O Fur Mil Pestana no Xime
1. Em mensagem do dia 24 de Julho de 2019, o nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art, CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) fala-nos do "Reguila", o 1.º Cabo Cordeiro do 3. Pelotão da 2520.
RECORDAÇÕES DA CART 2520
O FURRIEL PESTANA
José Joaquim Pestana, assim se chamava um dos furriéis do 2.º pelotão da CART 2520 que esteve no Xime. Fez a sua formação como Atirador de Artilharia no 2.º ciclo do 1.º turno de 1968 na Escola Prática de Artilharia de Vendas Novas. Era muito bem disposto e brincalhão e até me chamava de imberbe devido ao meu aspecto jovem em relação à idade que eu tinha. Sabia tocar guitarra e ensinou outros elementos da Companhia a fazê-lo, pelo que normalmente, sempre que as condições permitiam, às noites se organizavam pequenos concertos de música.
Santa Margarida - José Joaquim Pestana é o segundo de pé a partir da esquerda.
Mas, para infelicidade do Pestana, no dia 9 de Março de 1970, a música foi outra. Já de regresso duma operação nas matas do Xime, o inimigo comandado por um "maestro" cubano, monta uma emboscada à CART 2520. A cerca de cinco ou seis quilómetros de distância e no destacamento do Enxalé, ouço o "cantar" das costureirinhas e o som das "baterias", neste caso dos RPG7 e também das nossas G3, que passados alguns minutos se calam.
Peço ao operador de rádio para entrar em contacto com a sede da Companhia e somos informados que a situação é grave, há um morto e vários feridos da parte das nossas tropas. Ao fim de algum tempo ouve-se ao longe o som característico das pás dos hélis, que procedem à evacuação dos nossos feridos para Bissau e outros para o Xime.
Pensando que poderia ser útil, solicito para me virem buscar à margem do Geba oposta ao Xime e assim com mais dois ou três elementos do meu pelotão faço a travessia da bolanha e também da sempre arriscada cambança do rio, ao mínimo percalço poderíamos servir de apetitosa refeição a um qualquer jacaré.
Apressadamente dirijo-me à nossa enfermaria, onde os nossos azougados enfermeiros, comandados pelo Furriel Enfermeiro Costa, fazem o que podem para tratar dos feridos.
Assim que me vê, o Costa diz-me:
- Nascimento, ajuda-me aqui.
Apresso-me a ajudá-lo e o ferido que estava a ser tratado era o Furriel Pestana. Tinha um buraco nas costas onde cabia um punho cerrado. Fiquei impressionado com o ferimento que vi, foi feito o melhor tratamento possível, ou seja o que estava ao alcance dos nossos enfermeiros, tanto o Pestana como alguns dos feridos são de seguida evacuados para Bissau.
Ainda no mesmo dia regressei ao Enxalé consciente de que havia cumprido a minha obrigação. Não mais voltei a ver o camarada Pestana porque ele não mais regressaria à Companhia, recuperou mas ficou com algumas mazelas.
Passados alguns anos, e depois vasculhadas várias listas telefónicas, consigo aceder a um número de telefone que me pareceu ser a do antigo camarada de armas. Depois de discar os números e de ouvir o toque de chamada sou atendido por um familiar, peço que me passem o telefone ao Pestana e depois de me identificar ouço do outro lado da linha num tom de voz verdadeiramente comovida:
- Ah, és tu Nascimento?
Tivemos uma pequena conversa sobre as nossas vivências da Guiné. Desde então ligue-lhe esporadicamente e desabafamos as nossas lamentações.
O Pestana sempre se recusou a comparecer nos convívios que a CART 2520 tem efectuado ao longo dos anos e compreende-se porquê.
Para todos os camaradas da Tabanca Grande um abraço.
José Nascimento
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Nota do editor
Último poste da série de 30 de julho de 2019 > Guiné 61/74 - P20020: Recordações da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) (José Nascimento) (14): "O Reguila"