quinta-feira, 13 de março de 2008

Guiné 63/74 - P2630: Poemário do José Manuel (3): Pica na mão à procura delas..., tac, tac, tac, tac, tac, TOC!!!

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > 2 de Março de 2008 > O Zé Teixeira, no tchon nalu, em pleno Cantanhez, no meio de duas mulheres da população local. Belíssimas, gentis e vistosas mulheres nalus, de porte altivo e de grande dignidade. Na carta de Cacine, a toponomia é Jemberem, a norte de Madina de Cantanhez... Hoje todo o mundo diz e escreve Iemberém. De resto, um dos afluentes do Rio Cacine é o Rio Iemberem... Será que terá havido um erro dos nossos cartógrafos ou uma gralha tipográfica ?


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > 1 de Março de 2008 > Onde quer que chegue, o Zé Teixeira conhece sempre alguém, antigo militar de unidades africanas, antigo milícia, antigo combatente do PAIGC, etc. E tem uma enorme facilidade de relacionamento humano. Ei-lo aqui em Iemberém, local onde a comitiva do Simpósio Internacional de Guileje pernoitou dois dias... Fica em plemo coração do Parque Nacional do Cantanhez. E é um orgulho para os seus habitantes e para a equipa da AD - Acção para o Desenvolvimento que lá tem projectos... Uma surpresa que contrasta com a tristeza que se sente em Bissau...

Fotos: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.



Guiné > Região de Tombali > CCAÇ 2381 (1968/70) > Mampatá Foreá > 3 de Novembro de 1968 > Alguns militares portugueses, entre eles o Zé Teixeira (em segundo plano, de óculos esfumados), em operação de rescaldo de um ataque do PAIGC, ao destacamento e à tabanca, à hora do almoço.

Imagem do José Teixeira, ex-1.º Cabo Enfermeiro, CCAÇ 2381( Buba, Quebo, Mampatá e Empada ,1968/70). Ele esteve em Ingoré (no norte, em treino operacional) e foi depois colocada no sul (Bula, Aldeia Forbosa, Mampatá, Empada) (Maio de 1968 / Maio de 197o). O Zé voltou à Guiné em Março de 2005, e partir daí já lá foi mais duas vezes, a última das quais por ocasião do Simpósio Internacional de Guiledje. Deve estar de volta a casa, nos próximos dias, fazendo o percurso de jipe, de Bissau até ao Matosinhos. Daqui vai um grande abraço para ele e para os demais camaradas da tertúlia do Norte... Que os bons ventos do deserto vos tragam a casa, sãos e salvos... Passámos, juntos, momentos de grande emoção na semana de 29/2 a 7/3/2008 (LG).

Foto: © José Teixeira (2005). Direitos reservados.


1. Mais três poemas do José Manuel, recebidos em 4, 5 e 6 de corrente. Foram escritos na Guiné (1). O José Manuel foi Fur Mil, Op Esp, CART 6250, Mampatá, 1972/74 (2). Ainda não temos nenhuma foto dele nem do tempo dele. Aproveito para o convidar a ler alguns dos excertos do diário do Zé Teixeira que passou também por Mampatá, uns anos anos (3). Aproveito também para lhe agradecer as suas gentilezas: José Manuel veio à festa do Beja Santos e trouxe alguns dos vinhos da sua Quinta da Graça para a malta provar... Sei que deixou para mim, ao cuidado do Virgínio Briote, uma garrafa de vinho fino... Obrigado, José Manuel! Como dizia um outro poeta, maldito, Luíz Pacheco (morto há pouco tempo), ainda melhor que a poesia, são as mulheres, e ainda melhor que as mulheres é o vinho, que nos faz esquecer as mulheres... Os teus poemas transportam-nos ao encanto, ao sortilégio, ao perigo das matas e das picadas de Tombali, mas também à solidão e à miséria da nossa condição de homens, combatentes, sem razão nem para matar nem para morrer... (LG).


Estradas amarelas
corpos cobertos de pó
pica na mão à procura delas
o polegar ferrado no pau
tac, tac, tac, tac, tac, tac
tacteando por sons diferente
o Fernandes com cara de mau
espeta no solo o ferrão da pica
tac, tac, tac, tac, tac, TOC
o calafrio
depois o grito
anunciando o perigo
o grupo é mandado parar
chega o Vilas à frente
e todos manda afastar
de joelhos no chão
numa simulada carícia
afaga a terra com a mão
com gestos simples e perícia
vai cavando devagar
hei-la... está aqui
lisa preta a brilhar
parece inofensiva a maldita
deita-lhe a mão e grita
és minha, já te tenho
volta-a
tira-lhe o detonador
e entre dentes, diz
esta não
esta não causará dor.


Tenho saudades
do amor que não se compra
daquele que se sente
o tal
que vem de dentro
e
que não acaba
com um orgasmo
não quero mais
ser
aquele que se vai
assim que se vem
não quero mais
ficar vazio
não quero mais
ficar sem eco
não quero mais
perder o elo
que me liga
a ela
seja ela quem for
não quero mais
fazer amor
sem ter de oferecer uma flor.

Josema
Bissau 1974


Saborear a vida

é sentir os outros
é sentir o vento
é sentir a água
é tocar...
num corpo de mulher


guiné 1972
josema
___________

Notas de L.G.:

(1) Vd. postes anteriores:
9 de Março de 2008 >Guiné 63/74 - P2619: Poemário do José Manuel (2): Que anjo me protegeu ? E o teu, adormeceu ?

3 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2608: Poemário do José Manuel (1): Salancaur, 1973: Pior que o inimigo é a rotina...

(2) Vd. poste de 27 de Fevereiro de 2008 >Guiné 63/74 - P2585: Blogpoesia (8): Viagem sem regresso (José Manuel, Fur Mil Op Esp, CART 6250, Mampatá, 1972/74)

(3) Alguns dos excertos de O Meu Diário, de José Teixeira (1º cabo enfermeiro Teixeira, da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70):

6 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXVII: O meu diário (José Teixeira, CCAÇ 2381) (5): Mampatá, Agosto-Setembro de 1968

(...) Mampatá, 7 de Setembro de 1968: Tenho que reagir. Estou-me portando pior que os outros. Onde está a minha força de vontade de viver segundo o meu projecto de vida ? Sinto-me só... recomeço a luta tanta vez... como fugir ?...Eu não quero matar. Eu não quero morrer. Quero viver, mas esta vida, não (...).

(...) Mampatá, 17 de Setembro de 1968: Dia de correio. Ainda cedo sentiu-se a avioneta de Sector em direcção a Aldeia Formosa. Aguardamos com ansiedade a viatura que partiu para lá....O Vitor escreveu-me. Por Bissorã nem tudo corre bem. Segundo ele, num pequeno incidente ficaram dois soldados inutilizados para toda a vida, ambos com uma perna amputada e um outro com a cara cheia de estilhaços. Além destes, uma nativa morta e outra sem uma perna. Tudo por rebentamento de minas A/P, montadas pelo IN.Numa saída em patrulha a malta vingou-se fazendo sete mortos e dois prisioneiros. O último a morrer foi o tipo que montou as minas e, pelo que ele conta, teve morte honrosa. Todos os africanos verificaram a eficiência das suas facas no seu corpo (...).

(...) Mampatá, 25 de Setembro de 1968: Como é belo sentir nas próprias mãos o pulsar de um coração novo que acaba de vir ao mundo. Um corpo pequenino, branco como a neve, puro como os anjos e no entanto, este corpo vai crescer, a pouco e pouco a natureza encarregar-se-á de o tornar negro como os seus progenitores, negro como os seus irmãos que hoje não cabiam em si de contentes. É puro como os anjos, a sua alma está imaculada, mas virá o tempo em que conhecerá o pecado, terá de escolher entre o bem e o mal (...).

(...) Mampatá, 29 de Outubro de 1968: (...) A família do sargenti di milícia Hamadu (1) estava toda reunida. No meio, um alguidar cheio de vianda (arroz) com um pequeno bocado frango frito:- Teixeira Fermero, vem na cume (Enfermeiro Teixeira vem comer). - Sentei-me meti a mão no alguidar, fiz uma bola com arroz bem temperado com óleo de palma e meti à boca (Em Roma sê romano). Estava apetitoso e eu estava cheio de comer massa com chispe que o cozinheiro confeccionava na cozinha improvisada ao ar livre, porque não havia mais nada. Estamos no tempo das chuvas, a Bolanha dos Passarinhos está intransponível pelo que não há colunas a Buba para trazer mantimentos (...).

(...) Mampatá, 5 de Janeiro de 1969: (...) Admiro esta população de Mampatá. Quando souberam que eu ia de serviço na coluna em substituição do Lemos vieram despedir-se de mim. Fui abraçado, as bajudas beijavam-me e cantavam uma melodia triste. Até dá gosto viver com esta gente.A mãe da Binta veio trazer-ma para lhe dar um beijinho e fazer um festinha como era meu hábito (Pegava nela e atirava-a ao ar dando a miúda e a mãe uma gargalhada).A Maimuna tinha oito luas quando cheguei a Mampatá (...).

(...) Chamarra, 23 de Janeiro de 1969: (...) Ontem ao anoitecer, em Aldeia Formosa, alguém, lançou uma granada de mão para a Messe dos sargentos. Não se sabe quem foi. Branco ou negro. Por vingança, por descuido. Os resultados foram tremendos. Dois soldados, meus camaradas, tiveram morte imediata e houve ainda dez Furriéis feridos, alguns com gravidade. As medidas tomadas pelo Comandante para descobrir o assassino ainda não resultaram.Aqueles dois colegas que casualmente se encontravam à porta encontraram a morte, pela mão de um companheiro cego pela loucura ou pelo ódio, tudo leva a crer (...).

Guiné 63/74 - P2629: Fórum Guileje (3): A Marinha esteve como peixe dentro de água no CTIG, e teve um papel logístico fundamental (Pedro Lauret)

Guiné-Bissau > Bissau > Palace Hotel > Simpósio Internacional Guiledje na Rota da Independência da Guiné-Bissau > 4 de Março de 2008 > Painel 1 (Guiledje e a Guerra Colonial / Guerra de Libertação) > Intervenção de Pedro Lauret, dirigida à mesa, e mais concretamente a Manuel dos Santos, ou Manecas, antigo comandante militar do PAIGC, que fez um comunicação sobre Amílcar Cabral e a componente militar do PAIGC: achegas para a compreensão dos meandros estratégicos e tácticos da guerra de libertação nacional.

Vídeo: ©
Luís Graça (2008). Direitos reservados.
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Visita dos participantes do Simpósio Internacional de Guiledje > 1 de Março de 2008 > Pedro Lauret foi o único represente da Marinha no simpósio, pelo lado dos ex-combatentes portugueses. Como orador, fez uma comunicação, no dia 5 de Março, no âmbito do painel 2 (Guerra colonial / luta de libertação nacional: problematização conceptual, contextualização histórica e importância historiográfica), subordinada ao título A Marinha no Teatro de Operações da Guiné: Guiledje e Gadamael, Maio-Junho de 1973, o papel da Marinha (1).
Sinopse da comunicação:

A Guiné, atravessada por uma multiplicidade de rios e braços de mar, com uma rede viária escassa será um Teatro de Operações privilegiado para a actuação da Marinha. Mais de 80% de todo o reabastecimento será efectuado por via fluvial. A evolução dos meios navais, as missões as potencialidades e as dificuldades, encontradas no teatro de operações. A missão hidrográfica, os levantamentos e as cartas hidrográficas, a balizagem e a farolagem. Os fuzileiros navais. A partir de Maio de 1973 com as dificuldades sentidas pela Força Aérea, a Marinha irá ser chamada a um maior esforço apesar das grandes dificuldades em meios. A Marinha e o Inferno dos 3 G’s – Guiné, Maio-Junho 1973.

Guiné > Região de Tombali > Rio Cacine > 1971 ou 1972 > Pedro Lauret, oficial imediato do NRP Orion (1971/73), na ponta do navio, a navegar no Cacine, tendo a seu lado o comandante Rita, com quem fez a primeira metade da sua comissão na Guiné. "Um grande homem, um grande comandante" (PL).

Foto: © Pedro Lauret (2006) . Todos os direitos reservados.

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cacine > 2 de Março de 2008 > Visita dos participantes do Simpósio Internacional de Guileje > Os tugas de volta a Cacine, outrora um importante baluarte no sistema de defesa do Rio Cacine contra as infiltrações e ataques do PAIGC. Foi sede do Destacamento de Fuzileiros Especiais 22. Hoje, é uma terra com ar desolado e decadente. Partimos de Cananima, do outro lado do rio, num barco de pesca, depois de um belíssimo almoço onde não faltou o saboroso e fresquíssimo peixe local. Embarcados, éramos um grupo de 30 participantes do Simpósio. O nosso capitão de mar-e-guerra ficou em terra a planear as eventuais operações de socorros a náufragos. Na foto, o regresso ao barco, depois de uma duas horas em Cacine: em primeiro palno, o jornalista do Correia da Manhã, correspondente em Guileje, José Marques Lopes, seguido da Júlia, esposa do Coronel Nuno Rubim, e da Diana Andringa...

Foto e legenda: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.

Pedro Manuel Cunha Lauret Saldanha e Albuquerque - CV abreviado:

(i) É capitão-de-mar-e-guerra na situação de reforma.

(ii) Nasceu em Lisboa, a 23 de Janeiro de 1949.

(iii) Efectuou os estudos secundários no Liceu Camões (1960/67), em Lisboa, onde foi dirigente da Acção Católica (JEC), participando em movimentações estudantis.

(iv) Entrou para a Escola Naval em 1967, tendo terminado o curso de Marinha em 1971.

(v) Foi um dos fundadores, em 1970, de uma organização política clandestina de Oficiais da Armada.

(vi) Em Setembro de 1971 iniciou uma comissão na Guiné, como oficial imediato da Lancha de Fiscalização Orion, exercendo uma intensa actividade operacional até Agosto de 1973; participou no início das operações conhecidas pelo cerco a Guidaje em Maio de 1973, e nesse mesmo mês e seguinte nos acontecimentos de Guileje e Gadamael.

(vii) Em Outubro de 1973, já no continente, efectuou os primeiros contactos com o Movimento dos Capitães, por designação de um grupo de oficiais da Armada.

(viii) Fez parte da comissão que redigiu o Programa do Movimento das Forças Armadas, e outros importantes documentos – em conjunto com Vítor Alves, Melo Antunes, Franco Charais, Vítor Crespo, Almada Contreiras.

(ix) Após o 25 de Abril integrou o gabinete do Almirante Pinheiro de Azevedo, Chefe do Estado-Maior da Armada e membro da Junta de Salvação Nacional.

(x) Faz parte da Comissão Coordenadora do MFA Armada, da Assembleia do MFA Armada e Assembleia do MFA Nacional.

(xi) Em 1976, especializou-se em sistemas de armas, embarcando em 1977 como chefe de serviço de Artilharia na fragata Comandante Roberto Ivens, participando em numerosos exercícios nacionais e no âmbito NATO.

(xii) Desembarcou em 1979 vindo a desempenhar funções técnicas no Gabinete de Estudos da Direcção Geral do Material Naval onde foi nomeado para a frequência de numerosos cursos no âmbito da electrónica, sistemas digitais e informática.

(xiii) Em 1981 concluiu uma pós graduação em Estratégia e Organização, no Instituto Superior Naval de Guerra.

(xiv) Em 1983, em comissão civil, exerceu as funções de engenheiro no Grupo de Oficinas de Armamento e Electrónica do Arsenal do Alfeite, acumulando com Chefe de Serviço de Informática do Arsenal.

(xv) Em 1986 passou à reserva e depois à reforma, iniciando actividade empresarial no âmbito
da engenharia e consultoria informática.

(xvi) Foi Membro fundador da Associação 25 de Abril, integrando actualmente a sua Direcção.

(xvii) Coordenou a equipa que produziu o site da Associação 25 de Abril e dirige, actualmente, no mesmo âmbito, um site sobre a Guerra Colonial.

(xviii) Dirige um projecto de investigação histórica designado Marinha: do fim da segunda Guerra Mundial ao 25 de Abril de 1974, que conta com o apoio do Chefe do Estado Maior da Armada.

(xix) Foi agraciado com o grau de Grande Oficial da Ordem da Liberdade.

Fonte: Site oficial do Simpósio Internacional de Guiledje > Oradores > Pedro Lauret

___________


Notas de L.G.:

(1) Vd. postes anteriores desta nova série, Fórum Guileje:

12 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2626: Fórum Guileje (1): E Cameconde ? Cabedu ? E a nossa Marinha ? (Manuel Lema Santos / Jorge Teixeira / Virgínio Briote)

12 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2628: Fórum Guileje (2): Nunca uma guerra foi feita de uma só batalha (Mário Fitas)

(2) Postes do nosso amigo e camarada Pedro Lauret:

1 de Outubro de 2006> Guiné 63/74 - P1138: 'Siga a Marinha': uma expressão do tempo da República (?) (Pedro Lauret)

5 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1151: Resposta ao Manuel Rebocho: O papel do Orion na batalha de Guileje/Gadamael (Pedro Lauret)

31 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1231: Estórias avulsas (5): Rio Cacheu: uma mina aquática muito especial (Pedro Lauret)

21 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1300: O cruzeiro das nossas vidas (3): um submarino por baixo do TT Niassa (Pedro Lauret)

29 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1393: Saudações tertulianas na chegada do novo ano de 2007 (1) : Luís Graça / Pedro Lauret

13 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1590: O sacrifício dos oficiais do quadro permanente (Pedro Lauret)

18 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1767: Spínola e Senghor encontram-se na região de Casamance em 1972 (Pedro Lauret)

27 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2222: RTP: A Guerra, série documental de Joaquim Furtado (4): Aspectos positivos e negativos (Pedro Lauret)

quarta-feira, 12 de março de 2008

Guiné 63/74 - P2628: Fórum Guileje (2): Nunca uma guerra foi feita de uma só batalha (Mário Fitas)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Visita dos participantes do Simpósio Internacional de Guiledje > 1 de Março de 2008 > Três homens (solitários) de Guileje. Da esquerda para a direita: o ex-major Coutinho e Lima (que em 22 de Maio de 1973, era o comandante do COP 5, sendo hoje coronel na reforma); Abílio Delgado (ex-Capitão dos Gringos de Guileje, a CCAÇ 3477, Nov 1971/ Dez 1972); e Nuno Rubim, (que comandou duas companhias, em Guileje, a CCAÇ 726, e a CCAÇ 1424, no período de 1965/66).

Foto e legenda: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.


1. Texto do Mário Fitas (1):

Caro Manuel Lema Santos,

Li, e senti a profundidade do seu texto Ainda sobre o 'Simpósio de Guilege' (2).

Fui um simples Fur Mil de Operações Especiais, em Cufar, de Março de 1965 a 1966, fazendo parte da CCAÇ 763 comandada na altura pelo então Capitão Carlos da Costa Campos, já não existente entre nós, mas cuja urna entrou na sua última morada, pelas mãos de elementos da CCAÇ 763, e que no seu regresso à Guiné para outra comissão, onde foi promovido a Coronel, comandadou o COP3, na altura das operações em Guidaje.

A empatia gerada entre mim e o Cor Costa Campos levou-nos a falar, e analisar pormenorizadamente, muita coisa sobre a Guerra da Guiné.

Já tive oportunidade de falar na nossa Tabanca Grande, não só sobre a colaboração da Armada bem como da Força Aérea Portuguesas, nos teatros da referida Guerra. E que reafirmo o meu grande reconhecimento, por tudo o que por nós fizesteis. Tenho a certeza que este reconhecimento seria subscrito em absoluto, por todos os elementos da CCAÇ 763.

Tenho plena consciência que determinados tabus ainda se encontram instaurados entre nós, mas que teremos de ter a capacidade de nos ouvirmos, e debater com clarividência, para que seja a verdade da Guerra na Guiné contada na primeira pessoa.

Muitos foram de facto os que sofreram e sofrem. Nunca uma guerra foi feita de uma só batalha!

Tenhamos a capacidade de ultrapassar todas as barreiras, e deixemos ao Povo Português o que foi uma Guerra de facto e não uma batalha. Dum lado e do outro que as mãos se unam, e façam a História dos seus Povos.

Tudo isto, para lhe demonstrar a minha admiração, pela clarividência e honestidade do seu texto.

Há momentos tristes, mas a verdade tem de ser nosso apanágio. Estou consigo! Estas suas palavras devem fazer parte do legado da Nossa Tertúlia!

Já que, de certeza, muitas vezes subiu e desceu o mítico Cumbijã, um abraço do tamanho desse maravilhoso rio.

Mário Fitas

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Notas dos editores:

(1) Vd. poste de 28 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2593: Pami Na Dondo, a Guerrilheira, de Mário Vicente (11) - Parte X: O preço da liberdade (Fim)

(2) Vd. poste de 12 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2626: Fórum Guileje (1): E Cameconde ? Cabedu ? E a nossa Marinha ? (Manuel Lema Santos / Jorge Teixeira / Virgínio Briote)

Guiné 63/74 - P2627: Vídeos da Guerra (8): Nha Bolanha (Jorge Félix, ex-Alf Mil Piloto Aviador, 1968/70)



Vídeo: Jorge Félix / You Tube (2008). (com a autorização do autor...). Agradecimento ao Bana, ao Luís Morais e ao extinto grupo musical, fabuloso, mítico, Voz de Cabo Verde... De um lado e doutro da barricada, se calhar ouvíamos a mesma música... Pelo menos, os tugas e os caboverdianos do PAIGC...



1. Mensagem do Jorge Félix (1):



Caro Luís Graça,

Não faltarão novidades para contar da terra das Bolanhas .Entretanto, durante a vossa estadia na Guiné-Bissau, coloquei um video, Nha Bolanha, que gostaria visses e comentasses.

Estou a acabar de ler o Diário da Guiné, do Beja Santos. Muito interessante. Logo no inicio fala do Brandão, aquele de quem eu falei na nossa conversa telefónica. Tenho uma versão um pouco diferente, e gostava de trocar umas palavras com ele. Será que me podes dar o email ou converso com ele na tertúlia ?

Jorge Félix

2. Em resposta a um pedido de esclarecimento meu (vd. ponto 3):

Luís Graça:

As imagens foram captadas de uma emissão da RTP. Ninguém me pediu autorização para lá aparecer .

Recordo-me que foi o Coronel Piloto Aviador Nico, na altura tenente, que filmou em super 8 mm.

A música é do extinto grupo, Voz de Cabo Verde, canta o Bana. Também ainda é vivo o Luís Morais, excelente músico.

Penso que a música, tendo mais de 30 anos, já é de "utilidade pública", não sei se há problemas de direitos de autor. É uma honra o Nha bolanha ir para o nosso blogue, nem que seja por link, vê-se de igual maneira.

Já enviei um e-mail ao Beja Santos sobre o livro Memórias da Guiné 68/69. Vou esperar resposta, pois também gostaria que postassem as minhas críticas que fiz ao livro. Junto um imagem de satélite que enviei ao Beja Santos, mostra o teatro de operações que o livro recorda.

Como aprendi por esta andanças, um abraço do tamanho do Geba.
Jorge Félix

Imagem de satélite da região de Bambadinca, incluindo a bacia hidográfica do Rio Geba e do Rio Corubal. Na imagem, pode reconhecer-se alguns pontos de referência que nos eram familiares, no tempo da guerra colonial, como Ganturé (na margem esquerda do Rio Corubal), Enxalé, Mato Cão, Missirá e Bocol (a norte do Rio Geba), Ponta Varela, Xime e Bambadinca (a sul do Rio Geba). Também é visível, a amarelo, o traçado da estrada (alcatroada) que vem Bissau, passa a norte do Mato Cão, atravessa o Rio Geba (Estreito) perto de Bambadinca, seguindo a esquerda Bafatá e em frente para o sul (Xitole, Saltinho, Quebo...).

Foto: Jorge Félix (2008).

3.Resposta de L.G.:

Jorge: Já vi o teu microfilme, Nha Bolanha, no You Tube. Parabéns pela ideia e sua execução.

Diz-me duas coisas: (i) as imagens são tuas, originais ? (ii) quem é o cantor, o autor da letra e música ?

Posso pôr o teu filme na nosso blogue, desde que não haja problemas de direitos de autor… Em último caso, ponho um link… Mas gostava de fazer referência ao autor da música…

Obrigado pelas imagens da tua caderneta de voo. Vou publicar.


4. Comentário final do editor do blogue:

Tens razão, é uma obrigação partilharmos, uns com os outros, e com os nossos filhos e netos, com os nossos antigos inimigos, os seus filhos e netos, estas imagens e estes sons que ninguém nos pode roubar...

A voz do Bana, o sax de Luís Morais, a silhueta de um heli nos céus da bolanha, o terrível matraquear do helicanhão, tu e os teus camaradas pilotos, as enfermeiras pára-quedistas, as bolanhas, os palmeirais, a serpente do Rio Geba, o pôr do sol na Guiné, a nota de tensão dramática na paisagem, tudo isso faz parte intrínseca da(s) nossa(s) vida(s). Tal como o sangue que corre nas nossas veias. A Guiné e a guerra da Guiné marcou-nos a todos indelevelmente. Ninguém nos condenou ao silêncio...

Meu caro Jorge: O nosso blogue não tem, de resto, quais propósitos comerciais... Fazemos apenas blogoterapia... E tu, que és um homem da imagem (andaste pela televisão, pelo cinema...), faz-nos o favor de mandar mais (2)... Estás autorizado a usar as nossas próprias imagens. Se bem te recordas, passaste a fazer parte da nossa Tabanca Grande...
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Notas de L.G.:

(1) 28 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2592: Voando sob os céus de Bambadinca, na Op Lança Afiada, em Março de 1969 (Jorge Félix, ex-Alf Pil Av Al III)

(2) Vd. postes desta série:

16 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1958: Vídeos da guerra (1): PAIGC: Viva Portugal, abaixo o colonialismo (Luís Graça / Virgínio Briote)

8 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2249: Vídeos da guerra (2): Uma das raras cenas de combate, filmadas ao vivo (ORTF, 1969, c. 14 m) (Luís Graça / Virgínio Briote)

8 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2250: Vídeos da guerra (3): Bastidores da Op Ostra Amarga ou Op Paris Match (Bula, 18Out1969) (Virgínio Briote / Luís Graça)

11 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2256: Vídeos da guerra (4): Ainda nos bastidores da Operação Paris Match (Torcato Mendonça / Luís Graça / Diana Andringa)

13 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2261: Vídeos da guerra (5): Nos bastidores da Op Paris Match: as (in)confidências de Marcelo Caetano (Manuel Domingues)

15 de Dezembro de 2007> Guiné 63/74 - P2351: Vídeos da Guerra (6): Uma Huître Amère para a jornalista francesa Geneviève Chauvel (Virgínio Briote / Luís Graça)

20 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2463: Vídeos da Guerra (7): Madina do Boé - A Retirada (José Martins)

Guiné 63/74 - P2626: Fórum Guileje (1): E Cameconde? Cabedu? E a nossa Marinha? (Manuel Lema Santos / Jorge Teixeira / Virgínio Briote)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cacine > 2 de Março de 2008 > Visita dos participantes do Simpósio Internacional de Guileje > Lápide assente nos restos de um aquartelamento das NT. Pode ler-se: "CART 1692. Início - 16/4/68. Ter[mino] - 18/4/68. Nisa - Alenquer. 60 bebedeiras neste priúdo [sic]. Trabalho Rápido".

Guiné-Bissau >Região de Tombali > Cacine > 2 de Março de 2008 > Uma terra abandonada e decadente. Vista do barco de pesca que saiu de Cananima, com um grupo de cerca de 30 participantes do Simpósio. Outrora, Cacine era um importante baluarte no sistema de defesa do Rio Cacine contra as infiltrações e ataques do PAIGC. Foi sede do Destacamento de Fuzileiros Especiais 22.

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cacine > 2 de Março de 2008 > Uma típica embarcaçao de pesca do Rio Cacine, a apodrecer na praia... As potencialidades do Rio Cacine não são ainda devidamente exploradas (vd. dvd)...

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cacine > 2 de Março de 2008 > Regresso dos turistas ao barco que os levará de volta a Cananima... Em primeiro plano, a Maria Alice, o cubano Oscar Oramas, a Catarina Santos, da Fundação Mário Soares, e o Álvaro Basto, membro da nossa Tabanca Grande.

Fotos e legendas: © Luís Graça (2008). Direitos reservados

1. Texto de opinião do nosso camigo e camarada Manuel Lema Santos, ex-1º Tenente da Reserva Naval da Marinha de Guerra, autor da página Reserva Naval, e um dos raros marinheiros a fazer parte da nossa Tabanca Grande (1).


Banjara, Barro, Cacine, Cameconde, Guidaje, Gadamael, Guileje, Jabadá, Madina do Boé, Oio...e tantos outros locais de uma terra com cerca de doze anos de Guerra. Numa picada de Buba para Aldeia Formosa, numa bolanha do Galo Corubal ou ao largo de Bissau, na queda da escada para o navio que o ia trazer de regresso. Para os mortos e estropiados foi igual. (vb)

Assunto - Simpósio de Guileje"

Nunca estive em Guileje.

No respeito pelo sacrifício de todos os que na Guiné se bateram por uma causa, ao tempo politicamente defensável e por isso obrigatória como dever de cidadania do regime, opto pelo contido silêncio dos que preferem apostar num futuro sem qualquer sentimento de culpa pelo passado recente vivido, parte integrante da própria História do País em que nasceram.

E podemos fazê-lo de várias maneiras, uma das quais honrando a memória dos que tombaram e lembrando-os a todos sem distinção de raça, classe social ou posto evitando, no futuro, os erros que conduziram a esse passado próximo de guerra.

Guerra injustificada e mutilante sim, mas aquele meu profundo respeito cresce quando, ao sacrificío inútil de tantos cidadãos jovens ceifados e tantas famílias enlutadas se vem acrescentar, muitos anos depois, tão obscenas incapacidade e hipocrisia políticas, apelidando o resultado de paz e democracia. Que resultado e a que preço social e económico?


Não tenciono tão pouco brandir qualquer estandarte em nome de qualquer outro local da Guiné diferente de Guileje mas, sem grande esforço de busca, acudir-me-iam à memória, e bem próximos, Cameconde e Cabedu, onde estive voluntariamente e a cujos militares, com quem convivi, presto aqui a minha homenagem pelo que neles senti de próximo.

Aliás Cameconde (2), onde estava sepultada viva uma secção do aquartelamento de Cacine na margem do rio com o mesmo nome, era exactamento o último reduto defensivo sudeste do famigerado corredor da morte. Caminhando para nordeste, seguia-se-lhe Gadamael, Guileje, Mampatá e Aldeia Formosa.

A largura do rio, excessivamente grande para cambanças rápidas, a permanente presença e fiscalização da Marinha de Guerra e a proximidade do aquartelamento de Cacine, aconselhavam o PAIGC a desviar transportes e abastecimentos mais para nordeste, passando a ser fundamental, nessa estratégia, o corredor de Guileje.

Conheço-lhe o nome e a pesada aura que rodeava a localidade, a que não serão estranhas as centenas de horas navegadas a bordo da LFG Orion, no rio Cacine, em patrulha, fiscalização, operações, transportes e abastecimentos que, ao logo de dois anos e para toda a Guiné, somaram acima das 2.000 horas de navegação.

Aí, no Sul, ficávamo-nos pelo limite possível de navegação segura daquele rio, até junto da marca Lira onde confluiam, a montante, os rios Cafungaqui, Diderigabi, Cacondo e o rio de Gadamael Porto. Para lá daquela marca, apenas botes de fuzileiros ou as LDM's que aportavam pontualmente a Gadamael.

Deste local a Guileje distavam uma escassa dezena de quilómetros mas eram os suficientes para vedar a acessibilidade à Marinha. Para nós, a maioria das vezes, Guileje traduzia-se em rebentamentos ouvidos e, noutros casos, em passagens de helicópteros, sempre um mau presságio mais tarde traduzido em más notícias.

Suspeito que poderia, sem grande esforço e com alguma falta de modéstia, pronunciar mais duas dezenas de locais daquele teatro de guerra igualmente dramáticos para quem lá teve de enfrentar os dois anos de serviço militar e, como exemplo, de forma aleatória, aflora-me à lembrança o nome de Madina do Boé...

Algum sentido de justiça e humildade leva-me a não cometer esse erro grosseiro. Afinal, os locais de drama foram muitas vezes definidos pelo acaso da mina, da emboscada, do tiro perdido, do ataque e até do acidente. Nenhuma diferença substantiva para quem foi vítima ou para os familiares dela e quanto a números e estatísticas, apenas mais um era acrescentado.

Confesso não me ter sentido motivado para qualquer participação no Simpósio de Guileje, mas também porque não houve qualquer apelo à conjugação de esforços e envolvimento de pessoas fora daquele contexto específico - Guileje e o seu aquartelamento.

Houve muitos outros cenários de drama na Guiné e exacerbar em importância uns subvalorizando outros, provocará necessariamente clivagens sociais e a reabertura de feridas ainda por sarar, com a consequente distorção histórica de relatos e acontecimentos.

A mediatização excessiva do evento parece pouco prudente e redutora da História da guerra da Guiné que, embora necessariamente fragmentada em relatos e acontecimentos parciais, não deverá perder uma perspectiva global integrada dos três ramos das Forças Armadas incluindo a cronologia narrativa de início até final.

Assim não tem sido até agora e o relato de acontecimentos cinge-se, em muitos casos, aos anos que antecederam o final da guerra em 1974 ou aos anos imediatamente anteriores. Ora é necessário que fique claro para o registo da História de Portugal que a guerra colonial teve aproximadamente 12 anos de duração, ainda incipiente em finais de 1962 mas eclodindo no início de 1963 com o ataque ao aquartelamento de Tite.

Mais difícil seria imaginar como tem sido possível o esvaziamento quase total da presença da Marinha de Guerra dos relatos e acontecimentos do teatro da Guiné, ignorando a participação empenhada daquele ramo das Forças Armadas e ensaiando a construção de uma História sem aquela componente.

Não deixa de ser estranho já que, sem o empenho da Marinha, como teriam sido transportados a quase totalidade de todos os outros militares para a Guiné sem o gigantesco dispositivo de transportes de tropas que o permitiu, tanto para lá como para os outros teatros de guerra?

Uma vez na Guiné, de forma continuada, como foram transportados para cada um dos aquartelamentos de norte a sul daquele território, como foram abastecidos no tempo, como foram transportados entre locais, como foram escoltados e apoiados em operações, como foram em alguns casos evacuados e que foi feito do convívio partilhado com os marinheiros que incluiram, em muitas situações, o alojamento, a refeição, o combate e até a enfermaria?

Como foram retirados até ao último elemento todos os militares de todos os aquartelamentos da Guiné no final de uma guerra que, para cada um e já no regresso, só terminou no final da viagem do transporte de tropas, na Rocha Conde de Óbidos ou em Alcântara?

Compreenderá o leitor que se expliquem estratégias militares numa guerra impossível sem a presença da Marinha, num território que alaga quase 25% da área continental entre cada duas marés, e que mais parece, por analogia e em toda a orla costeira, um emaranhado sistema circulatório aquático?

Srão do conhecimento geral dados simples como a existência de um dispositivo naval da Marinha de Guerra que, em 1971, chegou a empenhar 1 PC (Corveta), 7 LFG's (Lanchas de Fiscalização Grandes), 8 LFP's (Lanchas de Fiscalização Pequenas), 3 LDG's (Lanchas de Desembarque Grandes), 31 LDM's (Lanchas de Desembarque Médias), 8 LDP's (Lanchas de Desembarque Pequenas), 5 DFE's (Destacamentos de Fuzileiros Especiais), 2 CF's (Companhias de Fuzileiros) e um Destacamento de Mergulhadores Sapadores?

Lamentável que quem escreve não cuide de pesquisar e recolher dados históricos com algum sentido de isenção e rigor. A operação Mar Verde, realizada em Novembro de 1970, inequivocamente de elevado risco e com resultados político-militares duvidosos, teve o condão de libertar 26 prisioneiros de guerra portugueses, um deles nessa condição durante 8 anos, capturado na sequência de ter sido atingido o T6 que pilotava e que, depois de tocado pelo seu asa no Cantanhês, conseguiu aterrar. O outro piloto morreu, ao despenhar-se o segundo avião da parelha.

Regressando a Guileje, num pormenor complementar relevante, a LFG Orion, no início de Junho de 1973, conjuntamente com as LDM's 114 – 410 – 415, a CF 8 e Páras, utilizando como base o aquartelamento de Cacine, onde estava sedeado o DFE 22, evacuou cerca de um milhar de pessoas, incluindo mortos e feridos, entre população e militares em fuga desordenada do aquartelamento de Gadamael que procuraram a fuga no rio e abrigo nas margens, bombardeados pelo PAIGC. Tudo isto como efeito dominó da retirada de Guileje, semanas antes.
No meu espírito e, porque regressei incólume, curvo-me permanentemente ao recordar os que não tiverem a mesma sorte e foram demasiados em toda a Guiné, de ambos os lados.

Guileje foi um dramático exemplo disso mas houve muitos mais.

Um abraço para todos,
Manuel Lema Santos
Ex-1º TEN da Reserva Naval da Marinha de Guerra

LFG Orion, Guiné, 1966-1972. Testemunho de Jorge Teixeira:

2. Testemunho do Jorge Teixeira:

Caro Manuel Santos,
Tenho de concordar contigo. Nunca entendi o porquê do Simpósio de Guileje. Mas aí os autores/participantes que expliquem porquê. Como leigo, abstive-me de comentar.
Mas a mim, mais me pareceu um honorificação do que outra coisa qualquer. De quem ? Não faço ideia.

O meu primeiro contacto na Guiné foi com fuzos. Eles tiraram-me do Niassa e colocaram-me em Bolama. Nos 15 dias que aqui passei, tive o prazer do seu convivio.
Vi muita solidariedade entre eles, com as populações e a tropa que estava de passagem e com a que estava permanente. Isto em Maio de 68. Pouco falavam da sua vida, aliás normal entre a maioria da malta ainda hoje. Só tentamos recordar o bom.

Depois colocaram-me em Catió. E tive a oportunidade de ver o seu profissionalismo, pois o batelão onde fui transportado com o meu pelotão, levava uma pequena guarnição de 3 elementos - velhos tempos em que no Tombali (ou terá sido no Corubal, já não me lembro) se podia ainda navegar sem cuidados de maior - nunca deixaram os seus postos de vigia durante as cerca de 10 horas que demorou a viagem.

Durante a minha comissão tive imensos contactos com eles, os fuzos. Como, por exemplo. Alguem se lembra da retirada do Como e quem a protagonizou? Antes da retirada, as operações quasi diárias - marítimas - para vir buscar água a Catió, a defesa (?)dum espaço enorme, por onde nao se podia andar, por apenas um pelotão, um secção de canhões sem recuo e uma LDM.

Realmente no que tenho lido, pouco se fala da Marinha. E acho que tens razão ao sentir que é um ramo desprezado. Ainda te dou razão quando dizes que a Guiné foram 12 anos de martírio e não houve só Guileje.

Eu costumo dizer que fui um privilegiado. Outros nem por isso. Mas recordêmo-los a todos, porque todos fomos iguais.

Um abraço,
Jorge / Portojo
___________

Notas de vb:

(1) Vd. artigos do Manuel Lema Santos:

213 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1842: 10 de Junho: Nós também estivemos lá (A. Marques Lopes / Lema Santos)5 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXC: Os marinheiros e os seus navios (Lema Santos)

21 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXXIII: Apresenta-se o Imediato da NRP Orion (1966/68) e 1º tenente da reserva naval Lema Santos

16 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1665: Operação Larga Agora, Tancroal, Cacheu, local maldito para a Marinha (Parte I) (Lema Santos)13 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1586: Debates da nossa tertúlia (I): Nós e os desertores (2): Lema

7 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1571: A Operação Larga Agora, o Tancroal / Porto Batu e as cartas náuticas do Instituto Hidrográfico (Lema Santos)

11 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1420: O cruzeiro das nossas vidas (5): A viagem do TT Niassa que em Maio de 1969 levou a CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Manuel Lema Santos)

21 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXXIII: Apresenta-se o Imediato da NRP Orion (1966/68) e 1º tenente da reserva naval Lema Santos

(2) Cameconde traz más recordações a alguns camaradas nossos, como o João Parreira. Foi nessa região que viu morrer, a seu lado, o Fur Mil Cmd Morais, no decurso da Op Ciao, em 7 de Maio de 1965. O João Parreira, também conhecido pela sua alcunha, o Uva, já aqui descreveu a morte do Morais, através de mim, que cito o seu diário: vd. post de Guiné 63/74 - CCCLXV: Brá, SPM 0418 (3): memórias de um comando (Virgínio Briote

"8.CAPITÃO MANILHA

"(...) Já quase no final da comissão, em Cameconde, lá para o sul. No diário do furriel Uva [João S. Parreira], um deles, podia ler-se.

“6 Maio 65. Saímos às 15h00 para a operação 'Ciao'.

"Num Dakota até Cacine e depois em viaturas até Cameconde, onde já se encontrava um pelotão à nossa espera. O Capitão Varela foi connosco.

"Saímos às 19h00 em direcção ao objectivo. Segundo as informações que nos foram fornecidas, a base IN era composta por cerca de 80 homens bem armados, comandados por Pansau Na Isna, chefe militar, adjunto do João Bernardo Vieira, de etnia Papel, mais conhecido pelo 'Comandante Nino'.

"Já na madrugada do dia 7, a poucos kms do objectivo demos indicações ao pelotão para permanecer ali e esperar pelo nosso regresso, com a missão de proteger a nossa retirada ou dar-nos apoio, caso fosse necessário.

"Assim, seguimos silenciosamente até perto do acampamento, situado na mata a SW de Catunco. Apesar de termos feito uma aproximação cuidadosa, fomos detectados por uma sentinela. Tentámos assaltar o acampamento. Mas eles estavam bem preparados, reagiram ao nosso fogo e o tiroteio prolongou-se. Quando o fogo deles abrandou, entrámos por ali dentro e vimos material abandonado durante a fuga.

"8 armas, cunhetes de munições, granadas, petardos, equipamentos, minas, fardas, e muitos documentos, entre os quais um caderno que pertencia a um tal Armindo Pedro Rodrigues, com elementos importantes da Ordem de Batalha do PAIGC.

"Carregados com o nosso material e com o que tínhamos capturado, regressámos para junto do pelotão. Juntámo-lo e começamos a vê-lo em pormenor. Faltava o aparelho de pontaria de um morteiro de 88 (?), até então ainda não apreendido na Guiné!

"O Morais afiançava tê-lo visto lá. O tenente Manilha chamou o Amadu e o Morais e disse-lhes para voltarem ao acampamento. Embora estivéssemos conscientes do perigo, arriscámos, partindo do princípio que o IN se tinha retirado após as baixas sofridas. O Morais perguntou quem é que queria ir com ele e com o Amadu. Ofereci-me bem assim como o capitão Varela, o furriel Matos e mais 7 camarada, 10 no total.

"De novo no interior do acampamento a arder. Vi uma árvore gigante, com umas cavidades enormes. Espreitei para dentro de uma, o Morais para a outra, à procura de material, e o restante pessoal, por ali perto, fazia o mesmo.

Subitamente, rajadas de metralhadora e granadas de bazuca caíram-nos em cima. Uma destas rebentou entre nós. Um pequeno estilhaço partiu a coluna do Morais, que caiu sobre uma fogueira. Eu fui atingido no lado direito das costas, mas na altura nem localizei o ferimento.

"Vi o Morais a morrer quando o olhei de relance. Um vago murmúrio, depois mais nada, um ar sereno no rosto, pareceu-me." (...)

terça-feira, 11 de março de 2008

Guiné 63/74 - P2625: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (4): Na Ponte Balana, com Malan Biai, da RTP África



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Ponte Balana > 1 de Março de 2008 > Caravana do Simpósio Internacional de Guileje... Imaginem quem é que eu deveria encontrar aqui ? O operador de câmara da RDP África, Malam Biai... Nascido em 1965, em Bambadinca, de etnia mandinga, diz que é primo do J.C. Mussá Biai, natural do Xime e membro da nossa Tabanca Grande... Quando puto, ia ao quartel de Bambadinca, à cata dos restos de comida do pessoal da tropa... Lembra-se bem dos militares da CCAÇ 12, unidade de intervenção que esteve em Bambadinca (Sector L1, Zona Leste), entre 1969 e 1973; dos dois ataques do PAIGC ao aquartelamento; da professora Violete (que dava aulas aos putos da 4ª classe) (1); dos fuzilamentos a seguir à Independência (assistiu, aliás, à execução pública de um agente da polícia administrativa de Bambadinca)... Confirmou-me, de resto, a notícia do fuzilamento, na região do Xime, do Abibo Jau, o gigante da CCAÇ 12, e do tenente ou capitão Jamanca, que conheci na 1ª Companhia de Comandos Africanos, e foi depois comandante da CCAÇ 21 (o que vem ao encontro do relato já aqui feito pelo Mussá Biai) (2)...Diz-me, além, disso que o antigo 1º Cabo da CCAÇ 12, o José Carlos Suleimane Baldé, meu guarda-costas, intérprete, guia, cozinheiro, secretário, está vivo, em Amedalai, perto do Xime... Gostaria de o rever...


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Ponte Balana > 1 de Março de 2008 > O Coronel Coutinho e Lima, que irá ser o herói do dia em Guileje, faculta-me informação adicional sobre a situação operacional na zona de Gandembel/Balana, entre 1968 e 1973, ano em que comandava o COP5... Na realidade, a ordem para a fixação da CCAÇ 2317, a que pertencia o nosso camarada Idálio Reis, em Gandembel e Balana, não é do Spínola, mas do seu antecessor, em Abril de 1968... E como eu gostaria que o Idálio pudesse estar aqui hoje!


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Rio Balana, visto da ponte > Uma cena quase idílica, e que nos remete ao tempo da guerra colonial: lavadeiras à beira-rio... Era aqui que os homens de Gandembel se vinham abastecer de água e tomar o seu banho (3)... Na época das chuvas, o caudal do rio é seguramente maior...
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Ponte Balana, ou Ponte sobre o Rio Balana, afluente do Rio Cumbijã (?)... No tempo da CCAÇ 2381 (Abril de 1968/Janeiro de 1971), um grupo de combate defendia heroicamente esta ponte, vital para o reabastecimento das nossas tropas... A ponte, outrora destruída pelo PAIGC, foi depois reconstruída pela Engenharia Militar... Do lado esquerdo, há uma pequena elevação do terreno...Foi aí que as NT edificaram um fortim, hoje completamente em ruínas. O pessoal de Gandembel vinha aqui abastecer-se de água...


Do outro lado da estrada alguém vai construir uma casa... Continuam a usar-se os materiais tradicionais, o barro, para fazer o tijolo, seco ao sol...
Não sei quantos anos têm estas travessas de madeira do tabuleiro da Ponte sobre o Rio Balana, na Estrada Quebo-Gandembel... Mas não irão durar muito mais... O desgaste provocado pela travessia de veículos automóveis é já evidente...
Em primeiro plano, o editor do blogue, tendo à esquerda um dos elementos da escolta policial da Ministra dos Combatentes da Liberdade da Pátria e à direita o escritor Oscar Oramas, embaixador de Cuba em Conacri, antes e depois da morte de Amílcar Cabral.

Uma cena insólita na Ponte Balana... Não é um batalhão, é apenas um magote de fotógrafos e jornalistas tentando ouvir, da boca do editor do blogue, a história da Ponte Balana e dos seus valentes defensores, entre Abril de 1968 e Janeiro de 1969...
O editor do blogue, em cima da ponte de madeira, fazendo um resumo histórico da Ponte Balana, perante as câmaras da RTP - África e outros órgãos de comunicação social, tais como a televisão comunitária do Bairro do Quelélé, TV Klélé... Na imagem, à direita, de óculos escuros, pode ver-se o Califa Soares Cassamá, jornalista, correspondente da RDP-África em Bissau, que ouço, de vez em quando, ao sintonizar de manhã aquela estação radiofónica, a falar com o Guilherme Galiano... Como o mundo é pequeno e a Guiné-Bissau uma tabanca grande: o Califa é primo do meu amigo e aluno de mestrado, o Lázaro Cassamá, médico, filho de um conhecido comandante do PAIGC em Morés, no tempo da luta de libertação...
O pessoal que veio do Porto (juntamente com os de Coimbra) juntou-se a nós em Ponte Balana, a caminho de Guileje... Na foto, a Alice, de costas, do lado esquerdo; o Paulo Santiago, ao centro, e o Álvaro Basto, à direita. Estão alojados em João Landim, a 30 km ao norte de Bissau...

Os nossos queridos amigos e camaradas da Tabanca Grande: Da esquerda para a direita, o Zé Teixeira; o Paulo Santiago, ao meio; o Álvaro Sousa, de costas, à direita. Em primeiro plano, a Alice, a esposa do editor do blogue...

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Ponte Balana / Gandembel > 1 de Março de 2008 > Uma planta chamada matchundadi di branco [ou pila de branco] na expressão bem humorada dos fulas da região (4)...

Fotos, vídeos e texto: ©
Luís Graça (2008). Direitos reservados


Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (4):

Vd. postes anteriores desta série:

9 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2621: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (3): Pequeno-almoço no Saltinho, a caminho do Cantanhez


Sábado, dia 1 de Março de 2008. Partimos hoje de manhã, de Bissau, por volta das 7h30. Seguimos a estrada que vai para leste, ao longo da margem direita do Rio Geba, passando por Nhacra e Bambadinca, flectindo aqui para sul, no sentido do Xitole... Chegamos ao Saltinho às 9h20, sem qualquer paragem anterior. No Clube de Caça do Saltinho fizemos a primeira paragem técnica, para tomar o pequeno-almoço, ou o segundo pequeno-almoço, que isto de andar de jipe em África faz fome e sede...

Às 10h15 a caravana - onde se inclui a Ministra dos Combatentes da Liberdade da Pátria, senhora Isabel Buscardini e uma escolta policial - arranca para a próxima paragem em Ponta Balana, perto de Gandembel, por volta das 11h00. Na realidade, chegamos lá just in time, em menos de três quartos de hora. Até agora apanhámos estrada alcatroada, sem curvas...
 
Saltinho, rápidos do Saltinho, Mampata, Contabane (reordenamento do tempo do Paulo Santiago, quando era comandante do Pel Caç Nat 53), Sare Amadi, Quebo (a Aldeia Formosa do nosso tempo, formosa pelas suas bajudas futa-fulas e sagrada pela presença do Cherno Rachid, alto dignatário do Islão em África) (5), Mampatá, Chamarra (estas três localidades, bem conhecidas do nosso Zé Teixeira, quando ele era 1º cabo enfermeiro da CCAÇ 2381, 1968/70)...

A partir de Quebo, o alcatrão foi desaparecendo e entramos em estrada de terra batida... Começa a maldita poeira e aparecem os primeiros buracões, obrigando as máquinas, os pilotos e os passageiros a prodigíos de equilíbrio... No jipe, conduzido pelo Antero, motorista, balanta, da AD, vou eu, a Alice, o Nuno Rubim e a esposa. O coronel vai à frente. Durante o percurso não tiro fotografias. Observamos a paisagem e pomos a conversa em dia. O Nuno e a esposa, que é natural da Guiné, aonde não vinha há trinta e tal anos, formam um casal de cinco estrelas e são uns óptimos parceiros de aventura.

Ponte Balana... Aqui estiveram os homens-toupeiras, os homens de nervos de aço da CCAÇ 2317 (6). Aqui e em Gandembel. Menos de nove meses, de Abril de 1968 a Janeiro de 1969. O tempo suficiente para apanharem com quase três centenas e meia de ataques e flagelações. Por aqui passaram muitas colunas logísticas, vindas de Aldeia Formosa ... Aqui houve muitos combates, feridos e mortos, entre as forças do PAIGG, as nossas tropas especiais e as unidades de quadrícula de Guileje, Quebo, Gandembel... Aqui um dia uma GMC carregada de bidões foi parar ao rio (7)... Falamos da petite histoire da História com H grande... É preciso escrever as duas... É urgente que os próprios guineense conheçam a sua história recente... Um povo sem história é um povo acéfalo, sem memória, sem identidade, sem raízes...

_________

Notas de L.G.:

(1) Vd. poste de 11 de Janeiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2431: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (15): Oficial e cavalheiro em Bambadinca, às ordens de Dona Violete

(2) Vd. poste de 12 de Maio de 2006 >
Guiné 63/74 - DCCXLIX: O fuzilamento do Abibo Jau e do Jamanca em Madina Colhido (J.C. Mussá Biai)

(3) Vd. poste de 3 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2326: O Hino de Gandembel e a iconografia do soldado atormentado pelo desassossego (Idálio Reis)

(4) Vd. poste de 22 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P895: 'Matchundadi di branco' e o sentido de humor da nossa caserna

(5) Sobre o famoso dignatário religioso Cherno Rachid, da Aldeia Formosa (ou Quebo), vd. postes de:
4 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1815: Álbum das Glórias (14): o 4º Pelotão da CCAÇ 14 em Aldeia Formosa e em Cuntima (António Bartolomeu)
18 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCX: O Cherno Rachid da Aldeia Formosa (Antero Santos, CCAÇ 3566 e CCAÇ 18)
16 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXVIII: Um conto de Natal (Artur Augusto Silva, 1962)
15 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LVII: O Cherno Rachid, de Aldeia Formosa (aliás, Quebo) (Luís Graça).

(6) Vd. postes de:
16 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1530: Fotobiografia da CCAÇ 2317 (1968/70) (Idálio Reis) (1): Aclimatização: Bissau, Olossato e Mansabá

Guiné 63/74 - P2624: À procura dos Camaradas e da Memória de 1966 (José Jerónimo / Virgínio Briote)

1. Mensagem que o José Jerónimo enviou há tempos:

Emocionado estou com todo o trabalho que têm tido na pesquisa de informações, sobre meus camaradas mais próximos, nos velhos tempos de Guiné.


Não sei como mostrar para vocês todo o meu reconhecimento.
Tu, meu grande camarada, que junto com o Henrique Cabral, com o Henrique Matos, com o Virginio Briote, com o Carlos Vinhal, com o Santos Oliveira (que se tem desdobrado em vários "Santos Oliveira" para me apoiar nesta busca, que já alguns resultados nos trouxe) e outros, tens cedido o teu tempo, o teu espaço, para me dares atenção, me ajudares , apesar do meu contributo de informações ser tão pequeno... mereces um Louvor por MÉRITO que se estende a todos os outros, não pelos vossos feitos na guerra.


Mas agora, em outro tempo bem distante, pelo ALTO NIVEL de Solidariedade, de Camaradagem, de Interesse em ajudar os outros, de Motivação em resgatar os momentos difíceis por todos nós vividos e que serviram para tanto fortalecer o espirito de CAMARADAGEM, nas raias da AMIZADE que fez a nossa linda história.

Daqui destas longínquas terras brasileiras, que agora muito mais perto se tornaram para todos nós, vai o meu MUITO OBRIGADO PARA VOCÊS TODOS.

Com um FORTE ABRAÇO para TODOS, do

José Jerónimo

PS: Esperando que tenhamos mais resultados em nossa busca,
JJ

2. Nova mensagem do José Jerónimo:

Caro Luís Graça,




Esta foi uma parte das operações em que a CCAÇ 1487 participou. Foram aquelas que fizemos ao nível de Batalhão com o de Tite, o BCAÇ 1860.

Além destas tivemos outras como Companhia de Intervenção do Batalhão de Bissau, em Mansoa e Mansabá, além de muitas outras várias que tivemos só ao nível de uma ou duas companhias, que aqui não estão relacionadas. Existe interesse em publicar no Blogue? Como? Posso escrever com alguns detalhes que me lembrar. O que achas?

3. Para lhe avivar a memória, meti-me na conversa, uma vez que somos praticamente do mesmo tempo:

Caro José Jerónimo,

Pela foto que acabas de enviar vejo que está bem, com um aspecto de fazer inveja à velhada que por aqui tem dado a cara.

E pelo resumo de algumas ops em que entraste, também me apercebi que dois grupos nossos (Cmds do CTIG, do então cap Garcia Leandro) andaram contigo, salvo erro a Narceja e a Naja, estou correcto?

Tens alguma informação mais detalhada que queiras enviar sobre as acções em que participaste?

Um abraço,
vb



4. Na volta, o José Jerónimo:

Caro VB

Concerteza que sim. Estive lá em todas essas operações, menos na última, a Navalhada, pois tinha acabado de ser evacuado para o Hospital Militar de Bissau. Nela, lembro, morreram o guia Idrissa e tivemos vários feridos no Grupo do Alf Freitas Soares.

Apesar de, pelo muito tempo afastado dessas nossas lides, tenha esquecido a maior parte dos detalhes que gostaria de recordar agora, lembro-me que na Narceja foi derrubado um helicóptero, quando foi evacuar os feridos. Na queda um furriel que com a sua secção fazia a segurança do helio, teve um braço quase decepado.

No helicóptero estava a ser evacuado, com outros, um cabo (não lembro o nome) da CCAÇ 1487, com um tiro no rosto.

Depois quando faziamos a segurança do helicóptero derrubado, alguns de nós, entre eles eu, estávamos perto de um grande poilão, onde estava o técnico do Alouette que ia desmontar o helicóptero, para o mesmo poder sair dali em um outro. Aí estavam também de pé o então capitão Fabião , apoiado na sua varinha, o também então capitão Osório e um dos alferes dos Cmds do CTIG (era um gordinho muito falador e divertido, estive com ele mais vezes).

Este último tentava assar umas febras de um leitão que tínhamos apanhado. Foi nessa altura que tivemos um contra-ataque com uma saraivada de balas , morteiradas e bazucadas. Todos os que ali estavam indevidamente foram para os seus lugares. Eu estava ao lado Alferes Lobato da CCAÇ 1487 e quando no primeiro momento nos jogamos para o chão, uma rajada passou entre nós os dois. Ele concerteza se lembrará também.

E lá se foram as febrinhas de porco, que pareciam vir a ser tão apetitosas. Os Páras desceram já muito mais tarde.

Tu estavas lá? Foi assim ? Ou estou a fazer confusão com outra operação? Acho que no fim fomos por Jabadá, onde o Alferes do Pel Mort 1039 (a quem eu chamo de Basílio) nos recebeu com umas boas cervejas, no destacamento, apesar de estarmos debaixo de muitos tiros.
Da Naja não lembro tão bem.

Outra que lembro alguma coisa, mas que vocês (Cmds do CTIG ) não estiveram, foi a Nalú. Foi nela que, pela primeira vez, foi integrado nas forças terrestres o Comandante do Batalhão 1860 (ele foi no meu Grupo de Combate e nesta operação , morreu o Alferes Carlos Santos Dias da CCAV 1549 (?), que actuava com um objectivo diferente.

Quanto ao ex-capitão Leandro, lembro que nos comandou durante os dois períodos de férias do Osório. Num deles tivemos um forte ataque ao aquartelamento de Fulacunda. E ele estava lá. Lembro-me que quando saí com a arma, para ir para fora do quartel (cabia ao meu Grupo a segurança da pista e da parte externa do quartel, onde ficava a população civil) me cruzei com ele, que ainda perplexo se tentava posicionar quanto à situação e me perguntou alguma coisa que agora não recordo.

Olha, Briote, se forem puxando por mim, ainda vou lembrar de um monte de coisas. Gostei deste momento de recordações e só tenho pena de só ir lembrando aos poucos.

Quanto à foto que te enviei, obrigado pelo elogio. De facto apesar das muitas peripécias da minha vida, ainda me sinto muito bem e tenho uma vida muitissimo ativa. Dou Graças a Deus por isso. Estou aí para mais lembranças e encontros...

Se tu, meu camarada amigo, estiveste em algumas destas operações, tenta avivar a minha memória, que começou a clarear desde que conheci o Grande Santos Oliveira e tenho estado em contacto com todos vocês.

Um abração amigo
JJ

__________

Nota de vb:


I. A op Narceja em que o José Jerónimo refere o abate do Allouette, consta também da minha memória. Não foi o meu grupo mas sim os Vampiros, comandados pelo alferes V. Caldeira. Foi a primeira ou se não foi, foi seguramente uma das primeiras vezes que o Caldeira, até então adjunto do cap Leandro para as questões administrativas, chefiou o grupo. O alferes Vilaça, até então o cmdt do grupo tinha regressado a Guileje e à sua CCaç 726.
II. O técnico da fábrica francesa que estava na BA 12, Bissalanca, já com alguma idade, deslocou-se num outro heli para ver os estragos e eventualmente reparar no local o que pudesse ser reparado.
O alf Vítor Caldeira contou-me a peripécia, mas o que mais retive foi a cena da largada dos páras.
Transportados para o local pelo próprio cmdt da Base, o cor Kruz Abecassis, se a memória não me atraiçoa, quando a zona foi sobrevoada pelo Dakota, havia tiroteio cá em baixo. Mesmo assim, fez-se a largada.



Foto de finais de 1965, princípios de 1966, em Brá, numa visita que o Governador A. Shultz fez à CCCmds. De costas e com as mãos atrás das costas, vê-se o então cap Nuno Rubim. O alf V. Caldeira é o que está assinalado à direita da imagem (mancha branca junto às botas) com o Marcelino da Mata ao fundo. É este o alferes gordinho de que falas?
JJ, puxa pelas memórias. Para as avivar, vai enviando fotos, docs, o que tiveres.
Foto de © vb (2008). Direitos reservados.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Guiné 63/74 - P2623: Estórias cabralianas (34): O Alferes, o piano e a Professora (Jorge Cabral)

Lisboa > Casa do Alentejo > 6 de Março de 2008 > O Henrique Matos (ex-Comandante do Pel Caç Nat 52, 1966/68) e o Jorge Cabral (ex-Comandante do Pel Caç Nat 63, 1969/71), no almoço organizado pela nossa Tabanca Grande no dia do lançamento do livro do Beja Santos (1)


Foto: © Albano Costa (2008). Direitos reservados (Foto editada por L.G.)



1. Mensagem do Jorge Cabral:

Querido amigo:

Espero que já estejas refeito de tanta emoção!

Lá estive no lançamento, que correu muito bem (1).

Gostei imenso de conhecer o Henrique Matos, com quem logo senti uma grande empatia.
Contei-lhe a estória que hoje envio, a qual devo ao Beja Santos, que me fez recordar do tal piano.

Grande, Grande Abraço
Jorge

2. Estórias cabralianas > O Alferes, o piano e a Professora (2)


Em Maio de 71, o apanhanço do Alferes excedera todos os limites. Os Amigos da CCAÇ 12 haviam partido e ele, com os seus vinte e três meses de mato, refinara a excentricidade, espantando agora os periquitos de Bambadinca.

Naquele dia resolvera visitar a Professora (3). Com que intenção, não sei. Líbido? Mera curiosidade? Alguma aposta? Talvez de tudo um pouco… e se viesse à rede… pois então…

Bateu à porta e logo a amarelenta dama, que parecia saída de um filme de Fellini, lhe franqueou a entrada, num sorriso de Admiração.
- O Senhor Alferes de Missirá! Entre!
- Venho pedir conselhos sobre a Escola. (... Depois blá, blá, blá, da didáctica, dos fulas, dos mandingas, da Guiné antes da Guerra…)
- E que fazia o Senhor na vida civil? - perguntou ela.
Nem hesitou o Alferes. Com um ar sonhador, apontou o piano que ali jazia ao canto, e disparou:
- Pianista!!!
Quase pulou a Professora. Brilharam-lhe os olhos e, como uma criança, bateu palmas.
- Vai tocar! Vai tocar!
Subitamente, ao Alferes, deu-lhe a pressa e encaminhou-se para a saída.
- Hoje não posso. Venho cá outro dia. E até lhe prometo um recital.
Cá fora, vociferou consigo próprio.
- Porra! Sou duro de ouvido. Não sei uma nota. Porque não lhe disse que era massagista?

A partir desse dia, assim que chegava ao Cais de Bambadinca, enfaixava a mão direita e punha o braço ao peito, para passar diante da Escola, com receio que a dama o fizesse cumprir a promessa.

Já em Julho o Polidoro (4) chamou-o. A Professora perguntara-lhe se o Alferes estava melhor.
Coitado, um tiro na mão. E sendo pianista… ainda pior… já não há recital.
- Cabral, você está doido! Que história é essa? Do tiro, do pianista, do recital?
- Boatos! Invenções! Delírios! Coitada da Dona Violete. Imaginou!

Jorge Cabral


PS - Envio foto (da autoria do Albano) tirada enquanto falava do prometido recital...
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Notas de L.G.:

(1) Vd. poste de 8 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2617: Lançamento do Diário da Guiné, 1968-1969: Na Terra dos Soncó, do Mário Beja Santos (Virgínio Briote)

(2) Vd. post de 4 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2612: Estórias cabralianas (33): Quatro Madrinhas de Guerra (Jorge Cabral)

(3) Vd. poste de 11 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2431: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (15): Oficial e cavalheiro em Bambadinca, às ordens de Dona Violete

(4) Tenente-coronel, comandante do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72). Já falecido.

domingo, 9 de março de 2008

Guiné 63/74 - P2622: Bibliografia (26): Henrique Matos, 1º CMDT do Pel Caç Nat 52, saúda o outro CMDT, Beja Santos, autor de Na Terra dos Soncó (Henrique Matos)

Lisboa > Sociedade de Geografia de Lisboa > 6 de Março de 2008 > O periquito Joaquim Mexia Alves, à esquerda, e o velhinho Henrique Matos mostram o seu regozijo pelo lançamento do livro do Beja Santos (ao centro). Os três têm em comum o facto de, em diferentes épocas, terem comandado os valentes soldad0s do Pel Caç Nat 52, entre 1966 e 1973.

Lisboa > Casa do Alentejo > 6 de Março de 2008 > Em primeiro plano, à direita, o nosso celebrado autor, rodeado por três outros comandantes de pelotões de caçadores nativos da Guiné: o Henrique Matos (Pel Caç Nat 52), o Jorge Cabral (Pel Caç Nat 63) e o Joaquim Mexia Alves (Pel Caç Nat 52)... Todos passaram por Missirá, em diferentes épocas.



Lisboa > Sociedade de georgrafia de Lisboa > O Jorge Cabral ganhando inspiração para uma próxima estória cabraliana...

Fotos: © Henrique Matos (2008). Direitos reservados.


1. Mensagem do Henrique Matos, ex-Alf Mil do Pel Caç Nat 52 (Enxalé e Porto Gole, 1966/68):


Caro editor e co-editores:

Subscrevo integralmente a mensagem do Mexia Alves para o Beja Santos (1). A festa foi mesmo muito linda e teve para mim um sabor muito especial pois foi a primeira vez que contactei pessoalmente com os participantes que conhecia apenas do Blogue, com excepção do Rui Alexandrino Ferreira que gostei de rever em boa forma.

Anexo 2 fotografias que mostram bem a nossa alegria e uma terceira, do Jorge Cabral, que fez questão de fotografar-se junto a uma bajuda que espero sirva de inspiração para mais uma das suas memoráveis estórias cabralianas.

Abraço a todos e em especial ao Luís Graça que perdeu uma festa mas teve outra que compensou.

Henrique Matos (2)

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Notas do editor:

(1) Vd. poste de 8 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2617: Lançamento do Diário da Guiné, 1968-1969: Na Terra dos Soncó, do Mário Beja Santos (Virgínio Briote)

(...) Mensagem do Joaquim Mexia Alves (...):

"Caro Mário Beja Santos: Foi linda a festa, pá!...Foi lindo o convivio, (não falemos do bacalhau!), foi linda a conversa, foi lindo o riso, foi lindo a visita à Sociedade de Geografia, foram lindos os 'discursos', foi lindo o som da Guiné, foi linda a tua emoção, foram lindas as cervejas que ainda bebi a matar saudades, ah, e o livro é lindo! Não vale a pena dizer mais nada, porque não há mais palavras para dizer o que vai no coração. Ah, e senti um grande orgulho em ter sido Comandante do 52!" (...)

(2) Vd. postes de:


14 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2105: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (1): Ataque a Missirá em 22 de Dezembro de 1966 (Parte I)

14 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2107: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (2): Ataque a Missirá em 22 de Dezembro de 1966 (Parte II)

6 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2158: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (3): O famigerado granadero do Enxalé, da CCAÇ 1439 (1965/67)

11 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2173: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (4): O capitão de 2ª linha Abna Na Onça, régulo de Porto Gole

18 de Outubro de 2007 >Guiné 63/74 - P2191: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (5): O baptismo de um periquito no Enxalé

23 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2376: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (6): Insularidade e solidariedade no Natal dos açorianos

31 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2392: Memórias dos Lugares (3): Porto Gole (Henrique Matos, Pel Caç Nat 52, 1966/68)

Vd. também poste de 22 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1871: Tabanca Grande (15): Henrique Matos, ex-Comandante do Pel Caç Nat 52 (Enxalé, 1966/68)