terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20662: Agenda cultural (743): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte V: Momento alto da tarde cultural: a moda "O meu chapéu", pelo Rancho dos Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa: letra e música de João Monge


Vídeo (3' 42''). Alojado em You Tube > Luís Graça


Lisboa > Casa do Alentejo > 8 de fevereiro de 2020 > Sessão de lançamento do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial: Guiné-Bissau, 1973-1974: memórias de Gabu" (Lisboa, Edições Colibri, 2019, 220 pp.).

Momento musical... de se lhe tirar o chapéu : atuação do Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa. Moda: O meu chapéu. Letra e música: João Monge.

Vídeo: Luís Graça (Com a devida vénia, ao grupo e ao autor...). (*)



Capa do álbum (2016) 


A MODA DO MEU CHAPÉU

Letra e múscia: João Monge


Aldeia Nova de S. Bento,
Plantada no meio do trigo.
Teu cantar é um lamento,
Gosto de cantar contigo.

Se passares à minha aldeia,
Não vás de cabeça ao léu,
Quando o sol mais almareia
Podes pôr o meu chapéu.

Podes pôr o meu chapéu,
A mais valiosa herança,
Já foi de quem está no céu
E não me sai da lembrança.


Quando nos faltar a voz,
Há-de haver uma mão-cheia
A cantar por todos nós,
Tenho cá na minha ideia

Tenho cá na minha ideia
Que o cante se ouve no céu,
Se passares à minha aldeia
Não vás de cabeça ao léu.

Quando eu ouço bem cantar,
Paro e tiro o meu chapéu.
Não se me dava morrer,
Se houvesse cante no céu.
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Nota do editor:

Último poste da série > 17 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20661: Agenda cultural (742): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte IV: Momento alto da tarde cultural: a moda "Fui ao jardim passear", pelo Rancho dos Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20661: Agenda cultural (742): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte IV: Momento alto da tarde cultural: a moda "Fui ao jardim passear", pelo Rancho dos Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa


Vídeo (3' 20'') Alojado em You Tube > Luís Graça


Lisboa > Casa do Alentejo >  8 de fevereiro de 2020>  Sessão de lançamento do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial: Guiné-Bissau, 1973-1974: memórias de Gabu" (Lisboa, Edições Colibri, 2019, 220 pp.)

Momento cultural: atuação do Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, Serpa. Moda: Fui ao jardim passear. Letra e música: tradicional. (Com a devida vénia...). (*)

Vídeo: Luís Graça



Capa do álbum (2016) 


FUI AO JARDIM PASSEAR

Lera e música: tradicional, Alentejo


Das flores que há no campo,
Qual é a mais estimada,
É a flor do rosmaninho
Que entra na casa sagrada.
Fui ao jardim passear,
Trouxe um ramo de alecrim
Para dar ao meu amor,
Que não se esqueça de mim.

Que não se esqueça de mim,
Para sempre se alembrar,
Trouxe um ramo de alecrim,
Fui ao campo passear.

Levantei-me um dia cedo
E fui passear ao campo,
Encontrei o teu retrato
Na folha dum lírio branco.

Fui ao jardim passear,
Trouxe um ramo de alecrim
Para dar ao meu amor,
Que não se esqueça de mim.

Que não se esqueça de mim,
Para sempre se alembrar,
Trouxe um ramo de alecrim
Fui ao campo passear.



Recorde-se que esta e outras modas (como O Meu Chapéu), que se tornaram "virais",  fazem parte do
CD Álbum  que o "Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento" (ensaiador: Pedro Mestre) lançou em 25 de novembro de 2016.

Sinopse: Passados dois anos desde que o Alentejo e Portugal se ergueram de orgulho por o Cante ser considerado pela UNESCO Património Mundial e Imaterial da Humanidade, é editado, em 2016, o álbum de um dos mais tradicionais e antigos ranchos de cante alentejano: Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, que conta com vários convidados especiais, nomeadamente Luísa Sobral, António Zambujo, Miguel Araújo, Jorge Benvinda e Pedro Mestre. (**)

O grupo tem página no Facebook. E tem três concertos agendados para o CCB, Lisboa, no Grande Auditório (c. 1500 lugares) para os próximos dias 20 de março de 2020, às 21h00, e 21 de março 2020, às 16h00 e às 21h00.
_______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 11 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20640: Agenda cultural (740): Lisboa, 8 de fevereiro de 2020, na apresentação do livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": quando o Alentejo e o Gabu se tocam - Parte III: Mais um momento memorável com o grupo "Os Alentejanos", de Serpa... Manga de ronco, Zé!

Último poste da série > 16 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20658: Agenda cultural (741): "Bá D'al na Rádio: memórias da Rádio Barlavento", livro do nosso camarada Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, QG/CTIG, Bissau, 1973/74, membro da Tabanca Grande, nº 790, mindelense, jornalista e radialista, a viver na Praia, Santiago, Cabo Verde

(**) Vd. poste de 3 de janeiro de 2017 > Guiné 61/74 - P16911: Agenda cultural (534): Um grande álbum do cante alentejano (agora, do mundo), "Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento" (2016), com a participação especial de António Zambujo, Luísa Sobral, Pedro Mestre e outros...

Guiné 61/74 - P20660: Notas de leitura (1265): Dicionário de Paixões, por João de Melo; Dom Quixote, 1994 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 10 de Fevereiro de 2017:

Queridos amigos,
João de Melo não precisa de apresentações, basta pensar nesse livro memorável que é "Autópsia de um Mar de Ruínas", em Fevereiro de 2017 apareceu a 9.ª edição reescrita pelo autor, é romance marcadamente autobiográfico da sua experiência como furriel enfermeiro algures no Norte de Angola.
Peguei neste "Dicionário de Paixões" à procura da alma açoriana, que ele tão bem exprime e dei com estas páginas a que nenhum velho combatente pode voltar a cara. Alguém que sabe confessar-se assim: "Trata-se de uma paixão inquieta, povoada, um pouco depressiva talvez. Mas trago-a desde a minha infância numa ilha dos Açores - desde o tempo em que me era preciso ser amado por todos; justamente porque tinha já uma imensa e universal paixão por toda a gente".

Um abraço do
Mário


A guerra de África em páginas soltas de João de Melo

Beja Santos

O escritor João de Melo é a figura cimeira tanto no estudo da literatura da guerra colonial como operário dessa escrita. Devemos-lhe “Os Anos da Guerra”, organizou em 1988 uma antologia de escrito representativos das três frentes da guerra e que ainda hoje é de consulta obrigatória. Em 1984, publicou “Autópsia de um Mar de Ruínas”, em 9.ª edição, reescrita em 2017, está na lista das obras-primas da literatura de guerra. Em “Dicionário de Paixões”, que apareceu em 1994 nas Publicações Dom Quixote, João de Melo deu à estampa crónicas que são textos que falam de sentimentos, visões, desejos, estranhezas, aproximações, experiências dos sentidos. Chamou-lhes crónicas sentimentais e ensaios de sonhos, fragmentos de uma autobiografia apócrifa.

Respigo das suas lembranças de África, combateu na região de S. Salvador, no Norte de Angola:  
“Continuo a vê-las, as crianças de África, chegaram à porta de armas, obedecerem à ordem do soldado louro que está de plantão e as manda pôr em formatura. Trazem velhas latas cheias de ferrugem, os rostos sujos, os pés descalços, as roupas inacreditavelmente rotas: ainda assim, há nelas uma muito extraordinária dignidade, uma alegria que só é possível no rosto e na inocência das crianças. Vêm pelos restos e comida, pelo rancho que sobra sempre do fastio da tropa. Entram em fila, quartel dentro, marchando ao som dos dedos que tamborilam o fundo das latas. Vejo-as e oiço-as. São as crianças de África, e vão-se lentamente acercando do refeitório da tropa. Param alguns metros, suspendem o clamor do batuque. Faz-se um silêncio trágico, feito de uma paciência triste, árida, longamente vexada. Penso: não é o justo o mundo tão grande e a grandeza humana tão pequena (…) Vejo-as, ontem e hoje, com os olhos da memória, nos livros que li e na prosa que em mim regressa. Continuam as sôfregas mãos, trémulas de febre, a mergulhar no lixo, no riso e nas vozes trocistas da tropa. Com os dedos em concha, pescam escamas, espinhas trucidadas de peixe, bagos encaroçados de arroz, ossos esburgados, batatas por descascar. Comem clandestinamente, devorando, rilhando o dente, ardendo em febre fria, escondendo-se do soldado que varre agora do lado de lá do refeitório. Disputam aos cães os restos de comida, com a avidez canina e a maldade de se empurrarem umas às outras, numa rixa surda. Enchem as latas com lixo e comida, deitam a correr parada fora, papá, mamã e os cambutas vão ter enfim o jantar assegurado”.

Estamos agora em plena guerra colonial, chegou uma mensagem ao aquartelamento, o operador de transmissões, qual alquimista, decifra códigos ultrassecretos, e a mensagem decifrada é entregue ao superior. “Lendo-a, o capitão estremeceu, pálido, quase estarrecido, como se nele viesse a notícia do seu próprio funeral. Ao entrar no gabinete, vinha aéreo, poroso, levitante. Chamando os alferes à sua presença, trancou a porta por dentro, abriu perante eles grandes gestos nervosos, antes de partilhar o insuportável conteúdo daquele segredo. Nela se garantia (e a PIDE nesse tempo, tal como Deus, nunca se enganava, que cerca de 300 elementos inimigos e respetivas famílias haviam atravessado a fronteira, a fim de se entregarem às tropas portuguesas. Impunha-se, por isso, que os quartéis do Norte ficassem em estado de máxima prevenção”. Começava assim a operação para intercetar e recolher os tais desertores. Marcara-se um lugar previsto e saíram pelotões a cumprir a sua missão.
E temos o desfecho:
“Um quarto para a meia-noite, e nós no mato, abrindo trilhos no capim, em progressão para o objetivo. 200 metros à frente, desarmados e em pânico, o alferes e os furriéis repetiam o santo e a senha. De duas uma: ou o guia dos desertores inimigos já lá estava à espera, de braços erguidos e pronto a entregar-se, ou então seriam eles a cair, abatidos como tordos, trespassados por uma rajada de metralhadora (…) Longas horas à espera desses corvos noturnos – espiando o capim, ouvindo a ilusão dos pequenos ruídos da noite, vendo o que por força sempre fora invisível. Até que o dia clareou e pelo rádio veio a ordem de suspender a operação. No regresso, com alma embrulhada nos logros frios do desencanto e da derrota, vivêramos não um pesadelo, mas a crueldade de mais uma mentira de guerra… Ao fim desse mesmo dia, uma segunda mensagem veio repor a outra, a segunda verdade da nossa tragédia: afinal, tratara-se de um simples exercício militar; nunca estivera prevista a entrega voluntária de quaisquer desertores. Mas, em contrapartida, os sublimes comandos portugueses mandavam dizer que as nossas tropas tinha estado perfeitamente à altura das circunstâncias”.

E fala também dos heróis da guerra, operacionais que nunca se separavam da sua faca de mato, nem das granadas presas ao cinturão. “Muitas virtudes assistiam aos heróis da minha guerra. Era o caso de dormirem apenas o essencial. Sem sono nem fadiga, passavam as noites à bebida, temperando-as com latinhas de anchovas, atum, sardinha de conserva, pasta de fígado. Ao terceiro dia de permanência no quartel, entre uma operação e a seguinte, urravam como bois pela parada, clamando contra o tédio, desesperados com os formigueiros do cio, fartos de tudo, implorando que os deixassem voltar depressa para a mata (leia-se guerra) e lhes dessem turra a matar (…) Os heróis da minha guerra espumavam de raiva contra as ideias dos traidores de Portugal, e largavam bojardas, partiam garrafas de cerveja contra o pavimento da messe dos sargentos. Mas eu sabia que eles, todos eles, absolutamente todos, um dia, quando as coisas mudassem e outra fosse a linguagem (e outros os donos e servos dela), seriam impolutos, sérios, democratas. E havia de ouvi-los garantir que nunca tinham dado um tiro ou maltratado um prisioneiro de guerra, que também eles eram vítimas do fascismo, que em Angola, em Moçambique e na Guiné se tinham empenhado não em fazer a guerra, mas em sabotar as operações, numa espécie possível de desobediência ao regime colonialista de então”.

Falando do seu autorretrato, volta a falar da guerra:
“Dizem que por ter feito a guerra colonial em Angola (1971-1974), perfilhou dela uma visão sensível, determinante, porventura radical, nos romances, novelas, contos e antologias que sobre ela publicou. Nada disso é certo nem falso”.

Não esqueçamos que o título da obra é Dicionário de Paixões, onde o autor explicita:
“A paixão existe. Não é um sentimento perdido. Ela tem a idade, a sombra, a explicação e o destino da literatura. A sua honra, também. Nunca o esquecimento foi necessário à literatura. O prazer e o sofrimento sim. Os seus excessos, também. E as suas perdições”.
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20649: Notas de leitura (1264): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (45) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20659: Parabéns a você (1758): António Carvalho, ex-Fur Mil Enfermeiro da CART 6250 (Guiné, 1972/74) e Fernando Chapouto, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 1426 (Guiné, 1965/67)


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Nota do editor

Último poste da série de 16 de Fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20654: Parabéns a você (1757): António Eduardo Carvalho, ex-Cap Mil da CCAÇ 3 e CCAÇ 19 (Guiné, 1974) e José Maria Pinela, ex-1.º Cabo TRMS do BCAV 3846 (Guiné, 1971/73)

domingo, 16 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20658: Agenda cultural (741): "Bá D'al na Rádio: memórias da Rádio Barlavento", livro do nosso camarada Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, QG/CTIG, Bissau, 1973/74, membro da Tabanca Grande, nº 790, mindelense, jornalista e radialista, a viver na Praia, Santiago, Cabo Verde



Cartaz do evento. Cortesia de Carlos Filipe Gonçalves




1. Mensagem, de ontem,  do nosso camarada Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, QG/FTIG,  Santa Luzia, Bissau, 1973/74, radialista, jornalista, escritor, estudioso da morna e de outras formas da música de Cabo Verde, membro da Tabanca Grande, nº 790 
(*):

Luís:

Desculpa, esta falha, pois tenho estado muito activo… foi o lançamento do livro sobre a Rádio Barlavento, em 31 de janeior, agora estou a braços com o próximo livro para abril ou maio, "Capitulos da Morna", este devia sair em dezembro por altura da consagração, mas atrasou-se… E claro, o livro sobre a Guiné está parado… mas brevemente te darei noticias deste outro trabalho…

Aqui vão o dados, que me pediste, sobre o livro que lancei recentemente na cidade da Praia. Se precisares de mais algum dado pede, se tiveres perguntas estou ao dispor. Segue também o cartaz, uma sinopse do livro e uma pequena nota biográfica sobre mim, bem como algumas opiniões sobre a obra.

Um forte abraço

Carlos Gonçalves

Jornalista aposentado

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Título: Bá D’al na Rádio – Memórias da Rádio Barlavento

Autor: Carlos Filipe Gonçalves

Editora : Livraria Pedro Cardoso – Bairro da Fazenda, Cidade da Praia, Cabo Verde.


O titulo é em crioulo, significa literalmente: Vai dar isso na rádio. Ou seja, vai difundir isso na rádio.

Trata-se uma frase jocos que surgiu depois da invasão / ssalto da Rádio Barlavento, na Ilha de S. Vicente, em Dezembro de 1974, em pleno período «revolucionário» após o 25 de Abril. É que o assalto ou «tomada da rádio», foi justificada, por uma «soit disant» democratização/pluralismo de acesso, o que na verdade não se verifica, porque todos os elementos contrários à «Unidade entre a Guiné e Cabo-Verde» foram presos poucos dias depois...


Teve início então uma avalanche de «comunicados revolucionários» depois das reuniões do comités do PAIGC, que eram enviados à rádio! Surgiu então esta frase jocosa, a criticar esta situação… Começou deste modo o «regime de Partido Único»…


Resumo: Carlos Filipe Gonçalves, que começou a trabalhar na Rádio Barlavento aos 16 anos, conta as recordações dele, de colegas e amigos que lá trabalharam, descreve o contexto social da época e traça o percurso histórico que culmina no assalto e encerramento daquela rádio e do Grémio Recreativo Mindelo em 1974: um acerto de contas numa luta de classes latente desde inícios do século XX que terminou com a nacionalização dos órgãos de comunicação social e um monopólio/situação dominante do Estado que vigora até ao presente.


2. Sobre o autor:

Carlos Filipe Fernandes da Silva Gonçalves, jornalista, músico:

(i) nasceu em Mindelo, S. Vicente em 12 de Outubro de 1950;

(ii) começa aos 16 anos a trabalhar na Rádio Barlavento, como discotecário, na realidade esteve a seu cargo por cerca de quatro anos a programação musical daquela estação emissora;

(iii) em 1971 deixa S. Vicente para cumprir o serviço militar em Portugal; foi mobilizado em 1973 para a Guiné, colocado em Bissau;

(iv) depois do 25 de Abril de 1974 toma contacto com amigos cabo-verdianos do PAIGC recém-chegados a Bissau, disponibiliza-se para dar o seu «contributo» como se dizia na época;

(v) trabalha como chefe da programação na Radio Libertação (entretanto deslocada para Bissau) transformada pouco depois em Radiodifusão Nacional da Guiné Bissau;

(vi) depois da Independência regressa a Cabo Verde, onde trabalha como chefe da programação na Radio Voz di Povo na Praia, também transformada logo depois em Emissora Oficial de Cabo Verde.;

(vii) a partir de 1980 estudou em Paris, no Instituto Nacional do Audiovisual;

(viii)  chefe de programação (1984/86) e director da Radio Nacional de Cabo Verde (1986/91); concebeu e criou a Rádio Comercial, que começou a emitir em 1999 e da qual foi director até 2013.

3. Sobre a obra (**):

Memórias muito interessantes e inclusivas pois que se estendem a nós, outros que também, vivenciámos esse tempo... Bem documentada a história de uma instituição (R+adio Barlavento) muito importante na vida destas ilhas de partidas de emigrantes, de separação inter-ilhas, da condição de ilhéu, em suma o que foi a Rádio. 

Tem um excelente capítulo sobre o nascimento e as condições vividas pela Radio Barlavento. Sobre o Grémio, fundamentos da instituição e o ambiente social à época, está muito interessante e bem conseguido. E ainda, excelentes contribuições, para a história da música da grande cidade musical que foi Mindelo! O autor tem um estilo coloquial, de leitura aprazível e que prende o leitor.

Ondina Ferreira

Leitura simplesmente deliciosa. As ideias estão muito claras e bem enquadradas.

Luís Guimarães Santos

Globalmente Carlos Gonçalves,  é a tua história, tua vivência da Rádio, sobretudo Rádio Barlavento, pelo que, o que posso dizer é que está bem contada e fiquei a conhecer sobretudo o teu percurso.

João Matos

Muitas memórias e escrita fluída.

Manuel Brito Semedo

(…) Pertinente o trabalho de investigação que estás a fazer para o livro sobre a Rádio Barlavento! (…) É bom reviver os bons momentos que vêm desse tempo, em que sobressaía a autêntica amizade!

Jorge Guimarães Santos

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 5 de dezembro de  2019 > Guiné 61/74 - P20416: O que é feito de ti, camarada (8): Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, QG/CTIG, Bissau, 1973/74, membro da Tabanca Grande, com o nº 790; jornalista aposentado, vive na Praia, ilha de Santiago, Cabo Verde... Está a escrever dois livros, um sobre a história da morna; outro sobre as suas memórias dos anos de 1973/75... E precisa de duas fotos: uma do QG em Santa Luzia, e outra da messe de sargentos no QG...

Guiné 61/74 - P20657: Blogues da nossa blogosfera (122): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (37): Palavras e poesia


Blogue Jardim das Delícias, do Dr. Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, (Canquelifá e Bigene, 1966/68), com a devida vénia, reproduzimos esta publicação da sua autoria.

NO CORAÇÃO DA MANHÃ

ADÃO CRUZ

© ADÃO CRUZ


Abro a janela de par em par
para entrar o rio
e o cio do amanhecer.
O sol desnuda as telas
e as cores que fizeram a noite
mergulham no frio
das águas fundas do rio.
Pelos tectos de penumbra
das vidas que vivem na sombra
às escondidas da madrugada
voam pedaços de nevoeiro
e gaivotas bailando.
Sobem no ar gemidos e dores
Vapores, desejos e cores
das gargantas secas da noite acabada.
Retomo os pincéis
e a tortura das tintas sem cor
e a dor de não conceber a textura
onde pintei o amor.
Nada mais quero além do sol e do rio
e a fecunda sensação de não ter frio.
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20634: Blogues da nossa blogosfera (120): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (36): Palavras e poesia

Guiné 61/74 - P20656: Blogpoesia (660): "Rondo meu eu...", "Transparências mágicas..." e "A pente fino...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados, entre outros, ao nosso blogue durante a semana, que continuamos a publicar com prazer:


Rondo, meu eu…

Meu eu é redondo.
Me abraça e envolve por dentro e por fora.
Sente fugazes os passos do tempo.
Louva e lamenta o que sabe e ignora.
Foge da dor e corre para a esperança.
Abre ao sol as janelas que tem.
Sabe de si.
Arremessa para longe o ócio e a dor,
Cultiva na sombra o bom e o bem.
Guarda para si segredos e não conta a ninguém.
Respeita os deveres e
sabe de cor os direitos que tem.
Aprecia o louvor.
Aceita sofrer por amor com os males de alguém.
Acredita que o bem é maior que o mal.
Se não fosse assim o mundo já teria acabado…

Ouvindo H. Grimaud 2/3 Rachmaninov piano concerto No.2 in C minor, op.18 [Adagio sostenuto]
Berlim, 14 de Fevereiro de 2020
9h53m
Jlmg

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Transparências mágicas...

Devasso as sombras mentais e me lanço no encalço das résteas de luz.
Projecto na mente minhas tendências vitais.
Alcanço auroras que iluminam a vida e fazem viver.
Arquétipos astrais dum mundo perdido.
Sonhos de sonho que despertam saudades.
Anseios ocultos que reflectem outros matizes que renascem das sombras.
Só a mente capta e entende...

Ouvindo Tchaikovsky: El lago de los cisnes - Swan Lake - Rizzo - Orquesta Joven de la OSG en María Pita
Berlim, 9 de Fevereiro de 2020
8h51m
Jlmg

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A pente fino…

Estrelas cadentes, me passam à frente.
Ideias luzentes. Brilhantes na cor.
Se esfumam depressa.
Não dá para apanhar.
Boto uma rede de malha bem fina.
Aflitas, parecem sereias.
Redemoinhando aflitas.
Se mostram contritas.
As junto em feixes como se fossem sardinhas.
Alindo-lhe as formas.
Alinho-lhe as linhas.
Afito-lhe arestas.
Tapo-lhe as frestas.
Ateio-lhe a luz.
Chego-lhe o fogo.
As mando para os céus.
Como se fossem balões.
Não sei onde caem.
Oxalá, num dia de sol.
Num dia de festa…

Berlim, 12 de Fevereiro de 2020
18h19m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de Fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20633: Blogpoesia (659): "A voz da consciência", "Por entre matas e florestas" e "Como borboleta livre...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

Guiné 61/74 - P20655: Da Suécia com saudade (63): reabrindo a Tabanca da Lapónia, agora ao povo... (José Belo)



A minha alegre casinha.. Tabanca da Lapónia: ela continua a lá estar, em Abisko, Kiruna... O endereço, na Net,  é que mudou.


"O valor das coisas näo está no tempo em que elas duram, mas na intensidade com que acontecem.
Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis" (Fernando Pessoa)


"Sem casas näo haveria ruas / as ruas por onde passamos pelos outros / mas e principalmente onde passamos por nós". (Ruy Belo: Todos os poemas, Lisboa, Assírio e Alvim, 2000)



Os fiéis amigos...


Visitas nem sempre  bem  vindas...


Para onde é que fica Empada ?... 

"Partir! / Nunca voltarei,/ Nunca voltarei porque nunca se volta. / 
O lugar a que se volta é sempre outro, / A gare a que se volta é outra. /
Já não está a mesma gente, nem a mesma luz, nem a mesma filosofia."

Álvaro de Campos / Fernando Pessoa 




"Lourinhac" ?.....Cá tem!... Mas o meu vodka caseiro (94%,  depois de 4 passagens pelo alambique) aí vendía-se certamente na... farmácia! Para mais é medicinal com casca de limäo e pau de canela, ou casca de limäo e rosmaninho. SKÅL !!! (Leia-se: Saúde!).


Fotos (e legendas): © José Belo  (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do José Belo: 

Data - 13/02/2020, 22:02
Assunto - Tabanca da Lapónia


Entretive-me umas horas a reconstruir a Tabanca da Lapónia numa versão evocativa de 40 anos de literais... congelamentos vários!

Algumas fotos e vídeos repescados das 4 versões anteriores a somarem-se a alguns novos.
Por faltas de paciência, várias das fotos contêm,de momento,pouco "paleio", oferecendo unicamente uma brisa fresca (!) desde bem dentro do Círculo Polar Árctico..

José Belo

A quereres dar uma saltada "nostálgica" até à última zona verdadeiramente selvagem da Europa...Sê bem vindo!

A morada é tabancalaponialusitano.blogspot.com
O título do blog é :

Lusitano...40 Anos na Lapónia

Um abraço, José Belo


2. Dois dias depois, oui seja ontem,  às 11h07, recebemos nova mensageem, com o seguinte teor:

Assunto - Convívio de... génios

Depois da "reinauguracäo" da Histórica (!) Tabanca da Lapónia,  acabei por lá colocar , a título de "apifamento", alguns pensamentos de um ramalhete de de génios do tipo Ruy Belo, Fernando Pessoa e...J. Belo!

Escrita agora em *português de lei*, vamos ver se alguns Lusitanos ciberturistas acabam por surgir neste blogue.

As antigas Tabancas da Lapónia, escritas em inglës e sueco, conseguiram estabelecer contactos com amigos da Escandinávia e dos States mas, muito poucos em Portugal. (*)

É mais uma tentativa de "vender" o ar fresco do Círculo Polar Árctico.
Bem-vindo!

Um abraço.

(E a propósito de "portuguës de lei",  acabei de aprender depois destas muitas décadas que a maneira correcta de escrever-se Lapónia na língua de Camöes é...LAPÔNIA!...LAPÔNIA??!?!

3. Para quem chegou ontem à Tabanca Grande... recorde-se que  o José Belo:

(i) é o régulo da Tabanca da Lapónia, nas suas várias "versões";

(ii) é membro da Tabanca Grande, para onde entrou "de jure e de facto"  em 8 de março de 2009;

(iii) tem cerca de 140 referências no nosso blogue, ou seja, é um "contribuinte líquido", dá mais do que o que recebe;

(iv)  formado em direito, foi jurista na América e na Suécia;

(v) a guerra, a paz e o amor levaram-no até à Suécia onde vive há mais de 4 décadas, e onde constituiu família;

(vi) continua a ter uma pontinha de orgulho nas suas velhas raízes portuguesas: de vez em quando escreve, no nosso blogue, uma crónica para a sua série "Da Suécia com saudade"; 

(vii) no século passado,  nioutra reincarnação, foi alf mil inf da CCAÇ 2381, Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70, e manteve-se no ativo, no exército português, durante uma década; 

(viii) está reformado como cap inf do exército português;

(ix) não sei se, como ao Camões, lhe pagam o mísero soldo, sendo um "autoexilado" (não cinfundir com... "desertor"): os amigos queixam-se de que a Pátria lhe foi Madrasta;

(x) reparte os dias do ano entre a Suécia (Estocolomo), o círculo polar ártico, na Lapónia (Abisko, Kiruna), e  Key West, na Flórida, EUA, onde a família (os filhos)  tem negócios e onde vivem os seus netos;

(xi) as vicissitudes da vida (, as suas "partidas"...) tornaram-no um "resistente" (ou diria: "resiliente"):

"Os meus 10 anos de vida militar, muito rica em 'acontecimentos' hoje incríveis, a somar-se a toda uma "tarimba" jurídica nos States, seguida de voluntariamente ter escolhido viver com o vizinho mais próximo a 297 km da minha porta, tornaram-me no que hoje sou....extremamente resistente. Quase como escreveu o poeta :"Deixei de ser aquele que esperava...isto é...deixei de ser aquele que nunca fui".

(xii) considera-se um exemplar de uma espécie em vias de extinção (**)

PS - Ah!, e não é primo do Ruy Belo... Belos há muitos, belos, bravos e bons é que... não!


4.  Comentário do editor Luís Graça:

José: acho que te faz bem… a ti e a nós, sentir esse frio polar ártico a entrar pelos poros da pele, pelas narinas, pelos meurónios, pela "alma" (para quem ainda tem "alma")... mas não pelas frinchas das portas e janelas, que a tua Tabanca é climatizada! 

 Acho que te faz bem reabrir a Tabanca da Lapónia"… e assumir a tua “idiossincrasia” de lusitano das 7 partidas, “perdido” na Lapónia há 40 anos…

É, ademais,  um gesto de grande hospitalidade, camaradagem e lhaneza, próprias de um puro lusitano como tu, abirr a tua casa ao "povo", depois de aí  receberes  a nobreza vikiNg e a burguesia ianque.

Como prometido, e com a devida vénia,  fiz uma visita ao teu blogue e uma seleção das tuas imagens. (Os vídeos, esses, deixo-os para exploração dos mais "voyeuristas")… 

Não sei a quem atribuir os créditos fotográficos. Mas, por defeito, pertencem ao régulo...A dificuldade é escolher, dada a magia de cada uma das fotos e sobretudo das legendas poéticas!... Sei que és um leitor de longa data de poetas portugueses como o Ruy Belo, o J. Belo  (, que por acaso não são  primos) e do Fernando Pessoa (ou dos Fernandos Pessoas)... 

É uma boa terapia, a escrita, a blogoterapia, , a poesia.. E eu perguntei-te (e tu não me respondestes, estás nesse direito...)  se tu não tinhas (ou nunca tiveste) um… diário.

Enfim, imagina que me lembrei  de te lançar um desafio: fazeres um check-list das 24 horas do dia na vida de um lusitano na Lapónia… Os "lapões" da Tabanca Grande, uma vez reaberta, ao "povo" a tua Tabanca da Lapónia, vão querer saber mais coisas sobre a vida do régulo no seu dia-a-dia:

(i) a  que horas é que  te levantas ? 
(ii) a que horas é que te deitas ?  Aqui é os séniores deitam-se  com as galinhas, aí será com as renas;
(iii) como é que tu te deslocas quando vais às compras ? 
(iv) também vais à caça e à pesca ? ou és agora conservacionista ?
(v) e como é que te desenrascas quando as renas e os cães precisam de veterinário ?
(vi) enfim, o que é que se come e bebe aí na tasca da Tabanca da Lapónia  ? 
(vii) será que o régulo é mais peixeiro do que carneiro ?
(viii) o campismo é "tax free" ?

e coisas idiotas do género. O problema é que a Tabanca da Lapónia, apesar de toda esta recente publicidade, ainda não vem nos roteiros turísticos da Lusitânia. Vou pedir ao PInto Loes (agência do Porto) para te pô no mapa... Ou é melhor não ?!

Sabemos que, se o régulo quiser tomar um chá na casa da/o vizinha/o  mais próxima/o,  tem que fazer uns 300 quilómetros (, o equivalente à distância de Lisboa ao Porto)... Em trenó puxado a renas, deve demorar umas horas valentes...Aindapor cima à luz dos archotes... 

Deve acrescentar-se que o termo "lapão" (feminino: "lapoa") pode ser considerado ofensivo e até racista...À cautela, vamos de futuro procurar evitá-lo... De resto, ele há coisas que,  quem um dia for lá, à Tabanca da Lapónia, deve saber, para não fazer... "merda": Lapónia para os lapões é... Sápmi.
Lapöes é... Samer. Um Lapão é... Same.  Uma Lapoa (mulher da Lapónia) é... Samisk kvinna. (**)

Meu caro régulo: a Lapónia (, sim, os brasileiros dizem Lapônia), por causa do sol da meia noite, das auroras boreais e do Pai Natal, tende a ser vista de maneira muito redutora e estereotipada... Por isso, se calhar é muito “voyeurismo", da parte dos nossos leitores, perguntarem-te estas coisas todas... Por razões até de segurança, não deves responder a nenhum delas...Quem quiser saber mais, que vá aí e te bata à porta: será por certo bem recebido, se for por bem, e com uma credencial da Tabanca Grande...  Ah!, e não se esqueçam: levem também uma garrafinha da Aguardente Vínica DOC Lourinhã... (Na minha terra, quem a bebia, escapou à gripe espanhola, à "pneumónica", a pandemia de 1918/19, que matou mais de 60 mil portugueses...).

Zé, não leves a mal... Há camaradas da Tabanca Grande que, nem por um canudo, conseguem ver Braga, quanto mais a Lapónia… Mas Braga tinha obrigação de ter uma tabanca, e não tem. Tem uma arcebispo, tem uma sé, tem um clube de futebol... mas não tem uma tabanca!...As tabancas mais próximas são a dos Melros (Gomdomar, Fânzres), da Maia, a de Matosinhos...

A Lapónia, colónia sueca, que não tinha obrigação nenhuma, até tem uma tabanca!...E já "histórica", sim, senhor!... 

Há 40 anos, é obra!...Grande lusitano!... Enfim, se estivesses mais perto, a gente  até ia ter contigo um dia destes… Em abril vou aos países bálticos num daqueles  esquemas de “turista estúpido”… mas não vai dar para beber um vodca contigo!... Como eu bem gostaria!... (****)

(***) Vd. postes de:

20 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15270: Da Suécia com saudade (55): Despedida do blogue, dos editores e de todos os de mais camaradas... Afinal, também há 4 décadas saí do nosso querido Portugal sem bilhete de ida e volta... Os amigos terão sempre uma "casa portuguesa" ao dispor, na Lapónia sueca, em Estocolmo, ou em Key West, Flórida, EUA (José Belo)

(****) Último poste da série > 8 de dezembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20427: Da Suécia com saudade (62)... E agora também dos States, Florida, Key West... A catarse do Império... O lugar do Portugal de hoje, tanto na Europa como no mundo, é que deveria ser assunto de discussões acaloradas (José Belo)

Guiné 61/74 - P20654: Parabéns a você (1757): António Eduardo Carvalho, ex-Cap Mil da CCAÇ 3 e CCAÇ 19 (Guiné, 1974) e José Maria Pinela, ex-1.º Cabo TRMS do BCAV 3846 (Guiné, 1971/73)


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Nota do editor

Último poste da série de 13 de Fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20645: Parabéns a você (1756): Miguel Rocha, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2367 (Guiné, 1968/70)

sábado, 15 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20653: Os nossos seres, saberes e lazeres (377): A Bélgica a cores que guardo no coração, e para sempre (5) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Setembro de 2019:

Queridos amigos,
Por aqui se desfiam recordações, décadas a fio a percorrer Bruxelas, a vadiar, graças ao comboio, por lugares atrativos, a ter o privilégio de alguns amigos irem assegurando viagens curtas pela Valónia e pela Flandres, consegue-se este mapeamento que não fica só no coração e sai assim aos soluços, mas há o recurso a muitos sacos de plástico com folhetos das digressões efetuadas, há os livros e até bilhetes de entradas em museus e concertos.
Tudo somado e desmultiplicado, aqui se deixam notas soltas sobre o tal país muito plano, criado artificialmente para travar ambições à França e à Alemanha, esta Bélgica que se divorciou da Holanda, ocupada durante as guerras mundiais e que conserva uma capital que tem eventos culturais por metro quadrado como nenhuma outra cidade no mundo.
Esta é a Bélgica que se me entranhou com lembrança perpétua.

Um abraço do
Mário


A Bélgica a cores que guardo no coração, e para sempre (5)

Beja Santos

Como se fosse hoje, mas de facto aconteceu em 1977, quando o viandante saiu na Gare Central, era tudo um descampado à volta, chamou-lhe a atenção uma pequena igreja, e para lá se dirigiu, de mala aviada. Ficou logo com a ideia que era um edifício desasado, e veio a confirmar que aquela igreja fazia parte de um convento que foi destruído nas guerras religiosas do século XVI. Guarda a portada barroca, foi restaurada nos anos 50, tem um belo vitral, bem datado. A propósito de vitrais, quem visita Bruxelas não deve perder a sumptuosidade da catedral, vitrais magníficos. Rezam os guias que estes vitrais da catedral tem um valor excecional, neles intervieram grandes artistas do século XVI como Bernard van Orley.

Igreja da Madalena, Bruxelas.


Vitrais da Catedral de S. Miguel e Santa Gudula.

A cerca de uma hora de Bruxelas, o viandante tem à sua espera, a partir da gare central, a febril cidade de Antuérpia. A catedral é impressionante, é o edifício mais alto da cidade, começou a ser construída em meados do século XIV, e a sua torre com 123 metros ficou concluída em 1530. Merece uma visita prolongada e conserva uma excecional peça de Rubens, cada vez que o viandante por lá passa tira sempre fotografia e vem comprar os respetivos postais.

Catedral de Nossa Senhora, Antuérpia.

“A Elevação da Cruz”, de Rubens, Catedral da Antuérpia.

Visitar Tongres, é como ir a Arlon ou a Tournai, os lugares mais vetustos da Bélgica. Estamos em território flamengo, por aqui aconteceram piratarias dos Hunos e dos Normandos, aqui se expressou uma arte decorrente da espiritualidade da Renânia. O claustro é antiquíssimo, data do século XII e é de uma beleza sem rival a sua galeria com arcadas, não se pode ficar insensível à harmoniosa alternância das colunas isoladas e acopladas.


Claustro de Tongres.

Várias vezes o viandante deambulou pela Abadia de Orval, a escassos quilómetros da fronteira francesa. Obra dos Beneditinos do século XII, eram discípulos de S. Bernardo. Estas ruínas são da primeira Igreja Cisterciense, pilhada, devastada e incendiada em 1637. Com a Revolução Francesa, a abadia voltou a ser devastada e pilhada. Ali ao lado temos uma terceira igreja, em cor de mel, foi consagrada em setembro de 1948, mas estas ruínas fazem ecoar a grandeza que o homem levanta e tem capacidade de arrasar sem remissão, ficam os vestígios de uma espiritualidade mutilada.

Abadia de Orval.

Há edifícios municipais na Bélgica que atestam opulência e majestade. Diante deste Hôtel de Ville não se tem dificuldade em sentir que foi erigido como manifestação de orgulho, data do tempo de Carlos V, é todo ele imponência, marcado pelo gótico flamejante. No alto da cúpula temos a representação da Coroa Imperial de Carlos V. Digamos que Audenarde não tem muito que se veja mas não se pode perder esta preciosidade.

Edifício da Câmara Municipal de Audenarde.

Voltamos a Bruxelas, e desta vez a uma avenida que ainda guarda marcas do fausto do século XIX, a Avenida Louise, foi então um elemento de ligação entre o rico centro urbano e os arrabaldes rurais e florestais até conhecer a urbanização maciça, que foi implacável a desfigurar a antiga grandeza, as árvores foram dizimadas, a avenida está furada por túneis e tornou-se numa autoestrada urbana, mas ficaram edifícios do seu antigo esplendor e os jardins são muito belos, veja-se esta escultura, não tenho dúvidas em que mereça todos os encómios como um dos expoentes da arte urbana de Bruxelas.

Escultura de Olivier Strebelle na Avenida Louise, Bruxelas.

Prosseguem as recordações. Foi sobretudo a partir do período da sua reforma que o viandante e o amigo belga que o acolhia em Watermael-Boitsfort passaram a visitar regularmente a Abadia de la Cambre, e era obrigatório entrar na igreja que foi erigida no século XIV, com as intervenções habituais correntes nesta arquitetura religiosa. Os guias turísticos recomendam uma visita a esta igreja para admirar uma cabeça de Cristo atribuída a Albert Bouts (século XV).

Interior da Igreja da Abadia de la Cambre.

No termo desta viagem com regresso inesperado, o viandante vai prazenteiro até ao Parque Josaphat, com jardinagem à inglesa, enxameado de belas esculturas, a visita é obrigatória no tempo das tulipas. E com um toque de nostalgia acaba hoje a viagem para recomeçar num amanhã incerto, mas sempre suspirado.

Escultura clássica do Parque Josaphat, Bruxelas.

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 8 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20632: Os nossos seres, saberes e lazeres (376): A Bélgica a cores que guardo no coração, e para sempre (4) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20652: Em busca de... (301): 2.º sargento miliciano Augusto Ali Jaló, do Pel Caç Nat 58 (Mansoa, 1970/74)... Com a cabeça a prémio, depois da independência, fugiu para o Senegal e daqui para Lisboa... Mas ninguém sabe hoje do seu paradeiro (Daniel Jacob Pestana / Jorge Picado)

1. O Daniel Jacob Pestana que se apresentou há dias à Tabanca Grande (*) , como ex-alferes miliciano de Operações Especiais,  CCaç 4641 (Mansoa e Bissau na Comissão de Extinção da Pide/ DGS, 1973/74), fez-nos também um pedido, que vamos aqui recordar:

(...) Nesta primeira mensagem, solicito a ajuda possível, tendo em vista a localização de um ex-militar Africano, que estava colocado em Mansoa, Era, salvo erro, 2º Sargento do quadro permanente, de nome Jaló, e vendia gado, que vinha do Senegal, para a nossa tropa.

Foi a ele que alugámos uma casa ao lado da sua residência de família, onde eu vivi durante uns meses com a minha mulher.  A mulher dele era Fula, de nome Lama, e, apesar da barreira da língua, entendia-se perfeitamente com a minha mulher. Tinham três filhos pequenitos, que eram o encanto da minha mulher.

Gostávamos muito de os reencontrar, mas até à data não temos tido sucesso. Ficarei, desde já, agradecido por qualquer informação sobre a sua actual localização. (...)


2. A resposta, célere, veio do nosso camarada do Jorge Picado, ilhavense, membro sénior da nossa Tabanca Grande, veterano dos nossos encontros nacionais, tendo cerca de 110 referências no nosso blogue; engenheiro agrónomo reformado; ex-cap mil, CCAÇ 2589 / BCAÇ 2885, Mansoa, CART 2732, Mansabá, e CAOP 1, Teixeira Pinto, 1970/72;

Caro Camarada Daniel Pestana

A pessoa em causa só pode ser o 2.º Sarg Mil Augusto Ali Jaló, que pertenceu, e possivelmente no teu tempo ainda pertencia,  ao Pel Caç Nat 58, que no meu tempo (1970/71) era um dos Pel Caç Nat de reforço à CCaç 2589. 

De facto era, segundo julgo, Futa-fula, filho de um importante lider religioso da Zona Leste de nome Mama Ingar, i habitante em Cambor (?). Foi dos que escapou na fatídica emboscada de 12 de Outubro de 1970 entre Braia e Infandre: apesar de ferido conseguiu esconder-se num buraco tapado pela vegetação, não sendo assim capturado apesar da grande "caça" que lhe fizeram, pois era um homem "marcado" pelo PAIGC, dada a grande influência e importância que tinha face aos africanos.

Conseguiu escapar após a independência, uma vez que "tinha a cabeça a prémio" com se costuma dizer, chegando ao Senegal e por lá andando fugido até conseguir chegar a Lisboa.

Quando tive conhecimento disto,  ainda tentei contactá-lo pelo n.º de telemóvel  que me deram, apesar de me avisarem que,  não conhecendo ele o meu n.úmero, não atenderia, como de facto aconteceu. 

O meu informador, camarada dessa minha Companhia,  também já lhe tinha perdido o rasto, uma vez que ele, mesmo em Lisboa, não "parava" muito tempo no mesmo sítio por se saber perseguido.
Em todos os almoços da Unidade pergunto por ele aos poucos camaradas do sul que ainda restam, mas até hoje não há mais informações sobre ele.

Sê bem vindo e abraço de um também "Mansoanca"

Jorge Picado
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sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20651: (Ex)citações (363); em dia de namorados, qual é a morna mais romântica de todos os tempos ? Segundo o "Expresso das Ilhas", é "A Força de Cretceu", a força do amor, poema do grande poeta da Brava, Eugénio Tavares, que nasceu (1867) e morreu (1930) em Nova Sintra



Cabo Verde > Ilha da Brava > 6 de novembro de 2012 >  Estátua do grande poeta Eugénio Tavares (1867-1930)...   


["Brava é uma ilha e concelho do Sotavento de Cabo Verde. A sua maior povoação é a vila de Nova Sintra. O único concelho da ilha tem cerca de sete mil habitantes. Com 67 km², Brava é a menor das ilhas habitadas de Cabo Verde, e tem uma densidade populacional de 101,49/km². A ilha tem uma escola, um liceu, uma igreja e uma praça, a Praça Eugénio Tavares". Fonte: Wikipédia]


Foto (e legenda): © João Graça (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. O "Expresso das Ilhas", na sua edição "on line", de hoje, dia dos namorados, fez um a pequena inquirição junto de um conjunto de personalidades cabo-verdianas do mundo da música e da literatura, sobre a morna mais romântica de todos os tempos...

(...) "Morna, música rainha de Cabo Verde e Património Imaterial da Humanidade, é a expressão musical da alma um povo. E é uma expressão, por natureza, romântica. Mas dentro de toda a variedade de mornas, há composições que se salientam, pela ode que fazem ao Amor e aos amores.

"Para marcar este dia de São Valentim, inquirimos algumas pessoas directa ou indirectamente ligadas à música e poesia: Qual é a morna mais romântica de sempre?

"Com tantas e tantas composições de excelência e referência que Morna gravou ao longo do tempo, a resposta não é muito fácil. Mas há algum consenso e um Top 3" (...)


(...) "Força di Cretcheu" de Eugénio Tavares é, indiscutivelmente, a morna rainha entre as mornas românticas.

"Foi a escolha de músicos, cantores e compositores como Betú, Teté Alhinho, Tibau, Alberto Koenig, Tó Tavares, e também do antropólogo, especialista em Eugénio Tavares, Manuel Brito-Semedo.

"Seis, em oito entrevistados, colocaram-na no top das mornas românticas." (...)


2. Já quanto às interpretações, o consenso é menor, as opiniões dividindo-se entre Sãozinha Fonseca, Celina Pereira e Gardénia (, esta última, nascida na ilha da Brava tal como o poeta, está a viver nos Estados Unidos)... 

Diz Tibau: “Apesar de não ser fácil a escolha de uma versão mais bonita, escolho a na voz da Gardénia Benros, arranjos do grande Paulino Vieira."

No You Tube, há um vídeo onde se pode escutar escutar esta grande artista cabo-verdiana, interpretando "A Força de Cretceu".


A letra, fomos recuperá-la aqui, no portal da Fundação Eugénio Tavares, e reproduzimo-la, com a devida vénia... [a Fundação Eugénio Tavares tem sede em Sintra, Portugal]. 


Julgamos que não é preciso tradução para português, não obstante o fraco traquejo do crioulo cabo-verdiano... por parte da generalidade dos nossos leitores.


A Força de Cretcheu

Ca tem nada na es bida
Mas grande que amor
Se Deus ca tem medida
Amor inda é maior.
Maior que mar, que céu
Mas, entre tudo cretcheu
De meu inda é maior

Cretcheu más sabe,
É quel que é di meu
Ele é que é tchabe
Que abrim nha céu.
Cretcheu más sabe
É quel qui crem
Ai sim perdel
Morte dja bem

Ó força de cretcheu,
Que abrim nha asa em flôr
Dixam bá alcança céu
Pa'n bá odja Nôs Senhor
Pa'n bá pedil semente
De amor cuma ês di meu
Pa'n bem dá tudo djente
Pa tudo bá conché céu

Eugénio Tavares



[Fonte: EugenioTavares.org. Reproduzido com a devida vénia...]


3. Mas há aqui uma tradução, para português, de Grace Roças ( a quem agradecemos a ajudinha...). Eu arrisquei fazer pequenas 'melhorias', a pensar nos leitores portugueses...

A Força do Amor

Não tem nada nesta vida
maior do que o amor.
Se Deus não tem medida,
o amor ainda é maior.
Maior que o mar e o céu.
Mas de entre todos os amores,
o meu ainda é maior.

Amor gostoso
é  aquele que é o meu,
ele é a chave 
que abre o meu céu.
Amor gostoso
é aquele que eu quero.
Ah, se eu o perder, 
Morrerei.

Ó força do amor 
abre a minha asa em flor,
deixa-me alcançar o céu
para eu ver o Nosso Senhor,
para eu pedir a semente 
do amor bem igual ao meu,
para eu dar a toda gente,
para todos conhecerem o céu.

 

Guiné 61/74 - P20650: Convívios (915): XXXIX Encontro do Agrupamento de Transmissões da Guiné, dia 9 de Maio em Vila Nova de Famalicão (Belarmino Sardinha)

XXXIX ENCONTRO DO AGRUPAMENTO DE TRANSMISSÕES DA GUINÉ

DIA 9 DE MAIO DE 2020

VILA NOVA DE FAMALICÃO


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Nota do editor

Último poste da série de 20 de janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20578: Convívios (914): A festa dos 10 anos da Magnífica Tabanca da Linha: gente feliz, sem lágrimas, mas com saudades dos que já partiram - Parte II (Fotos de Jorge Canhão / Zé Rodrigues / Manuel Resende)

Guiné 61/74 - P20649: Notas de leitura (1264): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (45) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Setembro de 2019:

Queridos amigos,
Enquanto o bardo espraia a sua existência na rotina pacífica de Bissau, porque já se andou no Sul, na batalha do Como, se fez itinerância pelo Oio e arredores, havendo paz nos Bijagós, ocorre visitar um dos locais mais ásperos de toda aquela guerra, Madina do Boé, cedo o PAIGC se apercebeu que aquele lugar, aquele isolamento permitiam fazer um bulício tremendo, ter sempre à mão uma carreira de tiro, até para mostrar aos jornalistas e amantes da revolução.
O livro de Gustavo Pimenta contribui para se perceber a psicologia do combatente, resistente, preparado para viver todas as contingências da mais imprevista morteirada ou canhonada. E havia também que destilar alguns estados de alma. Gustavo Pimenta refere o que se sentia a levantar uma mina, o que nos deu aso a republicar belíssimas páginas escritas por Francisco Henriques da Silva na sua "Guerra da Bolanha".

Um abraço do
Mário


Missão cumprida… e a que vamos cumprindo (45)

Beja Santos

“Este amigo e camarada
a camisa e os calções mudava.
Quando não ia passear
as botas eu não largava.

Às seis horas o clarim a tocar,
o Andrade se erguia,
e os calções ele vestia
e as botas a acompanhar.
A cara eu ia lavar.
Junto com a maçaricada
a bexiga era despejada
voltando para a caserna,
e punha a boina moderna
este amigo e camarada.

Depois de beber o café
levava horas pensando
e por letras ia contando
o que sofria na Guiné.
Eu tive sempre muita fé
que à terra natal regressava.
Na Amura os dias passava
ou alegre ou chateado,
e para andar sempre asseado
a camisa e os calções mudava.

De noite eu espairecia
a ver a mana russinha
e o nosso amigo Vidinha
com o Horta para lá ia.
O 49 e o Joaquim Maria
até chegaram a rastejar.
No canhão se vinham sentar,
junto de mim e do Teixeira.
Espiava as moças a noite inteira
quando não ia passear.

Tinha um barrete camuflado
que eu não podia deixar.
Servia para me sentar
ao chegar a qualquer lado.
Na minha cama recostado,
lia, escrevia e contava,
muitas noivas arranjava,
para não pensar na amargura.
E no quartel da Amura
as botas eu não largava.”

********************

O bardo deu em intimista, desabafa sobre o seu quotidiano, é como se nos desse luz verde para discretear sobre a guerra que continuava, ao rubro em Madina do Boé, como noutros pontos do Sul, no Oio e arredores. Porque em 1965, quando o bardo está na Amura, o PAIGC já não tem só pistolas nem armas antiquadas, há mais de um ano que usa minas, flagela com morteiros e bazucas, sobre quartéis e nas picadas. Alguns aquartelamentos, pelo seu isolamento, são o bombo da festa. É o caso de Madina, como escreve em “sairòmeM, Guerra Colonial”, Gustavo Pimenta, Palimage Editores, 2000. É um romance inequivocamente diferente de tudo quanto até agora se referiu, como logo o título alude é escrito do fim para o princípio, o leitor é forçado a um exercício de dilucidação, tem pela frente uma leitura em vários sentidos. É muito intimista, não se fala em nomes, regra geral, não há assomos de farronca nem tiques de heroísmo, temo-lo a observar a inquietação que assedia os outros que o acompanham.
Assim:
“Que sentirá um condutor-auto quando vê minas a destruírem sucessivamente as viaturas que o precedem e tem, de súbito, de ser ele a conduzir a que vai na cabeça da coluna? Sozinho, entregue aos seus pensamentos, que pensará?
Na mulher? Nos filhos?
Há poucos gestos comparáveis aos daqueles que vi, serenamente, sem protesto nem resmungo, assumir o lugar da mais presumível das vítimas. Quero supor que os animava o sentido do mais sagrado dos deveres. Que é o de, pela simplicidade de quem acredita e cumpre um destino, se oferecerem à troca por quem foi condenado a enfrentar desigualmente a roleta da vida e da morte”.

Gustavo Pimenta
Caminham para Madina do Boé, levantaram-se algumas minas entre Canjadude e o Ché Che, os T6, lá nos céus, eram presença tranquilizadora.
E descreve onde e como vive:
“Se o aquartelamento, com as enormes clareiras que o rodeavam, era praticamente inexpugnável a qualquer tentativa de assalto, a verdade é que se tornava extremamente vulnerável como alvo das elevações que o circundavam.
Deslocarmo-nos para as tarefas mais comezinhas, para uma simples mijada fora do abrigo, tornara-se numa espécie de jogo do gato e do rato. Nunca sabíamos se eles estavam à coca e nos sairia na rifa o tiro isolado do dia. Aos mais afoitos, os mais loucos, já lhes dava, às vezes, para subirem ao alto de um abrigo e despejarem insultos a tudo quanto fosse guerrilheiro inimigo e respectiva família, enquanto evidenciavam convenientes manguitos.
Foram os mais insustentáveis tempos da nossa guerra.
As múltiplas inscrições que o pessoal foi colocando, em estacas ou nas árvores, um pouco por todo o lado, eram significativas. Na zona mais exposta a esse verdadeiro exercício de tiro ao alvo, qual barraca de feira, ficava uma avenida Lee Oswald. Na parte central do quartel, protegido por quatro estacas com arame à volta, estava o monumento ao mijo, uma granada de morteiro semienterrada, que não rebentara. Do lado da pista, na única entrada, protegida com cavalos de arame farpado, por onde entravam viaturas, estava uma banca repleta de recordações de Madina: empenas de granadas de morteiro e de canhão sem recuo. Se pudéssemos, tínhamos lá misturado todas as nossas angústias.”

Numa atmosfera destas, importava manter regras, incentivar o lúdico, jogar a sério o jogo da normalidade, o capitão exigia que andassem indumentados, limpassem as armas, engraxassem as botas, o pessoal ocupava-se do lúdico, como Gustavo Pimenta observa:
“Para além dos jogos de cartas ou de tabuleiro, que se podiam praticar dentro dos abrigos, recorria-se aos que se pudessem concretizar no exterior mas que não implicassem grandes ajuntamentos. Uma granada de morteiro no meio de um campo de futebol seria uma tragédia.
A malha era dos jogos que mais se praticavam. Na zona de cada abrigo, com mais ou menos vales pelo meio, havia um espaço onde se arremessavam as pedras escolhidas ou as rodelas de tronco de árvore que serviam de malha. Os mecos, executados com primor, quase carinho, partir-se-iam amiudadamente, a cada mecada, senão tivesse havido o cuidado de escolher a madeira adequada”.

Num contexto de iminência de flagelação, naquele isolamento quase perpétuo, há alguém que é saudado com especial fervor:
“Cada piloto que nos visitava era recebido na pista: balde de gelo, água Perrier e garrafa de uísque na mão. A evidenciar a gratidão pelo risco, sempre grande, de o atrevimento de poisar em Madina. Se alguém nos podia pedir o que quisesse, eram esses bravos homens que nos consentiam, em regra semanalmente, a partilha de outros mundos, do mundo dos outros, que tínhamos a ilusão de ter quase à mão”.

E um dia saíram de Madina e mudaram de rumo, no entretanto ocorreu aquela catástrofe de fevereiro de 1969 que dizimou muita gente na travessia do Ché Che. Já estão em S. Domingos, este nosso alferes Gustavo Pimenta levanta minas, e não omite a aflição que pode ir na alma de quem o faz. Livro de uma urdidura raríssima, um verdadeiro filme desbobinado, que assim começa para depois preparar o seu termo:
“O beijo da minha mãe durava uma eternidade. Fechara os olhos para que o retrato fosse imperecível. Nas cores esmaecidas da casa, no amarelo tímido do meu quarto, o da frente, junto à rua. Nos meus, que me prodigalizavam abraços, venturas e lágrimas.
Tinha o pressentimento de que nunca mais seria o mesmo. Estava a despedir-me de mim”.

Houve Madina do Boé, depois S. Domingos, como já tinha havido Fá Mandinga e a região do Xime. Fez-se uma viagem para o Norte, depois de desembarcar e ganhar a disponibilidade. Regressa como cão, o motorista de táxis bem protestou.
E tudo acaba onde começou:
“A casa antiga – para não dizer velha – acolheu-me com o cheiro e o conforto que a memória reconheceu. Quanto tempo passado e como tudo me pareceu, de súbito, regressar ao princípio. As mesmas cores esmaecidas, em particular o amarelo da porta e janelas, o mesmo soalho corrido com tábuas carcomidas entremeadas, aqui e ali, por novas impecavelmente aplicadas, a motorizada logo à entrada do corredor e, ainda, a mesma cortina encobrindo o cubículo das garrafas de gás”.

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E a pensar no terrífico desse levantamento das minas, ocorreu-me alguns dos mais belos parágrafos que vi escritos sobre os estados de alma que percorrem esse levantador na hora da verdade, belos parágrafos que constam no livro “Guerra na Bolanha”, por Francisco Henriques da Silva, Âncora Editora, março de 2015:
“O que se passa pela cabeça quando estamos a desmontar uma mina com cerca de seis quilos e meio de trotil? Sabemos que qualquer erro seria, como diziam os nossos instrutores em Tancos, o primeiro, o único e o fatal. Nesse momento tudo nos incomoda, as pessoas, o arvoredo, a areia seca do arremedo da estrada em que nos encontramos, os ruídos indefinidos da floresta, as formigas que, indiferentes, passeavam num carreiro ali ao lado; alguém que assobiou lá ao longe, sem qualquer motivo; o fundo de um cigarro que o furriel deitou ali bem perto de nós, há minutos. E depois o que nos passa em flashes sucessivos pela cabeça: os eléctricos amarelos de Lisboa, tão perto do nosso coração e tão longe; a namorada que já não tínhamos, mas que podíamos ter; a última música dos Beatles, que era bem gira; os pais, os irmãos e a avó, com os seus límpidos olhos azuis e o seu ar autoritário; os estudos inacabados; a estupidez incomensurável da guerra naquele país ignorado e que poucos sabiam localizar com exatidão no mapa. Enfim, o que é que, em boa verdade, não nos passa pela cabeça? Mas, atenção: temos de nos concentrar, o importante é desactivar a mina, tão depressa quanto possível, mas sem grandes pressas. Temos medo? Creio que não. Estamos apenas apreensivos. Como é que isto se define? Não sei. A juventude e alguma inconsciência que a caracteriza acaba com qualquer vislumbre de medo e a prudência não é para aqui chamada. 

Francisco Henriques da Silva
Vamos a isto? Vamos! Mãos à obra.
Com efeito, ao escavar a terra sob a parte inferior da caixa de madeira da mina anticarro, deparei com algo de estranho, não sabia exactamente o que era. Parecia-me um arame, junto com um objecto redondo metálico em forma de pastilha. Não percebi muito bem o que era, mas estava desconfiado. Não conseguia, porém, escavar mais, até porque podia desequilibrar a mina e se esta estivesse contra-armadilhada podia dar por terminada a minha comissão na Guiné e começar outra de imediato no Além. Acresce que, à torreira do sol, estava com as mãos suadas e sujas de terra. Não podia continuar. Lembrei-me de um alferes sapador que, uma semana antes, lá para o Sul, deixou escapar o percutor e ficou feito em carne picada, que, segundo me contaram, mal cabia toda dentro de um quico. Para rematar, com todos os acontecimentos do dia, estava enervado com pequenas coisas e não com a mina propriamente dita, ou seria por causa dela?”

(continua)
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Notas do editor

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