segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Guiné 63/74 - P16852: O nosso querido mês de Natal de 2016 e Ano Novo de 2017 (6): Benjamim Durães [ex-fur mil op esp, Pel Rec Info, CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72)]


Cartão de boas festas do nosso amigo, camarada e grã-tabanquieiro Benjamim Durãe [ex-fur mil op esp, Pel Rec Info, CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72); DFA, sempre voluntarioso e generoso, é um homem de causas, tendo sido até há uns anos  presidente da direção do Núcleo de Setúbal da Liga dos Combatentes].



Guiné >  Zona letse > regiãod e Bafatá > Bambadinca (Setor L1) >  CCS/BART 2917 (1970/72) > Época das chuivas, 1970  > O Benjamim Durães no meio do capim da Bolanha de Bambadinca (?)


Foto: © Benjamim Durães (2011). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P16851: O início da guerra colonial no CTIG, contada pelo outro lado: entrevista, de 2001, com o homem que liderou o ataque a Tite, Arafam 'N’djamba' Mané (1945-2004) – Parte Final (José Teixeira): os frutos (amargos) da aventura...


Guiné > Região de Quínara > Tite > Julho de 1965 > O Santos Oliveira, em pacato  passeio pela tabanca


Guiné > Região de Quínara > Tite > Agosto/setembro de 1965 > Uma cena de caça


Guiné > Região de Quínara > Tite > Julho de 1965 > Uma DO27 (Dornier) na pista de reabastecimento.

Fotos do álbum do nosso camarada, grã-tabanquerio da primeira hora, de Santos Oliveira, ex-2.º  sgrt mil armas pesadas inf, Pel Mort 912, Como, Cufar e Tite, 1964/66). Esteve em Tite ao tempo do BCAÇ 1860 (Tite, abril de 1965/abril de 1967)

Fotos (e legendas): © Santos Oliveira (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




O Zé Teixeira, em 2008, em Iemberém,
com  população local. Foto de Luís Graça (2008)
O início da guerra colonial no CTIG, contada pelo outro lado: entrevista, de 2001, com o homem que liderou o ataque a Tite, Arafam 'N’djamba' Mané (1945-2004) – Parte Final (José Teixeira): os frutos (amargos) da aventura...



1. Preâmbulo

Todos nós, os que passamos pela guerra (e em particular pelo TO da Guiné), temos vindo com o tempo, a tentar passar aos vindouros as situações vividas (, "com sangue, suor e lágrimas"...)  num  ambiente hostil e agressivo, próprio dos confrontos militares . É o nosso ponto de vista. Com mais ou menos romantismo; com mais ou menos realismo, vamos escrevendo o que a nossa memória registou.

É comum ouvirmos camaradas nossos contar testemunhos de situações que vivemos em conjunto e encontrarmos diferenças, às vezes pormenores que nos escaparam ou a que não demos atenção. Foram situações (ataques, flagelações, emboscadas, explosões de minas e armadilhas, etc.) vividas em comum, mas analisadas por outro ponto de vista. Alguém com outra base académica ou cultural, ou até com outra visão politica e militar da situação, é capaz de "ver" e "narrar" os acontecimentos de outra maneira... O local e ângulo de onde se está a vivenciar o acontecimento, afeta a informação registada na memória (e depois a narrativa, a reconstituição, o depouimento...).

Neste caso concreto, estamos a tomar conhecimento de um testemunho de alguém que vivenciou o ataque a Tite, de 22 para 23 de janeiro de 1963, data (polémica) do in´´iio "oficial" da guerra colonial (ou de "libertação", para os nacionalistas). Foi o seu comandante, mas do outro lado da barricada, logo, o relato dos acontecimentos que viveu e a visão global do ataque são à partida diferentes da "narrativa" daqueles que,  na altura, defendiam a bandeira verde e rubra. Pontos de vista diferentes, mas tespeitáveis, já que tal como a moeda, a "verdade" tem um verso e um reverso.  São estes conjuntos de ponto de vista, diferentes entre si, dos acontecimentos que vão permitir escrever a História.

Estranhamente pouco ou nada se tem escrito, oficialmente,  sobre este acontecimento tão marcante, (seria?) para o desenvolvimento da guerra na Guiné.

Na parte da entrevista que se segue, o entrevistado assume que o ataque a Tite foi uma aventura, a qual serviu de alerta para as tropas portuguesas. Na realidade, podia ter sido uma grande catástrofe para os guineenses envolvidos pela sua ingenuidade de fazer avançar cerca de 150 africanos (!) – diz ele – com reduzido armamento e nenhuma formação nem prática de combate, contra uma instituição militar devidamente apetrechada e homens bem trenados no manuseamento de armas. Valeu-lhes o ato de surpresa e creio mesmo que a população local envolvida fugiu a sete pés, mal se iniciou o tiroteio.

Com este "ato de loucura", o PAIGC terá ganhado mais alguns aderentes e talvez notícias de primeira página nos jornais, por esse mundo fora, vacinado contra o colonialismo via URSS e EUA, as grandes potências em conflito latente, empenhadas em “abocanhar” a África e a afirmar a sua hegemonia geopolítica,,,. Claro que foi um ato que deu “gás” aos militantes do PAIGC, fazendo sentir que era possível lutar contra os "tugas" (sic), de "armas na mão", bastante para isso terem armas, pois que vontade não lhes  faltava.

Mas,  como acontecimento de guerra, o ataque a Tite não passou de um fracasso, para ambos os lados da barricada. Desgraçadamente, foi o início de uma escalada que só parou 11 anos depois... e que nos envolveu a todos.

A três anos de morrer, Arafam Mané faz também o balanço de uma vida:  "filho de camponês", com passagem pela escola do maoismo, e tendo conhecido as misérias e as grandezas da luta de libertação nacional, da independência, do exercício da governação e das lutas fratricidas no seio do PAIGC, Arafam Mané termina a entrevista em tom "politicamente correto", mas nem por isso menos "coerente" e "humano" e até com uma ponta de "amargura":

Isso para mim, é um grande orgulho. Vejo que, de facto fiz algo de importante para este país a Guiné-Bissau. Mesmo, se morrer hoje não ficarei arrependido. Cada um de nós conhece bem o que é a vida de um camponês. O filho do camponês é sempre condenado na sociedade dos intelectuais mesmo nos países mais desenvolvidos do mundo. Somente nos países socialistas é que vimos que o filho do camponês tem valor. Eis as recordações palpáveis que tenho sobre o ataque de Tite.

Em todo o caso, convirá dizer que esta versão dos acontecimentos de 23 de janeiro de 1963 não é consensual entre os próprios protagonistas (***)... Como sói dizer-se, quem conta um conto acrescenta-lhe um ponto... Por exemplo, não fica esclarecido quem é que "comandou" a operação, se fosse o Malam Sanhá ou so seu adjunto, o Arafam Mané...Como os dois já morreram, nunca mais irão esclarecer esta minha pequena dúvida...



II. Sinopse da entrevista – Parte Final
Arafam Mané com uma "costureirinha", c. 1963. Foto
do Arquivo Amílcar Cabral / Casa Counm.
Com a devida vénia......


No texto anterior o entrevistado dizia, continuando a responder à pergunta, " Mas como é que conseguiram penetrar facilmente no interior do quartel?"

“A nossa missão podia ter maior sucesso se um dos nossos companheiros não tivesse falhado no cumprimento da ordem. Não obstante tudo, a operação planeada para esse dia não podia ser adiada custe o que custasse. Considero que o acto foi uma aventura que serviu de alerta para os tugas; porque queríamos que soubessem que voltamos com força para a zona. Foi uma guerra psicológica porque, na realidade, nós não tínhamos uma força palpável. Mas essa acção desorientou as tropas coloniais que a partir daquele momento receavam sair do quartel para fazer patrulhas.”

E continuava:

"No entretanto, após esta corajosa operação, mais de 300 jovens voluntários aderiram ao movimento de guerrilheiros para, do nosso lado, lutar contra os colonialistas portugueses. Não havia armas nem tão pouco baionetas mas esta realidade não desanimou os jovens cujo número de aderentes crescia constantemente na minha barraca [acampamento temporário]."

Publicamos a seguir a resposta de Arafam Mané às duas questões finais.


III. Entrevista com o coronel Arafam Mané - Parte IV ( e última)

Esta entrevista foi concedida em 2001 ao jornal “O Defensor”, órgão, de periodicidade mensal, das FARP - Forças Armadas Revolucionárias do Povo, Guiné-Bissau, no quadro da recolha de depoimentos dos Combatentes da Liberdade da Pátria sobre os acontecimentos históricos que marcaram a luta armada de libertação nacional, entrevista essa reproduzida no sítio das FARP, em novembro de 2015.

Excertos transcritos com a devida vénia.(A entrevista completa pode ser lida aqui. no sítio das FARP, Guiné-Bissau.)

(Continuação)

O Defensor – Coronel, o que pensa que poderia acontecer durante a operação 
se o vosso comando inexperiente
 tivesse armas de fogo suficientes?


Malan Sanhá, c. 1963.
Foto do Arquivo  Amílcar Canral
/ Casa Comum

Com a devida vénia...
Coronel ADM - Penso que a falta de armas ou a sua insuficiência na altura da operação de Tite foi uma coisa positiva, porque se houvesse muitas armas, isso teria talvez constituído um golpe fatal para o nosso próprio comando que, certamente, devido a falta de experiência sobre o uso de armas poderia provocar vítimas nas nossas fileiras mesmo, como referiu o célebre cantor guineense José Carlos Schwarz,“caçador desconhecido falhou e virou a sua arma contra a aldeia”.

Se não fosse a falta de experiência, teríamos ocupado Tite naquele dia, porque as tropas coloniais,  surpreendidas pela operação,  tinham já fugido. Do nosso lado, a única baixa do assalto foi o meu guarda costa Wagna Bomba, natural de Gambala, que sucumbiu atingido por balas do inimigo. Do lado do inimigo, não posso avançar um número preciso de vítimas mas deve ter sido considerável, porque o camarada Malam Sanhá conseguiu lançar uma granada dentro da caserna onde dormiam soldados. Foi um sucesso, camarada jornalista.

Portanto, depois da operação em Tite, os ataques da guerrilha se multiplicaram, alastrando-se para os diferentes pontos do sul.

A notícia sobre o início da luta armada contra os colonialistas portugueses, como já disse anteriormente,  foi tornada pública por Amílcar Cabral em Londres (Inglaterra), numa Conferencia de Imprensa. Em África, a notícia foi imediatamente publicitada pelas Rádios de Conacri, Rádio Nacional do Senegal e mais tarde pela “Rádio Libertação” do PAIGC.

A divulgação dessa notícia nos órgãos de comunicação social levantou o moral no seio dos camaradas e a vontade de lutar fortemente para libertar o nosso povo. Enquanto para os "tugas", a divulgação da notícia constituiu uma dor de cabeça.

O Defensor  - Mas no fundo 
qual foi a reacção de Amílcar Cabral 
logo que foi informado do ataque 
contra o quartel de Tite?


Coronel ADM - Foi positiva. Fui logo promovido ao posto de Comandante Regional. E, antes da minha ida para a República Popular da China, que ocorreu em Abril de 1963, consegui mobilizar um número considerável de camaradas para a luta. Tive inclusive contactos com Bissau na pessoa de Rafael Barbosa que na altura era grande membro do Comité Central do PAIGC.


FACTOS HISTÓRICOS INESQUECÍVEIS 

São recordações de encorajamento, isso porque depois da operação as nossas populações chegaram a conclusão de que, afinal, nós naquela altura não podíamos fazer nada porque não tínhamos armas. Reconheceram, por outro lado, que nós podíamos ser bons soldados se tivéssemos armamento. Depois dessa acção, passamos a receber géneros da população e recebemos também medicamentos.

Houve igualmente o congresso de Cassacá que deu o acento tónico que a população esperava do grande partido. O congresso permitiu acabar com as barbaridades praticadas por alguns camaradas, reorganizar a nossa luta armada, entre outros. O povo voltou a ganhar a confiança no partido, nos seus dirigentes e no destino da Luta de Libertação Nacional.

Mas a maior satisfação que tenho é, precisamente, o facto de ver hoje os camaradas que ontem eram camponeses analfabetos que tinham como vestuários “lopé” (tanga), panos rodeados no corpo com os pés descalços, tornarem-se agora grandes oficiais das Forças Armadas Revolucionárias do Povo (FARP), outros são Engenheiros, Aviadores (Pilotos), Médicos, Deputados, Condutores, pilotos de barcos...

Isso para mim, é um grande orgulho. Vejo que, de facto fiz algo de importante para este país a Guiné-Bissau. Mesmo, se morrer hoje não ficarei arrependido. Cada um de nós conhece bem o que é a vida de um camponês. O filho do camponês é sempre condenado na sociedade dos intelectuais mesmo nos países mais desenvolvidos do mundo. Somente nos países socialistas é que vimos que o filho do camponês tem valor. Eis as recordações palpáveis que tenho sobre o ataque de Tite.


IV. Comentário final

Vejo nesta entrevista um documento histórico de relevante interesse, pois acaba por desmistifica um acontecimento propalado aos quatro ventos como um verdadeiro ato de guerra, heróico e grandiloquente... Afinal não passou de uma "aventura", uma ação, tosca,  que escapou à própria direção política do PAIGC, quase sem consequências imediatas, a não ser a de alertar as tropas portuguesas...

Em todo  caso, e usando a terminologia dos historiadores da guerra colonial Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes, mal ou bem o "ataque a Tite" marca o fim da "fase pré-insurreccional e de doutrinação políticia (in; Afonso, A, e Matos Gomes, C. - Guerra colonial; Angola, Guiné, Moçambique. Lisboa: Diário de Notícias, s/d, p. 421),

O PAIGC estava em fase de mentalização e mobilização das populações, e de organização das suas estruturas enquanto  a tropa portuguesa ainda “dormia na forma”. Por outro lado, está bem patente o medo que os militares portugueses impunham sobre as populações através de atos violentos na tentativa de travar o avanço do movimento independentista.

Hesitei em por o texto no nosso blogue, com receio de que iria abrir "velhas feridas mal curadas". Por outro lado o seu valor histórico impunha que fosse dado a público, mas para meu sossego passou incólume, sem o mais pequeno contraditório, o que me preocupa, confesso.


[Introdução, seleção, notas, incluindo parênteses retos, revisão e fixação de texto: Zé Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enf]
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Notas do editor:

(*) Postes anteriores da série:

3 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16794: O inicio da guerra colonial no CTIG, contada pelo outro lado: entrevista, de 2001, com o homem que liderou o ataque a Tite, Arafam 'N’djamba' Mané (1945-2004) - Parte I (José Teixeira)

8 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16812: O inicio da guerra colonial no CTIG, contada pelo outro lado: entrevista, de 2001, com o homem que liderou o ataque a Tite, Arafam 'N’djamba' Mané (1945-2004) - Parte II (José Teixeira)

11 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16823: O início da guerra colonial no CTIG, contada pelo outro lado: entrevista, de 2001, com o homem que liderou o ataque a Tite, Arafam 'N’djamba' Mané (1945-2004) - Parte III (José Teixeira)

(**) Vd. portal noticioso > Guiné-Bissau > 24/1/2013 >23 de janeiro, dia de início da luta armada de libertação nacional, celebrado no país

(...) Bissau (Rádio Bombolom-FM, 23 de Janeiro de 2013) – A Guiné Bissau marcou ontem, quarta-feira, cinquenta anos do início da luta armada de libertação nacional a 23 de janeiro de 1963 no quartel de Tite, região de Quínara, no sul da capital, Bissau.

Em homenagem a esse acontecimento histórico do país, o Estado-Maior General das Forças Armadas, através da Divisão para os Assuntos Cívicos e Sociais e Relações Públicas, promoveu uma palestra subordinada “Início da Luta Armada pela Independência da Guiné e Cabo Verde”.

Um dos participantes nesse primeiro ataque com armas de fogo contra um reduto militar português na então Província Ultramarina da Guiné, Daúda Bangura (Comissário Político), lembra ainda dos nomes de heróis que haviam constitudo o grupo de assalto, entre eles, Arafam Mané (na altura Adjunto de Comandante), Malam Sanhã (na altura Comandante Geral da Operação) e Tchambu Mané, que era Comandante de Grupo.

Apesar de o assalto ter sido de surpresa para as tropas portuguesas, Daúda Bangura lembra que na operação, o grupo sofreu duas baixas, nas pessoas dos guerrilheiros NFamará Dabó e Malam Dabó. (...)

Guiné 63/74 - P16850: O nosso querido mês de Natal de 2016 e Ano Novo de 2017 (5): Miguel e Giselda Pessoa... nos altos voos dos céus da vida...

1. Sempre bem humorado, bonacheirão, irreverente, prestável, sempre surpreendente,  o nosso Miguel,  amigo do seu amigo, camarada do sue camarada, grã-tabanqueiro de longa data, cartunista talentoso e, claro, histórico sobrevivente da guerra colonial, o único coronel pilav '(e)strelado' que eu conheço em todo o mundo e arredores... (É, além disso, o diretor da Karas de Monte Real. )

Mandou-nos este divertido, belíssimo, festivo e original  'cartanito' de Boas Festas, como votos de Feliz Natal e Ano Novo para toda a Tabanca Grande, o mesmo é dizer todos os amigos e camaradas da Guiné...

O editor, infante, terráqueo, que não está habituados às alturas, retribui, em nome da tropa toda (de ar, terre a mar),  com o desejo de boa continuação  dos altos voos nos céus da vida, para a Giselda e o seu 'asa' Miguel (e viceversa, já que ele e ela fazém tandém...). LG

PS - Se eu fosse o Chefe Supremo das Forças Armadas Portuguesas, teria que lhes dar a nota máxima, na escala de 0 a 20, por esta exibição acrobática (que, felizmente não põe em risco o ptrimónio nacional nem muito menos a soberania e independêncioa da Pátria) ... Mas, como não sou o chefe dos chefes, mas ainda sou prof, dou-lhes um Excelente nesta "prova de vida" (que é isso que conta para o nosso blogue)...

Quanto ao cartune ("cartum", no Braisl...), acho que não tem preço!... Adorei!..

2. Em tempo... (Nota do Miguel Pessoa, com data de hoje, posterior à edição deste poste)

Como não contava que fosse dado tanto relevo ao meu "cartanito" não me preocupei em mencionar a autoria dos "bonecos" nele contidos. É certo que o cartoon foi ideia minha, mas os "bonecos" foram uma oferta do Paulo Moreno, o "benjamim" da Tabanca do Centro que muito nos tem apoiado nas nossas iniciativas - são da sua autoria as T-Shirts, aventais, bolsas, bonés, canecas e outros projectos que têm saído da sua loja com motivos alusivos à Tabanca do Centro. Aqui fica a informação, pois não gosto de brilhar com o trabalho dos outros...

Um abraço
Miguel Pessoa
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Nota do editor:


Guiné 63/74 - P16849: Notas de leitura (912): Reflexão sobre os 30 anos de independência da Guiné-Bissau, por Leopoldo Amado, na revista Africana Studia, n.º 8, 2005, publicação do Centro de Estudos Africanos da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 19 de Outubro de 2015:

Queridos amigos,
O historiador e nosso confrade Leopoldo Amado deu à estampa em 2005 uma importante reflexão sobre os 30 anos da independência da Guiné-Bissau. Preambula cuidadosamente sobre a singularidade ideológica do PAIGC, enquanto entidade subordinada ao pensamento e ação de Cabral e aprecia a ingenuidade e cegueira dos dirigentes do novo Estado que pretendiam a todo o vapor projetos financiados pela ajuda internacional de grande envergadura sem disporem de gestores à altura.
De 1974 a 1980 passou-se do sonho e do reconhecimento de muitos pela índole do movimento revolucionário para a queda aparatosa de todos os sonhos, incluindo a cisão irreversível na unidade Guiné-Cabo Verde.
A época de Nino Vieira é também cuidadosamente estudada, incluindo a deriva de Kumba Yalá. Nino Vieira regressou e o depauperamento não conheceu melhores dias, chegou a praga do narcotráfico e o aviltamento das instituições.
Para ler e tirar lições.

Um abraço do
Mário


Guiné-Bissau, 30 anos de independência, por Leopoldo Amado

Beja Santos

A revista Africana Studia, n.º 8, 2005, publicação do Centro de Estudos Africanos da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, é essencialmente dedicada aos 30 anos de independência das antigas colónias portuguesas. Coube ao historiador Leopoldo Amado, nosso confrade, a reflexão sobre a Guiné-Bissau. Começa por nos dizer que o PAIGC que chegou a Bissau em Outubro de 1974 exibia com todo o garbo a sua matriz revolucionária anticapitalista e autocrática. O novo Estado viria a ser formalmente influenciado por dois fatores: os princípios fundamentais do PAIGC e pelo sistema de países que durante essa luta o auxiliaram. O processo de reconstrução nacional contava nesta fase com a cooperação dos países na órbita de Moscovo, e de Moscovo, claramente. O PAIGC teimava em apresentar-se como partido marxista mas não como partido marxista-leninista e publicitava os seus princípios numa direção coletiva, no centralismo democrático (tal como ela era praticado pelos países comunistas) e na democracia revolucionária.

Esta fase medeia entre 1974 e 1980: o sonho de grandes projetos, uma tensão permanente entre a visão de um país profundamente atrasado e agrário e a expetativa de alguns dirigentes para que o país avançasse a galope para a industrialização. O saldo deste período foi profundamente negativo, exauriu o país, cavou tensões entre a cidade e o campo, exacerbou ódios indevidos na ausência de um plano seguro e fiável de reconciliação nacional.

Por estas razões e pela crescente crispação entre o grupo militar guineense e a elite dirigente cabo-verdiana, Nino Vieira encabeça a 14 de Novembro um golpe de Estado que era apresentado como “Movimento Reajustador”. Para Amado, o golpe oculta inúmeras contradições mal resolvidas durante o período de libertação nacional, a par de uma questão militar, política e moral que continuava sem solução, a definição de estatuto para os Combatentes da Liberdade da Pátria, que aguardavam um pouco de justiça e o prémio devido para os deficientes, incapacitados e severamente doentes. Luís Cabral, atulhado em projetos verdadeiramente faraónicos para a dimensão do país, para os quais não havia gestores à altura, teve de recorrer a ajudas financeiras. Nino Vieira seguiu, é no seu tempo que vão ser aplicados programas de estabilização e ajustamento estrutural.

A atmosfera política guineense assumia duas faces: a direção política dura e pura e as garantias que Nino dava à comunidade internacional de que ia encaminhar o país para a democratização. Nino Vieira, ao adotar o PAE (Programa de Ajustamento Estrutural) negociado com o FMI e o Banco Mundial, tentou implementar um plano de desenvolvimento que acabou por originar, na prática, a rutura com o anterior modelo de planificação marxista. E de rutura se tratou, na pior aceção da palavra, pois todos os projetos da época de Cabral foram escandalosamente deixados ao abandono.

Colapsado o modelo de planificação, nasceu a tentação da Guiné avançar para uma ideologia liberal mantendo o partido monolítico na direção. A Carta dos “121” foi o primeiro sinal de exigência à abertura. Mas o PAIGC parecia apostado na inviabilidade da abertura política a conta-gotas. Afinal, a liberalização não foi uma escolha assumida do poder político, este entrou contrafeito no processo, sob a égide de uma intensa pressão económica internacional. Em sequência, surgiu o anteprojeto da Plataforma Programática de Transição, que previa um governo baseado na separação de poderes, na consagração do sufrágio universal direto, mantendo o sistema de governo presidencial mas declarando abertura para a formação de partidos políticos. É nesta atmosfera que se chegou ao II Congresso Extraordinário do PAIGC onde foram votadas novas medidas: despartidarização das forças de defesa e de segurança e privilegiando-se um sistema semipresidencialista de governo.

Entrara-se concretamente na transição democrática. Em 1994, realizaram-se as primeiras eleições democráticas e presidenciais, o PAIGC foi vencedor. Passado cinco anos da realização das primeiras eleições, o país foi de novo a votar, depois de uma guerra civil que teve o condão de abalar praticamente todas as infraestruturas do país. Nesse clima, o PAIGC foi punido, perdeu as eleições a favor do PRS e de Kumba Yalá. Por inoperância do sucessor de Nino, iniciou-se um processo de claro desequilíbrio étnico na representação social do poder, a etnia Balanta apresentava-se ao mais alto nível da hierarquia: Presidente da República, Primeiro-ministro, Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e Presidente do Tribunal de Contas. Embora o termo não seja verdadeiramente justo, assistiu-se a uma balantização do regime, o mesmo é dizer assistiu-se ao definhamento do Estado, à incapacidade técnica e política dos titulares dos cargos públicos, à mais despudorada perversão das regras democráticas que apressaram a queda de Kumba e o regresso de Nino. É indubitável que a guerra civil clivou a sociedade guineense, pôs a nu a fragilidade da democracia a despeito do comportamento heróico dos velhos militares guineenses que puseram senegaleses e guineenses de Conacri em fuga.

Nino Vieira não soube acalmar os conflitos, até com o próprio PAIGC, exonerando arbitrariamente o Primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, o que se seguiu era irrelevante pela falta de coesão política. Chegava-se à triste realidade de haver uma completa indefinição ou mesmo ausência da presença do Estado na maior parte do território, isto a par da extrema indefinição do papel das autoridades tradicionais.

O enfraquecimento do Estado e das instituições democráticas figuram na Guiné-Bissau como a principal causa da incapacidade do Estado em usar as suas atribuições.

E Leopoldo Amado termina o seu ensaio observando que quando se fala da Guiné-Bissau como um Estado falhado, “é imprescindível que se proceda a uma profunda normalização da vida pública e à modernização do aparelho de Estado que devem ser os antídotos à corrupção reinante e à necessidade inadiável de se conferir credibilidade interna e externa ao Estado”.

Ensaio premonitório, toda esta deriva foi desaguar no golpe militar de 2012, mais um manifesto sinal que os militares, depois de 1980, contrariavam a lógica de Amílcar Cabral que confinava os militares ao poder político.
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Nota do editor

Último poste da série de 16 de Dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16839: Notas de leitura (911): “Revolução na Guiné”, edição e tradução de Richard Handyside, 1969 (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P16848: O nosso querido mês de Natal de 2016 e Ano Novo de 2017 (4): Alberto Branquinho / António Gedeão (com o poema "Dia de Natal")


Lourinhã > 10 de dezembro de 2016 > "Boneco" de Natal > Há muito que a economia "mercantilizou" o Natal dos cristãos... Não há terra nem terrinha que escape à ideologia do consumo e e à compulsão do "shopping" natalício...

Foto (e legenda): © Luís Graça  (2016). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário, ao poste P16841 (*), pelo nosso camarada, 
gã-tabanqueiro e escritor Alberto Branquinho [ex-alf mil op esp, CART 1689, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69); ver aqui algumas das suas obras publicadas]

Pois é, Zé Teixeira!

Ou, melhor, FOI.


E veio, também, essa espécie de "coisa" a que chamam "árvore de Natal". E anda toda a gente excitada neste tempo de Natal, não pela ideia de "nascer" qualquer coisa de novo (ou renovada), mas por causa das compras, compras, compras... prendinhas, prendas e prendonas...

No poema "Dia de Natal" do António Gedeão está lá isso TUDO! Só tem que se substituir o "relógio de pulso anti-magnético" pelos mais recentes "gadgets" das novas tecnologias (?) inúteis ou fúteis.

Abraços
Alberto Branquinho


P.S. - Isto lido por muita gente que a gente sabe, será seguido por um pensamento ou uma afirmação:- Velhada!Cotas! (**)



2. Dia de Natal


por António Gedeão [1910-1997]

Hoje é dia de ser bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.

É dia de pensar nos outros— coitadinhos— nos que padecem,
de lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar a sua miséria,
de perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos que não merecem,
de meditar sobre a nossa existência, tão efémera e tão séria.

Comove tanta fraternidade universal.
É só abrir o rádio e logo um coro de anjos,
como se de anjos fosse,
numa toada doce,
de violas e banjos,
entoa gravemente um hino ao Criador.
E mal se extinguem os clamores plangentes,
a voz do locutor
anuncia o melhor dos detergentes.

De novo a melopeia inunda a Terra e o Céu
e as vozes crescem num fervor patético.
(Vossa Excelência verificou a hora exacta em que o Menino Jesus nasceu?
Não seja estúpido! Compre imediatamente um relógio de pulso antimagnético.)

Torna-se difícil caminhar nas preciosas ruas.
Toda a gente se acotovela, se multiplica em gestos, esfuziante.
Todos participam nas alegrias dos outros como se fossem suas
e fazem adeuses enluvados aos bons amigos que passam mais distante.

Nas lojas, na luxúria das montras e dos escaparates,
com subtis requintes de bom gosto e de engenhosa dinâmica,
cintilam, sob o intenso fluxo de milhares de quilovates,
as belas coisas inúteis de plástico, de metal, de vidro e de cerâmica.

Os olhos acorrem, num alvoroço liquefeito,
ao chamamento voluptuoso dos brilhos e das cores.
É como se tudo aquilo nos dissesse directamente respeito,
como se o Céu olhasse para nós e nos cobrisse de bênçãos e favores.


A Oratória de Bach embruxa a atmosfera do arruamento.
Adivinha-se uma roupagem diáfana a desembrulhar-se no ar.
E a gente, mesmo sem querer, entra no estabelecimento
e compra— louvado seja o Senhor!— o que nunca tinha pensado comprado.

M
as a maior felicidade é a da gente pequena.
Naquela véspera santa
a sua comoção é tanta, tanta, tanta,
que nem dorme serena.

Cada menino
abre um olhinho
na noite incerta
para ver se a aurora
já está desperta.
De manhãzinha,
salta da cama,
corre à cozinha
mesmo em pijama.

Ah!!!!!!!!!!
Na branda macieza
da matutina luz
aguarda-o a surpresa
do Menino Jesus.

Jesus,
o doce Jesus,
o mesmo que nasceu na manjedoura,
veio pôr no sapatinho
do Pedrinho
uma metralhadora.

Que alegria
reinou naquela casa em todo o santo dia!
O Pedrinho, estrategicamente escondido atrás das portas,
fuzilava tudo com devastadoras rajadas
e obrigava as criadas
a caírem no chão como se fossem mortas:
Tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá.

Já está!
E fazia-as erguer para de novo matá-las.
E até mesmo a mamã e o sisudo papá
fingiam
que caíam
crivados de balas.

Dia de Confraternização Universal,
Dia de Amor, de Paz, de Felicidade,
de Sonhos e Venturas.
É dia de Natal.
Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade.
Glória a Deus nas Alturas.

[O poema «Dia de Natal» é publicado, em 1967, num jornal de estudantes do Liceu Camões, Lisboa,  que é apreendido pelo reitor. Fonte: Cronologia :: Rómulo de Carvalho :: Biblioteca Nacional]
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Notas do editor:

(**) Poste anterior da série:

18 de dezembro 2016 > Guiné 63/74 - P16843: O nosso querido mês de Natal de 2016 e Ano Novo de 2017 (3): Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes (...um núcleo, formidável, ativo e solidário, mas também com preocupações culturais, seguramente um dos melhores que integram a Liga; um alfabravo também para eles, seus associados e dirigentes, por parte da nossa Tabanca Grande)

Guiné 63/74 - P16847: Parabéns a você (1178): Humberto Reis, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 12 (Guiné, 1969/71) e João Melo, ex-1.º Cabo Operador Cripto da CCAV 8351 (Guiné, 1972/74)


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Nota do editor

Último poste da série de 16 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16838: Parabéns a você (1177): António Paiva, ex-Soldado Condutor Auto do HM 241 (Guiné, 1968/70)

domingo, 18 de dezembro de 2016

Guiné 63/74 - P16846: Manuscrito(s) (Luís Graça) (105): Natal de 1955 (... quando ainda o Pai Natal não tinha sequestrado e morto o Menino Jesus)


Portugal > Estremadura > A8 > Torres Vedras-Lisboa > 17 de dezembro de 2016 > O pôr do sol... Onde estão os moinhos de vento da minha infância e dos meus Natais ? E o vento soprando nas velas e nas cabaças  dos moinhos ? E o mar? E os heróis do mar ?


Foto (e legenda): © Luís Graça  (2016). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Canaradas da Guiné]



Natal de 1955

por Luís Graça



Em 1955,
soletrava-se à noite,
à luz do candeeiro a petróleo,
a lição do livro da primeira classe
onde terra rimava com chão.
Ainda não havia televisão,
havia o hino nacional, 
na rádio, que era um luxo,
havia Deus, 

havia a Pátria,
havia a Família,
e pouco mais,
e chegava,
essa tríade sagrada.
Afinal, o mundo acabava ao fundo
da rua grande da tua aldeia.

E, no Natal,
quando ainda o Pai Natal
não tinha sequestrado e morto o Menino Jesus,
ia-se à missa do Galo,
à meia noite em ponto,
na igreja do Castelo,
e só depois,
a tiritar de frio,
de regresso a casa,
pela rua escura e medonha dos Valados,
rente ao muro branco do cemitério,
é que se bebia o cacau quente
e se comiam os coscorões,
o arroz doce
e as filhós de sangue de galinha!

De manhã, junto ao fogão a petróleo
ou ao fogareiro a carvão,
a mãe tinha alinhado os sapatinhos
onde por um golpe de magia haviam florido
meias e lenços,
e uma ou outra, rara, guloseima...
e, com sorte, talvez um carrinho de lata para ti
ou  uma boneca de cartão para a mana,
comprados às escondidas na feira de setembro.

Havia uma noite do ano
em que os meninos da tua rua
eram inconscientemente felizes,
os mais inconscientemente felizes do mundo!


Havia o ouro, a mirra,
os três reis magos,
e um deles era o pretinho da Guiné,
havia o presépio,
o burro, 
a vaca, 
a esterqueira, 
havia o incenso,
ligeiramente enjoativo das missas,
havia, enfim, o sagrado
e o pagão,
e a tudo isto, ou a só isto,
se resumia o acanhado palco da vida
que te coubera em sorte.

E, claro, havia o mar,
os moinhos nos cabeços,
e o vento uivando nas velas e nas cabaças dos moinhos,
e, por detrás dos cabeços e dos moinhos,
e das velas e das cabaças dos moinhos,
havia o mar,
o grande oceano.
e o apelo irresistível 
do(s) que estava(m) para além do mar.


Excerto de:

Luís Graça - Autobiografia: com Brughel domingo à tarde
(poema, inédito, 2005, c. 40 pp)
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Nota do editor:

Último poste da série > 17 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16848: Manuscrito(s) (Luís Graça) (104): uma boa oferta de Natal o livro do José Ferreira da Silva, "Memórias Boas da Minha Guerra" (Chiado Editora, 2016, 216 pp.)... Um bom antídoto contra o stress natalício e a tristeza que nos invade ao cair da última folha do calendário...

Guiné 63/74 - P16845: Blogpoesia (485): "Um lema para toda a vida"; "Arrosto o mar das emoções" e "Salão do café", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. O nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) vai-nos enviando ao longo da semana belíssimos poemas da sua autoria, dos quais publicamos estes, ao acaso, com prazer:


Um lema para toda a vida

Dócil.
Submisso.
Atento e compassivo.
Grato.
Combatente.
Aberto e acessível.
Reservado,
Mas risonho e circunspecto.

Misericordioso e penitente.
Religioso a cem por cento,
Sem dar nas vistas.

Constante,
Fiel e apaixonado.
Interveniente e positivo.
Carinhoso e apaixonado.

De tudo um pouco,
Com peso e com medida.

Seja o lema para uma vida cheia...

Berlim, 12 de Dezembro de 2016
8h49m
Jlmg

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Arrosto o mar das emoções

Como um barco afoito,
No rebentar das ondas,
Em mar irado, me lanço e arrosto,
Sem olhar para trás.

As domino e venço.
E o mar largo e imenso,
Se abre em frente.

Cumpro a minha rota
Até alcançar o cais.
É ao largo que é alto e fundo
O céu.

Só o cintilar das estrelas
Me ofusca e inunda os olhos
E, por eles a alma.

Como astronauta,
A voar na altura,
É do mar que a nitidez da Terra avulta…

Ouvindo Susan Boyle

Berlim, 11 de Dezembro de 2016
18h0m
JLMG

************

Salão do café

Adoro presenciar os casais sentados à mesa,
frente a frente num café.
As horas correm e eles, indiferentes,
conversam, sorriem, olhos nos olhos,
segredam-se os sonhos,
prometem amores sem favor.

Tempo sadio. Banhado de amor.
Flashes raiados de cor.

Adoro ver os casais em meninos,
se descobrindo por sendas, ignotas,
onde moram
O desejo e a fome
Do corpo e da alma.

Morrem temores em abraços, quentes,
Fervem os corpos trementes.
Lampejam os ossos.
A pele se arrepia em frémitos
E jorram dos olhos
Desejos escondidos...

Lá fora, caídas no chão,
Jazem amarelas, molhadas,
As folhas.
É Dezembro sem neve...

Bar dos Motocas., arredores de Berlim, 9 de Dezembro de 2016
11h. 52m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 11 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16822: Blogpoesia (484): "Travo seco e amargo..."; "Chamam pelo sol..." e "Como embondeiros...", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

Guiné 63/74 - P16844: Agenda cultural (531): O novo palácio do Nicolau: espetáculo de multimédia: Lisboa, Terreiro do Paço, fachada do Arco da Rua Augusto, todas as noites até 23 de dezembro, às 19h00, 19h45 e 20h30... O tema das alterações climáticas no planeta... Levem os netos e os bisnetos... porque a terra não é nossa, é deles...


Fonte: Agenda Cultural de Lisboa, com a devida vénia


E também com a devida vénia, citamos aqui a jornalista Susana Lopes Faustino, da "Visão", que acrescenta: 

"O enredo pode parecer estranho para uma história de Natal, mas, como o espetáculo de vídeo mapping O Novo Palácio do Nicolau pretende chamar a atenção para temas como o meio ambiente e as consequências das alterações climáticas, são personagens como a ilha de plástico, o monstro do petróleo ou a desflorestação que fazem de maus da fita. 

"A iniciativa, quase a alcançar o estatuto de tradição, começa esta quarta-feira, 14, e prolonga-se até dia 23, na Praça do Terreiro do Paço, em Lisboa, o mesmo local onde já é possível admirar a árvore de Natal gigante (tem uma altura de cerca de dez andares). A servir de tela para o espetáculo de vídeo mapping, produzido pela Bridge em parceria com a Grandpa's Lab, está mais uma vez a fachada do Arco da Rua Augusta, que se encherá de cor, luz e espírito natalício."
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Nota do editor:

Último poste da série > 11  de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16824: Agenda cultural (530): Colóquio "A Cidade, o Mosteiro, os Afetos" e Lançamento do livro "Arco de Memórias", de José Eduardo Oliveira (JERO), Luci Pais e Rui Rasquilho, dia 18 de Dezembro de 2016, pelas 16 horas, na Cooperativa Agrícola - Alcobaça (José Eduardo Oliveira)

Guiné 63/74 - P16843: O nosso querido mês de Natal de 2016 e Ano Novo de 2017 (3): Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes (...um núcleo, formidável, ativo e solidário, mas também com preocupações culturais, seguramente um dos melhores que integram a Liga; um alfabravo também para eles, seus associados e dirigentes, por parte da nossa Tabanca Grande)


1. Mensagem de boas festas enviada pelo Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes, com data de 16 do corrente, e a que retribuímos com votos de boa saúde e longevidade para todos os camaradas,  associados e dirigentes. 

Daqui a 10 anos este núcleo vai fazer 100 anos!

Destaque para o seu projecto da construção da “Sede Social/Centro de Dia”, uma ideia que tem vindo a ganhar força face ao problema  do envelhecimento dos combatentes. Segundo se lê na apresentação do Núcleo da Covilhã na página oficial da Liga dos Combatentes, é dever do Núcleo: (i)  lutar contra adversidades, (ii) congregar sinergias que permitam intensificar actividades, (iii) proporcionar a abertura a outras formas complementares de lazer e cultura," em suma colaborar para um envelhecimento saudável, onde não falte a medicina preventiva, curativa e de reabilitação, apoiada em serviços de gerontologia, geriatria e fisioterapia."

O segundo projeto, esse já em velocidade de cruzeiro, é a publicação, trimestral "O Combatente da Estrela". de 20 pp -,  e que recebemos regularmente, em formato pdf, na nossa caixa de correio. É também distribuído, gratuitamente,  em papel. (Vd. abaixo a folha de rosto do nº 103, relativo a julho-setembro de 2016: neste número, colaboram, com textos da da sua autoria, dois dos nossos grã-tabanqueiros, camaradas da Guiné, o José Teixeira e o Juvenal Amado).  Um alfabravo para o seu diretor, o João Cruz de Azevedo, o seu subdiretor, João de Jesus Nunes,  e demais colaboradores.

O que sabemos, através das notícias que nos chegam, veiculadas por este seu jornal, é que se trata de um núcleo, formidável, ativo e solidário, mas também com preocupações culturais, seguramente um dos melhores que integram a Liga dos Combatentes

Tem página no Facebook que é seguida por diversos camaradas nossos da Tabanca Grande.




Detalhe da página principal de "O Combatente da Estrela", edição nº 103, jul-set 2016, órgão do Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes,
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Nota do editor:

Último poste da série > 16 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16840: O nosso querido mês de Natal de 2016 e Ano Novo de 2017 (2): Boas festas, de Macau, tão longe e afinal aqui tão perto (Virgílio Valente, ex-alf mil, CCAÇ 4142, Gampará, 1972/74)

sábado, 17 de dezembro de 2016

Guiné 63/74 - P16842: Manuscrito(s) (Luís Graça) (104): uma boa oferta de Natal o livro do José Ferreira da Silva, "Memórias Boas da Minha Guerra" (Chiado Editora, 2016, 216 pp.)... Um bom antídoto contra o stress natalício e a tristeza que nos invade ao cair da última folha do calendário...


Capa do livro. Cortesia de Chiado Editora



O Zé mais o neto (Foto de Juvenal Amado,
Serra do Pilar, V.N. Gaia, 2016)
1. Mensagem do José Ferreira da Silva com data de 10 de novembro passado:

[Foto à direita: José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), mais o neto, em Vila Nova de Gaia]

Caro Tabanqueiro Mor

Como é bem do teu conhecimento, o lançamento do meu livro "Memórias boas da minha guerra" tem corrido pelo melhor. Devo-te muito e ao nosso Blogue, este sucesso. Gostaria de te enviar um exemplar autografado. Para isso, preciso que me indiques o endereço. OK?

Depois do lançamento no Salão Nobre da Serra do Pilar e da apresentação na Tabanca de Matosinhos, vejo-me na obrigação de fazer uma apresentação cá na terrinha de Crestuma. Por isso, e antes de novos eventos, marquei para o dia 17 de Dezembro (11 horas) essa apresentação no edifício da Junta da Vila de Crestuma.

Como me palpita que virás para norte, para a Quinta do Douro, passar a quadra natalícia, gostaria de saber se poderás dar-nos a honra de ser o Apresentador do livro. O ambiente será porreiro, até porque já está assegurada a presença do Bando [do Café Progresso], que já marcou um almoço convívio na Casa dos Leitões.

Aguardo boas notícias.
Grande abraço,
José Ferreira


2. Comentário de LG:

Meu caro José:

É uma honra o teu convite. Como logo te respondi, apeteceu-me aceitá-lo, de imediato, mesmo não tendo a certeza de aí poder estar, em Crestuma, hoje, dia 17...  Na realidade, não pude mesmo estar aí, hoje, de manhã, mas sei que estive bem representado pelo meu camarada, amigo e coeditor Carlos Vinhal, na companhia  do pessoal do Bando do Café Progresso. O Carlos, coadjuvado pela Dina (que também é nossa grã-tabanqueira e talentosa  fotógrafa), irá por certo fazer a devida reportagem, completíssima, do evento.

Já viste também, seguramente., a "nota de leitura" que de imediato fez, do teu livro, o nosso camarada Mário Beja Santos.

Obrigado, Zé,  pela tua gentileza, simpatia, amizade e camaradagem,  ao mandares-me pelo correio o teu livro com a dedicatória que acima reproduzo e que não podia deixar de me sensibilizar. Mas não tens que agradecer o que temos feito por ti, já que tu tens feito muito mais pelo blogue que é de todos nós.

Convenhamos que a altura é  tramada, esta quadra natalícia, em que as solictações são muitas e o tempo é sempre curto. Não é por acaso que se fala do... "stress de Natal" ... Mas, enfim, também é uma boa altura para divulgares o teu livro e, se possível, recuperares alguma da  massa empatada no negócio... Como é sabido, também não há livros grátis... Os camaradas da Guiné pagam para editar os seus livros nas editoras comerciais... De borla, só no nosso blogue, em formato digital... E aqui já se revelaram dezenas e dezenas de camaradas com talento para a escrita... Por isso  fazes muito bem em aproveitar esta quadra festiva, em que  as pessoas, mesmo empobrecidas por estes últimos anos de austeridade cega,  estão mais calorosas, afetuosas e dispostas a abrir o cordão à magra bolsa,,,

Sou o pirmeiro a promover o teu livro: em papel ou em ebook, é uma boa oferta de Natal,  o teu livro ,,, Eu continuo a preferir o papel, leva-se para todo o lado, do comboio ao WC, da cama à esplanada, da praia ao banco do jardim... E eu ainda sou do tempo em que se tomavam notas e se sublinhava, a lápis, as páginas dos livros em papel... Sou incapaz de ler um livro sem sublinhar, sempre a lápis... Mais: eu ainda sou do tempo em que se lia livros, e livros em papel...

Como te disse, abri o exemplar autografado que me ofereceste, num sítio algo insólito, inesperado, senão mesmo inapropriado, o consultório... do dentista. E as histórias que reli, enquanto esperava a minha vez, confesso que não perderam "o encanto da primeira vez"... Mais do que isso, já li ou  reli, deliciado, divertido, quase metade das tuas "memórias boas da guerra" (27 ao todo, se não erro). E começo por louvar o título que escolheste (e que o mesmo da tua série no blogue)... "Memórias boas da minha guerra" é saudavelmente provocatório... Mas tu és o próprio a avisar, citando o Pablo Neruda, que "só um louco pode desejar guerras", já que a "a guerra destrói a própria lógica da existência humana"...

Essas histórias, é bom entretanto  relembrá-lo, foi o nosso blogue que teve o privilégio de começar a publicá-las,  muito antes de tu, em boa hora, teres pensado em passá-las para papel.

Contrariamente ao que te havia prometido, não consegui arranjar tempo para escrever um "nota de leitura", mais pessoal (e ... "transmissível"),  como tu mereces e o teu livro merece. Fica prometida, então, uma análise crítica mais detalhada do livro. Teremos que aguardar melhor ocasião, quiça até ao fim do ano.

Até la, recebe um, abraço festivo, natalício e fraterno do Luís.
_______________

Nota do editor:

Último poste da série > 1 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16785: Manuscrito(s) (Luís Graça) (103): E no 1º de dezembro, a banda a tocar o Ti Zé da Pera Branca...

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Guiné 63/74 - P16841: Estórias do Zé Teixeira (43): O meu Natal perdeu todo o encanto no dia em que o Menino deu lugar a um velho de barbas brancas que trazia um saco às costas, a quem chamavam o Pai Natal mas não era o pai do Menino (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enf)

1. Uma "prenda de Natal" que nos mandou o Zé Teixeira, ex-1.º cabo aux enf,  CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada , 1968/70, com data de 11 do corrente:

Meus caros camaradas.

O Natal está a chegar. Por todo o lado “chovem” flashes comerciais a lembrar o Natal e a injetar convites para o consumismo.

Há outro Natal, talvez mais verdadeiro – o Natal de cada um – Um convite a viver a amizade e a partilha do sorriso, do abraço que aquece o coração.

Gostava de transmitir a todos os camaradas que de algum modo “passeiam o olhar pelo nosso 

blogue os meus votos de que tenham um Santo Natal, com muito amor e carinho.  E para entreter, junto um pequeno conto num regresso aos meus tempos de criança.


2. Estórias do Zé Teixeira (44 > O meu Natal perdeu todo o encanto no dia em que o Menino deu lugar a um velho de barbas brancas que trazia um saco às costas, a quem chamavam o Pai Natal mas não era o pai do Menino


O Natal era aquela noite santa em que o Menino nascia no presépio, mas que antes passava lá por casa. Chegava de noite, quando o João estava a dormir. Trazia-lhe uma prendinha que a madrinha comprava na manhã seguinte. Mas era um segredo muito bem guardado. Até a padaria, nesse dia, abria antes da missa, para que as madrinhas fossem para casa, logo após o “ite missa est”, acordar os afilhados levando-lhe a prendinha para colocar no tamanco, que as crianças deixavam junto à lareira. Era apenas uma pequena regueifa em forma de pomba, mas tinha o valor de todo o ouro do mundo.

O João admirava aquele Menino, tão pequenino, cheio de frio que nascia no presépio naquela noite, prenhe de magia. Vinham os tios, da longínqua cidade junto ao mar, para contar as suas histórias; vinham os primos de sapato engraxado e tudo! Era uma festa.

Estar acordado, para ver o Menino chegar com as prendinhas, era o sonho do João. Mas Ele era maroto. Chegava à meia noite e o soninho vinha mais cedo. Bem tentava resistir, mas as pestaninhas teimavam em fechar-se. Então encostava a cabeça no colinho da mãe e adormecia. A mãe depositava-o no leito com carinho. Aconchegava-lhe o cobertor e cantava a cantiga

“O meu menino é doiro.
 é doiro o meu menino,
hei-de levá-lo ao céu
 enquanto for pequenino."

O João, tolhido pela sonolência, tentava opor-se e balbuciava: não quero ir para o céu, quero ficar à tua beira! Depois adormecia e só acordava quando a madrinha o chamava, já o sol tinha chegado para iluminar o céu e o Menino se tinha ido embora.

Como era lindo o céu do Natal! Tinha o aspeto de uma grande abóbada azul, onde o sol se plantava de manhãzinha para derreter a fria neve que cobria a noite, e levar calor às crianças que esperavam o Menino.
– Bom dia Joãozinho! – dizia-lhe a madrinha com uma voz muito meiguinha. – O Menino já nasceu e depositou uma prendinha no tamanquinho que deixaste na lareira. Queres ir ver?

O João saltava-lhe para o colo, porque a neve era fria, muito fria. Abraçados, corriam para a cozinha e encontravam no tamanco a pombinha de regueifa.

O Natal do Menino desapareceu, para nossa frustração. Perdeu-se o encanto daquela criança que nascia pobrezinha na manjedoura, e tinha sempre uma prendinha de amor para a todas as crianças da terra.

Era assim o Natal dos pobres. Mas era tão rico!

Deu lugar à noite do velho de barbas brancas que traz um saco às costas, a quem chamam o Pai Natal, mas não é o pai do Menino.ã

Ah! Como eu gostava que o Natal do Menino voltasse todos os dias e não só nas noites frias. Ele tinha o condão de deixar as pessoas muito felizes.

José Teixeira
______________

Nota do editor:

Último poste da série > 30 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16541: Estórias do Zé Teixeira (42): Tempestades

Vd. os últimos cinco postes:

8 de junho de 2016 > Guiné 63/74 - P16176: Estórias do Zé Teixeira (41): O sonho do João

(...) A noite chegara cedo. Extenuado de um dia de trabalho, o João adormeceu no sofá, deixando-se abraçar suavemente pelo Morfeu que o transportou rapidamente ao país dos sonhos… Caminhava com uma sombra à sua frente. Parecia-lhe o pai vergado por um dia de trabalho.As árvores da floresta verdejante impediam a sua passagem. O sol penetrava por entre a folhagem, aquecendo-lhe o corpo de forma impiedosa. O zumbido estridente de um mosquito perturbava-o. Parecia um comboio a apitar, quando se aproximava dos seus ouvidos. Então, parou e olhou em redor. (...)


(...) O Cascais sentiu-se perdido no alto mar. A amargura penetrava-lhe na alma. O ondular das ondas que faziam dançar a velha e desgastada carcaça do Niassa, recordavam-lhe que há muitas marés. Há marés baixas e marés altas. No circuito da sua vida passada, assim tinha acontecido, mas as nuvens que ao longe escondiam o azul dos céus, varriam-lhe a mente, escondendo-lhe o futuro. Sabia de onde vinha, não sabia para onde ia. Vagueava como um autómato no convés do barco. (...)

3 de dezembro de 2010 Guiné 63/74 – P7373: Estórias do Zé Teixeira (39): O medo do terrífico telegrama (José Teixeira)

(...) Naquele dia 8 de Fevereiro de 1970, uma mãe esquecida do quadragésimo oitavo aniversário, preparava o almoço para os três filhos. Um quarto estava ausente na Guiné. Este, tinha feito 23 anos dois dias antes. Era comum juntar-se a família no dia oito e cantarem-se os parabéns em duplicado. Apenas se mudavam as velas no bolo que aquela mãe, analfabeta, cozinhava com todo o carinho. (...)

(...) No dia 24 de Julho de 1968, uma mina A.C. (Anti-Carro) roubou a vida a um camarada que ia em cima da viatura de rádio a comunicar com a base em Buba. Foi o meu primeiro encontro no mato com o IN e o primeiro camarada que vi morrer sem lhe poder valer. Nunca soube o seu nome. Apenas sei que pertencia à Companhia dos Lenços Azuis, que estava estacionada em Aldeia Formosa e nos foi buscar a Buba para de seguida partilharmos aventuras em comum durante mais de meio ano. (...)

11 de agosto de 2009 > Guiné 63/74 – P4808: Estórias do Zé Teixeira (37): “A vala, salva vidas” (José Teixeira)

(...)  Chegado a Buba, toda a gente correu para os poucos chuveiros existentes, formando fila. Enquanto uns se molhavam, outros esfregavam o sabão, fazendo um rodopio. Os restantes, completamente nus, esperavam pacientemente uma vaga, quando o IN apareceu a baptizar a Companhia atacando de canhão sem recuo, morteiro e "costureirinha". De repente um estrondo lá longe. Logo se ouviu a frase mágica que eu nunca mais vou esquecer - “Aí estão eles” - vinda de vários lados. Numa fracção de segundos, o tempo da vida ou da morte, toda aquela gente desapareceu da vista. (...)