quinta-feira, 11 de março de 2010

Guiné 63/74 - P5974: Ao correr da bolha (Torcato Mendonça) (3): O velho picador, Seco Camará

1. O Velho Picador, mais um texto para a nova série Ao correr da bolha, enviado por Torcato Mendonça (ex-Alf Mil da CART 2339, Mansambo, 1968/69), em mensagem do dia 2 de Março de 2010:


Ao Correr da Bolha - III

O Velho Picador


Vi num “Poste” uma foto do velho Seco Camará. Senti saudades dele. Senti saudades de ter menos quarenta anos e, com ele e um grupo, voltarmos a ir ao Poidom, a fazer as “operações” de outrora, parando em “grande alto” para descansar e comer a ração. Diria então o velho Seco, caso a ração dele fosse contemplada com polvo ou lulas:
- Alfero,  rabo de rato, troca pelas tuas sardinhas.

Eu ria e trocava. Comíamos e conversávamos e eu com ele ia aprendendo, não a arte da guerra, mas só a guerra naquele bocado da Guiné que ele, velho mandinga, conhecia como a palma de suas mãos.

Há quantos anos? Desde o inicio, há cinco ou seis anos atrás. Que pensaria ele de nós que íamos e vínhamos à cadência de um ou dois anos? Não sei. Era um velho guerreiro, colaborador das NT ou Nossas Tropas. Morreu, talvez menos de dois anos depois, nem tanto. Voou para o Paraíso dos Mandingas, o velho Seco Camará.

Antes a morte em combate que teve, do que o abjecto e cobarde pelotão de fuzilamento dos libertadores. Quantos amigos meus, como o Seco, passaram por isso?! Quantos? Homens que foram auxiliares das NT e ingloriamente assim desapareceram.

Que fariam eles, durante a guerra, se não andassem connosco? Iam para a guerrilha. Mesmo estando connosco,  quantos em nós acreditariam? Quantas reservas poriam à nossa actuação, à nossa presença e, se colaboravam, quantos não o faziam contrariados com certos militares nossos.

Lembro aqui o caçador Lhavo. Homem grande, olhar e porte altivo, vestimenta muçulmana. Era o meu guia preferido. Não facilitava os pedidos para colaborar. Lembro que foi ele a encontrar o acampamento do Mamadu Indjai. Não queria ir. Naquele fim de tarde falei com ele pausadamente, o Capitão afastado a observar e o Lhavo a entender o que eu lhe dizia. Depois olhou-me e calmamente disse:
- Amanhã ao nascer do Sol vem a Afiá, agora vai para Candamã.

Assim foi feito e com bons resultados.

O Lhavo uma vez ficou aborrecido comigo. Regressávamos da [Op] Lança Afiada, manhã a nascer,  e avistamos uma vaca de mato. Ele queria atirar. Fiz-lhe sinal que não. Baixou a arma e já em Mansambo disse-lhe o porquê. Compreendeu e apertamos as mãos. Talvez se tenha aí cimentado mais a nossa amizade.

Esta gente das Tabancas é que para mim foi, e ainda hoje é, o Povo da Guiné.

Um outro homem diferente mas por quem tinha amizade, o António Bonco Balde, régulo em Candamã, Alferes de 2º Linha (nunca o vi vestido de militar), homem criado numa Missão, empregado em Bissau e regressado a Candamã após a morte do pai. Homem de múltiplos saberes e com ele aprendi muito. Miúdo alferes de 23 anos e Fula, talvez, de quarenta e…homem bom.

Só um breve episódio.

Estava com o meu grupo em Candamã e Afiá, tabancas em auto defesa. Um dia de Afia informaram que faltavam muitos homens. Já sentíramos isso em Candamã. Falamos com o Régulo António Bonco. Ele disse já saber e que eu tinha que compreender. Os “tchãos” não davam o suficiente para alimentar as famílias. Conversamos bastante e agora resumo em breves palavras. Dizia ele:
- Os homens vão para a apanha da mancarra no Senegal. O pior é que quem os leva,  ganha dinheiro, quando regressam quem lhes faz o câmbio ganha dinheiro e eles nem metade do que ganharam trazem.

Fiz um relatório sobre essa exploração, os lucros de comerciantes sem escrúpulos, o silencio da Administração e, se as Informações militares de nada sabiam…ou sabendo…até porque assim cada vez se desguarnecia mais a defesa das tabancas. O Régulo fez questão de assinar também. Foi o relatório enviado à Companhia, o Capitão levou ao Batalhão e este ao Agrupamento.

Sempre se passou algo mas depois fez-se silêncio. Antes do silêncio foram-nos entregues sacos de arroz para distribuir, equitativamente, pela população. Assim não se resolve nada,  dizia o Régulo e eu… história encurtada, inacabada e a merecer tratamento duro nesse tempo.

Quem aos inimigos, perdoa às mãos… pois!

Curiosamente, dizem, se bem me lembro, que o Comandante do BCaç 2852 e um Capitão foram molestados, digamos assim, após o ataque a Bambadinca. Os civis ou a administração civil teria algo a ver com isso? Certamente que não! E que interessa isso agora? Nada!

Será que os homens das tabancas continuam a serem explorados? Certamente que não!
__________

Nota de CV:

Vd. primeiro poste da série de 9 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5958: Ao correr da bolha (Torcato Mendonça) (2): SPM 4758

Guiné 63/74 - P5973: Memória dos lugares (74): Fotos de Bedanda (Vasco Santos, 1º Cabo Op Cripto da CCAÇ 6, Bedanda - 1972/73)





1. O nosso Camarada Vasco Santos, ex-1º Cabo Op Cripto da CCAÇ 6, Bedanda - 1972/73 -, com data de 10 de Março de 2010, algumas das fotos do seu álbum de memórias:



Bedanda
Memórias

Eu, com o meu amigo Filipe (de Transmissões). Esta foto era uma daquelas que enviávamos para o jornal “A Voz da Guiné”, a fim de ali serem publicadas, pois havia um apartado reservado para os "castiços" das companhias. A foto destinava-se a ser impressa com a legenda: “Os castiços de Bedanda”.

Aqui estou eu e o nosso querido amigo, Dr. Mário Bravo. Pode ser que agora ele se lembre de quem é o cripto que está na primeira foto publicada no poste P5801 (da sua autoria), em 11 de Fevereiro de 2010.

A equipa de futebol de praças (Bedanda 15FEV1972)

Eu, na Tabanca, com a tia Djaló, avivando memórias para que alguns ex-Camaradas possam relembrá-la.

As bajudas de Bedanda (1972).
Um abraço,
Vasco Santos
1º Cabo Op Cripto da CCAÇ 6

Emblema da colecção pessoal: © Carlos Coutinho (2010). Direitos reservados.___________
Notas de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

11 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5801: Memória dos lugares (69): O isolamento de Bedanda (Mário Silva Bravo, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 6, Bedanda, 1971/72)

Guiné 63/74 - P5972: Fajonquito do meu tempo (José Cortes, CCAÇ 3549, 1972/74) (3): O Cap Patrocínio, a CCAÇ 15, dois casos de insubordinação e ainda o Cherno Baldé


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Fajonquito [, mapa de Colina do Norte]> CCAÇ 3549 (192/74) >  Casa Gouveia (onde trabalhava o pai do Cherno Baldé), com a casa dos oficiais de que ele  fala na sua narrativa.



Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Fajonquito > CCAÇ 3549 (192/74) > Povoação de Fajonquito.



Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Fajonquito > CCAÇ 3549 (192/74) > Rua principal de Fajonquito.




Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Fajonquito >  CCAÇ 3549 (192/74) > Eu com o filho mais novo da Cristina, lavadeira, a mais popular dentro do aquartelamento.


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Fajonquito > CCAÇ 3549 (192/74) > Eu e o Alaje, espero que o Cherno  Baldé consiga dizer do paradeiro dele.




Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Fajonquito > CCAÇ 3549 (192/74) > Bajuda junto ao depósito de géneros do aquartelamento.

Foto: © José Cortes (2010). Direitos reservados



1. Mensagem de José Cortes, ex-Fur Mil At Inf, CCAÇ 3549, Fajonquito, 1972/74 (*):

(i) Vou tentar responder ao companheiro Mexia Alves (**), sobre o Cap José Eduardo Marques Patrocínio.

O companheiro deve estar confundido com o ano em que foi para Mansoa, não deve ter sido em 1972 mas sim em 1973. Os meses de Julho e Agosto devem estar certos.

Porque os Cap São Pedro foram graduados pelo General Spínola mais ou menos em Maio de 1973, e o Cap Patrocínio já não se encontrava na companhia pelo menos há dois meses.

Portanto o Cap Patrocínio devia ter estado em Mansoa mais ou menos  5 ou 6 meses.

Segundo o que diz o coronel Vargas Cardoso, que era o 2º Comandante do Batalhão, o Cap Patrocínio foi para a CCAÇ 15,  [composta por ] tropas africanas.

O Cap Patrocínio tinha a formação de comandos, com uma comissão em Moçambique, como alferes,  onde foi ferido em combate.

Formou a nossa companhia em Chaves no BC 10 de 22 de Dezembro de 1971 a 25 de Março de 1972, dia em que saímos de Chaves para a Guiné. Ele era do Quadro Especial de Oficiais (QEO).

(ii) Agora gostava de fazer um pequeno comentário as Amêndoas Vermelhas de Fajonquito (**).

O que aconteceu naquele dia, não foi concerteza caso isolado durante 13 anos de guerra.

Temos que ver que grande parte dos soldados das NT tinham pouca formação escolar, eu na minha companhia,  e já foi em 1972, tinha muitos soldados que não sabiam ler nem escrever.

Portanto,  qualquer situação menos vulgar que acontecesse, o respeito pelos superiores desvanecia-se e a disciplina era esquecida . Eu próprio passei por uma situação, em que esteve envolvido o soldado Silva, do primeiro pelotão da minha companhia.

Certo fim da tarde,  já noite,  envolveu-se numa discussão com um camarada, e agarra na G3 e toca a descarregar o carregador no tecto da caserna onde dormiam.

Quando o abordei para saber o que se passava, quando cheguei junto dele ainda se encontrava com a arma na mão, virou-me a arma e disse:
- Ó furriel,  não me diga nada porque a seguir vai para si.

Tive que participar ao comandante de companhia, Cap Patrocínio, que lhe deu 10 dias de prisão, que passou em Bafatá.

Quando os camaradas o visitaram na prisão,  dizia-lhes que eu não chegava ao fim da comissão.

No fim dos dez dias, eu é que o fui buscar, e perguntei-lhe se era verdade o que os camaradas tinham dito, e ele disse para esquecer porque foram dez dias que passou sem fazer nada e comia e bebia.

Passados vinte e tal anos,  apareceu num dos nossos convívios e  voltámos a falar no assunto. E ainda nos rimos da situação. Mas podia ter acontecido uma tragédia se por acaso na altura eu tivesse respondido à agressão verbal dele.

Outra situação foi passada com o companheiro furriel Campos, e um soldado também do 1º pelotão, no destacamento de Sare-Uale.

Durante um jogo de futebol,  disputado ao fim de tarde no destacamento,  numa disputa de bola mais acesa entre o furriel e o soldado Maleiro, o soldado amuou e ficou zangado com o Campos, ao ponto de se recusar a cumprir o serviço de sentinela para que estava escalado naquela noite.

Quando foi abordado pelo furriel, para cumprir com a sua obrigação,  respondeu-lhe que não fazia o serviço e que saísse da sua frente se não queria levar um tiro, com a arma em riste apontada ao furriel.

É claro que o furriel só tinha que comunicar ao Comandante de companhia o que se passava, pois para sua segurança e dos outros soldados ele não queria mais aquele elemento consigo.

O Maleiro foi mandado embora para outra unidade, não ouvimos falar mais dele, na Guiné. Sei que está bem porque é daqui da zona de Coimbra.

Isto são dois casos, que não tiveram consequências mais graves, mas concerteza que aconteceram mais naquela guerra, com desfechos bem mais complicados, como o de Fajonquito no dia 2 de Abril de 1972, Domingo de Páscoa.

Temos que andar para trás nos anos, e ver que éramos uns puto de vinte e poucos anos, a quem foram dadas responsabilidades muito importantes, como a vida de ser humanos.

Não foi o meu caso pois tive sempre em sede de companhia, mas camaradas meus,  furriéis,  a quem foi dado o comando dos grupos de combate, por falta de oficiais, ou por outras razões, que agora não interessa falar .Com responsabilidade além do comando do grupo, tinham as populações dos destacamento que dependiam da tropa para quase tudo. Tiveram que ser enfermeiros sem conhecimento da especialidade, tiveram que administrar a alimentação sem serem vagomestres, e outras situações, sem preparação, só foram preparados para defender as populações da guerra, e nos destacamentos tinham que fazer de tudo.

O Cap São Pedro foi graduado salvo erro com vinte e seis anos de idade, era um puto, foi-lhe entregue uma companhia com 160 homens mais ou menos da mesma idade, a população de Fajonquito, Canhámina, Cambajú, Sare Uale, Sare Jambarã e outras que existiam no nosso sector. Teve que assumir uma postura com certa autoridade, que o próprio posto hierárquico lhe exigia.

Ainda hoje,  passados 36 anos,  há companheiros que lhe guardam ressentimentos daquele tempo. (...)

3.  Mensagem de 6 do corrente:

Caro Luis Graça.


Ao ler as narrativas do Cherno Baldé [, foto à direita, quando estudante universitário em Kiev, na Ucrânia, nos finais de 1980], dei com um comentário do companheiro José Bebiano, do qual me lembro bem pois era o Furriel de Operações e Imformãções da companhia e, como era de rendição indivudual, só esteve connosco meia dúzia de meses, mas lembrava-me bem dele. Já comuniquei com ele como te dei conhecimento., fiquei muito contente com a resposta dele.

Com respeito ao Cherno, como é natural não tenho ideia dele naquela altura, embora a cara dele não esteja apagada da minha memória.

Como ele conta o convívio com os militares,  era capaz de ser assim, sei que alguns se excediam no tratamento com os miúdos. Ele fala em dois condutores, o Dias e o Magalhães, na verdade tivemos dois condutores com esse nome, mas não tivemos nenhum alferes chamado Maia, por isso não sei se ele se refere à minha companhia. (***)

Vou enviar algumas fotos, espero que as faças chegar ao Cherno para que ele as identifique;

1 - Eu com a filha mais nova da Cristina, lavadeira,  a mais popular dentro do aquartelamento.

2ª - Eu e o Alaje, espero que ele consiga dizer do paradeiro dele.

3ª - Povoação de Fajonquito.

4ª - Casa Gouveia, com a casa dos oficiais que ele fala na sua narrativa.

5ª - Rua principal de Fajonquto.

6ª - Bajuda junto ao depósito de géneros do aquartelamento.

Um Abraço

José Cortes
________________

Notas de L.G.:

(*) Vd.poste de 7 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5946: Fajonquito do meu tempo (José Cortes, CCAÇ 3549, 1972/74) (2): Evocando o Sold Almeida e o Fur Alcino, da CART 2742, que morreram, mais o Cap Figueiredo e o Alf Félix, na tragédia do domingo de Páscoa de 1972

(**) Vd. poste de 6 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5938: A tragédia de Fajonquito ou as amêndoas, vermelhas de sangue, do domingo de Páscoa de 2 de Abril de 1972 (José Cortes / Luís Graça)

Comentário de Joaquim Mexia Alves:

(...) Não tendo a ver directamente com esta tragédia gostava de perguntar o seguinte:


- Quando é que o Cap Patrocínio saiu da Companhia? O Cap Patrocínio não tinha especialidade de Comando?


Pergunto isto porque a minha memória por vezes me atraiçoa, (não só a mim,  com certeza), e eu tenho quase a certeza de que fui "substituir" o Cap Patrocínio na CCaç 15, (porque quando cheguei à 15 não havia Capitão e eu era o Alferes mais antigo).


Tenho a ideia que quando fiz a viagem do Xime para Bissau, para depois ir para Mansoa, o Cap Patrocínio, apenas por coincidência, ir nessa viagem e termos conversado, pelo que soube desde logo que ele já não era comandante da 15 e eu teria de o ser até à chegada de um novo Capitão.


Mas o tempo é "curto", pois eu julgo que cheguei à CCaç 15 lá para Julho ou Agosto de 72, o que faria com que a passagem do Cap Patrocínio por Fajonquito e pela 15 fosse muito rápida.


Alguém me pode relembrar para eu poder organizar a minha memória?


Abraço camarigo para todos (...).

(***)  Dados sobre as companhias de Fajonquito,  aqui citadas e que são do tempo do Cherno Baldé, "menino e moço":

CCAÇ 3549:

Mobilizada pelo  BCaç 10. Partida para a Guiné em  26/3/1972; regresso em 29/6/1974. Esteve em Fajonquito. Comandantes: Cap QEO José Eduardo Marques Patrocínio; Cap Mil Grad Inf Manuel Mendes São Pedro. Pertencia ao BCAÇ 3884 (Bafatá), que teve 6 (seis!)  comandantes, 4 tenentes coronéis e 2 majortes, o último dos quais o supracitado  Maj Inf Mário José Vargas Cardoso. A este batalhão pertenciam a inda a CCAÇ  3547 (Contuboel), comandada pelo Cap Mil Inf  Carlos Rabaçal Martins; e  a CCAÇ 3548 (Geba) (teve três comandantes, todos eles capitães milicianos de infantaria).

CART 2742:

Mobilizada pelo RAL 5. Partida para a Guiné: 18/7/1970; regresso: 21/9/1972. Esteve sempre em Fajonquito.  Comandantes:  Cap Art  Carlos Borges de Figueiredo (confirma-se que não era miliciano, mas sim do quadro) e  Alf Mil  Art  Baltasar Gomes da Silva (que o substitutui o capitão, por morte deste, em 2/4/1972). Esta unidade pertencia ao BART 2910 (Bafatá), comandado pelo Ten Cor  Art  Fernando de melo  Macedo Cabral. A este batalhão pertencia ainda CART 2741 (Contuboel;  Cap Art  João Maria Clímaco  de Sousa Brito) e CART 2743 (Geba;  Cap Mil Art Iídio do Rosário dos Santos Moreira).

Guiné 63/74 - P5971: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (12): Ivone Reis, a primeira Enfermeira Pára-quedista que conheci (Rosa Serra)

1. Mensagem de Rosa Serra, ex-Enfermeira Pára-quedista, BCP 12, Guiné, 1969, nossa nova camarada e tertuliana, com data de 5 de Março de 2010:

Olá Sr. Luis Graça.
Sou Rosa Serra, ex-Enfermeira Pára-quedista.

Conforme me foi solicitado aqui vai um pequeno resumo do meu percurso como Enfermeira Pára-quedista.

- Iniciei o meu curso de pára-quedismo em Setembro 1967 tendo este sido interrompido por acidente em instrução. Após estar completamente recuperada, concluí o curso sozinha e fui brevetada em 13 Março de 1968.

- No mesmo mês fui colocada no Hospital da Força Aérea, BA 4 - Ilha Terceira, nos Açores.

- Em Março de 1969 rumei para a Guiné para o BCP 12.

- Em Abril de 1970 fui colocada no BCP 21 em Luanda.

- Em Setembro de 1971 fui nomeada para o RCP, em Tancos, para ministrar um curso de primeiros socorros avançados a soldados pára-quedistas. Após terminada essa formação aos militares pára-quedistas, em Janeiro de 1972 iniciei o curso de instrutores e monitores em pára-quedismo na mesma unidade, o qual terminei em Março do mesmo ano.

- Em Junho de 1972 volto aos Açores, onde fico até Dezembro de 1972.

- Em Janeiro de 1973 fui colocada na 3.ª Região Aérea, tendo estado destacada cerca de um ano no AM-51 em Mueda.

- Em 1 de Março de 1974 rescindi o contrato, deixando de prestar serviço na Força Aérea.

Em relação à Enfermeira Ivone, apenas descrevo em traços gerais o que sempre apreciei nela, contudo não quis alongar-me muito; mas é sem dúvida uma grande Senhora e uma grande referência para as enfermeiras pára-quedistas.

Curiosidades:

Cerca de 20 anos depois de ter saído da Força Aérea, tomei conhecimento de que tive 2 louvores; um dado pelo Comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné e outro pelo Comandante da 3.ª Região Aérea; e nos cursos de pára-quedismo que fiz, exceptuando as 2 semanas do primeiro curso antes do acidente, fiz o curso normal sozinha e no segundo era a única mulher do curso.

Logo que possível tentarei fazer-vos chegar as duas fotos da praxe - uma dos velhos tempos e outra actual. De qualquer modo, suponho que as fotos que o Miguel Pessoa vos enviou poderão ilustrar o texto sobre a Enfª Ivone.

Com os meus cumprimentos
Rosa Serra


ENFERMEIRA IVONE REIS

Tancos, 2005 > Enfermeira Pára-quedista Ivone Reis

Têm-me perguntado várias vezes pela Enfermeira Ivone. Sei também que já há um certo número de pessoas que sabem que ela não tem estado bem de saúde, por isso aqui estou eu para falar um pouco da primeira enfermeira pára-quedista que eu conheci.

Nós, aqueles que a conheceram e que com ela conviveram períodos da sua vida por diversas razões, não a esquecem e no meu caso pessoal tenho bem presente quem foi a Ivone, como sempre a vi e o que eu aprendi com ela.

A Enfermeira Ivone pertence ao grupo das 6 Marias, nome pelo qual ficou conhecido o 1.º curso de Enfermeiras Pára-quedistas portuguesas feito em 1961.

Foi ela que contactou as futuras candidatas, residentes na Cidade do Porto, que em 1967 tinham pedido por escrito à Força Aérea informações sobre cursos para Enfermeiras Pára-quedistas. Foi a Enfermeira Ivone a primeira a deslocar-se ao Porto para conhecer as 4 interessadas na candidatura ao curso, onde eu estava incluída.

Mais tarde, eu, já Enfermeira com boina verde na cabeça, estive em várias comissões com ela. Fazíamos uma grande diferença de idade; eu muito novinha, a Ivone uma senhora cheia de sabedoria e experiência. Logo percebi tratar-se de uma pessoa de princípios e moral muito vincados, nem sempre de fácil contacto, porque o seu grau de exigência era muito elevado, não só para quem estava à sua volta, mas para com ela mesmo.

Não se lamentava do seu cansaço nem de quem a magoasse com qualquer atitude menos simpática; mas também não se inibia de chamar a atenção sobre tudo o que eu ou outra enfermeira qualquer pudéssemos fazer e que ela considerasse pouco correcto, ou até mesmo deselegante.

Fazia gosto e não se poupava a esforços para que todas nós fossemos um exemplo de profissionalismo impecável, cumpridoras de normas militares sem deslizes, posturas e atitudes que se destacassem, de forma a sermos admiradas como grupo.

No meu caso pessoal percepcionei logo na primeira comissão que fiz com ela a sua forma de estar e o seu rigor no desempenho da sua actividade como enfermeira em ambiente masculino e de guerra.

Várias vezes ela me chamou atenção por pequenas rebeldias insignificantes e atitudes que eu tomava, como entrar no helicóptero para ir fazer uma evacuação com o casaco de camuflado pendurado num ombro, de bolsa de enfermagem no outro e de t-shirt branca; era sabido que quando regressasse logo me dizia do perigo em usar a t-shirt em pleno mato pois tornava-me um alvo bem visível, além do aspecto pouco alinhado no uso do uniforme militar a bordo de uma aeronave.

Eu dizia-lhe para ela não se preocupar, porque eu era um alvo que não interessava a ninguém; e quanto ao desalinho do casaco pendurado no ombro, um dia respondi-lhe que só o fazia porque tinha calor, não pelo clima da Guiné, que até era “fresquinho”, mas se calhar por estar a entrar em “menopausa” e ela esboçou um sorriso e respondeu-me:

- A menina gosta muito de brincar.

Eu nunca levava a mal o que ela me dizia, apesar de eu ser mesmo uma periquita ao lado dela; sempre soube apreciar as suas qualidades profissionais sobretudo em termos de organização e de uma verticalidade e sentido de dever pouco comuns, mesmo nessa altura.

Mais tarde, em Angola, as enfermeiras colocadas em Luanda viviam num apartamento de um edifício da Força Aérea destinado a alojar militares e suas famílias. O ambiente era bem mais calmo que o da Guiné, o que nos permitia termos fins-de-semana, irmos à praia, convivermos mais tranquilamente com a comunidade civil ou com famílias de militares.

A Enfermeira Ivone sempre alinhou comigo nas horas de lazer, tal como respeitava se eu não a convidasse para ir comigo quando eu saía com um grupo de amigos ou familiares meus que lá se encontravam na época.

Em Angola eu estava colocada no BCP 21 e ela na Direcção do Serviço de Saúde da Força Aérea. Normalmente eu ia para o Batalhão com farda n.º 2 (saia, camisa e eventualmente blusão) e, claro, boina verde na cabeça. Um dia resolvi colocar num dedo um anel com uma pedra grande verde, que dava um bocado nas vistas; quando ela me viu sair com semelhante adereço, fardada, olhou para o dedo e com ar de espanto diz-me:

- A Rosa esqueceu-se que está fardada? - Eu respondi, não - e acrescentei:

- Não me diga que não é giro… condiz mesmo bem com o verde da boina - e ia mostrando o dedo e dizendo: - É lindo, até devia estar orgulhosa de uma Enfermeira Pára-quedista estar assim tão gira.

Ela respondeu-me:

- Nem por isso - e virou-me as costas. Acredito que se foi rir às escondidas.

Mais tarde comentámos uma série de peripécias deste género que se passaram connosco e fartámo-nos de rir, e com aquele jeito típico dela, depois destas lembranças e passados tantos anos, acabava por dizer:

- A menina era muito brincalhona, nunca consegui zangar-me consigo.

Estou a contar estes episódios porque sempre percebi que por trás daquele ar rigoroso dela estava uma mulher mais tolerante do que parecia, com uma capacidade de organização espantosa, uma noção de ética muito apurada, muito trabalhadora; e nunca a vi fazer uma crítica desagradável ou fofoqueira de ninguém e nem gostava que as pessoas que a rodeavam o fizessem.

Ao longo de todos estes anos mantive sempre contacto com ela, o que me permitiu tomar conhecimento de um espólio fantástico que ela foi recolhendo dos sítios por onde passou e organizando ao longo dos anos, tendo em vista a divulgação da história das Enfermeiras Pára-quedistas de quem ela tanto se orgulhava e que sempre se preocupou em não deixar cair no esquecimento. Foi sempre um bom exemplo para mim.

(Rosa Serra)

Tancos 2005 > I Encontro de Mulheres Boinas Verdes > A Enfermeira Ivone corta o bolo comemorativo

Base Aérea de S. Jacinto, 2007 > III Encontro de Mulheres Boinas Verdes > Da esquerda para a direita: Giselda, Rosa Serra (de branco), Maria Bernardo Vasconcelos (de vermelho e preto), atrás (?), depois Júlia Lemos (camisola florida), Amália Reimão (de branco), Céu Matos Chaves (de amarelo) e Zulmira André. Em baixo, Aida Rodrigues.

Base Aérea de S. Jacinto, 2007 > III Encontro de Mulheres Boinas Verdes > A partir da esquerda: (?), a Rosa Serra (de branco), a Zulmira André (meio tapada), a Maria Bernardo Vasconcelos (de vermelho e preto), Teresa Lamas, a Maria do Céu Matos Chaves (de amarelo), a Júlia Lemos (camisola florida) e a Amália Reimão (de branco). Em baixo estão a Giselda e uma camarada mais nova.

Base Aérea de S. Jacinto, 2007 >III Encontro de Mulheres Boinas Verdes> Giselda, Rosa Serra e Zulmira André
Fotos e legendas enviadas por Miguel Pessoa



Comentário de CV:

Cara Enfermeira Rosa, temos muito prazer em recebê-la na nossa Caserna Virtual, onde imperam os homens, mas onde as senhoras são bem-vindas. Que o diga a Giselda que tem sido acarinhada por todos nós, na medida em que era, até à sua chegada, a única representante da classe das Enfermeiras Pára-quedistas a quem tanto devemos pela nobre missão que desempenhavam nos teatros de guerra.

Apresentamos as nossas saudações de boas-vindas e esperamos que colabore no nosso Blogue, contando as suas histórias, complementando afinal o trabalho já desenvolvido pela nossa camarada Giselda Pessoa.
__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de > 20 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4979: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (11): Fartote de hortaliças (Giselda Pessoa)

Guiné 63/74 - P5970: Parabéns a você (86): Artur Soares, ex-Fur Mil Mec Auto da CART 3492, Xitole, 1972/74 (Os Editores)

1. Hoje dia 11 de Março de 2010 está de parabéns o nosso camarada Artur Soares (ex-Fur Mil Mec Auto da CART 3492/BART 3873)*, porque completa 61 anos de vida.

Vem toda a Tabanca desejar ao nosso camarada um dia de aniversário repleto de alegria na companhia de seus familiares e amigos.

São ainda nossos votos que esta data seja festejada por muitos anos com saúde e boa disposição.




2. Não foi possível encontrar registos do Artur no nosso Blogue, no entanto deixamos o atalho para consulta dos postes da CART 3492, à qual o nosso camarada pertenceu e onde naturalmente ele e a sua equipa deram o melhor de si.

Não se pode esquecer o papel importantíssimo dos nossos camaradas da Mecânica Auto que conseguiam autênticos milagres, tirando peças daqui e dali, improvisando por vezes, mas nunca pondo em perigo a vida de quem dependia diariamente das viaturas que mantinham operacionais apesar das dificuldades.



3. Comentário de L.G.:

Meu caro Artur: Com quase seis mil postes e um 1 GB de imagens, o nosso blogue (I e II Série) é pior que a floresta-galeria que cobria vastas partes do Sector L1 que nos coube em sorte, a ti e a mim, nomeadamente no famoso  rectângulo Rio Corubal-Xime-Bambadinca-Mansambo-Xitole...

É verdade que não és muito dado à escrita, mas és um bom camarada, apareces nos nossos encontros e convívios, és enfim um ilustre representante da Figueira da Foz (digo bem, já que há quem seja de Buarcos, e tem muito orgulho de ser Buarcos e não da Figueira, como o nosso querido amigo e camarada Vasco da Gama, que puxa e faz muito bem a brasa à sua sardinha... Espero, de resto, não estar a pôr a pata na poça e arranjar mais um molho de bróculos diplomático, que a gente já não tem idade para ser bombeiro voluntário e andar a pagar fogos...).

Brincadeira àparte (a gente teve que nascer nalgum sítio, nem que aseja no cu de Judas...), dizia eu que, apesar da floresta-galeria que já o nosso blogue (com crescentes dificuldades de pesquisa...), fui apanhar uma mensagem tua, de 17 de Março de 2007, de há 3 anos, portanto, e que reza assim:

(...) Mensagem do Artur Soares [, foto à direita, Xitole,l 1973,] para o seu camarada da CART 3492 (Xitole, 1972/74) (**).


Olá, Mexia Alves: Foi com grande satisfação que recebi o teu mail, só que não tive oportunidade de te responder. Eu já andava para te escrever, porque vi o teu endereço electrónico no Blogue do Luís Graça.

Andava eu a navegar na Internet à procura de alguma informação sobre a Guiné e ex-militares, na esperança de encontrar alguém das nossas guerras, quando vi o Blogue do Luís Graça e, claro, percebi logo que o nome do Mexia Alves me dizia alguma coisa. Tudo isto, depois de ter colocado aquela mensagem no livro de visitas do SAPO.


Tenho lido com atenção as mensagens e visto as fotografias que tens enviado para o Blogue, são passagens reais e verdadeiras, que nos fazem bem recordar os bons e os maus momentos que por lá passámos. Eu por vezes até fico emocionado, mas recordar é viver e é sinal que estamos vivos.


Como sabes, eu fui Furriel Mil Mec Auto e, depois de virmos da Guiné, nunca mais vi ninguém, nem do nosso Batalhão, o BART 3873, nem da nossa Companhia, a CART 3492. A única pessoa a quem mando as Boas Festas, pelo Natal, é ao Maçães que vive em Póvoa de Varzim e que era o Furriel Vagomestre.

Já lá vão quase 33 anos e fiquei emocionado ao ver as Fotos do que resta do Aquartelamento do Xitole, bem como da casa do Jamil (fotos do David Guimarães).


O Batalhão tem feito convívios anuais? Se tiveres outros contactos, agradeço que mos envies, pois faz bem ao ego, contactar e saber das pessoas com quem convivemos durante 27 meses em condições bastante difíceis.


Eu vivo em Figueira da Foz, como vês, quase somos vizinhos, pois é bastante perto de Monte Real. Por hoje não te maço mais, recebe um forte abraço do amigo Soares. (...).


Manda notícias. Artur Soares [que também aparece no blogue Xitole e na Tabanca de Matosinhos]

Tudo isto para te dizer, Artur, que já és um tabanqueiro de longa data, e que hoje estás de parabéns, porque é o teu dia, o teu dia de aniversário. Desejo-te, pessoalmente, invocando a minha condição de andarilho da estrada Bambadinca - Mansambo - Xitole, os melhores votos de longa vida, com  saúde e com a ternura dos entas (que vai dos 40 aos 90)...Luís Graça.

PS - Além do Artur, também faz anos um nosso muito estimado amigo, amigo de todos nós, do nosso blogue, e da nossa Guiné... Pai do nosso camarada Álvaro Basto... Adivinham quem é ?  Nem mais, o Rolando Basto, com os seus 87 anos (invejáveis!), e aqui na foto com o seu inseparável filho, e mais um camarada da Tabanca de Matosinhos, o Nelson. Ele é tratado, carinhosamente, como o Homem Grande. Ainda há dias tive o grato prazer de o rever, em Monte Real, e desejar-lhe antecipadamente os melhores votos para a festa do seu aniversário... Bebo um copo aos seus belos 87!!! Luís Graça.

Foto: Cortesia de Tabanca de Matosinhos (2010)

__________

Notas de CV:

(*) Vd. postes desta Companhia de Artilharia no marcador "CART 3492"

Vd. último poste da série de 8 de Março de 2010 Guiné 63/74 - P5950: Parabéns a você (85): A. Marques Lopes, mouro de Lisboa disfarçado de morcão em Matosinhos faz hoje 66 luas... (Os Editores)

(**) Vd. poste de 17 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1607: Artur Soares, ex- Furriel Mecânico Auto, CART 3492, Xitole, 1972/74 (Joaquim Mexia Alves)

OBS: Por lapso meu este poste saiu com um dia de antecedência. Hoje é publicado de novo, desta feita no verdadeiro dia de aniversário do Artur.

Ao Artur e aos camaradas a quem induzi em erro, as minhas desculpas.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Guiné 63/74 - P5969: Convívios (201): 19º Encontro da CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole, Missirá, 1965/67)


Coruche > 19º Encontro Nacional da CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67), mais os Pel Caç Nat 52 e 54 > 6 de Março de 2010 > Fotografia de grupo. Este ano associaram-se à festa os antigos Alf Mil  João Crisóstomo (que vive nos EUA), o Antonino Freitas, o Mário Beja Santos e o Jorge Rosales. A foto veio sem legenda: reconheço o Jorge Rosales (o primeiro da 1ª fila, do lado esquerdo), o Beja Santos (o segundo da 2ª fila, a contar do lado direito); e o Henrique Matos (o segundo da 3ª  fila, a contar do lado direito).

Fonte: © Henrique Matos (2010). Direitos reservados


1. Mensagem do nosso amigo e camarada Henrique Matos (, ex.-Alf Mil, Pel  Caç Nat 52, 1966/68), com data de hoje

Caro Luís e co-Editores

Tal como foi publicado no nosso Blog, teve lugar no passado Sábado, em Coruche,  mais um encontro (o 19.º) do pessoal da CCaç 1439 que esteve instalada no Enxalé e com destacamentos em Missirá e Porto Gole.  A estes encontros associam-se sempre os Pel Caç Nat 52 e 54 que a foram reforçar. (*)

Foi com muita satisfação que o pessoal reencontrou (passados 43 anos) o ex-Alf Mil João Crisóstomo que vive em Nova Iorque e o ex-Alf Mil Antonino Freitas (este pela segunda vez) que vive no Funchal.

Este ano também tivemos dois convidados especiais que andaram por aquelas paragens: o mais velho, ex-Alf Mil Jorge Rosales e o mais novo, ex-Alf Mil Mário Beja Santos.

Para constar, aí está a fotografia do grupo.

Abraço ao tabancal
Henrique Matos

_________________

Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de  12 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4328: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (6): Atolado no Mato Cão, com a CCAÇ 1439, a madeirense do Enxalé (**)

(**) Sobre o Enxalé, há pelo menos 23 referências, na II Série do nosso blogue.

Guiné 63/74 - P5968: Novo sítio da Tabanca da Lapónia (José Belo)

Tabanca da Lapónia, sítio do nosso camarada José Belo, a não perder




1. Mensagem do nosso camarada José Belo:

Caro Camarada e Amigo.
A Tabanca Grande deu-se ao trabalho de enviar uma "circular" a todos com a nova morada da Tabanca da Lapónia, mas, aparentemente, muitos não lêm o seu correio, e enviam-me E-mails pedindo a nova morada.

Será possível um CURTÍSSIMO post com a mesma?

Um abraço do
José Belo.



A pedido do nosso tertuliano José Belo, comunicado ao Blogue:

Caros camaradas
Todos sabemos que há teclas que não devem ser utilizadas sem se pensar duas vezes, porque por vezes acarretam dissabores.

O nosso camarada José Belo foi vítima de uma tecla marota que lhe fez peder toda a informação do seu nóvel Blogue.

Quando recuperado do choque e da inevitabilidade de ter de criar outro, meteu mãos à obra e avisou o nosso Blogue do novo endereço.
Fizemos correr uma mensagem onde se informavam os camaradas do sítio da Lapónia reactivado e de como aceder, mas oh destino cruel, não é que continuam a perguntar ao Belo:

- Então pá, então o teu blogue? Quando e onde o podemos visitar?

Porque não queremos que ninguém perca a oportunidade de ver lindíssimas fotos e artigos com assuntos variados, vimos mais uma vez dizer que podem e devem visitar a Tabanca da Lapónia em http://www.tabllap.com/.

Deixo-vos estas três fotos que lá roubei, por uma justa causa, dar-vos a conhecer tão bonito "sítio" e aguçar-vos o apetite para o irem visitar.





(Carlos Vinhal)
__________

Vd. último poste da série de 12 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5634: Blogues da Nossa Blogosfera (31): Tabanca dos Melros - Ex-Combatentes do Ultramar Português de Gondomar (Jorge Teixeira/Portojo

Guiné 63/74 - P5967: Agenda Cultural (65): O Abílio Machado (ex-Alf Mil, CCS / BART 2917, Bambadinca, 1970/72) a Toque de Caixa, na FNAC Colombo, Lisboa, 5ª feira, 11, às 18h00


1. Mensagem que o Abílio Machado [ na foto acima, o homem do adufe, na ponta direita,] mandou aos seus amigos do sul (Luís Graça, Humberto Reis, Gabriel Gonçaves, Tony Levezinho, que outrora fizeram parte da CCAÇ 12, e que estiveram em Bambadinca juntos com ele pelo menos 9 meses, entre Maio de 1970 e Março de 1971, bem como ao seu camarada da CCS, o ex-Alf Mil Capelão Arsénio Puim, natural dos Açores, membro igualmente da nossa Tabanca Grande):

Meus caros :

Um abraço a todos.

Tinha prometido que avisaria e aí vai : o Toque de Caixa estará no próximo dia 11 do corrente em Lisboa . Às 15 horas participará no programa Viva a música, de Armando Carvalheda, na Antena 1, transmitido do Teatro da Luz; às 18 horas, estaremos na FNAC, do Colombo, para um pequeno concerto de promoção do novo CD [, Cruzes Canhoto].

Espero que estejam todos bem.

Um abraço, Abilio Machado



2. Em 22 de Janeiro último, já nos tinha enviado um exemplar do CD[, imagem da capa, à esquerda]:

Caros amigos :

Enviei-vos o último CD do Toque de Caixa.  Fresco como um naco de boroa, a rescender a fumo e odor do forno .

Espero que o tenham recebido em boas condições. Depois de meses de trabalho, intenso às vezes ,ele aí está .

Não sei ainda a data de apresentação em Lisboa, mas sei que estaremos no programa Viva a Música,da RDP Antena 1, no dia 11 de Março, no Teatro da Luz .

No mesmo dia estaremos na FNAC,às 18,30 h .

Se houver concertos na zona de Lisboa, avisarei com tempo .

Um abraço a todos
Abilio Machado

3. Comentário de L.G.:

Bilocas: o teu/vosso novo trabalho, Cruzes Canhoto, já anda há mês e meio a fazer a 2ª circular, de casa para o trabalho e do trabalho para casa, bem como as viagens à Lourinhã, ao Porto, a Candoz, e por aí fora... Já lá está na caixinha de música, tal como o primeiro que me ofereceste em tempos (*)...

Parabéns pelo vosso profissionalismo, talento, dedicação e amor à nossa música, à nossa cultura, à nossa gente, às nossas raízes... Não, não é a estafada e requentada música folclórica do antigamente, é criação e recriação do melhor que o novo povo nos deixou em termos de patrimonónio musicográfico. Faço minhas as vossas palavras de auto-apresentação, no vosso sítio:

  "O Toque-de-Caixa nasceu com os cantares de janeiras, no Natal de 1985. O gosto comum pela música tradicional fez com que os seus músicos, um grupo de amigos, prosseguissem a recriação de novos ambientes sonoros. O moderno e o antigo, são elementos de fusão para uma nova música tradicional."...

Nova música tradicional: eis talvez o termo apropriado... Em tempo farei a minha recensão crítica do CD... Para já convido todos os amigos e camaradas da Guiné a comparacer, amanhã, na loja da FNAC - Colombo, em Lisboa, às 18h00 em ponto, para dar um abraço ao Abílio e conhecer os seus amigos do Toque de Caixa, gente de múltiplos talentos que nos traz os sons, únicos, ora alegres ora intimistas, vocais e intrumentais, da nossa música... Os sons da folia, da festa, do adufe à gaita de foles, da rebeca ao cavaquinho, os sons das fabulosas vozes humanas com sotaque nortenho, os sons da saudade,  da brincadeira, do amor, da poesia... Os sons do profano, do sagrado, do colectivo, do individual...

E porquê este título,  Cruzes, Canhoto!,  ? O próprio grupo dá a resposta: "Juravam-nos mortos, vejam só! Leram responsos, vieram os óleos santos, a vala já aberta. Até nós nos divertíamos a compor o epitáfio.... Cruzes, canhoto! Cá estamos a esconjurar o mafarrico... Porque isto da música é obra daquilo que nos apraz. A música eleva-nos, enleva-nos, transporta-nos, transforma-nos. Só ela nos sustém o ânimo. E a teimosia, velha como a vida. Somos a erva daninha....e a fénix! Na adversidade, mergulhámos fundo as raízes e apegámo-nos à terra. Das músicas tradicionais, cantadas por vozes deste tempo, passando pelo fado, sem esquecer as continuas influências de outras paragens. Incorporamos sons e criamos sotaques musicais. Aqui deleitamo-nos com os nossos sonhos, os nossos ambientes plenos de sentimentos, de fantasia. Amizades que recheiam melodias. Nada se faz sozinho. Tudo é para ser complementado...daí contarmos convosco! Começa o sonho...como quem conseguiu encontrar o que andava perdido. Se uma só nota deste trabalho vos provocar um arrepio de alma, diremos que valeu a pena voltar!" (...)
____________

Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 7 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3579: Os Nossos Seres, Saberes e Lazeres (7): A Toque de Caixa, com o Abílio Machado, ex-baladeiro de Bambadinca (Luís Graça)

(...) O Toque de Caixa surge em 85/86, quando, tendo mudado a minha morada para a Maia, encontrei um grupo de jovens com potencialidades que me pareceu de aproveitar. Criou-se um grupo base, no início ainda demasiado numeroso, que se foi depurando ao longo dos meses de elementos com menos qualidades. Os inevitáveis contactos com outros grupos da zona do Porto permitiram que, por alturas de 90, se desse uma espécie de fusão com outro grupo em desagregação.

Um outro processo de decantação ao longo do tempo permitiu que rapidamente o Toque de Caixa adquirisse uma qualidade que manifestamente não tinha nos seus primeiros tempos. Era a altura do director musical (era eu) ceder o lugar a quem mais sabia da marinhagem em tais ondas. Em boa hora o fiz, pois corríamos o risco de afogamento por cansaço ou inanição. (...)

Guiné 63/74 - P5966: Ser solidário (61): Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina, 6 de Fevereiro de 2010 (Luís Graça)

1. A propósito da prática, actual e no passado, da  Mutilação Genital Feminina (MGF), na Guiné-Bissau (*)



O dia  6 de Fevereiro passa  a ser consagrado como o Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina (MGF).  A prática da MGF existe ainda em cerca de 28 países Africanos  e do Médio Oriente, mas também na Ásia e em comunidades emigrantes na Europa, América do Norte e Austrália.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS),  estima-se em cerca de 130 a 140 milhões o número de mulheres, de todas as idades,  submetidas à MGF. Todos os anos há cerca de dois a três milhões de novos casos, ou seja, de crianças e adolescentes em risco de vir a sofrer desta prática milenar, profundamente misógina, intolerável, violadora dos direitos humanos, profundamente lesiva da saúde física, sexual, reprodutiva, mental e psicossocial da mulher,  inaceitável mesmo à luz do tradicional conceito do relativismo cultural.

Na Guiné-Bissau, estima-se que a prevalência de MFG nas meninas e mulheres, entre os 15 e os 49 anos de idade seja da ordem dos 45% (Vd. a brochura, em formato.pdf, Eliminação da Mutilação Genital Femina: Declaração Conjunta (...), 2009, 45 pp).

De acordo com a OMS (2000), citada pela página do Alto Comissariado da Saúde (ACS), "Portugal é um país de risco, tendo por base a assumpção de que as comunidades migrantes provenientes de países onde a MGF é praticada, o continuam a fazer, quer no país residente, quer deslocando-se ao país de origem".

E acrescenta o sítio do ACS:

Neste contexto, o I Programa de Acção para a Eliminação da Mutilação Genital Feminina, inserido no III Plano Nacional – Cidadania e Igualdade de Género (2007-2010), coordenado pela Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, tem como objectivo reforçar a coerência das acções desenvolvidas e das políticas para a igualdade de género.


No âmbito do Programa, foi produzido um folheto informativo sobre MGF, que aborda, entre outros temas, os riscos imediatos e a longo prazo para a saúde, as consequências médico-legais e os serviços e instituições que podem responder e encaminhar pedidos de apoio médico e psicossocial.


O folheto destina-se em particular a mulheres e famílias que se encontrem em risco, ou que já tenham sido sujeitas às práticas de MGF, mas também à população em geral.

O folheto, em formato.pdf, pode ser aqui consultado: Mutilação Genital Feminina.

______________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 9 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5962: Antropologia (17): A Condição da Mulher em Cacine, em 1972 (Juvenal Candeias)

(**) Vd. mais postes sobre a MGF publicados no nosso blogue

Vd. também uma pequena apresentação, em português, no You Tube,  sobre a Mutilação Genital Feminina, nomeadamente no Quénia, em África, país onde a ADDHU (Associação de Defesa dos Direitos Humanos) luta directamente contra a MGF.

Vd. também, em inglês, no You Tube, o vídeo Female Genital Mutilation: "This video was created in hopes of educating people about FGM's and why they are performed. This video is solely for educational purposes".

terça-feira, 9 de março de 2010

Guiné 63/74 – P5965: Actividade da CART 3494 do BART 3873 (1): Parte 1 (Sousa de Castro)

1. O nosso Camarada Sousa de Castro (*), que foi 1º Cabo Radiotelegrafista da CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, 1971/74, enviou-nos a seguinte mensagem, com a primeira parte da actividade desenvolvida pela sua Companhia, com data de 7 de Março de 2010:

ACTIVIDADE DA CART 3494 DO BART 3873 NO TEATRO DE O. P. GUINÉ (1)


DEZEMBRO1971/ABRIL 1974
Este texto foi elaborado a partir do livro: - BART 3873
“HISTÓRIA DA UNIDADE”
CART 3492 – CART 3493 – CART 3494
NA GUERRA CONSTRUINDO A PAZ
(autor desconhecido)

MOBILIZAÇÃO

a) Nota circular

– A nota circular nº. 4496/PM-Procº 18/3873 da 1ª Repartição de Estado Maior do Exército, datada de 04NOV71, ordenou que se procedesse à mobilização do Batalhão de Artilharia nº. 3873 o qual renderia, na Província da Guiné, o BART 2917 a atingir o termo da sua comissão de serviço.


b) Unidade Mobilizadora

- Foi unidade mobilizadora o Regimento de Artilharia Pesada 2 (RAP 2), em Vila Nova de Gaia.

c) Pessoal

- O pessoal que compôs os seus quadros – CCS, CART 3492, CART 3493 e CART 3494, metropolitano de origem, era natural em grande parte do Norte (MINHO e DOURO) e Centro (BEIRAS), particularidade conducente à afirmação de a África constituir, para a maioria, quase uma incógnita mais ou menos próxima da imaginação de cada um.

d) Concentração

- A concentração dos novos mobilizados começou a 15NOV71 e terminou a 27NOV71.

e) Instrução

- A instrução geral (I. A. O.) teve lugar já no Ultramar (Ilha de Bolama) de 29DEC71 a 27JAN72, decorreu a um nível positivo e satisfatório, o resultado obtido foram animadores.

1. MISSÃO

- Tem por missão global a neutralização da subversão, através duma manobra simultaneamente psicológica, social e militar.

A actuação concretiza-se nas seguintes tarefas:

- Impedir e destruir o avanço do inimigo
- Defender as populações
- Integração dos guineenses no contexto nacional
- Apoiar as autoridades civis
- Promover o progresso moral e material das diversas etnias, sem quebra do seu habitat natural
- Recuperar os elementos extraviados, etc.

2. LOCALIZAÇÃO DO SECTOR - L 1

- O sector situa-se sensivelmente no centro da Guiné. Não confina com qualquer território estrangeiro, nem com o Oceano e deve considerar-se um dos sectores de maior vastidão em todo T. O.

3. CONDIÇÕES GEOGRÁFICAS

a) Clima

- O clima é tropical (quente e húmido) com alteração de duas estações: A «Seca» que vai de Dezembro a Junho e a das «Chuvas» de Junho a Dezembro. Não difere, por conseguinte, do resto da Província.

Do SAHARÁ sopra o vento «Leste» quente e seco que em choque com a «Monção Marítima» provoca os «Tornados», cuja velocidade chega a atingir os 100 Kms/hora.

Precisamente no período pluvioso, é que, se formam os «Tornados» surgidos bruscamente e precedidos por trovoadas, anunciadas por calor sufocante.

b) Terreno

- A sua configuração é plana. Durante as chuvas transforma-se numa extensa área lacustre, onde os africanos lavram as «bolanhas» e as «lalas».

Uma densa rede hidrográfica corta o território, sobressaindo os rios GEBA e CORUBAL.
A composição geológica do solo é de natureza dorelítica.

4. VIAS DE COMUNICAÇÃO

- Recorde-se que a sede do BART 3873 – BAMBADINCA-, desempenha o importante papel de centro reabastecedor do LESTE, por isso as vias de comunicação aéreas, terrestes e aquáticas oferecem um interesse primacial. Enumeramos os principais:

- Aeródromos: - BAMBADINCA.
- XITOLE.
- Pistas de heliportagem nos Aquartelamentos e Destacamentos disseminados pelo mato.
- TERRESTES - Estrada XIME-BAMBADINCA-BAFATÁ, asfaltada, qualidade que lhe permite um escoamento mais rápido e seguro.
- Estrada BAMBADICA-MANSAMBO-XITOLE.
- Portos: - XIME e BAMBADINCA.
- A estes portos acostam barcos civis e militares que circulam no rio GEBA.

5. INIMIGO

a) Organização

- Actualmente organiza-se em Frentes. O Sector L1 é abrangido a Ocidente pela Frente MORÉS-NHACRA; a Oriente e Sul pela frente BAFATÁ-XITOLE; a Sudoeste pela Frente de QUINARA; ainda a SUL pela frente BUBA-QUITAFINE e a Norte pela Frente BAFATÁ-GABÚ NORTE.


b) Instalação

As suas zonas de instalação nos limites do Sector são:

- Regulado XIME-BISSARI (Frente BAFATÀ-XITOLE)
POINDON-BAIO/BURUNTONI-MINA-MANGAI
- Regulado do CUOR
MADINA/ENXALÈ

- Efectivos na 1º zona:

- 03 Bigrupos de Infantaria
- 01 Grupo Especial de Bazookas

- Efectivos na 2ª zona:

- 01 Bigrupo de Infantaria
- 01 Bigrupo de Artilharia

O Abrigo das Transmissões, vendo-se ao lado direito os depósitos da água 1972

6. DISPOSITIVO DAS NOSSAS TROPAS

a) Sub-Sector do XIME

- CART 3494 – XIME
01 PELOTÃO – ENXALÉ
- 20º PEL ART 10,5 – XIME
- GEMIL 309 e 310 – ENXALÉ
- C. MIL. XIME – TAIBATÁ
- PEL MIL 241 – AMEDALAI
PEL MIL 242 – TAIBATÁ
PEL MIL 243 – DEMBATACO

Vista parcial do XIME em 1972


7. SOBREPOSIÇÃO

Antes de a CART 3494 do BART 3873 ter assumido, efectivamente, as inerentes funções, desenrolou-se a sobreposição que excepcionalmente e por retardamento de embarque do CART 2715 do BART 2917 se prolongou de 28JAN72 a 14MAR72.

A utilidade desta fase de transição é, como se sabe, a de adaptar ao local de actuação e inteirar sobre o estado de coisas reinante.

(Continua)

Um abraço Amigo,
Sousa de Castro
1º Cabo Radiotelegrafista da CART 3494/BART 3873

Documentos: © Sousa de Castro (2009). Direitos reservados.
___________
Nota de M.R.:

Este é o primeiro poste desta série.

Guiné 63/74 - P5964: A Guiné-Bissau na lente do grande fotógrafo Eduardo Gageiro (Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Fevereiro de 2010:

Queridos amigos,
Na Livraria Círculo das Letras esteve patente uma belíssima exposição de Eduardo Gageiro. A exposição chama-se “Silêncios”, reúne uma selecção de 30 fotografias captadas nos últimos 50 anos. Trata-se de imagens retiradas do livro “Silêncios”, um álbum com duas centenas de fotografias.
Para Gageiro, trata-se do seu livro mais intimista, corresponde ao tempo em que ele foi confrontado com uma doença oncológica, em 2007. Em “Silêncios” pode encontrar-se de tudo e um pouco por toda a parte: pessoas sozinhas na paisagem urbana, uma fotografia inédita de Salazar, crianças. Gageiro é indiscutivelmente um dos maiores fotógrafos portugueses, consagrado com prémios internacionais de primeira importância. Nunca escondeu o interesse pela expressão das pessoas e como ela espelha sentimentos.

Fui convidado pelo Fernando Vicente a fazer uma comunicação no âmbito de um ciclo de debates e tive tempo para percorrer demoradamente esta exposição encantadora.

O Fernando Vicente viu que me enamorara desta foto, interrogou-me, expliquei-lhe porquê. E oportunista como sou pedi-lhe licença para a publicarmos no blogue, para que esta criança, onde quer que esteja, se possa rever e testemunhar a esperança num futuro melhor.

O Fernando Vicente acaba de ma enviar, ela aqui vai para todos.

Um abraço do
Mário

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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 8 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5952: Notas de leitura (76): Kikia Matcho, de Filinto de Barros (Beja Santos)

Guiné 63/74 - P5963: Os Nossos Médicos (19): Em busca de pessoal que tenha conhecido o meu irmão, o Alf Mil Médico José Alberto Machado, Nova Lamego, 1963 (Fernanda Santos, esposa do Carlos Marques Santos)



Tabanca do Centro. Almoço-convívio. Monte Real, 26/2/2010. Teresa Santos, esposa do nosso camarada Carlos Marques dos Santos, ex- Fur Mil  (CART 2339, Mansambo, 1968/69), casal residente em Coimbra... A Teresa é uma entusiástica companheira do nosso blogue, desde os seus primórdios, tendo estado presente logo no nosso I Encontro Nacional, em 2006, na Ameira, Montemor-O-Novo...

Neste pequeno vídeo, além de dar sugestões de nomes para um grupo de trabalho da Tabanca do Centro, faz um apelo aos camaradas presentes (dirigindo-se ao camarada Luís Raínha, que ela achava ser o mais velho, em termos de antiguidade na Guiné), para que a ajudasse a localizar gente do tempo do seu  irmão, o Aferes Miliciano Médico  José Alberto Machado, que esteve em Nova Lamego, Zona Leste, Guiné, em 1963 (*)... Morreu precocemente,  aos 34 anos, depois de regressar à Metrópole.

Vídeo (1' 05''): You Tube > Nhabijoes (2010).

Clicar aqui para saber mais sobre a série Os Nossos Médicos.
_____________

Nota de L.G.:

(*) 15 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3899: Os nossos médicos (1): Alf Mil Médico José Alberto Machado (Nova Lamego)

Guiné 63/74 - P5962: Antropologia (17): A Condição da Mulher em Cacine, em 1972 (Juvenal Candeias)

Guiné > Região de Tombali > Cacine > Binta, a bajuda contestatária, recusou  o casamento forçado com um homem grande




Guine > Região de Tombali > Cacine > "Hospital Central de Cacine”: todas as especialidades (incluindo partos)

Foto: © Juvenal Candeias (2010). Direitos reservados.


1. Mensagem, com data de ontem, do Juvenal Candeias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3520, Estrelas do Sul (Cacine, Cameconde, Guileje, 1971/74):

 Assunto: A Condição da Mulher em Cacine, em 1972


 Camaradas,


Não quero deixar passar o Dia [Internacional] da Mulher sem vos enviar este texto, singela homenagem  à Mulher Nalú, que muito admirei, pela sua força, coragem e importância na comunidade.


Tomara que essa força e coragem tenha entretanto sido devidamente orientada!... Penso que ao texto deveria antes chamar Elementos para o Estudo da Condição [da Mulher]... deixando para os sociólogos - parece que há um aí bem perto - o verdadeiro estudo da Condição  da Mulher em Cacine.


Como diria Filinto Barros, este texto não é "nem sociologia, nem história, nem política, é tão-somente um conjunto de memórias com 38 anos.


Um forte abraço a todos.


Juvenal Candeias


PS. À atenção do Luís Graça: observa a fotografia da enfermaria de Cacine. Do lado direito podes ver como era o bunker cujas ruínas fotografaste há relativamente pouco tempo.


2. A CONDIÇÃO DA MULHER EM CACINE, EM 1972
por Juvenal Candeias


Em Cacine predominava a etnia Nalú, tradicionalmente animista, convertida ao Islamismo por influência dos Sossos, etnia minoritária, mas culturalmente mais evoluída

A islamização dos Nalús transformou completamente a sua cultura, afectando de modo significativo a condição social da mulher. O casamento poligâmico forçado, o trabalho feminino e o fanadu (mutilação genital da mulher) surgiram como novas realidades ou revestiram aspectos totalmente distintos.

- O CASAMENTO

O casamento, que tradicionalmente era feito por troca, passou a ser feito por compensação (pecuniária e/ou em géneros).

Quando as jovens tinham 12 ou 13 anos, apresentavam-lhes um homem dizendo-lhes que era o seu marido. Não havia relações sexuais prévias, não havia namoro, não havia nada que permitisse à mulher conhecer o marido, muito menos decidir se com ele queria viver!

A negociação das bajudas (mulheres jovens) era feita no momento, por proposta efectuada pela família do pretendente à família da jovem, mas o comprometimento de bajudas ainda na infância, também era vulgar. Neste caso, o noivo passava desde então a ajudar a família da noiva, até que esta, alguns anos mais tarde, lhe fosse entregue.

O número de mulheres de cada homem dependia da sua capacidade financeira e determinava mesmo o seu estatuto social na comunidade.  Não eram raros os homens grandes (velhos) com 3 ou 4 mulheres, algumas bastante mais jovens. É que, para além do eventual interesse sexual, as mulheres significavam também mão-de-obra barata.

O casamento imposto, verdadeira violência psicológica exercida sobre as mulheres, raramente tinha contestação, por um lado, porque se efectuava logo a partir dos 12 anos, quando a mulher tinha pouca possibilidade de se opor, por outro lado, devido à pressão social que a própria comunidade exercia sobre as eventuais contestatárias.

Contudo, esporadicamente ocorriam alguns casos, como o de uma bajuda, residente na Tabanca Nova – reordenamento estrategicamente colocado junto à picada, a meio caminho entre Cacine e Cameconde – que perante o iminente casamento negociado pela família com um homem grande, mais interessada num jovem, recusou, acabando por fugir para o mato, onde andou sozinha cerca de uma semana.

De nada lhe serviu! Encontrada e repreendida, o castigo terá sido severo, uma vez que durante bastante tempo ninguém viu a Binta!

O ambiente familiar, com várias esposas de um mesmo homem que entre si se designavam por cumbossas, era, naturalmente, de grande rivalidade, salvo quando a diferença etária entre as cumbossas era significativa, situação em que as mais velhas, a troco de trabalho, podiam mesmo dar alguma protecção às mais jovens.


Apesar de toda esta envolvência, as crianças eram tratadas como filhos por todas as cumbossas, independentemente de quem fosse a verdadeira mãe. Era uma original, mas real situação de crianças com várias mães!

No âmbito do casamento também a herança era um fenómeno original e penalizador da condição da mulher. A viúva não tinha direito a herdar os bens do marido. Os mesmos eram herdados pelos irmãos, fazendo a mulher, ela própria, parte da herança do falecido marido.

Para além de perder o marido e os bens, via-se na contingência de integrar uma nova família a quem era obrigada a servir e ainda a manter relações sexuais com um novo homem que, naturalmente, também não escolhera!

A extrema submissão a que as mulheres estavam sujeitas levava a que questionar uma mulher,  sobre as diferentes situações de violência no seio do casamento, era obter, invariavelmente, a resposta, por estas ou por semelhantes palavras: “sempre foi assim…”, “é Deus que quer…”

- O TRABALHO DA MULHER

O casamento a que nos referimos, determinava que a mulher via a sua posição degradada, fora convertida em servidora, verdadeira escrava da luxúria do homem, que a transformara em simples instrumento de produção e reprodução.

Esta situação acabava por influenciar, ironicamente, a posição preponderante que a mulher desempenhava no seio da família e a importância da sua acção na comunidade. De facto, à mulher estava atribuída a responsabilidade da alimentação, vestuário, manutenção da casa e educação dos filhos, áreas em que os homens não tinham a mínima interferência.

A família não se sustentava só com o que comprava com os parcos rendimentos obtidos pelos homens mas, sobretudo, com o que resultava de a mulher transformar muitas horas de trabalho.

Algum destaque deverá ainda ser dado à educação dos filhos. Era garantida em exclusivo pelas mulheres que, contraditoriamente, acabavam por ser as transmissoras de comportamentos e valores enraizados, ligados a um processo de socialização de que elas próprias eram as principais vítimas.

As crianças do sexo feminino eram preparadas pelas mães para o processo de submissão à vontade do homem e da comunidade e as do sexo masculino para perpetuarem o domínio dos homens.

O analfabetismo era outro problema grave. Atingia valores extremamente elevados nos homens e era total nas mulheres.

O Furriel Miliciano Lopo mantinha uma escola primária a funcionar diariamente, onde nunca conseguiu ter um aluno do sexo feminino!

Estas horas de trabalho invisível desenvolvido pelas mulheres eram fundamentais para garantir a economia doméstica e a evolução da comunidade e da cultura da própria etnia. Para os homens, contudo, este trabalho pouco contava, estava praticamente oculto atrás da fachada da família poligâmica, permanecendo invisível, porque não se traduzia em produtos visíveis.

Muitas horas de rude desgaste diluíam-se magicamente, permanecendo na clandestinidade a forte contribuição da mulher Nalú para a comunidade.

À mulher competia ainda outro trabalho, um pouco mais visível… Apanhar ostras e proceder à sua venda - a cotação da bacia de ostras era de 10 pesos – apanhar mangos, cultivar mandioca e mancarra, semear arroz… enfim, pouco restava para os homens fazerem, para além das rezas e do descanso tranquilo nas suas cadeiras de encosto!

Sempre que a tropa passava pela tabanca em deslocações de trabalho ou de patrulhamento, o cumprimento era um paradigma:
- Eh pessoal! Manga de trabalho!

A resposta, indolente, vinha lá bem do fundo da cadeira:
- Manga deeeele!

- O FANADO

O fanado, ou mutilação genital feminina, dizia-se ser um processo mais amplo, que podia descrever-se como uma cerimónia ou ritual de iniciação que preparava as jovens para a vida adulta, para a sua responsabilidade na comunidade e para a habilidade de continuar a cultura da própria etnia.

O fanado tinha na mutilação genital feminina a sua face mais negra. Ocorria na época das chuvas, altura em que as mulheres padidas (que tinham sido mães recentemente) se ocupavam da construção das barracas do fanadu, integralmente em material vegetal e longe da tabanca.

Tudo o que se relacionava com o fanadu não tinha intervenção do homem, que estava até impedido de se aproximar do local da cerimónia.

Eram as mulheres padidas que “montavam segurança” nas imediações do local e um cusco da nossa Companhia teve mesmo direito a perseguição e caça, no meio de tremenda algazarra, salvando-se apenas com a entrada no aquartelamento, após longa corrida.

Construídas as barracas, apenas as meninas que iam ser sujeitas ao fanadu (com cerca de 10 anos), as fanatecas e algumas mulheres grandes, lá entravam!

O que acontecia no interior das barracas, durante semanas, ninguém sabia com absoluta certeza.

O fanado era um ritual secreto do qual apenas se conhecia a mutilação genital e a transmissão, pelas mulheres grandes, dos valores atrás referidos.

Constava, contudo, que a mutilação era efectuada pela fanateca, que dispunha de uma faca própria para o efeito, que os cortes eram efectuados a frio, sem sombra de anestesia, sucessivamente a todas as bajudas, sem condições sanitárias, sem sequer a faca ser esterilizada após cada utilização.

Esta intervenção provocava problemas imediatos de hemorragias e infecções de que se desconhecia a exacta dimensão, uma vez que, devido ao carácter secreto da cerimónia, o facto não era muito comentado e nenhuma jovem podia recorrer a apoio médico.

As consequências nefastas do fanado projectavam-se sobre o futuro das bajudas e agravavam-se com maternidades precoces. Hemorragias e outros problemas no momento do parto eram comuns e levavam as mulheres a recorrer às enfermarias militar e civil, aqui já sem grandes inibições.

Em casos extremos, mas não raros, verificava-se mesmo a incapacidade para ter filhos.

Apesar de todos estes problemas, a mulher Nalú nem um gemido largava ao parir e levantava-se imediatamente a seguir ao parto, para efectuar a limpeza total do local.  Era uma questão cultural, de honra e prestígio.

O fanado era, portanto, uma cerimónia absolutamente generalizada. Não passar pelo fanado era algo de inconcebível, determinando a exclusão social, a discriminação, a recusa de casamento e de tarefas no seio da família, dado que a jovem não tinha sido purificada. Se as bajudas não fossem ao fanado,  as suas preces não seriam ouvidas, por mais que se lavassem nunca ficariam limpas…

Consequentemente, e em casos extremos, as próprias mães chegavam a fazer o fanado às filhas!

De resto o fanado era uma festa que se prolongava por várias semanas, em que o principal programa era comer, beber (apesar da islamização) e dançar!

Juvenal Candeias

Março 2010

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Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:

18 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5295: Histórias de Juvenal Candeias (6): Padaria de luxo em Cacine

16 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5113: Histórias de Juvenal Candeias (5): Vicente, o Piu

16 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4961: Histórias de Juvenal Candeias (4): Há periquitos no Quitáfine

1 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4623: Histórias de Juvenal Candeias (3): Um Manjaco em chão Nalú

12 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4323: Histórias de Juvenal Candeias (2): Incêndio no Rio Cacine

7 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4299: Histórias de Juvenal Candeias (1): Pirofobia ou a mina que não rebentou por simpatia

6 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4294: Tabanca Grande (136): Juvenal Candeias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3520, Cameconde (1972/74)

(...) Era Alferes Miliciano, Atirador, com recruta e especialidade em Mafra a que se seguiu Tavira durante 3 meses!



Mobilizado para a Guiné, fui formar Companhia no BII 19, no Funchal, donde saí com a Companhia de Caçadores 3520 para Bissau, onde cheguei ao fim da tarde de 24 de Dezembro de 1971 (que rica noite de Natal, no Cumeré!!!)


Após a IAO no Cumeré, fomos parar a Cacine (mais o destacamento de Cameconde), onde permanecemos até final de Outubro de 1973! (...)