terça-feira, 12 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21762: Projecto de livro autobiográfico, de António Carvalho, ex-Fur Mil Enfermeiro da CART 6250/72 (Mampatá, 1972/74) (1): Contra os canhões marchar, marchar...

1. Mensagem do nosso camarada António Carvalho (ex-Fur Mil Enf da CART 6250/72, Mampatá, 1972/74), com data de 10 de Janeiro de 2021:

De um projecto de livro autobiográfico que pretendo editar e publicar na íntegra, um dia destes, destaquei este trecho para, caso mereça algum interesse, ser publicado na nossa Tabanca Grande.

Aproveito para cumprimentar os editores e desejar-lhes saúde e felicidade.
Carvalho de Mampatá


1 - CONTRA OS CANHÕES MARCHAR, MARCHAR…

Naquela noite fria de 10 de janeiro de 1971, por amabilidade do meu saudoso amigo José Augusto Baptista Oliveira, seguíamos ambos no carro de seu avô que nos conduzia à estação de Campanhã onde, pela meia noite, tomaríamos o comboio que nos levaria até ao Regimento de Infantaria das Caldas da Rainha, com transbordo em Alfarelos de permeio.

 Pela manhã do dia seguinte lá estávamos nós, com muitos outros, à porta de armas do quartel, prontos a servir a Pátria, como então se dizia. Não que essa ideia de serviço e dedicação à Pátria nos preenchesse a mente como algo de adquirido ou absolutamente acomodado. Pelo contrário, eram já muitas as interrogações que nos assolavam o espírito, pelo menos a mim que já tinha conhecido, dois anos antes, a perda de um primo na guerra de Angola. 

E é admissível que o meu amigo Zé Baptista, por entre todas as suas cogitações, tivesse até antevisto, senão mesmo a eventualidade da sua morte, em qualquer emboscada montada pela guerrilha, num dos cenários da guerra ultramarina, pelo menos algo que lhe pudesse acontecer de grave, como a perda de uma perna numa mina ou algum ferimento que lhe impedisse a realização dos sonhos próprios da juventude. Infelizmente, para ele, para os que mais o amavam e para os seus amigos, aconteceu a pior das hipóteses, no dia 18 de fevereiro de 1974.

Mas, na verdade, não era fácil escolher o caminho da deserção que implicava, naquele tempo, um adeus à família para sempre ou por muito tempo. O regime, depois da morte de Salazar, em 27 de julho de 1970, tinha dado alguns sinais de abertura, mas muito ténues e, nas questões essenciais, como era a guerra do ultramar, nada havia mudado, mantendo-se a aposta na defesa intransigente dos territórios ultramarinos onde os insurgentes lutavam pela independência de Angola desde 1961, da Guiné desde 1963 e de Moçambique, na costa do Índico, desde 1965. 

Soubesse eu que iria ocorrer uma revolução vitoriosa em 1974 e outra coisa estaria eu a fazer naquele dia, em vez de receber um fardamento da cor do feijão verde. 

Havia já o registo de muitas deserções, sobretudo nas camadas mais instruídas, mas nada que fizesse perigar o prosseguimento daquela guerra sem sentido e sem fim à vista. O período dos primeiros três meses de instrução básica, comummente designado por recruta, passei-o ali, em sessões diárias de exercícios de ordem unida, ginástica, marchas e corridas fora do perímetro das instalações militares, formação sobre manuseamento e funcionamento da arma, instrução de tiro, teoria sobre guerra de guerrilha e ação psicológica. 

Após esse período, a cada um de nós foi atribuída uma especialidade cujo processo de formação era constituído por mais três meses, a frequentar num outro aquartelamento. A mim coube-me o curso de enfermeiro que me foi ministrado no Hospital Militar de Lisboa, entre abril e junho de 1971, seguido de um estágio de seis meses no Hospital Militar do Porto.

Estava assim transcorrido o meu primeiro ano de serviço militar. Antes da minha mobilização para a Guiné havia ainda de prestar serviço no Regimento de Cavalaria n.º 4, em Santa Margarida, durante cinco meses. 

Ao tempo, os comboios, sobretudo à sexta-feira à noite e no final do dia de domingo, andavam superlotados de soldados que se deitavam no chão e até nas bagageiras, por falta de lugares sentados, em cansativas viagens de fim de semana para reverem os seus familiares. Alguns soldados não visitavam as suas famílias durante todo um período de três meses, fosse por falta de dinheiro para a viagem,  fosse até por se encontrarem num dos extremos do país e a sua residência ser no lado oposto. 

Diga-se, para conhecimento dos leitores mais novos que, por esse tempo, as autoestradas estavam ainda a nascer e estendiam-se por curtas dezenas de quilómetros. Os militares viajavam sobretudo de comboio mas havia também, nalguns aquartelamentos, organizadores de excursões que contratavam autocarros de ida e volta no fim de semana. O governo de então não nos assegurava transporte gratuito, a não ser nas viagens consideradas em serviço ou por doença. Ora, as viagens em serviço eram aquelas que tínhamos que fazer, pela primeira vez, entre a nossa residência e o quartel que nos fosse destinado, sempre que houvesse lugar a mudança de quartel e, finalmente, na viagem de regresso a casa, no fim do serviço militar. 

A alimentação era entre o aceitável e o péssimo. Passei por quartéis onde havia alguma qualidade na alimentação e até no asseio das instalações e outros onde a comida era imprópria para pessoas. Sendo que todos os quarteis recebiam o mesmo abono em dinheiro por cada militar só posso concluir que nuns regimentos se roubava muito e noutros pouco ou nada. 

A sistemática má qualidade das refeições chegava a produzir movimentos de revolta a que chamávamos levantamento de rancho. Não me lembro de ter vivenciado algum, mas tive conhecimento da ocorrência de vários. O levantamento de rancho é uma manifestação de repúdio generalizado contra a má qualidade ou quantidade de uma refeição e consiste, para ser bem sucedido, na sua rejeição, por parte de todos os militares, sem uma única exceção, tendo por consequência a confeção de novo repasto.

A disciplina militar, pela sua rigidez, constitui um obstáculo à análise crítica e ao escrutínio do funcionamento da instituição castrense, permitindo assim, mais facilmente, atitudes abusivas quer no que diz respeito à instrução ministrada quer no que se refere à gestão dos seus próprios recursos, nomeadamente a aquisição de materiais, equipamentos e produtos alimentares. E se a corrupção era evidente nesse período de antes do 25 de Abril, ela permanece nas instituições militares atualmente, como no correr dos dias vamos lendo nos órgãos de comunicação. (...)
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Guiné 63/74 – P21761: Estórias avulsas (100): Como substitui o comandante de operações de patrulhamento em Jumbembem (Fernando C. G. Araújo, ex-Fur Mil OpEsp 2ª CCAÇ/BCAÇ 4512)



1. O nosso Camarada Fernando Costa Gomes de Araújo* (ex-Fur Mil OpEsp/RANGER da 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512, Jumbembem, 1973/74), enviou-nos a seguinte mensagem, com data de 10 de Janeiro 2021:

Camaradas, 

Conforme conversa com o Magalhães Ribeiro, pelo telefone, e por pensar ser uma matéria interessante, envio algumas fotos e um texto, narrando como um Fur. Mil. substituiu o comandante de operações de patrulhamento, em Jumbembem. 

Substituição do comandante de operações de patrulhamento em Jumbembem 

Em 24-07-1973, no “Teatro de Operações da Guiné,” tive o ensejo e a honra, como “Furriel”, de ter comandado numa operação de patrulhamento, os oficiais e furriéis que integravam os dois grupos de combate: 1º e 2º pelotão. 

Um motivo de grande orgulho para mim, ao guiar todos estes homens (+/- 40 a 50) e pela confiança depositada pelo Capitão, comandante de companhia .


Convenções:

Cuntima ---------------  E

JBB --------------------  D

Curva da areia --------- C

Norobanta -------------- B

Entrada ------------------ A


Em 07-08-1973, comandei dois grupos de combate, mas faltam as convenções.   Em 09-08-1973, tive novamente o ensejo, como “Furriel”, de ter comandado noutra operação com maior risco, os oficiais e furriéis que integravam os três grupos de combate: 1º; 2º e 4º pelotão. 

Um orgulho ainda maior, pela confiança que o comandante da companhia mais uma vez depositava nas minhas mãos, (+/- 70 a 80 homens). Convenções assinadas pelo (Capitão) comandante da 2ª Compª.Bat.4512. 


 



          Convenções:

JBB ----------------------- C

Farim --------------------- A

Estrada Fambanta ------- D

Alto Lamel --------------- F

Lamel --------------------- R

Entrada -------------------- E

Isto traduz bem o que representa um militar de Operações Especiais e da segurança e força anímica que consegue transmitir a terceiros. Desde o primeiro dia, após a minha integração no 2º pelotão da 2ª Companhia do BCAÇ 4512, que os homens ficaram mais motivados no teatro de operações quando comigo começaram a actuar. A disciplina, o rigor a lealdade e a dignidade com que sempre os tratei e habituei, fizeram com que o sacrifício por eles dispendido fosse atenuado com uma firme vontade de vencer, porque sabiam por quem estavam a ser guiados e sentiam-se mais confiantes.


Audácia; Abnegação; Coragem; Decisão; Disciplina; Entusiasmo; Generosidade; Lealdade; Resistência e Sobriedade, foram os aços com que fui forjado, no centro de Instrução de Operações Especiais e que humildemente fui e vou transmitindo. 

Chamavam-me “Chicalhão” quando apresentava o pelotão, a companhia, ou quando exigia que melhor se ataviassem, para se apresentarem na formatura. Julgo que estas situações que relato dispensam comentários, pelo treino militar adquirido no Centro de Instrução de Operações Especiais não havendo por isso comparação possível com os outros militares do contingente do exército. 

Um abraço,
Fernando Araújo
Fur Mil OpEsp/RANGER da 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512

Fotos: © Fernando Araújo (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

SÁBADO, 25 DE JULHO DE 2020 > Guiné 61/74 - P21198: Estórias avulsas (99): Achado misterioso (António Eduardo Ferreira, ex-1.º Cabo CAR)

Guiné 61/74 - P21760: Álbum fotográfico de António Marreiros, ex-alf mil, CCaç 3544, "Os Roncos", Buruntuma, 1972, e CCaç 3, Bigene e Guidage, 1973/74 - Parte II: A festa do fanado


Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4

Guiné > Região de Cacheu > Bigene > CCAÇ 3 (1973/74) > A festa do fanado

 1. Mensagem do nosso camarada António Marreiros [ a viver há quase meio século no Canadá (Victoria, BC, British Columbia), ex- alferes miliciano em rendição individual na Companhia CCaç 3544, "Os Roncos", Buruntuma, 1972, e, meses depois, transferido para Bigene, CCaç 3, até Agosto 1974]: 



António Marreiros, 1973, no rio Cacheu


Data - domingo, 3/01&2021, 20:59


Assunto - Ritual de iniciação


Talvez o Cherno Baldé possa esclarecer.

Não estão tão nítidas, as fotos que mando em anexo,  mas é uma janela no passado...

Lembro-me bem disto, fui convidado pelos jovens e meti-me no grupo... Havia um indivíduo mascarado todo coberto de castanho ( vê se mal nesta foto) que levava os jovens para o mato (Foto nº 1)...

São quatro fotos que eu penso estão relacionadas com “ o fanado”...

Abraços, 

António Marreiros

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Notas do editor:


Vd. também postes de:

3 de janeiro de  2021 > Guiné 61/74 - P21731: Fotos à procura de...uma legenda (129): Pistas de leitura para um casamento Balanta-Mané, em 1973, em Bigene, região do Cacheu (Texto: Cherno Baldé; fotos: António Marreiros)

3 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21729: Memória dos lugares (416): Um casamento em Bigene (António Marreiros, ex-alf mil, CCAÇ 3544, Buruntuma, 1972, e CCAÇ 3, Bigene, 1973/74)

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21759: Consultório militar do José Martins (58): O Estatuto e a Insígnia do Antigo Combatente (José Martins / António José Pereira da Costa)


Publicamos hoje mais um trabalho do nosso camarada José Martins (ex-Fur Mil TRMS, CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), desta vez sobre o Estatuto dos (Antigos) Combatentes e a polémica Insígnia do Antigo Combatente.

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2. Ainda a propósito da Insígnia do Antigo Combatente, aqui fica a opinião do nosso camarada António José Pereira da Costa, enviada ao Blogue em mensagem de 7 de Janeiro de 2021:

Boa tarde Camaradas
Não sei muito de heráldica, mas há uma coisa que sei de fonte limpa: nos brasões não se escreve. É assim nos das U/E/O das FA e até nos emblemas dos clubes. Ninguém viu que o emblema do Bunfas ou do Fê-Cê-Pê tivesse escrito por baixo "Sócio do..."
Estes distintivos, como os brazões, falam e não necessitam de esclarecimentos para serem entendidos.
No nosso caso, não. Ao símbolo - miniatura do monumento do Bom Sucesso - acrescentaram (soto puseram) "Antigos Combatentes".
Pergunto se também os haverá modernos e ancestrais ou até futuros?
O símbolo adoptado pode ser discutível, mas isso é outra questão.
Mas escrever por baixo do símbolo...
O que é que temiam? Que alguém o confundisse com um clube de campismo?
Não sei quem foi o autor do projecto. Para mim, é a assinatura de quem o aprova que conta.
Claro que agora nada há a fazer, a menos que o bom senso impere rapidamente, digo eu...

Um abraço para todos e desculpas àqueles a quem não boafestei na devida altura
António José Pereira da Costa
Cor. Art.ª (Ref.) AM 64/67

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Nota do editor

Vd. postes de:

27 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21299: Consultório militar do José Martins (51): O Estatuto do Antigo Combatente (1)
e
28 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21301: Consultório militar do José Martins (52): O Estatuto do Antigo Combatente (2)

Último poste da série de 31 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21716: Consultório militar do José Martins (57): Reduto de Monte Cintra

Guiné 61/74 - P21758: Notas de leitura (1333): “De Lisboa a La Lys, O Corpo Expedicionário Português na Primeira Guerra Mundial”, por Filipe Ribeiro de Meneses, Publicações Dom Quixote, 2018 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Maio de 2018:

Queridos amigos,
A investigação deste conceituado historiador que em 2010 publicou a incontornável biografia política de Salazar, é muitíssimo incómoda para todos aqueles que têm procurado tecer hagiografia sobre um dos maiores desastres militares portugueses. Em síntese, a linha democrata do regime republicano, com Afonso Costa na proa, investiu fortemente para a criação do Corpo Expedicionário Português, após a declaração de guerra à Alemanha, tínhamos que nos provar briosos nas trincheiras da Flandres.
O historiador narra as intrigas, as tensões nos Altos Comandos, o diálogo penoso entre estes e a hierarquia militar britânica, o estranhíssimo comportamento de uma maioria dos oficiais do CEP, mal relacionados com os seus subordinados e chegamos àquele 9 de abril que começou com uma tempestade de fogo sobre as linhas do CEP e uma demandada em catástrofe, sobre a mesma há narrativas desencontradas.
Este livro é porventura a investigação mais rigorosa e atual sobre estes acontecimentos fatídicos que irão preludiar a queda do regime republicano.

Um abraço do
Mário


De Lisboa a La Lys: A tragédia de 9 de abril de 1918

Beja Santos

“De Lisboa a La Lys, O Corpo Expedicionário Português na Primeira Guerra Mundial”, por Filipe Ribeiro de Meneses, Publicações Dom Quixote, 2018, é mais uma investigação de gabarito de um historiador que se consagrou com a obra Salazar: Uma Biografia Política. La Lys, como o autor observa, foi um dos dias mais mortíferos da história militar de Portugal. Numa só manhã, perto de 400 portugueses morreram, muitos mais foram feridos e o número de prisioneiros rondou os 6600. O Corpo Expedicionário Português (CEP), símbolo máximo do esforço de guerra nacional durante a I Guerra Mundial, desapareceu dos campos de batalha franceses enquanto unidade organizada. O regime republicano apostara forte neste Corpo Expedicionário, tudo fez para o enviar com celeridade para a Frente Ocidental, o descalabro de La Lys iria pôr o regime em xeque e o seu militar mais prestigiado, Gomes da Costa, aparecerá à frente do 28 de maio de 1926.

O que Filipe Ribeiro de Meneses investiga e dá à estampa é muito incómodo para os nossos brios e compromete em grande parte a hagiografia que se tem pretendido montar sobre os lances de heroísmo e a bravura do militar português nas trincheiras da Flandres. A história bem comportada do CEP, como Ribeiro de Meneses ilustra, é um conto de fadas, baseia-se em inúmeros testemunhos que servem para comprometer o manto diáfano da fantasia.

O historiador enceta o seu trabalho falando de seu avô Mário Ribeiro de Meneses, capturado em La Lys e levado para território alemão, daqui travará correspondência com a família e nos aperceberemos das peripécias do que foi o seu regresso e de outros milhares de militares. Mas peripécias, jogos políticos e um impressionante desfasamento entre oficiais, sargentos e praças, é o que não falta neste documento rigoroso, e com um novo olhar historiográfico.

Chegado o CEP a França, logo começaram as dificuldades, assinaladas as péssimas relações, que atravessaram todo o contingente. Chegaram a Brest e pouco antes tinha havido em Lisboa o golpe de Estado de Machado Santos, com revoltosos detidos, que depois embarcariam para França. O general Tamagnini irá queixar-se permanentemente que estava sob vigilância ideológica do partido de Afonso Costa, através de um major. Eram difíceis as relações com os aliados britânicos, estes cedo se aperceberam que havia que dar mais instrução para a guerra que o contingente português iria enfrentar (o que tinham aprendido em Tancos estava bem distante do que iam experimentar nas trincheiras), Afonso Costa negociara com Londres a contribuição portuguesa para o esforço de guerra: o Exército Português teria o seu setor próprio a defender, com o seu comando próprio, com a sua completa autonomia. A prática ensinou que não podia ser assim. O autor recorda que 1917 foi um ano cruel para os Aliados, a Batalha de Passchendaele que resultou num massacre de enormes proporções, aspirava-se à chegada de contingentes que renovassem os corpos de Exército completamente estafados pela vida das trincheiras e por desaires sucessivos frente aos alemães.

A logística também cedo se revelou difícil, desde o transporte marítimo à distribuição de peças de artilharia e armamento ligeiro; para além do frio, ia muita gente doente e doenças venéreas não faltavam. Ao mais alto nível, discutia-se a preparação e a ida para as trincheiras.

O historiador, mais do que altamente documentado, cruzando agilmente a documentação britânica e portuguesa, revela o vai e vem das decisões, mostra a correspondência intercetada pela censura, veja-se este trecho de um soldado: “Aqui não se fazem avanços. Os que os tentam fazer perdem toda a sua gente com as minas que o inimigo faz explodir, em vista de nós termos minas por baixo das trincheiras deles e eles debaixo das nossas. A guerra das trincheiras é isto só: ataques de artilharia, gases, de noite cortarem arames uns aos outros, metralhadores a fazer constantemente fogo, para não deixar avançar o inimigo, morteiros que enterram um homem vivo e de vez em quando lá morrem meia dúzia, e assim passamos estes dias até nos chegar também a vez”.

Se a falta de coesão no CEP era indisfarçável, o golpe de Estado sidonista e o afastamento dos políticos que tudo tinham feito para que Portugal entrasse na guerra introduziu novos embaraços, acrescidos das dificuldades manifestadas pelos britânicos no transporte regular de tropas portuguesas para a guerra. De janeiro para fevereiro de 1918, o CEP aparecia constituído em corpo de exército mas pouco apto para empreender raides contra posições alemãs. Não obstante, as forças portuguesas passaram a penetrar nas linhas inimigas. O estado de saúde dos militares portugueses não era abonatório, como escreveu nessa altura Jaime Cortesão: “Pálidos, magros, exaustos, os pulmões roídos dos gases, os pés triturados das marchas, sem esperança nem apoio moral, arrastam-se, sob o imenso fogo que tomba do céu, por essas estradas, como uma legião miserável de abandonados”. E assim chegamos ao cenário da ofensiva alemã de 9 de abril, o historiador colige o que há de mais expressivo nas narrativas contraditórias, pois as versões documentais estão longe de coincidir. Os relatos ingleses evidenciam que se susteve a gigantesca ofensiva alemã, a barragem de fogo foi infernal e desfez aquela linha da frente, pôs a generalidade das nossas forças numa retirada caótica, a infantaria alemã não teve dificuldade naquele número elevado de capturas. Iniciaram-se novas discussões, os britânicos entendiam que os portugueses não deveriam regressar como força independente às primeiras linhas e é nesse período transtornado que a Alemanha, exausta e à beira da guerra civil, capitulou. As consequências para Portugal foram igualmente dramáticas: “Em La Lys findou o sonho de uma República capaz de transformar os destinos de Portugal, do seu domínio colonial e dos Portugueses de todo o mundo, mobilizando todas essas forças em torno do sacrifício dos soldados nas várias frentes de combate e da valorização, pelo mundo fora, do bom nome português”.

De leitura obrigatória.
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Nota do editor

Último poste da série de 4 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21734: Notas de leitura (1332): Espaço social e movimentos políticos na Guiné-Bissau (1910-1994), por Philip Havik, na Revista Internacional de Estudos Africanos, n.º 18-22, 1995-1999 (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P21757: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (81): o monumento ao capitão Teixeira Pinto, em Bissau, inauguraddo em 1929 (Carlos Silva, ex-fur mil arm pes Inf, CCAÇ 2548/BCAÇ 2879, Jumbembem, 1969/71; régulo da Tabanca dos Melros; dirigente da ONGD Ajuda Amiga)


Foto nº 1 > Bissau, 1929: O governador, coronel António Leite  de Magalhães, inaugura o monumento a Teixeira Pinta (Fonte: P20686 *)

Foto nº 2 > Bissau, 1930 > Monumento a João Teixeira Pinto 
(Fonte: P20041 **)


Foto nº 3 > Bissau, Monumento a Teixeira Pinto (Fonte: P17532 ***)


1. Mensagem do Carlos Silva [, ex-Fur Mil Inf, CCAÇ 2548/BCAÇ 2879, Jumbembem, 1969/71), Régulo da Tabanca dos Melros, dirigente da ONGD Ajuda Amiga, advogado e profundo conhecedor da atual Guiné-Bissau aonde se tem deslocado com frequência depois da independência]

Data - sexta, 8/01, 20:03 
Assunto - Monumento a Teixeira Pinto em Bissau

Luís

No seguimento da minha promessa em comentário ao post 21741, aqui vão as cópias que retirei do Blogue, e não como eu tinha pensado que tivesse digitalizado, que confirmam o que referi no mencionado comentário.

Nas fotos estão indicados os postes

Podes reencaminhar para a Ana Paula e publicar. (****)

Abraço

Carlos Silva
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 26 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20686: Historiografia da presença portuguesa em África (201): "A Guiné Através da História", pelo Coronel Leite de Magalhães; Cadernos Coloniais, Editorial Cosmos (1) (Mário Beja Santos)

(**) Vd. poste de 7 de agosto de 2019 > Guiné 61/74 - P20041: Historiografia da presença portuguesa em África (171): "Resumo do que era a Guiné Portuguesa há vinte anos e o que é já hoje" - Uma obra ímpar do 2.º Sargento António dos Anjos: A Guiné logo a seguir às operações da pacificação (1) (Mário Beja Santos)

domingo, 10 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21756: (In)citações (176): Nós, os "dinossauros" do blogue e o novo "annus horribilis" de 2021: queremos continuar a ser um blogue de partilha de memórias e de afectos, no fundo um "grupo de ajuda mútua"... Afinal, os velhos combatentes podem ser destruídos, mas nunca derrotados, parafraseando o protagonista de "O Velho e o Mar" (José Belo / Luís Graça)






Vistas da Tabanca da Lapónia


Fotos (e legenda): © José Belo (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Mensagem de José Belo (, régulo da Tabanca da Laponia)

Date: terça, 5/01/2021 à(s) 11:15
Subject: Perguntas de subjetividades feitas
 
Caro Luís 

Perguntas ao ano que passou,  procurando respostas construtivas no ano que se inicia (*). 

O que levou a que tantos Camaradas que, com os seus muito interessantes textos e comentários, por vezes acalorados mas vivos, tenham terminado de o fazer?

Sem citar nomes de entre os mais "clássicos" representantes de mui dísparas opiniões, foram parte importante da dinâmica do blogue.

Silêncios e distanciamentos que se fazem notar.

Obviamente os anos passam, os problemas de saúde vão aumentando, e a situação de isolamentos vários do dia a dia actual também são factores importantes

Mas "estrangular" o meio de contacto que é este blogue,  em nada vem ajudar o anteriormente apontado.
Muito pelo contrário, isolando-nos cada vez mais nos nossos "retiros" de conveniência, sejam eles geográficos ou comunicativos, acabamos todos por perder algo de nós próprios.

Algo que mais não é que as nossas experiências comuns na guerra da Guiné que, a seu modo, vieram formar as nossas vidas.

Um abraço do J. Belo

2. Comentário do editor LG:

A escassos 3 meses de completar 17 (dezassete!) anos de existência, em 23/4/2021, o Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné corre o risco de se tornar um blogue de... "dinossauros"!... Uma palavra, de resto, que nada tem de depreciativo ou pejorativo: dinossauro (do grego deinós, -ê, -ón, terrível, horrível + - saûros, -ou, lagarto) é algo ou alguém que mete respeito ou merece consideração pela sua antiguidade, sabedoria, experiência, resiliêmcia, capacidade de sobrevivência...

Este ano, e quando o início da guerra colonial, ou guerra do ultramar, ou guerra de África (como cada um quiser chmar-lhe), fizer sessenta anos (1961-2021), o nosso blogue ainda estará cá, espero bem!, para ajudar os últimos soldados do império a exorcizar os seus fantasmas...

Blogoterapia... A palavra ainda não foi grafada nos nossos dicionários. Mas tem já cerca de 270 referências no nosso blogue... Se calhar devia ter mais: afinal o que fazemos aqui todos os dias é isso mesmo, é blogoterapia, é partilharmos memórias (e emoções) através do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné...

Sem querer fazer concorrência (desleal) aos "psis" (psiquiatras, psicólogos, psicoterapeutas, e eu até tenho três na família...), diria que o nosso blogue é também um "grupo de ajuda mútua" (em inglês, "mutual aid group")... É um grupo de partilha de informação, conhecimento, vivências, histórias de vida, memórias, emoções, cores, sons, sabores... e saudade!

Faz-nos bem ?... Mal não nos faz (desde que o usemos com conta, peso e medida, sabendo que há mais vida para lá das redes sociais, e que é importante igualmente os nossos convívios e encontros, de que estamos, infelizmente,  arredados há 10 meses por causa da pandemia de Covid-19).

Ainda ontem a nossa amiga aniversariante e grã-tabanqueira Cristina Silva, filha do nosso camarada Jacinto Cristina, escrevia este comentário que nos sensibiliza a todos e que também nos define, com propriedade: 

"Meu querido amigo Luís! Foi com grande emoção que li as palavras que me dedicou, no meu aniversário! Sabe, o meu amigo, que eu sou uma pessoa de afectos e, como tal, com este seu gesto não só me sensibilizou como me encheu o coração de alegria! Com grande orgulho, pertenço a esta comunidade de gente boa." (**)

Pois, Zé Belo, cá vamos... Blogando e andando (era o título de uma série do nosso camarada JERO, o último monge de Alcobaça, que agora anda mais confinado) ... Já a Blogpoesia, a caminho das 770 referências,  bem se esforça por humanizar a nossa caminhada pela picada da vida, cada vez cheia de minas e armadilhas... 

Também. sem falsa modéstia, nos orgulhamos de ter dado novos blogues e novas tabanncas ao mundo... E, provavelmente aí megalómanos, ou portugueses de Quinhentos, continuamos a achar que O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (130 referências).

Também vamos Facebook...ando (cerca de 100 referências) mas o Facebook não é o nosso forte, ou a nossa praia...Não é o melhor sítio para se estar com os amigos e camaradas, na medida em que também há  muita gente, ruidosa e até indesejável,  à volta, a meter-se em bicos de pés ou a fazer caretas para a câmara. 

As estórias (e temos centenas delas...) são, essas, sim,  o nosso forte. Mas dá trabalho alinhavar uma estória e submetê-la à crítica dos leitores. Mesmo assim, o nosso blogue já ajudou dezenas de camaradas a publicar o seu primeiro livro... 

Há as estórias e as histórias, e com elas lá vamos remendando a teia, esburacada, da nossa memória. Por que cada um viu, viveu, ouviu, experimentou, sofreu, reteve, interiorizou, gravou... apenas uma parte, sempre ínfima, da realidade. E os olhos, os "óculos", com que chegámos a Bissau e vimos a Guiné e a guerra, eram de muitos feitios e muitas cores.... Não tem mal, no final, o nosso caleidoscópio é muito mais feérico, mágico e divertido... 

O blogue ajudou-nos a ver que a Guiné e a guerra não podiam ser vistas a preto e branco, de um lado e do outro lado do combate (para usar uma expressão cara ao Jorge Araújo)... Eu, pessoalmente, confesso que sei hoje muito mais da Guiné e da guerra do que sabia quando regressei a casa, em 17/3/1971, a bordo do T/T Uíge... E regressei, "são e salvo", com a promessa de rapidamente tudo esquecer... Acabei, feliz ou infelizmente, por quebrar a promessa... Afinal, "o criminoso volta sempre ao local do crime",,,

Que é que queres que te diga mais, ó luso-sami, Zé Belo, perdido  pelas  tundras, montanhas e florestas da terra dos samis ?... Para já, foi bom ter-te conhecido a ti e a muitas camaradas que por aqui têm passado, e um parte deles  espalhada, como tu, pelas sete partidas do mundo. E vão continuar a passar, "devagar, devagarinho", proque  afinal devagar é que se vai ao longe... 

Dito isto, espero que no novo "annus horribilis" de 2021,  se continue a:

 (i) refrescar a Tabanca Grande, com a entrada, no mínimo, 2 novos grã-tabanqueiros por mês (de preferência, ainda com "prazo de validade"); 

(ii) publicar , no mínimo, 3 postes por dia; 

(iii) produzir, no mínimo, quatro comentários em média por poste; 

(iv) registar duas mil ou mais vizualições de páginas por dia...

(v) ser um "blogue de afectos" e uma "comunidade de gente boa"...

Se conseguirmos manter a nossa "performance", como até aqui, pese embora o efeito da idade, das mazelas,  das vicissitudes da vida, das desilusões e das canseiras, isso quer dizer que o nosso blogue ainda está vivo e recomenda-se... 

Afinal, os velhos combatentes podem ser destruídos, mas nunca derrotados, parafraseando o velho pescador de "O Velho e o Mar", do Ernest Hemingway (1952).   Quero eu dizer: podem "confinar-nos", podem relegar-nos para o "lixo da História", podem passar por cima de nós sem pedir-nos licença, pode a vida fazer-nos mil e uma tropelias, mas não podem roubar-nos as nossas memórias, as boas e as más... Claro que convém sacá-las do limbo da memória, antes que chegue o sacana do Alzheimer ou outra demência crónica degenerativa...(**)

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Notas do editor:

(*) Vd. também postes de:

4 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21732: O nosso blogue em números (66): continuamos vivos: no "annus horribilis" de 2020 publicámos 1202 postes, valor que está dentro da média anual dos últimos
seis anos

5 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21735: O nosso blogue em números (67): no "annus horribilis" de 2020, o número de visualizações de páginas foi de cerca de 800 mil, tendo atingido um total de 12,4 milhões

6 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21740: O nosso blogue em números (68): em 2020, no "annus horribilis" da pandemia de Covid-19, tivemos uma média de 4,5 comentários por poste (num total de 5410 comentários em 1202 postes)

7 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21744: O nosso blogue em números (69): No mundo globalizado, fomos vistos em muitos países, com natural destaque para Portugal (41%), EUA (25%) e Brasil (6%)...Cabo Verde e a Guiné-Bissau, infelizmente, ainda não aparecem no Top 20... São dois pequenos países, de resto com taxas de penetração da Internet desiguais: 63,3% e 12,7%, respetivamente

Guiné 61/74 - P21755: Blogpoesia (713): "Viver a negativos", "Dar prendas", "Sem asas" e "As cores da paciência", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. A habitual colaboração semanal do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) com estes belíssimos poemas, enviados, entre outros, ao nosso blogue durante esta semana:


Viver a negativos

Há quem sobreviva a negativos.
Os esquimós.
E há os que vivem sempre a negativos.
Nas contas à ordem.
E há os que nunca sairam e também vivem.
Como se vê é uma questão de perspectiva.
Os esquimós podem ter sempre saldos positivos nas suas contas.
E, até, serem ricos.
Vivem da caça e esta abunda.
É positiva a falta de ar.
Faz-nos lutar por ele.
O sangue, para correr nas veias,
Tem de ter energia.
E, sem trabalho, não há energia.
Como se vê, esta é a nossa condição de vida.
É a lei natural que subjaz a tudo.
Vem isto a propósito do teorema de Pitágoras.
Que explica como tudo funciona na Natureza.
Só um bocadinho.
O nosso filho mais novo descobriu um pouco.
Uma revista científica da área, publicou o seu trabalho e classificou-o como inovador.
O resto, apareça quem o descubra!...


Berlim, 4 de Janeiro de 2021
11h49m
Jlmg


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Dar prendas

Dar e receber prendas é uma festa que se faz e se recebe.
Mostra que, afinal, somos importantes para alguém.
Uma vez que seja, de quando em quando.
Ser padrinho ou madrinha cria laços
Que apertam nossas vidas.
Pela Páscoa e pelo Natal.
Aquela regueifa fofa.
Aquelas peúgas a cheirar a novo.
A bênção que lhes pedíamos.
Traziam paz e confiança.
Não estávamos sós nos nossos passos.
Uns segundos pais a nos darem as suas mãos.
Dá saudade relembrá-los agora que somos maduros.
Tudo riquezas dos velhos tempos
Que a modernidade desconhece.
Recuou-se muito nesse sentido.
Está-se mais pobre em humanidade.


Berlim, 5 de Janeiro de 2021,
20h3m
Jlmg


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Sem asas

Meus pés, atolados ao chão,
Lamentam a sorte que a natureza lhes deu.
Preferiam ter asas
Para poderem voar.
Mal as batessem,
Subiriam ao céu.
Ao mundo dos sonhos.
Esqueceriam as bolhas
Que as botas lhes fazem.
Se livrariam das pedras
E das topadas que dão,
Com sangue a correr.
Mas perderiam o convívio da gente
E do bem que ele faz.


Berlim, 8 de Janeiro de 2021
16h30m
Jlmg


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As cores da paciência

Manto leve e transparente
Que cobre de cores nossa vida.
Arrefece a dor.
Sara as mágoas.
Finge ser o que nem sempre é assim.
Acalma os nervos.
Trespassa paredes de ingratidão e de abandono.
Derrete as agruras do dia-a-dia.
Faz renascer a paz e a esperança em melhores dias.
É dos humildes e dos pacientes chegar de pé ao fim,
Sem desistir.


Berlim, 9 de Janeiro de 2021
20h35m
Jlmg

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Nota do editor

Último poste da série de 3 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21730: Blogpoesia (712): "Nunca esperei...", "Vultos na noite" e "Folhas caídas", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

Guiné 61/74 - P21754: O nosso blogue em números (70): em 2019 e 2020, entraram 40 novos membros para a Tabanca Grande: somos agora um total de 824 (dos quais 10% já faleceram)

 


Infografia: Blogue Luís Graça  Camaradas da Guiné (2021)


1. O número de entradas de novos membros da Tabanca Grande tem-se mantido regular: nos últimos cinco anos (de 2016 até 2020), foi de 1,55 em média por mês. Em 2012 éramos 595, no final de 2020 somos 824 (Gráfico nº 11).

O ano passado, por lapso, não publicámos esta informação estatística: tanto em 2019 como em 2020 entraram igual número de novos tabanqueiros (20)... 

A média anual, nos últimos nove anos, é de 25,4. Mas nos últimos cinco é apenas de 18,6. 

Temos que reconhecer que há hoje mais dificuldade em recrutar novos amigos e camaradas da Guiné. E alguns dos que  entraram,  foram-no,  infelizmente, a título póstumo.

No final de 2012, éramos 595... Em junho de 2006, éramos já  111... De abril de 2004 a maio de 2006, entraram em média, 5,3 novos membros por mês. Estávamos no início do nosso blogue, era uma novidade, e tínhamos necessidade de partilhar recordações uns com os outros.

Entretanto, mais do que triplicámos em pouco mais do que três anos e meio (de junho de 2006 a dezembro de 2009), passando a ser 390 os membros da Tabanca Grande. (crescimento médio mensal = 6,5.)

De 2009 (n=390) a 2012 (n=595), o crescimento médio mensal continuou alto (5,7). De então para cá, esse indicador tem vindo a diminuir: 1,7 em 2016; 2,8, em 2017; 1,5 em 2018; 1,7 em 2019 e 2020... Média dos últimos cinco anos: 1,55.

Em 200 meses, ou seja, em quase 17 anos da nossa história (que vamos comemorar em abril de 2021), tivemos,  em média, 4,12 novos membros por mês, o que não deixa de ser notável. (**=)


2. Nos anos de 2019 e 2020 tivemos 14  "baixas" (por falecimento). 

Lembremos aqui, por ordem alfabética, os nomes dos 13 camaradas e 1 amiga (a Isabel Levezinho), inscritos formalmente na Tabanca Grande, que "da lei da morte se foram libertando":

Carlos Marques dos Santos (1943-2019)
 
Domingos Fernandes (1946-2020)

Eduardo Jorge Ferreira (1952-2019)
 
Fernando Franco (1951-2020)
 
Isabel Levezinho (1953-2020)

Jorge Rosales (1939-2019)

José Barreto Pires (1945-2020)

José Ceitil (1947-2020)
 
José Maria da Silva Valente (1946-2020)
 
Libório Tavares (Padre) (1933-2020)

Lúcio Vieira (1943-2020)

Luís Rosa (1939-2020)

Mário Gualter Pinto (1945-2019)

Raul Albino (1945-2020)

 
São agora já 85 os camaradas e amigos já falecidos nestes 16 anos e 8 meses de existência do nosso blogue. Mas podem eventualmente ser mais. Há membros da nossa Tabanca Grande que não têm feito a "prova de vida" nos últimos anos, contactando-nos, escrevendo-nos, telefonando-nos, aparecendo nos convívios das diversas tabancas, etc.  

De qualquer modo, connosco ninguém fica na "vala comum do esquecimento"... É esse um dos objetivos deste blogue, que é, ao fim de16 anos, a maior rede social de ex-combatentes da Guiné (1961-74).

3. Não confundir, no entanto, membros da Tabanca Grande, formalmente registados (n=824), com amigos do Facebook, da nossa página Tabanca Grande Luís Graça.

O processo de adesão de uns e outros é diferente: o blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné acolhe essencialmente ex-combatentes que estiveram no TO da Guiné, entre 1961 e 1974, e que querem partilhar memórias do tempo da sua comissão de serviço (fotos, histórias, depoimentos, etc.).

Por outro lado, o blogue tem um conjunto regras editoriais que os membros da Tabanca Grande têm de respeitar. No entanto, há uma série de "amigos do Facebook", ex-camaradas da Guiné, que bem poderiam integrar o nosso blogue... 

Para isso basta-lhes contactar os nossos  editores,  por email, pedindo expressamente a sua entrada no blogue da Tabanca Grande [leia-se: como membros do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]. 

Junto com o pedido, exige-se duas fotos (uma atual, à paisana, e outra do "antigamente", fardado) e duas linhas de apresentação: sou o fulano tal, estive na companhia tal, no período tal, passei pelos sítios tais e tais...

Os amigos inscritos na nossa página do Facebook, Tabanca Grande Luís Graça, são 3184. Eram 2813, no final de 2018.
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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

sábado, 9 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21753: Manuscrito(s) (Luís Graça) (196): Parabéns, Cristina Silva, filha do Jacinto Cristina, um dos bravos da Ponte Caium... Que as filhas dos nossos camaradas, também nossas filhas são...

 

Ferreira do Alentejo > c. 1973 > Cristina Silva, quando pequenina, folheando o álbum fotográfico do seu pai. Jacinto Cristina, na altura um dos bravosque guardava a Ponte de Caium... 

Como eu costumo lembrar, o  Jacinto Cristina (Sold At Inf, CCAÇ 3546, 1972/74), membro da nossa Tabanca Grande, industrial de panificação, reformado, a viver em Figueira de Cavaleiros, Ferreira do Alentejo, foi, como muitos de n+os,  um "sem-abrigo na Guiné", viveu um ano e tal em cima de um tabuleiro da Ponte de Caium, com o motteiro 81, de que era municiador a seu lado... 

Além disso, também foi, por força da necessidade,  o padeiro do destacamento... E tinha esta menina linda à sua espera, tal como a sua Goretti (entretanto, infelizmente  falecida há mais de três anos). 

A Cristina, engenheira, mãe da Sara, esposa do meu amigo e médico do trabalho, o funchalense  dr. Rui Silva, é empresária na região autónoma da Madeira, sócia da empresa Ergoram Lda. 

Faz hoje anos. Para além de ser uma amiga de família, de há muitos anos, tem igualmente um lugar sentado, à sombra do nosso poilão. Foi uma das primeiras filhas de camaradas nossos a abrir o seu coração no nosso blogue.

 Deizei-lhe, na sua página do Facebook, estes versinhos singelos (*), com que eu e a Alice nos qusemos associar, à distância  à sua festa de aniversário. Um chicoração para ela. Um alfabravo para o nosso camarada Jacinto Cristina de quem a filha disse, aqui há uns anos atrás: "O meu pai é o meu herói" (*)



Cristina Silva, foto de perfil 
(com a devida vénia...)


Parabéns, Cristina!

A q’rida amiga Cristina,

Nascida a nove de janeiro,

Volta hoje a ser menina,

Lembra-lhe o seu companheiro.

 

Lembra-lhe o seu companheiro,

Que adora aniversários:

“Por amor, não por dinheiro,

Tornámo-nos empresários”.

 

Volta hoje a ser menina,

Com saudades do Alentejo,

“Ficaste-me na retina,

Foi aí que te roubei um beijo.”

 

Nascida a nove de janeiro,

Vive agora no Funchal:

“Quem do amor é prisioneiro,

Em parte nenhuma está mal”.

 

A q’rida amiga Cristina,

De uma princesa é mãe,

Tinha a sina de ser rainha,

… E nossa amiga também!

 

Alfragide, 9 de janeiro de 2021

Um dia feliz, e um Ano Novo melhor que o Velho

Muita saúde e longa vida,  que a Cristina merece tudo!

Alice & Luis

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Notas do editor:


(*) Vd. poste de 12 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14601: Blogoterapia (269): O meu pai é o meu herói (Cristina Silva, filha do Jacinto Cristina, o "padeiro da ponte Caium", ex-sold CCAÇ 3546. Piche, 1972/74)

(**) Último poste da série > 2 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21604: Manuscrito(s) (Luís Graça) (195): In Memoriam: Eduardo Lourenço (1923-2020), pensador maior da nossa história, da nossa cultura, da nossa identidade como povo

Guiné 61/74 - P21752: (In)citações (175): Saudade (Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Baptista (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), autor do livro "Brunhoso, Era o Tempo das Segadas - Na Guiné, o Capim Ardia", com data de 7 de Janeiro de 2021:


Saudade

Francisco Baptista

Ontem, Dia de Reis segundo o calendário católico, foi um dia nefasto, com notícias que nos abalaram um pouco a todos. A primeira foi sobre o alarmante número de infectados em Portugal, com o covid-19 que atingiu o seu máximo, com mais de dez mil pessoas afectadas por essa moléstia.

Já em 2021, ouvi na RTP que numa grande votação online, organizada pela Porto Editora, a saudade foi eleita a palavra do ano de 2020. O locutor da estação de televisão entre o anúncio da votação e o seu resultado fez um intervalo com outras notícias diferentes, desafiando os ouvintes a pensar no resultado. O meu voto foi também para a saudade apesar de ter pensado também no covid 19 e na pandemia, as segundas e terceiras mais votadas. Ao escolhermos por maioria a saudade, essa palavra que é dor, melancolia, memória, nostalgia, distância, tristeza, mas que também é poesia, amor, pátria, amizade, fraternidade, escolhemos a esperança na vida que os portugueses sempre tiveram apesar das maiores adversidades. A Saudade tem múltiplos significados e definições que variam de acordo com a sensibilidade e a experiência de vida de cada um.

Carolina Michaelis, a célebre escritora, filóloga e pedagoga definiu-a assim:
[Saudade é a] lembrança de se haver gozado em tempos passados, que não voltam mais; a pena de não gozar no presente, ou de só gozar na lembrança; e o desejo e a esperança de no futuro tornar ao estado antigo de felicidade.”]

Eu, em viagem de família em Veneza, num encontro ocasional num restaurante com dois portugueses um jovem e uma senhora, dias depois, lembrando a conversa calorosa que tivemos, descrevi desta forma a saudade numa crónica:
"Os portugueses da diáspora que inventaram a palavra saudade evocam-na como quem procura o afecto e o calor da Pátria. Há nela um sentimento doce porque nos faz recordar bons momentos passados com pessoas que estimamos muito. Há nela um sentimento amargo, que nos magoa pela distância que interpõe entre uns e outros, que só se acalma nos reencontros possíveis entre abraços e beijos, nessa proximidade física que os portugueses como povos latinos adoram."

Todos temos a nossa saudade. Uma palavra complexa que sendo amarga ou doce nos ajuda a viver.

A segunda má notícia de ontem, divulgada pelos meios de comunicação de toda a Terra foi a invasão do Capitólio americano por uma horda de milhares de fanáticos, às ordens desse bárbaro e imbecil Donald Trump. Os Estados Unidos da América são uma grande democracia, que se tornou também uma nação imperial, sem perder muitos princípios básicos da democracia que copiou dos ingleses e da Revolução Francesa. Com muitos defeitos como a escravidão, o genocídio de nações indias, a descriminação racial e situações de prepotência e exploração a nível internacional, algumas foi corrijindo, outras sem remédio, continua a ser a maior democracia dos tempos modernos. Que o Império Americano não se auto-destrua como o Império Romano que ele quis imitar e que na sua fase decadente teve imperadores imbecis e idiotas como Calígula e Nero. Não sabemos o que podemos esperar dos impérios Russo ou Chinês, já que eles nunca tiveram raízes democráticas.
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Nota do editor

Último poste da série de 23 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21679: (In)citações (174): Apesar de agnóstico, ainda conservo, na cabeceira, um crucifico-talismã que alguém deixou na tabanca onde eu pernoitava: Ká pudi larga mezinho qui pudi salvar kurpu (Luís Mourato Oliveira, o último comandante do Pel Caç Nat 52, Mato Cão e Missirá, 1973/74)

Guiné 61/74 - P21751: História da 3ª Companhia de Comandos (1966/68) (João Borges, 1943-2005) - Parte VIII: atividade operacional: março/abril de 1967: destaque para a Op White Label: golpe de mão ao acampamento de Cã Quebo, no Oio, que dispunha de abrigos de cimento


Guiné > Região do Oio > Carta de Farim (1954) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Gã Quebo, a oeste de Mansabá, em plena região do Oio. ( A região do Oio está dividida em 5 setores: Bissorã, Farim, Mansabá, Mansoa e Nhacra).

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2021)
 


 

Brasão da 3ª Companhia de Comandos (1966/68)




1. Começámos a publicar, em 17/11/2020, uma versão da História da 3ª Companhia de Comandos (Lamego e Guiné, 1966/68), a primeira, de origem metropolitana, a operar no CTIG. (Hão de seguir-se lhe, até 1974, mais as seguintes: 5ª, 16ª, 26ª, 27ª, 35ª, 38ª e 4041ª CCmds.)

O documento mimeografado, de 42 pp., que nos chegou às mãos,  é da autoria de João Borges, ex-fur mil comando, já falecido (em 2005). Trata-se de um exemplar oferecido ao seu amigo José Lino Oliveira, com a seguinte dedicatória: 

"Quanto mais falamos na guerra, mais desejamos a paz. Do amigo João Borges". 

Uma cópia foi entregue ao nosso blogue para publicação. (*)

[O José Lino [Padrão de] Oliveira foi fur mil amanuense, CCS/BCAÇ 4612/74, MansoaCumeré e Brá, 12-7-1974 / 15-10-1974, a mesma unidade a que pertenceu o nosso coeditor Eduardo Magalhães Ribeiro; é membro da nossa Tabanca Grande desde 31/12/2012; tem dezena e meia de referências no nosso blogue; vive em Paramos, Espinho]



História da 3ª Companhia de Comandos 
(1966/68) (*)

3ª CCmds
(Guiné, 1966/68) / João Borges
Parte VIII (pp. 21-22)






(Sobre a posição relativa de Gã Quebo, na região do Oio, vd. infografia acima)

Vd. postes anteriores:

27 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21699: História da 3ª Companhia de Comandos (1966/68) (João Borges, 1943-2005) - Parte VI: atividade operacional: Susana (Arame), Jababá (Flaque-Cibe e Bissilão), novembro de 1966

20 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21667: História da 3ª Companhia de Comandos (1966/68) (João Borges, 1943-2005) - Parte V: atividade operacional: Jugudul (Ansonhe e Ponta Bará), Tite (Jorge), outubro de 1966

16 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21650: História da 3ª Companhia de Comandos (1966/68) (João Borges, 1943-2005) - Parte IV: atividade operacional: Tite (Nova Sintra, Flaque Cibe, Jabadá, Jufá), setembro de 1966