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domingo, 22 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10178: (In)citações (41): Serpentes, feitiços e casamentos inter-étnicos... (Cherno Baldé)


1. Comentário, de 19 do corrente, do nosso amigo Cherno Baldé [, aqui na foto, quando jovem estudante em Kiev, Ucrânia, no final dos anos de 1980], ao poste P10166:


Caro Luis Graça e amigos,

Esta serpente verde ], a mamba verde,] é bem conhecida e motivo de muita desgraça entre as populações do sul da Guiné, mais precisamente entre os jovens que se ocupam do trabalho do corte de chabéu e da limpeza das plantaçoes de bananeiras.


E, muitas vezes, pelo facto das habitações estarem rodeadas de árvores de cola e pés de bananas, ela chega a invadir as casas e semear o terror.

O mais interessante, no fim, é que a explicação ou justificação da sua existencia e das desgraças que provoca é, como se pode perceber, sempre de natureza social e/ou existencial. Não é a serpente que mata mas sim o vizinho ao lado ou a madrasta má que se transformam e, furtivamente, atacam as vitimas.

As vezes, as explicações, de tao reais, chegam a ser convincentes, pois nao raras vezes, ou as serpentes perseguem as suas vitimas ou estão escondidas em cima da palmeira a sua espera. As mordeduras são sempre mortais.


Por diversas vezes, tive ocasião de visitar esta região, ouvir falar e assistir a alguns casos porque a familia materna da minha esposa [, foto à esquerda,] é da etnia Nalu e natural de Calaque, aldeia situada entre Cassaca e Campeane, no sector de Cacine.

A titulo de curiosidade, digo que somos, assim, um casal misto que representa o cruzamento de um Nordestino, região colaboracionista e aversa ao PAIGC,  e duma mulher originária do Sudeste (Cacine), filha de antigos combatentes do PAIGC e nascida em Boé (Fevereiro de 1973), que foram os maireos bastiões deste movimento durante a luta.

Um abraço amigo, Cherno Baldé

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Nota do editor:

Último poste da série > 5 de junho de 2012 > Guiné 63/74 - P9999: (In)citações (40): Deixem-me aliviar a angústia das notícias vindas da minha terra (Braima Djaura, ex-sold cond auto, CCaç 19, Gudiaje, 1972/74)

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7241: Notas de leitura (167): Crónica da Libertação, de Luís Cabral (4) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Novembro de 2010:

Queridos amigos,
A saga está quase a findar.
Aprecie-se ou não as memórias de Luís Cabral, elas fazem parte dos códices essenciais para estudos futuros. Há certamente omissões, excessos de apreciação, episódios deliberadamente truncados, para trazer benefício à imagem da direcção do PAIGC. Mas é um relato que tem princípio, meio e fim. Resta saber se Luís Cabral deixou outras memórias referentes a este período ou subsequente à sua deposição.

Um abraço do
Mário


“Crónica da Libertação” (4), por Luís Cabral

Beja Santos

A consolidação do PAIGC ao nível interno e internacional

Em 1965, o PAIGC ganhara indiscutivelmente prestígio: vinham jornalistas visitas às chamadas zonas libertadas, foram reduzidas as dificuldades na fronteira senegalesa, a coordenação da acção das organizações nacionalistas das colónias portuguesas eram um facto. 

É nesse contexto que Amílcar Cabral se deslocou a Cuba onde foi participar na Conferência Tricontinental e onde se encontrou com Fidel Castro que trouxe novos apoios para a luta armada. A intervenção de Cabral em Havana, como muito observadores disseram, trouxe a sua consagração como teórico, ao introduzir elementos inovadores no que toca ao proletariado rural e à liderança revolucionária da pequena burguesia. Fidel anunciou vários apoios: preparar combatentes para o desembarque em Cabo Verde, enviar pessoal e material sanitário bem como instrutores para a República da Guiné e zonas libertadas.

Em 1966, estava Amílcar Cabral no Boé, foi descoberta a preparação de um criminoso atentado, tal como escreve Luís Cabral:

 “Os elementos descontentes tinham já aliciado alguns combatentes dos quais um atirador de bazuca seria o autor do miserável atentado quando o Secretário-Geral do partido se tivesse recolhido à sua barraca, para ali passar a noite. Denunciado o atentado por um dos camaradas contactados, o grupo foi preso. Os responsáveis da justiça agiram prontamente, o processo foi organizado, a tentativa de crime comprovada durante o julgamento. Os chefes da monstruosa conspiração foram condenados à pena capital e executados”. 

Porque havia descontentamento, porque era necessário liquidar Amílcar Cabral, o autor não adianta as razões, o que é lastimável se acaso por detrás da tentativa de atentado estavam motivos semelhantes aos de 20 de Janeiro de 1973. Não deixa de ser curioso verificar, segundo Luís Cabral, que Amílcar terá convocado uma reunião de dirigentes em que lera uma declaração segundo a qual se tornasse necessária a tomada de decisões extremas em relação a companheiros, repetindo-se nova tentativa de atentado, ele se retiraria completamente da luta.

Também nesse ano se tomou a importante decisão de incrementar a luta na frente Norte. É nessa altura que Luís Cabral é transferido para Ziguinchor, no sentido de se imprimir uma nova dinâmica na região senegalesa. Mais tarde, Amílcar visitou o Norte e fez um grande comício na tabanca de Djagali, na margem esquerda do rio Farim. No Norte, foram criadas sete regiões autónomas e um órgão de direcção e coordenação. Na frente Leste, a vida tornara-se insuportável em Madina do Boé e Beli. Domingos Ramos que fora transferido do Xitoli para ali acabou por morrer depois de ter sido gravemente ferido, no ataque a Madina do Boé.

Quanto à preparação para um desembarque em Cabo Verde, Amílcar Cabral recuou quanto à oportunidade de tal operação. Luís Cabral e Chico Mendes reformularam a vida política e militar da frente Norte, resolvendo dois problemas: fazer chegar mais material e atravessar zonas perto de aquartelamentos portugueses e fazer chegar esse mesmo material a todas as regiões. Se é verdade que tudo melhorou, continuaram as carências de infra-estruturas de acolhimento para os combatentes evacuados.

Por esse tempo, deu-se a visita de uma delegação militar da Organização da Unidade Africana que visitou a frente Norte. A delegação constatou que era necessário que as forças do PAIGC dispusessem de um armamento mais potente. Mas o facto que Luís Cabral destaca foi a oportunidade de os oficiais do Senegal e da Guiné Conacri terem forjado excelentes relações, isto quanto a diplomacia entre os dois países era de grande tensão. 

A mudança táctica das autoridades senegalesas quanto à passagem de homens e armas trouxe um grande reforço à luta. Luís Cabral regista outros acontecimentos que reputa como fundamentais para o crescimento do PAIGC: a propaganda, sobretudo a radiofónica, com a inauguração da Rádio Libertação; a criação de cursos de enfermagem; a melhoria do abastecimento, o bom funcionamento das escolas. Em 1967, as populações sobre o controlo do PAIGC passaram a receber armas.

As forças portuguesas estavam agora a receber helicópteros que semeavam o pânico quando largavam ou recolhiam as tropas especiais que atacavam as bases. A resposta foi a criação do Corpo de Comando e a utilização de melhores peças de artilharia. Segundo ele, as bazucas T-21 constituíram um importante elemento dissuasor.

Em 1968, em Fevereiro, um grupo de combatentes fez uma incursão durante a noite até Bissalanca de onde lançou fogo de morteiro sobre as instalações militares do aeroporto. Aumentou a pressão sobre os aquartelamentos portugueses, nomeadamente no Sul e no Leste. É neste contexto que Schultz termina a sua comissão e é substituído por Spínola. 

Luís Cabral enumera as diversas reuniões internacionais em que participou Cabral e o seu crescente prestígio. Quando, no início de 1969, desapareceu Madina do Boé, a pressão intensificou-se em todo o Gabu. As forças portuguesas concentravam-se, o PAIGC tinha que responder da mesma maneira. Mas Spínola não trazia só uma nova lógica para a manobra militar, pretendia captar as populações. A libertação de Rafael Barbosa que anunciou o seu arrependimento, foi um grande choque para o PAIGC. Ele escreve: 

“O antigo presidente do partido tinha sido, afinal, mobilizado pelos nossos inimigos e prontificara-se a trair o nosso povo e o PAIGC em troca da liberdade. Vários outros antigos militantes seguiram o mesmo caminho. Uns pondo-se abertamente ao serviço dos colonialistas, outros procurando anonimamente a sua segurança e bem-estar nas fileiras da Acção Nacional Popular… Os outros camaradas que participaram connosco na fundação do PAIGC tinham já sido libertados anteriormente. Eram eles Elisée Turpin e Júlio Almeida. Um e outro voltaram à sua vida, este como técnico agrícola, aquele dedicando-se a actividades comerciais e industriais de pequena envergadura, aproveitando-se das facilidades que a nova política do governador lhe facilitava”. 

Para Luís Cabral, Rafael Barbosa estava completamente desprestigiado e muito provavelmente estaria a denunciar militantes que actuavam em Bissau. Spínola procurou acções ofensivas, atacando quartéis do PAIGC dentro do Senegal. É neste contexto que chegou uma nova arma de grande potência, o GRAD-P. Os foguetões iam fazer a sua entrada na guerra de guerrilhas.

(Continua)
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 7 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7237: Operação Saudade 2010 (Mário Beja Santos) (4): Páginas de um diário quase improvável, antes de viajar para a Guiné (2) 31 de Outubro

Vd. último poste da série de 6 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7232: Notas de leitura (166): Crónica da Libertação, de Luís Cabral (3) (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3846: PAIGC Actualités (Magalhães Ribeiro) (2): O nº 54, Outubro de 1973, dedicado à proclamação da independência: pp. 3-4

1. Continuação da publicação da revista mensal PAIGC Actualités, nº 54, Outubro de 1973, um número histórico de que nos foi enviado uma cópia, digitalizada pelo nosso amigo e camarada Eduardo Magalhães Ribeiro, mais conhecido na Tabanca Grande como o pira de Mansoa. (*)

As páginas 3 e 4 foram traduzidas do francês paar português pelo Vasco da Gama, ex-Cap Mil da CCAV 8351, os Tigres de Cumbijã (1972/74).


Imagens: © Magalhães Ribeiro / Luís Graça & Camaradas da Guiné (2008). Direitos reservados.




Guiné-Bissau > Região do Boé > 24 de Setembro de 1973 > "O Comandante Paulo Correia, do Comité Executivo da Luta, primeiro vice-presidente do Conselho de Estado, crava no chão, frente à Presidência, a bandeira nacional" . [Paulo Correia, de etnia balanta, será mais tarde julgado e condenado à morte, sendo executado em 1986, juntamente com o jurista Viriato Pã, um e outro acusados serem os autores morais da tentativa de golpe de Estado, que ficou conhecida como o "Caso 17 de Outubro" ou "A rebelião dos balantas". L.G.]




"A ASSEMBLEIA NACIONAL POPULAR, reunida a 23 e 24 de Dezembro, adopta a primeira Constituição da História do nosso povo.

"O PAIGC permanece como força política dirigente da nossa sociedade.

"O LEMA DO ESTADO DA GUINÉ BISSAU É UNIDADE, LUTA, PROGRESSO.

"O Secretário Geral do nosso Partido inaugurou a ANP, perante a qual apresentou um balanço das realizações do nosso Partido que conduziram às eleições e à convocação da ANP de acordo com os planos estabelecidos pelo nosso saudoso dirigente Amílcar Cabral, principal obreiro de todas as vitórias alcançadas pelo nosso povo.

"O camarada Pereira refere-se também às novas perspectivas que se abrem à nossa luta na Guiné e às Ilhas de Cabo Verde, assim como às pesadas e novas responsabilidades que recaem sobre todos os dirigentes responsáveis e militantes do nosso Partido.

"O Estado da Guiné-Bissau é um Estado soberano, republicano, democrático, anti -colonialista e anti - imperialista e tem como objectivos principais a libertação total do povo da Guiné Bissau e Cabo Verde e a construção da união destes dois territórios através da edificação de uma pátria africana forte e rumo ao progresso. A modalidade desta união será estabelecida após a libertação dos dois territórios de acordo com a vontade popular.

"O Estado da Guiné Bissau fixa como dever sagrado agir no sentido de acelerar por todos os meios a expulsão das forças de agressão do colonialismo português da parte do território que ainda ocupam na Guiné Bissau e no sentido de tornar mais forte a luta nas Ilhas de Cabo Verde, parte integrante e inalienável do território nacional do povo da Guiné Bissau e de Cabo Verde. Nas ilhas de Cabo Verde será criada no momento oportuno a Assembleia Nacional de Cabo Verde, tendo em vista a formação de um órgão supremo da soberania total do nosso povo e do seu Estado Unido: A Assembleia Suprema do Povo da Guiné e de Cabo Verde.

"O Estado da Guiné Bissau considera, como um dos princípios base da sua política externa, o reforço dos laços de solidariedade e fraternidade combativa do nosso povo com todos os povos das colónias portuguesas; solidariza-se com os povos em luta pela sua independência na África, Ásia e América Latina e com todos os povos árabes contra o sionismo.

"O Estado da Guiné Bissau é parte integrante de África e luta pela unidade dos povos africanos, respeitando a liberdade, a dignidade e o direito ao progresso político, económico, social e cultural desses povos".

O Conselho de Estado exerce, nas sessões da A.N.P., as funções que lhe são atribuídas pelas leis e resoluções da própria Assembleia. É responsável perante a A.N.P. e compõe-se de quinze elementos, cujo mandato é de três anos, eleitos, entre os deputados à A.N.P. na primeire sessão da sua legislatura.



Foto: "O Camarada Luís Cabral, secretário geral adjunto do nosso Partido, eleito Presidente do Conselho de Estado, seu representante nas relações internacionais, sendo igualmente o comandante supremo das Forças Armadas Revolucionárias do Povo ( FARP)".



Os deputados à ANP prestam juramento nos termos seguintes: “Juro que servirei com todas as minhas forças no sentido de conseguir os objectivos principais da Constituição: liquidação total do regime colonial, unidade da Guiné Bissau e das Ilhas de Cabo Verde, progresso social”.


Os outros membros do Conselho de Estado:

- Comandante Umaru Djalô, Vice-Presidente

- Comandante Lúcio Soares, membro do C.E.L. [Comité Executivo da Luta], Secretário

- Pascoal Alves, membro do C.E.L.

- Otto Schacht, membro do C.E.L.

- Carmen Pereira, membro do C.E.L.

- Paulo Correia, membro do C.E.L.

- Bacar Gassamá, membro do C.E.L.

- E ainda Sr. El-Hadj Fodé Mai Turé, Sra. Chica Vaz , Sra. Mansaba Sambu, Sr. Wangne Tchuda e Sr. Musna Sambu



Foto: "Em primeiro plano e da direita para a esquerda: Os Comandantes Umaru Djalô, membro do C.E.L. , Vice-Presidente de Estado, João Silva, membro do C.S.L. e Constantino Teixeira, membro do C.E.L., eleito no Conselho de Estado".

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Nota de L.G:

2 de Fevereiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3828: PAIGC Actualités (Magalhães Ribeiro) (1): O nº 54, Outubro de 1973, dedicado à proclamação da independência: pp. 1-2