sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Guiné 63/74 - P8813: Filhos do Vento (1): Nem branquear os casos nem culpabilizar ninguém (José Saúde)

1. Mensagem do nosso camarada José Saúde [ex-Fur Mil Op Esp,

Data: 21 de Setembro de 2011 22:01

Assunto: "Filhos do Vento"

Meu caro Luís!

"Filhos do Vento" é o princípio de um tema por mim lançado à opinião pública (*) quando em causa está justamente os muitos "desvarios" que a guerra de África proporcionou. 

Ninguém, ou quase ninguém, passa impune a uma realidade que nos foi sobejamente conhecida. Não fui e não fomos anjos imaculados. Não vamos é branquear verdades adquiridas. Consumadas. 

O momento não passa pela culpabilização daqueles que,  num acto sexual,  não meditaram as causas subsequentes. Imputar responsabilidades "às cabeças de vento", penso, ser um tema perverso. Importante é trazer à discussão factos conhecidos. Reais. 

Sou de opinião que a temática tem estatuto para uma ampla discussão. Procurar, e saber, presenças humanas onde o fenómeno se consumou. Conhecer mulheres "usadas" sexualmente num clima de guerra; crianças, hoje adultas, frutos desses encontros amorosos; militares que partiram, e jamais voltaram, mas que esvaziaram cromossomas em vaginas completamente desprotegidas. Enfim, um conjuntos de adjectivações por enquanto sem resposta. 

Vamos erguer, isso sim, bem alto,  o tema e aceitar, em parte, a quota parte de responsabilidade que nos cabe. Só assim, e todos em uníssono, chegaremos a viabilidades plausíveis. Não podemos, tão pouco devemos, branquear um assunto deveras melindroso mas... verdadeiro. 

Força, o tempo não é para jogar a toalha ao chão mas sobretudo para trazer à ribalta os muitos "Filhos do Vento" espalhados por este mundo fora.

Um abraço,
José Saúde

2. Mensagem do editor do blogue, Luís Graça, enviado internamente a todos os amigos e camaradas da Guiné que integram a Tabanca Grande, em  20 do corrente:

Apelo que circulou hoje, internamente, pela Tabanca Grande,  também publicado como comentário ao poste P8799 (**):

Camaradas: Quantas crianças mestiças, cuja paternidade era imputada a militares, "tugas", vocês conheceram, nos anos e nos sítios por onde andaram na Guiné, entre 1959 e 1974 ?...

Em Bambadinca, Bafatá, Nova Lamego, Teixeira Pinto, Mansoa, Bolama, Bissau, Buba, Bedanda, e por aí fora... Precisam-se histórias e testemunhos... Em meio milhar de membros da Tabanca Grande, vamos arranjar material para meia dúzia de postes ?

Eu sei que o tema é delicado, devendo nós ter o cuidado de preservar/proteger a identidade de pais e crianças... Em caso algum o nosso blogue pode ser usado para fazer "investigações de paternidade"...

Um abraço. Luis Graça

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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 19 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8798: Memórias de Gabú (José Saúde) (3): reflexos de uma guerra que deixou marcas no tempo: “Filhos do vento”

(**) Vd. poste de 20 de Setembro de 2011 >  Guiné 63/74 - P8799: (In)citações (36): Filhos do vento, ontem, brancu mpelélé, hoje (Cherno Baldé)

Guiné 63/74 - P8812: Notas de leitura (276): Ultrajes na Guerra Colonial, de Leonel Olhero (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 7 de Setembro de 2011:

Queridos amigos,
Foi uma das minhas leituras de férias e confesso que me provocou um tremendo desassossego. Em conversa telefónica com o autor, não lhe escondi que estava estarrecido pela gravidade dos actos que ele imputa a Salgueiro Maia, na Guiné.
Declarou-me ter testemunhos e estar pronto a revelá-los a quem lhos solicitar. Independentemente destas declarações chocantes, há ali parágrafos indispensáveis, confissões de um náufrago mas também de uma pessoa profundamente zangada, sobretudo com os superiores, pronta e exibir a público aquilo que ele denomina o seu passado atroz e irreal.
O livro está profusamente ilustrado.

Um abraço do
Mário


Ultrajes na guerra colonial

Beja Santos

“Ultrajes na Guerra Colonial – Reminiscências de furriel de cavalaria”, por Leonel Olhero é uma edição de autor (contactos: 229 742 093, leonelolhero@gmail.com e 965 269 288), baseia-se num diário de alguém que nasceu em Aveçãozinho, Vila Real, e nesta estação de caminho-de-ferro partiu em 11 de Janeiro de 1971 para as Caldas da Rainha, daqui para Santarém, nova estação no Porto, seguindo-se embarque no Uíge, o autor irá narrar as suas deambulações num Esquadrão Panhard, essencialmente em Bula e na circunvizinhança. É uma literatura memorial por vezes cáustica, Leonel Olhero não esconde muitas zangas e azedumes, deixa-nos alguns parágrafos belíssimos e em dado momento atira uma revelação que seguramente irá aqui suscitar larga controvérsia, ao descrever um acto torcionário e um homicídio que ele atribui à figura iconográfica de Salgueiro Maia. Vamos por partes.

No princípio, temos o transmontano que se adapta a custo à engrenagem militar, há para ali muitas saudades do Marão e um somatório de bonomia: “Nas Caldas da Rainha conheci os senhores Cross, Galho, Pórtico e Paliçada, que me deram cabo da paciência. A dona G-3, de quem aprendi a não me separar. A menina Parada, de má memória, porque nela perdi pedaços da minha rica vida. O menino Pré, demasiado económico e muito forreta, um safado!, um sem vergonha”. Sentiu-se malquistado em Santarém, há ali um bom número de reparos a cavalgaduras e cretinices. Aqui estudou blindados Panhard, Daimler, Chaimite e Fox. Seguiu para Cavalaria 6 no Porto, é aqui que lhe dão guia de marcha para Cavalaria 7 em Lisboa e em 25 de Agosto ruma para a Guiné.

Torna-se num dos sargentos do Esquadrão Panhard 3432. Atravessa o Mansoa em João Landim e chega e Bula. Em Setembro é destacado para Nhamate, passam por Binar que ele classifica por estéril povoado e lá chegam a Nhamate, definido como lugar ermo e triste onde a vida era irreal e todos cediam o corpo à morte: “Em Nhamate a vida corroía-se-me lenta, o meu relógio não andava e tudo me era vago. E era assim que, naquele tédio, um homem se fazia à morte. Deslumbrantes pores-do-sol arquitectavam-nos ausências e sentenciavam-nos a penosos silêncios recônditos e melancólicos”. Descobre que a natureza estava viva, sente o empanturramento de horas preguiçosas, deslumbra-se uma trovoada tropical: “Uma trovoada, com carácter primitivo e sagrado, apavorou-nos. Receoso, o sol estremeceu de inquietação e correu a esconder-se. Numa embriaguez de luzes, relâmpagos cintilaram em ziguezagues de fogo, bateram nas trevas e apanharam relâmpagos em resposta. De alto a baixo, raios riscaram rasgando fundo os céus. Irrequietos, os trovões estalaram implacáveis vibrando de tronco em tronco e em cada folha, assustando aves e ribombando pelos caminhos do céu imenso num estampido ensurdecedor, enquanto que o vento, carregado dos cheiros da terra e do odor da selva, bradou com fúria e em rajadas hirtas e tudo impeliu numa maluca confusão”.

É numa viagem num sintex, quando foi a Bula buscar salários, que Olhero nos dá uma descrição de grande beleza, que mais realça pela contenção dos adjectivos: “Para lá das desviadas margens, num sussurro, naquele rio largo como uma promessa via-se água que penetrava na brumosa mata de onde, desafiando nos céus altas fasquias, se erguiam crescidas e seculares árvores. Por causa das investidas da nossa artilharia, com olhos cansados de procurar, vi cepos definhados com galhos despidos e rasgados. Braços vegetais abertos que nos desejariam abraçar e onde poisavam centenas de colónias de coloridos periquitos (…) Na tona da água bandos de periquitos de rabo de junco rasavam, chispavam à nossa passagem e rabiscavam hieróglifos (…) Inumeráveis abutres repugnantes e agoirentos que poisavam nos poleiros altos da sossegada e densa ramagem, alteavam-se impassíveis, estremecendo penosamente as enormes e aborrecidas asas. Alguns, mais tímidos, alavam para o escuro daquele tão intemporal bosque e ali ficavam à espera de olhos tristes e adiados”. E fiquemos com esta pálida amostra de uma linda viagem de sintex que até hoje não tinha lido, é cativante o deslumbramento do autor por tudo quando capta neste rio. Desforra-se a apanhar rolas, assim melhora o rancho, sempre tão igual na sua sopa do costume e arroz cozido com rodelas de salsicha.

E de Nhamate volta a Bula, começa o rosário de escoltas, Binar, São Vicente, Có, Teixeira Pinto ou Pelundo são algumas metas obrigatórias. De vez em quando vai a Bissau, no Pidjiquiti encontra o Zé Luís, empregado do café A Brasileira, em Vila Real. E assim chegamos a 1972. Há lá muita bebedeira em Bula, maledicência, gente quezilenta, ouvem-se flagelações, chegou a hora das perdas humanas, seguem-se férias na metrópole.

No regresso, temos o ramerrão em Bula, com colunas dentro do sector. Em Outubro, Olhero conhece Fatu Camará, chegou o momento de doces recordações eróticas. Estamos em Novembro, altura em que Salgueiro Maia terá descoberto um falso caçador que andaria à procura de o emboscar. E ele escreve como o Capitão de Abril desaferrolhou a língua do preso: “Mandou que se pusesse em cima de uma chapa de zinco, de onde saiam fios metálicos ligados ao motor de um Unimog e depois, com um ar de triunfo de galo de combate, num divertido vozeirão, disse a um seu militar: Dá à chave! Satisfeito da vida, meliante e cínico consigo próprio, o soldado cumpriu e o preto saltou! E saltou! E Saltou, cada vez mais alto. Enquanto bradava: pára, capitão! Pára, capitão! Pára, capitão! E a chave, envergonhada, girou; para alívio do preto que, a tremer e a destilar e num suor pingado ainda mostrava um terror difuso nuns olhos irados”. No início de Dezembro, há quem tenha visto um foguete luminoso, e Olhero lá vai com Salgueiro Maia e o dito preso, levam pás, picaretas e enxadas, Maia terá confidenciado a Olhero que o preso revelara saber de minas anticarro implantadas na estrada velha de São Vicente. Apanhava a frente, depois de muita confusão ou indecisão o preso afirmou ter-se enganado as minas estavam na estrada velha do cemitério e para lá foram, ali se cavou até à exaustão. Na noite escura ouviu-se o preso suplicar ao capitão para que parasse, depois a voz enfraqueceu, tornou-se um soluço, veio o silêncio. O preso fora executado.

No regresso, quando Olhero perguntou a Maia o que acontecera este terá respondido: “O tratante andou-nos a enganar a ver se caímos numa cilada. Também viu o very light. Mas teve azar e bateu com a cabeça na coronha. Agora dorme… Sempre admirei aquele divertido oficial, a quem devemos a façanha do 25 de Abril. Ele ainda vive no coração de muitos portugueses. Mas dou comigo a perguntar se não teria sido melhor ter corrido o risco de salvar um culpado, do que, impiedosamente, o ter secamente condenado”.

A vida prossegue em Bula, assim chegamos a 1973, a rotina está instalada, Olhero é remetido para Mansoa, sede do CAOP, comandado pelo coronel Rafael Durão, é tempo de novos amores, de escaramuças, corresponde a este período algumas das páginas mais enxutas deste diário, é bem visível o grau de saturação a que chegou o seu autor, há muitas questiúnculas, e em Outubro o furriel de cavalaria entrega o seu espólio na Calçada da Ajuda e parte para Vila Real. Convida todos a contactá-lo para adquirir estes ultrajes, termo polissémico que fala de desastres, desencontros, perdas, actos ignóbeis e até ofensas dificilmente perdoáveis. O autor garante que há um diário por detrás destas penas confessadas, a própria capa será o involucro de tanto ultraje.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 19 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8795: Notas de leitura (275): A Força Aérea na Guerra em África - Angola, Guiné e Moçambique, 1961 - 1974, por Luís Alves de Fraga (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P8811: Recortes de imprensa (49): Expresso das Ilhas - Morreu Aristides Pereira (1923-2011), o primeiro Presidente de Cabo Verde (Nelson Herbert)

1. Em mensagem de ontem, 22 de Setembro de 2011, o nosso tertuliano Nelson Herbert dava-nos conta da morte do primeiro Presidente da República de Cabo Verde, Aristides Pereira, notícia inserta no Expresso das Ilhas, de Cabo Verde.

2. Com a devida vénia ao Expresso da Ilhas, transcrevemos a sua notícia do dia 22 de Setembro:



Morreu Aristides Pereira, primeiro Presidente de Cabo Verde (1923-2011)

22-9-2011

Aristides Pereira morreu hoje nos Hospitais da Universidade de Coimbra, onde estava internado desde agosto na sequência de uma fratura do colo do fémur. Tinha 87 anos.
Numa primeira reação à RCV, o Governo de Cabo Verde, através da ministra da Saúde, Cristina Fontes, considerou a morte de Aristides Pereira como "uma perda maior para a nação cabo-verdiana", e garantiu o executivo está a preparar as cerimónias fúnebres do antigo Presidente, que deverão ser anunciadas nas próximas horas.

"Claro que consideramos que é uma perda maior para a nação cabo-verdiana", afirmou à Lusa, acrescentando que "o Governo de Cabo Verde inclina-se perante a memória de Aristides Maria Pereira que, desde de sempre e ao lado de Amílcar Cabral, conduziria estas ilhas à independência nacional".

Cristina Fontes Lima disse ainda que o executivo vai tomar tomar "providências" quanto às exéquias do primeiro Presidente.

"Estamos a tomar as disposições para garantir as exéquias nacionais com a dignidade que o Presidente da Republica merece e nas próximas horas anunciaremos o que vai acontecer", referiu.

Aristides Pereira tinha sido evacuado de Cabo Verde para Lisboa de avião a 03 de Agosto, a fim de ser assistido após uma queda em que terá voltado a fracturar o colo do fémur.


Biografia

O primeiro presidente cabo-verdiano começou a sua vida profissional a trabalhar como radiotelegrafista, onde chegou a chefe dos serviços de Telecomunicações, na Guiné-Bissau.
A partir dos anos 40, Aristides Pereira envolveu-se na luta pela independência de Cabo Verde. Juntamente com Amílcar Cabral, fundou o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), em 1956, assumindo o cargo de secretário-geral, em 1973.

Com a conquista da independência, em 1975, Aristides Pereira tornou-se o Presidente da república de Cabo Verde.

Aristides Maria Pereira era natural da ilha da Boavista, onde nasceu a 17 de Novembro de 1923.

(http://www.expressodasilhas.sapo.cv/pt/noticias/detail/id/27254


3. Ainda, e segundo a mesma fonte:

Morte de Aristides Pereira:
Cerimónias fúnebres oficiais marcadas para terça-feira

As cerimónias fúnebres oficiais, pela morte de Aristides Pereira, vão decorrer na próxima terça-feira, 27, confirmou hoje Cristina Fontes, em representação do Chefe do Governo. A ministra Adjunta e da Saúde acrescentou ainda que foi decretada tolerância de ponto para esse dia de derradeira homenagem ao primeiro Presidente da República de Cabo Verde.

(http://www.expressodasilhas.sapo.cv/pt/noticias/detail/id/27281)


4. Os editores deste Blogue, em nome da tertúlia, enviam ao povo e Governantes de Cabo Verde as mais sentidas condolências pelo falecimento de Aristides Pereira, o seu primeiro Presidente da República.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 22 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8806: Recortes de imprensa (48): Strela, a ameaça ao domínio dos céus do ultramar português - Revista da FAP, Mais Alto, n.º 392 , Jul / Ago 2011

Guiné 63/74 - P8810: Memórias boas da minha guerra (José Ferreira da Silva) (23): O mergulhador do Funchal

1. Em mensagem do dia 20 de Setembro de 2011, o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos esta boa memória da sua guerra.


Memórias boas da minha guerra - 23

Raul Pires - O Mergulhador do Funchal

O Raul chegou a Catió no dia 27 de Agosto. Vinha em rendição individual, para colmatar a falta do Francisco Maria Pereira Adão, conhecido por Chico do Palácio, que havia falecido no dia 01 de Agosto de 1967, durante a Op Sónia.

Logo no primeiro dia, apesar do seu aspecto humilde e de comportamento meio bajulador, ficou famoso. Como é sabido, não há tropa sem jogatina. E, pela noite dentro, há sempre um pequeno grupo mais viciado que, normalmente, se esconde a… fazer companhia ao padeiro. Pois o Funchalense de gema, conseguiu meter-se no grupo, para desgraça de todos os jogadores.

A meio da manhã seguinte, lá vinha o Raul com um rádio de pilhas novo, ao ombro, com os decibéis a meio tom, enquanto alegremente assobiava a acompanhar o ritmo da canção de sucesso:
- Mulhé grande in´cá tem cabaço, olé lé lá! Bajuda na tem dimais!

Na parada, era evidente o ambiente de crava, entre os fumadores. E o Matosinhos não se conformava:
- “Puta que pariu”, como é que o gajo nos limpou a todos?

- Que nos fodeu, fodeu bem, porque nem demos por ela. - dizia o Monteiro de Paredes.

- Foi limpinho! E agora, que vamos fazer? - perguntava o Mafamude.

- Estamos tesos, não temos tabaco e ainda faltam uns dias para o pré.

E concluiu:
- Acabámos por ter muita sorte porque se mais tivéssemos mais dinheiro perdíamos.

Vista parcial da marginal do Funchal
Foto de Carlos Vinhal

Íamos fazer um pequeno patrulhamento, a nível de Pelotão. Formados na parada, verificámos que o Raul não estava. Foram procurá-lo e deram com ele na cama. Saímos na direcção de Príame e esperámos fora do Quartel, para que o Capitão não descobrisse que ainda estávamos ali. Passados uns bons minutos, surge o madeirense, preparado para fazer o seu primeiro serviço na guerra. De lenço colorido (lembrança de uma das dançarinas do Rancho Folclórico da Camacha) amarrado na cabeça, tipo pirata das Caraíbas, arma G3 atravessada na nuca para apoio dos braços e com sapatilhas de ginástica. Vinha calmamente e a assobiar.

Inicialmente, foi gargalhada geral. Porém, logo de seguida, os outros encarregaram-se de o alertar para vários perigos.

E eu, que vou fazer a este gajo? - Pensei.

Como era a primeira vez, deixei-o ir de sapatilhas, para que sentisse as consequências. Lembro-me de o ver descalço e a coxear, quando regressávamos.

Além de ter sido expulso por indesejado no grupo da jogatina (sem outra justificação que não a de limpar tudo), o Raul era acusado de aproveitar-se dos mais distraídos para lhes desviar alguns haveres.
É que ele até as botas deixava enterradas na bolanha e, consequentemente, tinha que repor… o stock. Também não se acanhava nada em deixar cair ao rio, as granadas de morteiro 60 ou de bazuca, que gostava de exibir à saída do quartel.

Era, realmente, um indivíduo fora do habitual e, aparentemente, de pouca confiança. A malta não lhe ligava muito e, até, se afastava dele.
Obrigava-nos a muita atenção, embora o seu relacionamento fosse bastante divertido.

Eu, gostava de o ouvir mas não podia dar-lhe “corda” porque ele ultrapassava as conveniências. Todavia, atendia-o com toda a atenção e, devido a isso, dizia gostar de mim. Fiquei a saber que ele era praticamente analfabeto, mas sabia falar algum inglês, francês e alemão. Não tinha profissão. Vivia do jogo e dos mergulhos no cais do Funchal a apanhar moedas lançadas pelos turistas. Eu não acreditava mas tive a oportunidade de verificar a sua destreza e não só nesse aspecto.

A primeira situação foi durante a montagem de segurança a uma das colunas de abastecimento a Cufar. Ao aproximar-me de um posto/abrigo verifiquei que estavam três militares (“Felgueiras”, Joaquim “Faquista” e Raul) em vez de dois, porque o madeirense se tinha deslocado para lá.

- Que é isto? Três gajos aqui? Só falta um para se poder jogar às cartas. – Chamei a atenção.

Então, o Raul levou a mão direita ao bolso de trás e, de imediato, em dois segundos, abriu o baralho, misturou as cartas e começou a distribui-las - 10 a cada um. Nunca tinha visto uma coisa assim. Dava as 10 cartas sem nos apercebermos de as ter contado. Ninguém conseguia acompanhar tal rapidez.

A outra oportunidade, verifiquei-a quando estivemos em Bolama durante uns dias, após a Op Quebra Vento para construção do novo quartel de Gubia, na península de Empada. Havia uma piscina, onde passávamos a maior parte do tempo livre. Desafiado a ir buscar moedas ao fundo, concordou plenamente. Virava-se de costas para a piscina enquanto mandávamos uma moeda para qualquer canto ou para o meio da piscina. Ele mergulhava e verificava toda a piscina até a encontrar, sem vir respirar à superfície.

Era muito gabarola. Antes das Operações até dizia que iria apanhar aos turras um Morteiro 82 mas, depois, era um problema com ele porque lhe custava aguentar disciplinadamente horas e horas, em situação de combate iminente (e sem fumar!).

Já tinha tentado enganar-nos com “indisposições” na hora de sairmos para as Operações. Como lhe correu bem da primeira vez, pensou que podia repetir a habilidade. Um dia, antes de sairmos para uma Operação perigosa, fui informado de que o Raul estava deitado no chão da parada, caído de bêbado. Não era pela falta que ele fazia, mas não podíamos tolerar esse comportamento. Pedi ao Furriel Enfermeiro “Berguinhas” para lhe aplicar a dose necessária, para o “acordar”. Após a injecção de Coramina não levou muito tempo a mexer-se e a coçar violentamente os dedos dos pés, das mãos e o nariz, enquanto gritava repetidamente:

- “Ai maezenha, maeiiizeeenha, que não aguento tanta formiguenha, tanta formiguenha”.

E, apercebendo-se de que eu estava por perto, intervalava, com:

- Chamem o meo paezenho. Acuda-me, furriel Seilva. Você é o meo paezenho.

HM 241 de Bissau

Foi ferido no dia 19 de Abril de 1968, num dos 51 + 1 ataques sofridos na Op “Bola de Fogo”, em Gandembel, no Corredor do Guileje. (O último ataque que refiro não teve lugar em Gandembel, porque foi uma emboscada montada à LDG que nos transportava, de regresso a Catió). Pois o Raul, logo que se pôde mexer, foi pelos corredores do Hospital de Bissau, carregando o material do soro que tinha instalado ao pé da cama, procurar o Capitão, que tinha sido evacuado dois dias antes, também ferido em Gandembel.

- Meo Capitãzenho, tambã me federam. Inda lá vamos voltar para resolvaer aquelo. Ningã veance a nossa Companhaea!

Surpreendido e alarmado, o Capitão, diz-lhe:
-Ó homem, você vem para aqui com essa tralha toda a segurar-lhe o tubo e a bolsa do soro? Só não trouxe a cama.

- Tem razã meo Capitã, éo já desse ó meo dôtôr que era melhour meter o souro num garrafã , mesturado com veinho teinto.

Silva da Cart 1689

Nota: O texto acima será melhor entendido pelo leitor se for esclarecido que comandei o Pelotão durante grandes períodos de tempo, devido a ausência do alferes.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 18 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8792: Memórias boas da minha guerra (José Ferreira da Silva) (22): Queimados

Guiné 63/74 - P8809: Tabanca Grande (302): Abram alas, camaradas, temos aqui mais um velhinho, o Alcídio Marinho, do Porto, Miragaia, ex-Fur Mil, CCAÇ 412 (Bafatá, 1963/65)

1. Em 4 de Junho de 2011, por ocasião do nosso VI Encontro Nacional, tive o grato prazer de conhecer mais um camarada da zona leste da Guiné, o Alcídio Marinho, ex-Fur Mil da CCAÇ 412 (Bafatá, 1963/65).


Acompanhado da sua esposa, Rosa, empunhava, com garbo, orgulho e valentia, o estandarte da sua companhia. O Alcídio vive no Porto, em Miragaia, ou seja, numa das mais velhas freguesias da cidade que é hoje Património Mundial da Humanidade, integrando o primitivo núcleo medieval, delimitada, no século XIV, pelas famosas muralhas fernandinas.

O Alcídio vinha já munido da "papelada" necessária para ingressar na Tabanca Grande (neste caso, as duas fotos da praxe e o seu currículo militar abreviado). O seu pedido foi imediatamente aceite por mim, uma vez feito o teste de conhecimentos sobre os direitos e deveres dos membros do blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Devo dizer que ele passou com distinção. (*)

Na conversa que tive com ele fiquei a saber que a CCAÇ 412, sediada em Bafatá, tinha uma vasta zona de acção, que ia de Cantacunda ao Enxalé, a norte do Rio Geba, e de Bambadinca ao Xitole, ao longo da margem direita do Rio Corubal (aquilo que mais tarde, seis anos depois, no meu tempo, era já "preenchido" por 2 batalhões, um em Bafatá e outro em Bambadinca, ou seja, por mais de 2 mil homens em armas, incluindo subunidades adidas e pelotões de milícia).

2. Por distração minha (de que peço mil e um perdões, ao próprio e aos demais camaradas), só hoje dou a boa notícia ao resto da Tabanca Grande, anunciando em voz:

- Camaradas, abram alas, arranjem um lugar para mais um digno representante da velhice da Guiné, deem-lhe as boas vindas!... (Velhice aqui não tem nada a ver com a idade fisiológica, mas com a antiguidade de guerra: o Alcides está em boa forma, como se pode ver nas fotos de Monte Real).

Sob o nº 520, o Alcídio Marinho vai ficar aqui, sentado no bentém, debaixo do mágico, secular, frondoso, generoso e protetor poilão da nossa Tabanca Grande e vai connosco partilhar as suas memórias desses idos e bravos tempos de 1963/65... Palavra de camarada! (LG).



Monte Real > Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca Grande > O Alcídio Marinho (Porto, Miragaia), o porta-estandarte da CCAÇ 412 (Bafatá, 1963/65).


Foto: © Manuel Resende (2011) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.




Monte Real > Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca Grande > A Rosa Marinho (Porto, Miragaia), empunhando com elegância, firmeza e determinação o estandarte dos Capacetes Verdes (réplica do original).


Foto: © Luís Graça (2011) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.

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quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Guiné 63/74 – P8808: Memórias de Gabú (José Saúde) (4): Recordando o benjamim da companhia: Alberto, um puto que irradiava simpatia!




1.   O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabú) - 1973/74, enviou-nos a 4ª mensagem desta sua série e duas fotos do seu álbum de memórias.

RECORDANDO O BENJAMIM DA COMPANHIA EM GABÚ.
ALBERTO, UM PUTO QUE IRRADIAVA SIMPATIA!

Descalço, melhor, usando quotidianamente o natural par de sapatos com os quais a sua mãe o colocou no Mundo, Alberto, o benjamim da minha companhia, era um puto deveras simpático. Movimentava-se com à vontade pelas instalações do aquartelamento, comia e bebia com a malta, sendo que à tarde regressava à tabanca. Foram longos meses curtindo, com ele, pedaços de uma vida repleta de pequenas histórias sempre inesquecíveis.

Gostava do Alberto! Confesso que com ele aprendi também a conhecer parte da realidade de um povo submisso ao conteúdo de uma guerrilha que não dava tréguas. A distância do tempo leva-me a não precisar ao certo a sua real idade. Deduzo que, na altura, o puto tivesse 7 ou 8 anos. A sua linguagem, fértil em diálogos permanentes com a rapaziada da metrópole, levava o Alberto a citar a língua de Camões com alguma facilidade. No campo das recordações revejo o momento em que pela primeira vez travei um pequeno diálogo com o Alberto, ficando então surpreendido pela desenvoltura como o rapaz dominava a flexibilidade da prosa lusíada. O miúdo, entrosado na sua sensibilidade, tinha, na verdade, conversas interessantes. Parecia um homem. Conhecia, também, os postos que a rapaziada ostentava.

O Alberto era um puto “desenrascado”. Não lhe olhassem à idade. O português, fluidamente travado com a nossa tropa, dava-lhe estatuto. Creio que não havia ninguém que dele não gostasse. Entrava no gabinete do comandante de Batalhão como na mais singela caserna do invulgar soldado desconhecido. Visitava-me, amiúde, no quarto por mim partilhado, pelo Rui, também ranger, pelo outro Rui, um rapaz de Coimbra, pelo Santos e pelo Fernandes. O Alberto era sempre uma cordial companhia que muito nos agradava. E tantas foram as vezes que o puto me fez parceria em pequenos passeios pelas instalações do quartel!

Hoje guardo, religiosamente, uma foto com o benjamim Alberto que evidencia a nossa amizade conquistada ao longo da minha estadia em Gabú. Passados tantos anos, 38, talvez, fica a razão da minha oportuna interrogação: Que será feito do agora senhor Alberto?

O Alberto, companheiro e amigo
No fundo de um buraco já enorme, eu e o Fur Mil Santos preparando mais um rebentamento de material explosivo existente no paiol 
O derradeiro adeus a Nova Lamego. Eu e o Fur Mil Santos no momento de deixarmos as nossas instalações

Um abraço,
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523

Fotos: © José Saúde (2011). Direitos reservados.
Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. primeiros postes desta série em:

13 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 – P8772: Memórias de Gabú (José Saúde) (1): No declinar da nossa presença em terras guineenses… A despedida!

 

18 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 – P8788: Memórias de Gabú (José Saúde) (2): Os conflitos tribais e a acção da tropa portuguesa. A “Psicó”!

 

19 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8798: Memórias de Gabú (José Saúde) (3): reflexos de uma guerra que deixou marcas no tempo: “Filhos do vento” 

Guiné 63/74 - P8807: Um apontamento sobre a CCAÇ 4544/73 em Cafal Balanta (António Agreira)

1. Mensagem do nosso camarada António Agreira* (ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 4544/73, Cafal, 1973/74), com data de 19 de Setembro de 2011:

Amigo Carlos Vinhal!
Em primeiro lugar forte abraço extensivo a todos os camarada e amigos da tabanca grande.
No decorrer do fim de semana (caseiro) dei por mim a remexer no baú das memórias, e lá apareceram algumas fotografias, das quais destaco duas que gostava de partilhar com todos os camaradas.

Para além de relatarem a forma como foram passados alguns momentos em Cafal, dão testemunho da fraternidade e união com que vivemos durante esse tempo.

Este homens que fazem parte destas fotos eram de Transmissões e Enfermeiros, todos os dias faziam patrulhamentos na mata do Cantanhez, com excepção de dois que eram Operadores Cripto.
Sendo patrulhas de rotina eram sempre motivo de conversa nestas reuniões, que como é evidente não ocorriam todos os dias.

Diariamente se fazia a picagem da estrada ao longo da bolanha até Cafine, mesmo que não ocorresse qualquer ida a Cufar ou Catió, cuja deslocação era sempre feita em barcos semi-rígidos pelo rio Combijã, no mínimo duas embarcações.

Voltando às fotos, o local destes convívios era sempre a tabanca das Transmissões, não era uma tabanca diferente das outras, a única coisa que tinha de diferente era o posto de rádio que se situava num abrigo localizado nas traseiras da tabanca, 7 ou 8 metros de profundidade, diga-se de passagem muito seguro.

Era no posto de rádio que se sabiam as noticias do exterior, e até dos familiares. Era o local que nos ligava ao Mundo e onde organizávamos a nossa defesa quando éramos atacados pelo PAIGC. Era também de lá que apoiávamos os camaradas das outras Companhias, pelo menos nos ataques com armas pesadas, em que utilizávamos o sistema de cruzamento de linhas para detectar as coordenadas dos pontos de saídas do fogo. Estas informações eram enviadas via rádio para: Jemberem, Bedanda, Catió e Bissau (BA 12).

Por hoje é tudo. Despeço me com amizade e gratidão pela atenção dispensada.
Se entretanto entenderes que este desabafo merece ser publicado, estás a vontade. Em anexo seguem as fotos da rapaziada.

Cumprimentos
António Agreira

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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 2 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8726: Os últimos dias da CCAÇ 4544/73 em Cafal Balanta (António Agreira)

Guiné 63/74 - P8806: Recortes de imprensa (48): Strela, a ameaça ao domínio dos céus do ultramar português - Revista da FAP, Mais Alto, n.º 392 , Jul / Ago 2011

1. Primeira parte de um trabalho intitulado "Strela, A ameaça ao domínio dos céus no ultramar português", publicado no número 392 da Revista Mais Alto da Força Aérea Portuguesa de JUL/AGO 2011.

Dedicamos este poste ao nosso camarada Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, 1972/74, actualmente Coronel na situação de Reforma e à sua esposa Giselda, uma das nossas queridas Enfermeiras Pára-quedistas, também ela 'strelada' nos céus da Guiné.

Honra e glória para os nossos valorosos pilotos da FAP que foram vítimas mortais das armas do IN e de todo o tipo de acidentes, e que não tiveram a sorte dos nossos camaradas Giselda e Miguel.

A publicação deste artigo tem a devida autorização dos responsáveis pela referida Revista, a quem desde já apresentamos os nossos cumprimentos e o reconhecimento pela deferência com que fomos tratados.
Deixamos aqui estas 3 mensagens trocadas a propósito:

i) Mensagem enviada pelo nosso Blogue em 13 de Setembro à Revista Mais Alto:

Exmos. Senhores
Na qualidade de co-editor do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/), venho junto de V.Exas. solicitar autorização para publicar no nosso Blogue a digitalização das páginas 31 a 42 da vossa Revista Mais Alto, número 392 de JUL/AGO 2011, referente ao Dossier Ultramar - "Strela, a ameaça ao domínio dos céus no ultramar português".

Este dossier foi-nos dado a conhecer pelo senhor Coronel Pilav Miguel Pessoa, nosso tertuliano, a quem quereríamos dedicar uma série, publicando as referidas digitalizações. Foi nos céus da Guiné que o então Tenente Pilav Miguel Pessoa foi derrubado por um míssil Strela.

Esperando de V. Exas. a melhor atenção para o nosso pedido, e deixando convite para nos visitarem, me subscrevo antecipadamente grato.
Carlos Vinhal


ii) Mensagem do Senhor Chefe de Redacção da Revista Mais Alto,  de 15 de Setembro de 2011:

Exmo. Sr.
Carlos Vinhal
Muito obrigado pelo seu contacto.
Solicitava o tempo necessário para que o vosso pedido seja autorizado pelo Director da Revista Mais Alto, Sr. Tenente-General Luís Palma de Figueiredo.
Em caso afirmativo enviar-lhe-ia a primeira parte do artigo em PDF (segue-se a II e última parte na próxima edição da revista de SET/OUT) de forma já editável no vosso Blogue.
Não gostaria também de deixar de assinalar o notável trabalho de recolha e divulgação que tem sido efectuado pelo blogue, um contributo de grande relevo para nossa História no período a que se dedica.

Com os melhores cumprimentos,
Nuno Esteves da Silva 


iii) Mensagem do Senhor Chefe de Redacção da Revista Mais Alto,  com data de 20 de Setembro:

Exmo. Sr.
Carlos Vinhal
Junto temos o prazer de enviar o artigo - Strela - I Parte em formato pdf.

Solicitamos apenas que seja referida a origem do artigo: Força Aérea Portuguesa - Revista Mais Alto, Nº 392 JUL/AGO 2011.

Com os melhores cumprimentos,
Nuno Esteves da Silva


DOSSIER ULTRAMAR
STRELA, A AMEAÇA AO DOMÍNIO DOS CÉUS NO ULTRAMAR PORTUGUÊS

Cortesia de Revista da FAP,  Mais Alto,  n.º 392 / JUL/AGO 2011

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Notas de CV:

Vd. ainda os postes de:

17 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1668: In Memoriam do piloto aviador Baltazar da Silva e de outros portugueses com asas de pássaro (António da Graça Abreu / Luís Graça)

19 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1675: 28 de Março e 5 de Abril de 1973: cinco aeronaves da FAP abatidas pelos toscos mísseis terra-ar SAM-7 Strella (Victor Barata)

21 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1867: Força Aérea Portuguesa: Seis Fiat G.91 abatidos pelo PAIGC entre 1968 e 1974 (Arnaldo Sousa)

31 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3825: FAP (2): Em cerca de 60 Strellas disparados houve 5 baixas (António Martins de Matos)

4 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3839: FAP (4): Drama, humor e... propaganda sob os céus de Tombali (Miguel Pessoa, Cor Pilav Ref)

9 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3859: FAP (6): A introdução do míssil russo SAM-7 Strela no CTIG ( J. Pinto Ferreira / Miguel Pessoa)

19 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4051: FAP (18): Kurika da Mata (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)

28 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4088: FAP (20): Efemérides: 36 anos após a morte do Ten Cor Pilav Almeida Brito, abatido por um Strela em Madina do Boé (Miguel Pessoa)

19 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4217: FAP (24): Afinal quem foi o camarada artilheiro do PAIGC que me 'strelou' em 25 de Março de 1973 ? Caba Fati ? (Miguel Pessoa)

28 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4258: FAP (27): Miguel, já não poderás apertar a mão ao homem do Strela que te quis matar... O Caba Fati morreu em 1998 (Luís Graça)

Vd. último poste da série de 7 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8746: Recortes de imprensa (47): Correio dos Açores: A notícia da morte do Fernando de Sousa Henriques (1949-2011) (Carlos Cordeiro)

Guiné 63/74 - P8805: Agenda Cultural (156): Exibição do filme Quem vai à Guerra, de Marta Pessoa, dia 30 de Setembro de 2011 no Centro Cultural da Malaposta, Olival Basto

1. Os nossos camaradas Giselda e Miguel Pessoa, em mensagem do dia 19 de Setembro de 2011, deram-nos conta da exibição do Filme de Marta Pessoa, "Quem vai à Guerra", no Centro Cultural da Malaposta, Rua de Angola, Olival Basto, no próximo dia 30 de Setembro pelas 21h30.

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Notas de CV:

Vd. último poste dedicado ao filme de 22 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8460: As mulheres que, afinal, foram à guerra (17): Público, Cinecartaz: Críticas dos leitores

Vd. último poste da série de 21 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8803: Agenda Cultural (155): Lançamento do livro Sopros de Vida, de José Lemos Vale, dia 24 de Setembro de 2011 na Livraria LeYa em Coimbra

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Guiné 63/74 - P8804: Convívios (375): XVIII Encontro da CCAÇ 727, dia 8 de Outubro de 2011, no RI 3 de Beja

1. Mensagem do nosso camarada Miguel Velez de Oliveira, com data de 16 de Setembro de 2011, dando conta do Convívio da CCAÇ 727 (Guiné, 1964/66):

Boa noite Caro Camarada e Amigo Vinhal
Mais um Ano mais um Convívio.
Este Ano no RI-3 em Beja, onde grande parte dos "Caçadores" tiveram o primeiro contacto com a Instrução.

Meu Caro Vinhal, peço-lhe que divulgue no V/Grande Blog o Encontro/Convívio da CCAÇ 727, uma das Companhias que, talvez terão tido, mais baixas.

Em nome dos Elementos da Organização, um Grande Obrigado.


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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 15 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8782: Convívios (368): Encontro do pessoal da CCAÇ 3461 do BCAÇ 3863 vai acontecer no próximo dia 17 de Setembro de 2011, em Coimbra (José Romão)

Guiné 63/74 - P8803: Agenda Cultural (155): Lançamento do livro Sopros de Vida, de José Lemos Vale, dia 24 de Setembro de 2011 na Livraria LeYa em Coimbra

Caros Amigos,
Realizando-se no próximo sábado dia 24, pelas 16H30, na Livraria LeYa_Coimbra Editora, Rua Ferreira Borges 79 em Coimbra o lançamento do meu livro Sopros de Vida, muito me honrariam com a v/presença neste evento de apresentação pública do citado livro, que é a 1ª homenagem de carácter público aos abnegados e humanitários Enfermeiros Militares que apoiaram os grupos de Combate na Guerra do Ultramar.

Numa segunda parte, enalteço e homanageio as Valorosas Mulheres que constituiram o Corpo de Enfermeiras Paraquedistas da Força Aérea Portuguesa,onde foram inexcedíveis em abnegação,coragem, espírito de Corpo e Sentido de Missão, atributos só reconhecidos pelos combatentes feridos e por elas assistidos nas frentes de combate com desvelo e carinho, dons que só os seres humanos bons conseguem partilhar com quem sofre as avdversidades da vida.especialmente em ambiente de guerra.. O Estado Português teima em não as homenagear publicamente. Espero que este livro possa colmatar esse inaceitável apagão aos excelentes serviços e à memória destas duas classes Enfermeiros da Guerra doUltramar.

Grato pela v/ presença, creiam-me com amizade
José Lemos Vale


C O N V I T E

Com a devida vénia a CELIVRARIAS
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Notas de CV:

Vd. notícia ainda em http://ultramar.terraweb.biz/06livros_JoseLemosVale_GuerraColonial_SoprosdeVida.htm

Vd. último poste da série de 19 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8794: Agenda Cultural (154): Exposição de fotos e lançamento do Livro Na Kontra Ka Kontra de autoria do nosso camarada Fernando Gouveia, ocorridos no dia 13 de Setembro de 2011, na Casa da Cultura Mestre José Rodrigues, em Alfândega da Fé

Guiné 63/74 - P8802: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (15): O Exército colonial português - do cofió, do bivaque e do caqui ao visual da boina e camuflado: Guerra e Paz(maceira)


Caldas da Rainha > "15/7/41. A despedida das tropas expedicionárias de Cabo Verde. R.I. 5, Caldas da Rainha. Luís Henriques [1º Cabo Inf)




Cabo Verde >S. Vicente > Mindelo > "23/7/1941. Chegada ao 1º Batalhão Expedicionário do R.I. nº 5 a São Vicente, Cabo Verde. Na fotografia estou eu com alguns camaradas da minha companhia. No porto do Mindelo fomos entusiasticamente recebidos. Luís Henriques". [Partida a 15 (?) ou talvez 16 de Julho de 1941, do Cais da Rocha Conde de Óbidos, Lisboa].


 Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Parada do [1º]  Batalhão expedicionário do R. I. nº 5. Lazareto, 1/12/41. S. Vicente, Cabo Verde. Ao fundo a linda baía com o seu belo porto de mar. Luís Henriques"


Fotos (e legendas): © Luís Henriques / Luís Graça  (2010). Todos os direitos reservados

 


1. Mensagem, de 19 do corrente, do nosso amigo e camarada António Rosinha [, Fur Mil, em Angola, aqui em 1961, em Luanda, o primeiro da direita]:


Amigos editores, penso que tem cabimento, fica ao vosso critério um poste ou não (*).

Na RTP África, em entrevista recente dizia o presidente de Caboverde Pedro Pires que a história das guerras é sempre contada pelo lado dos vencedores.


Mas creio que no nosso caso aqui, essa afirmação não é verdadeira, porque neste blogue contamos a história de uma guerra que não ganhámos.


Ou ganhámos?  E se perdemos, perdemos o quê?   E a perda foi total? Ou apenas parcial?


Será que Portugal alguma vez chegou a investir numas forças militares para ganhar pelas armas fosse o que fosse?  
Claro que o tipo de guerra que viria a surgir em 1961, e aqui rememoramos, não era com armas que se ganhava. Será que era por isso que não se investia em armamento? Será porque era assim que Salazar pensava, e já tinha reduzido ao mínimo as armas e os homens na Índia, quando o Neru invadiu o Estado Portugês da India?

A pasmaceira dos quartéis coloniais, interrompida em 1961, em Angola, onde se iniciaram os conflitos armados pró-independência, datava provavelmente desde 1918 quando terminou a I guerra mundial. Foram 43 anos de paz(maceira).


Os oficiais e sargentos e praças do quadro, que povoavam os quartéis coloniais, funcionavam tal qual como o armamento ultrapassadíssimo daquele tempo, serviam apenas para dar instrução, desfilar nos juramentos de bandeira, e prestar serviço de rotina de um quartel em paz. Mas não pensavam nem eram mentalizados para qualquer guerra, apenas estavam estruturados para terminar a comissão no ultramar sem complicações, o que lhe proporcionaria alguma promoção ou um algum necessário louvor, no regresso à metrópole.


Quanto aos milicianos e praças anualmente incorporados obrigatoriamente, cumpriam com os programas por obrigação.


A Infantaria, e artilharia eram as armas que se podiam encontrar distribuidas pelas capitais de distrito em Angola nos anos 50 e apenas em 1959 foi criado um esquadrão de cavalaria ( penso que era esquadrão).


A Força Aérea e Marinha eram reduzidas certamente, pois que pouco se notava a suas presenças no ambiente luandense e muito menos no interior, o que é mais dificil de ajuizar sobre o que pouco se via.


Quem demonstrava muito entusiasmo pelo serviço militar, eram os soldados indígenas, Soldados I, que assimilavam com enorme rapidez a instrução militar e o ensino nas aulas regimentais. Era uma enorme desilusão para eles quando terminavam o tempo militar e tinham que regressar às famílias de mãos a abanar, e já inadaptados à vida da tribo.


Os quartéis de infantaria coloniais viviam numa rotina sonolenta, embora se falasse que em Moçambique havia uma "cultura" mais refinada, com hábitos de guiar à esquerda a imitar os vizinhos, mas parece que o mimetismo seria apenas no volante em contramão. Nas Ilhas crioulas e Guiné seria tudo militarmente bem reduzido.


Às vezes havia um certo ambiente marcial nesses quartéis, (em Angola),  quando alguém fazia ouvir na parada discos com as marchas militares clássicas americanas. De resto era um arrastar de pés pelas paradas tão cansativo que provocava uma sede tropical enorme que só um abastecimento regular de barris de cerveja nas messes de oficiais e sargentos e cantinas, resolvia a situação.


Mesmo em tempos de paz, a tropa em África já tinha o hábito de não morrer à sede.


Parece pessimismo olhar assim para os militares, mas ninguém pode desmentir que os comandantes exigiam muito pouco, nem ao governo exigiam modernização nem aos oficiais e sargentos se exigia um rigor verdadeiro, como por exemplo ensinar a fazer fogo com as armas de cada especialidade.


Por exemplo, num curso de sargentos milicianos de armas pesadas de infantaria, com especialidade de metralhadora pesada, morteiro 81 e canhão anticarro, podia acontecer um aluno nunca ter dado um único tiro com qualquer uma dessas armas, e terminar com boa nota no fim do curso, (sem cunhas).


Na primeira manifestação nacionalista anti-colonial morreu um 1º cabo fardado de caqui, e provavelmente, digo eu, e talvez não seja exagero, sem bala na câmara, se é que tinha alguma arma na mão. Foi a 4 de Fevereiro de 1961 no ataque do MPLA (?) à casa de Reclusão em Luanda.


Nesse tempo o serviço de guarda`aos palácios do governo, ou às prisões eram feitas por uma secção: Um velho sargento barrigudo ou um novato cabo miliciano, branco ou mestiço ou mesmo preto, e um 1º cabo da mesmas cores, e 9 soldados invariavelmente (I) indígenas. Todos de caqui. Calças com polainitos, capacete de cortiça para o sargento ao palácio e cofió para os soldados I (Na casa de Reclusão era com capacete de aço, para todos).


Os soldados de sentinela usavam Mauser a tiracolo ou encostada à parede, e um pente com 5 balas dentro de um saquinho de plástico fechado e inviolável, sujeito a punição se o saco fosse violado sem justificação. Nas guaritas havia sempre dois tijolos que tanto serviam de banco para sentar como de travesseiro para dormir.


O Comandante de secção usava uma FBP a tiracolo ou no armário, que só dava tiro real já no final dos cursos de sargentos, pelo que era mais o tempo que passava com o cano cheio de massa consistente. 
 

Mais tarde, na segunda manifestação anticolonial e tribalista, morre o primeiro alferes do exército colonial, quando nos massacres do 15 de Março (FNLA), o Alferes Flores fazia uma patrulha repetidíssima numa rotina semanal de transporte de correio entre Noqui e São Salvador. Nem a PIDE se informava nem informava, nem os comandantes das companhias se preocupavam muito, pois o destino se encarregaria de os informar.

A farda do exército colonial continuava de côr caqui, quando há 50 anos (1961) foi substituida por um vistoso camuflado.


Talvez por causa da manufatura morosa dessas fardas, é que teria demorado a chegar a Luanda o primeiro navio com um grande contingente de caçadores especiais fardados com camuflados. Seria a falta de fardas ou de estratégias a causa da demora?


Já havia muitas malas feitas para dar às de vila diogo, em Luanda e não só, quando Salazar reagiu aos massacres terroristas de 15 de Março (FNLA) enviando o 1º de muitos contingentes militares.


Será que foi o ditador o inspirador do alfaiate militar?
(É que hoje já há tanta escrita sobre o homem que já se escreve que mandava em tudo, talvez ele entendesse mesmo de moda e fosse dele a ideia do camuflado. É que teve impacto psicológico positivo, naqueles que já pensavam dar corda aos sapatos.)

Não se sabe se os turras ficaram impressionados com o visual, mas ficaram e bem, impressionadas as garotas de Luanda.
Já tinha sido em Fevereiro o ataque à casa de Reclusão e o navio chegou apenas a 1 de Maio.

Mais um pouco de demora na chegada do 1º contingente, e a impaciência tomava conta da multidão e já não seria preciso "fazer qualquer guerra" nem de caqui nem de camuflado, pelo menos em Angola. Pois não haveria "brancos" a quem guardar as costas, o que era para alguns capitães do quadro, o motivo daquela mobilização "guardar os brancos" contra a revolta dos pretos, que os brancos maltratavam, e por isso eles se revoltaram.


Claro que alguns brancos, tão ignorantes como alguns desses capitães, diziam a esses capitães que matassem os pretos todos para resolver o problema.


E já na Guiné e Moçambique havia bordoada da grossa, quando se dá a 3ª manifestação anticolonial em Angola (UNITA), em que torna a haver uma morte de europeu, só que desta vez não era militar. Será que foi o camuflado que ajudou?


E não morreu nenhum militar,  porquê?  Simplesmente era noite de festa de Natal de 1966, e estava tudo acordado e bem desperto dentro do quartel, e os "turras" de Savimbi, desorganizados, é que foram surpreendidos por esse facto.


E apenas houve um único europeu surpreendido, foi um civil noctívago, que regressava a casa vindo de uma visita feminina. 
Esse civil era simplesmente o inspector da PIDE em serviço naquela vila de fronteira de Teixeira de Souza, que pelos vistos andava mal infornado.

É que não era só falta de rigor e disciplina no desempenho da tropa, tudo o que era autoridade e Estado, estava completamente enferrujado e desligado da realidade, tropicalmente acomodado.


Para a classe da função pública, que em maioria era afro-luso caboverdeana-angolana-guineense-sãotomense-macaense e goesa, que em princípio sonhavam com uma autonomia e não escondiam essa pretensão, essa pasmaceira, que podemos dizer que era promovida ou apreciada por Salazar, nem era nada desagradável usufrui-la, antes pelo contrário, era uma vida a côres comparado com o preto e branco de Portugal e Ilhas.


Acho que essa modorra tropicalíssima, reinante nas colónias, tambem se poderia considerar um sistema político, como tudo.


Não quero agora falar na qualidade de vida que aqueles ambientes coloniais e tropicais proporcionavam, se compararmos com o nosso retângulo metropolitano e ilhas adjacentes. Imaginemos apenas que não havia fome nem pedintes, e já havia certos conhecimentos de tratamento de doenças tropicais.


Sem falar na vantagem de não haver tantas gravatas, o que tornava tudo mais desafogado, e não só no colarinho.


Falamos nos tempos em que já tudo tinha esquecido a guerra mundial, porque antes tambem terá sido complicado.
Neste caso, podemos dizer que era política de Salazar, pois era ele que tudo mandava.

Visto hoje, 50 anos depois do início das independências dos países africanos com demaracação de fronteiras definidas em Berlim, portanto da inteira responsabilidade da europa, não podemos dissociar a história das ex-colónias portuguesas, hoje 5 paises, da história de toda a África colonizada, que vai de Marrocos à Cidade do Cabo.


Mas a maior diferença entre a independência destes nossos 5 irmãos lusófonos, e outros paises africanos, não foi só Portugal ter fardado um exército para impedir que os vários movimentos tomassem nas mãos a independência daquelas fronteiras, mas sim o facto de terem sido os movimentos cujos elementos eram os mais ligados a Portugal, " africanos mais aportuguesados", e os auto-intitulados brancos de 2ª  que, ou venceram os outros movimentos ou até nem permitiram que outros movimentos se formassem, que içaram a respectiva bandeira nacional.


O que noutros paises africanos, embora muitos tenha sido o colonizador a "ajudar" a promover os futuros governantes, poucos destes dirigentes estariam desligados do ambiente tribal como o caso daqueles que tomaram o poder nos 5 paises lusófonos.


Que foi o caso mais genuíno desta afirmação a Guiné, com o PAIGC com Amilcar, e o irmão Luis Cabral e muitos outros elementos. 
Mas também como a formação do MPLA e FRELIMO em que a maioria já não nasceu em palhota de tabanca, mas sim na "praça".

O que parecia algo impossível aos ouvidos
. Era difícil acreditar que coordenassem aquele emaranhado de tribos, pelo que muita gente se opôs a "entregar" e "entregar-se" a esses movimentos vencedores de uma luta que não foi apenas dos 13 anos da guerra que a política de Salazar nos obrigou a enfrentar, mas que está muito para lá desses 13 anos.

Muita ilusão tinham esses movimentos, sobre o futuro que os esperava, pois aquilo que parecia naquele período colonial de uma certa prosperidade e abundância e até uma paz social e tribal, ia transformar-se num pesadelo igual ao que outros paises já tinham sofrido e que ainda se vai manifestando aqui e alí.


Mas provavelmente se hoje aqueles 5 países, mantêm as suas bandeiras nacionais e as suas fronteiras intactas conforme as "herdaram" desde 1880 e tal, certamente foi graças a esses movimentos "destribalizados", o que seria muito difícil aos outros movimentos e facções que havia, terem sucesso por falta de gente idónea.


Mas se Portugal (Salazar) tivesse entregue às Nações Unidas (EUA e URSS) em 1961 o destino daqueles territórios como muitos "inteligentes" anti-salazaristas ainda hoje defendem, aquelas fronteiras iam ser todas pulverizadas ou iam ser re-colonizadas fora da lusofonia, e nem seriam provavelmente as figuras como Agostinho Neto, Amilcar e Luis Cabral, ou Machel e outros conhecidos protagonistas que sobreviviam à selvajaria que se adivinhava em Março de 1961.


Já vimos Angola, Guiné e Timor serem invadidos por vizinhos, após a saída de Portugal, imaginemos o que aconteceria em 1961. 
É que devido a muitos factores faceis de explicar, nem sempre fomos respeitados internacionalmente, e acontecia isso mesmo naquele momento crítico só que nem sempre queremos encarar isso de frente.

Nós portugueses temos tantos conceitos e preconceitos sobre o que nós somos que até temos medo/vergonha de encarar com as nossas fraquezas/forças e preferimos viver num misto de verdade/mentira quanto ao que fazemos ou fizemos ou que outros nos fizeram.


Se não vejamos um caso que não tem muito a ver com a guerra colonial, mas é ilucidativo como devemos ser nós a olhar para nós sem complexos, e não olhar para o lado e varrer os problemas para debaixo do tapete.


Por exemplo esta mentira de sermos o país com as fronteiras mais antigas da europa, com 800 ou mais anos, conforme políticos, escritores e historiadores se fartam de escrever e reescrever.


Mentira, porque a Madeira e os Açores não foram ocupados há tantos anos. 
Mentira, porque no Alentejo houve um recuo da fronteira de vários quilómetros a leste de Juromenha, o que faz que as nossas últimas fronteiras naquele lugar andam apenas pelos 200 anos, pelo menos provisoriamente, segundo esperam os "amigos de Olivença" o que faria com que hoje ainda nem temos as fronteiras definitivas.

Não devemos continuar a mentir a nós próprios, escondendo ou transfigurando factos históricos, em que nós mesmo participámos, ou estamos vendo mas fugimos com o olhar, como acontece com esta guerra nas nossas antigas colónias em que participámos em conjunto ou contra africanos, cubanos, russos, sulafricanos, etc. etc., e que como portugueses estivemos divididos mas não tanto como uns tantos querem fazer crer.


Até mesmo aqueles que não vestiram um camuflado ou porque foram para a pesca do bacalhau ou sairam das aldeias de assalto trabalhar para a França, até desses Salazar aproveitou o esforço para bem da Nação, uns pescando o fiel e indispensável amigo, outros atravez de agências do BES, estrategicamente colocadas que religiosamente lhe arrecadavam as suas remessas de emigrantes que ao que consta o ditador apreciava imenso.


Outros que foram mais para leste, tambem marcaram aquele período, e a sua maneira de ir contra aquela guerra deve tambem ser escrita e ficar para a história e nunca ser varrida para debaixo do tapete.


Claro que este Blogue  é dedicado àqueles que viveram a guerra na Guiné, e espero que os assuntos que abordei, não desrespeitem as memórias de quem lá andou.


Cumprimentos para os editores e todos os que acompanham este blogue.


Antº Rosinha

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Nota do editor: