terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5470: Parabéns a você (53): Francisco dos Santos, 1º Cabo Radiotelegrafista, CCAÇ 557, Cachil, Como, 1964 (Editores)


1. O nosso Camarada Francisco dos Santos, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista, da CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65, completa hoje 67 anos de idade.


2. O Francisco dos Santos foi apresentado como novo tabanqueiro no poste P4329:

“Francisco dos Santos, nado a 15/12/42 e criado em Sarilhos Grandes, Montijo, onde sempre fui fiel como residente, excepto aqueles vinte e três meses de residência forçada na Guiné. Sou casado com a minha sempre querida Emília [Mila para os amigos], tenho sessenta e seis anos de idade, duas filhas e três netos. Sou reformado, fui motorista, hoje dedico-me à família e à Academia Musical União e Trabalho de Sarilhos Grandes, da qual faço parte dos órgãos directivos e tenho como hobby a escrita, ou por outra, o bichinho da poesia popular.

Embarquei para a Guiné no navio mercante Ana Mafalda integrando a Companhia de Caçadores 557 em 27/11/1963, desembarquei em Bissau a 3/12/1963, onde a Companhia 557 substituiu transitoriamente a CCaç 556 no dispositivo do BCaç 600, com vista à segurança e protecção das instalações e das populações da área da Ilha de Bissau até à chegada da CArt 349.


3. Entretanto, contactamos o José Colaço e pedimos-lhe que nos soubesse algo mais sobre a personalidade do Francisco Santos, que em 14DEZ2009, nos respondeu assim:

Camaradas, muito agradeço o vosso serviço de sentinela alerta.

Falei via telefone com o Francisco dos Santos que me disse, que neste momento está em paz com a guerra.

E como poeta que é, leu-me ao telefone a sua biografia que, poeta que se preze, tem que ser em rima.

Biografia do Francisco dos Santos:

Em Sarilhos eu nasci
e fui como outros tantos,
no Montijo, perto daqui,
registaram Francisco dos Santos

Comecei a ouvir depois,
ainda menino eu lembro,
que nasci em quarenta e dois
no dia quinze de Dezembro.

Sarilhos Grandes me criou,
só para a Guiné eu sai,
sou feliz aonde estou
tudo o que tendo é aqui.

Casei, construí família,
gozo de cinco maravilhas,
para além da esposa Emília,
três netos e duas filhas.

PS: Para o Luís Graça, o Xico está a organizar os seus poemas da passagem pela Guiné.

Uma boa noite com algum trabalho,

Um abraço,
José Colaço.


4. Fomos consultar num dos programas, à disposição de consulta na internete, mais conhecido e popular do género, o KAZULO (http://horoscopo.kazulo.pt/4866/signos-do-zodiaco.htm), o que diz o signo astrológico do Francisco dos Santos, que é o Sagitário, para os nativos entre 22 de Novembro e 21 de Dezembro:



“Os Sagitários possuem uma personalidade entusiasta, optimista e sempre de olhos postos no futuro. Têm fé e não há nada que os faça perder a exuberância pela vida. Mesmo que as coisas não correm bem, são capazes de encontrar sempre um lado positivo e identificar um significado e a razão pela qual as coisas aconteceram daquela forma.


"Um Sagitário tem muitas filosofias, e porque entende que as nossas motivações e formas de pensar estão relacionadas com a altura e local onde estamos, as suas ideias e argumentos podem soar quase proféticos. Nalgumas ocasiões, podem estar tanto com a cabeça no ar que não vêem algo correcto que esteja à sua frente.


Os Sagitários têm tendência para tirar conclusões precipitadas e de se estenderem em compromissos, tempo e objectivos. Honestos e frontais podem por vezes magoar ou ofender alguém com um dos seus comentários espontâneos, ficando de certa forma melindrados, quando se apercebem dos efeitos das suas palavras. Haverá infelizmente, alturas em que eles não se aperceberão do mal que causaram.”

5. Independentemente dos comentários que os nossos Camaradas colocarão no local reservado aos mesmos, queremos em nome do Luís Graça, Carlos Vinhal, Virgínio Briote, Magalhães Ribeiro e demais Camaradas da Grande Tabanca, desejar-te o seguinte:



PARABÉNS A VOCÊ,
NESTA DATA QUERIDA,
MUITAS FELICIDADES,
MUITOS ANOS DE VIDA.
HOJE É DIA DE FESTA,
CANTAM AS NOSSAS ALMAS
PARA O AMIGO FRANCISCO...
UMA SALVA DE PALMAS!

Além da cantiga, mais acrescentamos que:

O nosso maior desejo, neste teu aniversário, é que junto da tua querida família sejas muito feliz e que esta data se repita por muitos, bons e férteis anos, plenos de saúde, felicidade e alegria.

Que por muitos mais e boas décadas, este "aquartelamento" de Camaradas & Amigos te possa enviar mensagens idênticas, às que hoje lerás no cantinho reservado aos comentários.

Estes são os nossos sinceros e melhores desejos destes teus Amigos e Camaradas.

Com um grande abraço fraterno.

6. Já agora, Eduardo, deixa-me pôr a cereja no bolo de aniversário do Xico:

Ribat’jana terra é,
Sarilhos onde nasceste,
Mas pior foi a Guiné,
Que em sarilhos te meteste.

Para trás fica o Cachil,
Esquece o que lá passaste.
Muito tarrafo… e trotil,
Não me digas que não gostaste ?!

Em dia de aniversário,
Há um camarada a saudar,
O Xico, que é Sagitário
E poeta... popular!


Luís Graça
__________
Nota de M.R.:

Vd. primeiro poste sobre o Francisco em:


Vd. último poste desta série em:

Guiné 63/74 - P5469: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (10): As palmas das vitórias de uma Guerra que não era nossa

1. Mensagem de José Câmara, ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Guiné, 1971/73, com data de 14 de Dezembro de 2009:

Olá amigo Carlos Vinhal,
Junto encontrarás mais uma pequena história da minha vivência no Palácio.
Este pequeno episódio deu-me para conhecer uma faceta mais humana do General Spínola.

Das terras geladas dos States, com votos de boa saúde para todos, e um abraço amigo,
José Câmara


Guerras palacianas: As palmas das vitórias de uma Guerra que não era a nossa

Enquanto Sargento da Guarda ao Palácio do Governador da Guiné, os meus contactos com o General Spínola foram, sempre, esporádicos.

Esses encontros davam-se quando ele se dirigia à Casa da Guarda para ali deixar, para limpeza, o seu cinturão com as cartucheiras e granadas de mão ofensivas M63 e a sua G3.

Outras vezes cruzava-me com ele junto dos portões de estrada quando ele, quase sempre na companhia da esposa, dava um passeio nos arredores do Palácio, ou se dirigia ou vinha do clube dos oficiais da Força Aérea que ficava nas redondezas do Palácio.

Sempre fiz acompanhar o meu cumprimento de continência militar ao velho General com um cumprimento civil sobretudo em atenção à esposa. O General sempre correspondia ao cumprimento com um leve sorriso. Julgo que era apreciativo desta forma de eu o(s) cumprimentar.

Um Domingo, com a noite já avançada, o encontro foi diferente.

Pelo intercomunicador do posto de sentinela que servia o portão de serviço geral recebi a informação que um estafeta dos CTT tinha uma mensagem dirigida ao Governador da Guiné. De imediato dirigi-me àquele posto de sentinela. Cumpridas as formalidades com o estafeta dos CTT, reparei que a mensagem era do tipo relâmpago. Era a primeira que me acontecia. Sabia o que tinha que fazer.

De imediato dirigi-me aos escritórios de apoio ao palácio. Para meu desepero não encontrei ninguém no escritório. Tinha a consciência da importância daquele tipo de mensagem que tinha de ser entregue, nem que tivesse que fazer o nosso General saltar da cama.

Aventurei-me nos corredores sem acender a luz na esperança de ver alguma réstea de luz por debaixo de alguma das portas. A ideia era boa, o resultado foi pobre. Decidi bater a uma das portas. Para surpresa minha a porta entreabriu-se Na minha frente estava o próprio General Spínola. Ao aperceber-se quem eu era de imediato transpôs a porta, fechando-a atrás de si.

Cumprimentei-o e disse-lhe o que me levara ali. Uma mensagem relâmpago dirigida a ele. A nossa conversa foi, essencialmente esta:

- Abra e leia - disse-me ele.

- Meu General eu não posso nem devo ler esta mensagem. É uma mensagem relâmpago - retorqui.

- Pode, pode… abra, abra… leia, leia. Sou eu que lhe estou dizendo que pode. - Disse ele um pouco impaciente.

Abri a mensagem e comecei a ler:

- O Conselho de Ministros em sua reunião de... aprovou o...

Hoje não tenho a certeza se a comunicação se referia à aprovação do Orçamento Geral da Guiné, ou apenas de um suplemento.

O General enquanto pegava na mensagem deu-me um pequeno toque nas costas e disse:

- Hoje é um dia grande para a Guiné!

Levantando a mensagem ao ar, como quem levanta um troféu, reabriu a porta e ouvi-o dizer:

- Está aqui…

Um coro de palmas ecoludiu naquela sala. Foi aí que pude reparar que o General estava rodeado pelos seus colaboradores mais directos na Guiné, deduzi.

Fechei a porta e dirigi-me à Casa da Guarda. Ia pensativo. Por causa daquelas palmas.

Afinal aqueles homens também eram capazes de exultar com as suas vitórias. Eram vitórias de um tipo de Guerra que não era a nossa, mas sem as quais as nossas vitórias seriam muito mais difíceis de obter.

Cruzei-me mais três vezes com o General: no destacamento de Bassarel, no destacamento de São João e no DA, em Brá, no dia da despedida.

José Câmara
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 9 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5434: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (16): Guileje não caiu, foi abandonado (José da Câmara)

Vd. último poste da série de 27 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5356: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (9): Histórias palacianas: tiros indiscretos...

Guiné 63/74 - P5468: Parabéns a você (52): O segredo do Sousa de Castro, um velhinho da Tabanca Grande (Luís Graça)



Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Xime > CART 3494 > 1972 > Feliz Natal e Próspero Novo... O postal de Natal da praxe, que se mandava aos familiares e amigos... Na imagem, o Sousa de Castro, 1º Cabo Radiiotelegrafista. Entre os 3 comandantes da companhia, contou-se o nosso camarada António José Pereira da Costa (Cap Art).




Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Mansambo > 1973 > O Sousa de Castro junto ao oráculo da Virgem, mandado erigir pela CART 2714 (1970/72), pertencente ao BART 2917 (Bambadinca, 1970/1972). Em baixo pode ler-se: "Senhora, protegei-nos. CART 2714". A companhia do Sousa de Catro foi transferida do Xime para Mansambo em Abril de 1973. A unidade de quadrícula que lá estava, a CART 3493, foi para o Cotumba, no Cantanhês. Para o Xime foi a CCAÇ 12, até então unidade de intervenção ao serviço do comando do Sector L1.


Fonte: © Sousa de Castro (2005). Direitos reservados.



1. Minhoto, 59 anos, casado com a Maria Conceição Fernandes Dias, pai de três filhos (só a mais nova, de 24, é que ainda está em casa), residente em Vila Frio, Viana do Castelo, reformado, 47 anos de vida activa...

Começou aos 11 (onze!!!) , mal acabada a 4ª classe, a trabalhar como ajudante de marceneiro, fez a tropa, casou durante a tropa, foi 1º Cabo radiotelegrafista na CART 3494 BART 3873 (Guiné, Zona Leste, Sector L1 > Xime e Mansambo, 1972/74) , ingressou nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, e por lá ficou 33 anos... É Sagitário, bom rapaz, altruísta, amigo do seu amigo... Gosta de fazer amigos e está em força nas redes sociais...


É o Sousa de Castro, António Manuel Sousa de Castro, o nosso tertuliano nº 2 (julgo que exequo com o Humberto Reis)...Acabei de lhe telefonar (963 673 628), a dar-lhe os parabéns. Ainda não é SEXA mas anda a treinar...

Está de boa saúde e está a gozar a sua reforma. Disse-me que para o ano quer ir de novo ao nosso Encontro Anual. Transmiti-lhe os cumprimentos da malta toda do blogue. Ficou feliz pela surpresa... Ao fim destes anos todos, ainda tem dificuldade em tratar-me por tu... Lembrei-lhe que ele foi o causador deste macaréu todo, que se chama agora blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné...


2. Mas vejamos como se apresenta na blogosfera:

(i) Nasceu em Caminha em 15/12/1950;

(ii) Reside em Vila Fria, concelho de Viana do Castelo.

(iii) Participou na guerra colonial na Guiné, pertenceu à CART 3494 (Companhia de Artilharia) do BART 3873 (Batalhão de Artilharia)na zona leste, no Xime e Mansambo. Embarcou em 27/01/1972 nos TAM (transporte aéreo militar) com o posto de 1º. cabo radiotelegrafista, regressou por ter terminado a comissão de serviço em 03/04/1974 nos TAM.

(iv) Trabalhou nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA. onde exerceu funções de Técnico Fabril no sector das Docas.

E-mail: sousadecastro@gmail.com

Segue 11 blogues (incluindo o nosso, Luís Graça & Camaradas da Guiné) e mantém o seu próprio blogue: CART 3494 - Guiné


O último poste é de 5 de Dezembro de 2009 > P45 - Apresentação da 3ª edição do livro “A retirada de Guilege” do Coronel Coutinho e Lima ... Ficámos a saber que o Coutinho e Lima é natural de... Vila Fria, Viana do Castelo. (Ei-lo aqui, na foto à direita, com o Sousa de Castro)

(..) No dia 05/12/2009, na Junta de Freguesia de Vila Fria, concelho de Viana do Castelo, que patrocinou a apresentação da terceira edição do livro 'A Retirada de Guilege', do Coronel, Coutinho e Lima (...)



O presidente de Junta, para além de agradecer a presença de várias pessoas, enalteceu o facto, como sendo muito importante, de um Vilafriense ter escolhido a sua terra Natal para apresentação do seu livro. O Coronel começou por dissecar e explicar a razão (com o auxilio de mapas), que o levou a tomar a decisão estratégica de retirar de Guilege, foi ovacionado pelos presentes, tendo respondido a várias questões e dúvidas, levantadas por alguns assistentes.


Curiosamente estiveram alguns ex-combatentes que passaram por Guilege e Gadamael Porto, nomeadamente um homem que veio propositadamente de Lamego dar um abraço ao seu comandante e que afirmou que aquela (retirada) foi a melhor opção que podia ter tomado. Segundo ele, a situação na altura era insustentável. Se assim não fosse, poderiam perder-se muitas vidas humanas.

No final foi oferecido um verde de honra, aí vários ex-combatentes reviveram os tempos idos da Guiné. Sousa de Castro. (...)

4. O Sousa de Castro foi o primeiro a aparecer, por email, em 19 de Abril de 2005... Por mão dele vieram outros camaradas nomeadamente nortenhos...Como eu costumo lembrar, depois do Sousa de Castro, "vieram mais cinco"... O David Guimarães, o A. Marques Lopes, o Humberto Reis, etc. foram alguns dos primeiros, a seguir ao Sousa de Castro, a atabancar, no nosso blogue... Se a antiguidade fosse um posto, entre nós, eles os quatro já hoje seriam generais de muitas estrelas... São velhinhos, são senadopres da nossa Tabanca Grande (ou tertúlia, como dizíamos na época).

Do Sousa de Castro recebi um primeiro mail, em 19d e Abril de 2005, que rezava assim [vd. poste de 20 de Abril de 2005 > Guiné 69/71 - V: Convívio de antigos camaradas de armas de Bambadinca (Luís Graça):

"Foi gratificante para mim encontrar algumas estórias sobre a guerra colonial, mais concretamente sobre a Guiné. Curiosamente eu também estive na Guiné em Jameiro de 1972 a Abril de 1974, no Xime [e depois em Mansambo]. O meu Batalhão estava em Bambadinca, BART 3873 (CCS), com a CART 3494 no Xime, a CART 3493 em Mansambo e a CART 3492 no Xitole.

"No meu tempo o Xime continuava muito complicado. Como descreve no seu blogue, nas estórias de um tuga [vd. 25 de Abril de 2004 > Guiné 69/71 - I: Excertos do diário de um tuga (Luís Graça)], continuamos com esta terra na cabeça, nunca mais nos sai e eu continuo buscando algo sobre aquele tempo passado relacionado com a guerra. Tenho reenviado a sua estória para colegas que estiveram na Guiné e é uma forma de dizermos que estamos vivos. Bem haja. Cumprimentos, Sousa de Castro".

Do nosso aniversariante, em jeito de homenagem, quero deixar aqui uma história, que seria também um segredo... se não tivesse sido já contada na I Série do Blogue [bd. poste de 22 de Abril de 2005 > Guiné 69/71 - VI: Memórias do Xime, do Rio Geba e do Mato Cão (Luís Graça / Sousa de Castro ). Aproveito também lhe dizer que já arranjei um capelão para a nossa Tabanca Grande... De qualquer modo, obrigado pelos seus bons ofícios... António: E que tenhas um dia feliz junto da tua família e amigos! (LG).


(...) Memórias da Guiné. Xime (1972-1974), por Sousa de Castro


"Xime. CART 3494. 10 de Agosto de 1972.

"A companhia nesse dia recebeu instruções para fazer um patrulhamento através do rio Geba em lanchas e depois entrar no mato e seguir para Mato Cão. Tínhamos lembrado ao Major de Operações que a hora que ele, major, determinara para sair, não seria ideal, já que dentro de pouco tempo passaria o Macaréu(1).

"Mesmo assim ele entendeu que haveria tempo de sair antes de passar o Macaréu. Os pelotões envolvidos nesse patrulhamento não tiveram outra alternativa senão obedecer. Os soldados, pela experiência adquirida, sabiam que uma desgraça iria acontecer. Dá-se então aquilo que todos esperavam, e que não se podia evitar: são apanhados pelo Macaréu.

"A embarcação virou e então cada qual tentou desenrascar-se como pôde do perigo de morrer afogado. Muitos não sabiam nadar. Depois com todo peso de armamento que transportavam, para além da farda que envergavam, viram-se e desejaram-se para se safarem, mas nem todos o conseguiram. Assim morreram afogados três camaradas, sendo um da Póvoa de Varzim, casado, com uma filha, outro de Famalicão, este solteiro, e um terceiro que já não me recordo de onde era.

"Nesse mesmo dia todo pessoal da companhia desdobrou-se em esforços tentando encontrar os que desapareceram. Só apareceu o de Famalicão, no dia seguinte, já em estado de começo de decomposição.

"Normalmente a companhia fazia diariamente segurança à estrada que ligava o Xime a Bambadinca. Era necessário ir buscar o pelotão que fazia essa mesma segurança. Eu era radiotelegrafista, não podia sair do quartel, mas vendo o estado muito abatido devido ao cansaço em que os transmissões de infantaria se encontravam, peguei no transmissor AVP-1 e na G-3, ofereci-me como voluntário e fui juntamente com o pelotão buscar o pessoal que fazia a segurança à dita estrada.


"Era de noite, então dá-se aquilo que eu não previa. Uma vez no local para agrupar o pessoal que fazia segurança da estrada, vi-me envolvido numa situação para mim única. Começa um forte tiroteio. Supondo ter sentido algo a mexer, eu, ao saltar da viatura, sem querer fiz um disparo, com pessoal na linha da frente. Fiquei preocupadíssimo, poderia ter atingido algum camarada meu, o que não aconteceu felizmente.

"Ao vir para o quartel, antes de entrar, o Furriel Carda, que era de Ponte de Sor (era quem comandava o pelotão que foi buscar a segurança no qual eu estava integrado) mandou parar as viaturas e disse: 'Alguém que está na minha viatura disparou um tiro. Quero saber quem foi. Ninguém quer dizer? É fácil. Cheira-se a arma de cada um e descobre-se já'.

"Como havia um alferes periquito, e a maior parte da malta pensando ter sido ele quem deu o tiro, acharam por bem que o melhor seria esquecer e ir embora para o quartel. Será que esse alferes também fez algum disparo? Ainda hoje estou na dúvida.

"Domingo 27 de Setembro 1998. Sousa de Castro". (...)

___________

Notas de L.G.:

(*) Vd. mais alguns dos postes do Sousa de Castro, na I Série do nosso blogue:

6 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXIV: Capelão, precisa-se, para tertúlia de ex-combatentes (Sousa de Castro)

10 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXXIX: Ainda a questão do bigrupo (Sousa de Castro)

9 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXI: Mansambo em 1973 (Sousa de Castro, CART 3494)

17 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLIII: Parte punho, bajuda (Sousa de Castro)

18 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXI: Um periquito da CCAÇ 12 (António Duarte / Sousa de Castro)

24 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXXII: A morte, às 6 da manhã, em Ponta Coli (Sousa de Castro, CART 3494)

25 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXXVII: Coragem, sangue-frio e desprezo pelo perigo em Ponta Coli (Sousa de Castro, CART 3494)
sábado,

Vd. na II Série:

18 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1288: Estórias de Bissau (5): saudosimos (Sousa de Castro)

(...) Sim, eu casei na tropa, antes de ir para a Guiné, e este casamento ainda dura e durará. Abdiquei do meu direito às férias na Metrópole, gozei quinze dias em Bissau, em casa de um amigo sargento de TRMS, cá da minha terra, Vila Fria. Naquela altura achava eu (e ainda acho) que não fazia sentido vir à Metrópole gozar férias. Para mim tropa era tropa até ao fim.


Se me permitem digo-vos que, apesar de tudo, gostei de andar na tropa, conforme diz a canção: Anda prá frente, mostra que és gente e sabes andar na tropa.... (...)

2 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3552: Blogues da Nossa Blogosfera (9): CART 3494, Xime e Mansambo (Dez 1971 / Abr 1974), criado pelo Sousa de Castro

Guiné 63/74 - P5467: FAP (40): Em defesa da honra da minha dama, na Op Lança Afiada (Jorge Félix)




*-

Cópia da caderneta de voo do Jorge Félix: Março de 1969 > BA 12 > Grupo Operacional >


Fotos:  © Jorge Félix (2009). Direitos reservados







1. Mensagem do Jorge Félix, ex-Alf Mil Pil, Heli Al III, BA 12, BIssalanca, 1968/70:


Assunto - Fiofioli e FAP


Caro Luis,
 

Lido o P5456, "Esta noite fomos ao Fiofioli" (*), duas notas em abono da tão mal tratada FAP. Não é o excelente texto do António Costa que tem o meu reparo, são as tuas
"Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:

15 de Outubro de 2005 >
Guiné 63/74 - CCXLIII:Op Lança Afiada (1969): (i) À procura do hospital dos cubanos na mata do Fiofioli

9 de Novembro de 2005 >
Guiné 63/74 - CCLXXXI: Op Lança Afiada (1969) : (ii) Pior do que o IN, só a sede e as abelhas

9 de Novembro de 2005 >
Guiné 63/74 - CCLXXXIII: Op Lança Afiada (1969): (iii) O 'tigre de papel' da mata do Fiofioli

14 Novembro 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXXIX: Op Lança Afiada (IV): O soldado Spínola na margem direita do Rio Corubal (Luís Graça)"

Voltamos á "Operação Lança Afiada", e pq também pedes: "Seria interessante ouvir, entretanto, o depoimento de camaradas do BCAÇ 2852 que participaram na Op Lança Afiada. ...",  cá estou. novamente
.

Julgo já ter falado nisto, mas como as tuas sugestões não vão parar à minha versão da "Lança Afiada" (**),  aqui vai para que fique associada quando se falar na dita operação.

Há um relatório:



Fonte: Extractos de: Guiné 68-70. Bambadinca: Batalhão de Caçadores nº 2852. Documento policopiado. 30 de Abril de 1970. c. 200 pp. Cap. 58-61. Classificação: Reservado (Agradeço ao Humberto Reis ter-me facultado uma cópia deste valioso documento em formato.pdf), onde sobre a FAP está escrito o seguinte:

8. Apoio aéreo

a.Ligação Ar-Terra

Foi relativamente boa.

b.Resultados da acção aérea

Não houve propriamente acção aérea se por acção aérea se pretende significar: apoio aéreo pelo fogo. Só no dia 12 de Março, o helicanhão actuou na margem oposta do Rio Corubal contra a tabanca de Inchandanga Balanta. E em 14 de Março, a FA [ Força Aérea ] bombardeou a mata de Fiofioli, não tendo as NT notado no dia seguinte quaisquer vestígios deste bombardeamento.

Não se teve conhecimento de outras acções aéreas pelo fogo.

c. Apoio aéreo

Inicialmente o apoio aéreo, no que respeita a reabastecimentos, revelou-se deficiente. O facto de não ter sido cedido o heli ao Comandante da operação, dificultou a acção de comando e influiu nos rendimentos dos meios à disposição, pois previra-se que esse heli colaboraria com o das evacuações e com o dos reabastecimentos.

Além disso, a coordenação levou o seu tempo a rodar, o que é naturalíssimo pois não tem havido muitas operações como esta.

Em terceiro lugar, os meios aéreos não deram inicialmente o rendimento que se esperava, uns por avarias, outros por serem desviados para outras missões e outros por estarem na altura das inspecções e revisões.

A situação quanto ao apoio aéreo era a seguinte em 13 de Março de 1969, às 13H45 (MSG 735/I/BCAÇ 2852):

- 1 DO estava avariado havia 2 dias;
- O outro DO só começou a trabalhar às 10H00;
- O heli trabalhava pouco mais de 1 hora, seguindo para Bissau;
- O outro heli seguira às 08H00 directo de Bafatá para Bissau (parece que podia ter ido ficar a Bissau na véspera);
- O helicanhão saira para Bissau às 10H30, só regressando no dia seguinte às 11H00;
Os helis que haviam seguido para Bissau só foram substituídos cerca das 11H00 ; só depois desta hora, portanto, se regularizou o serviço de reabastecimentos e evacuações.

No dia 13 a actividade dos meios aéreos fornecidos para a operação foi a seguinte:

- A DO levantou de Bafatá para a área 9 [ Mina – Gã Júlio ]às 07H20 com o Comandante do Agrupamento Táctico Sul, o Major Negrão da FA e o Cap Lopes que ia assumir o comando do Dest G e ficou no Xitole; à tarde foi para Bissau;

- Os 2 helis levantarm às 07H30 com o comandante da operação para Bambadinca (serviço normal);

- O helicanhão, saído da zona de operações em 11 de Março, às 10H30, e regressado a 12, às 11H00, fez escolta ao heli de Sexa Comandante-Chefe; não prestou serviço à operação, que se tivesse conhecimento;

- A DO chegou de Bissau, foi a Piche buscar o Coronel Neves Cardoso para uma reunião em Bambadincas onde chegou às 11H00; à tarde voltoiu a levar a Piche o mesmo oficial.

- A DO chegou de Bissau, foi a Piche buscar o Coronel Neves Cardoso para uma reunião em Bambadincas onde chegou às 11H00; à tarde voltoiu a levar a Piche o mesmo oficial.

Em 14 os helis chegaram a Bambadinca às 08H30 e só aqui é que se abasteceram (pelo menos um). Podiam tê-lo feito em Bafatá. No entanto, a situação melhorou por vários motivos. Primeiro, porque se acabou com os recomplementos. Segundo, porque a selecção natural fez baixar o número de evacuações. Terceiro, porque os meios aéreos ficaram mais tempo na zona da operação. Quarto, porque a coordenação ar-terra ganhou experiência e tornou-se por isso mais eficiente.
.....
c) A inicial deficiência do apoio aéreo podia ter acarretado consequências graves se o IN tivesse reagido com maior agressividade." [ o meu filho teria escrito -LOL].




Noutra altura enviei uma foto da minha caderneta de voo, dos dias em que estive envolvido na operação Lança Afiada, hoje vou redigir o que lá está e junto fotos [vd. acima].

Dia 12 de Março de 1969 Hel AlIII nº 9279 DESP- Bs-Buba-Bambadinca 2 ater 1:40 horas
Dia 12/3/09 TGER-TEVS- Bambadinca-ZOPS-Bambadinca. 5 Aterragens 1:40 horas
Dia 12/3/09 TGER-TEVS- Bambadinca-Zops-Bambadinca 2 aterragens 35 minutos.
Dia 12/3/09 TGER-TEVS- Bambadinca-Mansambo-Zops 10 aterragens 1:20 horas
Dia 12/3/09 TGER-TEVS- Bambadinca-Zops-Bambad 2 aterragem 30 minutos
Dia 12/3/09 DESP- Bambadinca- Bafata 1 aterragem 15 minutos

Dia 13/3/69 Hel AlIII nº 9275 DESP Bambadinca -Bissau 1 aterrag 50 minutos
Dia 13/3/69 Hel AlIII nº 9279 DESP Bafata Bambadinca 1 aterrag 15 minutos
Dia 13/3/69 TGER- TEVS-Bambadinca- ZOPS (3x) 10 aterrag 1:45 Horas
Dia 13/3/69 TGER-Bambadinca-Zops- Bambadinca 2 aterrag 30 minutos
Dia 13/3/69 TGER Bambadinca ZOPS-Bambadinca 2 aterragens 25 minutos
Dia 13/3/69 TGER Bambadinca-ZOPS-Bafatá 10 aterragens 1:50 horas

Dia 14/3/69 Hel AlIII 9276 AESC Bafatá-Bambadinca-Zops 4 aterragens 2:10 Horas

Dia 15/3/69 Hel AlIII 9279 TEVS- Bafatá-Bambadinca-BS 3 aterrag 1:25 Hora
Dia 15/3/69 DESP-Bs- Bambadinca 1 aterrag  45 mint
Dia 15/3/69TGER-TEVS Bambadinca-Zops 16 aterragens 2:20 Horas
Dia 15/3/69 TGER-TEVS Bambadinca-Zops 10 aterrag  2:oo horas
Dia 15/3/69 DESP Bambadinca-Bafatá 1 aterrag 15 minutos

Dia 16/3/69 DESP Bambadinca Bafatá Bambadinca 2 aterrag 2:00 Horas
Dia 16/3/69 Av DO27 3470 DESP Bamb-Bafat-Bambadinca 2 aterragens 30 minutos

Dia 18/3/69 AlIII 9276 TMAN BS Zops (2x) BS 5 aterg 45.

(esta operação no dia 18 já não é em Bambadinca, e o voo em DO27 foi talvez de apoio ás Forças terrestes, navegação, orientação pelo ar.)

Entre os dias 12 e 16 de Março voei 23:00 Horas na ZOPS da operação Lança Afiada.

Depois de comparar o registrado na minha caderneta tenho que concluir que o relatorio "Batalhão de Caçadores nº 2852" [Bambadinca, 1968/70], acerca da Operação Lança Afiada, tem muitas inverdade que desta vez não vou destacar. Julgo que basta o testemunho da minha participação para verificar quanto de exagero há na apreciação á prestação das FAP naquela operação.

Quando se falar da Operação Lança Afiada, gostaria que juntasses as informações que te enviei, e estou convencido que não fui o ínico a voar para a Lança Afiada.
A FAP não necessita da minha defesa, mas sinto necessidade de a defender.

(...) Caro Luis,  recebe os Votos de um Bom Natal que são extensivos a todos os "Tertulianos". Jorge Félix

(quando reli o email passei os olhos pela foto junta e lembrei que no dia 7 de Março com base em Catií fui alombar ao Quitafine ond haviam quatro anti-aéreas. No dia 5 passei por Buba e Zops, e para terminar, entre dois whiskies fui no dia 1 a Aldeia Formosa fazer uma TEVS. Hoje vou sonhar com Fiofioli em cor de rosa)


2. Comentário de L.G.:


Como te disse, Jorge, o relatório tem a chancela do então Cor Hélio Felgas, já falecido como Maj Gen Ref. Tem ‘picardias’ em relação à FAP; transcrevi o relatório; agora é altura de acrescentarmos outros depoimentos como o teu… Houve 110 evacuações… Imagino a tua trabalheira… (***)
_______________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 13 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5456: Memórias de um Capitão (António Costa) (1): Esta noite fomos ao Fiofioli

(**) Vd. poste de 28 de Fevereiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2592: Voando sob os céus de Bambadinca, na Op Lança Afiada, em Março de 1969 (Jorge Félix, ex-Alf Pil Av Al III)


(***) Iniciada em 8 de Março de 1969 com a duração de 11 dias, a Op Lança Afiada foi uma das grandes operações que se realizaram na época , ainda no início do consulado do brigadeiro António Spínola (1968-73), um mês depois da trágica retirada de Madina do Boé, em 6 de Fevereiro de 1969.

A Op Lança Afiada envolveu cerca de 1300 homens, entre militares, milícias e carregadores. Houve cerca de duas dúzias e meia de flagelações das NT por parte dos guerrilheiros, os quais no entanto se furtaram ao contacto directo. As populações sob controlo do IN no triângulço Xime-Bambadinca-Xitole passaram, com alguma segurança, para o lado do rio Corubal. Os fuzileiros não puderam ou quiseram participar nesta operação, que também não envolveu outras tropas especiais (comandos e páras). Foi, pois, uma operação só com tropa macaca, embora a nível de regimento, sendo comandada por um coronel (Hélio Felgas). Quase um terço dos efectivos eram carregadores.

Pensava-se que em Mina, junto ao Rio Corubal, estaria sedeado o Comando do Sector 2, da estrutura político-militar do PAIGC. Pensava-se também que havia um grande hospital, com médicos e enfermeiras... cubanos!

Do ponto de vista militar, a operação foi um bluff... Em contrapartida, houve inúmeras evacuações (n=110) dos nossos combatentes, devido a problemas de desidratação, desnutrição, esgotamento físico e stresse psicológico... É interessante a análise do autor do relatório sobre os sucessos e os insucessos desta megaoperação de...limpeza.

Tratando-se de uma fotocópia de um documento dactilografado e possivelmente policopiado a stencil, com data de 1970, há erros e omissões [no relatório, de que se publicam alguns excertos] que eu procurei colmatar ou corrigir, sempre que possível. Também substituímos algumas abreviaturas para tornar o texto mais legível para os paisanos ou os que não fizeram tropa nem estiveram na Guiné.

A Op Lança Afiada foi talvez uma das maiores e mais dramáticas operações terrestres que se realizou na Guiné, ou pelo menos na Zona Leste, quer pelo número de efectivos envolvidos (cerca de 1300 homens, sendo cerca de 800 militares mais 380 carregados, enquadrados por 100 milícias), quer pelo número elevado de heli-evacuações (mais de 100), devido não tanto a baixas provocadas pelo IN como sobretudo a casos de fadiga extrema, insolação, doença e ataque de abelhas.

Esta operação, em que as NT varreram toda a região da margem direita do Rio Corubal, entre este rio e a linha Xime-Xitole, durante 11 dias (de 8 a 19 de Março de 1969), teve um impacto mais psicológico do que militar, apesar da destruição de importantes meios de vida e infra-estruturas, necessários à guerrilha e às populações sob o seu controlo (animais domésticos, arroz, casas, escolas, hospitais de campanha...).

Esta operação pôs à prova (e revelou os limites de resistência, física e psicológica, de) os militares portugueses, num terreno e num clima duríssimos. Basta citar uma das conclusões do relatório, que temos vindo a publicar:

"A Op Lança Afiada decorreu durante 11 dias. As temperaturas verificadas neste período foram as seguintes: Máxima à sombra – Entre 39 e 43,6 graus centígrados; Máxima ao sol – Entre 70 e 74,5 graus centígrados. Estes números são elucidativos. Por um lado justificam que um homem necessite muita água (entre 8 a 10 litros por dia). Por outro lado aconselham as NT a deslocarem-se e a actuarem ou de noite ou ao amanhecer. Entre as 11 e as 16h, o melhor é parar, se possível à sombra".


O próprio autor do relatório não se coibe de comentar: "(...) processava-se a selecção natural: os mais fracos não resistiam à fadiga, ao calor e à deficientíssima alimentação proporcionada pelas rações de combate tipo normal. Por outro lado a falta de água era um tormento que só quem já sofreu pode avaliar".

As forças que entraram, vitoriosas, em Fiofioli, no dia 15 de Março de 1969, constituíam o Agrupamento táctico sul, baseado no Xime e comandado pelo Ten Cor Jaime Tavares Banazol: Dest F > CART 2339 (Mansambo); Dest G > CCAÇ 2405 (Galomaro); Dest H > CART 2413 (Xitole); Dest I > CCAÇ 2406 (Saltinho).

Recorde-se que a companhia de Galomaro, a CCAÇ 2405, pertecente ao BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70),  tinha justamente acabado de sofrer, em 6 de Fevereiro de 1969, a perda de 17 homens, na trágica travessia do Rio Corubal, em Cheche, aquando da retirada das NT em Madina do Boé.

Por sua vez, o Agrupamento táctico norte, baseado no Xitole e comandado pelo Ten Cor Manuel M. Pimentel Bastos, era constituído por: Dest A > CART 2338 ; Dest B > CART 1746 (Xime); Dest C > CART 1743 ; Dest D > CCAÇ 2403 (Fá Mandinga).

O comandante da força era o Coronel Hélio Felgas (já falecido como Maj Gen, conhecido especialista em questões geopolíticas africanas, e na já na altura autor de um livro sobre "A guerra da Guiné", de 1967, comandante do comando operacional de Bafatá - no meu tempo era o COP 2-, mas que, segundo creio, não morria de amores por Spínola).

É extenso o relatório da Op Lança Afiada em que, durante 11 dias, de 8 a 19 de Março de 1969, a região delimitada pela margem direita do Rio Corunal e a linha Xime-Xitole foi palco de uma orgia de fogo e de destruição de todos os meios de vida encontrados pelas nossas tropas: arroz, porcos, vacas, galinhas, escolas, livros, cadernos, hospitais, tabancas, moranças... 

A Lança Afiada foi sobretudo a maior "churrascada" que alguma vez se fez na Guiné, durante a guerra colonial: tudo o que era porco, leitão ou galinha foi consumido, in loco, pelos esfomeados tugas que deitaram fora as suas intragáveis rações de combate...

A realização de uma operação desta envergadura era justificada pelo facto de a região ser "considerada uma zona de refúgio e preparação do IN": a profundidade continental da região, a sua espessa arborização (excepto na franja marginal do Rio Corubal), a falta de trilhos e caminhos, a grande distância a que ficam os aquartelamentos mais próximos (Xime, Mansambo e Xitole), eram apontadas pelos especialistas militares como as principais razões da existência, permanência e "relativa tranquilidade" (sic) da guerrilha do PAIGC na região, praticamente desde o princípio da guerra, em 1963.

E foi com relativa ordem, calma e segurança que o o PAIGC conseguiu, antes da chegada das NT, transferir para a margem esquerda do Rio Corubal as populações (balantas e beafadas) que viviam sob o seu controlo e administração, enquanto as NT lançavam o seu cilindro compressor sobre este, até então, santuário do IN (região libertada, na terminologia do PAIGC)...

No relatório, não se esconde o número e a importância das tabancas que viviam sob a bandeira do PAIGC, fora portanto do controlo da "soberania portuguesa", em pleno coração da Guiné, ao longo da parte superior do Rio Corubal: Ponta Luís Dias, Mangai, Tubacutá, Mina, Cancodea, Satecuta, Fiofioli... Nunca se dão números sobre as populações, mas a leitura do relatório sugere-nos uma ideia da sua grandeza:

(i) "Os Dest A e B aproximaram-se de Tubacutá (área 5). Durante a noite anterior ouviram um motor dum barco fazendo travessias do Rio Corubal na região entre Queroane e Fiofioli. O movimento durara desde as 19H00 do dia 12 e as 4H00 do dia 13";

(ii) "Os Dest C e D continuaram destruindo a enorme tabanca de Ponta Luís Dias, com uma grande escola onde havia muitos livros e cadernos";

(iii)"Por seu lado, o Dest C, às 7H30, destruíra cinco canoas em local com indícios de ter tido grande movimento durante a noite";

(iv) "Os Dest C e D atacaram a enorme tabanca de Mangai, também recém abandonada, tendo começado a destruir as moranças, muitas toneladas de arroz e centenas de animais domésticos (incluindo vacas)";

(v) "Os Dest F e G avançaram sobre Cancodea Balanta enquanto os Dest H e I passaram para Candodea Beafada. Todos capturaram e consumiram (sic) centenas de animais domésticos, começando também a destruir as 2 tabancas (onde havia escolas importantes e grande quantidade de arroz";

(vi) [No Fiofioli] o Hospital antigo surgiu pouco depois com as suas enfermarias separadas para homens e mulheres, quarto dos médicos cubanos, banco, etc.";

(vii) "Batida a mata, desceu-se à tabanca de Fiofioli, recém abandonada, dispondo de bons edifícios e 2 escolas com imensos livros e cadernos"...

Constata-se também a enorme diferença do esforço que era pedido à tropa-macaca, por comparação com as forças especiais (que, estranhamente, não participaram nesta operação)... Por outro lado, os meios aéreos eram escassos e a descoordenação parecia ser  grande...

Os resultados finais acabavam por ficar aquém das expectativas dos responsáveis militares e não justificar o emprego de meios tão vultosos e caros: 5 guerrilheiros mortos (confirmados), "17 nativos capturados, na sua maior parte mulheres" (sic), para além da apreensão de material de guerra (muitos milhares de munições de armas ligeiras) e da destruição das tabancas abandonadas...

Só numa viagem de duas horas, o helicóptero gastava tanto (30 contos) como os vencimentos mensais dos quatro alferes de uma companhia... Ora nesta operação, para além dos reabastecimentos periódicos de água (absolutamente vitais), os helicóperos tiveram que fazer 110 evacuações (por ferimentos em combate, mas sobretudo insolações, ataques de abelhas, stresse, doença), para além das viagens de regresso com os recomplementos (oficiais, sargentos e prças que vieram substituir os camaradas evacuados)...

Não admira, por isso, que esse tipo de operação de limpeza acabe por ser abandonada pela equipa de estrategas de Spínola. Tinha, além disso, uma grande impacto negativo na população nas "regiões libertadas": afinal de contas, eram elas as grandes vítimas destas "operações de limpeza"... As crianças, as mulheres e os idosos, cujo apoio era preciso conquistar... através da acção psico-social e não do terror.

Isso talvez explique por é que do outro lado do Rio Corubal, na margem esquerda, não havia forças emboscadas ou prontas a intervir para cortar a retirada do IN, acossado pelos tropas envolvidas na Op Lança Afiada... O autor do relatório, visivelmente incomodado e até irritado, refere-se várias vezes a este "buraco na rede", consentido (ou até querido) por Bissau... No preâmbulo do relatório pode ler-se:

"O IN sabe que detecta facilmente qualquer tentativa de aproximação das nossas Forças Terrestres. Se a aproximação terrestre é difícil, a actuação das FN [Forças Navais] parece facilitada pela existência do Rio Corubal. E a tal ponto que, em estudo realizado por este Comando, a área da margem direita do Rio Corubal, desde a Ponta do Inglês a Cã Júlio, foi considerado uma área que devia ser batida pelas NT em operação conjunta de meios navais e helitransportados"...

Ora, o que o Coronel Hélio Felgas não conseguiu fazer foi essa grande operação conjunta de forças terrestres, navais e helitransportadas, que bem poderia ser a cereja no bolo da sua carreira militar... Regressadas as NT aos quartéis, no dia 19 de Março de 1969, o Rio Corubal lá continuou "interdito", como dantes, à nossa navegação...

Eu, pelo menos, no período em que andei por aquelas bandas (Julho de 1969/Fevereiro de 1971) nunca lá tomei banho e todas as vezes que nos aproximámos das suas margens fomos corridos a tiro, morteirada e roquetada... E a nossa valente marinha de guerra também nunca lá mais voltou a pôr uma lança de desembarque (grande, pequena ou média...).

Em Abril e Maio de 1969, a guerrilha mostrava de novo os dentes, no triângulo Xime- Bambadinca - Xitole ), pondo os oficiais superiores do BCAÇ 2852 à beira de um ataque de nervos... Dois meses depois da Op Lança Afiada, era a própria sede do sector L1, Bambadinca, que era atacada em força, durante 40 minutos, pela primeira e única vez durante toda a guerra...

Foi, obviamente, uma resposta taco a taco. As consequências também foram mais psicológicas do que militares. Mas não deixaram de ter implicações nas carreiras dos militares do quadro que detinham o comando do BCAÇ 2852, os quais foram todos (ou quase todos) punidos por Spínola e despachados para casa, por alegada incompetência... (Sobre esta "flagelação", o documento sobre a história do BCAÇ 2852 dedica aopenas 3 linhas telegráficas, em contraste com as dezenas de páginas escritas sobre a Op Lança Afiada)...

De qualquer modo, não deixa de ser curiosa, deliciosa mesmo, e até reveladora de alguma familiaridade com a literatura maoísta da época (!), a expressão usada pelo autor do relatório, quando conclui, com ar triunfal, depois da conquista do Fiofioli no Dia D + 7 (15 de Março de 1969) o seguinte: "o mito do Fiofioli desaparecera na mentalidade dos nossos soldados. A mata do Fiofioli fora um tigre de papel"!...

A operação, comandada pelo coronel Hélio Felgas (o patrão do Agrupamento 2947, mais tarde comando operacional de Bafatá, COP 7, se não me engano), coadjuvado por dois tenentes-coronéis, Jaime Banazol (liderando o Agrupamento Táctico Sul, com mais de 500 homens que partiram do Xitole e de Mansambo) e Manuel Pinto Bastos (comandante do BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70), que encabeçava o Agrupamento Tático Norte (com cerca de 750 homens, que partiram do Xime). Ao todo 1300, entre soldados metropolitanos, milícias e carregadores...

Foi uma das últimas grandes "operações de limpeza", realizadas no primeiro ano de Spínola, enquanto Governador Geral e Comandante-Chefe (que fez questão de estar presente, junto das NT, no Dia D + 9, ou seja, 17 de Março de 1969, partilhando inclusive o transporte naval que levou os nossos esgotadíssimos camaradas da Ponta Luís Dias à Ponta do Inglês, no regresso ao Xime.

Apesar dos elevados meios humanos e materiais envolvidos, a correlação de forças não se modificou e, depois de um rápido processo e reorganização, a guerrilha voltava a obrigar as NT a acantonarem-se nos seus aquartelamentos onde flutuava a bandeira verde-rubra (Bambadinca, Xime, Mansambo e Xitole) e destacamentos dispersos. A população civil, sob a administração do PAIGC, terá sido a grande vítima desta megalómana e descoordenada operação.

Os soldados portugueses serviram, por sua vez, de cobaia num teste de resistência, a que o autor do relatório, sem despudor, chama processo de "selecção natural" (sic)... Num total de 700 e tal homens metropolitanos (o resto eram milícias e carregadores, habituados às duras condições do terreno), conclui-se que um sétimo fora mal seleccionado para o TO da Guiné, já que no decorrer da operação teve de ser evacuado, de helicóptero, por "insolação, ataque de abelhas e doença" (sic).

É o próprio relatório a reconhecer que, nesta época (tempo seco), as temperaturas andarvam entre os 39 e os 44 graus, à sombra, e entre os 55 e os 70º ao sol, e que nesas condições, (i) a guerra tinha que parar das 10 da manhã às 16h da tarde, precisando um soldado metropolitano de 8 a 10 litros de água (!)...

Nesta operação em que os guerrilheiros e a população por eles controlada passaram simplesmente para o outro lado do Rio Corubal (com os cães, os porcos, as galinhas...) (não havia páras, comandos nem fuzos do outro lado...), o verdadeiro inimigo das NT foi, de facto, a desidratação, além dos problemas alimentares: o tipo de rações que deram aos nossos soldados (a ração dita normal) era tão má que provocava uma sede horrível: ao segundo dia, já não se comia; ao terceiro, começava a haver problemas...

Tratou-se de uma operação onde se foi a lugares míticos, como a mata do Fiofioli, junto ao Corubal, mas ninguém encontrou médicos e enfermeiras cubanas... Hospitais de campanha, sim, mas já abandonados, uns meses antes. Destruiram-se muitas toneladas de arroz, mataram-se milhares de animais, queimou-se tudo o que era tabanca e culturas... Em contrapartida, houve 24 flagelações do IN, mas os guerrilheiros seguiram as regras da guerrilha: retirar quando o inimigo, ataca: atacar, quando o inimigo retira... O autor do relatório, irritado, queria que os tipos do PAIGC se apresentasse de peito feito às balas e dessem luta...

O mais caricato e divertido desta operação é que o pessoal deitou fora as rações de combate e desatou a comer leitão assado no espeto!

Este é um cínico relato da dura condição da guerra da Guiné, vista pelo lado dos tugas. Por outro lado, há críticas veladas, do autor do relatório, ao Comandante-Chefe, ao Quartel General e à Força Aérea (que se teria comportado como uma verdadadeira prima dona, segundo Hélio Felgas, que não esconde a sua irritação e frustração...).

Há coisas, pouco abonatórias paras as NT, que se passaram neste operação e que eu deixo à atenção e consideração dos tertulianos e demais visitantes deste blogue. Cada um de vós que faça a sua leitura desapaixonada... Aqueles de nós, que foram operacionais, rever-se-ão mais facilmente no cenário que foi o da Op Lança Afiada... Sobre o desempenho dos actores, já não vale a pena assestar as baterias da crítica... Felizmente que a guerra acabou! War is over, baby!

Para uma correcta localização das povoações ao longo da margem direita do Rio Courbnal, consulte-se o mapa, dos Serviços Cartográficos do Exército, relativo ao Xime, disponibilizado, mais uma vez, pelo nosso amigo e camarada Humberto Reis, ex-furriel miliciano da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71). O mapa do Xime deve ser complementado por outros como Fulacunda, Xitole e Bambadinca, também disponíveis on line.

Deixem-me só lembrar que, dois meses depois desta operação, o PAIGC retribuiu a visita das NT e apareceu às portas de Bambadinca em força: mais de 100 homens, três canhões sem recuo, montes de LGFoguetes, morteiros... Esse ataque ficou célebre: a malta de Bambadinca foram apanhados com as calças na mão, faziam quartos de sentinela sem armas; enfim, um regabofe... Claro que no dia seguinte o Caco Baldé deu porrada de bota a baixo, nos oficiais todos, do tenente-coronel (o célebre Pimbas) até ao capitão da CCS...

Um caso exemplar, divertido e hilariante, da guerra da Guiné... A sorte dos nossos camaradas de Bambadinca foi os canhões s/r terem-se enterrado no solo e a canhoada cair na bolanha... Quando nós, periquitos da CCAÇ 2590 (futura CCAÇ 12), lá passámos, uma semana depois, vindos de Bissau e do Xime a caminho da nossa estância de férias (Contuboel, um mês e meio de paraíso... seguido depois de 18 meses de inferno...quando fomos justamente colocados no Sector L1), os nossos camaradas da CCS do BCAÇ 2852 ainda estavam sem pinga de sangue...
- Podíamos ter morrido todos - dizia-me 1º cabo cripto Agnelo Ferreira, da minha terra, Lourinhã...

Fomos depois nós, para lá, com os nossos nharros  [fulas], e em 18 meses nem um tirinho (em Bambadinca): que o respeitinho (mútuo) era muito bonito... Porrada, porrada, era só quando a gente se atrevia a meter o bedelho na terra deles, que já estava "libertada"... Eu faria o mesmo, na minha terra...

Na história do BCAÇ 2852, o ataque a Bambadinca é dado em três linhas, em estilo telegráfico: "Em 28 [de Maio de 1969], às 00H25, um Gr In de mais de 100 elementos flagelou com 3 Can s/r, Mort 82, LGF, ML, MP e PM, durante cerca de 40 minutos, o aquartelamento de Bambadinca, causando 2 feridos ligeiros".

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5466: Álbum fotográfico de Rui Baptista, ex-Fur Mil da CCAÇ 3489/BCAÇ 3872





1. Álbum fotográfico de Rui Baptista* (ex-Fur Mil da CCAÇ 3489/BCAÇ 3872, Cancolim, 1971/74), elaborado com fotografias mandadas em mensagem de 30 de Novembro de 2009:




Álbum fotográfico de Rui Baptista (I)

Foto 1 > Aquartelamento de Cancolim

Foto 2 > Aquartelamento de Cancolim

Foto 3 > Parada de Cancolim


Foto 4 > O pombal na parada de Cancolim (alguns pombos serviram de petisco)

Foto 5 > Apresentação do Batalhão ao ComChefe (Gen Spínola) – Em primeiro plano o Alf Mil Rosa Santos (26-12-71) falecido há pouco tempo.

Foto 6 > No Cumeré na passagem de ano (1-1-1972) – à frente o alferes que nos abandonou e primeiro da última fila o capitão que também se foi.

Foto 7 > Trajando à civil para esquecer a guerra (oficiais e sargentos em 23-09-73) – sentado: Fur Mil Oliveira – 1.ª fila da esquerda para direita: 1.º sarg Romana, Fur Mil Correia (Rodinhas), Fur Mil Silva (Russo), eu, Capelão da CCS, Fur Mil Silva, Fur Mil Peixoto, Alf Mil Andrade, em cima também da esquerda para a direita: Fur Mil Santos, Alf Mil Videira, Alf Mil Oliveira, Fur Mil Conde, Fur Mil Gaspar, Fur Mil Ferreira e Fur Mil Jacinto.

Foto 8 > Um posto de sentinela em Cancolim

Foto 9 > O Fur Mil Jacinto e eu junto do famoso pombal de Cancolim

Foto 10 > "Os Vingadores" (2.º Pelotão da CCaç 3489) prontos para uma patrulha. Ficámos com este nome porque quase sempre nos tocava ir em busca do IN após os ataques ao aquartelamento

Foto 11 > Mais uma partida para o mato dos Vingadores em 15-04-72 após uma flagelação a Cancolim à hora do almoço

Foto 12 > Saída para o mato dos Vingadores para mais uma patrulha

Foto 13 > Segurança à picada entre Cancolim e Sangue Cabomba

Foto 14 > Preparação para uma coluna a Bafatá (parte do 2.º Pelotão)

Foto 15 > O estado em que ficou a viatura que caiu numa mina em 14-08-72 na picada no regresso de Bafatá a Cancolim (deixou-me 40 dias, todo partidinho, no HM 241 de Bissau – além de mim tivemos mais 16 feridos entre eles dois camaradas que tiveram de ser evacuados para o HMP de Lisboa)

Foto 16 > Abrigo da população na orla da mata para espantar os macacos por altura da colheita da mancarra

Foto 17 > O último dia em Cancolim (na parte de cima da foto pode ver-se alguns dos RPG que caíram na parada de Cancolim durante a flagelação ao aquartelamento em 20-01-74 (a única vez que fomos atacados logo de manhã)

Foto 18 > Eu junto ao rio Geba à espera da LDG para Bissau

Foto 19 > O último dia em Bissau antes do regresso à Metrópole

Foto 20 > O Fur Mil Gaspar, o Alf Mil Andrade e eu na escala que o Niassa fez no Funchal no regresso a Lisboa
__________

Nota de CV:

(*) Vd. poste de 3 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5400: Tabanca Grande (192): Rui Baptista, ex-Fur Mil da CCAÇ 3489/BCAÇ 3872, Cancolim, 1971/74

Guiné 63/74 - P5465: Blogpoesia (60): Memórias da Escola Prática de Infantaria, Mafra e Macau (António Graça de Abreu)


China > Setembro de 2009 > Com a minha mulher Hai Yuan e os meus filhos João e Pedro, num restaurante em Xangai






China > Agosto de 2009 > Com a minha mulher Hai Yuan em Zhouzhuang, província de Jiangsu.





China > Agosto de 2009 > com actores da ópera de Pequim, em Yangzhou, província de Jiangsu.





China > Macau > Junho de 2009 > No Largo do Leal Senado, em Macau.


Fotos e legendas: © António Graça de Abreu (2009). Direitos reservados


1. Mensagem,  de 10 de Novembro, do nosso amigo e camarada António Graça de Abreu, ex-Alf Mil, CAOP1, Teixeira Pinto, Mansoa, Cufar, 1972/74; especialista em cultura chinesa, tradutor de clássicos da poesia chinesa, autor de Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura (Lisboa: Guerra e Paz, 2007).


Blogopoesia - Memórias da Escola Prática de Infantaria, Mafra e Macau


 No dia 27 de Junho de 2009, acabadinho de chegar de Macau e já então a fazer a mala para nova viagem, agora até Xangai, Pequim e arredores, fui um dos quase dois mil convidados presentes num encontro e opíparo almoço no convento de Mafra oferecido pelos antigos governadores de Macau a todos quantos haviam trabalhado e vivido na velha cidade sino-portuguesa na foz do rio das Pérolas.


Por acaso, nunca vivi em Macau, sempre em Pequim e Xangai, mas tenho trabalhado, e muito, para e por Macau. Daí o convite. Comemoravam-se os dez anos da entrega à China do último pequeníssimo - mas rendoso  - bastião do Império.


 Solitário entre tanta gente, reencontrei os espaços tão conhecidos ao longo dos anos por muitos de nós, a parte militar do convento, ou melhor a Escola Prática de Infantaria nele integrada,  onde, em 1970 e 1971, passei seis meses de vida no COM (Curso de Oficiais Milicianos) como soldado cadete do 1º. e 2º. Ciclo, recruta e especialidade (Atirador de Infantaria).


Depois, em 1972 veio a Guiné...


Nesse dia de Junho de 2009, fui anotando num papel ideias e frases a utilizar num poema. Só agora o consegui concluir. Primeiro, três versos apenas, uma espécie de haiku, aqueles brevíssimos poemas japoneses com apenas dezassete caracteres, assim:


Magia em Mafra.
Sem vento
um convento oscila ao vento.
  
Em seguida, um poema mais extenso, deste modo:


 Dois lustros depois do fim de Macau,
efeméride faustosa no convento de Mafra.
Um almoço, mil iguarias,
governadores, embaixadores, amigos,
oportunistas, gente boa, lambe-botas,
mosaico das gentes do mundo.
Regresso ao mosteiro onde vivi há quatro décadas,
não na serena contemplação de Deus,
mas para o exercício das artes da guerra.
O mesmo sol nos jardins de buxo,
os mesmos chafarizes de mármore velho,
os mesmos corredores, as mesmas abóbadas, 
os mesmos nomes, La Couture, Vimeiro, La Lys,
as mesma mesas no mesmo refeitório de frades,
os mesmos  cheiros, a mesma humidade fria.
Depois de Mafra, guerreiro nas franjas do Império,
a gesta, a loucura, uma Guiné em fogo.
Rolaram os anos e veio a China, 
 envolta na bruma de todos os mistérios,
e veio Macau, agasalhando tanto desvairo de mim.
Hoje, um pouco antes do fim,
recolhimento solitário na capela do convento
e, nos Sete Altares vazios,
um cântico, uma prece ao Senhor do Céu.


 António Graça de Abreu