sexta-feira, 8 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18722: Notas de leitura (1073): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (38) (Mário Beja Santos)

Fachada do BNU iluminada


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 5 de Janeiro de 2018:

Queridos amigos,
Os primeiros relatórios da década de 1960 ainda estão redigidos com a satisfação de quem vê as exportações da mancarra e coconote de vento em pompa. Mas 1962 e 1963 já falam de importações maciças de arroz, as culturas do Sul definharam.
A administração do BNU faz perguntas sobre a Sociedade Comercial Ultramarina, o seu interesse por esta empresa irá dobrar e redobrar. Deverá ter mudado o gerente em Bissau, o seu relatório de 1964 é um documento espantoso, parece ter sido redigido por um visionário da economia agrícola disfarçado de homem de Estado a explicar para a sede do BNU que aquela agricultura precisa de mudar de rumo e explica tim-tim por tim-tim tudo quanto há para fazer, desde adubos e alfaias até ao corporativismo.
É um prosélito esquecido que a Guiné já está a ferro e fogo.

Um abraço do
Mário


Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (38)

Beja Santos

Chegados à década de 1960, vamos notar que os relatórios provindos de Bissau continuam centrados sobre a economia agrícola, não deixando, em certos momentos, de trazer novidades, como a chegada, ainda a título experimental, do caju. Seria impossível iludir as consequências da luta armada e notar-se-á bastas referências à desarticulação do território, se bem que numa linguagem muito comedida. Falando de 1962 e 1963, adianta-se que a mancarra e o coconote são os produtos agrícolas da exportação que atingem expressão relevante. E fala-se assim do arroz:  
“O arroz, uma das culturas tradicionais, falhou. A cultura orizícola, outra próspera, que chegou a exprimir números apreciáveis e cujos excedentes exportáveis constituíram, noutros tempos, razoável arrecadação de divisas, sofreu forte redução em consequência da época anormal que a Província atravessa, a ponto de para abastecimento das populações ter de se recorrer aos mercados estrangeiros. Assim, por não ter sido possível, o Sul da Guiné, colher e transportar o apreciado cereal, alimentação base dos guineenses, importaram-se 3 mil toneladas de arroz de origem norte-americana”.

O relatório referente a 1963 fala numa nítida melhoria em relação ao ano anterior devido a uma excelente produção de mancarra e do coconote, dizendo que esta fora a maior de sempre. Refere-se assim ao arroz:  
“Por irregularidades de chuva, baixou a produção, provocando uma importação de 2 mil toneladas deste cereal, exagerada para as necessidades, pois se encontram ainda por vender cerca de metade do produto importado”.
A economia da Guiné, no primeiro ano da luta armada parecia sorrir. Curioso é verificar que no relatório subsequente se continua a referir a exportação da mancarra e do coconote, houve um ano agrícola de regular produção. Mas já não se iludem as dificuldades: o défice crónico da balança comercial foi agravado no ano de 1964 com mais um encargo da ordem dos 14 milhões de escudos destinados à importação de cerca de 4 mil toneladas de arroz originário da metrópole e dos EUA.

Ter-se-á mudado de gerente, tem-se agora um registo quase professoral no que toca à descrição da economia agrícola e que, como veremos adiante, será persistente no cariz pedagógico, tem-se por vezes a sensação que está ali um potencial homem de Estado a fazer recomendações a quem mais pode.

Vejamos o que ele escreve em 1964:  
“Praticamente inexistente, como já se tem afirmado, a indústria guineense é representada por escassas dezenas de unidades de quase nenhuma influência do conjunto económico da Província.
E porque assim é, só podemos contar, e por muito tempo, com uma estrutura económica de base agrária que, por esta razão, deve ser consolidada racionalmente e nos aspetos que mais possibilidades ofereçam de extração de riquezas e aumento da produção. Enquanto não for possível enquadrar outros produtos além do amendoim e do coconote, a economia será sempre vulnerável. A industrialização, embora dificultada pelas condições naturais do território que impossibilitam, praticamente, o aproveitamento de energia elétrica, deverá ser tentada com perseverança, pois daí advirá, sem dúvida, apreciável contributo para o fortalecimento económico da Guiné”.

Documento pertencente ao Arquivo Histórico do BNU

Em Maio de 1965, o administrador Castro Fernandes escreve para a gerência em Bissau, a propósito do relatório referente ao ano anterior:

“Recebemos a primeira parte do relatório que passamos a apreciar. Da sua leitura fica-nos a agradável impressão de existir por parte dessa gerência o firme desejo de aproveitar ao máximo as possibilidades da sua atuação numa praça que, felizmente parece ter registado maior desafogo em consequência de um regular ano agrícola e de um mais compensador comércio de importação e exportação. Como, porém, tais circunstâncias favoráveis não assentam em condições estáveis, dado que a produção agrícola está sujeita a fatores de diversa ordem e a permanência de elevados efetivos militares obedece a uma situação anormal, forçoso é reconhecer que são muito limitadas as perspetivas de resultados mais substanciais, sem abandonar a prudência de que desejamos ser sempre observada”.
E, mais adiante, a finalizar:  
“Cremos que para o surto de prosperidade económica e desafogo financeiro, além da circunstância apontada relativa à expansão demográfica, também não deve ser estranha uma melhor cotação dos produtos locais, pelo que nos ocorre perguntar se, na vossa opinião, existem melhores perspetivas futuras para a Sociedade Comercial Ultramarina que, ao contrário do que sucede com a maioria do restante comércio da praça não acusa melhoria na situação das suas contas no nosso banco”.

Na segunda parte do relatório escrito em Bissau voltava a referir-se a existências das três instituições (Caixa Económica Postal, Caixa de Previdência dos Funcionários Públicos da Guiné e Montepio das Alfândegas da Guiné) que faziam algumas operações com caraterísticas bancárias, tais como empréstimos garantidos por letras, declarações de dívida e hipotecas, destinados, em parte, à construção de habitações, tudo minuciosamente explicado.

E é aqui que começa um relambório totalmente inusitado, como houvesse necessidade de esclarecer a administração em Lisboa do bê-á-bá da agricultura guineense, até parece prosápia de quem se dirige a um auditório de ignorantes:
“A estrutura agrícola da Província assenta exclusivamente no rotineiro agricultor nativo, sem organização e sem meios capazes de por si só aumentar as suas produções. Ecologicamente a Província divide-se em duas grandes zonas: a Litoral, com excelentes condições para o desenvolvimento da orizicultura, nas terras baixas, os palmares naturais pouco explorados, e as zonas do centro e interior, onde a principal cultura é a da mancarra. A estas zonas correspondem, naturalmente, a distribuição de tribos que se adaptam a um género de exploração agrícola: arroz, coconote e mancarra.
Sendo a mancarra a base da economia da Guiné, e por alguns anos sê-lo-á ainda, até que se consiga a diversificação da produção agrícola, verifica-se que a cultura se processa por métodos anacrónicos que há a combater.
Todos os anos o nativo, perante a área esgotada, derruba a floresta ou a savana que submete à nova cultura e depois deixa de pousio ao fim de três ou quatro anos, ao sabor do capim e da queimada, ciclo vicioso que irá conduzir estas terras à laterização. Floresta ou savana: mancarra-capim – eis a trilogia das regiões do interior e parte litoral da Guiné a que poderá associar-se com uma relação causa-efeito: nativo-queimada – desertificação.
O fator condicionante da extensão agrícola é a água. Uma prolongada época seca, cerca de seis a oito meses, não permite nestas regiões culturas anuais de sequeiro; no entanto, analisados os problemas das diversas regiões da Província, verifica-se que poderia haver uma melhor ocupação da mão-de-obra humana. Assim, nas regiões de Bafatá-Gabu, a par do cultivo da mancarra na época pluviosa e das culturas alimentares, seria possível, à custa de regadios e portanto com pequenas barragens de terra, armazenar água para conseguir ocupar a mão-de-obra não utilizada. Região rica em gado, o cultivo de forragens para encilar seria certamente um dos caminhos a seguir. O fomento apícola naquelas regiões e nas extensas savanas e florestas abertas de Farim, ricas em espécies melíferas, poderia contribuir para uma substancial melhoria do nível de vida da população autóctone.
Em resumo, as áreas de Bafatá-Gabu e parte de Farim deveriam destinar-se a: mancarra-milho-culturas alimentares-exploração pecuária-mel.
O nativo tudo faz com o seu esforço próprio. Não alia á exploração agrícola, ou só raramente o faz, o auxílio valioso da tração animal. À custa do trabalho braçal, do arado Balanta ou da enxada Fula, tudo se consegue”.

Em nenhum outro relatório alguma vez se lera tal entusiasmo em descrever tal massa monumental de noções da economia agrícola para os administradores do Banco do Império. O gerente não se fica por aí, quer revolucionar o sistema, reclama formação, faz apelos ao corporativismo, ao recurso de adubos, como veremos em próximo texto. Lê-se este documento com um misto de perplexidade e admiração pela coragem deste neófito doutrinador, que talvez idealizasse que a partir do sistema bancário se iria inverter todo o processo agrícola naquele território cada vez mais marcado pela guerra subversiva.

 Equipa de basquetebol do BNU

(Continua)
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Notas do editor

Poste anterior de 1 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18700: Notas de leitura (1071): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (37) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 4 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18707: Notas de leitura (1072): História das Missões Católicas na Guiné, por Henrique Pinto Rema; Editorial Franciscana, Braga, 1982 (3) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P18721: Parabéns a você (1450): Antero Santos, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3566 e CCAÇ 18 (Guiné, 1972/74) e João Gabriel Sacôto, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 617 (Guiné, 1964/66)


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Nota do editor

Último poste da série de 7 de Junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18718: Parabéns a você (1449): Ernesto Marques, ex-Soldado TRMS Inf da CCAÇ 3306 (Guiné, 1971/73)

quinta-feira, 7 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18720: Agenda cultural (640): Lançamento do volume n.º 16 dos Cadernos de Estudos Leirienses, com textos de José Eduardo Oliveira e José Marcelino Martins, dia 9 de Junho, pelas 15 horas, na sede do Núcleo de Leiria da Liga dos Combatentes



Estimados Amigos,
Informamos que o lançamento do volume n.º 16 dos CADERNOS DE ESTUDOS LEIRIENSES, todo ele dedicado à participação dos militares do Distrito de Leiria na 1.ª Grande Guerra, vai ser no próximo dia 9 de Junho, às 15h30, nas instalações do Núcleo de Leiria da Liga dos Combatentes (Av. 25 de Abril, Lote 12, r/c Dto., próximo das instalações do Orfeão de Leiria e do Estádio - ver planta em anexo). 

A apresentação será feita pelo senhor Coronel Ismael Alves. 

Teríamos muito gosto que estivesse presente. 

Os melhores cumprimentos. 
Carlos Fernandes / Textiverso
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Notas do editor

Este Caderno tem textos dos nossos camaradas tertulianos José Eduardo Rodrigues Oliveira (JERO) e José Marcelino Martins

Último poste da série de 6 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18717: Agenda cultural (639): Programa "Fronteiras XXI", RTP3, hoje, 4ª feira, dia 6, às 22h: o quinto programa, a não perder: "Em Português é que nos entendemos"... Debate: convidados, o escritor cabo-verdiano e Prémio Camões 2018, Germano Almeida; o músico e compositor brasileiro Ivan Lins; e o poeta e cronista português Pedro Mexia

Guiné 61/74 - P18719: Ser solidário (212): Gostaria de saber as companhias que passaram e estiveram sediadas em Candamã e quando é que costumam celebrar o convívio anual (Luís Branquinho Crespo)



1. Mensagem do nosso camarada Luís Branquinho Crespo (ex-Alf Mil da CART 2413, Xitole e Saltinho, 1968/70), com data de 26 de Maio de 2018:

Meus Caros Amigos

A associação a que pertenço com alguns amigos e amigas e que constituí chamada de Associação Humanitária Para a Cooperação e Desenvolvimento, Resgatar Sorrisos, e já constituída em ONGD, iniciou em Março a construção de uma Escola para a 5.ª e 6.ª Classes em Candamã[1], junto a Bambadinca e entre esta localidade e o Xitole.

Com uma equipa de vários homens fizemos as fundações, colocámos ferro, depositámos brita, cimentámos as fundações, fizemos subir pilares e com a ajuda da população a escola vai crescendo.

Sei, porque no local ainda existem restos físicos da passagem de militares nossos pela zona (há registos gravados em pedra de por lá terem passado em 1969 os Viriatos), gostaria de saber as companhias que passaram e estiveram sediadas nessa tabanca e quando é que costumam celebrar o convívio anual e com quem posso contactar, indicando-me o nome e telemóvel ou modo de os obter.

Estou convicto e convencido que tinham todo o interesse em saber do nosso projecto e talvez até queiram colaborar.

Será que os meus amigos podem ajudar e responder informando-me do nome e dos possíveis contactos?

Aguardo pelas v/ informações.
Desde já o meu agradecimento.

Um abraço meu e o reconhecimento da
RESGATAR SORRISOS (ONGD)[2]

Atentamente
Luís Branquinho Crespo

Infografia: Projeto da escola de Candamã, Bambadinca, Bafatá, Guiné-Bissau. 
Luís Branquinho Crespo (2018)

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2. Ontem mesmo, dia 6, recebemos do camarada José Martins, nosso consultor para assuntos militares, a seguinte mensagem:

Boa noite 
Nas minhas notas só tenho com passagem por Candamã:

CCAÇ 1551 de Maio a Novembro de 1966
CCAÇ 1550 de Janeiro de 1967 a Janeiro de 1968
CART 2339 de Setembro de 1968 a Novembro de 1969
CCAÇ 2404 de Novembro de 1969 a Março de 1970

Sendo Candamã um destacamento de nível pelotão/pelotão reforçado, há "espaços de tempo" entre a saída e entrada de nova unidade, o que pode não ter acontecido na realidade. As minhas notas são baseadas nas informações do Volume VII da CECA, pelo que pode haver omissões. 

Nota:
Sábado é apresentado no Núcleo de Leiria da Liga dos Combatentes (15h30), mais um "Caderno de Estudos Leirienses", sobre a Grande Guerra, em que existem textos de, pelo menos, dois tabanqueiros, que têm ligações afectivas a Leiria. 

Abraço 
Zé Martins
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Notas do editor:

[1] - Vd. poste de 22 de janeiro de 2018 Guiné 61/74 - P18240: Ser solidário (209): Construção de Escola em Candamã, iniciativa da Associação Humanitária Resgatar Sorrisos (Mário Beja Santos / Luís Branquinho Crespo)

[2] - Vd. poste de 24 de fevereiro de 2018 Guiné 61/74 - P18351: Ser solidário (210): A ONGD Resgatar Sorrisos apresenta-se à Tabanca Grande e agradece desde já quaisquer apoios para poder construir a escola de Candamã (, no antigo subsetor de Mansambo) (Luís Branquinho Crespo)

Último poste da série de 14 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18414: Ser solidário (211): Concentração cívica (hoje, 4ª feira, às 18h00, no antigo Hospital Militar Principal, Estrela, Lisboa) e petição pública a favor do apoio social e clínico aos militares e seus agregados familiares, incluindo os antigos combatentes da Guerra em África

Guiné 61/74 - P18718: Parabéns a você (1449): Ernesto Marques, ex-Soldado TRMS Inf da CCAÇ 3306 (Guiné, 1971/73)

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Nota do editor

Último poste da série de 6 de Junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18714: Parabéns a você (1448): Belarmino Sardinha, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista dos STM/CTIG (Guiné, 1972/74)

quarta-feira, 6 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18717: Agenda cultural (639): Programa "Fronteiras XXI", RTP3, hoje, 4ª feira, dia 6, às 22h: o quinto programa, a não perder: "Em Português é que nos entendemos"... Debate: convidados, o escritor cabo-verdiano e Prémio Camões 2018, Germano Almeida; o músico e compositor brasileiro Ivan Lins; e o poeta e cronista português Pedro Mexia


Sítio do projeto Fronteiras XXI, uma parceria entre a Fundação Francisco Manuel dos Santos
 e a RTP 3


1. PROGRAMA FRONTEIRAS XXI: OS TEMAS QUE DESAFIAM PORTUGAL E O MUNDO  > Nº 5, "EM PORTUGUÊS É QUE NOS ENTENDEMOS" > 

RTP 3, HOJE,   6 DE JUNHO DE 2018, ÀS 22H00


Sinopse > 

"No mundo haverá mais de 260 milhões de pessoas que falam português. Vai a língua portuguesa continuar em expansão acompanhando o crescimento demográfico em África e no Brasil? Que poder tem a nossa língua? Que património cultural arrasta e que estratégia deve haver para a manter viva?
Não perca na quarta-feira, 6 de Junho, às 22 horas, na RTP3.

Para Fernando Pessoa a língua portuguesa era a “pátria”, para Mia Couto “a língua da moçambicanidade” e um “instrumento de contacto com o mundo” para o escritor cabo-verdiano Germano Almeida.

Do Brasil, a África, passando pela Índia, Timor-Leste ou Macau serão mais de 260 milhões aqueles que falam português, apontam os dados oficiais. O idioma é língua oficial de nove países e deixou vestígios em mais de uma centena de línguas e dialectos, dizem os especialistas.

Ainda divididos pela ortografia, segundo as previsões, o número de falantes do português continuará a crescer, acompanhando a explosão demográfica no hemisfério Sul: atingirá os 395 milhões em 2050, revelam as estimativas das Nações Unidas.

Se é em português que nos entendemos, que estratégia existe para a língua e a sua afirmação no futuro? Que património cultural arrasta? Que poder tem e quanto vale hoje falar português?

Para responder a estas e outras questões estarão no programa o escritor cabo-verdiano e Prémio Camões 2018 Germano Almeida, o músico e compositor brasileiro Ivan Lins e o poeta e cronista português Pedro Mexia.

O programa contará também com um vídeo original do actor, humorista e escritor brasileiro, Gregório Duvivier, um dos criadores da série Portas dos Fundos. E com o fadista Ricardo Ribeiro a actuar em directo.

A moderação é do jornalista da RTP Carlos Daniel. Não perca o próximo Fronteiras XXI, no dia 6 de Junho, às 22h, na RTP3.

Quer assistir ao vivo?


2. O PROJECTO FRONTEIRAS XXI

"Debater os grandes temas que desafiam Portugal e o mundo, colocando frente a frente conceituados especialistas nacionais e/ou internacionais e uma plateia seleccionada. É este o desafio do Fronteiras XXI, o novo programa mensal da RTP3 que resulta de uma parceria entre a Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) e a RTP.

"Com estreia a 1 de Fevereiro, o Fronteiras XXI pretende alargar o debate às plataformas digitais, desafiando o público a participar no programa antes, durante e após o debate. Pode faze-lo através deste site ou colocando as questões ao vivo durante a emissão.

"Ao longo de dez programas de 90 minutos, moderados pelo jornalista da RTP Carlos Daniel, vão discutir-se alguns temas que marcam a actualidade, mas também outros, menos mediáticos que afectam o nosso dia a dia. Vamos falar do presente a pensar no futuro.

"Serão também apresentados resultados inéditos sobre os mais recentes estudos e projectos de investigação apoiados pela Fundação. O programa é transmitido em sinal aberto na RTP3.

"David Azevedo Lopes

"Administrador e Director-geral da FFMS [, Fundação Francisco Manuel dos Santos]" 

[Com a devida vénia: Fronteiras XXI]
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Nota do editor:

Último poste da série > 27 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18685: Agenda cultural (638): Lançamento do novo livro de Catarina Gomes, "Furriel Não É Nome de Pai: Os filhos que os militares portugueses deixaram na Guerra Colonial" (Tinta da China, 2018, 224 pp.): Em Lisboa, na Feira do Livro, domingo, 3 de junho, 16h00; no Porto, Mira - Artes Performtivas, sábado, dia 2 de junho, 15h00

Guiné 61/74 - P18716: Historiografia da presença portuguesa em África (117): Uma reunião invulgar: a Conferência dos Administradores, Bissau, 1941 (2) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 31 de Janeiro de 2018::

Queridos amigos,
Tenho razões fundadas para considerar esta obra como de grande relevo para a compreensão da mentalidade colonial do início da década de 1940.
Desconheço inteiramente qualquer tipo de iniciativa governamental como esta, uma conferência bem organizada, foram enviados despachos para os administradores e altos funcionários e corrigiram-se elementos relevantes nas memórias produzidas. Poderá questionar-se por que razão o Capitão Vaz Monteiro não abordou obras públicas e comunicações. A resposta parece ser simples, se pensarmos que estamos no auge da guerra, não há dinheiro, pode mesmo tomar-se esta iniciativa como o fazer das tripas coração e aproveitar a boleia da austeridade como um novo vetor de importantes mudanças, que o governador reconhecia como urgentíssimas, desde a economia agrícola, à dinâmica exportadora e ao uso da língua portuguesa.
Uma grande surpresa, esta conferência para administradores, em 1941.

Um abraço do
Mário


Uma reunião invulgar: a Conferência dos Administradores, Bissau, 1941 (2)

Beja Santos

Não posso deixar de confessar a grande surpresa que foi a leitura deste documento que, tanto quanto me parece, tem passado despercebido aos estudiosos da Guiné. O Capitão de Artilharia Ricardo Vaz Monteiro foi Governador da Guiné entre 1941 e 1945. Não conheço nenhuma iniciativa precedente deste jaez. No final de 1941, mais propriamente entre os dias 3 e 8, o Governador que enviara um conjunto de despachos aos administradores de circunscrição e responsáveis pelos serviços públicos da colónia, na presença do Ministro das Colónias, Francisco Vieira Machado, abriu uma conferência que, no seu dizer, tinha de ser franca, seria permitido a cada um dos participantes dar parecer sobre a matéria dos despachos. É uma edição bem estranha, não se sabe quem é o responsável pela edição, onde e como foi publicada, tem uma capa singela intitulada Conferência dos Administradores, Atas das Sessões Realizadas em 1941, sob a Presidência do Governador da Colónia, Capitão Ricardo Vaz Monteiro, seguidas de Despachos e Memórias.

Impressiona a preparação do governador, a exaustão dos temas e a competência que mostra no final de cada um dos debates, foi esta a matéria do texto anterior cuja leitura se recomenda para que a leitura deste ganhe mais transparência.

Em Novembro desse ano, o governador enviara a todos os participantes um rol de despachos, abarcando matérias tão diversas como: sementes e culturas; licenças para o exercício do comércio fora das povoações comerciais; utilização dos serviços dos ajudantes de pecuária, fiscais do Conselho Técnico de Agricultura e guardas florestais; melhoramento das condições de exploração agrícola indígena; cultura do milho; exportação do gado bovino; produção de couros; apicultura; concessões de terrenos; língua portuguesa e religião dos portugueses; pomares, palmares, hortas e viveiros; aumento das manadas e melhoramento das espécies; política indígena dos chefados e regulados; projetos dos orçamentos privativos dos concelhos e das circunscrições civis.

Cada um dos despachos inclui reflexões. Só alguns exemplos.
No despacho n.º 1, sugeria-se a escolha em cada região dos campos de mancarra com melhor aspeto. Depois de escolhida e convenientemente seca esta mancarra, ela devia ser conservada nos celeiros comunais. E o governador avançava com desafios: “Os administradores devem propor as medidas que julgarem convenientes para se aumentar a produção da mancarra, quer por compra de semente, quer por exigência indígena de maiores quantidades para os celeiros. Os administradores devem dar parecer sobre a conveniência de se manterem os atuais celeiros individuais, de povoação, dos postos e das sedes de circunscrição”.
No despacho n.º 2, entre outras reflexões, havia esta: “Não se tem cumprido a exigência do aproveitamento do terreno das concessões e das propriedades. Este facto muito tem contribuído para que o melhoramento das condições económicas da Colónia venha sendo prejudicado desde há longos anos”.
No despacho n.º 13, referente à política indígena, punham-se questões muito concretas: “Qual a maneira de evitar que o regime de chefados e dos regulados não provoque a agitação constante que se nota entre os pretendentes e os seus partidários?” e pediam-se comentários à seguinte consideração: “Tanto no caso de haver sucessão pacífica de conformidade com o direito consuetudinário como nos casos em que resulte interregno ou haja litígio, a experiência aconselha que a nomeação destas autoridades gentílicas seja feita pelos chefes dos postos, pelos administradores, pela Repartição Central dos Serviços da Administração Civil ou pelos governadores”.

Se há já surpresa na natureza desta iniciativa, ao que se crê sem precedentes, se se perceciona o alto calibre dos despachos, lê-se também com grande surpresa os elementos carregados pelas memórias trazidas pelos administradores e altos funcionários dos Serviços da Administração. Matéria de maior interesse, escolhemos hoje um conjunto de elementos fornecidos por alguns administradores, deixando os restantes para um terceiro e último texto.

O administrador do concelho de Bissau, a propósito do exercício do comércio fora das povoações comerciais apresentou a seguinte proposta: fiscalizar a ação dos senhores feudais, dizendo explicitamente que “na área de Bissau existe uma propriedade medindo cerca de 546 hectares onde a fiscalização das autoridades não pode ser exercida devido à oposição do proprietário. Neste vasto feudo, o seu detentor chega ao ponto de protestar pelos impostos que incidem sobre os seus (!) indígenas”. E foi opinativo sobre o crioulo: “O crioulo da Guiné, que difere do crioulo de Cabo Verde, é constituído por vocábulos diversos do português arcaico, inglês, francês, espanhol, línguas étnicas, dos povos que têm exercido influência na colonização da Guiné. Em nossa opinião, só uma ação persistente das autoridades e a criação de escolas móveis conduzirão o indígena, no fim de um certo número de anos, a familiarizar-se com a língua portuguesa”.

O administrador do concelho de Bafata observou que: “80% dos indígenas não sabem para que queremos nós a mancarra que lhe compramos e os restantes dirão que é para a comermos. Evidentemente que não se apercebe da conveniência em a apresentar livre de impurezas e com melhor aspeto. O que sabe é que isso representa para ele, um acréscimo de trabalho e uma diminuição de proventos. Se o comerciante lhe apresenta à venda em más condições, este habituar-se-ia a apresentá-los limpos, por fim convencido de que com má apresentação os não conseguimos vender em parte nenhuma, mas uma parte do comércio compra tudo: pedras, paus, terra e cascas”.

Veremos então no próximo texto outras observações e comentários de administradores de circunscrição, não se pode negar que se trata de um repositório invejável de notas que permitem, de algum modo, ajudar a qualificar a administração colonial na Guiné, no início dos anos 1940.




Nota:
Estas imagens foram retiradas da revista Defesa Nacional, um número de 1946 dedicado às comemorações do V Centenário da descoberta da Guiné, a primeira imagem é hoje um clássico, o soldado vigilante na fortaleza da Amura, a segunda mostra os bijagós à volta de um momento dedicado à pacificação e a terceira é para mim um achado, sempre ouvi falar nos cristãos de Geba e na importância da paróquia de Geba, nunca vira qualquer fotografia, a minha curiosidade está satisfeita.

(Continua)
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Notas do editor:

Poste anterior de 16 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18641: Historiografia da presença portuguesa em África (114): Uma reunião invulgar: a Conferência dos Administradores, Bissau, 1941 (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 17 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18644: Historiografia da presença portuguesa em África (115): Otto Schacht, um comerciante alemão, que deu dores de cabeça às autoridades da colónia e à diplomacia portuguesa... e que terá sido avô de um outro Otto Schacht, futuro dirigente do PAIGC, assassinado em 14 de novembro de 1980, data do golpe de Estado de 'Nino' Vieira (Armando Tavares da Silva)

Guiné 61/74 - P18715: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXIV: Como se faz um alferes miliciano do Serviço de Administração Militar (II)


Foto C64  > Com Salazar, amigo e padre, Santiago de Compostela,  28-4-1965.


Virgílio Ferreira, aspirante a oficial miliciano,
Porto, junho de 1967. Foto para o BI militar,

1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Virgílio Teixeira (*), ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69); natural do Porto, vive em Vila do Conde, sendo economista, reformado; tem já cerca de 6 dezenas de referências no nosso blogue.


GUINÉ 1967 /69 1967/69 > ÁLBUM DE TEMAS > T001 – SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO > CURSO DE OFICIAIS MILICIANOS (COM) > EPI | MAFRA; EPAM | LUMIAR, LISBOA - Parte II

Perguntei ao Virgílio Teixeira se não tinha fotos  "à civil", antes da tropa... Como estudante, por exemplo ... Pretendia ilustrar um pouco melhor a sua história de vida antes de ir parar à Máfrica...(como lhe chamava, à EPI, em Mafra, o nosso saudoso Vasco Pires) (*).

Sempre voluntarioso e disponível, o nosso camarada Virgílio Teixeira mandou-me um lote de fotos, digitalizadas, algumas de fraca qualidade, que eu selecionei, editei e mas decidi, de comum acordo, publicar agora...

Afinal, todos temos/tivemos pai, mãe, irmãos, família, namorada(s), vizinhos, amigos, colegas de escola e de trabalhado... Mas. os que ainda estão vivos/as, têm direito à reserva de imagem...

Obrigado, ao Virgílio, por nos mostrar esta parte, mais pessoal e íntima, da sua vida de "paisano" mas que não vamos partilhar com a Tabanca Grande... Fica apenas este registo: a sua vida de mais de 7 décadas (infância, adolescência, juventude e idade adulta...) foi toda passada no Norte.  Recorde-se ainda que  o pai e o irmão velho eram militares (, tendo ambos passado, nomeadamente, pela Índia Portuguesa). O seu irmão Jorge esteve  inclusive no campo de Pondá como prisioneiro de guerra, cerca de 5 meses(1961/62). (*)


2. Notas e lgendagem:

Fotos de civil, anteriores ao serviço militar:

Estas fotos foram agora retiradas do baú com mais de 50 anos, a maioria em mau estado, outras de fraca e fraquíssima qualidade, mas para já foi o que encontrei. Estão numeradas com FC – Fotos Civis sequencialmente, e sem nenhuma ordem de antiguidade.

Foram à pressa digitalizadas sem muitas condições e de muito pequena resolução, foi o meu filho que fez este trabalho, sem os equipamentos necessários, por isso é o que tenho. Para fazer melhores terei de ir ao Porto, deixar lá as fotos, passado uma semana ir buscar, e depois pagar 5€ por cada 3 fotos digitalizadas, e isso fica para outra vez.

As datas e locais podem ser não totalmente certos, pois não há nada escrito nas fotos, só algumas têm datas, mas serão sempre anteriores a 1966. Mas de todas elas, peço-te que publiques apenas a seguinte:

Foto C64 – Foto a cores, da esquerda para a direita, sou eu de capa e batina, o Prior da Igreja de São Tiago de Compostela, depois o Manuel Salazar, um homem à civil, também espanhol, deve ser o Sacristão, e outro estudante de capa, que conhecemos lá. Viajem feita à boleia, com uma agravante de termos ficado ao relento num local depois de Arcos de Valdevez, chamado Extremo. À noite faltou a boleia até Valença, e ficamos no meio do ‘mato’. Uivos de lobos, frio de rachar, passamos a noite na cabina de uma camioneta abandonada, com as capas à volta de nós, para minorar o frio. Depois de manhã rápido chegamos a S. Tiago de Compostela. A foto tem a data de 28-Abril de 1965. Data da revelação. O padre prior depois de contarmos as nossas aventuras, ofereceu-nos estadia e comida para dois dias. Mas passamos mal aquela noite no Extremo, terra que nunca mais esqueci.

(Continua)
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Guiné 61/74 - P18714: Parabéns a você (1448): Belarmino Sardinha, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista dos STM/CTIG (Guiné, 1972/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 5 de Junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18710: Parabéns a você (1447): Manuel Traquina, ex-Fur Mil Enfermeiro da CCAÇ 2382 (Guiné, 1968/70)

terça-feira, 5 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18713: Álbum fotográfico de António Ramalho, ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71) - Parte II: T/T Uíge (Lisboa - Bissau, o 1º e único cruzeiro da minha vida), Bula, Capunga...

Foto nº 1


Foto nº 2

 Foto nº 3

Foto nº 4

 Foto nº 5

 Foto nº 6

 Foto nº 7

 Foto nº 8

 Fioto nº 9

Foto nº 10


Fotos (e legendas): © António Ramalho (2018) . Todos os direitos reservados (Edição e legendagem omplementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)



1. Continuação da publicação do álbum de António Ramalho, ex-fur mil at cav,
CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71), membro da Tabanca Grande, nº 757, natural de Vila Fernando, Elvas (*):



CCav 2639  > Guiné 1969/1971  > Listagem de fotos (10/55)


1.  T/T Uíge > Lisboa - Bissau > O 1º Cruzeiro da minha vida, único até hoje!
2. T/T Uíge > A 1ª Refeição a bordo, o Matias já partiu (canto inferior direito).
3. Bula > Içar da bandeira.
4. Bula > Lavandaria pública. 
5. Capunga Resort > O Nosso acampamento.
6. Capunga Resort > O Chalet Cónico dos Furriéis. 
7. Capunga > O 3º Pelotão todo reunido na parada.
8. Capunga > Com o meu inseparável Periquito!
9. Capunga > À falta de manicura!...
10. Bula  > Leitura do jornal da terra, "Linhas de Elvas" [, semanário, com 67 anos de existência, que ainda hoje se publica]

(Continua)
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Guiné 61/74 - P18712: Efemérides (281): O 10 de Junho em Ponte de Lima: convite e programa. Lançamento do livro do nosso grã-tabanqueiro Mário Leitão, "Heróis Limianos da Guerra do Ultramar", às 11h30, no auditório da Câmara Municipal.




Convite que nos chegou hoje através do nosso amigo, camarada, grã-tabanqueiro e escritor Mário Leitão, autor do "Heróis Limianos da Guerra do Ultramar", que irá ser lançado no  10  de Junho, em Ponte de Lima.

Também recebemos o mesmo convite, em  24 de maio passado, por parte do recém-criado Núcleo de Ponte de Lima da Liga dos Combatentes. Transcreve-se a primeira parte da mensagem:

(...) "No momento em que se formaliza oficialmente a instituição do Núcleo de Ponte de Lima da Liga dos Combatentes, vimos apresentar a V. Exª as nossas cordiais saudações e disponibilizar todas as nossas energias para promover a salvaguarda das memórias sagradas dos Soldados naturais de Ponte de Lima que morreram ao serviço de Portugal.

"Nesse sentido, temos a honra de convidar V. Exª para as cerimónias de homenagem aos nossos Combatentes, que este Núcleo vai promover no próximo dia 10 de Junho (DIA DE PORTUGAL)" (... (...) "


Aos nossos camaradas de Ponte de Lima desejamos um grande jornada de festa e de luta. Parabéns ao Mário Leitão por conseguir levar de vencida mais este projeto de resgate da memória dos ex-combatentes limianos, mortos na guerra do Ultramar. E ao Núcleo local da Liga dos Combatentes desejamos as maiores venturas nas prossecução da sua missão.
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Nota do editor:

Guiné 61/74 - P18711: FAP (107): O dia em que a Guerra na Guiné quase terminou… (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

FIAT's em Bissalanca


1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, 1967/69), com data de 31 de Maio de 2018:

O dia em que a Guerra na Guiné quase terminou…

Cumpri apenas uma comissão de serviço no Ultramar durante a minha carreira na Força Aérea Portuguesa. A comissão na Guiné, porém, sobrepôs-se a todas as outras acções e marcou-me indelevelmente para o resto da vida. A mim e certamente a todos os que, de algum modo, partilharam a mesma experiência. É de um destes acontecimentos que a lei da sorte permitiu, não só que vos esteja aqui hoje a relatar, mas que teria provavelmente mudado o destino de toda a guerra colonial se o pior naquele dia de Agosto de 1968 tivesse porventura acontecido. É deste evento que vos irei agora dar conta…

Naquele dia, cumpria-se a rotina habitual relativa à acção da Linha da Frente da Esquadra de Tigres “Os Fiat`s G-91 R4”. Isto é, as diferentes especialidades cumpriam escrupulosamente o seu trabalho com a dedicação e o sentido do dever a cumprir. Os mecânicos, (como eu) electricistas e pessoal de rádio procediam às inspecções de preparação para o voo, enquanto o pessoal de armamento cumpria o rearmamento dos aviões de acordo com o planificado pela chefia do Grupo Operacional. Eram oito as aeronaves a inspecionar, reabastecer e rearmar. Se bem me lembro duas parelhas com Foguetes e Drop tanques suplementares (para aumento de autonomia) e as restantes configuradas com bombas de 200 Kg (pylons internos) e 50 Kg (nos pylons externos) destinadas a bombardeamento de instalações AA inimigas que tinham entretanto sido detectadas e devidamente referidas no mapa..

 Bombas de 200Kg

Em tempos de Guerra, a azáfama de uma linha da frente é sempre frenética e bastante nervosa, uma vez que estamos permanentemente a lidar com material que causa destruição e eventualmente mata ou estropia seres humanos ou animais e arrasa com estruturas quer sejam urbanas ou rurais.

BA 12, 1968 - Assinando o Livro de Inspeção

Todos procuram fazer bem e depressa, o que nem sempre é uma boa mistura e em que por vezes apesar de toda nossa boa vontade não se consegue actuar em perfeita sintonia. No meio de todo aquele frenesim, alguém decidiu (porventura para poupar tempo) que as aeronaves podiam ser abastecidas de combustível ao mesmo tempo que algumas das aeronaves eram carregadas com as bombas e as restantes municiadas com rocketts e os respectivos pentes de balas 12,7mm colocadas nos compartimentos das metralhadoras.

Assim foi com naturalidade que vi chegar o autotanque de JP4 e o vi posicionar-se em frente aos aviões…

O meu camarada e amigo 1.º Cabo MMA, Luís Branco Tavares, após a passagem técnica de inspecção, dado ter sido um dos primeiros a terminar a vistoria, saltou de imediato para cima da asa direita pronto para o abastecimento… Deve ter algures vislumbrado um filme de terror… ou por qualquer outra razão impossível de explicar, deu um berro medonho (ele tinha e tem ainda hoje uma voz de tenor) e gritou a plenos pulmões: “Ó condutor, tira-me ESSA MERDA DAÍ”, o que o Soldado condutor auto cumpriu de imediato. Em boa altura o fez, já que passados minutos se ouviria um disparo que terá passado ao lado da traseira do camião cisterna e rebentado na terra desmatada entre a linha de delimitação da Base Aérea e um tabancal situado a uns quilómetros da zona.

Caros amigos, não creio haver um mínimo de exagero, se vos disser que se acaso o foguete tivesse acertado no camião cisterna, toda a Base teria sido incinerada. Não eram apenas as aeronaves mais próximas, seriam também todas as outras; os T-6, Hélis, DOs, Dakotas, hangar`s e Esquadras, etc., sem nunca esquecer que os depósitos onde eram fabricadas as bombas napalm estava ali bem pertinho a meia dúzia de metros!

A principal vantagem dos militares portugueses na guerra de 1961-74 foi, em meu entender, a superioridade aérea de que a FAP usufruiu durante a guerra. Foi uma vantagem militar sem paralelo do nosso lado e contra a qual durante muito tempo eles não tiveram qualquer forma eficaz de combater. Uma mais-valia que, no entendimento dos responsáveis militares e políticos, se deveu à aposta na intensificação da implementação da aviação militar em África. A actividade aérea, que até 1968 se desenrolou regularmente, só foi limitada pelos meios humanos e materiais ou pelas más condições atmosféricas, o que permitiu um contínuo apoio ao esforço de guerra, assumindo essencialmente três vertentes: transporte, informações e apoio de fogo.

 Bissalanca, 1968 - Fiat's

A partir de 1965 começaram a ser estabelecidos procedimentos para a coordenação entre meios aéreos e de superfície, sendo criados o Centro Conjunto de Apoio Aéreo, em Bissau, e a Secção Conjunta de Apoio Aéreo, em Nova Lamego. Estes organismos permitiram melhorar a comunicação e coordenação entre os três Ramos das Forças Armadas, a determinação de prioridades e a afectação racional dos meios aéreos. A guerra na Guiné teve características muito diferentes da guerra em Angola. A elevada organização da guerrilha e a forma como a sua luta se iniciou, através de acções de combate e não com massacres como em Angola, era reveladores das dificuldades que as FA iriam ter neste território. O principal movimento de libertação era o (PAIGC), que se preparou antecipadamente para a guerra através da formação de quadros, do recrutamento e doutrinação dos combatentes e do treino militar, passando três anos a analisar condições e a recolher apoios internacionais para a rebelião.

Por outro lado, o território guineense possuía um conjunto de características que favoreciam a actuação dos guerrilheiros. A extensa área fluvial, a linha costeira bastante recortada, os largos estuários e braços de mar que penetram profundamente no continente, exigiam operações militares com uma importante componente anfíbia, motivo pelo qual a Armada esteve tão presente neste teatro de operações.

O restante território tinha uma dimensão reduzida, cerca de um terço de Portugal, e era habitado na sua maioria por nativos de várias etnias, algumas estendendo-se para lá das fronteiras. Na Guiné, não só os factores históricos e a hostilidade da geografia e do clima tornaram difícil a actuação das FA, como também as independências da Guiné-Conakry (1958) e do Senegal (1960) tiveram um importante papel na condução da guerra. Estes dois países foram uma importante fonte de apoio aos guerrilheiros do PAIGC, proporcionando-lhe refúgio a Norte, Leste e Sul, onde puderam estabelecer as suas bases e desencadear acções militares na Guiné . O nível de organização do movimento e o armamento moderno de que dispunha (armas automáticas, morteiros, RPG’s, metralhadoras anti-aéreas) possibilitou aos guerrilheiros evoluírem de tal forma rápida que, em 1965, já tinham estendido a sua actuação a todo o território da Guiné. Para piorar a situação militar portuguesa, em termos de apoio aéreo, devido a pressões exercidas pelos EUA a Força Aérea Portuguesa foi obrigada a retirar da Guiné os oito F-86F, a principal arma de ataque aéreo de que dispunha.

F-86F 354 nos céus da Guiné

Desde a retirada destes, em finais de Outubro de 1964, e a chegada dos seus substitutos, os novos caças FIAT G-91 R4 adquiridos à Alemanha Ocidental, as missões de apoio aéreo próximo às forças no terreno foram garantidas pelas aeronaves T-6G. Este era um avião que estava longe de possuir o mesmo poder de fogo do anterior F-86F ou do posterior FIAT G-91 R4, o que terá contribuído para que no período de dezoito meses entre a saída de uns e a entrada ao serviço de outros, a guerrilha tenha reforçado a sua presença no terreno, especialmente na região a Sul. A evolução militar da guerrilha permitiu ao PAIGC, em 1966, anunciar publicamente o controlo de dois terços do território, afirmando que a Guiné era “um Estado em desenvolvimento, estando um terço do seu território a ser objecto de agressão imperialista". Por esta altura, o PAIGC começou a desencadear acções militares mais arrojadas, perto da guerra convencional, embora nestes casos ficasse muito exposto à acção aérea, especialmente nas áreas de menor densidade florestal. A inferioridade do inimigo na guerra aérea levou a que desde cedo procurassem anular esta vantagem das força armadas portuguesas, recorrendo para tal ao uso de artilharia anti-aérea.

Portanto, aquele foi um dia de sorte para todos nós, um dia em que as nossas vidas e própria guerra podia ter tido um final trágico na Guiné!

Mário Santos
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18690: FAP (106): Fotos da montagem dos primeiros FIAT's G-91 R/4 destinados à Esquadra de Tigres de Bissalanca (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

Guiné 61/74 - P18710: Parabéns a você (1447): Manuel Traquina, ex-Fur Mil Enfermeiro da CCAÇ 2382 (Guiné, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 3 de Junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18705: Parabéns a você (1446): António Azevedo Rodrigues, ex-1.º Cabo do CMD AGR 2957 (Guiné, 1968/70)

segunda-feira, 4 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18709: Convívios (861): Rescaldo do convívio do pessoal da CCAV 2748 levado a efeito no passado dia 2 de Junho nas Caldas da Rainha (Francisco Palma, ex-Soldado Condutor)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Palma (ex-Soldado Condutor Auto Rodas da CCAV 2748 / BCAV 2922, Canquelifá, 1970/72), com data de 2 de Junho de 2018, com o rescaldo do convívio do pessoal da sua Unidade. 

Camaradas,
A CCAV 2748 de de Canquelifá, 1970-72, realizou no dia 02 de Junho de 2018 o seu Convívio Anual, juntando 88 presenças na Tornada Caldas da Rainha.

Foi com muita alegria e troca de memórias que o tempo "voou" e se conviveu com saudade e alegria.
Diremos que a ligação destes Combatentes está cada dia mais forte e ficaram votos e pedidos de repetição para o novo reencontro no próximo ano.

Francisco Palma






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Nota do editor

Último poste da série de 31 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18699: Convívios (860): Rescaldo do XXVIII Encontro dos Maiorais da CCAÇ 2381, levado a efeito no passado dia 5 de Maio de 2018, em Abrantes (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro)

Guiné 61/74 - P18708: Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capítulos 55 e 56: "Amanhã, 19 de maio de 1973, faço 23 anos e vou dar um baile só é pena aqui não haver raparigas”.


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > "Alegria das primeiras chuvas"...
 Foto (e legendagem): © Jorge Pinto (2014). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Continuação da pré-publicação do próximo livro (na versão manuscrita, "Em Nome da Pátria") do nosso camarada José Claudino Silva [foto atual à esquerda] (*)

(i) nasceu em Penafiel, em 1950, "de pai incógnito" (como se dizia na época e infelizmente se continua a dizer, nos dias de hoje), tendo sido criado pela avó materna;

(ii) trabalhou e viveu em Amarante, residindo hoje na Lixa, Felgueiras, onde é vizinho do nosso grã-tabanqueiro, o padre Mário da Lixa, ex-capelão em Mansoa (1967/68), com quem, de resto, tem colaborado em iniciativas culturais, no Barracão da Cultura;

(iii) tem orgulho na sua profissão: bate-chapas, agora reformado; completou o 12.º ano de escolaridade; foi um "homem que se fez a si próprio", sendo já autor de dois livros, publicados (um de poesia e outro de ficção);

(iv) tem página no Facebook; é avô e está a animar o projeto "Bosque dos Avós", na Serra do Marão, em Amarante;

(ix) é membro n.º 756 da nossa Tabanca Grande.

2. Sinopse dos postes anteriores:

(i) foi à inspeção em 27 de junho de 1970, e começou a fazer a recruta, no dia 3 de janeiro de 1972, no CICA 1 [Centro de Instrução de Condutores Auto-rodas], no Porto, junto ao palácio de Cristal;

(ii) escreveu a sua primeira carta em 4 de janeiro de 1972, na recruta, no Porto; foi guia ocasional, para os camaradas que vinham de fora e queriam conhecer a cidade, da dos percursos de "turismo sexual"... da Via Norte à Rua Escura;

(iii) passou pelo Regimento de Cavalaria 6, depois da recruta; promovido a 1.º cabo condutor autorrodas, será colocado em Penafiel, e daqui é mobilizado para a Guiné, fazendo parte da 3.ª CART / BART 6250 (Fulacunda, 1972/74);

(iv) chegada à Bissalanca, em 26/6/1972, a bordo de um Boeing dos TAM - Transportes Aéreos Militares; faz a IAO no quartel do Cumeré;

(v) no dia 2 de julho de 1972, domingo, tem licença para ir visitar Bissau, e fica lá mais uns tempos para um tirar um curso de especialista em Berliet;

(vi) um mês depois, parte para Bolama onde se junta aos seus camaradas companhia; partida em duas LDM para Fulacunda; são "praxados" pelos 'velhinhos' (ou vê-cê-cês), os 'Capicuas", da CART 2772;

(vii) faz a primeira coluna auto até à foz do Rio Fulacunda, onde de 15 em 15 dias a companhia era abastecida por LDM ou LDP; escreve e lê as cartas e os aerogramas de muitos dos seus camaradas analfabetos;

(viii) é "promovido" pelo 1.º sargento a cabo dos reabastecimentos, o que lhe dá alguns pequenos privilégio como o de aprender a datilografar... e a "ter jipe";

(ix) a 'herança' dos 'velhinhos' da CART 2772, "Os Capicuas", que deixam Fulacunda; o Dino partilha um quarto de 3 x 2 m, com mais 3 camaradas, "Os Mórmones de Fulacunda";

(x) Dino, o "cabo de reabastecimentos", o "dono da loja", tem que aprender a lidar com as "diferenças de estatuto", resultantes da hierarquia militar: todos eram clientes da "loja", e todos eram iguais, mas uns mais iguais do que outros, por causa das "divisas"... e dos "galões"...

(xi) faz contas à vida e ao "patacão", de modo a poder casar-se logo que passe à peluda; e ao fim de três meses, está a escrever 30/40 cartas e aerogram as por mês; inicialmente eram 80/100; e descobre o sentido (e a importância) da camaradagem em tempo de guerra.

(xii) como "responsável" pelo reabastecimento não quer que falte a cerveja ao pessoal: em outubro de 1972, o consumo (quinzenal) era já de 6 mil garrafas; ouve dizer, pela primeira vez, na rádio clandestina, que éramos todos colonialistas e que o governo português era fascista; sente-se chocado;

(xiii) fica revoltado por o seu camarada responsável pela cantina, e como ele 1º cabo condutor auto, ter apanhado 10 dias de detenção por uma questão de "lana caprina": é o primeiro castigo no mato...; por outro lado, apanha o paludismo, perde 7 quilos, tem 41 graus de febre, conhece a solidariedade dos camaradas e está grato à competência e desvelo do pessoal de saúde da companhia.

(xiv) em 8/11/1972 festejava-se o Ramadão em Fulacunda e no resto do mundo muçulmano; entretanto, a companhia apanha a primeira arma ao IN, uma PPSH, a famosa "costureirinha" (, o seu matraquear fazia lembrar uma máquina de costura);

(xv) começa a colaborar no jornal da unidade (dirigido pelo alf mil Jorge Pinto, nosso grã-tabanqueiro), e é incentivado a prosseguir os seus estudos; surgem as primeiras dúvidas sobre o amor da sua Mely [Maria Amélia], com quem faz, no entanto, as pazes antes do Natal; confidencia-nos, através das cartas à Mely as pequenas besteiras que ele e os seus amigos (como o Zé Leal de Vila das Aves) vão fazendo;

(xvi) chega ao fim o ano de 1972; mas antes disso houve a festa do Natal (vd. capº 34º, já publicado noutro poste); como responsável pelos reabastecimentos, a sua preocupação é ter bebidas frescas, em quantidade, para a malta que regressa do mato, mas o "patacão", ontem como hoje, era sempre pouco;

(xvii) dá a notícia à namorada da morte de Amílcar Cabral (que foi em 20 de janeiro de 1973 na Guiné-Conacri e não no Senegal); passa a haver cinema em Fulacunda: manda uma encomenda postal de 6,5 kg à namorada;

(xviii) em 24 de fevereiro de 1973, dois dias antes do Festival da Canção da RTP, a companhia faz uma operação de 16 horas, capturando três homens e duas Kalashnikov, na tabanca de Farnan.

(xix) é-lhe diagnosticada uma úlcera no estômago que, só muito mais tarde, será devidamente tratada; e escreve sobre a população local, tendo dificuldade em distinguir os balantas dos biafadas;

(xx) em 20/3/1973, escreve à namorada sobre o Fanado feminino, mas mistura este ritual de passagem com a religião muçulmana, o que é incorreto; de resto, a festa do fanado era um mistério, para a grande maioria dos "tugas" e na época as autoridades portuguesas não se metiam neste domínio da esfera privada; só hoje a Mutilação Genital Feminina passou a a ser uma "prática cultural" criminalizada.

(xxi) depois das primeiras aeronaves abatidas pelos Strela, o autor começa a constatar que as avionetas com o correio começam a ser mais espaçadas;

(xxii) o primeiro ferido em combate, um furriel que levou um tiro nas costas, e que foi helievacuado, em 13 de abril de 1973, o que prova que a nossa aviação continuou a voar depois de 25 de março de 1973, em que foi abatido o primeiro Fiat G-91 por um Strela;

(xxiii) vai haver uma estrada alcatroada de Fulacunda a Gampará; e Fulacunda passa a ter artilharia (obus 14); e o autor faz 23 anos em 19 de maio de 1973; a 21, sai para Bissau, para ir de férias à Metrópole; um grupo de 10 camaradas alugam uma avioneta, civil, que fica por um conto e oitocentos escudos [equivalente hoje a 375,20 €];

(xxiv) considerações sobre i clima, as chuvas; em 19/5/1973, faz 23 anos...


3. Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capºs 55 e 56


[O autor faz questão de não corrigir os excertos que transcreve, das cartas e aerogramas que começou a escrever na tropa e depois no CTIG à sua futura esposa. E muito menos fazer autocensura 'a posterior', de acordo com o 'politicamente correto'... Esses excertos vêm a negrito. O livro, que tinha originalmente como título "Em Nome da Pátria", passa a chamar-se "Ai, Dino, o que te fizeram!", frase dita pela avó materna do autor, quando o viu fardado pela primeira vez. Foi ela, de resto, quem o criou. ]


55º Capítulo  > AS ARMAS GRANDES


Tento ser o mais coerente que posso mas a realidade de há 45 anos atrás entrechoca-se com o meu pensamento de agora. Leiam:

“Meu bem.

Normalmente por aqui tudo decorre bem mas amanhã vai haver aqui um pouco de movimento, vêm para cá trinta negros que possivelmente ficarão aqui no quartel para saírem para o mato com os meus camaradas. Estes negros também são militares como eu mas para ser franco não gosto deles misturados connosco, pois de qualquer maneira são pretos na mesma como os “turras”. Lá vou tendo paciência e suporto-os o melhor possível”.


Se vos disser que me arrependo do que então pensava estarei a mentir. Se vos disser que a minha ignorância pode desculpar, em certa medida, esse pensamento, tem alguma lógica. A Pátria. A Bandeira que todos os dias içávamos no mastro da parada. O Hino cantado nas mais díspares circunstâncias tolhiam um pouco o raciocínio a cada um de nós. As coisas não mudaram assim tanto nestes anos. Os nacionalismos bacocos aí estão a singrar pelo mundo, denotando uma imensa falta de solidariedade entre todos os povos. Em minha defesa, sou levado a afirmar:eu estava e continuei a estar, por mais alguns meses, convencido de que defendia Portugal.

De súbito, as minhas piores previsões sobre o correio concretizaram-se.

“A carreira da avioneta vai acabar, de maneira que… a menos que paguemos o aluguer… o correio só virá de barco, portanto de quinze em quinze dias, até eu irei de barco para Bissau, lá para o dia 16 ou 17 pois alugar avionetas é muito caro, não tenho outra alternativa terei de me resignar a mais esta contrariedade.

Hoje veio o barco trazer as tais armas grandes [Obus 14].

Quando tal começo mas é a fazer as malas para ir da férias”.


Receber correspondência era o melhor a que podíamos aspirar naquele fim do mundo, o que na sua ausência nos fazia ficar cada vez mais irascíveis. Pelo menos eu, no que até agora reli, percebo que o meu humor vogava ao sabor das notícias que ia recebendo. As armas grandes a que me refiro eram três obuses 14.

Que grande alteração já a seguir.

“Afinal ficou hoje resolvido que vamos de avioneta até Bissau. Como somos dez fizemos uma panelinha e como é uma avioneta Maior em vez de 400$00 fica por 180$00 a cada um. De avioneta são 20 minutos de barco seriam dois dias. Saio daqui no dia 21”.


56º Capítulo  > CHEGOU UM “PERIQUITO”


Já mais de uma vez pensei: que interesse tem o que escrevo neste livro, ou o que escrevi à namorada, para a maioria das pessoas? São histórias pessoais.

Infelizmente, não são. Se sou eu que assumo a sua autoria, aqueles por quem escrevi, em virtude de serem analfabetos, ou aqueles que o fizeram eles próprios, se tivessem guardado a correspondência, as histórias seriam muito parecidas. Os nove que me acompanharam, quando vim de férias, tinham um discurso quase igual ao meu.

Agora, quando nos encontramos anualmente, reparamos nas enormes diferenças que nos separam; naqueles dois anos parecíamos todos iguais.

Tenho tentado e vou continuar a fazê-lo: dar uma ideia do que diariamente ia acontecendo, intercalando acontecimentos graves com coisas banais, como por exemplo:

“Já chegou o clarim que veio substituir o que tinha sido evacuado. Coitado do rapaz por onde passa todos fazem pouco dele, vem tão branquinho que parece ter saído agora da lavandaria e sabes como é, os velhos gozaram-nos a nós agora é a nossa vez.

Salta pira salta pira.
Periquito vai pró mato.
Olé lé lá que a velhice vai prá Metrópole
Olaré lé lé.

Depois ensino-te a música”.


Coisa estúpida, não?

Ou esta:

"Embora isto não te interesse muito quero que saibas que continuo a surpreender-me com este clima. Hoje choveu e foi de tal forma que eu nunca vi tal, já vi chover muitas vezes mas como hoje nunca, o engraçado é que antes de a chuva começar, somos avisados.

Está um calor horrível depois começa a soprar vento até se parecer com um ciclone e só depois é que chove torrencialmente durante mais ou menos meia hora, depois pára e dá lugar novamente a um calor infernal, que muito dificilmente se suporta. Este clima não haja duvida que é um clima curioso, mas o mais engraçado é que aqui chove todos os anos e em Cabo Verde que é relativamente perto não chove há sete anos. Os militares tem um litro de água para beber por dia, agora para tomar banho etc. é com água salgada. Os soldados que lá estão vêem-se à rasca com a sede”.


Pior ainda o que disse no dia seguinte:

“Amanhã faço 23 anos e vou dar um baile só é pena aqui não haver raparigas”.
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Nota do editor:

Último poste da série > 31 de maio de 2018 >  Guiné 61/74 - P18698: Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capítulos 53 e 54; vai haver uma estrada alcatroada até  Gampará, e vamos ter artiilharia em Fulacunda