domingo, 24 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7170: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (8): Da Casa Gouveia aos Armazéns do Povo

1. Mais um texto do António Rosinha (, foto à esquerda), 




Data: 23 de Outubro de 2010 23:55
Assunto: A adaptação da Casa Gouveia (capitalismo)aos Armazens do Povo(comunismo)-Transformação muito imaginativa



A experiência socialista na Guiné com Luis Cabral, e a tentativa do mesmo socialismo com Vasco Gonçalves/Cunhal em Portugal, quase chegou a satisfazer a curiosidade daqueles que, como muitos de nós,  olhavam para as economias de leste, como fruto proibido pelo salazarismo.


A malta em África, sem televisão nem jornais, criou um hábito de fazer zapping no rádio transistor, que corria emissoras em português desde Argel, BBC, rádio Tirana, Praga, rádio Moscovo e Voz da América,  etc, mas dávamos muita preferência ao que vinha de leste.
De maneira que se adquiriu uma grande curiosidade e até alguma crendice no comunismo.
Um slogan que se ouvia muito dirigido contra Portugal nessas emissoras, em duplicado, uma emissão para Portugal e África e outra para Brasil e América, era chamarem "colonialistas, imperialistas e fantoches", que penso que seriam os brancos, os militares portugueses  e os africanos que estavam ao nosso lado.


Quando Norton de Matos em 1949 se candidatou a presidente da República, e desistiu in extremis, nas aldeias do interior a mesa de voto em geral era nas nossas escolas que hoje estão abandonadas. Os nossos velhotes, se não fossem comunistas ou do contra,  iam votar no Craveiro Lopes,  por aconselhamento do regedor, do presidente da junta, e do padre e talvez do professor.


Os que eram comunistas clandestinamente, que já tinham as melhores casas e as melhores propriedades classificadas e destinadas a ocupações por  eles próprios, votavam,  como se dizia naquele tempo, no contraPreviamente a PIDE encarregava-se de os engavetar e pô-los à sombra por uns dias se não acontecesse pior, como mais tarde vieram os relatos.
Em 1949, quem tivesse 10 ou 11 anos podia ficar com esta lembrança dos acontecimentos no mundo rural da metrópole.


Passados uns anos, em 1958, quem tivesse 20 anos, via os mais velhos votarem no Américo Tomás, aconselhados pela União Nacional, pelos chefes instalados, e pelos que tinham medo ao comunismo. Os que eram do contra, por exemplo,  uns colegas meus, votavam Humberto Delgado, porque aí o Salazar ia à viola e os funcionários que nunca eram aumentados, iam ganhar mais, diziam os menos politizados, e os mais politizados sonhavam que com o comunismo é que devia ser bom.


Falava-se que Humberto Delgado teve mais votos, mas houve falcatrua, e no caso de Angola onde se notava menos a presença da PIDE, havia euforia nítida a favor de Humberto Delgado. Mas uma ideia que ficou em toda a gente, em 1949 e em 1958, é que nem um general nem o outro eram anti-colonialistas declarados. Mas uma coisa hoje os livros confirmam o que se pensava nesse tempo, os socialistas/comunistas colaram-se a esses candidatos da oposição a Salazar. E já havia nos votantes do contra, muitos com ideias anti-colonialistas e pró-independência, no pessoal letrado das colónias.


Dizia-se que  essas eleições «abalaram os alicerces» do Estado Novo. Mas o grande abalo deu-se em 1968,  quando se partiu o pé da cadeira onde o Botas [, Salazar,] descansava , e passados poucos anos vimos, quem viu, a implantação do socialismo/comunismo na Guiné Bissau, com toda a naturalidade e sem a mínima oposição.


Em Angola e Moçambique não se pode dizer o mesmo, pois que o MPLA e FRELIMO tiveram os inconvenientes duma guerra bastante longa, e em Portugal deu-se o 25 de Novembro muito cedo, o que não deu a tranquilidade de que auferiu o PAIGC na Guiné e em Cabo Verde, onde o regime socialista se concretizou.








Guiné > s/d > Algures, em região sob controlo do PAIGC (ou "região libertada") > Um armazém do povo. Fonte: PAIGC. Segundo texto do Jorge Santos, membro da nossa Tabanca Grande, "O PAIGC promove a criação dos Armazéns do Povo por decisão tomada no 1º Congresso de 1964. O objectivo dos Armazéns do Povo, empresa geral de comércio de tipo estatal, era garantir o fornecimento de artigos de primeira necessidade à população das regiões libertadas e, por meio de troca, receber produtos agrícolas que deveriam em seguida escoar-se para o exterior, criando-se e desenvolvendo-se assim, progressivamente, a base de um comércio externo. O número de Depósitos dos Armazéns do Povo passou de 6, em 1964, para 16, em 1969". Fonte: PAIGC - História da Guiné e Ilhas de Cabo Verde. Porto: Edições Afrontamento. 1974

E aqui entram as teorias escritas de Amílcar Cabral, e a execução prática de Luis Cabral, implantando o regime socialista com o apoio dos países de leste e Cuba, mas também da anuição da cooperação portuguesa e de muitos países que não eram comunistas. E, quem tivesse vivido muitos anos à espera de ver o comunismo implantado em África, que fosse a Bissau, que ficava admirado como Luis Cabral adaptou o regime colonial-salazarista, ao regime que,  penso eu, era o regime marxista, ou soviético, ou resumindo, o regime que o Salazar combatia e Nossa Senhora de Fátima dizia que era mau.


Como Luis Cabral conhecia bem a Casa Gouveia e o semi-monopólio da mesma, apenas lhe passou a chamar Armazéns do Povo e passou a administração para o PAIGC. Todo o comércio que se praticasse, desde a mancarra exportada a tudo o que fosse importado, ou recebido por doações, passava pelos Armazéns do Povo.


Até parecia fácil como aquele regime (económico) funcionava, e Luis Cabral mostrava um àvontade na governação que parecia que tinha nascido para governar. No caso da produção agrícola interna e transportes fluviais, foi seguir simplesmente o procedimento do colon, que ele conhecia bem, e projectou um melhoramento dos acessos fluviais herdados do colonMandou reconstruir pontes cais de Caboxanque, Cadique, acostamento  de Impungueda, Binta, e várias rampas para canoas.


Fez acordos de cooperação com técnicos de meio mundo para melhorar a produção de arroz, cajú, etc, e uma fábrica de transformação de produtos agrícolas no Cumeré, e até já tinha uma estrada projectada de Antula para o Cumeré sobre o canal do Ipernal. Não havia produtos à venda nas lojas dos portugueses e libaneses, era só prateleiras vazias, e quando os Armazéns do Povo tinham produtos para venda, fornecia essas lojas de venda a retalho.
Mesmo a venda de porta a porta do produto das mulheres que apanhavam camarão, com uma pesca muito característica aproveitando as marés, essas mulheres estavam proibidas de vender esse camarão, porque era defraudar a economia guineense, pois só os Armazéns do Povo podiam pôr esse camarão no circuito comercial. Assim como também era proibida a venda na via pública de  cajú ou mancarra torrada  pelas mulheres e crianças,  pela mesma razão de ser um crime económico.


Pode haver alguem eventualmente que duvide desta minha afirmação, mas desde já aviso que assisti a polícias perseguir mulheres e garotas, que frente à UDIB vendiam pequenas medidas de mancarra e camarão,  que tinham que fugir para não perder o produto.
Tambem foram criados postos de controlo em pontos estratégicos de acesso às cidades, sendo que o mais célebre era junto a Safim, que controlavam a circulação de pessoas e bens.


Vendo  como o governo de Luis Cabral implantava o sistema comunista, num país em que o povo aceitava tudo o que lhe era imposto, inclusive as filas (formas) para adquirir o simples pão ou arroz, e até aceitava que os membros e famílias do PAIGC tivessem o privilégio de não ir para as filas do pão, era natural que houvesse algum tipo de revolta, mas tal não se manifestava. E até parecia não haver muita violência, pois que em cada fila, ou nas padarias, ou nas lojas, ou no mercado municipal, um único polícia  era o suficiente para manter a ordem.


O governo e o PAIGC, ao fazerem a adaptação do sistema colonialista/capitalista ao sistema comunista, de um momento para o outro, tinha que haver alguma capacidade quer de autoridade como de capacidade governativa. A autoridade, essa, facilmente se encontrava na força militar do PAIGC. Mas a capacidade governativa  donde vinha, se os guineenses eram na maioria sem escolaridade,  e os mais estudados como os antigos estudantes do império, eram em número muito reduzido? E uma grande parte de gente guineense com mais preparação, não se deixou engajar pelo projecto de Amilcar Cabral?


Sem dúvida, para mim evidentemente, que Luis Cabral baseou a equipa governativa em gente de Cabo Verde, que temos que reconhecer, pelo que acontece com a governação de Cabo Verde, estavam bem preparados. E com a saída dos caboverdeanos em 1980,  com o golpe de Nino vieira sobre Luis Cabral, foi o total descalabro. Porque com todos os problemas que houvesse com Luis Cabral e os caboverdeanos no governo, havia uma enorme credibilidade internacional que foi posta em causa, e a rotina governativa que já existia foi desfeita e não havia outra alternativa preparada.


Os caboverdeanos da maneira como vencem as dificuldades de governar uma terra como Cabo Verde, fariam coisas maravilhosas na Guiné, se não fossem as contradições que é evidente que existiam no interior do projecto do PAIGC. Vão morrendo alguns, Luis Cabral, Vasco Cabral, Nino Vieira, por exemplo, sem relatarem quais as virtudes e os defeitos daquele projecto, o que poderia explicar alguns acontecimentos antigos e modernos que se passam na Guiné, e poderia ajudar a resolver alguns problemas, se alguem publicasse a história dos bastidores de Conacri, Havana e Moscovo. Mas quem conhecesse o que pensavam os angolanos e caboverdeanos antes de a  luta armada de libertação começar, desde funcionários públicos, estudantes ou comerciantes, sabia que eles diziam e pensavam que se governavam muito bem se a Metrópole os deixassem governar. Isto no caso do PAIGC e MPLA, não me refiro à UNITA e UPA (FNLA).


Indepententemente de concordarmos ou não que os diversos países africanos deveriam ficar independentes das metrópoles naquelas circunstâncias da guerra fria dos anos 50/60 do outro século, penso hoje que Angola e Moçambique e a Guiné tinham gente capaz de fazer das suas terras uns países de fazer inveja e que sabiam governar. Claro que também se sabe que os que podiam fazer daqueles terras, países sem guerras e com harmonia e prosperidade poucos ficaram nessas terras, sendo que a maioria está na Europa, Brasil  e até na América e Canadá ou já morreram.


Menciono apenas Amílcar Cabral e Luis Cabral para dar o exemplo dos que podiam fazer coisas lindas. Mas em Angola e em Portugal conheci e conheço muitas figuras públicas que podia mencionar e que andam por aí no jornalismo e na política portuguesa.


Então quem há uns tempos atrás tenha trabalhado em empresas de construção civil em Portugal, via que era rara a empresa em que nas chefias não houvesse um engenheiro angolano ou moçambicano e técnicos de toda a ordem.


Mesmo na Guiné houve sempre muitos engenheiros e técnicos angolanos e moçambicanos nas empresas portuguesas que trabalhavam como portugueses porque fugiram da guerra e da política entre os movimentos vencedores(!) nas suas terras de origem. Poderia haver desentendimentos políticos e até algum tipo de ditadura como também houve em Cabo Verde, mas aqui entenderam-se sem haver guerra nem quente nem fria nem tiros nem assassinatos.


Mas sem dúvida que Luis Cabral quase conseguia realizar alguns dos sonhos de Amílcar: o socialismo e a unidade. Enquanto ele governou funcionava, pelo menos aparentemente, o socialismo/comunismo, penso que com todas as suas características, pelo menos no campo económico. Quanto à unidade que Amílcar falava, pelo menos etnicamente,  parecia alcançada, apenas a unidade com Cabo Verde se saberá o que se passou, quando a história dos bastidores for publicada por aqueles que viveram por dentro dos mesmos.


Como tive ocasião de ser cumprimentado em grupos de trabalho,  mais que uma vez pelo presidente da República da Guiné Bissau,  Luis Cabral, em que o ouvi falar e senti o entusiasmo com que estava dedicado à Guiné, acredito que por ele, todos os sonhos de Amílcar Cabral se concretizariam. 


Mas uma coisa que sem dúvida falhou no projecto do PAIGC, e de Luis Cabral, foi a falta de colaboração do povo, principalmente dos mais idosos que viviam de braços caídos durante todos aqueles primeiros anos de independência. Mas se com Luis Cabral o socialismo não entusiasmou, com Nino Vieira dilui-se bastante com gilas, industriais de madeira (madeireiros),  importadores de vinho, empreiteiros, etc., até que foi dado por findo mais ou menos em 1990, tranquilamente.


Este testemunho do que vi não é documentado nem quantificado, apenas fotografado de memória e que se não tivesse visto e estado nas filas de pão e de peixe, mais de meio ano sem comer batatas (das nossas), matar a fome milagrosamente na pensão da Dona Berta, e os guineenses da  Tecnil já não compareciam ao trabalho porque não tinham arroz (fome em familia), não é para condenar nem aplaudir o governo ou as ideias do PAIGC.

É mais uma tentativa para compreender que ideias e projectos se realizaram e/ou ficaram por realizar na luta tremenda do PAIGC, que fazendo juz a uma máxima  que se ouviu durante muitos anos "e a luta continua", e que parece que ainda hoje continua.
 
Até porque se a governação na Guiné é complicada, pessoalmente gostei de trabalhar e conviver com imensos guineenses, e apesar das dificuldades, a dividir por todos não custa nada, a Guiné é mais tranquila e viável que muitos países africanos e até se vive muito melhor (os guineenses são mais humildes) que em muitos países latino-americanos.
Eu, pessoalmente,  já trabalhei no Rio de Janeiro, junto à favela da Rocinha, em que,  chegando às cinco da tarde,  chegava junto a mim um segurança armado até aos dentes, e dizia: 
- Cara, si tu não larga tudo e vai, dentro de 5 minuto tu tá por tua conta!


Espero que um dia os guineenses oiçam a explicação porque tinha que ser como foi, e aí talvez aqueles que estão de braços caídos se entusiasmem.
Cumprimentos para todos,


Antº Rosinha


[ Fixação / revisão de texto / título: LG]

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Nota de L.G.:

Guiné 63/74 – P7169: Fichas de Unidades (8): Batalhão de Caçadores N.º 4514/72 (Guiné, 1973/74) (José Martins)

1. Mensagem de José Marcelino Martins* (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), com data de 22 de Outubro de 2010:

Caro Luís

Já me não recordo se dei as informações solicitadas no mail abaixo, de qualquer forma segue:

Estive no Arquivo Histórico Militar a consultar a pasta 2-4-113-4 referente à História do BCaç 4514/72, mas o que a mesma contem é muito reduzido e não contem dados relevantes.

Pelo que li, as Unidades tiveram os seus mortos e feridos, mas não indica quem, limita-se a indicar o número de mortos e feridos o que leva a pressupor que os evacuados, como é lógico, contam como feridos.

No caso em análise, o nosso camarada Francisco Ferreira dos Santos terá sido um dos feridos em operações, provavelmente antes de 25 de Abril, evacuado para o Hospital de Bissau, vindo a falecer, em consequência dos ferimentos, na data de 10/Maio/74.

Provavelmente os ferimentos não aconselhavam a sua transferência para Lisboa.
Anexo segue a história da unidade, nos moldes habituais.

Envio com conhecimento ao Sr. José Conteiro, informando que poderá contar com a nossa colaboração, caso necessite

Um abraço
José Martins


FICHAS DAS UNIDADES (8)

Batalhão de Caçadores n.º 4514/72


Divisa: “POR VÓS"


Mobilizado no Regimento de Infantaria n.º 15, de Tomar, embarca em Lisboa a 3 de Abril de 1973, chegando a Bissau a 9 do mesmo mês.

Teve como Comandante o Tenente-coronel António Manuel Dias Falagueiro de Sousa Teles e Segundo Comandante o Major Eduardo César Franco Bélico Velasco, que viria a ser substituído no cargo pelo Capitão de Infantaria Jorge Xavier de Vasconcelos Mendes Belo, que era o Oficial de Informações e Operações/Adjunto da unidade.

O comando da CCS - Companhia de Comando e Serviços - foi desempenhado, sucessivamente, pelo Capitão SGE (Serviço Geral do Exército) José Augusto Dias Veloso, Capitão SGE Ponceano Alves Martins e Tenente SGE José João Morato Ferreira.

O Batalhão realizou o IAO (Instrução de Aperfeiçoamento Operacional) no Cento Militar de Instrução, no Cumeré, entre 11 de Abril e 6 de Maio de 1973, tendo seguido para o sector de Nova Lamego em 9 de Maio, para efectuar o treino operacional e a sobreposição com o Batalhão de Cavalaria n.º 3854. 

No entanto em 5 de Junho de 1973, no final do treino, é deslocado para a zona Sul onde sobrepõe e substitui o Comando Operacional n.º 4 (COP 4), instalando o Comando e a CCS em Cadique a 19 desse mês.

Assume a responsabilidade Sector S4 em 3 de Julho de 1973, em substituição do COP 4, tendo a sede em Cadique e com subsectores em Bedanda, Caboxanque, Cadique, Cafal, Cabedú, Chugué, Cobumba e Jemberem. Em 1 de Fevereiro de 1974 o sector é reduzido dos destacamentos de Chugué e Cobumba e em 9, desse mês, foi reduzido do destacamento de Jemberem.

Desempenhou a sua intensa actividade na área Sul, onde houve um recrudescimento de acções contra as nossas tropas.

Na actividade desenvolvida capturou, além de outro material, 1 pistola-metralhadora, 1 espingarda, além de detectar e levantar 19 minas.

Foi rendido em 23 de Maio de 1974 no Sector S4 pelo Batalhão de Artilharia n.º 6520/73, recolhendo a Bissau para posteriormente se deslocar para a zona Leste, para render o Batalhão de Caçadores n.º 3884, assumindo a responsabilidade do Sector L2, em 15 de Junho de 1974, com a sede em Bafatá. 

Na execução do plano de retracção do dispositivo milite português, desactivou e entregou ao PAIGC os subsectores de Sare Bacar em 20 de Agosto, de Fajonquito em 01 de Setembro, de Contubuel em 02 de Setembro e os aquartelamentos de Geba e Bafatá em 07 de Setembro, data em que recolheu a Bissau a aguardar embarque, que ocorreu em 08 de Setembro de 1974 (Comando, CCS e 3.ª Companhia).


Subunidades orgânicas:

1.ª Companhia – Comandada pelo Capitão Miliciano de Infantaria José Custódio Sanches Antunes e, depois de efectuar o treino operacional, em Cabuca, com a Companhia de Caçadores n.º 3401, assume, em 01 de Junho de 1973, a função de subunidade de intervenção e reserva do Batalhão de Caçadores n.º 3854, procedendo a várias actividades operacionais nos subsectores de Canjadude, Cabuca e Quibaba. 

Foi deslocada, provisoriamente, para Bissau em 11 de Julho de 1973 e seguindo para Cadique, no dia 22 de Julho, substitui a Companhia de Caçadores n.º 4540/72 assumindo a responsabilidade do subsector, integrada no comando e dispositivo de manobra do seu batalhão. 

Em 23 de Maio de 1974 é rendida pela 1.ª Companhia do Batalhão de Artilharia n.º 6520 e é deslocada para Contubuel, no Sector L2, onde rende a Companhia de Caçadores n.º 3547 e assume a responsabilidade do subsector em 15 de Junho de 1974. 

Em 30 de Agosto de 1974 inicia o deslocamento para Bissau, tendo permanecido no destacamento um pelotão que procede à entrega do mesmo ao PAIGC em 1 de Setembro. Regressa à Metrópole em 05 de Setembro de 1974, em conjunto com a 2.ª Companhia.

2.ª Companhia – Comandada pelo Capitão Miliciano de Infantaria Ramiro Filipe Raposo Pedreiro Martins e depois de efectuar o treino operacional, em Madina Mandinga, com a Companhia de Caçadores n.º 3406, foi deslocada para Farim, afim de substituir a 1.ª Companhia do Batalhão de Caçadores n.º 4512/72, assumindo a responsabilidade do subsector em 20 de Maio de 1973, deslocando para Cumtima um pelotão, para reforço da guarnição local.

 É substituída, em 14 de Setembro de 1973, pela Companhia de Caçadores n.º 4944/73 e segue para o Sector S4, substituindo a 2.ª Companhia do Batalhão de Caçadores n.º 4610/72, instalando-se em Cafine, subsector de Cafal, integrada no comando e dispositivo de manobra do seu batalhão, deslocando dois pelotões para reforço da guarnição de Cobumba. 

Em 23 de Maio de 1974 a 2.ª Companhia do Batalhão de Artilharia n.º 6520/73 substitui esta subunidade em Cafine e Cobumba, que se desloca para o Sector L2, indo assumir a responsabilidade do subsector de Fajonquito e destacando dois pelotões para Cambajá, onde substituiu a força ali instalado da Companhia de Caçadores n.º 3549. 

A 20 de Agosto de 1974 entrega ao PAIGC o aquartelamento de Cambaju, retirando a força para Fajonquito.

Inicia em 30 de Agosto o regresso a Bissau para aguardar embarque, regressando à Metrópole em 05 de Setembro de 1974, em conjunto com a 1.ª Companhia.

3.ª Companhia – Comandada pelo Capitão Miliciano de Infantaria Jorge Manuel Pedroso de Oliveira Martins, substituído pelo Capitão Miliciano de Infantaria Tiago Frederico depois de efectuar o treino operacional em Nova Lamego com a Companhia de Caçadores n.º 3405, assume, em 01 de Junho de 1973, a função de subunidade de intervenção e reserva do Batalhão de Caçadores n.º 4512/72, tendo sido deslocada para Guidage entre 10 de Junho até ao fim de Agosto de 1973, como reforço ao Comando Operacional n.º 3. 

Em 4 de Setembro de 1973 e rendendo a 1.ª Companhia do Batalhão de Artilharia n.º 6521/72, reforça a guarnição de Jumbemrem, integrada no dispositivo de manobra do seu batalhão. 

Tendo sido substituída pela 3.ª Companhia do Batalhão de Artilharia n.º 6520/73 em 23 de Maio de 1974, é deslocada, acompanhando o seu batalhão, para o Sector L2 onde, em 15 de Junho de 1974 rende a Companhia de Caçadores n.º 3548 e assume a responsabilidade do subsector de Geba. 

A 31 de Agosto inicia a deslocação para Bissau, ficando no local um pelotão para proceder à entrega do aquartelamento ao PAIGC em 7 de Setembro. 

Regressa à Metrópole em 08 de Setembro de 1974, em conjunto com o Comando e a CCS.


Tombaram em Campanha

Companhia de Comando e Serviços

Dinis da Conceição Marques, Soldado Atirador número mecanográfico 14842272, solteiro, filho de Eugénio Marques e de Maria José Conceição, natural do lugar de Vale de Tábuas, freguesia de Maçãs de Dona Maria e concelho de Alvaiázere, faleceu em 18 de Dezembro de 1973 no Hospital Militar de Bissau, vitima de ferimentos em combate em resultado de um ataque In na estrada entre Cadique e Jembemrem, aquando da protecção à reparação da estrada. Foi inumado no Cemitério Paroquial de Maçãs de Dona Maria.
(Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África 1961-1964, 8.º Volume – Tomo II - Livro 2, página 235/2)

João das Neves Fernandes, Soldado Atirador número mecanográfico 13190572, solteiro, filho de Fernando Fernandes e de Conceição das Neves Tavares, natural do lugar de Moita, freguesia de Oliveirinha e concelho de Aveiro, faleceu em 18 de Dezembro de 1973, vitima de ferimentos em combate em resultado de um ataque In na estrada entre Cadique e Jembemrem, aquando da protecção à reparação da estrada. Foi inumado no Cemitério Paroquial de Oliveirinha, no sarcófago exclusivo dos militares mortos no Ultramar.

(Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África 1961-1964, 8.º Volume – Tomo II - Livro 2, página 236/1)


1.ª Companhia

Alcino Dionísio Leal Rodrigues Gaio, 1.º Cabo Atirador número mecanográfico 11562572, solteiro, filho de Dionísio João Rodrigues Gaio e de Maria Zulmira Rodrigues Leal, natural da freguesia de São Félix da Marinha e concelho de Vila Nova de Gaia, faleceu em 19 de Novembro de 1973 no Hospital Militar de Bissau, vitima de ferimentos em combate em resultado de um ataque In ao aquartelamento em Cadique. Foi inumado no Cemitério de São Félix da Marinha.

(Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África 1961-1964, 8.º Volume – Tomo II - Livro 2, página 231/2)

Francisco Leite Costa, 1.º Cabo Atirador número mecanográfico 12269172, solteiro, filho de José Ferreira da Costa e de Leonor Leite, natural da freguesia de Vizela (Santo Adrião) e concelho de Felgueiras, faleceu em 02 de Janeiro de 1974, vitima de ferimentos em combate em Cadique. Foi inumado no Cemitério Paroquial de Vizela (Santo Adrião).

(Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África 1961-1964, 8º Volume – Tomo II - Livro 2, página 249/1)

Manuel Carreira Eusébio, Soldado Atirador número mecanográfico 12306072, solteiro, filho de Albino Fernandes Eusébio e de Elisa Torres Carreira, natural da freguesia de Aguçadoura e concelho de Póvoa de Varzim, faleceu em 02 de Janeiro de 1974, vitima de ferimentos em combate em Cadique. Foi inumado no Cemitério Paroquial de Aguçadoura.

(Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África 1961-1964, 8.º Volume – Tomo II - Livro 2, página 249/2)

Adriano Maria Alexandre, Soldado Atirador número mecanográfico 14182872, solteiro, filho de José Alexandre e de Maria Joaquina, natural do lugar de Moita, freguesia de Pataias e concelho de Alcobaça, faleceu em 25 de Fevereiro de 1974 no Hospital Militar de Bissau, vitima de ferimentos em combate em resultado de um ataque In ao aquartelamento em Jumbembem. Foi inumado no Cemitério Paroquial da Moita.

(Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África 1961-1964, 8.º Volume – Tomo II - Livro 2, página 263/1)


2.ª Companhia

João Moreira da Cunha, Soldado Atirador número mecanográfico 12653372, solteiro, filho de José Eduardo da Cunha e de Clarinda Moreira dos Santos, natural do lugar de São Gião, freguesia de Água Longa e concelho de Santo Tirso, faleceu em 07 de Fevereiro de 1974, vitima de ferimentos em combate em Cafine. Foi inumado no Cemitério da Paróquia de Água Longa – Lugar reservado aos combatentes.

(Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África 1961-1964, 8.º Volume – Tomo II - Livro 2, página 259/2)


3.ª Companhia

Henrique dos Santos Cabral, 1.º Cabo Atirador número mecanográfico 13916172, solteiro, filho de António Vicente Cabral e de Zulmira da Piedade Santos, natural da freguesia de Ponte de Penacova e concelho de Penacova, faleceu em 07 de Outubro de 1973 no Hospital Militar de Bissau, vitima de ferimentos em combate provocado pelo rebentamento de uma mina anti-carro em Jemberem. Foi inumado no Cemitério da Carvoeira – Penacova.

(Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África 1961-1964, 8.º Volume – Tomo II - Livro 2, página 225/2)

Augusto José Abreu, Soldado Atirador número mecanográfico 14342272, solteiro, filho de João da Silva Abreu e de Alda de Jesus, natural da freguesia de Agria Grande e concelho de Figueiró dos Vinhos, faleceu em 07 de Abril de 1974 no Hospital Militar de Bissau, vitima de ferimentos em combate em Jembemrem. Foi inumado no Cemitério Municipal de Figueiró dos Vinhos.

(Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África 1961-1964, 8º Volume – Tomo II - Livro 2, página 277/1)

Francisco Ferreira dos Santos, Soldado Atirador número mecanográfico 14246272, solteiro, filho de Francisco dos Santos e de Luísa Ferreira Eugénia, natural do lugar de Vale de Água, freguesia de Juncal e concelho de Porto de Mós, faleceu em 10 de Maio de 1974 no Hospital Militar de Bissau, vitima de ferimentos em combate. Foi inumado no Cemitério Paroquial do Juncal.

(Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África 1961-1964, 8.º Volume – Tomo II - Livro 2, página 285/2)

Manuel Tomé Ferreira, Soldado Atirador número mecanográfico 14420972, casado com Maria de Fátima Coelho Lourenço, filho de Manuel dos Santos Ferreira e de Maria Fernandes Tomé, natural da freguesia de Estela e concelho de Póvoa do Varzim, faleceu em 30 de Agosto de 1974, vitima de acidente de viação no itinerário Xime - Bafatá. Foi inumado no Cemitério Paroquial de Estela.

(Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África 1961-1964, 8.º Volume – Tomo II - Livro 2, página 301/1)

José Marcelino Martins
22 de Outubro de 2010
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 23 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7163: Patronos e Padroeiros (José Martins) (18): Nossa Senhora do Cheche

Vd. último poste da série de 12 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 – P6581: Fichas de Unidades (7): Companhia de Artilharia 2673 - CART 2673 (José Martins)

Guiné 63/74 - P7168: Notas de leitura (161): Guerra na Guiné, por Hélio Felgas (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 22 de Outubro de 2010:

Queridos amigos,
Não é à toa que digo que a leitura deste livro de Hélio Felgas nos teria feito muito bem a todos, os que fomos para a Guiné depois de 1967.
Nada sabíamos, não havia uma base escrita sobre o estado da guerrilha e as suas motivações. Como é evidente, Felgas escreveu uma obra para ressaltar uma resposta militar portuguesa que foi muito menos briosa e consistente do que ele apregoa. Porém, nada se escreveu de mais abrangente e com tanto pormenor.
Não sei como é que é possível termos andado arredados deste texto capital.

Um abraço do
Mário


Guerra na Guiné, por Hélio Felgas (1)

Beja Santos

Era o livro que eu gostaria de ter lido quando fui para a Guiné. O tenente-coronel Hélio Felgas publicou através do SPEME – Secção de Publicações do Estado-Maior do Exército, a sua visão dos acontecimentos da guerra da Guiné, desde 1961 a meados de 1965. Escreve: “Do lado do inimigo procuraremos descrever como começou o terrorismo em 1961, no noroeste da Província. Como se reacendeu naquela área no princípio de 1963, altura em que também iniciou as suas actividades no sul, de onde, em Julho seguinte, alastrou para as florestas do Oio, ao norte do Geba. Como se estendeu à área de Farim em Janeiro de 1964 tentando depois infiltrar-se para leste e para oeste. Como penetrou no Gabu, no nordeste da Província, em Agosto de 1964 e apareceu no Boé, a sudeste, no final desse ano. Como procurou chegar à área dos Manjacos, a oeste, em Novembro de 1964.

Do nosso lado focaremos como, quer em 1961 quer em 1963, dominámos por completo o terrorismo no noroeste da Província. Como procurámos deter as suas numerosas infiltrações nas outras áreas da Guiné, enfrentando no final de 1963 e na primeira metade de 1964 uma situação de certo modo difícil. Como começámos assentando uma malha de ocupação militar apertada e eficiente. Como obtivemos o concurso da quase totalidade da população. Como no final de 1964 eliminámos fulminantemente a infiltração do inimigo no sector dos Manjacos. Finalmente, como pouco a pouco, fomos dominando a situação militar nos outros sectores, obrigando o inimigo a afastar-se cada vez mais para as áreas fronteiriças”.

Como não podia deixar de ser, trata-se de um livro apologético escrito por um oficial com provas dadas no terreno e na escrita (um elevado número de artigos sobre o Congo ex-Belga, problemas africanos em geral, Timor e outros). O primeiro capítulo é dedicado à apresentação da Guiné (esboço histórico, clima fauna e flora, terra e população, vilas e cidades, meios de comunicação, aspectos históricos). A obra ganha realmente interesse no segundo capítulo dedicado aos grupos políticos clandestinos. Pela primeira vez, um oficial do Exército registava num documento público a constituição de grupos políticos emergentes na Guiné, com os ventos da descolonização: Movimento de Libertação da Guiné (MLG), com sede em Dakar, foi de facto no Senegal que se acolheu este grupo como outros, caso da União das Populações da Guiné (UPG), a União Popular para a Libertação da Guiné (UPLG), o Rassemblement Démocratique Africain de la Guinée (RDAG) e a União dos Naturais da Guiné Portuguesa (UNGP). Como o tempo veio a demonstrar, a despeito das muitas tentativas de Senghor crer ver impulsionado um partido genuinamente guineense e não marxista, a generalidade destes grupos limitavam-se a um grupo directivo, decorativo e imaturo, tudo pequenos funcionários ansiosos por ter uma oportunidade de chegar ao poder. O que tinham em comum era crerem “a Guiné para os guineenses” e bastou este motivo central para entrarem em conflito insanável com Amílcar Cabral e o PAIGC. Hélio Felgas chega mesmo a falar em Benjamin Pinto Bull e a sua UNGP, mas não adianta nada sobre as conversações pessoais ditas com Salazar. Do conjunto destes grupos veio a distinguir-se a FLING que virá a funcionar como chapéu-de-chuva da maior parte dos grupos que com o tempo se irão dissolvendo. O MLG considerava-se como continuador da efémera Liga Guineense, constituída no início da República e que procurou zelar por condições de prosperidade e de impulso económico da região. O MLG era a favor de Guiné constituir um Estado federal de Portugal, ideia que não vingou. Na sua propaganda, o MLG manifestava um conflito permanente com os cabo-verdianos a quem atribuía o propósito de quererem dominar os guineenses. Não desprezando a ideia de uma cooperação com o PAIGC era radicalmente contra a união Guiné – Cabo Verde. O seu dirigente era um Manjaco que falava só francês, François Mendy. É o MLG quem irá praticar os primeiros actos de terrorismo em São Domingos, Susana e Varela, em Julho de 1961. Estas escaramuças não tiveram continuidade e aliás a população guineense recebeu-as, de um modo geral, com repúdio, quando assaltaram Varela tudo pilharam e vandalizaram.

A FLING teve núcleos na Guné Conacri, levando para aqui os seus conflitos com o PAIGC. Amílcar Cabral foi forçado a uma atitude de persuasão junto de Sekou Touré para retirar apoio à FLING. Chegou a participar em reuniões promovidas pela Organização da Unidade Africana, mas acabou por não ter continuidade e muito menos desenvolveu uma linha militar. Também Senghor quis apoiar a FLING, chegou mesmo a autorizar a instalação de um campo de treino em Kolda, a poucos quilómetros de Cuntima (Colina do Norte). A irresponsabilidade e a pesporrência liquidaram internacionalmente a FLING. O seu presidente chegou ao atrevimento de declarar que “de Bissau a Catió, de Mansoa a S. Domingos, de Bolama aos Bijagós, de Barro a Xitole, passando por Farim, Bafatá, Bambadinca, não há um palmo de terra guineense onde os habitantes não sejam um militante ou soldado da FLING”. Seja como for, a FLING teve audiência até 1965, entrou depois na obscuridade, isto enquanto o PAIGC era alvo de uma progressiva consideração nos fóruns internacionais.

O PAIGC teve um percurso distinto. Criado em 1956, dota-se de uma estratégia em 1960 (então ainda com o nome de PAI) prepara militares nas academias chinesas, mantém um elevado esforço de aliciamento ideológico graças a personalidades como Rafael Barbosa. O secretariado do PAIGC instala-se em Conacri, é nesta República que começam a chegar os primeiros armamentos que vão sendo transferidos para o interior do território. O PAIGC notabilizou-se por ter impulsionado uma federação de movimentos de libertação das colónias portuguesas. Aliás Cabral terá um papel preponderante na história do PAIGC. As tensões entre o PAIGC e o Senegal foram muito difíceis durante anos. Desde muito cedo que Cabral se lançou nos areópagos internacionais ido obter apoio não só em diferentes países africanos como junto da China comunista, primeiro, e da União Soviética e dos seus aliados, depois. Confundindo as autoridades militares portuguesas, as primeiras incursões do PAIGC na Guiné-Bissau não foram junto das fronteiras mas no interior. Tudo começa em Tite, em Janeiro de 1963, nessa altura a região Sul estava significativamente madura para apoiar o PAIGC, os seus grupos foram sistematicamente destruindo os meios de comunicação, isolando os quartéis portugueses.

O capítulo terceiro é dedicado aos actos de subversão até ao final de 1973. É um relato detalhado sobre tudo quanto se passou na região Norte, envolvendo o MLG. Hélio Felgas descreve a situação do Sul, a partir de 1963, deixando bem claro que os guerrilheiros se apropriaram do terreno. Descreve-os assim: “Estes bandos inimigos não diferiam essencialmente dos utilizados no noroeste da Província pelo MLG. Eram formados por um núcleo de uma dezena de indivíduos armados de pistolas-metralhadoras, pistolas, caçadeiras e granadas de mão, rodeado por uma centena ou mais de Balantas e Nalus dispondo apenas de armas gentílicas e de espingardas roubadas aos nossos cipaios. Cada um dos elementos do núvcleo tinha ao pé de si três ou quatro nativos com a missão de lhe apanharem a arma ou recolherem o corpo, caso ele fosse ferido ou morto”. Outros relatos posteriores levaram a desmentir este tipo de actuação, mas a verdade é que o PAIGC nesta altura não dispunha de bazucas e morteiros, iniciara-se com armamento ligeiro e com a implantação de minas.

Este importante livro foi-me emprestado pelo António Duarte Silva, a quem devemos alguma da melhor investigação que se faz presentemente sobre a Guiné.

(Continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 22 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7160: Notas de leitura (160): Descolonização Portuguesa - O Regresso das Caravelas, de João Paulo Guerra (2) (Mário Beja Santos)

sábado, 23 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7167: Ser solidário (93): Vamos ajudar a Associação de Estudantes de Gadamael em Bissau, o Inussa Intchasso e os seus colegas (Fernando Miguel Naves)

1. Mensagem de Fernando Miguel Naves, cooperante na Guiné-Bissau, com data de 19 de Outubro de 2010:

Caro Luís Graça,
Desde já saúdo o seu blogue, tão importante como veículo de partilha para todos os que estiveram na Guiné-Bissau, em circunstâncias tão diferentes daquelas que recebem hoje os portugueses que lá trabalham, estudam, cooperam etc. Eu sou um desses portugueses que conheceram a Guiné-Bissau, e particularmente Gadamael, nas condições actuais, e quero propor neste email algo que penso será do seu interesse e dos muitos camaradas que estiveram em Gadamael.

Talvez lhe cause surpresa ao saber que tenho 26 anos, mas posso garantir que, embora a distância no tempo e as circunstâncias tenham sido radicalmente diferentes, também eu sinto carinho e saudade pelas gentes de Gadamael.

Estive em Gadamael a fazer trabalho de campo para uma investigação biológica e social, onde acampei durante vários meses. Tendo-me deslocado sozinho para Gadamael, fui acolhido de braços abertos por aquela gente maravilhosa e rapidamente me misturei na comunidade local e me senti perfeitamente em casa.

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Gadamael Porto > 10 de Outbro de 2010 > A pista de aviação (ou melhor, o que resta dela)...
Foto (e legenda): © Pepito / AD -Acção para o Desenvolvimento (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados

O objectivo do meu email é uma proposta, que, ao ver os comentários de José Casimiro e outros ao post de Pepito sobre Gadamael, me parece irrecusável para os que continuam a ter vontade de ajudar a população daquela aldeia.

Confio que um dos principais meios de ajuda será a educação, pois julgo que pode dotar os "filhos" de Gadamael com ferramentas que possam ajudar a desenvolver a sua terra e a trazer mais e melhor formação, saúde etc.

Ainda em Gadamael, comecei a ajudar um rapaz de 18 anos, o Inussa Intchasso, cujo pai não tinha dinheiro para lhe pagar uma ida para a escola. O sonho do rapaz é ser professor e ensinar às crianças de Gadamael no futuro. Fiquei sensibilizado pois ele mostrava muita vontade de aprender e comecei a pagar-lhe uma escola de qualidade em Bissau, acrescido de um curso de francês e informática, assim como uma pequena ajuda para cadernos e lápis. Fez a diferença total para a vida dele, vejo agora. Um rapaz que não sabia o que era a internet no final de 2009, e que agora me põe a par dos seus estudos por email. Foi comovente receber o seu primeiro email.

A ideia que me surgiu foi replicar esta iniciativa, pois assim como ele, são vários os estudantes de Gadamael que vão para Bissau e mal têm dinheiro para um caderno e um lápis, e frequentam escolas de ensino francamente mau. Gostaria de ajudar mais mas, como estudante, não tenho capacidade de ajudar mais que um.

Gostaria portanto de propor um sistema que pode ser desenhado em conjunto com os que estiverem interessados, de apadrinhamento de alunos de Gadamael em Bissau, de maneira a investir no futuro individual de cada um, mas ao mesmo tempo no futuro da própria Gadamael. A ideia seria cada um de nós apadrinhar um aluno, ou aluna, tal como eu já estou a fazer, e garanto que não se gasta muito dinheiro.

Gostaria muito de discutir em conjunto com os interessados e conseguir um intermediário de confiança em Bissau que possa assegurar a distribuição justa das ajudas a cada aluno, por exemplo o nosso amigo Patrício, que trabalha há 20 anos em Bissau e que seguramente muitos de vós conhecem, ou então o Pepito através da AD. Penso que seria interessante discutir isto em conjunto.

Gostaria de dizer também que este aluno, o Inussa, a quem pago a escola e materiais, teve a iniciativa (da qual me orgulho), de fundar a associação de estudantes de Gadamael em Bissau, a qual diz terem 46 membros, e foi a partir desta informação, pois não sabia que eram tantos em Bissau, que me surgiu esta ideia de proposta que apresento aqui.

Não me alongo mais, espero sinceramente obter um retorno de si, e que talvez possa reenviar a mensagem a quem interesse, pois eu não tenho mais contactos,

Desde já um obrigado imenso pela consideração,
Saudações cordiais,
Fernando Sousa
miguelnaves@yahoo.com
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 23 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7161: Ser solidário (92): Ainda a propósito das iniciativas da ONGD - Ajuda Amiga (António Estácio)

Guiné 63/74 - P7166: Blogoterapia (163): Recordações da infância (Felismina Costa)

1. Mensagem da nossa tertuliana Felismina Costa* com data de 22 de Outubro de 2010:

Boa-noite editor e amigo Carlos Vinhal!
Dando sequência às minhas memórias, trago hoje a público recordações da minha infância que primam pela agradável recordação dos primeiros anos, onde a família fez questão de me dar a perceber, que eu era para eles um elemento importantíssimo.

Se achar que tem algum interesse publicar, uma vez que saí do âmbito do blogue, faça o favor!



Recordações da infância

Nas grandes noites de Inverno, de chuva, frio e ventania, o aconchego do lar e o calor humano que me rodeava, fizeram com que as recordações permaneçam em mim.

Hoje quero falar do meu avô materno, Carlos Costa de seu nome, que juntamente com minha mãe foram os mais directos responsáveis na minha formação.

Depois do jantar, e arrumada a cozinha, sentávamo-nos à volta da lareira na casa do avô, com quem vivíamos.
A avó Adelina, pouco interventiva, fazia meia, sentada no lado direito do semi-circulo que formávamos frente à lareira.

A mãe costurava a roupa que vestia a prol, e eu, sentada entre a mãe e o avô, ouvia encantada as suas histórias de vida.
O avô fechava o semi-circulo à esquerda.

À nossa frente, um lume aceso e agradável ia sendo moderadamente alimentado por lenha de azinho, seca durante o Verão, e guardada em lugar seco durante o Inverno, para tornar aprazível aquela lareira dos serões familiares.

Nem televisão nem rádio incomodavam as nossas mentes, que estavam permanentemente disponíveis para ouvir contar aos mais velhos, as histórias que recordamos com saudade.

Lembro-me desde os meus seis anos de idade, de acompanhar interessadíssima, os serões familiares.
O pai, magnífico contador de estórias, deitava-se cedo, para cedo se levantar e sair para o trabalho, que quase sempre era longe de casa.
Então a avó Adelina, a mãe, eu e o avô Carlos, permanecíamos até por volta da meia-noite, junto à lareira em agradável e amena cavaqueira.

Seguro e indesmentível, o avô oferecia-nos o seu passado, o seu conhecimento, a sua vivência, religiosamente escutado.

Comecei por saber que o avô tinha nascido em 1896, que em criança tinha feito a 4.ª classe com distinção e que os professores o haviam aconselhado a prosseguir os estudos, mas a falta de estruturas na localidade e as dificuldades económicas, fizeram com que ficasse por ali.

Tive ao longo da vida oportunidade de constatar a sua inteligência, o seu gosto pela cultura e a sua capacidade de análise a tudo o que o rodeava.

Lia interessadíssimo jornais e revistas da época, que assinava, e guardava extraordinárias revistas a cores de grande formato, sobre a 2.ª Grande Guerra , que cedo comecei a ler.
O avô tinha sido 1.º Grumete Escriturário da Armada Portuguesa durante a Primeira Grande Guerra.
Contava ter assistido à revolta dos marinheiros, durante o período em que cumpria o serviço militar, e tinha sido acusado de pertencer à dita sublevação. Preso e presente a Tribunal de Guerra, o avô fez a sua própria defesa tendo sido absolvido.
Eu bebia as palavras do avô! Extasiada! O avô era para mim... um herói.

No fim do serão, um café de cevada ou um chá quentinho e umas torradas feitas na lareira, confortavam-nos o coração, porque a alma já estava ricamente confortada.

Ao longo do dia acompanhava-o nas sementeiras e na labuta à volta da casa, que ele construíra com as suas próprias mãos, e onde tinha aplicado os seus conhecimentos, para se rodear e aos seus, do maior conforto possível. Até os animais domésticos que possuíamos tinham alojamentos confortáveis. Respeitador de todas as formas de vida, nunca o vi matar um animal doméstico, era a minha mãe, mulher de grande coragem, que tal como os criava com prazer, também os matava para nos alimentar.

A cerca ao lado da casa, que o avô cultivava, foi o meu primeiro palco, onde cantei a alegria de existir!
Misturava-me com as flores e as aves, e encantava-me no azul do céu e nas nuvens.
Nas primaveras da vida e do tempo, apreciei encantada, as quatro estações!
Rodeada de carinho, sentia a importância que tinha para todos.

Livre, podia brincar até anoitecer.
Correr, sentindo a leveza do corpo criança, era um prazer indescritível!
As nuvens no céu de Abril, corriam ligeiras como eu, que observava as suas formas desmultiplicadas, que desenhavam naquele céu azul e lindo, as mais variadas figuras.

E, nas noites de Verão, luminosas e calmas, onde só o cantar das cigarras e dos grilos quebravam o silêncio, eu e o avô, sentados no banco frente à casa, observávamos o céu.
O céu magnifico da minha infância magnifica!
Lua, estrelas e um cometa (que passava na altura), faziam as delícias da nossa observação.
As estrelas cadentes assustavam-me na sua queda aparatosa.


Foi o avô, que me ensinou a conhecer as constelações como a ursa maior e a ursa menor, algumas estrelas, as fases da lua, Vénus e Júpiter igualmente.
Desse tempo me ficou a adoração pelos astros, e todas as noites, antes de me deitar, abro a janela da cozinha, e olho agradecida o pouco que me é permitido ver.Vénus continua a encantar-me, e perfila-se frente ao meu observatório.

Quando eu e o avô dávamos por terminada a observação da noite, o avô vinha até à ponta da rua da casa, e, olhando para Oriente, fazia as suas previsões meteorológicas, baseado, não sei em que factores, mas muitas vezes saíam certas.

Fui crescendo sempre próxima desse grande e velho amigo, que marcou positivamente a minha existência, e, sempre que eu chegava à sua beira me dizia com um sorriso... olá minha neta!

Foi o meu primeiro professor!
O meu primeiro dicionário.
Devia-lhe esta Homenagem!

Felismina Costa
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 17 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7141: Blogoterapia (162): Juventude, anos sessenta (Felismina Costa)

(Imagem retirada da Internete)

Guiné 63/74 - P7165: Estórias do meu amigo de infância Alfredo Ramos, ex-Sold Condutor Auto da CCAÇ 556 (Guiné, 1963/65) (Arménio Estorninho)

1. Mensagem de Arménio Estorninho* (ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas, CCAÇ 2381,Ingoré, Aldeia Formosa, Buba e Empada, 1968/70), com data de 20 de Outubro de 2010:

Amigos e camaradas editores, saudações tabanquenhas
O Soldado Condutor Auto Alfredo Ramos, indo ao fundo do baú, tirando as recordações e sacudindo o pó (passados 45 anos), agora narra “estórias” que aconteceram entre si e o ex–Alf Mil Jorge Rosales, quando faziam parte do 1.º GCOMB, colocado no Destacamento de Porto Gole, da CCaç 556, Guiné, 1963/65, Bissau, Enxalé e Bambadinca.

Dei conhecimento aos dois intervenientes da minha pretensão, em que fossem postadas no blogue as suas lembranças.

Pela amizade e camaradagem, os cumprimentos a toda a tertúlia.
Com um Abraço
Arménio Estorninho


Estórias do meu amigo de infância Alfredo Ramos

Reportando-me ao Poste 7092, dedicado ao aniversário do nosso amigo e camarada Jorge Rosales, está inserida uma foto onde se encontra o aniversariante e o Sarg. Arlindo Verduga Alface (paz à sua alma), era natural do Cano – Alto Alentejo e ao tempo Comandante de uma Secção de Soldados oriundos da 1.ª CCI de Farim. Sendo a foto do meu interesse, devido na mesma conter um marco histórico e porque estava a ultimar um trabalho sobre a chegada dos primeiros navegadores Portugueses à Guiné.

Foto 1 > Guiné > Região de Bafatá > Parada de Porto Gole > 1964 > O amigo e camarada Jorge Rosales, junto do marco histórico colocado na parada. Actualmente este marco assinala o V centenário da descoberta da Guiné, 1446-1946.

Dai até eu entrar em contacto com o camarada Jorge Rosales foi um instante, predispondo-se ele a me facultar aquela e mais outras das suas fotos, de Porto Gole. Entre as mesmas vinha uma onde constava um Soldado detendo uma macaquinha saguim, sendo dadas as referências, de que ele se chamava Alfredo, era de Ferragudo e que aparecia por vezes pela praça dos táxis local.

Pelo conhecimento que tenho do concelho de Lagoa, foi fácil indagar e logo tomando conhecimento de que se tratava de Alfredo Ramos, natural e residente em Lagoa, que fora proprietário de um táxi na praça de Ferragudo.

Andámos na mesma Escola Primária, jogámos com a mesma bola de trapos, ao berlinde e ao rapaz pirata nas mesmas ruas, e tantos outros jogos da nossa infância.

Como eu vi o camarada Alfredo Ramos, algarvio humilde, com a voz embargada e uma lágrima ao canto do olho, aquando dialogava via telemóvel com o seu ex-Comandante do Grupo de Combate o amigo e camarada Jorge Rosales.

Estando já na posse das informações e das fotografias, dirigiu-me a casa do meu vizinho Alfredo, que na circunstância se encontrava em casa onde me recebeu com toda a simpatia pessoal. Disse-lhe o porquê de ali estar, mostrando-lhe as fotos e se nas ditas conhecia alguém, retorquindo prontamente: "este sou eu tendo à trela a macaquinha “Gabriela,” o outro é o meu Alferes Jorge Vilar Rosales que está a provar o rancho".
Diga-se que a macaquinha saguim ”Gabriela,” veio para Portugal e ainda viveu mais 20 anos.

Foto 2 > Guiné > Região de Bafatá > Destacamento de Porto Gole > 1964 > À esquerda da foto o Soldado Alfredo Ramos, segurando a macaquinha saguim “Gabriela” enquanto Alf Mil Jorge Rosales prova o rancho.

Tudo esclarecido e nos conformes, resolvi ligar ao amigo e camarada Jorge Rosales. Do outro lado atendeu-me um filho, tendo para o efeito encaminhado o solicitado contacto e havendo dialogo com certa divagação na presença do Alfredo a fim de se relacionar.

Passei o telemóvel ao Alfredo Ramos, e o que eu ouvi mas só do lado de cá, foi:

- Olá meu Alferes como está…, tudo bem…, eu já estou aposentado…, então quando vem ao Algarve…, quando passar por Lagoa tem um quarto para ficar…, é no Largo do Jardim 5 de Outubro, n.º 32, e não se esqueça porque tenho muito gosto em recebe-lo em minha casa.

Estando a aperceber-me que o Alfredo, um genuíno algarvio, tinha a voz embargada e as lágrimas nos olhos, e sentindo o que se passava, fiquei também com um pouco de comoção. Tudo se passou em fluente português, lindo… lindo..!

A ”estória” contada pelo camarada Alfredo Ramos, que pretendia ir a Bissau “tirar” a carta profissional de condução auto. O seu desenfianço de Porto Gole e o desenrascanço em Bissau.

Estando o Comando da CCaç 556, colocado em Enxalé, o Soldado Alfredo Ramos solicitara autorização ao Comandante da Companhia, Cap. Inf. Fernandes Gonçalves Foitinho para ir “tirar” a carta profissional de condução auto, sendo o pedido recusado por haver falta de condutores.

Ora, Porto Gole era um Destacamento, estando o amigo e camarada ex-Alf Mil Jorge Rosales a comandar o 1.º GCOMB, o Alfredo Ramos lastimou a sua vida e recebera daquele um “vou pensar no teu assunto.”

Foto 3 > Guiné > Região de Bafatá > Campo de futebol de Porto Gole > 1964 > Uma equipa de futebol, em que os metropolitanos eram do 1.º GCOMB/Caç 556. De pé, a partir da esquerda: 1.º Cabo do Morteiro, 1.º Cabo da Bazuca, Sold At e Sold Cond Auto Alfredo Ramos. Agachados: 1.º Cabo de Transmissões António José, Fur Mil Enfermeiro, e o último não identificado. Quanto aos guineenses, eram de uma Secção da 1.ª Companhia (CCI) oriunda de Farim.

Porque vulgarmente os Fuzileiros entre os quais o Ten. Fuzileiro Crispim, aportavam a Porto Gole e aqui faziam umas jogatinas de futebol. Assim, o ex-Alf Mil Jorge Rosales e o Ten. Fuza, acordaram a forma de o Alfredo Ramos se deslocar a Bissau.

Depois de tudo acertado o camarada Alfredo Ramos foi autorizado verbalmente a deslocar-se a Bissau. Não seria portador de passaporte, seguiria num barco dos Fuzas e voltaria na mesma forma.
Conquanto em Bissau teria que se desenrascar, não andar em distúrbios e/ou ser interceptado. Evitando problemas para si próprio, para o Comandante do Destacamento de Porto Gole e contornando dessa forma o RDM.

Em Bissau, o bom do camarada Alfredo Ramos sempre muito compenetrado, encontrava amigos e fazia-lhes um choradinho justificativo. Indo almoçar, jantar e dormindo conforme o mais oportuno, no Destacamento dos Fuzas, na Polícia Militar na Amura e na Base Aérea C.C. Pára-quedistas. Neste último lugar é que a coisa ia-lhe saindo da pior forma, pois tendo procurado o nosso conterrâneo Pára-quedista Jacinto, com o dito choradinho lá foi convidado a ir para a Base tomar uma refeição. Estando sentado no refeitório apareceu-lhe o Oficial de Dia à Companhia, e como era facilmente identificável pela farda, foi-lhe feita a pergunta de quem o autorizou a estar aqui a comer. “Tremedeira total e vontade de meter-se no mais pequeno buraco.” Logo em sua defesa se levantou o Pára-quedista Jacinto, informando que fora ele quem o convidara porque era seu conterrâneo e estava com fome. O Oficial de Dia à Companhia aceitou a situação por ser o Jacinto mas…, quando acabasse de comer devia retirar-se. Já fora do Quartel outros Pára-quedistas disseram que podia-se ter dado uma sublevação e deram a justificação de o Jacinto já ter mais castigos que saltos de pára-quedas.

Foto 4 > Bissau > Região de Bafatá > Parada de Porto Gole > 1964 > Alfredo Ramos envergando a farda amarela. Ao fundo o rio Geba.

O camarada Alfredo Ramos, concluiu com aproveitamento o exame de condução profissional de veículos automóveis pesados e partiu lesto para Porto Gole.

Chegado, apresentou-se ao Comandante do 1.º GCOMB do ex-Alf  Mil Jorge Rosales, sendo este colocado ao corrente dos acontecimentos e informado que não houvera qualquer ocorrência de registo. Tudo se recompôs.

O Alfredo Ramos, agora em Porto Gole, já tinha a sua cama, a comidinha e roupa lavada atempadamente. Porque para um soldado desenfiado em Bissau, a frequentar a escola de condução a fim de obter a carta profissional de veículos pesados e os Pesos a escassear, a coisa não era fácil.

Um caso disciplinar resolvido a contento, entre o ex-Alf Mil Jorge Rosales e o Sold. Alfredo Ramos.

No entanto não há bela sem senão, o Sold. Alfredo Ramos, estando certa noite de sentinela num posto de vigia, por descuido como se costuma dizer, aconteceu-lhe um grande azar. Estando a passar pelas brasas na hora que o ex-Alf Mil Jorge Rosales fora fazer ronda, este assentou-se a seu lado. O Sold. Alfredo ao despertar toma consciência da imprudência, defendo-se que não estava a dormir, mas não se safou de cinco reforços "à benfica", ficando só por ai.

Foto 4 > Bissau > Região de Bafatá > Porto Gole > Rio Geba > 1964 > Barco civil de transporte de mantimentos e material de manutenção. Militares do 1.º GCOMB/CCaç 556. Identificado só o 1.º elemento que está junto à proa do barco, dentro de água, trata-se do camarada Alfredo Ramos.

E assim, o nosso camarada Alfredo Ramos está grato ao seu bom amigo Jorge Vilar Rosales do qual ainda sabe de cor o seu nome completo, porque não quis ter a mão pesada (participação disciplinar) e embora sendo um risco, facultara-lhe a possibilidade de obter a carta de condução profissional de veículos autos pesados, permitindo-lhe posteriormente como bom condutor ter exercido a profissão de motorista particular de ”Sua Alteza Real Infanta D. Filipa de Bragança,” de proprietário de um táxi na Praça de Ferragudo e de condutor camionista na Câmara Municipal de Lagoa.

Nota: - Este trabalho foi observado pelo amigo e camarada Alfredo Ramos, tendo sugerido acertos e dando conformação ao seu conteúdo.

Pela amizade e camaradagem, os cumprimentos a toda a tertúlia.
Com um Abraço
Arménio Estorninho
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Nota de CV:

15 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7133: Descoberta do Senegal e da Guiné, pelos Portugueses (2) (Arménio Estorninho)

Guiné 63/74 - P7164: Meu pai, meu velho, meu camarada (24): Bijagós, memórias de menino e moço (Manuel Amante)



Guiné-Bissau > Bolama > s/d > Cais > Uma canoa nhominca, para transporte de passageiros 

 Foto: © Patrício Ribeiro (2009). Todos os direitos reservados.


1. Eis um belo texto sobre uma das mais belas regiões da Guiné, os Bijagós, que  a maior parte de nós, antigos combatentes, não conhece, não conheceu nem nunca  terá, infelizmente, oportunidade de conhecer... 

O embaixador Manuel Amante da Rosa, que foi nosso camarada de armas em 1973/74, e que tem hoje funções de responsabilidade na CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, autorizou-me em tempos a reproduzir esse texto, que ele escreveu para a sua filha, Carla,  autora do blogue Amante da Rosa, e que vive (ou vivia na altura) em Cabo Verde... É um blogue que eu visitava regularmente mas que infelizmente fechou, entretanto (embora continua a ser pesquisável na Net). Apresenta(va)-se nestes termos: "Meu Cabo Verde. História e Estórias. Minhas raízes, família e recordações. A Guiné. Pensamentos e Imagens. Sem ordem cronológica"...

Com a devida vénia, e como homenagem à Carla, ao pai Manuel Amante e ao avô paterno, em cujo barco, o Bubaque, muitos nós, malta da zona leste da Guiné, deve ter viajado entre Bissau e Bambadinca, entre 1961 e 1974, permito-me transcrever este texto de antologia, que o Manuel Amante escreveu para a sua filha Carla, em memória do seu velho... (Julgo que as ilustrações são da responsabilidade da autora do blogue).

Uma resslava: apesar de termos na nossa posse, digitalizadas, todas as cartas do arquipélago dos Bijagós - oferta do nosso camarada Humberto Reis, em 2005 - , nunca as chegámos a pôr  "on line", por razões de segurança... Ficam, no entanto, à disposição dos amigos e camaradas que precisaram delas, por razões de turismo, solidariedade, investigação ou outras razões a avaliar, caso a caso e mediante pedido pessoal ao editor Luís Graça. (LG).

Fonte: Blogue Amante da Rosa > Setembro 10, 2007 > Bijagós, memórias de um pai


2. Meu pai, meu velho, meu camarada > Bijagós, memórias de menino e moço
por Manuel Amante (**)


Após a separação dos meus pais, aí por volta dos meus dez anos, passei a fazer parte do espólio do meu velho. Ele, aos 33 anos, com o fim do casamento, reinventara-se marinheiro errante e pescador, desventurado que estava com o início da guerra que o impedia de circular pelas estradas da Guiné. Já lhe estava na matriz de ilhéu o destino de ser um deambulante incansável e, na altura, a pretexto de uma fuga imaginária, transferiu a sua sanha de aventuras para a descoberta um arquipélago desconhecido, onde poderia livremente saltar de uma ilha para outra. Um lugar onde as lágrimas que foi vertendo, certamente a olhar para lá das ilhas de Caravela e de Unhocomo, se foram diluindo na mistura baça resultante do encontro das águas do Rio Geba e do Atlântico.

O horizonte longínquo que em algumas ocasiões pairava no seu olhar perdido foi-me decifrado numa manhã solarenga, de mar prateado, com vento de través, no canal entre as ilhas de Uno e Orango, quando murmurou, agarrado à cana do leme que aquela canoa, a sua Ave do Paraíso como carinhosamente a apelidava, certamente que aguentaria ir até à ilha de Santiago,  em Cabo Verde. Mal sabíamos os dois que, quase 40 anos depois, milhares de africanos, a fugir da miséria e instabilidade, desafiariam o destino e as intempéries nessas frágeis embarcações para chegarem tanto às ilhas de Canárias como às ilhas creolas.

O desterro voluntário do velho, por longos períodos, tinha sido a encantadora ilha de Sogá,  no arquipélago dos Bijagós. E eu, orgulhosamente só,  em Bissau. Os meus outros dois irmãos mais novos, o Rui e o Djoi, tinham acabado por regressar à protecção e segurança do lar materno. Lá ia aguentando menos mal a casa da madrasta onde nunca me integrei.

Tornei-me também, junto de outros companheiros de mais idade do Bissau Velho, um aventureiro incorrigível de caça, dos banhos e pesca de bentaninhas e bagres nas bolanhas próximas da segunda ponte, lá para os lados de Bulola. Nadávamos em grande algazarra e descontraidamente junto de grandes saltões, de sapos, de lagartixas, de garças, de raras linguanas e de cobras que por vezes se entremeavam, de cabeça erguida, no nosso meio à procura de sossego ou da outra margem, sem contar com os crocodilos que, sempre que alguém gritava lagarto,  saltávamos em debandada para fora da água. Apesar de alguns terem dito que lhes viam, ali na segunda ponte, nunca os vi. Inventávamos os saltos mais arrojados para a água,  em especial o arratchacoco, que repetíamos vezes sem conta em cima dos mais incautos.

[bjg2.bmp]Outras vezes, num grupo mais pequeno embarcávamos na lancha Barreiro ou no pequeno Gouveia 16 e íamos para o ilhéu do Rei com os operários da fábrica de óleo de amendoim. Esta aventura era somente para os mais destemidos e que aguentavam fome. Ali não havia árvores de fruto ou quem se condoesse connosco. Voltávamos cedo e durante dias sentíamos o odor do óleo de mancarra para onde fossemos.

Por vezes, caminhávamos bem mais longe. Até vermos Cumeré do outro lado de um pequeno rio lodoso, o Impernal. Outras vezes ainda caminhávamos alegres, nus ou semi nus, com a roupa enrodilhada na cabeça, cana de pesca no ombro e a indispensável fisga ao pescoço, sempre em bicha de pirilau, através dos diques das bolanhas e canaviais, através de grandes extensões de terra alagada, até sairmos atrás do quartel de Santa Luzia e entrarmos na Granja do Pessubé (***). Aqui, num jogo de esconde-esconde com os guardas, surripiávamos fruta e nos banhávamos, se possível, no tanque que apelidávamos de piscina. Depois, ao anoitecer, era o regresso ao Bissau Velho sem sapatos ou algumas peças de roupa, arrependidos e com promessas repetidas de que nunca mais faríamos a pirraça de faltar às aulas. A entrada no Bissau Velho despertava em todos o receio das cintadas ou da palmatória de cinco buracos. Dividíamos no Zé da Amura para não dar nas vistas.

Pai fora e madrasta ocupada com afazeres profissionais. Vida boa. O que mais poderia almejar naquela idade? A vontade de continuar livre foi tanta que, após um bom final de exame do segundo grau,  disse orgulhoso a uma vizinha da minha Mãe, perante um olhar dela de comiseração e surpresa, que não tencionava mais voltar à escola porque o meu Pai tinha dito que para ser pescador não era preciso mais que a quarta classe. Ainda acabei, por alguns meses, como aprendiz de mecânico, nas oficinas navais.

Mas antes, num certo dia, numa das inúmeras passagens pelo porto do Pidjiguiti, após as aulas, soube que a canoa a motor de cerca de nove metros a flutuar desajeitadamente a uns metros, para além da cabeça de ponte, era do meu velho e que se prestava a sair com a vazante, de regresso aos Bijagós. Não hesitei e arranjei forma de embarcar. Ninguém mais conseguiu de lá me tirar por mais argumentos que me fossem apresentados.

[bjg4.bmp]Época das chuvas, com uma brisa irregular do Sudoeste, horizonte escuro lá para os lados de Tite e de Enxudé a avisar da aproximação de um tornado e mar algo encapelado lá fomos, meia força avante, apontando, num fim de tarde triste, para a embocadura desse largo rio de onde por vezes não se via a outra margem.

Uma hora depois, resguardado, por uma manta fortuita do arrais Nhô André, compadre do meu velho, fascinou-me ver a água fosforescente a deslizar para trás, as luzes de Bissau a desaparecerem e um farol, o Pedro Álvares, muito ao longe pela proa, por vezes, a piscar. O bater compassado do esporão da canoa nhominca a cortar as ondas altas, as inclinações laterais e a chuva miudinha pouco me amedrontaram. Sentia-me o herói de uma aventura da banda desenhada do Príncipe Perfeito e do Simbad.

Mesmo assim, lá para as nove, já com a lua a iluminar o rastro deixado pela canoa, após ter tentado imitar os outros, mijei em equilíbrio precário para sotavento, mastiguei a custo um pão duro e bebi, por um dos orifícios, quase meia lata de leite condensado que me deram. Adormeci depois todo enrolado e a tiritar em cima de uma prancha, logo a seguir à arca de gelo.

Uma avaria inesperada no único motor, ao largo da ilhas das Galinhas, faria com que continuássemos, a custo por causa da enchente, à vela e a remos até ao nascer do sol. Lá pelas nove, já com a força da maré de vazante, desembarcamos, perante a fuga de mais de uma dezena de macacos e debandada ocasional dos habituais caqres, numa praia da lindíssima ilha de Rubane. O meu primeiro desembarque de muitas outras paragens pela maioria das mais de 60 ilhas e ilhotas. 

Achei que aquela paisagem deslumbrante seria a tradução do que deveria ser o paraíso. E nunca me arrependi desse juízo. A viagem continuou ainda para uma outra ilha (Canhabaque) algumas milhas adiante, para recolher o meu Pai, que um dia quase que se tornava um nobre desse pequeno reino dos Bijagós. Muito certamente o primeiro espaço da África negra a sofrer um bombardeamento aéreo na guerra dos Bijagós de Canhabaque contra os poderes coloniais por volta da década de 20 do século passado. Só seriam considerados completamente pacificados após sucessivas campanhas que terminaram em 1936.

[bjg1.bmp]Mas, depois contar-te-ei com mais detalhes e também do meu encontro com um pai assustado até dizer chega, por ver a loucura que eu tinha feito e naquelas condições de tempo. O meu receio de poder levar uma valente sova quando ele me visse e as ilhas que percorremos, numa breve semana, até retornar, a toque de caixa, a bordo do lento e estafado Ametite, à enfadonha turma da quarta classe da Escola Oliveira Salazar, em Bissau. Poucos dos colegas acreditaram que tinha feito tamanha proeza por ser dos mais novos, franzino e não passar de um brancucinho que, apesar de brigador e rápido, jogava desajeitadamente à bola e que até ia para a escola de tchacual. Ainda hoje, julgo que partilho da mesma praga que tombou sobre Cassandra.

Até aos meus 21 anos nunca mais lá deixei de ir sempre que podia. Aprendi com vários arrais, sem cartas e ou outros instrumentos, a não ser a bússola, a navegar no arquipélago, aproveitando as estrelas à noite e o pulsar regular das marés, por entre aquelas ilhas e canais, ao ponto de, aos 13 anos, levar o LP3 de Bissau a Bubaque e regresso, sem supervisão do arrais, sem encalhar e demorar mais tempo. Surpreendia-me sempre o Arrais Avião, cego de um olho, que me instruía assim:
- Segue paralelo à Sogá, passa o canal de Bubaque, até veres a ponta mais afastada de Rubane, aproas à ponta e deixas a popa na extremidade norte de Sogá até estares dentro do canal. Atenção ao descaimento provocado pela enchente e na vazante à malhadeira na ponta de Bubaque à entrada do canal. 

Um autêntico desafio seguir estas instruções na roda do leme. Umas vezes de canoa a remo ou à vela ou outras vezes no barco de pesca e navios de passageiros fui conhecendo o último paraíso desta costa africana que até há pouco tempo ainda detinha resquícios de uma sociedade matriarcal.

[bjgs1.bmp]
O site dar-te-á o alumbramento do que pude ver pela primeira vez. O encanto das ilhas, suas gentes, flora e fauna nunca se perderam dos meus olhos apesar de ter percorrido mais de meio mundo e visitado lugares exóticos. Vê e diz-me se não é mesmo um paraíso o que descobri ainda na infância.

Manuel Amante da Rosa

[ Revisão / adaptação / fixação de texto: L.G.] (****)
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Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de Manuel Amante publicados no nosso blogue:


28 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5555: A navegação no Rio Geba e as embarcações do meu tempo: Corubal, Formosa, BOR... (Manuel Amante da Rosa)


 12 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5455: Memória dos lugares (60): O Rio Geba e o navio Bubaque, do meu pai (Manuel Amante da Rosa)

27 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1787: Embaixador Manuel Amante (Cabo Verde): Por esse Rio Geba acima...


 (**) Recorde-se que o nosso camarada Manuel Amante nasceu, em 19 de Dezembro de 1952,  na Guiné, de pais caboverdianos, tendo passado pelas fileiras do Exército Português,  em 1973/74. 

Depois da independência de Cabo Verde, exerceu, entre outros cargos e funções, os seguintes (de acordo com um currículo, desactualizado, de que dispomos: conselheiro do Ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo de Cabo Verde (2005), embaixador de Cabo Verde no Brasil (1992/2002) e em Angola (1995/99), observador internacional da OUA no processo de democratização da África do Sul (1993/94), diplomata em Moscovo, colocado na embaixada de Cabo Verde (1986/90) bem como na missão permanente de Cabo Verde nas Nações Unidas, em Nova Iorque... Entrou em 1980 para o Ministério dos Negócios Estrangeiros.


O Manuel Amante exerce actualmente o cargo de Secretário Geral Adjunto do Fórum para as Relações Económicas e Comerciais entre a China e os Países de Língua Portuguesa, com sede em Macau. No exercício desse cargo, passa uma larga temporada em Macau, lugar de onde acompanha o nosso blogue com assiduidade, atenção e carinho.

Como ele recorda, "também fui militar (73/74), de recrutamento local, no CIM de Bolama onde fiz a recruta e especialidade antes de ser colocado no QG (Chefia dos Serviços de Intendência) em Bissau. No momento de ser incorporado, tal como muitos da minha geração, estava relativamente familiarizado com as questões de foro castrenses. Não se podia viver na Guiné e ficar alheio ao que se passava e à inutilidade que essa guerra significava em termos de vidas humanas.

"Na minha infância e adolescência fiz muitas viagens pelo interior da Guiné-Bissau durante a luta de libertação. Mas o que mais me encantava (70/73), pelas paisagens e desafios, era subir o Rio Geba, nas férias ou mesmo nos fins de semana, num dos barcos de passageiros do meu Pai (o Bubaque, antiga traineira algarvia, adquirida pela Marinha portuguesa e transformada, nos inícios da guerra, em Lancha Patrulha nº 4, até ser comprada pelo meu Pai e transformada em navio de transporte, mais popularmente conhecido por Djanta Kú Cia)". (...)


(***) Granja de Pessubé, nos arredores de Bissau: estação agronómica onde trabalhou o Engº Amílcar Cabral entre 1952 e 1955.

(****) Último poste desta série > 20 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6874: Meu pai, meu velho, meu camarada (21): Parabéns a vocês! Luís Henriques e Armando Lopes, 90 anos, uma vida! (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P7163: Patronos e Padroeiros (José Martins) (18): Nossa Senhora do Cheche


1. O nosso Camarada José Marcelino Martins, (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), enviou-nos mais uma mensagem, em 22 de Outubro de 2010, da série “Patronos e Padroeiros do Exército”:


Patronos e Padroeiros do Exército
Padroeira do Destacamento

© Foto: José Marcelino Martins (1969) – Direitos reservados

Nossa Senhora do Cheche

A imagem intitulada Nossa Senhora do Cheche, não é mais que a imagem da Senhora de Fátima que, para lá foi transportada, provavelmente, por um militar europeu.

A primeira unidade a instalar-se naquele destacamento foi a Companhia de Cavalaria nº 702, que em 5 de Junho de 1965 para ali enviou uma secção, reforçada poucos dias depois por um pelotão da Polícia Administrativa que, por sua vez, é substituído por um pelotão de Milícias.

Em 1 de Abril de 1967, a 3ª Companhia de Caçadores Indígenas já guarnece o destacamento do Cheche, quando é alterado o seu nome para Companhia de Caçadores nº 5, permanecendo naquele destacamento um Grupo de Combate (reforçado) e o Pelotão de Milícias nº 163.

Aquele destacamento passa a ser guarnecido por um Grupo de Combate (reforçado) da Companhia de Artilharia nº 2338, até ao dia 6 de Fevereiro de 1969, data em que é desactivado, após a retirada da guarnição que se encontrava no Cheche.

A imagem que se encontrava no Cheche em Junho de 1968, vem para Canjadude onde, em 12 de Maio de 1968, é incorporada numa procissão de velas, data em que se celebrava o 51º aniversário da primeira aparição, em Fátima, de Nossa Senhora aos pastorinhos.

Rezando e cantando, a procissão percorreu o caminho que levava à porta sul, na direcção do Cheche, tantas vezes percorrido pelas patrulhas quando se dirigiam para efectuarem operações para aqueles lados. Chegando ao fim do caminho, circundou uma árvore enorme, à sombra da qual se davam reuniam os “homens grandes”, regressando pelo mesmo caminho até ao aquartelamento.

Se no percurso de ida o caminho estava ladeado pela população que tinha acorrido, não só atraído pelas “ladainhas e cânticos”, mas também pelo cortejo de luz que as velas proporcionavam, no regresso pouca gente se via. Poucas pessoas estavam ao longo do percurso.

Feitas as orações finais e quando o padre Libório se voltou para os militares para proferir a despedida, ficou surpreso, direi mesmo espantado. Misturados com os militares metropolitanos estavam quase todos os habitantes civis que, tendo à frente os seus “sacerdotes”, com os seus terços, rezando a Alá, se foram integrando no cortejo, fazendo daquela procissão, um acto ecuménico espontâneo.

Quando deixamos Canjadude em Maio de 1970 a imagem ainda lá permanecia, desconhecendo-se se foi trazida por algum militar ou, na altura da desactivação do aquartelamento, teria ficado esquecida ou foi destruída involuntariamente.

José Marcelino Martins
Fur Mil Trms da CCAÇ 5
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

9 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7106: Patronos e Padroeiros (José Martins) (17): Curso 1962/1967 da Escola Naval - Jorge Manuel Catalão de Oliveira e Carmo

Guiné 63/74 - P7162: Agenda Cultural (87): Passeio temático a "La Lys", organizado pela Liga dos Combatentes


Divulgamos hoje um evento de interesse geral que vai ser realizado pela Liga dos Combatentes, deixando aqui uma pergunta/desafio a esta “nossa” instituição: Para quando a programação de uma ida à Guiné, Angola e Moçambique?
Inscrições para o passeio temático a "La Lys", organizado pela Liga dos Combatentes.

Exmo(a). Sr(a).

Em parceria com a agência de viagens Cistertour, a Liga dos Combatentes promove passeios temáticos para todos os seus associados e interessados nas temáticas. São quatro passeios que demonstram a presença portuguesa no Mundo e que deixam transparecer o esforço heróico de grandes batalhas, o sistema defensivo e operações tácticas militares, assim como, o sentimento de regresso a alguns dos lugares do antigo Império português.

O programa dedicado às comemorações da Batalha de La Lys recebe as suas inscrições ou pré-reservas até 8 de Dezembro de 2010. Esta viagem leva-o aos territórios das batalhas e da história da Flandres e da Normandia. Para além da oportunidade de assistir às cerimónias que assinalam a Batalha de La Lys, tem ainda a possibilidade de visitar os locais do desembarque dos aliados ("Dia D", na Normandia) em 6 de Junho de 1944, os locais onde se encontram os memoriais referentes à Batalha e ainda uns dias de "fuga" em Paris.

Para ficar a conhecer todos os roteiros de cada viagem, assim como as condições que temos para oferecer, consulte os links infra indicados ou navegue até ao website da Liga dos Combatentes:

LINHAS DE TORRES – 09 de OUTUBRO 2010
Oportunidade de descobrir os sistemas defensivos que ao longo da história protegeram a cidade de Lisboa. As fortalezas da costa e as Linhas de Torres. Almoço incluído.

1 dia – preço por pessoa 60€ (Reservas até 22 de Setembro)

GOA, DAMÃO, DIU E COCHIM – 20 JAN a 01 FEV 2011
Regresso aos territórios da antiga Índia Portuguesa, numa viagem singular plena de emoções e afectos.

13 dias – preço por pessoa 2850€ + taxas aeroporto (Reservas até 22 de Outubro – sinalização 700€)

BATALHA DE LA LYS – 8 a 13 ABRIL 2011
Comemorações da Batalha de La Lys. FLANDRES e NORMANDIA os territórios das batalhas e da história.

6 dias – preço por pessoa 1200€ + taxas aeroporto (Reservas até 08 de Dezembro – sinalização 250€)

MARROCOS – 10 a 21 SETEMBRO 2011
A presença portuguesa no Norte de África. Ceuta, Tânger, Ksar-el-Kebir, Mazagão, Casablanca, Mogadoro, Safim, Marrakech e Fez.

12 dias – preço por pessoa 1650€ (Reservas até 10 de Julho 2011 – sinalização 500€)


NOTA: Cada viagem só se realizará com um mínimo de 20 a 30 participantes.

Qualquer dúvida ou esclarecimento deve remeter para a Liga dos Combatentes para Catarina Carvalho, contactos:

Tel. 92 738 31 39 / 21 301 72 25

E-mail: fbs.marketing@ligacombatentes.org.pt

Catarina Carvalho
Departamento de Marketing e Comunicação
Museu do Combatente e Forte do Bom Sucesso
(junto à Torre de Belém),
1400-038 Lisboa - Portugal
Telefone: 92 738 31 39
E-mail: fbs.marketing@ligacombatentes.org.pt
http://www.ligacombatentes.org.pt/

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Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:

17 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7137: Agenda Cultural (86): DocLisboa2010, 14-24 de Outubro de 2010: a pesca do bacalhau na Terra Nova como alternativa à guerra colonial (Luís Graça)