sábado, 12 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 – P5452: Estórias do Mário Pinto (Mário Gualter Rodrigues Pinto) (30): Sector de Buba-Aldeia formosa - 1º Semestre 1970 (Mário G R Pinto)


1. O nosso Camarada Mário Gualter Rodrigues Pinto, ex-Fur Mil At Art da CART 2519 - "Os Morcegos de Mampatá" (Buba, Aldeia Formosa e Mampatá - 1969/71), enviou-nos a sua 30ª mensagem, em 11 de Dezembro de 2009:

SECTOR DE BUBA-ALDEIA FORMOSA

1.º Semestre de 1970

Janeiro de 1970

Começo do ano de 1970, as NT, estacionadas no terreno, tem constatado pouca actividade por parte do PAIGC. Por esse motivo empenharam-se em obras de melhoramentos das instalações, suas defesas e infra-estruturas.

Registaram-se algumas flagelações do IN em Aldeia Formosa e Mampatá, simplesmente para marcar presença, sem resultados práticos aparentes.

Na coluna do dia 16JAN1970, Buba-Aldeia Formosa, foram detectadas várias minas anti-carro e anti-pessoal, junto a UANE, tendo sido as mesmas levantadas pelas unidades que prestavam segurança à mesma.

As NT, de acordo com informações recebidas do BCAÇ 2892, no dia 21JAN70, foram emboscar a cerca de 1 km de Iero Saldé, com 2 Grupos de Combate da CART 2519, reforçados com Milícias, a fim de interceptar um grupo do IN.

As NT, foram detectadas pelo PAIGC, quando instalavam um dispositivo de intercepção, por 2 elementos do grupo IN, que vinham de Sare Dibane. Foi aberto fogo tendo os 2 elementos sido abatidos e o seu armamento capturado.

As NT deslocaram-se para Sare Dibane, ao encontro do grupo IN para estabelecer contacto, mas o mesmo debandou para norte de Uane. Na impossibilidade de alcançar o IN, foi pedido
fogo de artilharia para a zona onde eles haviam sido detectados.

Na ZA da CCAÇ 2615 e CART 2521, de Aldeia Formosa, no primeiro mês do ano, as actividades do IN foram quase nulas, apesar dos constantes patrulhamentos sobre as ZA.

A seu cargo os vestígios do PAIGC, não se faziam notar na área, no entanto registaram-se alguns ataques aos "Gilas" (nativos que se dedicavam ao contrabando de bens ao longo das fronteiras).

Existiam informações da presença de um bi-grupo do IN, em Mampatá Bicirgo, vindo de Kandiafara com destino a Kasembel.

Em Buba e Nhala, não se verificavam factos de realce na ZA, apesar da constante actividade das NT. O inimigo não foi referenciado nesta zona.


Fevereiro de 1970

Neste período houve alterações ao plano inicial "Galgos Ligeiros", passando o Sector a norte de Sare Dibane-Unal, a pertencer operacionalmente à CCAÇ 2614 e CART 2521.

A actividade do IN continuava a ser fraca, limitando-se a flagelamentos de curta duração aos aquartelamentos de Buba, Mampatá e Aldeia Formosa.

Foram detectadas minas A/C e A/P, na estrada Buba - Aldeia Formosa que foram levantadas pelas NT.

As NT continuaram a emboscar e a patrulhar todo o trilho de Missirã, a sul de Uane, sem encontrar qualquer movimentação do IN neste período.

Foram também referenciados elementos do PAIGC, junto a Contabane e foi efectuado o levantamento de minas, neste Sector, pelas NT.

Março de 1970

Neste mês notou-se um crescimento operacional do IN, com maior actividade no Sector de Contabane, Bungofé e Sare Amadi.

O inimigo concentrou neste Sector 2 bi-grup
os de combate e um grupo de canhões s/recuo.

Foi inaugurada a nova pista de aviação de Aldeia Formosa, com a sua ampliação e o respectivo alcatroamento.

As forças estacionadas em Aldeia Formosa, nomeadamente a CCAÇ 2615, juntamente com a CART 2521, patrulharam e emboscaram os trilhos do Sector de Contabane, tentando conter as infiltrações inimigas, vindas da fronteira evitando a sua fixação em Kansembel.

No dia 20MAR1970, a CCAÇ 2615 foi reforçada com um grupo de combate da CART 2521, tendo sofrido três emboscadas, junto ao Rio Balana no trilho Bungofé, de que resultaram 2 milícias feridos com gravidadeNo corredor de Missirã, notou-se uma fraca actividade do PAIGC, não se registando vestígios dos mesmos, pelas NT. Este Sector passou a estar mais preenchido a Sul de Uane pela CART 2519 e a Norte pelas CCAÇ 2614 e CART 2521.

Neste período registaram-se flagelações de fraca duração em Mampatá, Buba e Chamarra.

Registou-se neste período e após a época das chuvas, o regresso das populações á actividade agrícola de proximidade.

Abril de 1970

O IN neste período diminui as suas acções de penetração, pelo corredor de Missirã e aumentou a sua presença no Sector de Contabane, reforçando os seus contingentes nesta zona, com a vinda de mais um bi-grupo de Kandiafara, um grupo de morteiros e 2 secções de sapadores.

Os ataques a Aldeia Formosa começaram a ser mais constantes e selectivos, marcando com isso forte implantação do IN na Zona.

Foi nomeado para comandante do Batalhão 2832 e do Sector o Ten. Coronel Manuel Agostinho Ferreira (foto ao lado), o célebre “metro e oito”, que viria a dar uma operacionalidade mais vasta às NT nas suas ZA.

Nhala foi reforçada com um grupo de combate da CART 2521 e, juntamente com a CCAÇ 2614, desenvolveram operações de Norte para Sul, entre o Corubal-Uane, deixando todo o Sul de Uane-Nhacubá a cargo da CART 2519.

À CCAÇ 2615, foi dada a missão de fazer segurança afastada, no Sector entre Contabane e Saltinho.

No dia 20ABR1970, a CCAÇ 2615 sofreu uma tremenda emboscada, junto a Sare Amadi, tendo sofrido 2 mortos.

Em 21ABR1970, foi atacada a Tabanca de Patembaló, sendo a mesma socorrida por forças de Aldeia Formosa.

No dia 26ABR1970, o IN atacou pela primeira vez Aldeia Formosa com foguetões de 122mm, tendo sido auto-transportados em viaturas vindas de Kandiafara.

A CART 2519, detectou um novo trilho do IN, no corredor de Missirá, a Norte de Ierosaldé, junto ao rio Tubaboiel, flectindo em direcção a Uane e Sardonha.

A CART 2519 viria a emboscar uma coluna de abastecimento do IN, neste novo trilho capturando material de guerra diverso e provocando, ao IN, 4 mortos confirmados.

Mais tarde Mampatá viria a ser flagelada à distância com fogo de morteiro e RPG 7.

Em Buba, as NT, conheciam uma acalmia aparente, sem guerra. Nos constantes patrulhamentos da CCAÇ 2616 e dos Fuzileiros, ao longo do rio, não havia sinais do IN.

Maio de 1970

Intensificou-se a acção do IN no Sector, as NT desdobraram-se em manobras de acção conjunta, conforme o delineado pelo comando de Aldeia Formosa.

"A fim de assegurar maior eficiência e permitir maior folga, a contra-penetração passou a ser feita por 1 Grupo de Combate de cada Companhia, no período de 24 horas. As CART 2519 e CCAÇ2614, contavam para o efeito com 1 Grupo de Combate da CART 2521 cada uma delas, que foram postos à sua disposição em Aldeia Formosa. Quando desejassem accionar este GC. deviam fazê-lo por MSG, com 24 horas de antecedência, indicando a hora, local da emboscada, dias e coluna. As Companhias podiam conjugar a protecção descontínua com grupos em contra-penetração, anulando todos os anteriores planos de contra-penetração."

Neste período o IN voltaria a reactivar o corredor de Missirã, deslocando para esta Zona efectivos consideráveis para proteger e manter aberto o itinerário de abastecimento para o Sector de Xitole.

Os contactos com o IN, pelas forças no terreno tornaram-se constantes vindo a verificar-se várias baixas em ambos os lados da contenda.

Foram colocadas minas e armadilhas, por tudo quanto era sítio de passagem do IN de Sare Dibane a Uane, criando-se uma Zona tampão pelas companhias no terreno, com permanecendo as mesmas no local 24 horas/dia.

Apesar de todo o nosso dispositivo no terreno, o inimigo continuava a penetrar para o interior, o que levou o Comando de Aldeia Formosa a idealizar e preparara a operação “Danúbio Azul", já aqui descrita no poste P4817.

O objectivo desta operação era encerrar o corredor de Missirã e para o efeito foi desenvolvida numa vasta área, desde Sambasó-Lenquel-Nhacubá, onde a acção desenvolvida foi classificada como “TOP SECRET” e o Sector foi fechado durante um largo período passando a ZI (zona de intervenção) para o COM-CHEFE.

Neste período de tempo, o IN atacou Aldeia Formosa, chegando a ter efectivos no fundo da pista de aviação e só retirando após a reacção das NT, que para o efeito recorreram ao Pel Rec Fox.

Junho de 1970

Neste mês, a acção do IN não se fez sentir a Sul de Samba Sabali, tendo o mesmo procurado outros itinerários, mais a Norte, o que levava a crer às NT que tentaram arranjar trilhos alternativos para efectuarem as suas penetrações.

Foram referenciados novos trilhos do inimigo junto a Colibuia, contornando a Zona minada pelas NT, aquando da operação “Danúbio Azul”.

O inimigo continuava a atacar Aldeia Formosa com insistência e violência, salientando-se os ataques nos dias 3 e 15 deste mês, em que foram usados morteiros de 120 mm e foguetões de 122 mm, transportados em viaturas oriundas da fronteira da Guiné-Konakry.

Nesta acção o IN acionou 2 minas A/C colocadas pelas NT em Sare Amadi, o que originou a destruição de uma das suas viaturas.

No dia 12JUN1970, na nossa coluna realizada entre Buba-Aldeia Formosa, foi accionada uma mina a seguir a Sare Usso, ferindo com gravidade dois elementos da CCAÇ 2615.

Em 30JUN1970, uma numerosa coluna do IN que se deslocava em Uane, foi detectada e atacada pelas CART 2521 e CCAÇ 2614, resultando a apreensão de considerável quantidade de material de guerra ao PAIGC e causando-lhe 5 mortos confirmados no terreno.

2. Secção - 1.º G. Combate

O inimigo nesta acção fugiu para Sul perseguido pelas nossas forças, vindo a cair numa emboscada que a CART 2519 tinha montada no terreno, mais a Sul de Uane, abandonando todo o seu equipamento que tinham conseguido levar e sofreram mais 4 mortos confirmados.

Registou-se neste período um ataque a Mampatá de fraca intensidade e outro a Buba.

Um abraço,
Mário Pinto
Fur Mil At Art

Fotos: © Mário Pinto (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:


Guiné 63/74 - P5451: Parabéns a você (51): Luís Dias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872 (Editores)

1. O nosso camarada Luís Dias*, ex-Alf Mil da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872, Dulombi e Galomaro, 1971/74, completa hoje, dia 12 de Dezembro de 2009, mais um ano de uma vida que ainda tem muito caminho pela frente. Vamos acompanhá-lo nesta jornada, marcando desde já encontro para o próximo ano neste mesmo lugar para o felicitarmos de novo.

Para já, em 2009, vimos desejar-lhe tudo de bom na sua vida, a começar por amor, dinheiro e saúde (pela ordem que mais lhe convier) junto dos seus familiares e amigos, entre os quais nos queremos incluir.



2. Luís Dias está connosco desde Maio de 2008, quando se nos dirigiu assim:

Caro Luís Graça & Camaradas da Guiné:

Dou-lhe os meu parabéns pelo vosso excelente blogue e pela oportunidade que dão aos ex-combatentes da Guiné de poderem confraternizar, trocar ideias e informações sobre momentos tão importantes da sua vida e que passados tantos anos ainda hoje os revivemos com uma certa paixão.

Gostaria de lhe pedir que dessem publicidade ao Blogue da CCAÇ 3491, que esteve no Dulombi e Galomaro, entre Dezembro de 1971 e 9 de Março de 1974 e que é o seguinte: HISTÓRIAS DA GUINÉ 71-74 - A C.CAC 3491-DULOMBI.

Caso o entendam, podem publicar uma das histórias ali contadas e que reproduzo abaixo.

Com os melhores cumprimentos
Luís Dias
Ex-Alf Mil Inf



3. Daí para cá enviou vários trabalhos para publicação na nossa página, o último dos quais já este mês de Dezembro.

Fotografias, só temos a que reproduzimos

O heróico chefe do Pel Mil de Campata - Semba Embaló (aqui com o Alf Mil L. Dias da CCAÇ 3491), que soube organizar as suas forças de forma a repelir com grande sucesso o ataque de um grupo IN fortemente armado. Campata 1973.

Foto e legenda: © Luís Dias (2009). Direitos reservados

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Notas de CV:

(*) Da colaboração de Luís Dias no Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné encontramos estes postes:

30 de Maio de 2008> Guiné 63/74 - P2901: O Nosso Livro de Visitas (15): Luís Dias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3491 (Dulombi e Galomaro, 1971/74)

16 de Junho de 2008> Guiné 63/74 - P2952: In memoriam (4): O meu amigo Alferes Farinha dos Santos (Luís Dias)

19 de Junho de 2008> Guiné 63/74 - P2967: O caso do embaixador português em Bissau (1): Protestos (Luís Dias)

5 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3022: Tabanca Grande (78): Luís Dias, ex-All Mil da CCAÇ 3491, Dulombi e Galomaro (1971/74)

8 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3037: Os nossos regressos (8): E vieram todos (Luís Dias)

18 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3650: O meu Natal no Mato (16): Os meus Natais na Guiné (Luís Dias)

20 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3763: Cancioneiro de Dulombi / Galomaro (1): Adeus, Guiné / É o fim do castigo, / Terminou a comissão... (Luís Dias)

21 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3772: Cancioneiro de Dulombi / Galomaro (2): Tecnil, Tecnil / Eu passei lá muitas noites / Certamente mais de mil (Luís Dias)

23 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3780: Fauna & flora (16): Avistamento de macaco-cão na zona de Dulombi/Galomaro (Luís Dias)

3 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3969: Sr. Jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (11): Jorge Picado, Manuel Reis, Luís Dias

11 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4012: Efemérides (18): Faz hoje 37 anos que tivémos o primeiro contacto com o IN (Luís Dias, CCAÇ 3491, Dulombi, 1971/74)

22 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4068: Recordando a tragédia do Quirafo, ocorrida no dia 17 de Abril de 1972 (Luís Dias)

20 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4219: Convívios (113): Pessoal da CCAÇ 3491, no dia 16 de Maio, em São Martinho de Antas, Sabrosa, Vila Real (Luís Dias)

25 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4249: Blogpoesia (41): "Para quê, Soldado?" (Luís Dias)

14 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4346: Os bu...rakos em que vivemos (10): Também havia um em Nova Lamego (Luís Dias)

21 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4390: Convívios (132): CCAÇ 3491 (Dulombi e Galomaro, 1971/74), Conviveu em Vila Real, no dia 16 de Maio p.p. (Luís Dias)

5 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4466: O Grupo Especial do Marcelino da Mata em Galomaro (Luís Dias)

1 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4616: Ainda sobre a ataque a Campata (Luís Dias)

4 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5405: Estórias avulsas (62): O Cavalo de Ferro de visita ao Dulombi (Luís Dias)

Vd. último poste da série de 9 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5430: Parabéns a você (50): Amílcar Ventura, ex-Fur Mil da 1.ª CCAV do BCAV 8323, Bajocunda, 1973/74 (Editores)

Guiné 63/74 - P5450: Dossiê Guileje / Gadamael (18): Estive 18 horas em escuta nesse dia fatídico para o Sr.Tenente Pessoa e a FAP, em 25 e 26 de Março de 1973 (Victor Affaiate)

1. Comentário do Victor Alfaiate, com data de 11 de Dezembro, ao poste P5444 (*):

Desculpa Luís, mas como disse ontem, e só tenho uma palavra, a minha participação no Blogue terminou. Como disse, saio antes de ter entrado. Não quero polémicas, quero manter-me sossegado.



Bom Natal e novo ano de 2010 próspero para todos.
Um abraço,
Victor Alfaiate

PS - Já agora e a talhe de foice, e para acabar de vez com qualquer ideia que ainda subsista de que algo me move contra os elementos da Força Aérea, agradeço-te que, se possível publiques o útimo mail que te enviei em 20 de Novembro.

2. Mensagem, de 20 de Novembro de 2009, do Victor Alfaiate (ex- Fur Mil, CCAV 8350, Guileje, 1972//3):

Olá,  Luís

Cheguei ontem de Portugal, onde por motivos profissionais tive que me deslocar, e ao analisar o meu correio electrónico, deparei-me com o teu mail de 9 de Novembro (*)  e sinceramente fico um pouco estupefacto pela tempestade que se parece ter criado sobre uma simples opinião pessoal sobre a actuação da Força Aérea no apoio a Guileje, isto porque ou eu não sei ler ou vocês vêem lá coisas que eu não escrevi.

Como já referi por mais de uma vez nunca foi minha intenção ofender (???) o Sr. Tenente Pessoa ou O Sr. Tenente Martins de Matos ou quem quer que seja. Aliás, não personalizei qualquer crítica à actuação dos referidos Srs. Oficiais, limitando-me a comentar a actuação da Força Aérea de uma forma global, e não a dos seus elementos em particular.

Não procuro culpados, nem faço peditórios, poderei ser um pouco bruto na maneira de me expressar, mas sou Ribatejano e no Ribatejo um toiro é um toiro e pega-se pelos cornos, não se pega um animal com chavelhos ou chifres, não sou de dourar a pílula para ser tomada mais facilmente, se tem que se tomar toma-se independentemente da côr que tiver, e o Blogue não pode, no meu entender, ser uma espécie de cultura indiana onde existam vacas sagradas que tem que permanecer intocáveis.

Conheci o Sr. Tenente Pessoa numa situação muito adversa para ele, fui talvez a última pessoa a falar com ele antes do seu avião ter sido abatido. Depois disso e enquanto não foi recuperado [vd. foto, à esquerda], não mais abandonei o Posto de Rádio, mantendo-me em escuta permanente com mais dois operadores de rádio durante cerca de 18 horas. Estava ao lado da maca em que se encontrava quando no heliporto de Guileje disse ao seu Comandante Sr. Tenente Coronel Brito que o avião não respondia as manobras e ele decidira ejectar-se. (Tenho fotografias desse dia em Guileje).

Reafirmo mais uma vez que nada me move contra qualquer elemento da Força Aérea, limitando-me a constatar que alguém, quem não sei, não tomou as medidas que se impunham no apoio a Guileje e à sua guarnição, isso é indesmentivel.

Porque:

- É ou não verdade que o Sr. General Spínola nos havia prometido apoio aéreo e evacuações?

- É ou não verdade que os aviões não levantaram de Bissau quando foi pedido apoio aéreo no decorrer da emboscada de 18 de Maio?

- É ou não verdade que o Cabo Rabaço faleceu na enfermaria de Guileje 4 horas depois de ter sido pedida a necessária evacuação que não foi efectuada?

- É ou não verdade que na tarde de 21 de Maio dois Srs. Pilotos que se deslocaram a Guileje, quando viram o estado em que tudo se encontrava comentaram um para o outro " É pá isto afinal era a sério" ?

- É ou não verdade que nessa mesma tarde, como não tinhamos transmissões nos foi prometida a realização de vôos de reconhecimento que posteriormente não foram efectuados.

- É ou não verdade que com a Força Aérea a sobrevoar Guileje, o PAIGC continuava a flagelar-nos ao mesmo tempo?

São factos indesmentíveis, que me levaram a fazer os comentários que fiz, e que mantenho, sobre a actuação da Força Aérea no seu global, não personalizando nem particularizando de modo nenhum a acção dos seus elementos. Se se sentem ofendidos nada mais me resta fazer que apresentar-lhes as minhas dersculpas, mas é a minha opinião e dela não abdico.

É evidente que estou convicto de que se alguém, quem não sei, tivesse ordenado ao Sr. Tenente Pessoa e à Srª. Enfª. Para-quedista Giselda que se metessem num Helicóptero e ao Sr. Tenente Martins de Matos que pegasse no Heli-Canhão para lhes fazer protecção e fossem a Guileje efectuar as evacuações, eles certamente teriam ido. O problema é que ninguém deu essa ordem, antes pelo contrário tê-la-ão proibido, e o Cabo Rabaço faleceu sem assistência.

Não posso, agora sim personalizando, deixar de perguntar:
- O que pensaria o Sr. Tenente Pessoa, se quando o seu avião foi abatido, nada tivesse sido feito para o proteger e recuperar? Se o deixassem abandonado à sua sorte? Possivelmente pensaria o mesmo que eu penso, mas do lado contrário.

Posto isto e para acabar em difinitivo com a discórdia, esquece os mails que trocámos, não publiques nada. Por mim o assunto está encerrado, não penso de modo nenhum participar em mais discussões, aliás tenho-me mantido calado todos estes anos e era como deveria ter continuado, lendo o que outros vão escrevendo, concordando ou não, sorrindo por vezes, emocionando-me por outras, mas é assim a vida, só é pena não se poder passar uma esponja sobre o que se passou naquela altura, mas tal é impossível.

Por último não posso deixar de te fazer um reparo, lamento que quando publicaste o mail do Sr. Tenente Martins de Matos, esse sim ofensivo para quem sofreu Guileje e mais propriamente o seu Comandante Sr. Major Coutinho e Lima, não tenhas tido o cuidado de previamente teres dado conhecimento do seu teor, aos que já faziam parte da Tabanca, os meus camaradas (Sr. Major Coutinho e Lima; Sr. Alferes Reis; Sr. Alferes Seabra e o meu amigo - TRRRAN -  Zé Carvalho)

Um abraço

Victor Alfaiate

[ Revisão / fixação de texto / bold / título: L.G.]

3. Comentário de L.G.:

Meu caro Victor: 

Foi ingenuidade minha pensar que os meus camaradas da Guiné  já tinham chegado à idade da Sabedoria,  da Paz e da Tolerância, sendo capazes de se sentar à volta do poilão da Tabanca Grande, tabaquear o caso (da guerra), tomar um trago de cachaça (ou um simples uísque com uma pedrinha de gelo e água de Perrier), contar as suas histórias, piscar o olho às travessuras do destino, abrir-se aos outros (que nunca ouviram falar da guerra) num sorriso amarelo mas ternurento, dar um abraço ao inimigo de ontem,  minimizar as diferenças (sociais, económicas, políticas, ideológicas, etc.) que hoje ainda os podem separar, gozar estes belos dias de outono que temos pela frente, escrever as nossas memórias, partilhá-las com os demais camaradas, amigos  e familiares, etc.

Mas, não, a guerra ainda acabou, para eles, para mim, para nós, sobretudo dentro das nossas almas inquietas. De facto, ainda não fizemos o luto das nossas  perdas nem a contabilidade do nosso deve-e-haver... Se calhar, nenhum de nós ainda conseguir fazer as pazes consigo próprio...

Tenho pena, e fico triste,  meu caro Victor, para mais num dia em que foi a enterrar ma minha terra um amigo meu,  por quem tinha muita ternura, o Luís Venâncio Rei, médico, natural do Seixal, Lourinhã, e eu nem sequer pude estar com ele, na hora do adeus derradeiro, nessa hora em que o coveiro (por sinal, a coveira!) te lança um pazada de terra por cima do teu caixão, como quem te diz: Memento homo quia pulvis es et in pulverem reverteris (Lembra-te, ó homem, que és pó e que em pó te hás-de tornar)...

A última palavra que ele me disse, há dias, no Hospital Pulido Valente, quando o fui visitar e vim de lá com a morte na alma, devastado, acabrunhado com a força brutal da doença e do sofrimento de um amigo, foi:
- Luisinho - tratava-me sempre por Luisinho, com ternura, sem qualquer laivo de paternalismo -  só tenho pena de já poder levar a minha filha, de braço dado,  até ao altar! (A belíssima e amorosa Zé, a filha dele e da minha amiga Benedita, tinha casamento marcado para esse fim-de-semana!)... 

O Luís Rei, mais velho do que eu uns cinco ou seis anos, não sei se fez tropa, acho que não. E se fez,  não foi parar ao Utramar, contrariamente aos cerca de 40 seixalenses da sua/nossa geração...  Contudo, a sua morte, embora anunciada,  foi para mim  como um murro no estômago, foi como se tivesse perdido um amigo e camarada da Guiné, há 40 anos atrás, quando eu tinha os meus verdes vinte anos!

Victor, desculpa-me esta fraqueza emocional, mas hoje é um mau dia para te dizer quanto lamento a tua decisão  de "sair mesmo ainda de entrar na nossa Tabanca Grande"... Noutras circunstâncias, faria tudo para te demover dessa intenção e lutaria pela tua permanências... Preferes a morte social, o exílio, a separação... Não contesto o teu direito... Deixa-me, ao menos, desejar que o teu auto-sacrifício não seja em vão... Vou dormir, estou exausto... Até sempre,  amigo Luís Rei, até sempre camarada Victor Alfaiate... Luís Graça

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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 11 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5444: Dossiê Guileje / Gadamael (17): Depois do que ouvimos da boca do Sr. Cor Pára Durão, tudo o que vier a ser dito, soa a elogio (Victor Alfaiate)

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5449: Votos de Feliz Natal 2009 e Bom Novo Ano 2010 (3): De Alcobaça, o Jero enviou-nos um Postal de Natal (José Eduardo R. Oliveira)



1. O nosso Camarada José Eduardo Reis de Oliveira (JERO), foi Fur Mil da CCAÇ 675 (Binta, 1964/66), enviou-nos um divertido e provocador postal de Natal, com data de 11 de Dezembro de 2009:


Camaradas,

Correspondendo ao desafio lançado hoje, no nosso blogue, em relação a cartões de "Boas Festas" remeto-vos um postal, escrito pelo raio de uma velha.

Não sei como é que é que a velhadas se lembrou de uma coisa destas, eu não tenho nada a ver com a coisa, palavra de... bom malandro:


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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:


Guiné 63/74 - P5448: Viva o Porto - Futebol Clube, breve estória de Torcato Mendonça

1. Mensagem de Torcato Mendonça* (ex-Alf Mil da CART 2339, Mansambo, 1968/69), com data de hoje, 11 de Dezembro de 2009:

Camarada Vinhal

Li e brincando comentei o "escrito" do Alberto Branquinho**. Mas fiquei a matutar. Depois voltei a sair, regresso, jantar e blogue. Li o comentário do Vasco da Gama e o teu. Os pensamentos breves e o matutar desta tarde, trouxeram-me agora ao presente um velho escrito. Onde andará o amontoado de letras... busca e zás. É sobre um antigo militar do meu grupo.

Faz dele o que entenderes camarada... faz dele o que entenderes... mas a nossa geração... fica para depois.

Gostei de ver a alegria da Tabanca de Matosinhos e da festa do Manuel Maia. Força!

Um abraço para ti e para todos os que directa ou indirectamente sofreram naquela guerra estúpida. De ambos lados, logicamente

Abração;
Torcato


VIVA O PORTO – FUTEBOL CLUBE!

Sentado confortavelmente no palanque da sentinela, o olhar a vaguear pela mata ali perto ou, quem sabe, a ir para o local muito longe dali onde estava a acção, por ele ora relatada: o confronto entre o seu Futebol Clube do Porto e algum dos seus mais directos adversários.

Parece-me valer a pena contar esta breve “estória”, como um conto de menino.
Talvez o efeito terrível do isolamento, da brutalidade da guerra. De tudo.

Assim:

Era uma vez um soldado que foi mobilizado para a Guiné. Antes foi à inspecção e deram-no como apto para todo o serviço militar. A Pátria precisava de todos os jovens. Tinha três frentes onde se combatia e outros lugares, por esse mundo fora, onde era necessário a tropa estar. Assim se mantinha una a Pátria do Minho a Timor.

Passado tempo, pouco, foi chamado, entrou num quartel e fez a recruta. Mais tarde foi mobilizado e tirou a especialidade de atirador de artilharia. Foi nesta altura que nos conhecemos. Confesso que não notei qualquer quebra no militar, física ou psicológica. Estava eu preparado para tal avaliação? Claro que não. Na parte física talvez e a mais não era obrigado. Lembro-me das dificuldades de um militar, a tirar também a especialidade, em fazer certos exercícios. Má coordenação motora ou, mais simplesmente, não brincara em criança. Tirou a especialidade e na Guiné foi excelente combatente.

Este, que agora invoco passou desapercebido. Fez a especialidade e foi para a Guiné também. Mas não devia ter ido.

Na primeira operação, com contacto com o IN, o comportamento não foi o melhor. Teve uma primeira conversa com o Furriel e, posteriormente na conversa entre os três concluímos estar, por agora, tudo bem. O medo vai e vem… talvez fosse isso. Só que não era bem isso. Noutras acções ele foi-se indo abaixo psicologicamente. Ainda falei ao médico do Batalhão sobre o estado de saúde daquele militar. Creio mesmo que ele lá foi. Tudo ficou na mesma. Foi regredindo, digamos mesmo que, cada vez mais, estávamos em presença de uma criança. Haviam militares em quebra o que, nas condições em que vivíamos era natural. Ele era diferente e teríamos que ser nós a resolver o problema. Antes deviam ter constatado o estado psicológico do homem. Nunca tal foi feito. Depois devia ter sido devidamente tratado. Não foi assim. Só se algo de grave acontecesse. Mas a bestialidade de certa gente, dita responsável, a mais não chegava.

Passou assim aquele militar à condição de não operacional. Fazia sentinelas diurnas, outros serviços de apoio ao grupo, nas nossas ausências mantinha os abrigos funcionais, os nossos pertences acautelados e era tratado com respeito e amizade por todos. Não tenho a certeza, creio que aprendeu a ler e escrever, tirando a 3.ª ou 4.ª classe.

O que mais gostava, era saltar para o palanque da sentinela e fazer relatos de futebol. Tudo bem. Aí estava ele a relatar as vitórias do seu Porto. Os nomes dos jogadores das várias equipas, estavam correctos. Passava de um campo a outro, voltava rapidamente para relatar mais um golo do Porto. Grandes vitórias. No intervalo havia cantoria. Assim se foi passando a comissão de um homem/criança de excelente trato. Havia camaradas que o conheciam na vida civil. Era mais fácil assim para ele e para nós. Eu entregava-lhe as minhas “coisas”. Ele tomava-as religiosamente a seu cuidado. De quando em vez, vinha junto a mim falar de vários assuntos, por vezes pedia para lhe pagar uma Fanta, outras na brincadeira, puxava-me as barbas. Barbichas… paga uma Fanta…paga?

Passou à disponibilidade e certamente foi esquecido, como tantos, por quem o mandou um dia defender uma terra que não era dele.

Penitencio-me, por nunca ter procurado saber dele e de outros… um dia… um dia!
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 9 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5435: Os nossos regressos (19): Dia 4 de Dezembro de 1969, já lá vão 40 anos (Torcato Mendonça)

(**) Vd. poste de hoje > Guiné 63/74 - P5445: Contraponto (Alberto Branquinho) (3): Fugas... na hora da morte

Guiné 63/74 - P5447: Controvérsias (59): Deixem que cada um tenha a liberdade de criar a sua versão... (António Matos)

1. O nosso camarada António Matos, ex-Alf Mil Minas e Armadilhas da CCAÇ 2790, Bula, 1970/72, enviou-nos a seguinte mensagem:

Deixem que cada um tenha a liberdade de criar a sua versão sem que isso seja motivo de confrontação!

Jorge Luís Borges dizia: “Chega-se a ser grande por aquilo que se lê e não por aquilo que se escreve", porém, e parafraseando alguém que escreveu no blogue, corroboro a confrangedora nulidade de muitos comentários nele publicados que não ajudam em nada a esta tão humilde posição pessoal de esforço de engrandecimento lendo as opiniões proferidas.

São, na sua maioria, eivadas de protagonismos exacerbados que nos toldam a visão e nos põem de pé atrás à cata dos proveitos que possam estar escondidos em tão díspares apreciações publicadas à saciedade.

Ciclicamente, a questão "Guileje" renasce das cinzas com os sobreviventes de tudo quanto aquilo possa ter sido, a reclamarem de sua justiça.

Esgotados os argumentos de que Coutinho e Lima foi um covarde ou um herói, retoma-se a lenga-lenga que, a meu ver, massacra psicologicamente quem lá esteve e enfada quem já leu dezenas de vezes a mesma coisa.

Conclusões, obviamente, nenhuma, o que me parece lógico na medida em que cada um viveu a situação dum ponto de vista, quer emocional quer geográfico diferente e isso dá diferentes percepções.

Calculo que todos e cada um dos intervenientes neste blogue terão já feito na sua cabeça o filme dos acontecimentos.
À sua medida, claro.

Com a sua verdade, com certeza.

Estarão certos? Estarão errados?

Já se percebeu que permanecerão as duas teorias, e daí?

Deixem que cada um tenha a liberdade de criar a sua versão sem que isso seja motivo de confrontação!

Ou alguém consegue ser eloquente suficiente que "venda" um discurso que se "compre"? Se sim, já o deveria ter feito!

Entretanto já existe uma segunda polémica: a FAP e a sua acção / inacção em (onde havia de ser?) Guileje!

Parece terem-se tornado hábito (pouco saudável, diga-se) as conversas de escárnio e mal dizer mas estas, (algumas) já são desabridamente insultuosas o que, de acordo com os credos do blogue já deviam ter sido pura e simplesmente eliminadas!

Liminarmente!

Vou continuar a ler querendo crer que Borges tinha razão.

António Matos
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Nota de MR:

Vd. poste anterior desta série em:


Guiné 63/74 - P5446: Votos de Feliz Natal 2009 e Bom Novo Ano 2010 (2): Na terra dos Vikings, com um cheirinho do nosso querido Portugal (José Belo)

A magia da floresta escandinava... ameaçada, como o resto do planeta, com as alterações climáticas. Foto: Autor desconhecido. Cortesia de José Belo


1.  Mensagem de Joseph Belo [ joseph.josephsson.belo@telia.com ], com data de 8 do corrente:

Com votos de um Feliz Natal e Bom Ano Novo  (*) para todos os Camaradas e Amigos da Tabanca Grande.          

Obrigado por terem feito chegar até aqui um bocadinho do nosso querido Portugal

Um abraço sincero do José Belo.

2.  Comentário de L.G.:

O José Belo (foto actual, à esquerda) foi Alf Mil Inf da CCAÇ 2381 (Buba, Quebo, Mampatá e Empada , 1968/70). Foi camarada de outros Maiorais como o nosso Zé Teixeira, da Tabanca de Matosinhos. Está hoje reformado como Capitão Inf e vive, na Suécia, há mais de trinta anos. É autor da série Da Suécia com Saudade. Quem, como ele vive da diáspora, longe da Pátria  - e são tantos os nossos caamaradas, nomeadamente os das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores - é que sabe dar o valor à palavra Saudade...

Reputado zoológo, foi ele quem identificou e deu a conhecer ao mundo uma nova espécie animal, os Ui!Ui!, animais nocturnos do tarrafo do  Rio Grande do Sul. Zé Belo, não sei do que precisas mais,  no novo ano que se avizinha... Desejo-te, no mínimo, continuação da boa saude e boa disposição na alegre companhia entre os Ui!Ui!...

P'la  nossa equipa editorial, Luís Graça
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Guiné 63/74 - P5445: Contraponto (Alberto Branquinho) (3): Fugas... na hora da morte

1. Mensagem de Alberto Branquinho (ex-Alf Mil de Op Esp da CART 1689 (, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), com data de 7 de Dezembro de 2009:

Carlos Vinhal
Junto vai um texto sobre morte e vida ou sobre vida e morte sobre tempos que estavam pela... "hora da morte".

Um abraço bem vivo do
Alberto Branquinho



C O N T R A P O N T O (3)

FUGAS…


Antes de chegar à Guiné, eu era eterno. Morte? Não havia (para mim). Ela estava longe… no tempo e no espaço.

Mesmo o suicídio do rapaz, que se pendurou do ferro mais alto do beliche durante um fim-de-semana algum tempo antes do nosso embarque, não aproximou de mim a ideia da morte. Deu, até, para aprender uma coisa – que o suicida, antes de executar o acto contra si mesmo, descalça ou, pelo menos, desaperta as botas.

Na Guiné, não demorou muito tempo a concluir que… não regressaria. E um homem, quando atinge o ponto que julga ser de não retorno, começava a baloiçar entre dois comportamentos: ou provocar o embrutecimento, a caminho da autodestruição (não, não pelo suicídio!) ou, quando a realidade espremia os miolos, causando angústias, insónias, irritações - a afogar-se em relaxantes, calmantes e outros. Era nessa altura que se começava o dia a beber duas “bazucas” em jejum. (Mesmo quentes, quando o frigorífico a petróleo estava avariado)

Não havia carta da família, por mais próxima que fosse, nem madrinhas de guerra que, por escrito, pudessem ajudar. Os mais fracos (e conhecedores…) movimentavam-se para irem à consulta de psiquiatria, em Bissau.

A saída era, muitas vezes, a dedicação a um macaco, a um periquito, a um cão. Assumiam-se atitudes extravagantes e bizarras, habitualmente nos cortes do cabelo, da barba e bigodes muito “criativos”.

Havia, também, quem, nas horas vagas, passeasse, cuidadosamente, latas de conserva puxadas por um fio, de modo a que não caíssem as “pedrinhas” que tinham colocado lá dentro.

Ou quem, em noite de insónia, agravada pelas picadas e zumbidos dos mosquitos, tentasse matá-los com rajadas de G-3.

Ou quem, no início das chuvas e debaixo de chuva, saísse de noite, de lanterna eléctrica na mão esquerda e vassoura na direita, matando os sapos e rãs que, num ápice, surgiam de não-sei-onde às centenas, num coaxar infernal, como um coro maluco e desafinado de tenores, barítonos e contraltos.

Coisas… Coisas que ainda hoje se recordam, com a diferença de que, agora, nos fazem sorrir (embora sentindo, ainda, um grão de angústia lá bem no fundo, bem fundo da alma).

Alberto Branquinho
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 10 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5247: Ser solidário (44): A propósito do Dia dos Veteranos em Stoughton - Estados Unidos da América (Alberto Branquinho)

Vd. último poste da série de 30 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4612: Contraponto (Alberto Branquinho) (2): Não vale a pena chorar

Guiné 63/74 - P5444: Dossiê Guileje / Gadamael (17): Depois do que ouvimos da boca do Sr. Cor Pára Durão, tudo o que vier a ser dito, soa a elogio (Victor Alfaiate)

1. Mensagem do Victor Alfaiate, com data de 30 de Outubro, e em princípio privada, mas que entendi dever divulgar como complemento do poste P5415 (*) e como contributo para um melhor conhecimento do seu autor, que foi  Fur Mil Trms, CCAV 8350 (Guileje, 1972/73), e é um dos novos membros da nossa Tabanca Grande. Permitam-me apelar, mais uma vez, para a elevação, intelectual e ética, que devemos manter na discussão, franca e aberta, deste dossiê difícil, fracturante, doloroso... (LG)

Olá,  Luís, Boa Noite

Li com a máxima atenção o mail que me remeteste e antes de mais quero esclarecer que não é nem foi nunca minha intenção melindrar ou ofender quem quer que seja.

Aliás se contactares os meus camaradas Reis, Seabra, Zé Carvalho ou Major Coutinho e Lima,  eles confirmarão certamente que sou incapaz de ofender quem quer que seja, mais que não seja porque me considero suficientemente educado para o não fazer.

No entanto e relendo o meu mail, confesso não ter encontrado nada que possa ofender os Srs. Tenentes Pessoa e Martins de Matos,  salvo a alusão às loirinhas e ao ar condicionado, mas se analisares com atenção é o Sr. tenente Martins de Matos que, no P3737,  diz que dormia todas as noites no ar condicionado, as palavras são dele não minhas.

Quanto a utilização do tratamento por Senhores, dou-te a minha palavra de honra que não há no mesmo qualquer sentido depreciativo, antes uma questão de respeito. Se reparares, trato todos por Senhores (Sr. Major; Sr. General; Sr. Alferes), aliás na Força Aérea todos se tratavam por Senhores, enquanto no exército era (Meu Capitão; Meu Alferes; Nosso Cabo),  na Força Aérea era (Sr. Capitão; Sr. Alferes).

Quanto ao termo "desculpa esfarrapada", não vejo qualquer mal, trata-se de uma desculpa que todos vêem ser falsa (Ex. Empresta-me o teu carro - Não posso porque acabei de o pintar e ainda não secou). Não vejo em que tal termo possa ser ofensivo.

No que diz respeito à ineficácia da Força Aérea no que toca ao apoio a Guileje, tive o cuidado de referir no início que era a minha opinião pessoal, correndo até o risco de poder ser injusto, mas sinceramente é e continua a ser a minha opinião pessoal, e aliás deixo bem explícitos os motivos conducentes a tal opinião.

No que respeita ao diálogo com o Sr. Tenente Martins de Matos, penso não poder fazer qualquer alteração uma vez que o mesmo reproduz na verdade o que realmente se passou.

Entendo perfeitamente que tentes evitar picardias, mas sinceramente não foi meu intuito provocá-las, aliás se vires bem no meu mail digo claramente que não era minha intenção participar numa discussão que, julgo, nunca conduzirá a qualquer conclusão, pelo que se achares que não deves publicar o meu mail, estás  à vontade para o fazer, considera-o se assim o entenderes sem efeito mas não me peças para fazer alterações porque isso seria desvirtuar o que sinto e penso na realidade, e já me basta viver num país onde os que fugiram a cumprir um dever que bem ou mal era servir a pátria, são considerados patriotas e democratas e nós, que andamos lá a bater com os costados, somos tratados nalguns casos abaixo de cão.

Este mail é pessoal, pelo que só para ti e, confirmando o que atrás deixo referido, se quisesse provocar picardias,  o P3737 do Sr. Tenente Martins de Matos dava pano para mangas, a saber:

- Sr. Major Coutinho e Lima sem perfil para comandar o Cop 5;
- O Homem do rádio, isto sim dito com sentido depreciativo;
- Guileje para os corrécios;
- B-52 - Resposta com raiva;
- Terem fugido 600 pessoas;
- Transformar o Sr. Major Coutinho e Lima num herói, que não foi.

Como vês,  a haver alguém que se deveria sentir melindrado e ofendido eramos nós, mas como já estamos habituados, nem ligamos, são bocas que esbarram na couraça da nossa indiferença. Depois do que ouvimos da boca do Sr. Coronel Durão quando chegámos a Gadamael, tudo o que vier a ser dito nos soa quase como elogios.

Não te vou chatear mais, como disse estás a vontade para dares ao mail o destino que quiseres.

Quanto a fazer parte do Blogue, como já disse terei muito gosto nisso, mas as fotografias só as poderei enviar quando for a Portugal.

Um Abraço.
Victor Alfaiate
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Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de :

7 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5417: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (15): Ainda e Sempre Guileje (Victor Alfaiate, ex-Fur Mil Trms, CCAV 8350, 1972/74)

Vd. também: 9 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5432: FAP (39): Guileje, outra vez?!... (António Martins de Matos)

(**) Vd. poste de 14 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3737: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (11): Um erro de 'casting', o comandante do COP 5 (António Martins de Matos)

Guiné 63/74 - P5443: Memória dos lugares (59): Fotos de Catió, Ilha de Como e Cufar III (Benito Neves)


1. O nosso Camarada Victor Condeço solicitou ao Benito Neves, que foi Fur Mil Atirador da CCAV 1484 (1965/67) (Nhacra e intervenção ao Sector de Catió de 08JUN66 a finais de JUL67), que nos permitisse publicar uma série de 28 fotografias do seu álbum de memórias, belíssimas e que detêm excelente qualidade e interesse pelos motivos retratados.

2. Nos postes P5366 e P5411, publicamos duas séries dessas estimadas e bem conservadas fotos, num total de 19 peças, e hoje, com os nossos melhores agradecimentos e cumprimentos ao Condeço e ao Benito, completamos com as restantes 9 dessas invulgares fotografias:

Foto 15: Catió, 1967 - Material capturado em Cabolol, operação “Penetrante” em 27JUN67.

















Catió, 1967- Material capturado em Cabolol na operação “Penetrante”, em 27JUN67. Fotos 14 e 16.

















Cachil > 1965 > Ilha do Como. Foto 24: Um abrigo onde se albergavam-se 3 ou 4 militares e Foto 25: Interior do aquartelamento.



Foto 1: Catió 1967 - Casa do então Tenente João Bacar Djalo, em Priame.




















Catió 1967 > Foto-026: Sargento Baldé ajudando a ataviar o Ten João Bacar Djalo. (O velho Sargento tinha por alcunha o “Furadinho”, tal a quantidade de cicatrizes de ferimentos que tinha sofrido em combate, como já não ia para o mato, era uma espécie de impedido do João Bacar e de 1º da Companhia); e Foto-027: O Tenente João Bacar Djalo comandante da Companhia de Milícia 13 à porta da sua casa em Priame. (Pela presença da viatura, provavelmente ia deslocar-se ao Comando do Batalhão para participar em mais um planeamento de uma operação, era normal pedirem a sua presença e atenderem as suas recomendações. Com o seu saber e a sua experiência no terreno, a ele se deveram por certo o êxito de muitas operações e o reduzido número de baixas sofridas. Nesta altura já lhe tinham sido atribuídas 2 Cruzes de Guerra, 1 em 1964 e 1 em 1965, em 1970 já ao serviço dos Comandos é-lhe atribuída a Torre Espada.)

Foto-028: Cufar 1966- Artilharia no quartel de Cufar, Obus 8,8 cm.
Benito Neves
Fur Mil At CCAV 1484


Fotos e legendas: Benito Neves (2009). Direitos reservados.
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Nota de MR:
Vd. poste anterior desta série em: