Blogue coletivo, criado e editado por Luís Graça, com o objetivo de ajudar os antigos combatentes a reconstituir o puzzle da memória da guerra da Guiné (1961/74). Iniciado em 23 Abr 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência desta guerra. Como camaradas que fomos, tratamo-nos por tu, e gostamos de dizer: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
segunda-feira, 28 de setembro de 2020
Guiné 61/74 - P21401: Memória dos lugares (413): O meu Seiko 5 (five), comprado na Casa Costa Pinheiro, parou ao fim de 50 anos... (Carlos Pinheiro, ex-1.º Cabo TRMS Op Mensagens)
1. Mensagem do nosso camarada Carlos Pinheiro (ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70) com data de 27 de Setembro de 2020:
O meu Seiko 5 (five) parou ao fim se 50 anos...
Comprei-o na Guiné, na Casa Costa Pinheiro em Bissau, onde trabalhava no escritório nas minhas horas vagas.
Já não me lembro quanto dei por ele mas não era barato, mas era e foi muito bom durante estes cinquenta anos.
Foi a peça que lá comprei que durou mais anos.
Comprei lá também um transístor SONY que não sei quanto tempo durou porque um camarada apropriou-se dele, enquanto estava a tomar o último banho da Guiné, poucas horas antes de seguir para o cais de regresso a casa depois de 25 meses e 10 dias de Guiné.
Também comprei uma máquina fotográfica FUJICA que durou ainda bastantes anos mas certamente por deficiência de uso também um dia parou mesmo de tirar retratos.
Mas o Seiko 5 deixou-me hoje ao fim de tantos anos.
A Casa Costa Pinheiro era talvez a maior casa comercial logo a seguir à Casa Gouveia da CUF.
Importava de tudo e tudo vendia em quantidades impressionantes.
Eram os automóveis Toyota Corolla, os Crown, as carrinhas Hi-Lux e as Staut e acima de tudo os camiões Toyota que por cá nunca apareceram.
Eram os relógios Seiko como facilmente do texto se pode deduzir bem como todos o material SONY, desde os pequenos transístores até aos mais potentes gravadores profissionais, de fita como era uso naqueles tempos e claro, as máquinas fotográficas FUJICA e respectivos acessórios e os indispensáveis rolos.
Eram as motas e as motorizadas Suzuky que nessa altura começaram a superar a Honda.
Era o material de som NIVICO, mas também o Garrard, para grandes salões e para profissionais.
Eram os produtos de beleza da Max Factor para as senhoras... a Colgate Palmolive que toda a gente usava nos quartéis, excepto no nas operações no mato claro, as esferográficas BIC que tantos milhares de aerogramas encheram de noticias, os tapetes da Issing Trading de Itália, que a malta comprava como recordação, eram os discos da Ansónia dos EUA, com os meregues a toda a prova, as porcelanas da Prago Export da Checoslováquia depois de ter também importado, em anos anteriores, os automóveis Skoda.
Enfim. Era uma casa muito grande se bem que não dava muito nas vistas, mas facturava muito bem.
Tantos milhares de letras ali preenchi referentes às vendas a prestações, especialmente dos carros e das motorizadas e motas.
As letras ficavam em carteira e os juros ficavam em casa sem intervenção do BNU que na altura era o único Banco da Guiné.
Nas madrugadas em que o Boeing da TAP ia a Bissau e voltava para Lisboa, era o dia e a noite toda a fazer-se correio para os mais variados fornecedores por esse mundo fora e para as mais variadas companhias de seguros porque parte importante das mercadorias perdia-se na viagem entre Lisboa e Bissau, sabe-se lá porquê. Mas as Companhias, depois do exame prévio na Alfandega e com a confirmação do Agente das seguradoras, garantiam a cobertura dos prejuízos.
E tudo isto para dizer que o meu Seiko 5 parou, ao fim destes 50 anos de vida e de trabalho sem parar... até que parou.
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Nota do editor
Último poste da série de 23 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21386: Memória dos lugares (412): Ponta de Jabadá, na região de Quínara, sentinela do rio Geba, reconquistada ao PAIGC em 29 de janeiro de 1965
Guiné 61/74 - P21400: Notas de leitura (1311): “I Reunião Internacional de História de África - “Relação Europa-África no 3.º Quartel do Século XIX”; Instituto de Investigação Científica Tropical, Lisboa 1989 (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 19 de Dezembro de 2017:
Queridos amigos,
René Pélissier descobriu o testemunho de um alemão que apareceu inopinadamente em Buba, quando Alfa Yaya atacou o importantíssimo entreposto da mancarra, assistiu aos confrontos e resolveu passar o seu testemunho a escrito, foi editado em Leipzig, em 1884.
O ponto de partida de Pélissier, figura fundamental da investigação do Império Colonial Português, é de que os portugueses e os Fulas estiveram longe de ter uma relação amistosa, foi preciso a aprovação da Convenção Luso-Francesa, de 12 de Maio de 1886 para se ter chegado à renúncia da beligerância, os Fulas perceberam rapidamente que só tinham a ganhar não conflituando com aquela potência que possuía na ordem internacional a autoridade para ali mandar.
O mito da aliança luso-Fula fez muito jeito durante a guerra da libertação, tanto PAIGC como Bissau procuraram usar esse mito a seu favor.
Um abraço do
Mário
Fulas e portugueses em guerra: um testemunho alemão de 1881
Beja Santos
Foi no decurso da I Reunião Internacional de História de África que decorreu sobre a consigna “Relação Europa-África no 3.º Quartel do Século XIX”, cujo acervo de publicações apareceu em 1989 por iniciativa do Instituto de Investigação Científica Tropical que René Pélissier apresentou uma curiosa intervenção revelando um testemunho inédito, entre nós.
René Pélissier |
Seguidamente, debruçou-se sobre o mito do acordo luso-Fula. É que praticamente todas as etnias resistiram de armas na mão aos portugueses e às suas tropas, por vezes vindas de outras parcelas do Império, como Cabo Verde, Angola e Moçambique.
René Pélissier introduz na sua comunicação o testemunho desconhecido de um observador alemão acerca de um combate entre Fulas e Portugueses em 1881, trata-se do alemão Cornelio Doelter, que foi publicado em Leipzig em 1884. Este alemão desembarcou em Buba em 1881, quando esta última povoação era a ultimada localidade portuguesa junto do Futa Djalon, ele caiu por acidente no meio de uma contenda, sem entender minimamente o que se estava a passar. Por isso se pode dizer que o seu relato goza da chamada neutralidade, é incontornável em qualquer investigação.
Buba era um importante entreposto comercial, tinha uma guarnição nesta extremidade do Rio Grande de Buba (ou Bolola). Buba fora salva das ambições dos britânicos da Serra Leoa devido à sentença arbitral de Ulysses Grant. O Rio Grande era o grande fornecedor de mancarra, artéria vital do comércio francês entre as “pontas” e Bolama, em plantações ribeirinhas ao longo do Forreá, onde os Beafadas tinham sido submetidos aos Fulas locais para o Futa Djalon, esta região convulsiva do Forreá e do Rio Grande de Buba era simultaneamente uma terra de “missão” e de razias e também um corredor obrigatório para o comércio de Buba e Bolama (armas e pólvora). Santa Cruz de Buba era um entreposto relativamente florescente no século XVIII, mas foi gradualmente perdendo importância até se revitalizar cerca de 1876. As “pontas” pagavam um tributo aos chefes Fulas e um imposto direto ao fisco português.
Os portugueses pretendiam que os chefes Fulas se considerassem vassalos da Coroa Portuguesa, mesmo que não passasse de uma “vassalagem de papel”. Depois do “desastre de Bolor”, em 1878, em que Felupes massacraram tropas portuguesas sobretudo cabo-verdianos, no Noroeste da Guiné, em 1879 desafetou-se esta colónia de Cabo Verde.
Nesta viragem vão começar bem cedo as contendas entre o governo de Bolama, pois logo o primeiro governador, Agostinho Coelho fez uma proposta aos Fulas-Forros do chefe Mamadu Paté Bolola, do Forreá, a proposta assentava em pagar-lhe um montante anual para que os Fulas deixassem em paz os comerciantes sem lhes cobrar qualquer imposto. Importa recordar que estamos no início da abolição da escravatura, Agostinho Coelho é abolicionista e franco partidário dos Fulas Pretos, procurou implementar uma política indígena ativa, atraiu para o seu lado o chefe Fula-Forro Sambel Tombom, e este declarou-se vassalo de Portugal. Resta dizer que Buba nesta época passa a ter a maior concentração militar portuguesa entre Lisboa e Luanda.
Em 1 de Fevereiro de 1881, ao romper da manhã, Buba foi atacada por Alfa Yaya, do Labé. Veio fortemente equipado mas utilizou uma tática completamente desadequada para enfrentar a artilharia. Mal começou a fuzilaria as tropas Fulas foram forçadas a retirar deixando uma centena de mortos no terreno. É neste ínterim que o alemão Doelter chega a Buba e faz o seu relato. Ele descreve o entreposto, quem ali vive, as edificações, diz que a povoação não possui fortificações, tinha unicamente uma paliçada. A artilharia não disponha de abrigo e só não foi atingida devido à inépcia do inimigo. A guarnição era composta por uma centena de homens, incluindo um capitão, um tenente e dois alferes. A tropa era maioritariamente constituída por angolanos e cabo-verdianos, pertenciam ao regimento de caçadores, sediado em Bolama.
O capitão estava enfermo, mas os outros oficiais receberam-no de braços abertos, o alemão preferiu ficar em casa de um civil. Mostra-se atónito, pois enquanto dura a fuzilaria os artesãos Mandingas trabalhavam tranquilamente. Um aristocrata francês dirigia o fogo de uma peça de artilharia junto da igreja. Depois daquela primeira tentativa de ataque, fez-se uma pausa; enquanto os sitiantes enterravam os seus mortos, os sitiados apetrechavam-se, pois sabiam que se tratava somente de um armistício. No dia seguinte, nova tentativa de ataque dos Futa-Fulas que se aproximaram da paliçada, infantaria e cavalaria, foram novamente repelidos, mais uma centena de mortos.
No dia seguinte, os Fulas retiraram-se totalmente de Buba, muitos deles, na retirada, ao descer a margem esquerda do Rio Grande incendiaram as “pontas” que encontravam.
Na análise sumária que René Pélissier faz ao relato deste alemão, tece três considerações:
Vitória pírrica, poucos anos depois o entreposto de Buba voltou a arruinar-se. O governador português tentou celebrar um tratado com os Fulas. Alfa Yaya irá regressar a Buba em fins de 1886, para celebrar um tratado de vassalagem. Houvera em 12 de Maio de 1886 a assinatura da Convenção Luso-Francesa, estava criada a Guiné Portuguesa, aqueles guerreiros vindos do Futa Djalon tinham percebido que houvera uma viragem na História para a qual eles não tinham resposta.
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Nota do editor
Último poste da série de 26 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21394: Nota de leitura (1310): "38ª Companhia de Comandos, 'Os Leopardos': a História": João Lucas (coord. lit. ), Porto, Fronteira do Caos Editores, 2018, 322 pp. - Parte I (Luís Graça)
Guiné 61/74 - P21399: Efemérides (335): Cumpre-se hoje 28 de Setembro, 53 anos da minha chegada à Guiné no HC-54 Skymaster 7504. Uma memória com mais de meio século (Mário Santos, ex-1.º Cabo MMA)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69) com data de 22 de Agosto de 2020:
UMA MEMÓRIA COM MAIS DE MEIO SÉCULO!
Cumpre-se hoje 28 de Setembro, 53 anos da minha chegada à Guiné no HC-54 Skymaster 7504.
Guardei para sempre a recordação da abertura da porta de cabine dos passageiros e da baforada de ar quente rançoso e húmido, proveniente de águas paradas e dos muitos rios lodosos existentes no território.
Esta foi a antevisão desagradável do que nos esperava: um clima doentio e que marcaria indelevelmente para sempre as nossas vidas.
Para além de muitos outros de quem não guardo memória, chegaram no mesmo voo os Tenentes Pil./ Aviadores José Nico e Rui Balacó.
Com eles convivi na Esquadra de Fiat's até ao fim da comissão.
Foram cerca de 22 meses em que interagimos diariamente na Esquadra de Tigres, eu como Mecânico na Linha da frente e eles Pil./Aviadores.
Pragmaticamente todos aceitámos o drama de guerra, irregular, assimétrica e mortífera que enfrentaríamos no futuro imediato, lutando para tentar preservar um legado deixado pelos nossos antepassados. A guerra na Guiné teve características muito diferentes da que se travava em Angola e Moçambique.
A elevada organização da guerrilha e a forma como a sua luta se iniciou, através de acções de combate e não com massacres como em Angola, eram reveladores das dificuldades que as FA iriam ter neste território. O movimento de gerrilheiros contra o qual iríamos lutar, era o Partido Africano para a Independência da Guiné e de Cabo Verde (PAIGC).
Na Guiné, não só os factores históricos e a hostilidade da geografia e do clima tornaram difícil a actuação das FA.
Para piorar a situação militar portuguesa, em termos de apoio aéreo, fundamental para a nossa defesa, devido a pressões exercidas pelos EUA, a FAP foi obrigada a retirar da Guiné os oito F-86F, a principal arma de ataque aéreo de que dispunha. Desde a retirada destes, em finais de Outubro de 1964, e a chegada dos seus substitutos, os novos caças FIAT G-91 R4 adquiridos à Alemanha Ocidental. As missões de apoio aéreo próximo às forças no terreno foram entretanto garantidas pelas aeronaves T-6G. Este era um avião que estava longe de possuir o mesmo poder de fogo do anterior F-86F ou do posterior FIAT G-91 R4.
Aqui deixo o meu abraço de grande estima ao General J. Nico e ao Coronel R. Balacó (que felizmente ainda se encontram entre nós) assim como a todos os companheiros de todas as Esquadras e que contribuíram com o seu esforço e as suas vidas para Portugal poder ter orgulho nos seus filhos que lutaram com honra e dignidade para preservar o que nos tinha sido legado!
Um abraço,
Mário Santos
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Nota do editor
Último poste da série de 26 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21295: Efemérides (334): O Dia do Combatente Limiano, em 24 de agosto de 2020, foi partilhado com um "anjo da guarda", Rosa Serra (Mário Leitão)
Guiné 61/74 - P21398: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (8): os meus livros de bolso, da RTP, oferecidos pelo MNF, em 25/1/1973, deixei-os a alguns guerrilheiros do PAIGC, em 17/7/1974... E comigo trouxe "farrapos" da nossa bandeira, e ainda os guardo, como símbolo do nosso sofrimento e coragem
domingo, 27 de setembro de 2020
Guiné 61/74 - P21397: Os nossos médicos (89): No BCAÇ 2879, sediado em Farim, onde estava integrada a minha companhia, havia dois médicos: um na sede e outro em Cuntima, e eram de facto mais "civis" do que "militares" (Eduardo Estrela, ex- fur mil, CCAÇ 14, Cuntima, 1969/71)
Aqui, nesta época [, 1964/65], no tempo ainda da malta do caqui amarelo, há um médico para cada 150/160 homens (=1 companhia), e que dorme no mato, nos mesmos buracos dos "infantes"... E participa em operações, como a conquista da Ponta de Jabadá! (...)
CCS - 1 médico
CCav 487 - 1 médico
CCav 488 - 1 médico, Jumbembem do qual existe 1 foto no meu site
CCav 489 - 1 médico Cuntima
Nota: Não sei se os outros 2 médicos estavam em Farim, há aqui camaradas tabanqueiros desta Unidade que podem esclarecer. (...)
(***) Último poste da série> 3 de julho de 2020 > Guiné 61/74 - P21132: Os nossos médicos (88): Fernando António Maymone Martins, especialista de cardiologia pediátrica, ex-alf mil, CCS/BCAÇ 2845, Teixeira Pinto, e HM 241, Bissau, 1968/70
Guiné 61/74 - P21396: Blogues da nossa blogosfera (141): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (52): Palavras e poesia
Do Blogue Jardim das Delícias, do Dr. Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, (Canquelifá e Bigene, 1966/68), com a devida vénia, reproduzimos esta publicação da sua autoria.
Bigene - O nosso Corpo Clínico
O que está do meu lado esquerdo, de barbas, é o furriel Pimentinha, meu furriel enfermeiro, que ainda hoje me telefona uma a duas vezes por ano. A sua profissão, antes de vir para a guerra, era electricista, electricista do Hotel Estoril-Sol. Pois, meus amigos, transformou-se num excelente parteiro e melhor puericultor. Leu e releu a minha sebenta de obstetrícia e deixava os bebés todos perfumadinhos e polvilhados de pó de talco, o que fazia a delícia das mães.
Duas histórias sobre o Pimentinha:
Primeira:
Um dia de madrugada, apareceu uma parturiente com uma apresentação de pelve, isto é, com o bébé a nascer de rabito em vez da cabeça. É um parto difícil e perigoso. Tentei, quanto sabia, algumas manobras, o mais suaves possível, mas não fui bem sucedido. Virei-me para o Pimentinha e disse: - meu caro Pimentinha, logo que comece a raiar a manhã, peça uma evacuação “Y” (urgente) de helicóptero, para levar esta mulher para Bissau, e fui-me deitar. Algum tempo depois, entra o Pimentinha no meu quarto, dizendo cheio de entusiasmo: - sr. Dr. o catraio já está cá fora. Com muito jeitinho lá consegui tirá-lo.
Segunda:
O Pimentinha ia de avioneta a Bissau, acompanhar um soldado que tinha um enorme hidrocelo (líquido nos testículos). Logo pela manhã, a avioneta, um Dornier levantou voo e meio minuto depois estatelou-se no solo. Felizmente não morreu ninguém, apenas o piloto fracturou uma vértebra. A carlinga da avioneta passou a ser a casota do nosso macaco.
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Nota do editor
Último poste da série de 20 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21376: Blogues da nossa blogosfera (140): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (51): Palavras e poesia
Guiné 61/74 - P21395: Blogpoesia (698): "Tanque sob a ramada", "Folhas de Outono" e "A minha costeira à porta de casa", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728
Tanque sob a ramada
Corria incessante a fonte fresca.
A ramada era um dossel onde o sol não atravessava.
Melhor sítio para passar a tarde não havia.
Um banco de pedra ao lado.
Que belas tardes ali passava.
Que ricas férias!...
E, quando o Avô José vinha era ainda melhor.
Tinha vivido por perto as guerras entre miguelistas e dom pedro.
Sabia de cor as histórias todas.
Passaram-lhe perto.
A história do incêndio criminoso da casa dos padres em Santa Quitéria.
Os olhos reluziam-lhe de entusiasmo.
Encontrara quem o gostava de ouvir…
Berlim, 26 de Setembro de 2020
12h39m
Jlmg
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Folhas de Outono
Uma a uma caem silenciosas as folhas secas.
Cobrem de amarelo o chão verde dos relvados.
Preanunciam tristes a chegada do inverno.
Findou seu reinado de ostentação nos toucados do arvoredo.
Se preparam consternadas para o destino da sua morte.
Mais um pouco e virá a neve branca.
Ocultas, esperarão sua destruição e transformação em húmus.
Enquanto a natureza dormirá a sono solto.
É o devir constante e lento do tempo ao ritmo das estações.
O devorador insaciável das vidas que aspiram à eternidade por vocação.
Berlim, 25 de Setembro de 2020
19h24m
Jlmg
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A minha costeira à porta de casa
Antes do alcatrão
Não foi fácil.
Eu vi.
Alisou-se o caminho.
Vieram camiões de granito das pedreiras esmigalhado.
Cobriu-se de cascalho.
Uma cobertura de saibro seco o revestiu.
Um cilindro de pedra repassou-lhe a superfície inúmeras vezes, até ficar liso.
Borrifou-se de água para sedimentar.
Com o vir das chuvas ficava totalmente firme.
Depois, era um regalo percorrer aquele caminho carregado de buracos e de lombas.
Desde a estrada até à capela de Pedra Maria.
Até servia para jogar a bola...
Berlim, 25 de Setembro de 2020
17h49m
Jlmg
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Nota do editor
Último poste da série de 20 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21375: Blogpoesia (697): "Passos perdidos", "O abraço" e "O convite", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728
sábado, 26 de setembro de 2020
Guiné 61/74 - P21394: Nota de leitura (1310): "38ª Companhia de Comandos, 'Os Leopardos': a História": João Lucas (coord. lit. ), Porto, Fronteira do Caos Editores, 2018, 322 pp. - Parte I (Luís Graça)
"Esta gloriosa sub-unidade de Comandos, possui um palmarés impressionante e é com orgulho que ostenta no seu guião a condecoração, da Medalha Militar da Cruz de Guerra de 1.ª Classe (colectiva). Ainda e bem revelador do enorme esforço operacional a que foi chamada, chora onze caídos no Campo de Honra pela Pátria que em todas as suas cerimónias recorda e homenageia.
Recordar uma história tão rica em episódios onde a dedicação e o heroísmo ombreiam com a abnegação e o espírito de sacrifício foi, para mim, um exercício exaltante pois tive o privilégio de no Batalhão de Comandos da Guiné (BCmdsG) ter podido comandar operações em que a «Tremenda 38» tomou parte, cumprindo sempre de maneira distinta as missões que tinha de levar a cabo.
O coordenador, João Paulo Lucas, é um antigo militar paraquedista, nosso amigo do Facebook. Em dia de anos, do Amílcar Mendes, um dos coautores do livro, já aqui deixo o seguinte comentário:
"PS - Uma completa recensão do livro "38ª Companhia de Comandos, 0s Leopardos" está na forja... Preciso apenas de um pouco mais de tempo e vagar"...
Último poste da série > 22 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21383: Notas de leitura (1309): "O Cântico das Costureiras", de Gonçalo Inocentes (Matheos) - Parte III (Luís Graça): a conquista da Ponta de Jabadá, em 29/1/1965, importante posição na defesa do rio Geba
Guiné 61/74 - P21393: Os nossos seres, saberes e lazeres (412): No Alto Minho, lancei âncora na Ribeira Lima (8) (Mário Beja Santos)
Queridos amigos,
Impunha-se uma visita cuidada ao Centro Interpretativo do Barroco, em Arcos de Valdevez. A Igreja do Espírito Santo foi muito bem escolhida, marca perfeitamente todo o espírito da Contra-Reforma, severidade e austeridade por fora, pompa e esplendor no interior. Somos riquíssimos em Barroco e Rococó.
A Europália Portugal, em 1991, foi um grande sucesso. Lembro-me das filas enormes à porta do Museu Real de Belas-Artes, em Bruxelas, para visitar a exposição O Triunfo do Barroco. Houve também outras exposições de estrondo, somos detentores de um património que a generalidade dos laboratórios universitários já tinham deitado fora, os instrumentos científicos do século XVIII, e as exposições de Arte Oriental e Africana foram altamente representativas, mas nada se comparou ao Barroco, à magnificência da arte religiosa e às carruagens da Embaixada que o rei D. João V enviou a Roma. Pois o Alto Minho também possui um património incomparável, como aqui se exemplifica.
E regressou-se a Ponte de Lima, desta feita a visita foi à Casa de Nossa Senhora d'Aurora, um portento património e com jardim assombroso, como também aqui se mostra.
Um abraço do
Mário
No Alto Minho, lancei âncora na Ribeira Lima (8)
Mário Beja Santos
Numa frase curta, numa síntese regada de sinuosidades e pontos divergentes, ir-se-á com o Barroco (na pintura, na escultura, na talha, na arquitetura e nas artes decorativas), foi um estilo que se instituiu depois do Renascimento e das modalidades do maneirismo, irá prolongar-se até ao século XVIII, e as suas linhas exuberantes ganharão um novo alento com um estilo denominado Rococó. É um período artístico de cerca de dois séculos que terá nomes de autores que ainda hoje são dominantes na cultura portuguesa de obras fundamentais no nosso património. Basta referir Josefa d’Óbidos, a Igreja da Madre de Deus, a Igreja de Santo António (Lagos), a escultura de Machado de Castro, o Convento de Mafra… E quando chegamos ao século XVIII, a região minhota dá cartas valiosas, Braga, Viana do Castelo e vários pontos do Alto Minho. E assim chegamos a esta paragem com enormíssimo interesse, a Rota do Barroco parte de Arcos de Valdevez e que agora se estende ao Alto Minho. E assim entro no Centro Interpretativo do Barroco, sediado na Igreja do Espírito Santo, em Arcos de Valdevez.
Arcos de Valdevez é porta de entrada deste roteiro do Barroco no Alto Minho, e não é por acaso, possui elementos notáveis do Barroco e do Rococó, sobretudo na vertente religiosa. A Igreja do Espírito Santo acolhe o Centro Interpretativo do Barroco, houve para ali um investimento municipal de cerca de um milhão de euros, supõe-se mesmo que esta viagem pode ultrapassar a área geográfica dos dez concelhos do Alto Minho, uma vez que a arte barroca da região está presente na Galiza e em Minas Gerais, no Brasil. O roteiro alicia para visitas do maior interesse, caso do Convento de Mosteiró, em Valença, a Capela das Malheiras, em Viana do Castelo, bem como a Capela da Boa Morte, na Correlhã, em Ponte de Lima, e o Santuário da Peneda, em Arcos de Valdevez. Entra-se na igreja, começa o assombro, estas obras falam mais que um milhão de palavras.
Atenda-se à magnificência do altar, a Confraria do Espírito Santo não se fez rogada e abriu os cordões à bolsa para que esta construção fosse de arromba. Por fora é tudo singelo, em granito, foi utilizado na estrutura principal, nos cunhais, cimalhas e lintéis, o próprio lajeamento que circunda o templo é em granito. A fachada foi reconstruída no século XIX, tem já traços marcadamente neoclássicos. O interior recebe a luz natural por dez janelas naturais, cinco a sul e cinco a norte, seguramente que se pretendeu que toda esta riqueza brilhasse, com toda a pompa, ao contrário do exterior. Veja-se a imagem seguinte.
Não há palavras, parece que todos os comentários não têm o poder de alcançar toda a simbologia que esta arte espelha, nos elementos escultóricos, contempla-se uma joia exaltativa do Espírito Santo e a vista é logo atraída para a sacristia onde somos todos recebidos com uma peça extraordinária alusiva ao Pentecostes, tudo sobre a forma de um altar. Inesquecível.
E regressa-se a Ponte de Lima. Sempre com o intuito de ver para compreender, levei na bagagem uma edição de 1985 das Seleções do Reader’s Digest intitulada Por terras de Portugal, orientada e coordenada por Maria Clara Mendes, doutora em Geografia Humana. Entra-se no casco histórico a caminho da Casa d’Aurora, e toma-se nota do que ela escreveu já sobre o século XVIII: “Nas primeiras décadas deste século ressurgem as casas de burgueses e fidalgos, e no espaço muralhado sobressaem o edifício da Câmara, o Paço dos Marqueses, a Igreja-matriz e os quarteirões definidos pela Calçada dos Artistas, Rua Formosa e Largo de Delfim Guimarães. Nas ruas estreitas entre a Rua do Postigo e a Porta do Souto o casario adensa-se. Os arrabaldes estão já definidos. A actividade industrial foi animada pela fundação de uma fábrica de tecidos de linho e algodão, a Sociedade Económica de Bons Compatriotas Amigos do Bem Público (1779-1786). Mas no fim do século a panorâmica é bem diferente”. Houve demolições, foi o caso da muralha, a atividade mercantil e agrícola levou D. Pedro IV a autorizar a realização das Feiras Novas. Em 1875 foi criado o Banco Agrícola, Comercial e Industrial de Ponte de Lima, e deste período datam a abertura das Alamedas de S. João e de Nossa Senhora da Guia, por ali corre desafogado e calmo o Lima. Mas eu vou em sentido contrário. A visita à Casa d’Aurora, tem o seu quê de peregrinação. Conheci Manuel d’Aurora através do meu saudoso amigo Carlos Miguel de Abreu de Lima de Araújo, foi este querido amigo que me pedia insistentemente para lhe ler as obras do 3.º Conde. Aí vou eu à Rua do Arrabalde N.º 90.
A Sr.ª D. Rosário teve a gentileza de interromper os seus afazeres para me mostrar ao pormenor o interior desta casa senhorial, um deslumbramento de valores, de memórias, até de interseção de culturas. O outro pretexto da visita era o jardim, ele consta do Roteiro das Camélias. É um jardim à francesa, parece datar do tempo em que a casa foi reconstruída entre 1714 e 1730. O bucho é vistoso, o arvoredo variado, irei ver num nicho barroco com fonte Nossa Senhora d’Aurora, no centro do jardim um belo lago e uma imponente araucária.
Ao longo do ano, qualquer visitante tem vegetação à sua espera, mas quanto a flores por aqui pululam rosas, azáleas, dálias e camélias, mas também rododendros e magnólias. As cameleiras são antigas, há para ali uma criptoméria japónica de grande beleza. O folheto da Casa de Nossa Senhora d’Aurora refere algo que não se visitou, os quatro hectares da floresta, onde pontificam carvalhos, castanheiros, pinheiros, cedros e azevinho espontâneo. Pois ficará para a próxima, outra maré, o marinheiro será o mesmo…
(continua)
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Nota do editor
Último poste da série de 19 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21373: Os nossos seres, saberes e lazeres (411): No Alto Minho, lancei âncora na Ribeira Lima (7) (Mário Beja Santos)
Guiné 61/74 - P21392: Parabéns a você (1872): Amílcar Mendes, ex-1.º Cabo Comando da 38.ª CComandos (Guiné, 1972/74) e António Medina, ex-Fur Mil Art da CART 527 (Guiné, 1963/65)
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Nota do editor
Último poste da série de 23 de Setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21384: Parabéns a você (1871): Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16 (Guiné, 1964/66)
sexta-feira, 25 de setembro de 2020
Guiné 61/74 - P21391: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XLIV: Jaime Frederico Mariz Alves Martins, maj grad inf (Oeiras, 1936 - Guidaje, 1973)
Guiné 61/74 - P21390: Manuscrito(s) (Luís Graça) (192): Quinta de Candoz: vindimas, a tradição que já não é o que era... (Augusto Pinto Soares) - II (e última) Parte
Marco de Canaveses > Paredes de Viadores > Candoz > Quinta de Candoz > Vindimas > 18 e 19 de setembro de 2020 > Foto galeria
II. A vindima é agora, nos tempos que correm, um ritual mais técnico, sem o sabor bucólico e festivo doutros tempos, sem o mesmo esforço, a mesma "freima". (*)
Nota do editor:
(*) Último poste da série > 24 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21388: Manuscrito(s) (Luís Graça) (191): Quinta de Candoz: vindimas, a tradição que já não é o que era... (Augusto Pinto Soares) - Parte I