quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Guiné 63/74 - P2538: Guineenses da diáspora (2): António Rocha, economista, casado com Juvelina Cabral, irmã de Amílcar Cabral

Guiné-Bissau > Bissau > 1998 > "Almoço no Clube de Caça da Anura, em 1998. Eu sou o segundo do lado direito, no primeiro plano. O segundo do lado esquerdo, no primeiro plano, é o Rocha, economista, casado com a Juvelina Cabral (irmã do Amílcar Cabral), que moravam na altura em Bissau (estão actualmente em Angola).

"Mesmo de frente, o homem de bigodes é o comandante do navio mercante que trouxe os portugueses quando se deu o golpe de Ansumane Mané (1); ao seu lado direito está o gestor da GUIPOR (empresa detentora da exploração do Porto de Bissau, na altura em mãos de portugueses)" (2).

Foto e legenda: © A. Marques Lopes (2005). Direitos reservados.


1. Mensagem do António Rocha, enviada ao A. Marques Lopes, com conhecimento ao editor do blogue:


Assunto - Guiné da minha saudade, Guiné da minha tristeza

Caro A. Marques Lopes:

Eu sou o Rocha, o economista casado com a Juvelina Cabral e que agora reside e trabalha em Angola e que, num dia de 1998, creio que pouco tempo antes da guerra civil da Guiné (1), teve o prazer de o conhecer, curiosamente na companhia daquele que seria o nosso Comandante salvador.

Creio que já há cerca de dois anos quando fazia uma pesquisa relacionada com a família Cabral, descobri, num dos primeiros sites da lista de resultados, a vossa tertúlia Luís Graça & Camaradas da Guiné, que no excerto de apresentação fazia referência a mim e à minha mulher.

Claro que fui imediatamente ao sítio do blogue e lá descobri o seu artigo com a fotografia no Clube de Caça de Anura (publicado em 7 de Agosto de 2005)(2), e resolvi escrever o texto seguinte, o qual enviei para o e-mail do Professor Doutor Luís Graça.

Curiosamente hoje, quando estava a reorganizar o Outlook (que há muito tinha deixado de usar) descobri que o tal e-mail ainda estava no arquivo de "a enviar".

Então revisitei o Blogue e entendi reenviar o texto mas, agora, também para si uma vez que lá descobri o seu endereço.

Já agora também lhe digo (porque vi que é de ou mora em Matosinhos ou Porto) que sou nascido e criado no Porto e durante muitos anos trabalhei em Matosinhos e em Leça, na Petrogal.

O texto que na altura julguei ter enviado foi o seguinte:

"Luís Graça e amigos,

Não poderei considerar-me do vosso grupo, no sentido em que não fui combatente nem na Guiné, nem na guerra colonial.

Consegui escapar, com muita artimanha e também por real incapacidade física (visual). Fui, sim, um combatente contra a guerra colonial, nas trincheiras da oposição anti-fascista, nos débeis períodos eleitorais e nas manifestações da universidade.

Respeito muito quem foi forçado a entrar nessa triste guerra, mas também respeito quem, na altura, se sentia na obrigação e com vontade de defender a pátria e o "glorioso império" português.

Mas entendo ter algo a ver com o vosso grupo porque amo e choro, todos os dias, a minha querida Guiné. A Guiné para onde quis dar o meu contributo voluntariamente em 1985 e me mantive até 2000 (com ano e meio de interregno causado pela guerra), a Guiné onde encontrei a mulher da minha vida, a Guiné que eu vi nascer para a democracia, a Guiné pátria do ídolo da minha juventude - Amílcar Cabral -, mas também a Guiné onde deixei amigos vivos e muitos mortos, a Guiné da minha tristeza diária, a Guiné que tarda em encontrar o caminho e que tanto me faz sofrer.

Eu sou o Rocha, o tal economista que o Coronel A. Marques Lopes refere no Blogue Nove Fora Nada, aquando da sua visita à Guiné em 1998 e que está na fotografia do Clube da Anura (2).

De facto ainda me encontro em Angola, juntamente com a Juvelina, minha mulher, e o nosso neto/filho João Carlos, há quase 7 anos!

Mas, não há um único santo dia que a primeira coisa que faça, não seja ler as notícias sobre a Guiné. Sou um viciado amante da Guiné que há muito só me tem dado motivos para chorar, para me revoltar.

Por isso não serei a melhor companhia para vocês que, passados tantos anos conseguem ver as coisas doutra maneira, que conseguem encontrar sempre algo de positivo ou até de belo nas vossas andanças por aquelas terras.

Isso é muto bonito e encorajo-vos a continuarem a recordar esses tempos tão significativos das vossas vidas, com a serenidade de quem consegue, hoje, ver no antigo adversário um amigo.

Eu só quis intervir para vos dizer que aprecio o vosso blogue, a vossa amizade e solidariedade e, sobretudo, o vosso contributo para o esclarecimento desta época, talvez a mais importante da nossa história contemporânea.
Por mim, despeço-me com amizade, até um dia em que possa intervir com mais serenidade e com o distanciamento e lucidez que vocês conseguem.

Até lá serei vosso atento leitor.

Desejo a todos muitas felicidades e muita saúde e que esta tertúlia se prolongue por muitos e bons anos.

António Rocha - O tuga-guineeense."


Creio que, apesar de decorridos 2 anos, nada teria a mudar deste texto. Continuo a ter os mesmos sentimentos pela Guiné e a sofrer da mesma maneira porque, infelizmente, as coisas não melhoraram, antes pelo contrário...

Só gostaria que um de vós me fizesse o favor de me informar se o endereço da v/ tertúlia é o mesmo pois constato (no que acedi, http://blogueforanada.blogspot.com/) que não foram acrescentadas mensagens recentes (3).

De qualquer modo desejo a todos muita saúde e até um dia.

Grande abraço

António Rocha

2. Comentário do editor L.G.:

António (e Juvelina):
É bom saber de vocês... Gostei muito de ler a tua mensagem que esteve dois anos à espera de ser enviada (permite-me que te trate por tu, por que isso simplifica muita coisa). É de um grande tuga e de um grande guineense.... Lamento muito que tenhas sido obrigado a sair da tua Guiné, e que haja tanta amargura e tanta saudade no teu coração... Fico feliz por saber que te faz bem ler o nosso blogue e que aprecias muitas das coisas que por cá publicamos... Formamos uma Tabanca Grande onde tu e a tua Juveliana seguramente que cabem... Aparece mais vezes, sempre que quiseres e puderes. Se for a Angola, gostaria de te conhecer pessoalmente. Um abraço solidário.

__________

Notas de LG:

(1) O brigadeiro Ansumane Mané liderou, em Junho de 1998, um levantamento militar, a partir do quartel de Mansoa, e que levaram a uma sangrenta guerra civil. Na altura, cerca de 3 mil estrangeiros, incluindo portugueses, tiveram que fugir do país. Ao fim de onze meses, a rebelião acabaria por levar ao afastamento do então Presidente Nino Vieira, e colocar no poder uma Junta Militar liderada pelo brigadeiro.
Ansumane Mané será entretanto morto, alegadamente em combate, nos finais de Novembro de 2000, no decurso de uma também alegada tentativa de golpe de Estado contra o Presidente Kumba Ialá, entretanto eleito.
(2) Vd. poste de 7 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CXLV: Bissalanca, Bambadinca, Anura... ou três fotos com legenda (1) (A. Marques Lopes)

(3) Desde Junho de 2006, estamos na 2ª série do blogue Luis Graça & Camaradas da Guiné. E formamos uma tertúlia ou Tabanca Grande onde cabem todos os amigos da Guiné e do seu povo... Reservamos, naturalmente, a palavra camarada para os ex-combantentes, portugueses, independentemente da sua posição (político-ideológica) face à guerra colonial / guerra do ultramar...

Guiné 63/74 - P2537: Bibliografia (16): Lançamento do Diário da Guiné, 1968-1969: Na Terra dos Soncó, do Mário Beja Santos (Virgínio Briote)

Capa do livro do Mário Beja Santos, Diário da Guiné 1968-1969: Na Terra dos Soncó.Foto: Círculo de Leitores (2008). (Gentileza da Dra Isabel Mafra, da Editora Temas e Debates)

1. Mensagem do Rui Alexandrino Ferreira a dar-nos conhecimento da carta que enviou a alguns Camaradas:


Viseu, 14 de Fevereiro de 2008

Meu caro amigo

Sob o lema “ Não deixemos que os outros contem por nós a nossa história “, Luís Graça, Sociólogo do Trabalho e da Saúde, professor da Escola Nacional de Saúde Pública e da Universidade Nova de Lisboa, que criou e editou um blogue colectivo em que os antigos combatentes da Guiné vêem descrevendo as suas participações naquela que passou à posteridade como a guerra colonial, a guerra subversiva ou a guerra de África.


Sendo que essa guerra foi o marco que condicionou a vida colectiva dos Portugueses na segunda metade do século vinte, continua a ser um tema sempre presente, controverso, discutido e nunca encerrado sobretudo para quem a viveu.

Daí lhe vem não só a importância mas a notoriedade e a curiosidade que o blogue Luís Graça & camaradas da Guiné vem despertando que o fez ultrapassar na data em que te estou a escrever o meio milhão de visitantes: Mais propriamente 525528.

Um sucesso verdadeiramente espectacular. Só possível pela competência, integridade simpatia e espírito de missão daquele nosso camarada que teve além do mais a felicidade, o bom senso e o cuidado de se fazer acompanhar por dois ex-combatentes de excepcional craveira moral, de liderança e de disponibilidade como são o Carlos Vinhal e o Virginio Briote.
Pessoalmente sinto-me muito honrado por pertencer a tão ilustre tertúlia.

Sucede que outro tertuliano de grande valor como é o Mário Beja Santos, figura pública bem conhecida que dispensa apresentações, organizou e vai publicar em conjugação com o Circulo dos Leitores (...) o Diário da Guiné – Na terra dos Soncó.
Estamos certamente perante um livro especial para todos quantos passaram pela Guiné, que aí viveram e a ela se sentem ligados, por quantos tiveram lá algum familiar, por quantos querem saber mais sobre a guerra colonial ou pelos que querem render homenagens ás gerações sacrificadas que, por terras então dominadas pelo espectro da morte, comeram o pão que o Diabo amassou.

Esse livro que é certamente um pouco de todos nós e para o qual te recomendo já a aquisição vai ser lançado no dia 6 de Março, em Lisboa, na Sociedade Portuguesa de Geografia, junto ao Coliseu dos Recreios.

A apresentação terá lugar às 18 e 30.
Aqui fica o meu convite para estares connosco.

Informo-te ainda que nesse dia vamos almoçar na Casa do Alentejo e na parte da tarde antes do lançamento estaremos em convívio numa sala posta à nossa disposição por aquela Sociedade onde como é lógico serás bem-vindo.
Se pretenderes almoçar connosco deverás proceder à inscrição o mais rápido possível eventualmente através da minha pessoa. O custo previsto por pessoa é de aproximadamente 12 euros.

Lá estarei à tua espera.

Um grande abraço.

Rui Alexandrino Ferreira

2.
Lançamento: Lisboa, 6 de Março de 2008, 18.30h, na Sociedade Portuguesa de Geografia.

Almoço: Presenças confirmadas (até 14/02)

1. Henrique Matos, o 1º Cmdt do Pel Caç Nat 52 (vem do Algarve).
2. A. Marques Lopes, (Porto), o nosso Camarada de Barro, de Sinchã Jobel e de tantos outros sítios da Guiné.
3. António Graça de Abreu, (Mafra), que viveu os anos do fim, em Canchungo primeiro, depois em Mansoa e finalmente em Cufar, nas margens do Cumbijã, e autor do bem sucedido "Diário da Guiné, Lama, Sangue e Água Pura".4. António Santos, (Lisboa), sempre atento e presente em tudo o que diz respeito à Guiné.
5. Delfim Rodrigues, (Coimbra), que esteve em Suzana e Varela, entre 71 e 73.
6. Mário Fitas, (Estoril), que escreveu a história da Pami Na Dondo (Cufar).
7. Rui Ferreira, (Viseu), autor de Rumo a Fulacunda, uma obra cheia de revelações sobre alguns dos acontecimentos mais dramáticos da nossa Guerra.
8. Raul Albino, que esteve em Có, Mansabá e Olossato (1968/70).
9. Carlos Vinhal e Esposa, (de Leça), nosso indispensável editor, capaz de pôr alguma ordem nesta imensa avalanche de informação.
10. Albano Costa e Esposa (de Guifões), o fotógrafo de Guidage e da Guiné de agora.
__________

vd artigos de:

Guiné 63/74 - P2536: Guileje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (19): Cotejando as fotos da Fundação Mário Soares com as nossas

Ocupação do Quartel de Guiledje pelo PAIGC, 22 de Maio de 1973: soldado do PAIGC preparando-se para hastear a bandeira.

Foto: Documentos Amílcar Cabral / Fundação Mário Soares (2008) (com a devida vénia...)


Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAV 8350 (Dez 1972/Mai 73), Os Piratas de Guileje > o Fur Mil At Inf Op Esp J. Casimiro Carvalho junto ao monumento aos mortos e feridos da CCAÇ 3325 (que esteve em Guileje de Janeiro a Dezembro de 1971). A penúltima unidade de quadrícula de Guileje foi a CCAÇ 3477 (Nov 1971 / Dez 1972), conhecida por Os Gringos de Guileje.

Foto: © José Casimiro Carvalho (2007). Direitos reservados.


Ocupação do Quartel de Guiledje pelo PAIGC, 22 de Maio de 1973: aspecto do interior do dormitório.

Foto: Documentos Amílcar Cabral / Fundação Mário Soares (2008) (com a devida vénia...)


Ocupação do Quartel de Guiledje pelo PAIGC, 22 de Maio de 1973: aspecto da destruição geral, distinguindo-se, à direita, a entrada de um dos abrigos subterrâneos (e o espaldão do morteiro 81 mm, o mesmo que se vê em maior detalhe na foto a seguir, com o J. Casimiro Carvalho).

Foto: Documentos Amílcar Cabral / Fundação Mário Soares (2008) (com a devida vénia...)



Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAV 8350 (1972/73) > O Fur Mil Op Especiais Carvalho, no abrigo do Morteiro 81

Foto: © José Casimiro Carvalho (2007). Direitos reservados.

Ocupação do Quartel de Guiledje pelo PAIGC, 22 de Maio de 1973: porta de armas com as insígnias da Companhia de Caçadores nº 3477, os Gringos (1971-1972.

Foto: Documentos Amílcar Cabral / Fundação Mário Soares (2008) (com a devida vénia...)



Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAV 8350 (Dez 1972/Mai 73) > O Fur Mil Op Esp J. Casimiro Carvalho, na famosa porta de armas de Guileje... Guiné > Região de Tombali > Guileje > 1972 > O Alf Mil Médico Mário Bravo (que vive no Porto) na porta de armas... O Mário Bavo, que pertenceu à CCAÇ 6 (Bedanda, 1971/72) ia regularmente a Guileje, para prestar assistência médica aos respectivos militares e população.

Foto: © Mário Bravo (2007). Direitos reservados



Amílcar Cabral e Constantino Teixeira, entre outros, a bordo de uma canoa. Uma das fotos-ícone de Cabral. Fotografia da italiana Bruna Polimeni, a fotojornalista que é autora de algumas das fotos mais famosas de Amílcar Cabral, do PAIGC e da luta de libertação da Guiné-Bissau e de Cabo Verde. Recebeu o Prémio Amílcar Cabral em 2006.

Foto: Documentos Amílcar Cabral / Fundação Mário Soares (2008) (com a devida vénia...)

A Fundação Mário Soares (FMS) associa-se à realização do Simpósio Internacional "Guiledje: Na rota da Independência da Guiné-Bissau", que se realiza em Bissau, de 1 a 7 de Março de 2008.

Neste âmbito, o Arquivo & Biblioteca da Fundação Mário Soares preparou um conjunto de documentos e fotografias relacionadas com Guiledje, com recurso, designadamente, ao Arquivo Amílcar Cabral.

De entre esses documentos, agora disponibilziados, é de referir o relatório elaborado, em 1973, pelo PAIGC sobre as forças armadas portuguesas no TO da Guiné (exército, força áérea e marinha), sua organização, meios e efectivos, com base em documentos capturados em Guileje em 22 de Maio de 1973 e que as NT não tiveram tempo de destruir. São 55 páginas, incluindo cópias dos originais. O documento está disponível em pdf.

A página da FMS sobre o Simpósio Internacional de Guileje tem um link directo para o nosso blogue > Luís Graça & Camaradas da Guiné. Foram utilizadas algumas imagens do nosso blogue, com a devida autorização do editor Luís Graça ao coordenador Vitor Ramos.

Para além das fotografias, nossas e do Arquivo Amílcar Cabral, veja-se também os textos (sobre anticolonialismo, Guileje, contexto). Os conteúdos são da responsabilidade de Vitor Ramos e Alfredo Caldeira.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Guiné 63/74 - P2535: PAIGC - Instrução, táctica e logística (9): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (IX Parte): Defesa anti-aérea (A. Marques Lopes)

Guiné > Região de Tombali > Gandembel / Balana >CCAÇ 2317 (1968/69) > Gandembel: A antiaérea que era pressuposto proteger o pessoal contra eventuais ataques ... dos Migs russos da República da Guiné-Conacri. Um dos objectivos (falhados) da Op Mar Verde - que consistiu na invasão do país vizinho, em 22 de Novembro de 1970 - foi justamente a tentativa de destruição dos Migs soviéticos, estacionados no território da Guiné-Conacri, cuja hipótese de utilização, a pedido do PAIGC, era terá sido seriamente ponderada por Spínola e o seu Estado Maior.

Foto gentilmente cedida pelo António Almeida, o intérpetre do Hino de Gandembel, soldado da CCAÇ 2317 (Gandembel/Balana, 1968/69) (1).

Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968 > Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, por ocasião da visita do Presidente da República, Alm Américo Tomás > Metralhadoras pesadas Degtyarev, de origem soviética, em reparos de utilização terrestre e antiaérea (2).


Foto: © Victor Condeço (2007). Direitos reservados .




Continuação do Supintrep, nº 32, de Junho de 1971, documento classificado, de que nos foi enviada uma cópia, em 18 de Setembro de 2007 pelo nosso camarada A. Marques Lopes (qie acrescenta, à margem, a seguinte nota sibilina: Quando eles ainda não tinham os Strella...) (3)


PAIGC - Instrução, táctica e logística (9): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (IX) >

(G). DEFESA ANTI-AÉREA


(1) De documentos capturados foram extraídos os seguintes elementos relativos a defesa anti-aérea:


CONHECIMENTO DA DEFESA ANTI-AÉREA


I – As funções dos aviões de combate



1.º Fazer reconhecimentos pelo ar, uer observando a baixa altitude quer fotografando a alta altitude.

2.º Transportar tropas e materiais.

3.º Lançar espiões.

4.º Atacar de surpresa os objectivos principais.


II – As fraquezas dos aviões


1.º O avião é muito influenciado pelas condições meteorológicas e limitado pelo aeredino e pela gasolina.

2.º Para o avião é muito difícil encontrar os objectivos dissimulados ou camuflados no chão.

3.º O avião não pode ocupar os objectivos terrestres pois somente a infantaria pode resolver o combate terrestre.

4.º Se os destacamentos efectuam movimentos e dispersam, o avião não pode desenvolver plenamente as suas funções.

5.º Se conhecermos as fraquezas e as funções dos aviões podemos evitar as suas qualidades e aproveitar as suas fraquezas. Portanto, os aviões não são omnipotentes nem medonhos. As experiências revolucionárias provaram que, embora o inimigo seja forte, o seu equipamentyo excelente e as sua armas potentes, podem-se inventar muitos meios bons para vencer os aviões inimigos.


III – Como se distinguem os diferentes aviões


Distinguimos o avião para conhecer as suas capacidades e as suas tarefas, para julgar as suas intenções e tomar as medidas convenientes.

1.º As categorias dos aviões segundo a as utilização são as seguintes:

- aviões de combate

- aviões de bombardeamento

- aviões de transporte

- aviões de reconhecimento


2.º Os aviões distinguem-se segundo as suas formas e características.

- Os aviões de combate são de forma pequena e velocidade grande. Andam 300 metros por segundo.

- Os aviões de bombardeamento são de forma grande e velocidade equena; o barulho é grande e os motores são numerosos.

- O avião de reconhecimento é de forma estreita e longa e a velocidade é pequena, o barulho é lento e pode voar a grande altitude.

- O avião de transporte é de forma grande e velocidade pequena – máximo 450 Kms por hora, 125 metros por segundo.


IV – Como se organiza a defesa anti-aérea


Organizar de uma maneira planificada as diferentes armas para abater o avião e os paraquedistas do inimigo, agora vai-se estudar como se deve atirar sobre o avião e os parquedistas com as espingardas e as metralhadoras ligeiras e pesadas.

- O tiro sobre o avião

As condições de espingarda e metralhadoras para atirar no ar são vantajosas por serem fáceis de manejar. Podem-se apontar e atirar rapidamente e o tiro com elas pode formar uma rede de fogo.

- O tempo de começo de tiro

Quando o avião entra no alcance eficaz das nossas armas pode-se começar a atirar. Para atirar sobre o helicóptero do inimigo instalam-se as tropas numa região onde o helicóptero pode aterrar e desde que ele toca a terra é preciso concentrar o fogo para atirar vivamente sobre ele antes que os paraquedistas desçam dele.

Pode-se também organizar e instalar grupos de tiro nas proximidades onde o inimigo pode provavelmente passar e quando o helicóptero passar atirar-lhe de surpresa.

Como se atira sobre o avião inimigo:

- Se o avião se encontra a uma distância de 500 metros marca-se a alça n.º 3;

- Se o avião se encontra à distância de 100 metros vê-se clramente a cabeça e a face do aviador; a 600 metros vê-se claramente a fuselagem do avião, a frente e as asas do avião; a 1200 metros pode-se ver o contorno do avião não se podendo distinguir as diferentes partes;

- Se não se faz o cálculo do alcance do avião escapa-se a posição; para que seja atingido de modo certo calcula-se o alcance do avanço em relação à posição A e quando o avião chega à posição B choca-se com a bala.





Para se saber esta distância há que conhecer duas condições:

- a velocidade do avião;

- o tempo de duraçãoda trajectória, isto é, em quantos segundos a bala percorre a distância da arma ao alvo.

Se o tempo de duração for de 0,5 segundos e a velocidade do avião 100 metros por segundo teremos: o alcance de avanço = 0,5 x 100 metros. Se o avião se encontra em A, aumenta-se 50 metros à frente do avião e o projéctil ai encontrar-se com o avião na posição B.


A direcção da trajectória = correcção da alça + N a multiplicar por duas vezes o menos alcance a dividir por 100.


Velocidade inicial / Algarismo a adicionar

750 m/s .................................... 14

800 m/s .................................... 12

850 m/s .................................... 20


A velocidade inicial da espingarda automática é geralmente 750 m/s; a da espingarda de repetição é geralmente de 800 m/s e da metralhadora ligeira é geralmente de 850 m/s.




(2) Organização defensiva (anti-aérea) de CASSEBECHE

(a) Resumo da Evolução


- Em 06OUT67, estavam referenciados em CASSEBECHE 3 espaldões para metralhadora anti-aérea, localizados nas posições 21,24 e 27 (Ver pág. 82).


- Em 24JAN68, existiam espaldões nas posições 1,2,3 e 4 (este com a forma circular) a oeste e, pelo menos, as posições 21, 24, 25 e 27 a leste, emboa algumas com aspecto desactivado.

- Em 09MAR69, quando da operação VULCANO, existiam espaldões nas posições 1,2,3,4,5,7,8,9 e 10 a oeste, todas desactivadas, e possivelmente três posições para atiradores em 6.

A leste encontravam-se activadas 12 das posições 21,24,25,29,32,34,37,40,48,52 e 55, sendo a posição 37 a da metralhadora quádrupla.

No decorrer da operação, e bem assim na actividade aérea subsequente, foram destruídas ou danificadas as armas instaladas em cinco das posições, deixando o IN de reagir com as restantes, que desmontou.

Verifica-se, assim, que entre 24JAN68 e 09MAR69 o IN modificou o espaldão da posição 4 que passou a ser do tipo “espiral” permitindo montagem da metralhadora quádrupla; construiu as posições 5 a 10 a oeste e cerca de oito outras posições a leste.

- Em 30OUT69 foram identificados os seguintes espaldões: 1,2,3,4,5,7,8,9 e 10 a oeste (a posição 5 com três posições de atiradores) e os espaldões 17,19,20,21,22,23,24,25,27,28,31,32,34,35,37,39,40,41,44,46,48,51,52,53 e 55.

Parece notar-se a realização de trabalhos de beneficiação de quase todas as posições 21,24,28,48,37,44 e 51.

Em data relativamente próxima deviam ter-se iniciado trabalhos de beneficiação na posição 25.

- Em 16DEZ69, não se notaram ainda trabalhos de protecção dos espaldões das armas anti-aéreas nas posições 30, 33 e 38, notando-se já a posição 28 e possivelmente a 47

- Em 10 e 11JAN70, reconhecimento fotográfico e fotográfico/visual revelaram:

(i) recente construção de uma trincheira – 11,12 a 15 – com posições para atirador isolado e, provavelmente, duas posições de armas pesadas destinadas a tiro rasante, 13 e 14, e a construção de uma trincheira de combate de traçado irregular, 16; salienta-se que estas trincheiras se situavam de forma a evitar qualquer aproximação pelas direcções por onde foi tentada a das tropas pára-quedistas em MAR69;

(ii) a construção de mais um espaldão de metralahdora anti-aérea, 42;

(iii) a construção de posições defensivas avançadas para protecção dos espaldões; posições 26, 28, 30, 33, 36, 38, 43, 47 e 54 (admite-se como possível que as posições 28 e 47 já estivessem iniciadas em 10DEZ69;

(iv) a realização nítida de trabalhos de beneficiação dos espaldões 17, 19, 20, 22, 23, 24, 25, 29, 31, 32, 34, 35, 37, 39, 40, 41, 46, 48, 52, 53 e 55.

(v) Salienta-se que nos espaldões 24, 25, 34, 48 e 53 os trabalhos de beneficiação pareciam ser apenas nos espaldões e não no poço e trincheira para a instalação de armas e guarnições respectivas.

(vi) Destacava-se, ainda, a ausência de trabalhos de beneficiação nos espaldões 21, 27, 44 e 51.

(vii) Não foi possível concluir da existência de trabalhos de beneficiação nas posições 1 a 10.

(viii) A ligação entre a trincheira de comunicação 15 e a trincheira de combate 16 não estava ainda concluída.


(b) Procedimentos assinalados



- A partir da acção de pára-quedistas em MAR69 e dos ataques aéreos subsequentes verificou-se um desembaraçamento dos campos de tiro, realizado à custa de abate de árvores e palmeiras.

- Verificava-se o extremo cuidado posto na camuflagem das posições à medida que se processava a sua construção, sendo os espaldões das posições de anti-aérea camuflados com ramos de palmeira colocados radialmente e as trincheiras e posições de combate para atiradores de armas ligeiras camufladas com tufos de capim que dão um aspecto “mosqueado” às posições.

- A falha mais assinalável era a falta de camuflagem das áreas onde foi feita remoção de terras, nomeadamente no interior das trincheiras e poços e na área adjacente aos espaldões de metralhadora anti-aérea.

- Após a concluisão dos trabalhos procedeu-se à instalação do armamento pesado, havendo que distinguir dois tipos de espaldões, provavelmente destinados a tipos diferentes de armamento.


Espaldões tipo “espiral”

Têm parede dupla e admite-se que se destinam a receber material cujo reparo seja susceptível de ser montado sobre rodado, sendo de admitir que se destinem a metralhadoras quádruplas.


Espaldões circulares


Têm paredes simples, com uma pequena entrada – 19 – apresentando no centro um poço ligado a uma trincheira em forma de “T”.

Admite-se que um dos ramos do “T” possa vir a ser coberto, ficando com a forma de “L”, como nas posições mais antigas – 23 -, servindo o ramo coberto para a guarnição se abrigar.

Estes espaldões admite-se que possam vir a receber apenas metralhadoras com um raparo relativamente pequeno, e portanto metralhadoras simples, no máximo duplas.

Estão neste caso as posições 1, 2, 3, 5, 7, 9, 17, 20, 21, 23, 25, 27, 34, 35, 39, 40, 41, 42, 45, 46, 48 e 55.


Espaldões de outro tipo


Com contorno exterior diferentes aparecem-nos os espaldões 29 e 53.

Verificou-se o crescimento da organização defensiva com vista à instalação de armas ligeiras, caso das trincheiras, posições avançadas, etc., podendo-se admitir que o In visou estabelecer uma organização defensiva anti-aérea e terrestre sendo, neste caso, os espaldões circulares destinados também à instalação de armas de tiro curto.


(c) Possibilidades de tiro


A forma como os espaldões estavam construídos faz supor que as posições dotadas com armas antia-aéreas dificilmente poderiam ser utilizadas em tiro terrestre com uma rasança aceitável.


(d) Instrução das guarnições


- No interior do perímetro defensivo notava-se a existência de diversas cubatas que poderão agrupar-se em três tipos mais ou menos distintos:

(i) do tamanho normal de uma casa balanta – A –

(ii) sensivelmente com metade desse tamanho – B –

(iii) de dimensões mais reduzidas – O –

- Admite-se que nalgumas destas casas pudessem habitar as guarnições das armas enquanto que outras poderiam servir de depósito de munições e material.

As casas de dimensões muito reduzidas pareciam cobertas de “IRÃS”.

- Não se notava em todo o perímetro defensivo a existência de escavações destinadas a abrigos nem terreno sobreelevado que pudesse corresponder à cobertura desses mesmos abrigos.

- A verificar-se a existência de tais abrigos admite-se que tenham sido cavados em “galeria”, o que, dada a consistência do terreno de areia, levaria à necessidade da existência de um sistema de cofragem eficiente.


(e) Finalidade da organização defensiva


- Admitindo-se o princípio, geralmente aceite, que a organização defensiva é uma envolvente das instalações a defender, não se vislumbram no interior da posição a existência de qualquer instalação de valor que justificasse tamanha organização do terreno.

- Admitindo-se que aquela organização defensiva pretendia garantir a defesa de quaisquer instalações excêntricas não se vê que as tabancas situadas imediatamente a norte, 5 casas, ou as situadas a sul, com sinais de intensa actividade e apreciável número de casas, fossem de molde a justificar só por si tamanha organização, ainda que se parta do princípio ser aquela uma região extremamente rica em gado, arroz e cola, visto que a área efectivamente defendida é muito reduzida relatiamente à extensão total da região.

Parece igualmente pouco provável que o IN tivesse concentrado na região depósitos de material, pois embora a região lhe permita um acesso fluvial fácil podê-los-ia construir com maior segurança em zona de mata densa, a coberto das vistas da nossa FA.

- Pondo de parte estas duas hipóteses poderemos ainda admitir que:

- as instalações tenham apenas um fim de propaganda e sejam aproveitadas para tentar materializar os cuidados dispensados pelo PAIGC às populações sob o seu controle no, por ele chamado, “território libertado”;

- o PAIGC tenha instalado na região um campo de treino, aproveitando para instruir o pessoal na construção de trincheiras e espaldões e, eventualmente, na reacção contra meios aéreos; a região tem um acesso fácil por via fluvial permitindo o transporte de material pesado;

- o PAIGC vise desviar a atenção dos nossos meios aéreos para uma região de menos interesse relativamente a instalações principais existentes no QUITAFINE; esta hipótese parece, aliás, pouco provável pois nesse caso deveria ter o cuidado de afastar as populações ad proximidade, facto que se não verifica, e não é de admitir que o PAIGC queira expor desnecessariamente essas populações;

- o PAIGC procure apenas causar baixas nos nossos meios aéreos; esta hipótese parece igualmente pouco lógica pois poderia obter resultados mais compensadores noutros pontos do território, actuando por surpresa, concentrando e dispersando as suas armas AA por forma a não oferecer um alvo remunerador par acções das NT ou da nossa Força Aérea.

- Embora não se disponha de elementos que permitam concluir a existência de trabalhos de beneficiação de núcleos de posições 1 a 10, aliás desactivadas em MAR69, há ainda a possibilidade de apoio dos dois núcleos 1/10 e 51/55 e a sua colaboração na defesa de qualquer objectivo intermédio, que também não está referenciado.


(f) Conclusão




Este estudo, baseado essencialmente em documentação fotográfica, tem apenas avaliar da evolução da organização do terreno não permitindo avaliar as intensões do IN quanto à montagem de armamento e objectivos a defender, pelo que as hipóteses postas em (a) não podem considerar-se como válidas sem uma análise conjugada com o conhecimento das suas intenções, facto que nunca foi obtido.


(g) Pormenor de espaldões



Organização Defensiva da Ilha de Cassebeche [, a sul de Cacine, junto à fronteira com a Guiné-Conacri, incluída no mapa de Cassumba, um dos poucos mapas que nos falta pôr em linha]


____________________

Notas dos editores:

(1) Vd. postes de:

22 de Novembro de 2007 < Guiné 63/74 - P2295: Hino de Gandembel, cantado no almoço da mini-tertúlia de Matosinhos (A. Marques Lopes / Carlos Vinhal)

28 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2311: Vamos expor o Álbum Fotográfico dos homens-toupeiras de Gandembel ? (António Almeida / Idálio Reis / Luís Graça)

(2) Vd. postes de:

13 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1756: Exposição de armamento apreendido ao PAIGC, aquando da visita de Américo Tomás (Bissau, 1968) (Victor Condeço)

17 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1764: Armamento do PAIGC (1): Metralhadoras pesadas Degtyarev, antiaéreas (Nuno Rubim)

(3) Vd. poste de 19 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2454: PAIGC - Instrução, táctica e logística (8): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (VIII Parte): Minas III (A. Marques Lopes)

Guiné 63/74 - P2534: Convívios (39): II Encontro de ex-Combatentes da Guiné do Concelho de Matosinhos, 12 de Abril de 2008 (Carlos Vinhal)



Momento de fado, no I Convívio, interpretado por camaradas com jeito e arte.

Foto: © Albano Costa (2007). Direitos reservados.

No dia 12 de Abril de 2008 vai realizar-se o 2.º Encontro de Ex-Combatentes da Guiné do Concelho de Matosinhos.


Os interessados em participar no almoço deverão inscrever-se até ao dia 31 de Março de 2008.

Contactos:
Manuel Agostinho, telem 969 023 731
António Maria, telem 938 492 478
Carlos Vinhal, telem 916 032 220

OBS:- Com muito prazer aceitaremos inscrições de ex-combatentes da Guiné de outros concelhos, especialmente do Grande Porto, que queiram confraternizar connosco.

Carlos Vinhal
_________

Notas de CV:

(1) Vd. post de 7 de Março de 2007 Guiné 63/74 - P1570: Almoço-convívio de camaradas de Matosinhos (Albano Costa / Carlos Vinhal)

(2) Comentário a este post, feito por um leitor identificado:

Cada vez que aqui venho, entre o muito que aprendo e o muito que me emociono, fico sempre com uma certeza outra: a da imensa dignidade da vossa camaradagem e da vossa ausência de ressentimento.
Aqui se destaca com grande evidência a generosidade, a sabedoria e a inteligência do papel das Forças Armadas... Infelizmente... os mandantes de hoje parecem sofrer todos de memória de grilo!
Os melhores cumprimentos, Senhor e Senhores.

Guiné 63/74 - P2533: O cruzeiro das nossas vidas (10): Fui e vim no velho e saudoso Niassa (Manuel Traquina)

Lisboa > T/T Niassa > Navio misto (carga e passageiros), de 1 hélice, construído em 1955, na Bélgica, registado no Porto de Lisboa, e abatido em 1979; comprimento: mais de 151 metros; arqueação bruta: c. 10.742 toneladas; potência: 6.800 cavalos ; velocidade normal: 16,2 nós; alojamentos para 22 em primeira classe, 300 em classe turistica, no total de 322 passageiros; nº de tripulantes: 132; armador; Companhia Nacional de Navegação - Lisboa.

Fonte: Navios Mercantes Portugueses (2004)página de Carlos Russo Belo (2006) (com a devida vénia...). O autor foi oficial da marinha mercante.

Manuel Traquina ex-Fur Mil, CCAÇ 2382, Buba, 1968/70 (1)


Assunto - A Guiné, os Tempos de Guerra > CCAÇ 2382 (1968/70) > O velho Niassa (2)


O Velho Niassa... Foi este o navio que nos transportou à Guiné, e também de regresso a Portugal. Antes tinha sido um cargueiro, farto de cruzar oceanos, tal como o Uije, o Alfredo da Silva e outros. Foi no inicio da guerra colonial adaptado ao transporte de tropas.

Terá feito imensas viagens à Guiné, Angola e Moçambique, milhares de ex-militares ainda hoje se recordam da incómoda viagem, com os habituais enjoos, e também de um ou outro dia mais calmo que lhes dava tempo para dormir uma sesta no convés, e com um canivete entalhar na madeira o seu nome, a data, ou outra referência! Compreende-se que, depois das muitas viagens realizadas e dos milhares de militares transportados, aquele convés quase já não tinha um pedaço de madeira disponível para mais um nome!

Além dos enjoos e das noites mal dormidas a bordo, recordamos também que tinha uma agradável sala de jantar, destinada apenas a oficiais e sargentos. Já do alojamento para os soldados o mesmo não se pode dizer, em todos os cantos do porão tinham sido improvisados dormitórios, as condições eram deploráveis. A comida era razoável, no entanto a sopa, embora fosse a mesma todos os dias, no menu tinha todos os dias um nome diferente...

O bar onde se bebia whisky, cerveja e se jogava à lerpa, dispunha de um pequeno conjunto musical que à meia tarde tocava sempre os mesmos trechos musicais, enfim o seu repertório não era muito vasto…

Deste navio recordamos ainda o barulho característico dos seus potentes motores e das suas hélices, e também a luz do luar reflectida na imensidão das águas do Oceano Atlântico.

Um dos passatempos a bordo era enviar mensagens dentro de garrafas de cerveja que eram atiradas ao mar, curioso é que pelo menos uma delas foi encontrada, passado não muito tempo a resposta a uma dessas mensagens - calculem... - veio de uma praia do Sul de Espanha onde una Chica de corpo bronzeado (presume-se) a terá encontrado, e assim se arranjou madrinha de guerra que quase deu em namoro…

Porém não há mal que sempre dure: a guerra acabou, também para aquele velho barco as viagens terminaram, soubemos que ele terá sido vendido a quem lhe mudou o nome, e o levou para a América Central onde ultimamente desempenhava funções de barco/hotel.

No entanto, acho, que poderia ter um fim mais glorioso em Portugal, já que aqueles que nele viajaram nunca o irão esquecer, bem como as inscrições que nele foram feitas que representam também uma página da história da guerra colonial.

Manuel Batista Traquina
(Ex-Furriel Miliciano)
____________

Notas dos editores:

(1) Vd. postes de:

2 de Janeiro de 2008> Guiné 63/74 - P2399: Tabanca Grande (47): Manuel Traquina, ex-Fur Mil, CCAÇ 2382 (Buba, 1968/70)

2 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2500: Histórias de Manuel Traquina (1): CCAÇ 2382 - A hora da partida

(2) Vd. postes anteriores desta série:

12 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1271: O cruzeiro das nossas vidas (1): O meu Natal de 1971 a bordo do Niassa (Joaquim Mexia Alves)

19 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1296: O cruzeiro das nossas vidas (2): A Bem da História: a partida do Uíge (Paulo Raposo / Rui Felício, CCAÇ 2405)

21 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1300: O cruzeiro das nossas vidas (3): um submarino por baixo do TT Niassa (Pedro Lauret)

21 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1301: O cruzeiro das nossas vidas (4): Uíge, a viagem nº 127 (Victor Condeço, CCS/BART 1913)

11 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1420: O cruzeiro das nossas vidas (5): A viagem do TT Niassa que em Maio de 1969 levou a CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Manuel Lema Santos)

15 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1953: O cruzeiro das nossas vidas (6): Ou a estória de uma garrafa, com o SPM de Mansoa, que viajou até às Bahamas (Germano Santos)

3 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2025: O cruzeiro das nossas vidas (7): Viagem até Bolama com direito a escalas em Leixões, Mindelo e Praia (Henrique Matos)

13 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2044: O cruzeiro das nossas vidas (8): Porto de Lisboa, Cais de Alcântara (Luís Graça)

15 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2050: Cruzeiro das nossas vidas (9): Do Funchal para Bissau no Ana Mafalda (Carlos Vinhal)

Guiné 63/74 - P2532: Tabanca Grande (56): José J. Macedo, ex-2º tenente fuzileiro especial, natural de Cabo Verde, imigrante nos EUA

José J. Macedo, quando era cadete da Escola Naval, em Portugal... Foi FZE (fuzileiro especial na Guiné, 1973/74, DFE 21)
  O José Macedo, natural de Cabo Verde, ex-tenente fuzileiro especial, vive nos Estados Unidos desde 1977. É advogado, segundo informação telefónica que deu ao nosso co-editor Virgínio Briote. 

Fotos: José Macedo (2008). Direitos reservados 


1. Em 19 de Janeiro de 2008, recebemos uma mensagem de José J. Macedo, natural de Cabo Verde, e que vive nos Estados Unidos, desde 1977. Esteve na Guiné, em 1973/74 "como oficial do Destacamento de Fuzileiros Especiais 21 (DFE21) (...), o primeiro Destacamento de Fuzileiros Especiais africano e que tomou parte, entre outras, na célebre Operação Mar Verde de que muito se fala no blogue". 

O José J. Macedo esteve , com o seu destacamento, em Vila Cacheu, Bolama e em Cacine "para as evacuações que foram feitas aos aquartelamentos do Sul". Faz questão de dizer que , "como Cabo-verdiano, nado e criado, tive e continuo a ter uma perspectiva diferente dos bloguistas do seu blogue sobre o que se passou na Guiné durante a Guerra Colonial". 

Define-se como "um leitor diário do blogue e muitas das crónicas me fazem viajar no tempo a Susana, São Domingos, Canchungo e outros locais da Guiné". Tem, no entanto, reservas em participar no blogue devido ao tipo de linguagem que muitas vezes usaríamos. O Macedo acha-a, por vezes, "racista", com uso e abuso de "expressões de caserna" que ele não aprecia nem aprova. "Parece que há membros da tertuúlia que têm prazer especial em usar nharro, preto pu** e outros termos pejorativos quando se referem aos Guineenses , inclusive aqueles que estiveram ao lado de Portugal". 

Em contrapartida, das "poucas vezes que li intervenções que Guineenses e/ou Cabo-verdianos que participaram na luta de libertação nacional pelo PAIGC, nunca vi nenhuma referência pejorativa em relação aos soldados Portugueses que lutaram na Guiné". 

Em suma, para o nosso visitante José Macedo e antigo camarada de armas não se trata de ser politicamente correcto , como está na moda dizer, mas tão apenas de "não chamar aos outros o que não gostaramos que nos chamassem a nós". Manda-nos "um abraço amigo". 


2. Em 21 de Janeiro, voltou a mandar-me um mail, que passo a transcrever (em parte): 

Luis: 
Espero que ja tenha recebido o meu e-mail com a minha apreciação do blogue. Estive a ler as normas de conduta e apenas gostaria de fazer um reparo: a norma (ix) garante a todos os tertulianos a "liberdade de expressão", razão porque, na minha opinião, aparecem expressões como as que mencionei no meu e-mail anterior. Contudo, parece-me que o Artigo (ix) está em colisão com o (iv), "Carinho e Amizade Pelos Nossos Dois Povos" e o (v), "Respeito Pelo Inimigo de Ontem." Acho que quando a Liberdade de Expressão serve para negar "Carinho, Amizade e Respeito", a mesma deveria ser cerceada. O exemplo típico para os constitucionalistas é que ninguém tem a liberdade de gritar FOGO num cinema cheio de espectadores (...). 


3. Na qualidade de fundador e editor do blogue, mandei-lhe a seguinte mensagem, em 22 de Janeiro: 

Meu caro José Macedo: 
Antes de mais, obrigado pela sua crítica ao nosso blogue. Vou, naturalmente, publicá-la. O seu ponto de vista merece-me todo o apreço e consideração que é devida a um antigo camarada de armas, e para mais cabo-verdiano, terra que amo desde pequenino, e onde tenho bons amigos. Tenho pena que não queira entrar para esta Tabanca Grande, e partilhar connosco as suas memórias dos fuzileiros e das suas emoções da Guiné... 

Farei, eu ou os meus co-editores, algumas apreciações às suas críticas, naquilo em que elas nos parecem injustas: por exemplo, nunca fizemos aqui a apologia do racismo ou publicámos relatos de violação de crianças ou adolescentes... São questões factuais: se achar que sim, diga-me onde e quando... Isto tem que ser dito, e com veemência. Somos gente com valores, aliás basta ver a nossa preocupação com as questões éticas... 

O seu reparo sobre eventuais contradições entre as nossas normas de conduta e a nossa prática editorial tem razão de ser... Mas isso acontece com tudo na vida... Como sabe, há várias questões fracturantes entre nós, amigos e camaradas da Guiné: por exemplo, os desertores, os fuzilamentos dos nossos camaradas guineenses, o 25 de Abril... Mas até agora temos sabido viver com as nossas diferenças... 

Quanto à linguagem de caserna, bom... O que é que eu posso dizer-lhe ? Não somos um blogue de meninos de coro... Mas prometo estar vigilante ao uso e abuso de expressões que eventualmente possam ter conotações racistas e sexistas... Felizmente não tenho nem formação nem mentalidade de censor...Naturalmente que tenho que assumir a minha responsabilidade como fundador e editor deste blogue (que é colectivo e onde coexistem muitas sensibilidades e idiossincrasias)...Irei procurar manter a coerência com as nossas normas de conduta... 

Obrigado por nos ler e criticar. Mas apareça mais vezes, que hoje já não temos o Atlântico a separar-nos. E, claro, fica sempre de pé o nosso convite para franquear o pórtico da nossa Tabanca Grande. 

Um Alfa Bravo. 
Luís Graça 


4. O nosso co-editor Virgínio Briote, que foi Alferes Comando da 1ª geração (Guiné, Brá, 1965/66), superior hierárquico do Justo e do Marcelino da Mata, entre outros, mandou-me a seguinte apreciação: 

Estou surpreendido com a leitura que o José Macedo faz. Não me lembro de ler as expressões com sentido pejorativo. A preocupação com o políticamente correcto, a nós, não se aplica porque não sentimos necessidade de pensar nesses termos. Falo por mim, mas não só, falo pelo que tenho lido até à data. (...) 

Puta é conversa de caserna e fora da caserna, é uma expressão menos corrente aqui que nos USA. É fuck para aqui fuck para acolá, presidentes americanos incluídos. Nharros? Só se for. 

E para uma observação isenta, é necessário não excluir os conhecimentos da língua de quem lê, os hábitos de leitura e tantas outras coisas. É assim que obras louvadas por muitos são apelidadas de pastelões por muitos outros também. 

Mas, esta não esperava. 

Um abraço, 
vb 


5. Resposta do José Macedo, com data de 21 de Janero: 

Luis: 
Obrigado pela sua resposta. Tenho seguido as vossas iniciativas e a divulgação da história de todos nos que passámos pela Guiné-Bissau. Através do blogue recordo os momentos (bons e maus) que por lá passei. Como falo o crioulo de Cabo Verde, muito semelhante ao da Guiné-Bissau, tive a sorte de poder compartilhar do dia a dia dos fuzileiros do meu destacamento, nas minhas viagens a São Domingos e São José no Chão Felupe e com os Manjagos de Canchungo. 

Também convivi com os Comandos de Brá, nomeadamente o Justo, o Folques, o Sicri Vieira e muitos outros. Com o Zicky Saiegh convivi de perto, pois era afilhado do meu tio Agnelo Macedo, que foi chefe de posto em Catió e esteve preso na Ilha das Galinhas, por alegadamente ter tido uma reunião em casa com o Aristides Pereira e outros quadros do PAIGC. 

Quando vou de férias a Portugal, um dos highlights da minha visita é encontrar-me nos Restauradores com o Sino Uie Cambe e o Saco Sano, fuzileiros do DFE 21, especialistas no MG-42 e na bazuca respectivamente, que se deliciam em contar e recontar as peripécias da Operacao Mar Verde e a veneração que têm pelo Comandante Rebordão de Brito. Também me contam o destino triste (fuzilamento) de alguns elementos do 21. 

Um abraço amigo 
Jose J. Macedo 


6. Novo mail do José Macedo: 

Luís: 
Obrigado pela sua resposta. Deve ter havido um mal entendido sobre ser apologista de atitudes racistas ou sexistas. Houve sim, não me lembro bem a data, em que um dos camaradas escreveu um texto a rondar o racismo e o o Luís disse que "sabia que ele não era racista" ou algo parecido. 

Se calhar por ser imigrante e viver numa sociedade multicultural, sou mais sensível a certas abordagens do blogue. Tambem eu sofri perdas de amigos e camaradas africanos do meu destacamento que foram fuzilados na Guiné. Sei que o blogue não faz , ou pelo menos tenta não fazer, juízo de valores; contudo, idolatrar (como alguns o fazem) o Marcelino da Mata... Please

Um abraço amigo, 
José J. Macedo. 


7. Zé Macedo: 

Estamos de acordo em relação ao Marcelino da Mata (...). Não o conheço sequer pessoalmente. Mas não posso impedir que haja pessoas, no nosso blogue, que com ele conviveram na Guiné e que escrevam sobre ele (...). 

Peço-lhe que, ao analisar o nosso blogue, veja a floresta e não apenas a árvore (centenas de pessoas que já cá escreveram, cerca de 2500 postes, meio milhão de visionamentos, vários milhares de fotos e outros documentos publicados, etc.), e sobretudo o reforço da amizade entre os nossos povos, o exorcismos dos nossos fantasmas, o direito à memória, etc....Você não tem muitos blogues deste tipo no mundo: infelizmente, os nossos amigos guineenses que combateram, tanto do nosso lado como do lado do PAIGC, não têm os mesmos meios (tecnológicos e outros) que nós temos... 

Mas, deixe-me que lhe diga, que temos incentivado e apoiado, através do nosso amigo Pepito e do seu/nosso Projecto Guileje, a preservação da memória dos antigos combatentes do PAIGC... Muito provavelmente, sem a nossa existência (colectiva, como blogue e como grupo) não seria possível a realização, no próximo mês de Março de 2008, do Simpósio Internacional: Guileje na Rota da Independência da Guiné-Bissau... (...) 

Gostaria de publicar, no nosso livro de visitas, alguns das suas observações e críticas em relação ao nosso blogue...Mas parte da nossa correspondência é privada... Já limámos algumas arestas, desfizemos alguns equívocos... Enfim, gostaria de o receber na nossa Tabanca Grande como um ex-camarada da Guiné e, porque não, como um amigo... Em suma, o que quer que eu publique (ou não) das suas mensagens anteriores ?... Não me interessa criar polémica (com os meus co-editores e com outros camaradas...) por questões de lana caprina... E quero que você entre pela porta grande... Pode ser ? Estou a fazer-lhe um convite. 

Um Alfa Bravo. 
Luís 


8. A resposta do nosso camarada não podia ser mais clara: 

Podes publicar a nossa comunicação. Acho que não será tão polémica como pensamos, pois como disse, ja limámos as arestas dos possíveis conflitos. (...) Publicar no blogue a nossa correspondência pode ser que ajude algum camarada a não usar a chamada conversa de caserna quando se refere a outros camaradas. 

Um abraco amigo, 
 Jose Macedo 


9. Nova mensagem a 5 de Fevereiro: 

Luis: (...) 
Depois de ter viajado ultimamente pelo blogue e com a próxima realização do Simposio de Guiledge, recordo-me que o meu destacamento, o DFE 21 de Fuzileiros Africanos, esteve em Cacine a montar segurança e a ajudar com a evacuação o para uma LDG de uma companhia do exército, na sua maioria soldados Açoreanos. 

Até me lembro de um triste episódio que aconteceu durante o transbordo em que um soldado, com armas e bagagens caiu ao rio e desapareceu. Como era noite, nada se pode fazer. Ele, que de certeza tinha sobrevivido ao infernos de Guiledge ou talvez do de Gadamael, para vir morrer nas margens do rio Cacine. 

Tambem gostaria de contactar alguém que tivesse estado na Companhia do Exército em Cacheu de 73-74. Se não me engano, o comandante era Capitão Rodrigues, de Aveiro. Também me lembro de ir a São Domingos, onde havia uma Companhia do Exército, a Suzana e São José, no Chão Felupe. Tinha formado uma equipe de futebol com miúdos do Cacheu e jogávamos contra os soldados. 

Gostaria que alguém que tivesse estado em Vila Cacheu, São Domingos ou Cantchungo (Teixeira Pinto), nessa altura, aparecesse no blogue

Um abraco amigo. 
José Macedo 
Tenente FZE DFE21-Guine 

PS - Mandei-lhe uma foto recente. Junto lhe envio uma dos meus tempos de cadete da Escola Naval. Se encontrar uma do meu tempo de fuzileiro, vou-lha enviar. 


10. Mensagem do editor do blogue, com data de 6 de Fevereiro: 

Obrigado, Zeca: 
Isto quer dizer que passarás a ser membro de pleno direito da nossa Tabanca Grande... E já agora, manda-nos uma estória (ou mais, as que quiseres) sobre o teu tempo de Guiné e sobre os teus fuzileiros... A actividade dos fuzileiros tem sido muito pouco abordada no nosso blogue... 
Fica bem. 

Aquele abraço. 
Luís

Guiné 63/74 - P2531: Ser solidário (4): Coimbra encaixotou o maior contentor de apoio humanitário à Guiné-Bissau





1. Transcrição da notícia de João Henriques no Diário de Coimbra de 10 de Fevereiro de 2008, com a devida vénia

Coimbra encaixotou "maior contentor" de apoio humanitário à Guiné-Bissau

O maior contentor de apoio humanitário à Guiné-Bissau vai chegar este mês a África.

Ontem, cerca de 20 voluntários arrumaram os mais de dois mil caixotes recolhidos. Os donativos vão ser entregues, pela Associação Humanitária Memória e Gentes, às instituições e escolas mais carenciadas.

Lá em cima, bem no alto, o sol brilhava intensamente. O dia era de Primavera antecipada. O calor fazia-se sentir e o suor escorria-lhes pela cara abaixo. Bastavam alguns (poucos) minutos a conviver com os raios do astro-rei para se sentir o termómetro a subir. Não havia dúvidas de que o dia estava convidativo para um passeio, de preferência à beira mar ou à beira rio, consoante as preferências.

Mas houve quem tivesse estabelecido outro programa para o dia de ontem.
O encontro estava marcado para o Estádio Municipal Sérgio Conceição, em Taveiro. Não! O objectivo não era assistir a um qualquer jogo de futebol.
A missão era outra. Muito mais trabalhosa, mas, em simultâneo, mais recompensadora para a alma. O sol, o tal que brilhava ontem a grande altura, também vai aparecer na Guiné-Bissau.

Vai demorar mais alguns dias. Apenas o tempo de fazer chegar a África o contentor carregado de coisas boas. O brilho vai, de certeza, estender-se às crianças, arrastando, sem dificuldade, muitos adultos. A felicidade vai invadir-lhe os rostos. Pode ser por pouco tempo, mas nunca mais se vão esquecer. As lágrimas, de felicidade, também vão cair. Para quem quase nada tem, qualquer ajuda significa o renascer. Um amanhã melhor.

Por baixo da bancada do Estádio Municipal Sérgio Conceição, as caixas amontoavam-se numa espécie de armazém improvisado. Estavam todas numeradas e devidamente identificadas por categorias. Material escolar, roupas, bens de saúde. Havia de tudo um pouco. Feitas as contas eram mais de duas mil embalagens. A chegar, estava um camião do Porto. Lá dentro, mais uma série de material já encaixotado.

Os carregadores voluntários foram chegando. Eram cerca de duas dezenas. Todos com a vontade de contribuir para, o mais depressa possível, esgotarem o espaço disponível no contentor. Inicialmente, era para ter 20 toneladas. Revelou-se pouco espaçoso face aos donativos amealhados. Teve de se arranjar um com o dobro do tamanho.
Dentro de 12 dias vai chegar à Guiné-Bissau.

O contentor segue por via marítima. Na Guiné-Bissau, vai ser descarregado na cooperação portuguesa. Por terra, três carrinhas e cinco jipes também vão partir.

Na expedição humanitária, organizada pela Associação Humanitária Memória e Gentes, vão 26 pessoas.
São 12 de Coimbra e 14 do Porto. Ainda há duas vagas.
Durante oito, nove dias passam por Portugal, Espanha, Marrocos, Saara Ocidental, Mauritânia, Senegal e Guiné-Bissau.
A entrada no continente africano vai ser por Tânger.

Expedicionários partem dia 21

Os expedicionários, cada um paga a viagem do seu bolso, arrancam no próximo dia 21. A saída está agendada para as 9h00, do Largo da Portagem, em Coimbra. Conimbricenses e portuenses saem juntos rumo a Tenerife. Pela frente, vão ter «duros e cansativos» cinco mil quilómetros. Alguns de estradas boas, outros (muitos) de caminhos ruins a que se pode chamar tudo menos estrada.

A campanha de recolha de bens começou em Janeiro e terminou anteontem. Agora, vão ser entregues às instituições e escolas mais carenciadas da Guiné-Bissau. Uma entrega que se pretende «controlada». A outra parte será distribuída, directamente, pelos expedicionários em escolas do interior, regiões privilegiadas, tendo em conta o risco de na capital, Bissau, entrarem no "mercado negro".
«O maior contentor de apoio humanitário à Guiné-Bissau» já está em marcha.

Muitos e essenciais bens

A operação logística de ontem permitiu ficar a saber que, no contentor, seguem, entre outras coisas, cadeiras de rodas, canadianas, material escolar, livros, roupa para todas as idades e bens de saúde. Tudo recolhido em apenas três semanas. A Associação Humanitária Memória e Gentes garante tratar-se do «maior contentor de apoio humanitário à Guiné-Bissau».

Fernando Ferreira, membro da associação, explicou que «a distância da viagem e as elevadas temperaturas» são dificuldades a enfrentar pelos expedicionários. Antes, ainda em Portugal, já superaram outras adversidades. Todos os dias à noite se reuniam no Estádio Municipal Sérgio Conceição para organizar as caixas. O extraordinário volume de donativos recolhidos ultrapassou as melhores expectativas da organização.
«Foi largamente ultrapassado, tendo mesmo forçado a alterar, para o dobro, o tamanho do contentor», observou José Moreira, presidente da associação e antigo combatente na Guiné em 1966 e 1967.

Apoiados a todos os níveis

Para tornar possível uma missão deste género é necessário recorrer a várias sinergias.
O contentor foi cedido pela Portline, empresa que centra a sua actividade no transporte marítimo e que vai colocar o material a custo zero na Guiné-Bissau.
A Câmara Municipal de Coimbra, o Governo Civil de Coimbra e a Junta de Freguesia de Taveiro também apoiaram a Associação Humanitária Memória e Gentes.
Além da recolha de material, contribuíram, ainda, com a oferta de bens diversos.
Os agradecimentos estendem-se à Alfândega da Figueira da Foz, assim como à Associação de Deficientes das Forças Armadas de Coimbra. Várias empresas, entre as quais a Âmbar, Águas do Luso, Babou e o livreiro José de Almeida Gomes e Filhos, Lda, engrossam a lista de «grandes apoios».
A Liga dos Combatentes tem um protocolo de missão conjunta com a associação, que tem como objectivo ajudar não só a Guiné-Bissau, mas todos os PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa).

O Ministério dos Negócios Estrangeiros presta apoio ao nível do contacto com as embaixadas, uma vez que a expedição vai passar por países em risco.
A Associação Humanitária Memória e Gentes, que não esquece os particulares que ofereceram diversos bens essenciais, colabora com a Associação Saúde em Português, transportando material a pedido desta organização não governamental.

João Henriques
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Notas dos editores:

(1) Vd. posts da série, de:

21 de Janeiro de 2008> Guiné 63/74 - P2466: Ser Solidário (1): Pe. Almiro Mendes, Pároco da freguesia de Ramalde, Porto, partiu hoje de jipe, para a Guiné-Bissau

24 de Janeiro de 2008> Guiné 63/74 - P2476: Ser solidário (2): Notícias do Almiro Mendes e do Xico Allen na rota do Dakar, a caminho de Bissau (Álvaro Basto)

28 de Janeiro de 2008> Guiné 63/74 - P2488: Ser solidário (3): Notícias do Pe. Almiro Mendes e do Xico Allen na rota do Dakar, a caminho de Bissau (Álvaro Basto)

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Guiné 63/74 - P2530: Guileje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (18): Meios de pagamento, câmbios, telemóveis, Net e saúde (Pepito)


Guiné-Bissau > Bissau > Bissalanca > Abril de 2006 > Aeroporto Internacional Osvaldo Vieira (um dos históricos dirigentes do PAIGC, morto durante a guerra de libertação)

Foto: © Hugo Costa (2006). Direitos reservados.


Guiné > PAIGC > "Grupo de dirigentes do PAIGC distinguindo-se Mussa Fati, Francisco Mendes, Lay Seck, Amílcar Cabral, Constantino Teixeira, Osvaldo Vieira e Bobo Keita"...
Guiné > PAIGC > "Grupo de dirigentes da luta, distinguindo-se Amílcar Cabral, João Bernardo Vieira (Nino), Osvaldo Vieira, Constantino Teixeira e Domingos Ramos"

Fotos e legendas: Documentos Amílcar Cabral/ Fundação Mário Soares (com a devida vénia...).



1. Mensagem do Pepito, em resposta a pedidos de esclarecimento do editor do blogue, sobre a estadia em Bissau:

Luís

Aqui seguem algumas das informações que pediste e que julgo poderem responder às duvidas existentes. Seria bom que todos os participantes nos pedissem informações práticas deste tipo, pois muitas vezes não nos apercebemos das dúvidas a esclarecer.
abraço

pepito


2. Guileje: Simpósio Internacional > À atenção dos participantes que vêm do Exterior


Mais informações úteis para todos os participantes que vêm da Europa (1):

Meios de pagamento:

Em Bissau só existe uma caixa multibanco, recentemente inaugurada, e que só serve para levantar dinheiro dos clientes que tenham uma conta nesse Banco (BAO).

Aconselham-se os participantes que o pretendam, a trazer consigo dinheiro líquido, euros de preferência.

Câmbios:

Aconselha-se que a troca de euros por CFA (moeda nacional) se faça em casas de câmbio onde a taxa de conversão é de 1 euro por 650 CFA (a taxa oficial é de 655 CFA). Cambiar na rua não é recomendável, uma vez que se corre o risco de receber notas falsas.

Telemóveis:

Quem trouxer o seu telemóvel, deve primeiro desbloqueá-lo para poder comprar em Bissau um número das duas redes funcionais que operam, a MTN e a Orange. O custo de cada número é de 1.000 CFA, para qualquer delas. Ambas têm acesso internacional directo.

Para quem quiser comprar localmente um telemóvel da rede Orange, o mesmo custa 35.000 CFA para um conjunto de 2 telemóveis. No entanto, através da organização do Simpósio pode-se comprar cada um a 7.500 CFA [,cerca de 11,5 euros].


Internet:


Há vários cibercafés espalhados pela cidade. Para quem ficar instalado no Hotel Azalai (antiga messe dos oficiais), local onde irão residir todos os oradores do Simpósio, o acesso à Internet é gratuito.

Saúde:

Embora ainda não seja a grande época dos mosquitos, é sempre conveniente trazer um repelente e um pequeno saco de medicamentos com o essencial (eventual diarreia ou dor de cabeça). Convém só beber água engarrafada.

Temperatura:

A época do calor veio mais cedo este ano. Deve-se trazer a roupa mais ligeira e fresca.

____________

Nota dos editores:

(1) Vd. último poste desta série: 10 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2522: Guileje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (17): Notícias do Nuno Rubim e do Xico Allen (Pepito)

Guiné 63/74 - P2529: PAIGC: Emboscada a forças do BCAÇ 2912, na estrada Galomaro-Bangacia (Duas Fontes), em 1 de Outubro de 1970 (Luís Graça)

Guiné > Zona Leste > Sector L5 > Galomaro > Dulombi > CCAÇ 2700 / BCAÇ 2912 (1970/72) > Em 1 de Outubro de 1970, duas secções da CCS do BCAÇ 2912, sediado em Bafatá, reforçadas por uma secção da CCAÇ 2700, sofreram uma violenta emboscada, na estrada Galomaro-Duas Fontes (Bangacia), de que resultaram 5 mortos, dos quais dois eram da CCAÇ 2700: Sold José Guedes Monteiro, natural de Marco de Canaveses, e 1º Cabo Rogério António Soares, natural de Nelas. Na foto, alinham-se os caixões que hão-de levar os restos mortais das vítimas...

Ficaram ecos desta terrível emboscada na memória dos vindouros. Leia-se por exemplo este excerto de um recente poste do nosso camarada Juvenal Amado (CCS/BCAÇ 3873, Galomaro, 1972/74)

"Duas Fontes: local onde abastecíamos de água perto de Bangacia. Era um local que inspirava confiança, mas não podemos esquecer que essa mesma confiança custou a vida a seis camaradas do Batalhão antigo [, BCAÇ 2912, 1970/72,]que ali foram emboscados.

Bangacia foi também destruída por um ataque durante a nossa comissão. Nós reconstruímos a povoação com ordenamento tipo Baixa Pombalina, com escola, posto médico e o PAIGC nunca mais atacou. Deve ter considerado que era uma coisa boa a manter para quando a paz chegasse. E tinham toda a razão".


Foto do álbum de fotografias do Américo Estanqueiro, com a devida vénia ao autor e à editora, a Fundação Mário Soares (*).

Fonte: Américo Estanqueiro (2007) / Fundação Mário Soares

Guiné > PAIGC > Comando da Frente Bafatá > Gabu Sul > 1971 > Comunicado, assinado por Constantino dos Santos Teixeira (Tchutchu), sobre os resultados da emboscada montada pela guerrailha a forças do BCAÇ 2912, na estrada Galomaro - Bangacia (ou Duas Fontes), em 1 de Outubro de 1971.

Cópia de documento do Arquivo de Amílcar Cabral / Fundação Mário Soares, reproduzido, na página 67, no catálogo da exposição de fotografia do Américo Estanqueiro (*). É um notável documento, objectivo, sucinto, escrito em português (quase perfeito), e revelador dos valores, da organização e da disciplina (revolucionária) dos combatentes do PAIGC...

Reprodução do documento (LG):

Comando Frente Bafatá. Gabu Sul, 7/10/71

Comunicado

Dia 10/1/71, os nossos combatentes numa emboscada feita na estrada Galomaro-Bangacia conseguiram destruiram dois camiões militar[es], maioria dos ocupantes liquidados; deixaram no terreno 6 mortos confirmado[s] pelo nosso c/ [camarada ou comandante ?], e apanharam 5 espingardas G-3 e alguns carregadores da mesma arma, e apanharam 2 relógios, (302$50) trezentos e dois escudos e cinquenta centavos e nove (9) vacas onde mandaram 5 para Quembera [ou Kambera] **, e ficaram com 4 no interior do país.

O c/ [comarada ou comandante ?] Paulo Maló (***) mandou-me dizer para pedir à direcção do Partido, para que o c/ [camarada ou comandante ?], M’ Font Tchuda (?) N’ Lona estava sem relógio[;], resolveram deixá-lo com um dos dois relógios apanhados durante a acção. Também trouxeram um prisioneiro, ele encontra-se con[n]osco.

Durante a operação tivemos dois feridos não grave[s], são eles Canseira Sambu, N’ Dankena (?) N’Hada.

Segue[m] com o portador as 5 espingradas G-3 apanhadas ao inimigo, e os outros objectos.

Saudações combativa[s].

Constantino dos Santos Teixeira (Tchutchu)



Guiné > PAIGC > Fevereiro de 1968 > Constantino dos Santos Teixeira, Tchutchu, um comandante que se distinguiu na Frente Sul, mas que em finais de 1971 liderava a Frente Bafatá / Gabu Sul. Foto: John Sheppard & Granada TV, in Liberation of Guine, Basil Davidson. Acedido em: A Brief History of PAIGC (com a devida vénia...). Foi primeiro ministro (ou ministro, não sei ao certo) da nova república, por um curto período de três meses, em 1978. (LG)

Guiné > Bissau > 1960 > "O 1º Curso de Sargentos Milicianos foi uma alfobre de quadros para o PAIGC... Alguns dos outros [, além do Domingos Ramos, ] que foram meus camaradas na recruta. De poucos nomes me recordo mas muitos também foram guerrilheiros. Dos dois que estão mais altos, o da direita é o Constantino [dos Santos] Teixeira, mais conhecido por Chucho [ou Tchutchu] ou Axon, que foi igualmente figura importante do PAIGC. Chegou a ser ministro da segurança interna, salvo erro, no tempo imediatamente a seguir à independência. Apareceu, algum tempo depois, morto dentro do carro numa rua de Bissau. Daquele gordinho de óculos escuros que está com a mão no bolso da camisa, só me recordo da sua alcunha que era Diblondi. O porquê de tal alcunha, não sei. Peço desculpa por omitir tantos nomes, embora me lembre das pessoas. Nunca tive o cuidado de ir anotando os acontecimentos nem de escrever no verso das fotos os nomes das pessoas. Péssimo hábito de que agora me arrependo. " (...) (****).

Foto e legenda: © Mário Dias (2006). Direitos reservados.

__________

Notas de L.G.:


Catálogo da exposição fotográfica de Américo Estanqueiro, ex-Fur Mil da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72).

Vd. postes de 12 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2260: Álbum das Glórias (33): Inauguração da exposição de fotografia do Américo Estanqueiro, hoje, na Fundação Mário Soares

Sobre a CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72), vd os seguintes postes:

22 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1541: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (1): Introdução: a 'nossa Guiné'

26 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1550: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (2): A nossa gente

15 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1595: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (3): minas, tornados, emboscadas, flagelações e acção... psicossocial

(...) Na noite de 1 de Outubro, quando 2 secções da CCS [do BBCAÇ 2912] executavam um patrulhamento nas Duas Fontes, foram emboscadas por um grupo inimigo estimado em 50 homens, causando 5 mortos às nossas tropas. Dois destes, pertenciam à nossa Companhia e estavam destacados no Batalhão [, sedeado em Galomaro]. Eram o Rogério António Soares e o José Guedes Monteiro. (...)

11 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1651: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (4): Historietas

30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1796: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (5): A(s) alegria(s) do(s) reencontro(s)

(**) É bem possível que seja o Paulo Malú, hoje coronel, e quadro superior das alfândegas, em Bissau; na altura elere era o comandante ou chefe do bigrupo que emboscou, no Quirafo, forças da CART 3490 (Saltinho, 1972/74), causando mais de duas dezenas de mortos e um prisioneiro (o nosso António da Silva Batista, só libertado em depois do 25 de Abril de 1974)

Vd. poste de 12 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1947: O Coronel Paulo Malu, ex-comandante do PAIGC, fala-nos da terrível emboscada do Quirafo (Pepito / Paulo Santiago).

Sobre a tragédia do Quirafo, vd. também os seguintes postes de:

21 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1980: Blogoterapia (26): Os nossos fantasmas, os nossos Quirafos (Virgínio Briote / Torcato Mendonça/Luís Graça)

17 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1962: Blogoterapia (25): Os Quirafos do nosso Passado (Torcato Mendonça / Virgínio Briote)

15 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1077: A tragédia do Quirafo (Parte V): eles comem tudo! (Paulo Santiago)

28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1000: A tragédia do Quirafo (Parte IV): Spínola no Saltinho (Paulo Santiago

26 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P990: A tragédia do Quirafo (parte III): a fatídica segunda-feira, 17 de Abril de 1972 (Paulo Santiago)


25 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P986: A tragédia do Quirafo (Parte II): a ida premonitória à foz do Rio Cantoro (Paulo Santiago)

23 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P980: A tragédia do Quirafo (Parte I): o capitão-proveta Lourenço (Paulo Santiago)


Guiné- Bissau > Instalações da AD - Acção para o Desenvolvimento > Julho de 2007 > O Paulo Malu, antigo comandante do PAIGC, hoje coronel, e quadro superior da Direcção-Geral de Alfândegas. Foi ele que comandou, em 17 de Abril de 1972, o bigrupo (?) que montou e executou a terrível emboscada contra os militares da CART 3490 (Saltinho, 1972/74) que escoltavam um grupo de civis afectos à construção de uma estrada (Quirafo-Foz do Cantoro).

Foto: © Pepito/ AD - Acção para o Desenvolvimento (Bissau) (2007)

(***) Campo de Instrução e Preparação Militar de Kambera, do PAIGC, na República da Guiné-Conacri

(****) Vd. poste de 1 Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCI: Domingos Ramos, meu camarada e amigo (Mário Dias)

Guiné 63/74 - P2528: O papel do Movimento Nacional Feminino (1): Mais meritório no apoio às famílias dos soldados (Joaquim Mexia Alves)

1. Mensagem do nosso querido amigo e camarada Joaquim Mexia Alves (Monte Real, Leiria), que foi Alf Mil Op Esp, Guiné, Dez 1971 / Dez 1973, CART 3492 (Xitole), Pel Caç Nat 52 (Mato Cão / Rio Udunduma) e CCAÇ 15 (Mansoa):


Caros Luís Graça, Carlos Vinhal, Virginio Briote, camaradas e amigos :


Tenho lido os diversos textos sobre o MNF e, porque vivi essa realidade de muito perto, aqui estou a dar a minha opinião.

Muitas vezes tomamos a parte pelo todo e acabamos por colocar em causa acções e atitudes meritórias, por causa de sentimentos que vão para além do que é preciso apreciar, mormente sentimentos políticos e outros que nos acontecem dadas as situações que vivemos.

(i) A minhã mãe foi dirigente regional do MNF


Isto para dizer, em relação ao MNF, que, retirando a parte de exposição pública de algumas senhoras, que apesar disso não deixam de ter o seu mérito, este organismo teve acção muito meritória durante a guerra, muito mais, a meu ver, junto das famílias que junto dos militares em África.

Minha mãe foi presidente do MNF no distrito de Leiria e eu sei bem as horas que ela dedicou, exaustivamente, àquela causa, bem como todas as senhoras que a acompanhavam, sobretudo junto das famílias com mais dificuldades, e como eram apreciados esses gestos.

Se havia gente que não gostava e dizia mal, com certeza, mas por cada um desses posso encontrar dois a dizerem o contrário.

Logicamente que as senhoras envolvidas, tinham algumas delas a ver com o regime então vigente, até porque se assim não fosse não seria possível levarem a cabo tais actividades.

Mas quero salientar, com conhecimento de causa, que se havia senhoras da sociedade, também as havia de todos os estratos sociais, que trabalhavam abnegadamente pelos militares e suas famílias.

Quanto ao modo como algumas senhoras se apresentavam junto dos soldados, deixem-me dizer, por experiência própria, que ainda bem que iam bem arranjadas e ataviadas, pois que de coisas feias e sem jeito já estávamos nós fartos, não me referindo obviamente às lindíssimas bajudas que havia na Guiné.

Reparo muitas vezes em acções que fazemos junto das prisões, sem-abrigo, toxicodependentes (sem fazer comparações com o que, ou quem está aqui em causa) como eles reparam no modo como tanto nós homens, como as mulheres, vamos vestidos e arranjados, num sentimento, julgo eu, que tem a ver com o sentirem que nos preocupamos com eles e lhes damos importância.

(ii) Madrinhas de guerra: também fizeram bem a muita malta


Quanto às madrinhas de guerra, se foi ou não uma reposição de uma figura que já tinha existido, não estou a ver qual é o problema, nem encontro em lado nenhum a afirmação de que foi uma invenção do MNF.

Se as madrinhas de guerra serviram para alguma coisa ou não, é uma discussão vasta e que me parece terá sempre uma conclusão: serviu a uns, a outros não!

Foi tudo bom? Com certeza que não, mas que ajudaram muita gente e que muitas dessas senhoras, talvez a maioria, trabalhou dedicadamente para amenizar os efeitos da guerra junto dos soldados e suas famílias, disso não há, julgo eu, a mínima dúvida.


(iii) 3º Encontro Nacional da nossa Tabanca Grande, em 2008


Estou a tratar do almoço do 3º Encontro Nacional da mal do blogue]! Tens algumas datas que sejam mais acertadas?

Vou fazer todos os possíveis para estar na apresentação do livro do Beja Santos, que aliás me toca pessoalmente, não só por participação fotográfica, segundo o que revelaste, mas também e sobretudo pelo Pel Caç Nat 52

Abraço camarigo


Joaquim Mexia Alves

2. Comentário de L.G.:

Como vês, meu caro Mexia Alves, já temos distanciamento, serenidade e maturidade suficientes para abordar e discutir, enre camaradas, alguns das nossas questões ditas fracturantes... Obrigado pelo teu testemunho, que é importante, a par da investigação (historiográfica, séria, metodologicamente sustentada...) que se vai fazendo sobre uma parte da história do Séc. XX de que fomos protagonistas... Por sobre o lastro das paixões e dos parti-pris político-ideológicos, ouçamos também os nossos investigadores... Mas o nosso papel aqui é dar voz a quem viveu os acontecimentos, tanto na frente como na rectaguarda da guerra colonial / guerra do Ultramar...

Quanto ao encontro, vamos deixar passar este mês... Vamos pôr isso na nossa agenda... Claro que serás bem vindo ao encontro da minitertúlia de Lisboa, por ocasíão do lançamento do livro do Beja Santos e nosso livro, no próximo dia 6 de Março. E espero que possas vir e até trazer a tua viola... Até por que há ainda uma Fado da Guiné para lançar em estreia... mundial. Vamos ouvir um bocadinho do ensaio ?

Fado da Guiné > Vídeo: 2 m e 19 s > Alojado no You Tube > Nhabijoes > Letra do Joaquim Mexias Alves. Música: Pedro Rodrigues (Fado Primavera) (com a devida vénia).
Vídeo: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.