terça-feira, 9 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25361: Historiografia da Presença Portuguesa em África (417): "Desastre de Bolor ou Bolol" [Carlos Cordeiro, 1946-2018) / Patrício Ribeiro]


Antiga Província Portuguesa da Guiné > Carta Geral (Escala: 1/500 mil) (1961) > Posição relativa de Bolor (1), Bolola (2), Jufunco (3), Varela (4) e Cacheu (5). No Google Map, o topónimo uado é "Bolor" (mas os guineenses hoje dizem "Bolol"... e o povo é quem faz a língua)

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2024)


1. Comentário de Carlos Cordeiro (1946-2018) ao poste P8622 (*)

[O desstre de Bolor ou Bolol] aconteceu em finais (talvez mesmo em dezembro) de 1878. A Guiné era governada por um governador, dependente do governador-geral de Cabo Verde.

Foi uma grande mortandade: falou-se mesmo em cerca de duas centenas de mortos. 

Tudo aconteceu por incompetência das autoridades portuguesas, em especial, do governador, que mandou sair tropas com armas descarregadas e ficou num barco a ver o desenrolar dos acontecimentos. Depois, o barco onde estava,  disparou o canhão (que me desculpe o C. Martins), que, mal assente, tombou e foi parar ao mar, etc.. 

A Câmara dos Deputados tem debates acalorados sobre os acontecimentos, ao longo de várias sessões, bem como sobre a legislação que, em 1879, criou a "província da Guiné portuguesa", tornando o seu governo independente do de Cabo Verde. 

Administrativamente ficou dividida em quatro concelhos: Bolama, Bissau, Cacheu e Bolola. (**)

Três aspectos sempre em destaque nos debates (além de outros, naturalmente):

(i) Que fazer? Expedição punitiva ou reconhecimento da incompetência das autoridades ao terem intervindo numa rixa que não tinha propriamente a ver com os interesses portugueses?

(ii) A falta de informações sobre as realidades ultramarinas e o problema da dificuldade das comunicações.

(iii)  As insuficiências das guarnições militares em todas as "possessões ultramarinas".

Não resisto a transcrever esta passagem de um discurso do deputado Freitas Oliveira, na sessão de 11 de Março de 1879 

(...) "Ouvi fallar das fortalezas da Guiné, como se ali houvesse alguma fortaleza! O que se chamou fortaleza da-Guiné, consiste em um paredão sobre o qual estão dez peças do artilheria, collocadas em sarilhos de madeira, que em dias de grande galla, por occasião das salvas, se voltam de traz para diante, quando disparam, como aconteceu ao rodizio da canhoneira que ultimamente aggravou com o ridículo o desastre dè Bolor". (...)

Só mais uma coisa: fala-se sempre em "Bolor" e não Bolol. No mapa aqui publicado também tem a indicação "Bolor". Deve ter havido alteração do nome.

Um abraço,
Carlos Cordeiro

1 de agosto de 2011 às 03:28


2. Comentário do editor LG:
 
O nosso "correspondente em Bissau" Patrício Ribeiro já em tempos nos tinha mandado fotos destas terras do chão felupe, que poucos de nós conheceram... Chama "Bolor" ao lugar que hoje outros chamam "Bolol"... E lá está o canhão... e vestígios (correntes de ferro) provavelmente do tempo ainda do tráfico de escravos... A rever. (***)



Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Bolor ou Bolo, na foz do rio Cacheu > Velhos canhões... e correntes de ferr

Fotos (e legenda): © Patrício Ribeiro (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
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(***) Vd. poste de 2 de setemnro de 2015 > Guiné 63/74 - P15065: Memória dos lugares (318): em terra dos felupes: Bolor, Rio Cacheu, Djufunco, Varela... (Patrício Ribeiro)

(...) Envio, para recordarem, algumas fotos tiradas no mês de maio [de 2015],  de visita por terra à Tabanca, do antigo Fortim da Ponta de Bolor (...).

Como sabemos, esta tabanca [Bolor, no estuário do Rio Cacheu, na margem direita, e vizinha de Jufunco ou Djufunco e de Bolol,] está cheia de histórias:

(i) afundamento de um barco inglês e morte dos tripulantes;

(ii) morte de mais de 30 militares portugueses, envenenados por flechas e lanças;

(iii) queda de avioneta com dois franceses, que desapareceram; após muitas buscas em terra e nos rios, nunca foram encontrados...

A quem pertencem estas correntes ? 
[vd. foto acima] (...) Foi a pergunta que o nosso amigo Pepito (Carlos Shwarz) fez aos Homens Grandes da tabanca, nunca teve resposta … aquando do almoço nesta tabanca de dezenas de brasileiros descendentes de escravos, em 2010, em Cacheu.

Será que alguém sabe a quem pertence? (...) Fotografei, nesta festa, mais ou menos 5 canhões , do tempo das caravelas, que só neste dia estavam nos largos da tabanca. (...)

(...) [Falta-nos a carta, de 1/50 mil, de Jufunco, lapso nosso ou do nosso "cartógrafo" Humberto Reis...Esta região faz parte do Parque Natural dos Tarrafes do Rio Cacheu, "considerado o 5º maior parque com mancha contínua do ecossistema do mangal em África"...]

Guiné 61/74 - P25360: Blogues da nossa blogosfera (191): Recuperando parte dos conteúdos do antigo sítio da AD Bissau - Parte IV: foto da semana, 2 de janeiro de 2011: a ilha-refúgio de Alfa Iaia, rio Corubal


Guiné-Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > Título da foto: A ilha refúgio de Alfa Iaia | Data de Publicação: 2 de Janeiro de 2011 | Data da foto: 6 de Novembro de 2010 | Palavras-chave: ecoturismo

Legenda:

No século XIX,  

Alfa Iaia, rei de Labé, c. 1900
Fonte: Wikimedia Commons 
(com a devida vénia...)
Alfa Iaia era rei de Labé no Futa Jalon, tendo sido coroado em 1892 e sendo hoje uma figura reverenciada na Guiné-Conacri e adorada como um herói nacional deste país.

Embora controversa pelas alianças que fez com o colonizador francês, acabou por ser um grande combatente que afrontou os colonialistas em numerosas batalhas a cavalo. 

Foi nesta ilha no meio do rio Corubal que por vezes se refugiava quando acossado pelos franceses que assim lhe perdiam a pista.

Acaba por morrer na Mauritânia em 1912, depois de ter sido para lá deportado pelos franceses, na sequência de uma anterior deportação para o Dahomé (atual Benin).

(com a devida vénia...)
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Nota do editor:

Último poste da série > 8 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25356: Blogues da nossa blogosfera (190): Recuperando parte dos conteúdos do antigo  sítio da AD Bissau - Parte III: Foto da semana, 19 de dezembro de 2010, o canhão do fortim de Bolol (ou Bolor), memória silenciosa do desastre de 1870

Guiné 61/74 - P25359: Os 50 anos do 25 de Abril (7): exposição em Santiago do Cacém, "Filhos da Terra, Soldados do Ultramar"


Cartaz da exposição "25 de Abril, 50 Anos: Filhos da Terra, Soldados do Utramar", Santiago do Cacém, a inaugurar no próximo dia 12 de abril de 2024.

Fonte: TV Canal Alentejo, 8 de abril de 2024 (com a devida vénia...)


1. Da nossa amiga SS (endereço de email: ssambado@gmail.com ), sobrinha de um camarada nosso, da FAP (Força Aérea Portuguesa), já falecido (em 9 de novembro de 2022),  e que passou pelo TO da Guiné (*), chegou-nos uma notícia que pode interessar aos nossos leitores,  a de um exposição, a ser inaugurada dentro de dias, em Santiago do Cacém, sobre os "filhos da terra" que foram "soldados do ultramar"...

Do Canal Alentejo, respigamos  a seguinte informação sobre o evento (com a devida vénia):

(...) "Entre os dias 12 e 30 de abril, os cidadãos de Santiago do Cacém têm a oportunidade de testemunhar uma parte importante da história nacional através da Exposição 'Filhos da Terra, Soldados do Ultramar'. 

"Esta mostra, que decorre na Biblioteca Municipal Manuel da Fonseca e na Travessa de São Sebastião, é uma oportunidade para refletir sobre a experiência dos santiaguenses que foram soldados durante a Guerra do Ultramar.

"A inauguração da exposição está marcada para o dia 12 de abril, às 15h00, na Biblioteca Municipal Manuel da Fonseca, onde será também apresentado o Arquifolha n.º 5. Este evento inaugural será seguido, às 15h30, por uma conversa com antigos soldados do Ultramar, moderada pelo Dr. Sérgio Pereira Bento, no Auditório da Biblioteca Municipal Manuel da Fonseca.

"A Exposição 'Filhos da Terra, Soldados do Ultramar' é mais do que uma simples coleção de fotografias e relatos. Ela representa uma parte da história vivida por muitos santiaguenses em tempos de guerra, oferecendo um olhar humano e íntimo sobre um período marcante e por vezes doloroso.

"As fotografias, gentilmente cedidas por ex-soldados e suas famílias no âmbito do projeto 'Imagens com História', oferecem um testemunho poderoso e autêntico desse período conturbado. É uma oportunidade única para todos os interessados em compreender e honrar o legado daqueles que viveram esta experiência.

"Esta iniciativa faz parte das Comemorações dos 50 anos do 25 de Abril, celebrando não apenas a liberdade alcançada nessa data histórica, mas também reconhecendo os sacrifícios e as vivências daqueles que estiveram envolvidos na Guerra do Ultramar. 

"É um convite para todos os cidadãos de Santiago do Cacém participarem nesta jornada de memória e reflexão sobre o passado coletivo de Portugal." (...)

2. Comentário do nosso editor LG:

Agradeço à nossa amiga SS, que regularmemte nos fornece informação relativa aos antigos combatentes. com origem em fontes do seu Alentejo e comunicação social em geral. 

Aproveito também por saudar esta iniciativa do Municipio de Santiagodo  Cacém, ao querer manter viva, 50 anos depois do 25 de abril e do fim da guerra de África / guerra do ultramar / gierra colonial (**), a memória dos seus filhos que lá combateram, e alguns morreram (um total de 32, segundo o portal UTW - Ultramar TerraWen).

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(**) Último poste da série > 1 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25326: Os 50 anos do 25 de Abril (6): "Geração D - Da Ditadura À Democracia", por Carlos Matos Gomes; Porto Editora, 2024 (3) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P25358: Parabéns a Você (2260): Jorge Canhão, ex-Fur Mil Inf da 3.ª CCAÇ / BCAÇ 4612/72 (Mansoa, 1972/74); Mário Vitorino Gaspar, ex-Fur Mil At Art MA da CART 1659 - Zorba (Gadamael e Ganturé, 1967/68) e Coronel PilAv Ref Miguel Pessoa, ex-Cap PilAv da Esquadra 121 / GO 1201 / BA 12 (Bissau, 1972/74)

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Nota do editor

Último post da série de 6 de Abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25343: Parabéns a Você (2259): Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil Op Especiais da CART 3492 / BART 3873; Pel Caç Nat 52 e CCAÇ 15 (Xitole, Mato Cão e Mansoa, 1971/73)

segunda-feira, 8 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25357: Notas de leitura (1681): "Margens - Vivências de Guerra", por Paulo Cordeiro Salgado; Lema d’origem Editora, Março de 2024 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Abril de 2024:

Queridos amigos,
Porque ficou este amor excessivo pela Guiné, por aqui andamos a testemunhar o que a memória ainda retém, no caso vertente Paulo Salgado, nosso confrade, volta em ondas sucessivas ao Olossato, aproveita acontecimentos vividos nos anos da cooperação e estas vivências da guerra, que agora nos oferece em livro, andam talentosamente entre o antes e o depois. Compete-me fazer uma declaração de interesse, dizendo que conheci o Paulo Salgado nos meses de cooperação de 1991, que viajámos ao Cumeré e ao Olossato, que numa das suas páginas me trata por Mariano e põe-me em Galomaro (diga-se de passagem que no meu tempo era uma quase colónia de férias, mas ele retratou-me entre flagelações e minas anticarro...). Devo-lhe um memorável encontro no Cumeré com o coronel Mamadu Jaquité que me deixava bilhetinhos na picada, sempre tratando-me carinhosamente por "alferes de merda"; e, não menos importante, guardo comovido a recordação da viagem ao Olossato, espero que o Paulo Salgado se recorde que quando ali chegámos se disse que nada de tão edénico tinha visto, sentia-me em Sintra. Enfim, as vivências que partilhei com o Paulo Salgado.

Um abraço do
Mário



Nunca o preço do amor pela Guiné é excessivo, só a morte o pode aniquilar

Mário Beja Santos

Paulo Salgado, depois da sua comissão no Olossato e em Nhacra, voltou à Guiné muito mais tarde como cooperante na área da saúde, durante sete anos, e sobre esta temática e outras incursões já deixara algumas achegas na escrita. Acaba de publicar uma nova incursão, de cariz memorial, pontuada por solilóquios, circunlóquios, viagens ficcionadas mas com personagens de carne e osso, deixa fluir a consciência de como pensava e agia no turbilhão da guerra, e com subtileza articula todos os seus regressos ao anseio da paz e do desenvolvimento, aquela terra, aquela vivência ganham forma de um processo irrefragável, é corpo dentro do seu corpo, e não resisto a comentar o que me ocorreu quando finalizei a leitura das "Margens Vivências de Guerra", Lema d’origem Editora, março de 2024, aquele parágrafo de Álvaro Guerra na sua obra O Capitão Nemo e Eu, 1973, nada de mais belo conheço em termos literários, e tudo por causa daquela guerra que nos irmanou: “Por lá chafurdei na lama das lalas, debati-me no turbilhão dos tornados, derreti-me na fornalha de um Sol quase invisível, dissolvi-me na chuva vertical, e amei como um danado aquela terra que me injetou a febre, me secou, me expulsou a tiro. Mas nunca o preço do amor é excessivo, nem a presença da morte o pode aniquilar.”

Paulo Salgado é Alberto, tudo começa no aeroporto de Bissalanca, vem esperar Mateus, irão viajar até ao Olossato, inevitavelmente passarão por Ponte do Maqué, “lá está o que resta do fortim, quadrado fortificado, por onde passaram pelotões de companhias para guarda e salvaguarda da ponte, coberto de capim e arbustos, tudo o tempo levou, mas não levou as memórias que me vêm ao presente”; no Olossato Mateus procura Sali, a sua antiga lavadeira, ela anuncia-lhe que lhe deixou um filho, tem nome de Infali, trabalha nos correios de Bissau, põe-lhe diante dos olhos uma criança de cinco anos, é o neto de Mateus e dá pelo menos nome, Mateus pensa logo em levar esta criança consigo e educá-la; mas há uma outra viagem, Alberto, a mulher e a filha levam um outro antigo alferes, de nome Mariano até ao Cumeré, conta-lhe que em Nhacra, no dia 9 de junho de 1971, houve bastante sobressalto com flagelações do PAIGC, no Cumeré Mariano procura o comandante Demba, o antigo guerrilheiro do PAIGC fora seriamente flagelado no seu aquartelamento por ele e por o seu grupo, depois de uns segundos de embaraço tudo acabou em abraços, e gritou-se viva à Guiné!, e viva à Portugal!

Temos agora uma rotação de lugar e tempo, o antigo médico combatente conversa com uma sua colega, um rasto de memória leva-os até ao Sul, a jovem médica tem muito por contar, e nem lhe passa pela cabeça como fez bem ao veterano da guerra ouvi-la. Voltamos á orla do Morés, há um soldado que chora numa emboscada e será reconfortado pelo seu comandante; há um radiotelegrafista que não queria naquele dia ir em operação, o alferes lá o persuadiu, houve emboscada, a vítima foi o radiotelegrafista.

Temos agora Mateus e Alberto junto do enorme poilão do Alto do Maqué: “As nervuras salientes do poilão são enormes, cabendo ambos numa das fendas, parecendo que, abraçando-a, a magnífica árvore parece recordar-se deles, uma espécie de reencontro entre a majestade e imponência da árvore e a revisitação por estes homens que a ela ocorrem respeitosamente. Sentado, de pé, ao lado, de vários ângulos, deixam-se fotografar por Carolina, embevecida perante aquele cenário, aquele consolo quase pueril dos ex-militares, agora cinquentões.”

E há a memória do rio, quase sempre um fio de água que vaza as suas águas pelos braços do rio Cacheu; naquele local, estratégico, entre Bissorã e Farim, com o Morés à espreita, há recomendações para fazer ação psicológica, organizar manifestações de apoio à política do Governo, Alberto, que comanda a companhia, conversou com onze chefes de tabanca, e houve recados incómodos, do género: “Nosso alferes, a guerra não tem jeito nenhum; o senhor fala com o homem grande de Bissau para falar com o chefe do PAIGC para acabar com a guerra.”

E há as cartas de amor, Fernando Pessoa falava nelas como ridículas, Alberto dirige-se à sua amada, um tanto circunspecto, mas sempre com muitas saudades; traz-se gente da população afeta ao PAIGC numa operação, Alberto conversa com uma enfermeira da guerrilha, ela diz-lhe sem volteios que só quer lutar pela liberdade, o capitão decide que ela e as outras mulheres voltem para onde estavam, como aconteceu; não falta a mágoa de receber mensagens criticando a falta de cumprimento exato do que se devia ter feito numa operação e Alberto/Paulo Salgado dão nos conta, como se todos estivéssemos numa sala de espelhos, em Assembleia Geral, da ansiedade na espera do correio, a morte de um ente querido que nos é comunicada por uma mensagem, os meses passam, há brancos e pretos, mortos e feridos, lá na companhia chegou a funcionar um jornal, de novo “O Tabanca”, morre a mãe de Alberto e ele dedica-lhe um lindo poema, estamos em novembro de 1970, no fim desse ano há um ataque com mísseis terra-terra ao Olossato, o capitão enviar para Bissau o relatório: “Aquartelamento e povoação atacados com mísseis terra-terra; não houve vítimas nem prejuízos; apenas há que refazer o heliporto.” Num relatório não cabe dizer que houve gente escoriada e que se comeu um jantar frio; caso excecional, desapareceu um cabo-condutor do aquartelamento, mandou-me mensagem informando que o militar se teria perdido na mata do Morés.

O cooperante Alberto está agora numa receção na embaixada do Brasil em Bissau, disserta-se e brinda-se à lusofonia. Novo salto até ao passado, Alberto viaja pelas tabancas do Olossato e, mais adiante, fala-se do pontão que liga as duas margens do rio Maqué, que faz a ligação entre Bissorã e Farim, e alguém conta que o PAIG a rebentou com petardos, houve que reconstruir a ponte; muito anos mais tarde, quem contou a esta história, de nome Suleiman, ex-chefe de milícia, foi visitado pelo cooperante Alberto no hospital Simão Mendes, e o que fica escrito a todos nós pertence:
“Que vida de dor, primeiro, português de segunda, depois guineense de segunda, castigado por ter combatido ao lado da trapo portuguesa; agora amortalhado, vencido pelo sacrifício e pela doença, tenho de chorar, para dentro, não se consigo reter as lágrimas, um pedaço da minha vida escoou-se naquela figura íntegra e amiga, que tantas vezes guiou os nossos passos, nossos e de outras companhias, trilhos, carreiros, picadas… e me salvou a vida, evitando o pisar de uma mina… que Alá te abençoe, Suleiman.”

Ainda há muito que esperar desta literatura memorial, na casa dos setentas e dos oitentas são estas acendalhas que tornam esplendente o que Álvaro Guerra nos advertiu em 1973, chafurdou-se na lama das lalas, viveu-se a espiral da solidão, conheceu-se o medo, viram-se crianças esquálidas e de ventre inchado, seres humanos minados pela doença, tudo parecia acabado quando a guerra para nós acabou, mas não, como diz Álvaro Guerra, nunca o preço do amor é excessivo, porque muitos receberam a graça de amar aquela terra como este amor que agora se confessa, não se quer só reter para uso da memória individual.
Olossato: torre abrigo com vista para a pista de aviação
Olossato: abrigo das peças de artilharia – obus 8,8
Olossato: efeitos de uma mina na estrutura da ponte

Estas três imagens foram extraídas do blogue Rumo a Fulacunda, com a devida vénia
Regresso ao Olossato, neste caso Ponte do Maqué, 2006. Paulo Salgado, ex-alferes da CCAV 2721, na companhia do ex-cabo Moura Marques. Imagem retirado do nosso blogue
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Nota do editor

Último poste da série de 5 DE ABRIL DE 2024 > Guiné 61/74 - P25342: Notas de leitura (1680): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (19) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P25356: Blogues da nossa blogosfera (190): Recuperando parte dos conteúdos do antigo sítio da AD Bissau - Parte III: Foto da semana, 19 de dezembro de 2010, o canhão do fortim de Bolol (ou Bolor), memória silenciosa do desastre de 1870


Guiné-Bissau > AD-Acção Para o Desemvolvimento > Foto da Semana >  Título da foto: Canhão do Fortim de Bolol | Data de Publicação: 19 de Dezembro de 2010 | Data da foto: | 21 de Novembro de 2010 | Palavras-chave: história (*)

Legenda:

Durante o período colonial, no final do século XIX, os portugueses estabelecem um fortim em Bolol para controlar o movimento marítimo na embocadura do Rio Cacheu, já próximo do oceano Atlântico.

A tabanca felupe de Djufunco, situada a pouca distância de Bolol, não aceita a presença desse Fortim e faz uma investida que acaba por destruí-lo e impedir de vez o seu funcionamento.

Ofendido, o governador da Guiné, sediado em Cabo Verde, organiza uma expedição punitiva a Djufunco, que acaba por se traduzir na morte de quase todos os soldados portugueses envolvidos nesta operação.

Passará a ficar conhecido na história como o Desastre de Bolol, vindo a ter como consequência imediata a afectação de um governador na Guiné, em vez de continuar a estar em Cabo Verde.

Fonte: Arquivo.pt > ADBissau.org (com  devida vénuia...)


Antiga Província Portuguesa da Guiné > Carta Geral (Escala: 1/500 mil) (1961) > Posição relativa de Bolol (ou Bolor(, Bolola, Jufunco, Varela e Cacheu.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guimné (2024)


2. Sobre o desastre de Bolol (ou Bolor, como ainda se escrevia na carta de 1961), pode ler-se na Wikipedia (com a devida vénia...)

(...) Desastre de Bolol é a designação por que ficou conhecida na historiografia colonial portuguesa o resultado da expedição militar portuguesa enviada em finais de 1878 para recuperar o fortim de Bolor (era assim que se escrevia na época ao) na foz do rio Cacheu, na então Guiné Portuguesa.

A expedição, enviada pelo governador de Cabo Verde, que à época tinha jurisdição sobre a costa da Guiné, resultou na morte de quase todo o contingente envolvido na operação, o que determinou a alteração da estratégia portuguesa na região, nomeadamente a criação de um governo específico na Guiné, sedeado em Bolama e separado do de Cabo Verde.

(...) No contexto da corrida à ocupação efectiva do território africano, que culminaria na Conferência de Berlim (1884-1885), forças britânicas da colónia da Serra Leoa instalaram-se na ilha de Bolama, iniciando uma disputa pelo controlo da foz do Cacheu que culminou em 1870 com a decisão arbitral do presidente norte-americano Ulysses S. Grant que reconheceu a soberania portuguesa na região.

Em consequência, o Governo português ordenou a ocupação efectiva daquela região, visando a consolidação do seu estatuto como possessão portuguesa. 

Entre os postos criados, foi estabelecido um fortim na tabanca de Bolol (ao tempo referida como Bolor), em território do grupo étnico dos felupes, na margem direita do rio Cacheu.

O objetivo do fortim de Bolor/Bolol era albergar uma pequena força portuguesa à qual caberia controlo do movimento marítimo na embocadura do rio Cacheu, estabelecendo assim a posse efectiva do território em antecipação a novos conflitos pela posse daquela estratégica porção da costa africana e das ilhas fronteiras, nomeadamente a posse de Bolama e da parte mais interna do arquipélago dos Bijagós.

Aparentemente com o apoio britânico, cujos mercadores na região terão fornecido armamento, o povo da tabanca felupe de Jufunco (lê-se: Djufunco),  situada a pouca distância de Bolor/Bolol, não aceitou a presença militar portuguesa, atacando e destruindo o fortim.

Em resposta ao ataque, o governador da Cabo Verde, então com jurisdição sobre a costa africana fronteira ao arquipélago de Cabo Verde, na qual se incluía a actual Guiné-Bissau, enviou em 1878 uma expedição punitiva a Jufunco. 

A resistência do povo felupe foi inesperadamente dura e a expedição foi um desastre militar, resultando na morte da maioria do efetivo português envolvido na operação.

O incidente, apelidado de 'desastre de Bolol' (na época dizia-se Bolor), foi uma das maiores derrotas do Exército Português na luta pelo controlo das populações africanas das colónias portuguesa no contexto das campanhas de pacificação.

Como consequência imediata foi determinado a criação de um governador autónomo na Guiné, separado de Cabo Verde, sendo escolhida como sede a vila de Bolama, estabelecendo assim uma efectiva presença portuguesa no território que havia sido disputado com os britânicos.

 Seguiram-se múltiplas acções militares visando a submissão dos diversos povos da região, nomeadamente contra os biafadas em Jabadá (1882), os papéis em Bissau e no Biombo (1882-1884), os balantas em Nhacra (1882-1884) e os manjacos em Caió (1883).(...)

No local do fortim, agora parte do Parque Natural dos Tarrafes do Rio Cacheu, apenas resta uma pequena peça de artilharia em ferro, de alma lisa.(...)

(Seleção, revisão / fixação de texto, itálicos, negritos: LG) 
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Guiné 61/74 - P25355: Blogues da nossa blogosfera (189): Recuperando parte dos conteúdos do antigo sítio da AD Bissau - Parte II: Foto da semana, 16 de janeiro de 2011 (Tambores de Bolol na festa do fanado felupe)


Guiné-Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Título da foto: Tambores de Bolol |  Data de Publicação: 16 de janeiro de 2011 |  Data da foto: 21 de novembro de 2010 | Palavras-chave: Cultura popular

Legenda: 

A tabanca de Bolol, situada no extremo sul da planície de Varela, junto à embocadura do rio Cacheu (Bolor, ao lado de Bolola, segunda cartografia portuguesa, vd. carta de Jufunco, que não temos), prepara-se este ano para realizar o seu 'fanado', o que está a mobilizar toda a comunidade felupe desta zona e em especial os jovens.

Trata-se da cerimónia ancestral de iniciação dos jovens à vida adulta, onde são acolhidos numa 'barraca' num local isolado durante cerca de 2 meses, onde aprendem a sua história, a sua cultura, os valores éticos e morais e a forma de se comportarem em sociedade.

Felizmente que este ano a colheita de arroz foi boa e muito melhor que a do ano passado, o que vai assegurar que todas as cerimónias culturais que antecedem a partida dos 
'fanados' para a 'barraca' e a sua saída se anteveja com muita alegria e festa.

Foto (e legenda): Arquivo.pt > AD - Bissau (com a devida vénia...)


1. Continuamos a recuperar, com sorte e paciência, algumas "fotos da semana", do antigio da AD - Acção para o  Desenvolvimento,  como esta que reproduzimos acima: os tambores de Bolol na festa do 'fanado' felupe...

Como já dissemos anteriormente, a maior parte das fotos desta série eram tiradas pelo Pepito,  nas suas andanças pelo interior da Guiné. Gostava gostava muito do "chão felupe". Tinha casa de praia em Varela, já deste o tempo dos pais.

Cada foto tinha um título, uma data, uma palavra-chave ou "descritor", e uma legenda, resumo analítico ou sinopse. Esta série, "foto da semana", começou a publicar-se no início da criação da página, em 2005.

O sítio, AD Bissau  (http://www.adbissau.org/ ) fazia parte da lista dos "blogues da nossa blogosfera" (*), Infelizmente ficou inativo por volta de 2020/2021 e foi desontinuada,  por razões que desconhecemos (talvez devido à pandemia).  O sítio atual da Ação para o Desenvolvimento (nova designação, de acordo com a ortografia em vigor) é: https: www.ad-bissau.org

Só muito recentemente, através do Arquivo.pt, conseguimos recuperar parte dos seus conteúdos. Outros perderam-se, como o casos de alguns excelentes vídeos didáticos, como o Bemba di Vida (Celeiro da Vida), uma produção do IBAP, com apoio de várias ONGD, incuindo a AD... (Está disponível no You Tube, na conta de Edgar Ferreira Correia). O Arquivo.pt não recupeera estes vídeos por que "o Adobe Flash Plaer já não é suportado"... Enfim, é o preço que se paga pela obsolescência tecnológica no domínio da gestão da informação.


De qualquer modo, é uma pena que estes recursos (vídeos, áudio, fotos, texto...) se percam. (Vd. também a página do Facebook do IBAP - Instituto da Biodiversidade e Áreas Protegidas), instituição que merece o nosso apreço e apoio.

No tempo do nosso amigo Pepito, engº agrº Carlos Schwarz da Silva (Bissau, 1949 - Lisboa, 2014), cofundador e diretor executivo da AD - Acção para o Desenvolvimento, tínhamos uma relação privilegiada com esta organização guineense, com sede em Bissau, Bairro do Quelelé..
.
Fomos perdendo os contactos, com a morte do Pepito e os sobressaltos da vida interna da ONG.  Mas durante anos o blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné continuou a figurar como um dos "parceiros" da AD, a par, por exemplo, da Tabanca Pequena de Matosinhos (vd. imagem à esquerda).

Guiné 61/74 - P25354: Blogues da nossa blogosfera (188): Recuperando parte dos conteúdos do antigo sítio da AD Bissau - Parte I: Foto da semana, 5 de julho de 2009 (Produção de Flor-de -Sal)



Guiné-Bissau > Bissau > AD - Acção para o Desemvolvimento > Foto da semana: Título da foto: Aumenta a produção de Flor-de-Sal | Data de Publicação: 5 de Julho de 2009 | Data da foto: 20 de Março de 2009 | Palavras-chave: Novas Tecnologias

Legenda:

"Ermelinda Medina é a técnica responsável pela difusão desta tecnologia amiga do ambiente que está a fazer um enorme sucesso em todas as zonas litorais da Guiné-Bissau, com crescentes pedidos da parte das mulheres habituadas a produzir sal segundo os moldes antigos, isto é, com recurso à lenha e ao lume.

"Enquanto vulgarizadora que bem conhece e domina a produção de sal de excelente qualidade, a flor-de-sal, ela começou a difusão na zona de Ingoré, seguindo-se Barro, S.Domingos e Canchungo, preparando-se para cobrir as zonas de Cacine e Bedanda, logo que comece a próxima época seca.

"Recorrendo apenas à energia solar, em vez da habitual queima de lenha, as mulheres passam a dispor de um produto de melhor qualidade (sal iodado), de aparência mais comercial e com uma procura assegurada, o que lhes permite aumentar os seus recursos financeiros, gastando menos tempo e não agredindo a sua saúde." 

Fonte: Arquivo.pt > ADBissau.org (com a devida vénia...)


1. No tempo do nosso amigo Pepito, engº agrº Carlos Schwarz da Silva (Bissau, 1949 - Lisboa, 2014), cofundador e diretor executivo da AD - Acção para o Desenvolbimento, tínhamos acesso à excelente fotogaleria da página desta prestigiada e respeitada ONG, com sede em Bissau, Bairro do Quelelé... 

Tínhamos inclusive uma  relação privilegiada com esta organização guineense, que se foi perdendo com a morte do Pepito. Nòs, a Tabanca Grande, a Tabanca Pequena de Matosinhos, e outras tertúlias, incluindo a ONGD Ajuda Amiga. Mas durante anos o blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné continuou a figurar como um dos "parceiros" da AD.

Nos últimos  anos, deixámos inclusivamente de ter acesso à antiga página da AD - Acção Para o Desenvolvimento: o sítio (http://www.adbissau.org/ )   terá sido reformulado e descontinuado (por  volta de  2020/2021). 

Só muito recentemente, através do Arquivo.pt, conseguimos recuperar parte dos seus conteúdos, nomeadamente do perído que vai do  seu início, em 2005, até 2010. Outros conteúdos  perderam-se como a multimédia (vídeos e áudios) e a fotogaleria (a série "Foto da semana"). 

Com sorte e pacicência, lá vamos recuperando alguma "foto da semana", como esta que reproduzimos acima. 

A maior parte das fotos eram da autoria do Pepito, que incansavelmente percorria a Guiné onde quer  que estivessem em curso,  ou em estudo,   projetos da AD...  Cada foto tinha um título, uma data, uma palavra-chave ou "descritor", e uma legenda, resumo analítico ou sinopse.

Tratava-se de um sítio que fazia parte da nossa blogosfera (*), que nos disponibilizava recursos (em imagem, texto, etc.)   importantes para se ir acompanhando quer projetos relevantes para o desenvolvimento socioeconómico sustentado da Guiné-Bissau (como é o caso, por exemplo, da produção de sal), quer para se conhecer melhor a socioantropologia guineense  (a arte, a música,  a cultura,   etc.) e a sua história recente.

A ONG AD - Ação para o Desenvolvimento passou, a partir de maio de 2011, a ter outro endereço, mas  a URL é ligeiramente diferente da do sítio antigo.  Estranhamente, não tem sido capturada pelo Arquivo.pt: https://ad-bissau.org/ . Já sugerimos que o façam.

De entre os membros da equipa da AD (40, dos quais já morreram três, incluindo o Pepito em 2014), o Mamadu Ali Jaló é atualmente (e desde maio de 2011),   o responsável pela actualização da página na Web e pela redacção dos folhetos e informações da organização.

domingo, 7 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25353: Efemérides (432): Há 70 anos que morreu Aristides de Sousa Mendes (em Lisboa, 3 de abril de 1954): O Presidente da República Portuguesa associou-se à homenagem do dia 7, hoje, em Nova Iorque, na Igreja Eslovena de São Ciro


Aristides de Sousa Mendes, o consul português de Bordéus, 1940.

Cortesia de Fundação Aristides de Sousa Mendes.




1. Mensagem do Presidente da República Portuguesa, que foi lida na Cerimónia de Evocação de Sousa Mendes (e Sousa Dantas), hoje em Nova Iorque, na Igrela Eslovena de São Ciro.(*)

O nosso amigo e camarada João Crisóstomo, um dos organizadores do evento, fazendo parte de The Day of Consciense  Committee, fez-nos chegar uma cópia da mensagem, com autorização para a publicar no blogue, depois da realização da cerimónia, que  teve o apoio da Missão Permanente de Portugal nas Nações Unidas, Igreja Eslovena de São Ciro, Fundação Internacional Raoul Wallenberg, Fundação Sousa Mendes e ainda "The Portugal-US Chamber of Commerce" (Câmara de Comércio Luso-Americana). (*)

Aristides Sousa Mendes (n. Cabanas de Viriato, Carregal do Sal, 19 de julho de 1885), o cônsul português em Bordéus, em 1940, morreu a 3 de abril de 1954,  em Lisboa, aos 68 anos. (**)

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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 4 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25338: Tabanca da Diáspora Lusófona (23): Nova Iorque, Igreja Eslovena de São Ciro, domingo, 7 de abril: recordando e cebrando os 70 anos da morte de dois grandes diplomatas e humanistas do tempo da II Grande Guerra, o português Sousa Mendes, e o brasileiro Sousa Dantas

(**) Último poste da série > 18 de março de 2024 > Guiné 61/74 – P25283: Efemérides (431): 51º Aniversário de instruendos que passaram pelo CIOE, em Penude, Lamego (José Saúde)

Guiné 61/74 - P25352: Agenda cultural (853): 25 de Abril, Três Livros em Festa: amanhã, dia 8, segunda feira, às 18h30, em El Corte Inglés, Lisboa (Manuel S. Fonseca, Ed. Guerra e Paz)





1. Mensagem do Manuel S. Fonseca, da editora Guerra e Paz:  

Data - 7 de abril de 2024, 14:45
Assunto - Um convite muito livre que mete livros
Cartoon de Nuno Saraiva



Gostava muito que viesse.
Vai ser uma festa. Amanhã, às 18:30, 
no El Corte Inglès. 

Não prometo que seja assim, como no desenho do Nuno Saraiva,  mas lá que haverá “vivas” a organismos…

Sem sermões, com humor e liberdade. E um delicioso cocktail no final. 

Até amanhã.

2. Mais informação sobre o evento:

O Âmbito Cultural do El Corte Inglés e a Editora Guerra e Paz têm prazer de convidar para a apresentação dos livros :
  • “Antes do 25 de Abril: Era Proibido”,  de António Costa Santos;
  • “50 Anos de Abril no Algarve, Uma Revolução Tranquila na Escrita dos Dias”,  de Ramiro Santos;
  • “25 de Abril, No Princípio era o Verbo”,  de Manuel S. Fonseca e Nuno Saraiva;
a realizar-se no dia 8 de Abril, pelas 18h30,a na Sala de Âmbito Cultural, piso 6, El Corte Inglés de Lisboa.

Sinopse 

Talvez – e já comecei mal, qual talvez, qual carapuça! Nunca mais voltaremos a ter um dia tão deliciosamente festivo, inocente e delirante, como aquele. E eu nem preciso de dizer: sabem todos muito bem, qual foi. 

Ora vejam, malta exaltada a correr pelas ruas com a palavra liberdade a sair-lhes cantada e chorada da boca para fora. Uns, maravilhosamente malvestidos, cabelos desgrenhados, calças à boca de sino, anarcas de corpo e alma, espantadíssimos a gritar, cheios de ironia, «Anarquia, sim, mas não tanto, por favor»; outros, seriíssimos militantes – vá lá, tipo mrpp –, punhos a bater no peito, como se o coração fosse um tambor, clamando «Estaline está morto, mas vive nos nossos corações». 

Eis a liberdade sem freios, pura, esfusiante. 

A editora Guerra e Paz concentrou essa liberdade em três livros, cujos seus autores são as vedetas da sessão mais livre e mais divertida dos 50 anos do 25 de Abril. Esta sessão.

Guiné 61/74 - P25351: Facebook...ando (53): Joaquim Garrett procura camaradas que andaram com ele na EINAT n.º 2052 (1968/70)



T/T Niassa >  2 de maio de 1968, a bordo do "Niassa" a caminho da "colónia de férias" da Guiné. Na companhia dos enfermeiros António Guita, Adriano Herculano e Coelho (Neusa), ambos da EINAT nº 2052. Tambem está o enfermeiro Martins,  da CCaç 2383.(O Joaquim Garrett é o primeiro do lado direito, na primeira fila.)



Bissau > Cais do Pidjoguiti  >  25 de agosto de 1968 > A contar da esquerda para a direita: o Pereira (açoriano),  Joaquim Garrett, e o Victor Ventura


Abrantes > 30 de abril de 1968 > Antes do embarque para a Guiné.

Fotos (e legendas): © Joaquim Garrett (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso camaradas Joaquim Garrett, amigo do Facebook da Tabanca Grande,  
publicada na sua página, em 24 de fevereiro de 2024, o8:34

(...) Faz hoje, 24 de fevereiro de 2024, 54 anos, que regressei da Guiné acompanhado da minha Equipa de Instrução de  Nativos - EINAT n.º 2052. 

Fizemos esta viagem de regresso a bordo do navio T/T "Índia", Graças a Deus regressámos todos. 

Aos camaradas que tenham conhecimento de outros que fizeram partir desta unidade militar e me acompanharam, agradeço que deem-lhe conhecimento desta publicação para caso seja possível voltarmo-nos a encontrar.

Foto (acima) tirada no dia 30 de abril de 1968, em desfile de despedida da população de Abrantes um dia antes do embarque. O meu muito obrigado. (...)



2. O Joaquim Garrett é amigo do Facebook da Tabanca Grande... Esteve no CTIG de 1968 a 1970, integrado numa subunidade, de que nunca antes tínhamos ouvido falar, a EINAT nº 2052, Equipa de Instrução de Nativos (sic)...

De acordo com a sua página no Facebook, tem 162 amigos (15 em comum). E pela sua apresentção, ficamos a saber que:

(i) é sócio gerente na empresa J.  A. Garrett - Organização e Gestão de Empresas;
(ii) trabalhou como gestor na empresa BMW;
(iii) estudou Gestão no ISCTE - Lisboa, Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa;
(iv) estudou Contabilidade e Auditoria em ISCAL - Instituto Superior de Contabilidade Administração de Lisboa;
(v) estudou no Instituto Comercial de Lisboa;
(vi) andou na Escola Comercial Patrício Prazeres;
(vii) é 
 de Lisboa e vive em Lisboa;
(viii) desde jovem que está ligado aos escoteiros;
(ix) aderiu ao Fcebook em setembro de 2016.

3. Além do pedido para nos esclarecer esta sigla (EINAT) (e já agora dizer algo mais sobre o que faziam estas Equipas de Instrução de Nativos, no seu tempo), teríamos muito gosto em tê-lo connosco, sentado à sombra do poilão da nossa Tabanca Grande, a tertúlia do nosso blogue (que faz 20 anos dentro de dias).  

Vemos que, entre os seus amigos do Facebook, está um outro contabilista certificado, o José Martins, de Odivelas, um histórico do nosso blogue, com cerca de 470 referências. Vejo que o Joaquim Garrett também andou no ISCTE, possivelmente até na mesma altura que eu (1975/80).

Pelas legendas das fotos, vemos que à EINAT também pertenciam enfermeiros. Seriam equipas mistas de alfabetização, prestação de cuidados de saúde e extensão rural ? Confesso que não ouvi falar, no meu tempo de Guiné (1969/71).

Um alfabravo, camarada. LG
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Nota do editor:

Guiné 61/74 - P25350: Contos do ser e não ser: Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887 (12): "Os velhinhos"

Adão Pinho Cruz
Ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547
Autor do livro "Contos do Ser e Não Ser"


Os velhinhos

Há vários restaurantes clássicos e tradicionais no Porto, aos quais acorrem, sobretudo ao domingo, as terceira e quarta idades. Como é óbvio, também por lá ando. Odeio a velhice, mas nunca os velhinhos, um pouco na mesma linha de que odeio as religiões, mas nunca os que as professam. Por vezes, convido o meu filho Marcos, não só porque gosto de estar com ele, mas também como contrapeso. Empresta-me um certo arejo de mais novo e permite-nos discorrer sobre filosofias da vida para as quais nos estaríamos marimbando se não fosse a garrafinha à nossa frente, às vezes duas.

Hoje fui sozinho a um desses restaurantes comer um cozidinho à portuguesa. Ia eu a meio da orelheira quando eles, os velhinhos, começaram a chegar. Bem alinhados nas roupas e nos arranjos, eles e elas, mais elas do que eles, numa derradeira tentativa de exumar alguns restos de juventude: logo à cabeça, um antigo colega meu do hospital de Santo António, que por acaso operara em tempos idos a minha irmã e, logo atrás, a sua própria irmã, que fora minha colega de curso. Que ternura! Quem os viu e quem os vê! O suficiente para eu parar de roer a unha, do porco, claro, e abrir os arquivos neuronais de trinta ou quarenta anos atrás. Quase me apetecia chorar se não fosse as couvinhas estarem-me a saber tão bem.

Logo a seguir, uma senhora de meia-idade, com ar de Senhora de Fátima, pedia uma mesa para seis. Podia ser aquela que estava mesmo à minha frente, disse o empregado. Logo, entraram dois de terceira idade, mais um de quarta idade e, um tanto atrasados, uma outra senhora de meia-idade, também com ar de Nossa Senhora de outra coisa qualquer, amparando um velhinho a arrastar-se, de braços trémulos no ar, como que a dizer Dominus Vobiscum. Uma cena provavelmente comum no Reino dos Céus.

Dizia um dos de terceira idade, carteira a tiracolo, calça pelo meio da perna e sapatilhas brancas da moda:
- Então, o que escolhem?
Ao que respondeu o outro, de quarta idade, a quem uma lufada de vento havia tombado definitivamente para o lado esquerdo:
- Comida mole, comida mole.

Tomei o meu cafezinho e pedi a conta. Nesse preciso momento, sentou-se na mesa ao lado um sujeito dos seus oitenta e muitos, torcendo a face com aquele esgar esquisito que denuncia a puta da dor das artroses, todo vestido a condizer, certamente ao gosto da filha ou da neta e não da mulher, que Deus provavelmente já havia chamado à sua Divina Presença. No meio da confusão, o empregado colocou a minha fatura na mesa do velho, ao que ele reagiu vociferando:
- Que caralho é isto? Eu ainda nem pedi nada!

É preciso vir a estes sítios para sentirmos a ternura da velhice. Odeio a velhice, mas cada vez mais me sinto pateticamente encantado com o mundo dos velhos, a sua profunda poesia e a dramática coreografia da antecâmara da morte.

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Nota do editor

Último poste da série de 31 DE MARÇO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25323: Contos do ser e não ser: Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887 (11): "Zulmiro"

Guiné 61/74 - P25349: Acordar memórias (Joaquim Luís Fernandes) (7): Uma estória passada no Pelundo, na escolta a um transporte de rachas de cibes: periquitos e velhinhos...


Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Canchungo > Pelundo > 2008 > Restos do antigo quartel português, ao tempo do BART 6521/72 (Pelundo, 22/9/1972 - 27/8/1974), a unidade que fez a transferência de soberania para o PAIGC, e que era comandado pelo Ten Cor Art Luís Filipe de Albuquerque Campos Ferreira.   

A foto foi-nos enviada, em setembro de 2008, juntamente com as fotos de uma série de ex-camaradas nossos,  manjacos do Pelundo (que estiveram ao serviço do exército português e para quem se pedia apoio), pelo sociólogo António Alberto Alves  que residia na altura (e desde 2006) em Canchungo (antiga Teixeira Pinto) e trabalhava para uma ONGD portuguesa.

Foto: © António Alberto Alves (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário de Joaquim Luis Fernandes ao poste P25341 (*), que decidimos incluir na sua série "Acordar Memórias" (**): o nosso camarada leiriense foi alf mil, CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1973, e Depósito de Adidos, Brá, 1974:


Este tema das rachas dos cibes (*), usados nas estruturas das coberturas das casas nos reordenamentos na Guiné, mas também no geral, na cobertura das casas das aldeias, vilas e cidades, traz-me à memória um episódio que vivi na Guiné, em fevereiro de 1973, que me ficou gravado bem fundo.

Estaria na 2ª ou 3ª semana de Teixeira Pinto (muito periquito). Recebi ordens para fazer a escolta ao soldado (ou cabo) da Engenharia, adido no BCAÇ 3863 em Teixeira Pinto, que iria, com pessoal civil, recolher uma carrada de rachas de cibes, nas matas que se situavam entre o Pelundo e Jolmete.

No dia seguinte, saímos logo pela manhã com 2 secções a escoltar a viatura de transporte, creio que uma Mercedes, onde iam os carregadores e o responsável da Engenharia. Eu ia num Unimog com uma secção e um furriel (já velhinho) num outro.

Do Comando, nada me disseram do local onde iríamos fazer a escolta, mas quando nos preparávamos para iniciar a marcha, fui informados por um ou mais soldados, os mais próximos, o que tinha acontecido nessa picada, entre o Pelundo e Jolmete, em 1970: o assassínio pela guerrilha do PAIGC, de três Majores, um Alferes e os seus três acompanhantes nativos. 

Fizeram-me a descrição como sabiam, que eu ignorava completamente. Inicialmente passou-me pela cabeça que o que estavam a dizer era só para assustarem o alferes periquito que os comandava. Depois, tomei consciência de que tinha sido verdade e que o local para onde íamos comportava alguns riscos.

Chegados ao local sem incidentes, montámos um cordão de segurança ao redor da área onde era feito o carregamento dos cibes. Eu (periquito e receoso) orientei uma secção como me pareceu melhor e o Furriel (velhinho) orientou a outra.

Terminado o carregamento, preparámos o regresso. O Unimog onde eu ia, seguia à frente, a seguir a viatura de carga e na retaguarda a outra secção. Tudo tinha corrido bem e isso tranquilizava-me.

No regresso, já com o sol a castigar forte, ao aproximarmo-nos do Pelundo, os soldados mais próximos, sugerem-me que parassemos no quartel do Pelundo, para matarmos a sede com umas cervejas frescas. Cedi à sugestão e,  aí chegados, foi deixar as viaturas e ir direito ao bar do soldado, um balcão que dava para o exterior.

Quanto todos estavam reunidos em frente a esse balcão, verifico que o Furriel e um outro soldado não estavam presentes. Senti um calafrio, terei ruborizado que nem um tomate maduro. O que teria acontecido para não terem vindo? 

Senti o peso da responsabilidade por não ter verificado se estavam todos presentes antes de iniciarmos a marcha de regresso. Vários cenários me passaram pela cabeça. A decisão foi voltarmos ao local onde tínhamos estado na esperança de que os encontraríamos.

E assim aconteceu: bastante antes de chegar ao local onde tinhamos estado, lá vinham eles a pé pela picada, com a G3 nas mãos (ou à bandoleira, ou ao ombro)

Não sei (não me lembro) se alguma vez disseram porque não tomaram o transporte no regresso. Também não compreendo como o condutor do Unimog e os outros soldados dessa secção não deram pela sua falta.

Como isto não é uma estória de ficção, só concluo que naquela guerra havia muita balda e falta de rigor no cumprimento das missões. Por isso às vezes aconteciam azares graves que não deviam acontecer.

Serviu-me de lição este episódio e durante o resto do tempo que passei em Teixeira Pinto, em missões de escoltas e patrulhamentos, passei a ser mais cuidadoso, evitando quanto possível as baldas e seguindo os ensinamentos que tinha recebido na instrução: "suor gasto na instrução e na disciplina, é sangue poupado no combate".

E a minha coroa de glória, é que daqueles que me acompanharam, não perdi nenhum.

Abraços
JLFernandes

6 de abril de 2024 às 00:41
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