Blogue coletivo, criado e editado por Luís Graça, com o objetivo de ajudar os antigos combatentes a reconstituir o puzzle da memória da guerra da Guiné (1961/74). Iniciado em 23 Abr 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência desta guerra. Como camaradas que fomos, tratamo-nos por tu, e gostamos de dizer: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quinta-feira, 31 de dezembro de 2020
Guiné 61/74 - P21714: Parabéns a você (1916): Adelaide Barata Carrelo, Amiga Grã-Tabanqueira
Nota do editor
Último poste da série de 27 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21696: Parabéns a você (1915): José Pedro Neves, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 4745 (Guiné, 1973/74)
quarta-feira, 30 de dezembro de 2020
Guiné 61/74 - P21713: Recortes de imprensa (113): Guiné-Bissau: Crianças tornadas mulheres à força (Joana Benzinho, "Bird Magazine", 19 de outubro de 2020)
Um dia conheci uma menina numa instituição da Guiné-Bissau com um ar demasiado frágil para os seus 14 anos e com quem me sentei a conversar. Contou-me que um dia, há alguns meses atrás, tinha fugido da aldeia onde vivia com os pais e irmãos para não acabar na cama e na vida de um homem muito mais velho.
Os seus pais tinham acertado o dote e o casamento à revelia da sua menoridade e da sua vontade e era questão de horas ou dias acontecer aquela violação consentida e para a vida, por parte de quem a devia proteger. A menina encheu-se de toda a coragem que nunca pensou concentrar na sua breve juventude e saiu de casa sem nada, quando a noite caiu e todos dormiam.
Talvez não tenha tido noção da amplitude do seu gesto naquele instante mas ele veio mudar toda a sua vida de uma forma dura e definitiva. A partir daquele momento a menina deixou de ter família, de ter aldeia, de ter amigos, de ter escola, de ter amparo. A corajosa decisão que tomou fez os pais, familiares e vizinhos cortar definitivamente relações com ela. É sempre assim.
Aos 14 anos partiu para o mundo sozinha. Procurou ajuda ao cabo de muitos quilómetros a errar pela noite escura e encontrou-a, mesmo que de forma temporária. Quando a conheci, a precariedade da sua situação ainda se mantinha e o medo de ser procurada fazia-a tremer a cada chegada de um carro ou ao cruzar um rosto desconhecido.
Estas meninas feitas mulheres pela crueldade da família ou casam ou ficam sozinhas no mundo. Não há meio termo. E quando ficam sozinhas nem sempre conseguem encontrar a ajuda adequada ao drama que estão a viver. Umas acabam violentadas, outras violadas, outras enganadas por quem é suposto protegê-las, algumas na prostituição. Outras fogem para o colo de quem as devia defender dos casamentos forçados e onde acabam precisamente pela sua mão.
São meninas a quem foi roubada de repente a vida na sua plenitude, quando este conceito por si já é tão limitado na Guiné-Bissau. Algumas infelizmente não aguentam a pressão da fuga e voltam para os braços dos carrascos que as agridem e as casam de imediato.
São estas meninas feitas mulheres que vivem no anonimato na Guiné-Bissau mas que engrossam estatísticas dos casamentos forçados e precisam de quem as proteja. De quem as acolha e lhes proporcione apoio emocional, depois de se verem despojadas de qualquer afecto filial e traídas pelas pessoas em quem mais confiavam. De quem lhes dê apoio pedagógico para que não engrossem os números da ileteracia da Guiné-Bissau. De quem lhe dê ferramentas formativas para abraçarem a vida de forma activa e com independência financeira quando atingirem a maioridade.
Como esta menina com quem conversei, há muitas outras na Guiné-Bissau e pelo mundo fora. E com a pandemia, os estados de emergência e os confinamentos os casos tornaram-se aparentemente mais numerosos, mais incógnitos e com consequências mais graves pois muitas meninas não conseguem fugir deste drama que lhes vai cortar a infância e destruir a vida.
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(*) A BIRD Magazine é uma revista online nascida em 2013. A BIRD Magazine é um meio independente, plural e equilibrado, orientado pela ética e deontologia jornalística. A BIRD Magazine procura a verdade, o rigor, a isenção e promove um espaço público de debate através dos seus cronistas residentes.
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Nota do editor:
Último poste da série > 4 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21222: Recortes de imprensa (112): entrevista ao antropólogo Vasco Gil Calado sobre droga e álcool na guerra colonial, "Público", 2 de agosto de 2020 (Carlos Pinheiro)
Guiné 61/74 - P21712: (D)o outro lado do combate (63): Amílcar Cabral e o Boé: a importância estratégica da região (Jorge Araújo)
Foto 1> Citação: (1966-1973), "Amílcar Cabral com um destacamento das FARP do PAIGC (na região do Boé; Frente Leste)", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_44176, com a devida vénia.
GUINÉ: (D)O OUTRO LADO DO COMBATE >
AMÍLCAR CABRAL E O BOÉ:
A IMPORTÂNCIA ESTRATÉGICA DA REGIÃO
- DIRECTIVAS E INSTRUÇÕES MILITARES DIFUNDIDAS EM 1965 -
1. - INTRODUÇÃO
Perto de completar trinta meses, após o início do conflito em Tite [em 23Jan63], e quinze meses antes da «Operação Madina do Boé» [em 10Nov66], a maior acção militar realizada até então pelos guerrilheiros do PAIGC, em cooperação com meia-dúzia de elementos do contingente cubano chegados, em 29Abr66, a Conacri – P21547 –, Amílcar Cabral (1924-1973) decide enviar uma "mensagem" aos seus camaradas operacionais, combatentes do exército popular, em nomadização na região do Boé (ver mapa acima).
Nessa "mensagem", datada de 1 de Julho de 1965, uma quinta-feira, reafirma, como "palavra de ordem", a importância estratégica dessa região para a libertação de toda a área circundante, compreendida entre Xitole, Bambadinca, Bafatá e Gabu.
Pela relevância do seu conteúdo, pois faz parte da historiografia do conflito a que designei anteriormente de «Guerra dos Doze Anos» [CTIG; 1963-1974 (P21547)], e porque o dossiê "Madina do Boé" continua em aberto, tomei a iniciativa de o partilhar no nosso fórum, organizando a apresentação em pequenos fragmentos, com o objectivo de facilitar a sua leitura, tendo por fonte de investigação, uma vez mais, o valioso espólio documental de Amílcar Cabral, disponível na Fundação Mário Soares.
2. - MENSAGEM DIRIGIDA AOS COMBATENTES DAS FARP DO BOÉ DATADA DE 01 DE JULHO DE 1965
Ø Camaradas.
Vocês todos sabem que a região do Boé é muito importante para a nossa luta na nova fase em que nos encontramos. Na verdade, se acabarmos rapidamente de libertar a região do Boé, se conseguirmos tirar dali todas as forças inimigas, criamos uma situação difícil para as tropas portuguesas que estão em Bafatá e no Gabu. Criamos além disso uma base muito boa para libertar rapidamente toda a área compreendida entre o rio Corubal, Xitole, Bambadinca, Bafatá e o Gabu.
O Partido tem feito grandes esforços para libertar totalmente o Boé, onde tem operado uma subsecção e dois bigrupos bem armados.
Sabemos que as nossas forças têm tido dificuldades por falta de consciência política da população e por falta de alimentação em alguns momentos numa região onde há pouca comida. Vocês têm feito algumas acções boas e conseguiram destruir [?] a "jangada de Xexe [Ché-Che, em 11 de Maio de 1965, 3.ª feira, conforme comunicado abaixo, manuscrito por Umaro Djaló [1940-2014], cmdt da subsecção "Rui Djassi"] e atacar Madina do Boé com sucesso. Mas temos de lembrar que podíamos ter feito muito mais, se agíssemos sempre com mais conhecimento das condições do inimigo e se não cometêssemos certos erros.
Sabemos que o inimigo já refez outra jangada [?], mas sabemos todos que ele tem pouca gente no Boé. Cremos que basta uma subsecção forte e decidida para criar ao inimigo uma situação difícil e correr com ele do Boé durante esta época das chuvas. Além disso, reduzindo o número de combatentes no Boé fica mais fácil dar comida para esses combatentes, em virtude das dificuldades de transporte durante as chuvas.
Mas têm de ficar no Boé os combatentes que têm dado provas de coragem e de audácia para garantirem o cumprimento do nosso dever nessa região.
Ø Camaradas,
O Boé tem condições muito favoráveis para a nossa luta. Desde que haja alimentação, não haverá razão nenhuma para não libertarmos totalmente o Boé em pouco tempo.
O que é preciso é iniciativa, audácia, coragem e acção, com base no conhecimento concreto do inimigo.
Temos de libertar completamente o Boé até ao fim do mês de Julho [de 1965]. Este é um trabalho importante do nosso Partido que nada poderá evitar.
Avante, pois, na libertação total do Boé, região importante para o grande avanço da nossa luta.
Pelo Bureau Político do PAIGC
Amílcar Cabral (Secretário-Geral)
1 de Julho de 1965
Ø Que devemos fazer para correr com os portugueses do Boé?
- Nós (PAIGC] deveremos:
■ 1. - Limitar o número de homens a uma subsecção, bem armada e dispondo de morteiros e bazucas. Obter informações sobre o inimigo.
■ 2. - Instalar armas anti-aéreas (DCK) para ataques aos aviões. Fazer sempre tiros contra os aviões e helicópteros. Destruir os campos de aviação.
■ 3. - Destruir a ponte da estrada do Boé que fica logo depois de Contabane. Minar essa estrada.
■ 4. - Colocar um grupo de emboscada perto a Guilejezinho.
■ 5. - Destruir a jangada de Xexe [Ché-Che], mesmo que para isso seja possível combater. Devemos atacar e destruir a jangada no momento em que esteja a trabalhar, quando chegar à margem do lado de Madina.
■ 6. - Colocar armas pesadas no porto de Xexe para não deixar passar o inimigo.
■ 7. - Bombardear Madina [do Boé] com morteiros de dia e de noite.
■ 8. - Fazer ataques rápidos e muitas vezes a Madina [do Boé], sobretudo com bazucas, para destruir casas em que está a tropa. Retirar-se.
■ 9. - Concentrar forças e atacar Madina [do Boé], para destruir o quartel inimigo e todos os soldados inimigos (mortos ou presos).
■ 10. - Concentrar forças e atacar Béli, depois de bombardear com morteiros e bazucas.
■ 11. - Controlar as estradas de Xexe [Ché-Che], Contabane e Palaque (ao norte de Béli), que vai para Cabuca).
■ 12. - Organizar e controlar a população em todas as zonas dentro do Boé.
■ 13. - Colocar armas pesadas ao longo do rio Corubal (em todos os quartéis) para evitar o regresso do inimigo.
■ 14. - Instalar várias armas anti-aéreas em pontos estratégicos de maneira a destruir todos os aviões que venham a Boé.
Fonte: Citação: (1965), "Mensagem aos camaradas militantes e responsáveis, combatentes do exército popular em Boé", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_40509
3. - DESTRUIÇÃO [?] DA "JANGADA DE CHÉ-CHE"
- EM 11 DE MAIO DE 1965 – COMUNICADO DE UMARO DJALÓ
De modo a poder validar a informação descrita na "mensagem" de Amílcar Cabral sobre a destruição da "jangada de Ché-Che", em Maio de 1965, encontrámos uma referência a essa ocorrência, assinada pelo Cmdt, à época, na região do Boé – Umaro Djaló –, que seguidamente se transcreve:
Ø Comunicado
Comunicamos à direcção do nosso Partido que destruímos a "jangada de Cheche" no dia 11 do mês corrente [Maio de 1965], às 4 horas da manhã. Foi totalmente destruída, e o homem que guardava a jangada conseguiu fugir no momento em que os camaradas progrediam em direcção do objectivo, e não conseguiram prendê-lo. Também os camiões que se encontravam na travessia foram igualmente destruídos.
A reacção das tropas em Madina [do Boé], depois de se aperceberem da detonação do explosivo, chamaram a intervenção da aviação, que imediatamente chegaram dois aviões às 6 horas do mesmo dia e rondaram até às 12 horas.
Agora estamos preparando um novo ataque sobre Béli, às sabotagens repetidas, sem interrupções. Pedimos que nos mandem munições, o mais depressa possível.
L-1-10 + bazucas, obuses chineses e checos, binóculos.
Madina do Boé, 12-5-1965
O comandante; Umaro Djaló.
Fonte: Citação: (1965), "Comunicado [Frente Leste]", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_40708
4. - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Chegados ao fim da presente narrativa, mais uma tendo por temática «Madina do Boé»: factos encontrados na literatura, escritos por Amílcar Cabral dois anos e meio após o início do conflito, não nos foi possível localizar qualquer "contraditório", por parte das NT, quanto à destruição da «Jangada de Ché-Che» em 11 de Maio de 1965.
Como última hipótese de tal poder vir a acontecer, acreditamos que o nosso camarada Manuel Luís Lomba esteja em situação privilegiada para legitimar/confirmar, ou não, esse facto (caso ainda dele tenha memória), já que, como é aludido no P18623, "a região do Boé foi também um dos 'amores' da malta operacional do BCAV 705, transferido de emergência para o Leste, em Maio de 1965 [a mesma data da ocorrência acima], e calhou à CCAV 704 [Companhia de Cavalaria 704] assentar arraiais em Madina [do Boé] e Béli, comandada pelo então Capitão de Cavalaria Fernando Ataíde."
Aguardemos o seu feedback.
► Fontes consultadas:
Ø (1) Instituição: Fundação Mário Soares Pasta: 07069.107.012. Título: Mensagem aos camaradas militantes e responsáveis combatentes do exército popular em Boé. Assunto: Mensagem de Amílcar Cabral, Secretário-Geral do PAIGC, aos militantes e responsáveis combatentes do Exército Popular no Boé, reafirmando a importância estratégica dessa região para a libertação de toda a área circundante (Xitole, Bambadinca, Bafatá e Gabu). Directivas e instruções militares aos combatentes para a conquista e libertação do Boé. Data: Quinta, 1 de Julho de 1965. Observações: Doc incluído no dossier intitulado Exército Popular / Zona Sul 1964-1965. Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral. Tipo Documental: Documentos.
Ø (2) Instituição: Fundação Mário Soares Pasta: 07069.107.027. Título: Comunicado [Frente Leste]. Assunto: Comunicado assinado pelo Comandante Rui Djassi (erro) [Umaro Djaló] sobre a acção de destruição da jangada de Cheche e a preparação de um novo ataque a Béli. Data: Quarta, 12 de Maio de 1965. Observações: Doc incluído no dossier intitulado Exército Popular / Zona Sul 1964-1965. Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral. Tipo Documental: Documentos.
Ø Outras: as referidas em cada caso.
Termino, agradecendo a atenção dispensada.
Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.
Um melhor Ano de 2021.
Jorge Araújo.
28DEZ2020
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Último poste da série > 15 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21547: (D)o outro lado do combate (62): o primeiro contingente cubano em acção no Boé em 1966 (Jorge Araújo)
Guiné 61/74 - P21711: Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (36): Núcleo de Ponte de Lima da Liga dos Combatentes; Fernando Chapouto, ex-Fur Mil; Jorge Picado, ex-Cap Mil; Prof Armando Tavares da Silva, Historiador e António Acílio Azevedo, ex-Cap Mil
Para os voluntariosos administradores e colaboradores desse magnífico blogue, a começar pelo Luís Graça, aqui vai o nosso postal de Boas Festas!
2. Mensagem do nosso camarada Fernando Chapouto, (ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 1426, 1965/67, Geba, Camamudo, Banjara e Cantacunda com data de 24 de Dezembro de 2020:
Desejo que tenham um Santo Natal e um Feliz Ano Novo na companhia de toda a família
Abraço
Fernando Chapouto
3. Mensagem do nosso camarada Jorge Picado (ex-Cap Mil do CAOP 1, Teixeira Pinto, e CMDT da CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa e da CART 2732, Mansabá, 1970/72) com data de 24 de Dezembro de 2020:
Amigo Luís
Votos de Feliz Natal e um Melhor 2021 é o que desejo para Todos Vós, com muita saúde e esperança em melhores dias, para voltarmos aos convívios.
Abraça-vos o Ilhavense
Jorge Picado
4. Mensagem do Prof Armando Tavares da Silva, historiador, com data de 24 de Dezembro de 2020:
Os meus votos de Feliz Natal e de Bom Ano Novo para o Grande Impulsionador de um importantíssimo blogue.
Abraço do
Armando
5. Mensagem do nosso camarada António Acílio Azevedo, ex-Cap Mil, CMDT da 1.ª CCAV/BCAV 8320/72 e da CCAÇ 17, Bula e Binar, 1973/74, com data de 30 de Dezembro de 2020:
Agradecido pela amizade, endereço a todos os sinceros votos de um Ano de 2021, bem melhor que este que está a terminar.
Muita saúde e paz para todos.
Um forte abração
António Acilio Azevedo
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Nota do editor:
Último poste da série de 30 de Dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21707: Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (35): Patrício Ribeiro, entre margens, do Mansoa ao Vouga
Guiné 61/74 - P21710: Fichas de unidades (14): CCAÇ 2753, "Os Barões do K3" (Brá, Bironque, Madina Fula, Saliquinhedim/K3 e Mansabá, 1970/72)
Ficha de unidade > Companhia de Caçadores nº 2753
Identificação: CCaç 2753 [Tem mais de 3 dezenas de referências no blogue]
Unidade Mob: BII 17 - Angra do Heroísmo
Cmdt: Cap Mil Art João Domingues da Rocha Cupido
Divisa: "Noblesse Oblige"
Partida: Embarque em 08Ag070; desembarque em 17Ag070
Regresso: Embarque em 26Jun72
Após o desembarque, ficou colocada em Brá (Bissau), a fim de se integrar no dispositivo e manobra do COMBIS em substituição da CCaç 2445, com um pelotão destacado em Safim e João Landim, onde substituíu idêntico efectivo da CArt 2520, colaborando na segurança e protecção das instalações e das populações da área.
A partir de 30Nov70 e até 17Dez70, substituída dias depois pela CCaç 2754, deslocou um pelotão por semana para Mansabá, a fim de integrar o dispositivo e manobra do COP 6, com vista à segurança e protecção da continuação dos trabalhos de asfaltagem da estrada Mansabá-Farim.
A partir de 21Dez70, em substituição da CCaç 17, assumiu a responsabilidade do destacamento de máquinas de Bironque e, em face do andamento dos trabalhos, em 13Jan71, do destacamento de Madina Fula.
Em 02Mar71, instalou-se em Saliquinhedim [K3], para onde já seguira um pelotão em 15Fev71, assumindo a responsabilidade do subsector então novamente reactivado.
Em 22Fev72, foi substituída em Saliquinhedim pela CCaç 3 e foi transferida para Mansabá, onde assumiu a responsabilidade do respectivo subsector em 23Fev72, em substituição da CArt 2732, no mesmo sector do COP 6.
Em 24Mai72, foi rendida no subsector de Mansabá pela CArt 3567, permanecendo, no entanto, nesta zona de acção em reforço da guarnição local até 19Jun72, após o que recolheu a Bissau a fim de aguardar o embarque de regresso.
Observações:
Tem História da Unidade (Caixa n." 85 - 2." Div/c." Sec, do AHM). (**)
Excerto de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas de unidade: Tomo II - Guiné - (1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002), p. 391
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Notas do editor:
(*) Último poste da série > 22 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21472: Fichas de unidades (13): CCAÇ 1589 / BCAÇ 1894 (Bissau, Fá Mandinga, Nova Lamego, Béli, Madina do Boé, 1966/68)... E recordando algumas das melhoras fotos do alentejano Manuel Coelho, que foi fur mil trms de "Os Tufas"
(**) Vd. poste de 5 de janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1403: Histórias de Vitor Junqueira (6): A açoriana CCAÇ 2753: uma família, uma unidade feita à medida
Guiné 61/74 - P21709: Historiografia da presença portuguesa em África (245): Guiné, o seu primeiro grande relato no século XIX: O Capitão-de-Fragata da Real Armada, José Joaquim Lopes de Lima (1) (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 5 de Fevereiro de 2020:
Queridos amigos,
Tratando-se de um relatório, que tinha todos os requisitos para ser sensaborão, fora pedido a este Cavaleiro da Torre e Espada, que governara possessões no Oriente e era um emérito administrador colonial, que esmiuçasse números de gentes e negócios, a grande surpresa é a sua capacidade descritiva, documentou-se a sério e momentos há em que tudo leva a crer que sai do seu punho uma joia da literatura de viagens, e num bom português do tempo.
Recorde-se que este oficial da Armada percorreu as parcelas do Império, consagrou-lhe seis volumes, sendo o primeiro dedicado a Cabo Verde e suas dependências na Guiné Portuguesa, ainda estamos distantes da autonomização de 1879. Um belo documento, de consulta obrigatória para qualquer curioso ou investigador da Guiné.
Um abraço do
Mário
Guiné, o seu primeiro grande relato no século XIX:
O capitão-de-fragata da Real Armada José Joaquim Lopes de Lima (1)
Mário Beja Santos
José Joaquim Lopes de Lima foi Oficial da Armada e Administrador Colonial com vasto currículo, governou a Índia e Timor e Solor, entre outras responsabilidades. Cavaleiro da Torre e Espada, membro do Conselho de Sua Majestade Fidelíssima, a Rainha D. Maria II, deram-lhe uma incumbência graúda, que ele abraçou, dando à estampa seis volumes que a pretexto da estatística das possessões portuguesas revelou um emérito plumitivo, um viajante curioso e documentado. O primeiro volume é dedicado a Cabo Verde e às suas dependências na Guiné Portuguesa. Tanto quanto sabemos, e independentemente de na época ser publicada a memória sobre a Senegâmbia Portuguesa, de Honório Pereira Barreto, outra joia narrativa e peça historiográfica incontornável, o relato de Lopes de Lima é o primeiro grande documento sobre a Guiné do século XIX, recorde-se que a data de publicação é 1844. Vejamos como ele descreve o clima guineense:
“No continente da Guiné o calor é muito mais intenso do que nas ilhas: as chuvas são infalíveis, e começam nos fins de maio, acompanhadas de fortíssimas trovoadas, precedidas de um negrume assustador. As chuvas são copiosíssimas durante duas ou três horas, no fim das quais o vento solta novamente ao NE e dentro em pouco fica a atmosfera limpa e o tempo sereno: no mês de Agosto acabam estas trovoadas, e há neste e no de Setembro chuvas mansas e aturadas durante dias inteiros, acompanhadas de ventos brandos do Sul: desde Outubro até Maio reina o Nordeste quase sem interrupção, e a Este se chama ali o tempo seco. Em toda a Província é grandemente nociva a exposição ao sol, mas muito mais ainda o suportar parado a cacimbada da noite”.
De seguida, orienta a sua atenção para as produções naturais:
“Aquelas que se podem esperar de um solo bem que argiloso e fértil, por toda a parte alagadiço e salitroso, possuído por povos bárbaros no estado da Natureza, faltos de precisões, indolentes, aferrados a más rotinas, e independentes das nossas leis, e dos nossos usos – são certamente bem pouco variadas; e mesmo assim não deixa de ser importante o trato destes portos, mantido na sua maior grossura pelas remessas de géneros do interior – Geba e Farim; porque os Mandingas, em cujo território estes Presídios estão situados, são povos mais industriados, essencialmente mercadores, mais civilizados que os da beira-mar.
Tratarei porém primeiramente das produções desta região marítima, vizinhas de Bissau, Cacheu e Zinguinchor – esse país baixo e lodoso aonde não surge um só monte, uma colina, e aonde apenas se encontra como raridade algum terreno enxuto no interior dos rios e alguma praia de areia na costa do mar. As ocupações agrícolas destes povos são quase exclusivamente a cultura do arroz e a criação do gado: apenas o gentio Papel vizinho das duas Praças de Bissau e Cacheu, e os Banhuns, vizinhos a Zinguinchor, granjeiam um pouco de feijão, painço e algumas frutas para consumo destas praças.
Todo o arroz desta região é miúdo, quebrado e de má vista, conquanto não tenha mau sabor. O mais escuro, e mais feio, e mais barato de todo o arroz desta costa é o arroz Felupe.
Todo o gado vacum em Guiné é mui pequeno mas bem nutrido, e de um pelo muito denso e comprido, os seus couros são muito estimados no comércio.
As outras mercancias, que vem engrossar ali o trato com negociadores estrangeiros, são dádivas quase espontâneas da natureza, que tão azinha as franqueia a este povo sáfaro nos montes e costas, sem outro trabalho que colhê-las às mãos e trazê-las ao mercado: cera, marfim, tartaruga, azeite de palma.
A cera criam-na no mato inúmeros enxames de pequenas abelhas que colmeiam nas tocas das árvores, de onde as mulheres e meninos as vão brutalmente expulsar com fogo e tomar-lhes a cera.
O marfim é o despojo dos elefantes que monteiam nos matos, principalmente nas terras do sertão, de onde vem a maior cópia dele; o seu preço varia segundo a grandeza do dente.
As tartarugas só se pescam nas ilhas dos Bijagós e daí vem a casca, que é muito mais grossa, e em cascos muito maiores que a das ilhas de Cabo Verde.
O azeite de palma é grosseiramente extraído do fruto da palmeira de dendém, é procurado para as saboarias e outras composições químicas.
Vem igualmente ao mercado pequenas porções de algodão apanhado nos algodoeiros que brotam espontaneamente por toda a parte; e algum incenso, grosseiramente extraído da árvore que o produz.
Nas férteis e verdejantes margens dos caudalosos rios da Guiné, formados de mangues, e cobertas de verdura, nas suas extensas várzeas, nas suas densíssimas florestas, o instruído naturalista teria em que consumir meses, e anos, se a vida lhe durasse, poderia compor em Botânica uma flora riquíssima e dar muitas espécies novas à Zoologia; mas de toda esta riqueza ainda não explorada, apenas apresentarei o pouco que é geralmente conhecido no trato comum dos que lá habitam.”
(continua)
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Nota do editor
Último poste da série de 23 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21681: Historiografia da presença portuguesa em África (244): "Fernão Gomes e o monopólio do resgate da Guiné", no Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa de Maio e Junho de 1938 (Mário Beja Santos)
Guiné 61/74 - P21708: Álbum fotográfico de José Carvalho (3): A CCAÇ 2753, ”Os Barões”, e o K3 (II e última Parte)
Foto nº 9 > Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 (1970/72) > K3 > Jantar de inauguração da messe de oficiais e sargentos. Da esquerda para a direita; Furriéis Milicianos Chambel Prates, JoãoTavares, João Serralha, Manuel Moutinho, Alf Mil Ramires, 1º Sargento Leão, Alferes Milicianos Vitor Junqueira, Cândido Pereira, Furriéis Milicianos Alfredo Silveira, [elemento não identificado], Enf Almerindo Carvalho, Manuel Tavares [, elemento não identificado], e, de costas, 2º Sargento Manuel Mexia
Foto nº 8 > Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 (1970/72) > K3 > Elementos da CCaç 2753 na margem sul do Rio Cacheu: em 1º plano Alf Mil Ramires, José Carvalho, Vitor Junqueira, Fur Mil A. Silveira e Pedro; em 2º plano, Fur Mil António Tonhá e 1º Cabo Cond [Ildeberto] Medeiros
A companhia, também apelidada “Os Açorianos" [Foto nº 8, acima], enceta um conjunto de trabalhos na área da reabilitação das edificações, melhorando consideravelmente a zona da cozinha, da cantina, casernas e construindo a messe de oficiais e sargentos, com zona de refeições e bar. [Foto nº 9, acima]
Uma página (a 2 ?) da "Nhau", revista da CCAÇ 2753", nº 4, outubro de 1971. Diretores: alf mil Carvalho, fur mil Silveira... Destaque o editorial "Noblesse Oblige", assinado pelo cap mil J. Cupido.
Foto nº 10 > Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 (1970/72) > Madina Fula > O Alf Mil José Carvalho (à esquerda) com o Cap Mil Art João Cupido, na véspera da mudança da CCaç 2753 para o K3, na estrada, em frente ao destacamento de Madina Fula.
Foto nº 11 > Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 (1970/72) > K3 > Início da noite de 31 de Dezembro 1971 > 1º Srgt Leão, Fur Mil Chambel Prates, Fur Mil Mec Auto Francisco Godinho, Fur Mil Pedro, Sold. Corneteiro (barman da messe) Manuel dos Santos, [, elemento não identificado], eu, Fur Mil José Faia e, ao fundo Sold Reis.
Foto nº 12 > Guiné > Região do Oio > Farim > CCAÇ 2753 (1970/72) > K3 > Alguns elementos do 2º Pelotão. A partir da esquerda: Roberto Mendonça, eu, Barbosa, Santos Carvalho, [, elemento não identificado], [elemento não identificadio], ”Faial”, Freitas, [elemento não identificadi], Grilo, Bettencourt e José Estrela
(*) Vd. último poste da série > 29 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21703: Álbum fotográfico de José Carvalho (2): A CCAÇ 2753, ”Os Barões”, e o K3 (Parte I)