Bissau, aparentava-se a calma necessária de modo a tudo parecer feliz. 

 Depois da saída da Ccaç 4150 no começo de Julho/74 de Guidaje, um dos nossos GrComb foi deslocado para lá a fim de ajudar a fazer a manutenção do quartel até à entrega do mesmo ao PAIGC, que foi efectuado a 21 de Agosto/74 , uma semana antes de sairmos de Binta para Bissau, o mesmo é dizer que até a “batata quente” nos foi entregue. Ora é sabido que naquela altura havia movimentações por parte de elementos africanos que tinham servido o exército e andavam por vários aquartelamentos a elucidar os seus camaradas e a prevenir situações que estavam a pressentir não serem as adequadas às suas expectativas, quanto ao seu futuro. Viam-se também envolvidos militares dos Comandos Africanos que estavam a alertar os seus companheiros para situações menos claras por parte do PAIGC. 

 Em sentido contrário andavam os comissários políticos do PAIGC a tentarem falar com a tropa nativa e populações, apresentando-se nos quartéis e pedindo aos Comandantes dos mesmos as licenças necessárias para tal fim, propondo encontros bilaterais para abreviar caminho, porque a pressa era muita para ambos os lados. As promessas, (ou acordos ?) então feitas aos nossos camaradas africanos em Guidaje não estavam a ser cumpridas e eles revoltaram-se, tentando fazer valer os seus direitos de combatentes que ainda eram, não querendo fazer a entrega do seu armamento sem as necessárias garantias, e desconfiados do PAIGC, e com razão, como infelizmente se veio a verificar depois da nossa retirada. 

 Em finais de Julho, (ou princípios de Agosto) recebemos ordens para levantar novamente o armamento, para fazer face a uma insubordinação que acontecia em Guidaje, onde o nosso GrComb estava como que refém dos camaradas africanos que estavam relutantes na entrega do seu armamento, face à falta de garantias mínimas que não existiam para eles. A apreensão tomou conta de nosso pessoal, que de imediato quis saber em que consistia a nossa ida a Guidaje, e a nossa recusa terminante em tomarmos alguma medida que pusesse em causa camaradas nossos, o pessoal militar africano de Guidaje teria que resolver o problema já que nada poderíamos fazer, e em nada contribuíramos para a situação criada.

 A operação consistia em se utilizar os meios necessários incluindo a força (confrontação armada?) para que os revoltosos entregassem as suas armas a fim de permitir a entrega pacífica do aquartelamento ao PAIGC. Na fronteira do Senegal estavam forças do PAIGC, atentas ao evoluir da situação, e a pressionar com a sua presença os revoltosos. Lá seguimos mais uma vez para Guidaje, novamente armados e a querer parecer que os ecos de Abril ali não tinham chegado, a minha HK-21 voltou às minhas mãos depois de me ter “despedido” dela, parecia que o “divórcio” amigável não se queria consumar.

Avançamos pela estrada que tinha sido construída e durante a deslocação fomos confrontados com uma viatura militar vinda de Guidaje com dois soldados africanos (Comandos?), a ordem era para não deixar passar ninguém, mas depois da paragem da viatura e de breve diálogo, nada questionaram e voltaram para trás. Estávamos assim numa situação que além de perigosa, não deixava de ser bizarra e irónica, a “alinhar” com o PAIGC para desarmar camaradas africanos que tinham combatido a nosso lado. 

 Ao entrarmos no quartel, somos rodeados de Milícias e Militares da Ccaç 19 que nos insultam e nos culpam pela situação existente, chamando-nos f… da p… e traidores entre outros “mimos”, e muito exaltados culpando-nos da situação existente. Antes de lá irmos já nos tinham alertado para a calma que teríamos de ter para resolver a questão e levar a bom termo com a máxima persuasão possível a questão da entrega do armamento por parte das forças de Guidaje, embora a tensão existente não fosse a mais favorável. 

 Embora o conhecimento mútuo das nossas Ccaç pudesse ajudar, foi complicado e teve que haver muito discernimento, e muitas conversas isoladas com este e aquele mais exaltado, já no interior do quartel, e evitando qualquer sinal de animosidade. Entre as nossas 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4512 e a CCAÇ 19, apenas havia ocorrido um episódio menos agradável entre Grupos de Combate de ambos os lados em Binta depois de uma coluna, mas tinha sido um caso pontual, embora tenso para ambos os lados. É evidente que não se vislumbrava o PAIGC embora eles já tivessem tido encontros bilaterais com a 19.ª CCAÇ, pelo menos a nível superior, mas alguma coisa tinha corrido mal, e nós teríamos de ajudar a sanar o problema, agora era connosco, era caso para citar o velho ditado, quem vier atrás que feche a porta

 Se calhar dá para perceber o meu cepticismo relacionado com as alegrias decorrentes então pela Guiné, uns abraçavam o IN, outros amargavam mesmo depois da paz (podre) alcançada. Não culpo ninguém, (embora tenha a minha opinião que não é para aqui achada) apenas relato factos que poderiam ter tido consequências desastrosas, para militares em final de comissão, com a guerra acabada, e desejosos de regressarem às suas famílias. E também com a força moral para dizer, que para mim as despedidas da Guiné não foram o que eu pessoalmente desejava, e lamento sinceramente, não ser capaz de exprimir alegria quando lembro o que se passou nessa altura. Não sei o que foi tratado a nível superior, mas a deposição das armas por parte da tropa africana existente em Guidaje, foi conseguida, mas fiquei sempre com a triste imagem dum camarada africano perfeitamente fora de si olhando para nós e gritando-nos na cara que éramos traidores. Numa próxima contarei a nossa triste saída de regresso a casa. 

 Um abraço para todos vós Manuel Marinho 

__________ 

 Notas de CV: 


Guiné 63/74 - P6611: Memória dos lugares (83): Mata de Cassum, na região fronteiriça de Susana / Senegal, de triste memória para o pessoal da CCAV 2538, comandada pelo Cap Cav Luís Vilar (Nuno Rubim)


Guiné > Região de Cacheu > Susana > Carta 1/50000 > Pormenor: a mata de Cassum, a norte da estrada Susana - São Domingos, na fronteira com o Senegal.




Excerto do Perintrep nº 08/70, com referência à Op Cassum, e às baixas sofridas pelas NT (CCAV 2538, comandada pelo Cap Cav Luís Rei Vilar).


Infogravuras: © Nuno Rubim (2010). Direitos reservados


1. Mensagem de Nuno Rubim, Cor Art Ref, e especialista em história militar da guerra colonial na Guiné, com data de 14 do corrente:

Caro Luís:

Tendo ido ao blogue ler a última parte do estudo do Cor Morais da Silva (a única que me faltava ), li, como não podia deixar de ser, o poste sobre o desditoso Cap Cav Luís Rei Vilar.

Fui pois procurar no dados que já tenho e passo a facultá-los:

(i) A CCav 2538 pertencia ao BCav 2876, que tem História da Unidade no A.H.M. ( Caixa nº 126 - 2ª Div / 4º Sec ).

(ii) No Perintrep nº 08/70 encontrei menção à operação Cassum, como podes ver pelo anexo.

(iii) Junto também mapa da zona da Mata de Cassum , que se estende para lá da fronteira com o Senegal, retirada da nossa Carta Militar da Guiné, folha de Susana, tendo acrescentado as coordenadas geográficas.


2. Comentário de L.G.:

Obrigado, Nuno. Apesar dos teus afazeres de incansável, dedicado, apaixonado, patriótico e competentíssimo investigador da guerra colonial da Guiné (entre outre outros tópicos da nossa história militar, pouco ou mal conhecidos), ainda tens tempo (e pachorra...) para acompanhares a nossa produção bloguística... Sei que és muito exigente e selectivo, e que nem tudo o que se publica,  te interessa... É normal, todos temos interesses diferentes, embora muitas vezes complementares. Mas mesmo assim consegues estar atento ao essencial.

A morte do teu e nosso camarada Cap Cav Luís Rei Vilar, durante muito encoberta pelo manto diáfano do mistério, da fantasia e da especulação, não é um fait-divers,é mais um - entre muitos - episódios dolorosos desta guerra.

 Segundo o Perintrep (acrónimo de Periodic Intelligence Report, termo  inglês usado pelas forças da NATO), a morte do Comandante da CCAV 2538 dá-se quase três depois de o guia das NT ter accionado uma mina A/P e quando, por volta das 14h30,   se  montava a necessária segurança à evacuação do ferido...Recorde-se que nesse dia o nosso camarada e amigo, Jorge Félix,  Alf Mil Pil Heli AL III, fez um transporte de evacução (TEVS) da zona operacional (ZOPS) de Susana, para Bissau (BS), com 4 aterragens...

A família Vilar vai, seguramente, ficar-te grata pela tua generosidade, disponibilizando ao nosso blogue os elementos informativos que nos ajudam a esclarecer melhor o contexto em que ocorreram as nossas baixas, no decurso da Op Cassum, no dia 18 de Fevereiro de 1970. Ela manda-te uma palavra de reconhecimento e agradecimento.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Guiné 63/74 - P6610: Em busca de... (136): Procuro qualquer contacto do Bernardino Parreira, ex-Fur Mil da CCAV 3365/BCAV 3846, S. Domingos e Bachile


1. O nosso Camarada José Quintino Travassos Romão, que foi Fur Mil At Inf da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, enviou-nos uma mensagem em 15 de Junho de 2010, contendo o seguinte apelo:

À procura de contacto do Bernardino Parreira

Camaradas,

O meu nome é José Quintino Travassos Romão ( ex-Fur Mil At Inf. da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863), e resido actualmente em Vila Real de Santo António.

Estive na Guiné desde Setembro de 1971 a Outubro de 1973, primeiro em Teixeira Pinto e depois na CCAÇ 16, no Bachile.

Vi no blogue uma mensagem enviada pelo camarada Bernardino Parreira, que foi Fur Mil At Inf da CCAV 3365/BCAV 3846, S. Domingos e Bachile) e que assentou praça comigo em Tavira, tendo estado no Bachile na mesma altura que eu.

Há cerca de trinta e sete anos que lhe perdemos o rasto, tanto eu com o Fur Mil João Codeço, residente em Arcos de Valdevez e temos tentado localizá-lo por diversos meios sem qualquer resultado positivo.

Assim, agradecia que o próprio ou alguém que saiba o seu contacto me o enviasse, através do e-mail:

zecaromao@hotmail.com

Eu e o Parreira na parada da CCAÇ 16, no Bachile

Um grande abraço para todos os camaradas,
José Travassos Romão
Fur Mil At Inf da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863
__________
Notas de M.R.:
  • Em nome do Luís Graça e Camaradas da Guiné, aqui deixo o convite ao José Quintino Travassos Romão, para, se for esse o seu desejo, aderir ao nosso batalhão (400 e tal Camaradas), da Tabanca Grande.
  • Em caso afirmativo, apenas terá que cumprir a praxe (habitual para todos os periquito bloguistas), que é o envio de uma foto do tipo passe actual, uma foto do seu tempo da tropa (se a tiver como é óbvio), além dos seus elementos pessoais, posto, unidade, locais por onde andou na Guiné e períodos aproximados da estadia.
  • Óptimo seria se complementasse a sua eventual adesão, com uma das suas estórias da Guiné.

Vd. último poste da série em:

2 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6521: Em busca de... (135): Carlos Miguel (O Fininho), ex-Fur Mil da CCAÇ 5, procura fotos suas do tempo de Guiné (José Corceiro)

Guiné 63/74 - P6609: Controvérsias (87): Nô Pintcha, Vamos P'rá Frente, Guiné-Bissau! (Carlos Silva, membro da ONGD Ajuda Amiga)



Guiné-Bissau > s/d > Amílcar Cabral e a sua mensagem revolucionária, Nô Pintcha  (título posterior de semanário guineense, de informação geral,  fundado em 1975 e dirigido por Simão Abina)... Em crioulo, a expressão "Nô Pintcha" quer dizer Vamos dar um empurrão, vamos para a frente...

Fonte: Sítio Xico Nhoca (com a devida vénia...)


1. Comentário do nosso camarada e amigo Carlos Silva, com data de 4 do corrente, ao poste P6525:

 Já agora, transcrevo do poste anterior, as palavras do Fernando Gouveia, na Guiné, Março de 2010:

"Como tenho vindo a referir ao longo destes relatos, além de muitos guineenses, incluindo antigos guerrilheiros, também este dirigente manifestou a ideia de que com Portugal estariam bem melhor do que na realidade estão."

" Sem qualquer nostalgia pelo colonialismo, que existiu e não se pode branquear, ai tenente coronel Benazol, ai Tangomau, aliás Mário Beja Santos! Abraço. Graça Abreu".

A propósito desta invocação/transcrição que o nosso camarada Graça Abreu faz de parte do Poste 6525 do nosso camarada Fernando Gouveia, sobre relatos que tem vindo a fazer aqui no blogue relativamente à sua viagem em Março que antecedeu uns dias da minha, tenho a dizer com todo o respeito que tenho por ambos meus amigos, que não ponho em causa a frase/afirmação do lamento que ele, Fernando Gouveia, ouviu do tal dirigente com quem conversou.

Lamentações dessas, ouço às milhares, quer na Guiné, ao longo das minhas visitas que faço aquele País irmão, quer aqui em Portugal da boca dos elementos que integram a diáspora guineense, bem como, tenho ouvido da boca de muitos outros, incluindo responsáveis …. Dizer que: (i) Portugal enquanto País ex-colonizador, deveria assumir a administração ou os destinos da Guiné; (ii) a Guiné não se desenvolveu desde a independência; (ii)  regrediu 40 anos, o que significa um atraso de 80 anos no seu desenvolvimento, etc. etc. etc.

Enfim…. Muitas lamentações, que dariam para "escrevinhar muita coisa" mas que não cabe aqui desenvolver nem através de um Poste.

Apenas quero chamar à atenção, que temos de conhecer a realidade guineense, o que me parece, sem ofensa, que a maioria dos bloguistas não conhece.

Que a lamentação invocada/transcrita – lamentações ouvidas – resultam da situação difícil quer económica, social e política, situação real que infelizmente aquele País irmão se encontra e não há meio de sair daquele marasmo.

Mas a Guiné, como significa a expressão "Nô Pintcha", vai dar um salto em frente, vai para a frente, os guineenses têm essa esperança.

Com isto quero dizer e é a minha interpretação e análise da realidade, que a mencionada frase transcrita não traduz uma vontade de ser português, de sentimento ou de nacionalismo português, pois os guineenses assumem-se como tal e querem ser independentes como Nação e País Soberano [Vejam a resposta que deram no conflito político-militar 98/99].

As razões ou fundamentos das lamentações que invocam, resultam apenas da situação sócio-económica em que se encontram, incluindo a maioria dos elementos que adquiriram a nacionalidade portuguesa por naturalização, pois mesmo esses, sentem-se guineenses e não portugueses, e não é/foi o estatuto formal que lhes é/foi concedido que lhes alterou tal sentimento.

Enfim, como acima referi, haveria muito para dizer sobre esta matéria, mas não é esta a sede própria para se discutir esta situação.

Presentemente, se colocassem meios de transporte à disposição dos guinenseses que se encontram na Guiné, para virem para Portugal, ou para outro País desenvolvido, com certeza que a maioria sairia de lá, mas à procura de melhores condições de vida e não por querer abandonar a sua terra.

Com este comentário, também quero reiterar que é necessário conhecer a realidade, concreta deste povo irmão, isto também, para reforçar a ideia, que há dias deixei num Poste em resposta a outra observação relativa à "língua portuguesa estar em perigo na Guiné".

Com um abraço amigo

Carlos Silva
ex-Fur Mil
CCaç 2548/Bat Caç 2879
Farim (1969/71)
Ajuda Amiga

[Fixação / revisão de texto / título: L.G.]

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Guiné 63/74 - P6608: Notas de leitura (124): A Guerra de África, 1961-1974, Volume II, por José Freire Antunes (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso Camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil At Inf, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 11 de Junho de 2010:

Queridos amigos,
Parto para férias, estarei no posto de trabalho no dia 28.
Continuo confiante que ainda há almas generosas dispostas a vasculhar nas estantes o que sobre a literatura da guerra da Guiné ainda não está inventariado no blogue.

Um abraço do
Mário



A Guerra de África, 1961 – 1974, Volume II (conclusão),

Por José Freire Antunes


Beja Santos

Conclui-se hoje a síntese dos depoimentos de determinados protagonistas que podem ajudar a esclarecer a problemática da guerra da Guiné, entre 1963 e 1974.

Não foi levianamente que aqui incluímos Dias Rosas, Ministro das Finanças de Marcelo Caetano. As despesas de guerra foram aumentando progressivamente e chegaram a atingir 40% do Orçamento Geral do Estado. Numa conferência proferida no Instituto de Altos Estudos Militares o ministro fez saber que pelo ritmo que as despesas levavam a situação iria decompor-se em poucos anos. Ele confessa que pediu demissão exactamente por causa de Cahora Bassa e as despesas militares. Diz que foi uma das poucas vozes em Conselho de Ministros favoráveis à negociação com os movimentos de libertação e também contra o esquema de financiamento de Cahora Bassa. Não há infelizmente estudos fidedignos sobre a evolução das despesas militares e muito menos à luz dos acontecimentos gravosos de 1973. A inflação disparou astronomicamente e chegámos a Março de 1974 com dois dígitos gordos. Quem fala em sustentabilidade das despesas militares ilude a argumentação utilizada por Dias Rosas e os factos da crise petrolífera de 1973, desencadeada após a guerra dos 6 dias.

O depoimento de Alípio Tomé Pinto, general do Exército e que foi capitão na Guiné, de 1964 a 1966, é de grande interesse. É um relato de densidade psicológica, fala de adaptação, da construção de aquartelamentos e das razões porque passou a ser conhecido pelo “capitão do quadrado”. É uma história rica de ensinamentos na aprendizagem do relacionamento com as populações da região de Farim.

Hélio Felgas fez duas comissões na Guiné (1963/1965 e 1968/1969). Na primeira comissão o seu sector estendia-se do Atlântico a Farim e Mansoa, num total de 13 mil quilómetros quadrados. Considera que andou a apagar fogos como os bombeiros, diz ele numa carta a Marcelo Caetano. Na segunda comissão, e de novo dirigindo-se a Marcelo Caetano, diz que a situação se tinha vindo a agravar tanto entre Piche e Nova Lamego como na região Xime – Bambadinca. Falando de Bambadinca diz que a região é o cordão umbilical de todo o Leste: “É só pelo rio Geba que se faz todo o reabastecimento do Leste e se processam todas as evacuações, se eles afundam um barco entre Xime e Bambadinca e conseguem cortar a estrada Xime – Bambadinca, colocam-nos numa situação desesperada. Nesta região de Bambadinca o inimigo tem mais de 500 combatentes (e nós cerca de 300)... As populações fulas começam a fugir no Leste e apresar de todo o pulso que tenho nelas são capazes de me fugirem na região de Bambadinca – Bafatá. E como podem os pelotões de milícias lutar contra canhões, morteiros e bazucas só com espingardas Mauser e G3? Tenho tomado as medidas que posso, dispersando as poucas tropas que disponho, de modo a dar às populações e aos pelotões de milícias alguma sensação de segurança. Mas contra centenas de bandoleiros excelentemente armados, que podem fazer estes pequenos efectivos? Morrer, é claro. Mas o pior é que este sacrifício será inútil, visto aumentar o moral do inimigo e desmoralizar ainda mais as populações nossas amigas. Precisamos de socorro imediato. Daqui a dois ou três meses será tarde, pois as populações terão já fugido... Sinceramente desejo que não se repita na Guiné o caso de Goa.

Deixamos sem qualquer comentário as notas da correspondência entre Spínola e Caetano, é um pensamento largamente difundido, não traz qualquer esclarecimento ao que tem sido publicado em dezenas de livros.

O depoimento de Rui Patrício foi de grande importância, era a primeira vez que um membro do governo tornava público que o governo de Marcelo Caetano entrara em negociações com o PAIGC. Diz sem ambiguidades: “Fui defensor das negociações secretas com o PAIGC, que decorreram em Londres, já em 1974. Eu nunca fui partidário de que a derrota militar seria o melhor. É evidente que queria a negociação. Depois procuraremos explicar os princípios, procuraríamos dizer que a Guiné vivia numa situação diferente. Qualquer explicação era possível porque qualquer coisa era melhor do que a derrota militar”.

Compreende-se como estas declarações de negociação sobre o futuro político da Guiné atormentaram e ainda atormentam os saudosistas e as direitas radicais.
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Notas de CV:

(*) Vd. postes de:

9 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6569: Notas de leitura (120): A Guerra de África, 1961-1974, Volume I, por José Freire Antunes (1) (Mário Beja Santos)

11 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6577: Notas de leitura (121): A Guerra de África, 1961-1974, Volume I, por José Freire Antunes (2) (Mário Beja Santos)

14 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6594: Notas de leitura (122): A Guerra de África, 1961-1974, Volume II, por José Freire Antunes (1) (Mário Beja Santos)

Vd. último poste da série de 16 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6600: Notas de leitura (123): O capitão Nemo e Eu, de Álvaro Guerra (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P6607: (Ex)citações (81): Para SEXA Juvenal Amado, a(s) palavra(s) de duas admiradoras (Felismina Costa / Vanessa Amado)

1. Em dia de anos, o comentário de uma admiradora do nosso Juvenal, a Felismina Costa (a nossa madrinha de guerra, de quem ainda não temos uma foto!)(*):

Amigo Juvenal Amado, muito boa-noite!

O AMIGO Carlos Vinhal enviou-me há dias o link para o acesso às suas histórias, que tenho lido com regularidade, e pelas quais o felicito. Cheiram e sabem a autênticas, a vivências que os anos tornam mais reais e valorosas.

Muitas sabem a saudade, sobretudo, aquela sobre o seu pai [ foto à esquerda, o primeiro da esquerda,], que me emocionou, e me trouxe à memória o meu, de quem tenho as melhores recordações e indízíveis saudades: fica sempre em nós aquele sentimento de termos deixado alguma coisa por fazer, como... escrever-lhe uma carta.

Também as minhas, eram dirigidas à minha mãe, que as lia para o pai ouvir, muitas vezes chorando de saudade e emoção... contudo, como é bom recordá-los!

Como é bom falar deles!

Neste espaço de ciberliteratura, aberto e oferecido aos que se interessam, virei procurar as suas notas, bem assim a de quantos se dignarem escrevê-las.

É já um espaço enorme de recordações, história e estórias, que a vossa memória regista, muito embora pese o motivo que o origina.

Os meus parabéns pela vossa capacidade de recordar, pelo vosso altruísmo, pela vossa sensibilidade.

A minha amizade sincera, é minha forma de vos expressar a minha gratidão.

A amiga
Felismina Costa


2. Vanessa Amada > Blogue Não Digas que Sim > 21 de Junho de 2009 > Agradeço em segredo à Tabanca Grande


(Com a devida vénia...)


A palavra é uma arma poderosa, que nos trespassa deixando o corpo mudo, trémulo, mãos suadas de dor ou alegria, injustiça ou reconhecimento, mas raramente indiferença. Arma capaz deixar a nu as fragilidades ou desejos mais profundos de cada um.

Desde criança ouvi da minha mãe: “tens uma língua!”. Esta frase dita vezes sem conta, sempre com o mesmo tom de reprovação que só uma mãe sabe dar, queria dizer que, quando em conflito, as palavras disparadas por mim, eram destinadas a magoar e sabia bem como fazê-lo.

Com os anos, aprendi a ter “mais tento na língua”, (ainda tenho em longo caminho a percorrer), aprendi a moldar o barro das ideias e opiniões em palavras, em jarros e potes entre outros objectos que, sendo da mesma matéria-prima, produzem um efeito muito diferente, de simplesmente atirar o barro em bruto à parede do outro. Ofereço agora com delicadeza, os jarros, os potes com papel de embrulho festivo e deixo que o barro de que são feitos produza o seu efeito.

Tudo isto para dizer que tenho uma anastomose coração-boca, não sustentada pela anatomia, mas funcional até hoje. Abro aqui os esfíncteres e deixo o coração falar com as suas próprias palavras em barro bruto. Aperto os lábios com força, a mão contra o rato do PC, habituada a transpirar na madeira do lápis, um pestanejar mais rápido e frequente que faz as maçãs do rosto corar de calor produzido pelas vossas palavras. Inunda-se o peito de alegria, soltam-se os lábios num sorriso e coro mais um pouco, murmuro entre dentes: Obrigado, com a timidez que me é característica.


Agradeço aqui em segredo, (forma como gosto de expressar o que me vai na alma), por mim e pelo meu pai, as palavras de todos e de cada um em particular.

3. Comentário de L.G.:

Vanessa: A prenda para o ano, para o 61.º aniversário do Papá, tem que ser o já aqui falado livrinho das Estórias do Juvenal Amado... Ele tem um enorme talento para as "short stories", para contar histórias curtas e simples. Ele é um das muitas grandes surpresas desta caixinha mágica que tem sido o nosso blogue. Ele é da melhor-prima de que é feito este povo. Sei que os tempos não são os melhores, para ele, para a família, afinal para todos nós. Mas é nas dificuldades e tormentas que a gente tempera o aço da coragem, da resistência e da grandeza humanas. Ofereço-me para fazer o prefácio. Arranje-se o editor... Um chi-coração para os dois. Um excelente dia (afinal, não é todos os dias que um homem entra para o Clube dos SEXAS, o das Suas Excelências). Luís Graça.

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Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 2 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6096: Meu pai, meu velho, meu camarada (20): Nunca te esqueças de escrever à tua mãe (Juvenal Amado)

(...) “Nunca te esqueças de escrever à tua mãe”. Estas foram as suas últimas palavras quando me abraçou, naquela madrugada fria de Dezembro, à porta de armas do RI 2 em Abrantes.

Assim foi, nunca passei uma semana em que não escrevesse para a minha mãe, no fim mandava beijos e abraços para o meu pai e irmãos. Ele estava lá sempre em segundo plano, mas garantindo que tudo se passava como o previsto.

Era um homem afável com um elevado sentido de humor. Foi Soldado de Artilharia Antiaérea e Defesa de Costa na Trafaria onde prestou serviço à volta de 1946. (...)

(...) A sua morte no dia 13 de Janeiro de 1995 foi o acontecimento mais triste da minha vida e hoje lembrei-me de que nunca lhe escrevi uma carta. (...)


(**) Vd. postes de:

17 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4541: Os Nossos Seres, Saberes e Lazeres (10): Juvenal, como foste nessa de chamar Vanessa à tua menina ? (Luís Graça)

18 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4547: Blogoterapia (108): Pais & filhos (Juvenal Amado / Luís Graça)