– Grande Mansa, vimos de uma terra onde um búfalo terrível devastava udo. Nós matamo-lo, mas o seu espírito encarnou nesta mulher, que é feia, mas forte e corajosa, por isso a trouxemos para você casar com ela, pois o filho que ela lhe der tornará grande o Mali. O nome dela é Sagolom – disse um dos caçadores.
– O filho de um leão e de um búfalo serão poderosos de verdade - sussurrou o djali bá (conselheiro) (16) ao Mansa Maghan.
O Mansa casou-se com Sagolom, e no ano seguinte, ela deu à luz um menino. Todos se alegraram, menos Sassouma Bérété, a primeira esposa do Mansa.
Durante anos Sagolom tentou em vão curar o seu filho com mésinhos (17), mas Sundiata arrastava-se de gatas pelo palácio, ignorado por uns, ridicularizado or outros, deixando a sua mãe desolada e o seu pai desesperado, apenas o djali bá do Mansa lhes dava esperança.
Doente e sentindo que a morte se aproximava, o Mansa Maghan ordenou que Sundiata fosse trazido à sua presença:
– Meu filho, já estou velho e os meus dias estão a terminar. Está na altura de tu, como futuro Mansa teres o teu djali bá. Este é Bala Fasséké, o seu pai foi meu djali bá, e ele será o teu. Ele irá ajudar-te no teu reinado –disse o Mansa.
Quando o Mansa Maghan morreu, o Conselho dos Homens Grandes não respeitou a decisão do Mansa de nomear Sundiata como seu sucessor, e nomeou o filho de Sassouma , como novo Mansa.
Cheia de orgulho, a agora poderosa Sassouma insultou a mãe de Sundiata e expulsou-a do palácio, bem como a Sundiata e aos seus irmãos.
Sundiata, vendo a sua mãe em lágrimas, ordenou a Bala que lhe fosse buscar uma vara de ferro. Quando Bala voltou, Sundiata, apoiando-se na vara com ambas as mãos, levantou-se e ficou de pé, sem qualquer apoio, ficando a vara vergada com a força que Sundiata fez.
Uma multidão reuniu-se espantada quando Sundiata deu um passo, depois outro, e outro, e Bala gritou:
– Abram caminho! Abram caminho! O leão está a andar!
Aos sete anos, Sundiata começava finalmente a andar, o que encheu de alegria a sua mãe.
Quando Sassouma ouviu as notícias sobre a caminhada e a força de Sundiata, ela temeu que ele agora fosse desafiar o seu filho pelo lugar no trono, e decidiu matá-lo. Depois pensou melhor e decidiu aguardar, pois Sundiata não tinha quem o apoiasse na conquista do trono, e com o tempo o seu jovem filho ganharia cada vez mais poder, e seria mais fácil destruir Sundiata.
Quando Sundiata fez dez anos, Sassouma achou que era a altura de se vingar de Sundiata e da sua família. Assim enviou primeiro Bala para a corte do terrível Mansa Sosso, Sumanguru, para Sundiata não ter ajuda do seu djali bá.
Sumanguru era um poderoso feiticeiro, conhecido pela sua maldade e magia, cujo grande exército era muito temido. Sumanguru ficou impressionado com a inteligência e habilidade do jovem Bala, e resolveu mantê-lo ao seu serviço para sempre.
Sundiata ficou zangado e triste com o destino do seu amigo e conselheiro, mas seguiu as sábias palavras de sua mãe:
– Meu filho, temos que deixar o Mali. Aqui corremos muito perigo, porque Sassouma agora é muito poderosa, e vai matar-nos a nós e à nossa família. Temos que fugir. Um dia voltarás para o lugar que te pertence.
Naquela noite, Sagolom e os seus filhos deixaram tudo, e partiram à rocura de um reino que lhes desse abrigo. Durante sete anos, a família viajou, indo de reino em reino, a pedir ajuda.
Alguns dos governantes dos lugares por onde Sundiata passava negavam-hes abrigo e as portas eram fechadas, pois tinham medo das represálias de Sassouma.
A juventude de Sundiata foi uma permanente viagem, mas isso deu-lhe muitos conhecimentos e muitos amigos, e com o tempo o seu corpo tornou-se também forte, transformando-se num guerreiro poderoso.
Em todos os reinos e caravanas, Sundiata ouvia falar do poder crescente de Sumanguru, da sua crueldade e do povo que vivia infeliz nas terras sob seu poder.
Por fim, a família de Sundiata encontrou um lugar para ficar, junto ao rio Níger, na cidade de Mema, e a sua mãe cansada e doente, pôde finalmente descansar.
Sundiata colocou-se ao serviço do Mansa de Mema, distinguindo-se logo nos combates que este travou contra os inimigos do Reino, o que lhe granjeou os favores do Mansa.
O Mansa de Mema, observando a coragem e a capacidade de liderança de Sundiata, foi-lhe dando cargos militares cada vez mais importantes, e impressionado com a sua capacidade, decidiu fazer dele o seu herdeiro, dando-lhe a sua filha para casar, e ensinando-lhe a arte da guerra e da governação.
Um dia, chegou inesperadamente um grupo de homens a Mema, e entre eles vinham os homens grandes do Mali, que antes não tinham querido Sundiata como seu Mansa, e pediram-lhe uma audiência urgente.
- Filho do leão e do búfalo, volta para a tua terra, a tua gente precisa de ti - imploraram os homens grandes.
- O que aconteceu? - perguntou Sundiata.
- Sumanguru invadiu o Mali, matou a família real, e continua a matar e a escravizar muita gente. O povo quer lutar, mas não temos um líder para nos guiar. Os marabus dizem que só tu podes salvar o Mali - responderam eles.
- Irei partir já! Vamos destruir Sumanguru, e o seu reino de terror! - exclamou Sundiata.
Sundiata não perdeu tempo e foi falar com o Mansa de Mema, pedindo-lhe autorização para partir imediatamente. O Mansa de Mema deu-lhe metade do seu exército, e disse-lhe:
- Vai, o teu Reino está à tua espera, leva metade do meu exército e salvao teu povo.
- Obrigado. Nunca vou esquecer toda a ajuda que me deu. Eu voltarei para casar com a sua filha - disse Sundiata agradecido.
Sundiata com a cavalaria formou o seu esquadrão de ferro, e ele próprio assumiu o seu comando.
A cavalaria de Mema era constituída por cavaleiros com grandes lanças de ferro. Cavalgando à cabeça desta coluna, Sundiata planeou reunir um poderoso exército, indo a cada reino que o tinha ajudado durante o seu longo exílio, e aos reinos que combatiam contra Sumanguru.
Quando Sundiata se dirigiu para a cidade de Tabom, para se encontrar com o seu amigo Tabom Uana, o qual era agora Mansa de Tabom, Sumanguru enviou o seu filho Sosso Bala, que tinha aproximadamente a idade de Sundiata para lhe barrar o caminho.
Sosso Bala colocou os seus guerreiros no vale, à entrada das montanhas, que davam acesso ao caminho para Tabom. Sosso Bala estava confiante, pois o seu exército era muito mais numeroso que o pequeno exército sob o comando de Sundiata, e só as setas dos seus numerosos arqueiros, quando estes as disparassem, tapariam a luz do sol, e seriam suficientes para destruir Sundiata e o todo o seu exército,
antes de ele chegar perto dos seus guerreiros.
Quando Sundiata chegou ao vale, depois de um longo dia de marcha, o vale estava negro com a infantaria de Sosso Bala. Todos os chefes de guerra foram da opinião de que os guerreiros deviam descansar e combater no dia seguinte.
- Sundiata, deixe os seus homens descansarem, amanhã combateremos.
Sundiata sabia que todos estavam cansados da caminhada, mas acreditou que poderia transformar aquela fraqueza em força, e contra tudo o que todos pensavam disse:
- Não vamos descansar. Vamos atacar já!
Sundiata colocou-se à frente da sua cavalaria e deu ordem de ataque.
Os espiões Sossos tinham informado Sosso Bala que o exército de Sundiata tinha feito uma longa marcha e que estava demasiado cansado para combater, pelo que os guerreiros poderiam descansar, pois a batalha só seria no dia seguinte.
Sosso Bala apesar de saber que Sundiata estava perto, acreditando na informação dos espiões, não achou necessário colocar o seu exército em formação de batalha, e o ataque de Sundiata apanhou todos de surpresa e lançou a confusão total.
- Alerta, alerta! Ataque de Sundiata! - gritaram as sentinelas, mas já era tarde, pois a cavalaria de Sundiata, lançada num galope desenfreado, entrou pelo acampamento de Sosso Bala.
Os arqueiros Sossos nem tiveram tempo de disparar as flechas para deter a onda atacante, e num instante Sundiata e o seu exército estavam no meio deles, fazendo um massacre terrível.
Sundiata viu Sosso Bala e avançou para ele, mas um guerreiro Sosso colocou-se no caminho, e enquanto Sundiata lutava, Sosso Bala aproveitou a oportunidade para fugir, temendo pela sua vida.
Ao verem Sosso Bala fugir, os guerreiros Sossos fugiram também. Antes do fim do dia, já só havia homens de Sundiata no vale, e os seus cavaleiros perseguiam e aprisionavam guerreiros Sossos.
Ao entardecer, o Mansa Tabom Uana veio ao encontro do seu amigo Sundiata, trazendo mantimentos e mais guerreiros, reforçando assim o exército de Sundiata.
A notícia da derrota do invencível exército de Sumanguru espalhou-se rapidamente, e todos os que tinham sofrido às mãos de Sumanguru, corriam agora a juntar-se a Sundiata.
Em breve, um numeroso exército se estendia pela planície, e os cascos dos seus cavalos eram ouvidos a muitos quilómetros de distância. Agora Sundiata podia passar à ofensiva, e decidiu ir ao encontro de Sumanguru no vale de Neguéboria, em Boure.
Os dois exércitos encontraram-se no estreito vale de Neguéboria. Sundiata optou por uma formação em quadrado, com a cavalaria à frente e os arqueiros na retaguarda.
Sumanguru com o seu capacete com chifres, bem visível no alto de uma das colinas que dominavam o vale, dava ordens ao seu exército. Sundiata deu ordem de ataque, soaram tambores e trompetas, e os cascos dos cavalos da sua cavalaria levantaram uma nuvem de pó vermelho e ecoaram nas paredes do vale, como um enorme trovão, fazendo tremer de medo as forças de Sumanguru.
Sundiata comandou a carga de cavalaria, e o seu manto branco esvoaçava no ar como uma bandeira, que os seus homens seguiam.
As forças de Sundiata atacaram o centro do exército de Sumanguru e logo este começou a ceder. Sumanguru deu ordem aos guerreiros que tinha escondido para atacarem as forças de Sundiata pelos lados, numa estratégia conhecida como chifres de búfalo, mas Sundiata já tinha previsto essa manobra e o seu exército estendeu-se rapidamente por toda a largura do vale, bloqueando a sua passagem.
Sumanguru tentou conter a queda do centro do seu exército, juntando- se aos seus guerreiros, para lhes dar coragem, mas isso colocou-o ao alcance da lança de Sundiata.
Sundiata não perdeu a oportunidade e atirou a sua lança, a qual atingiu o peito de Sumanguru, mas fez ricochete. Sundiata não desistiu e com o seu arco lançou uma flecha contra Sumanguru, mas esta também fez ricochete no peito de Sumanguru.
- Ninguém me pode matar! - gritou Sumanguru.
- Isso é o que vamos ver - respondeu Sundiata.
Furioso, Sundiata pegou noutra lança e avançou para onde estava Sumanguru, mas quando o procurou novamente, já ele estava no alto da colina.
Espantado, Sundiata parou de lutar e ficou a olhar para Sumanguru, vendo-o desaparecer.
O exército de Sumanguru, ao vê-lo fugir, fugiu também. Sundiata ficou a pensar como poderia derrotar Sumanguru, se ele tinha uma magia tão poderosa que podia desaparecer e era invulnerável ao ferro.
Sundiata continuou a sua marcha, desta vez para a Sibi, de onde lhe chegaram boas notícias, pois o seu amigo e conselheiro Bala tinha conseguido fugir da corte de Sumanguru e vinha ao seu encontro.
O encontro entre Sundiata e Bala foi de grande alegria, e a partir dele Sundiata ficou a saber que o animal sagrado de Sumanguru era o galo, e era dele que provinham os seus poderes e feitiços.
Bala tirou do seu saco uma seta, que tinha na ponta um esporão de galo, e disse:
- Esta seta irá acabar com o poder de Sumanguru, pois este esporão de galo irá destruir toda a sua magia. Basta feri-lo para ele ser vencido!
- Como poderei feri-lo, se as lanças e as setas fazem ricochete nele? - perguntou Sundiata.
- Sumanguru tem um escudo de ferro, escondido debaixo da roupa, atingi-o onde não tiver roupa.
- Obrigado Bala! Vamos fazer Sumanguru provar o seu próprio feitiço!
Os dois exércitos enfrentaram-se na planície de Kirina. Durante todo o dia, uma furiosa batalha foi travada entre os dois exércitos, e Sundiata, montado no seu cavalo, procurou Sumanguru.
No meio da poeira vermelha e da confusão da batalha, Bala descobriu o feiticeiro e gritou para Sundiata, ao mesmo tempo que apontava:
- Sumanguru está ali!
Sundiata olhou, e viu Sumanguru no alto de um morro perto de si, e, antes que ele o visse, pegou no seu poderoso arco e puxando a corda ao máximo disparou a seta com o feitiço.
A flecha voou como um raio, espetando-se no braço de Sumanguru. Somanguru ao sentir-se ferido e vendo que a seta tinha o feitiço do galo, soltou um grito de pânico e fugiu a galope do campo de batalha.
-Ahaaa! Estou perdido! - gritou Sumanguru.
Desorientado com a fuga de Sumanguru, o exército do feiticeiro fugiu também. Sumanguru, perseguido por Sundiata, fugiu para a encosta do Monte Koulikoro e entrou cambaleando numa caverna escura, mas por mais que o procurassem nunca mais foi visto.
Diz-se que Sumanguru foi transformado na pedra da caverna, pelos poderes do mal que ele servia.
Sundiata voltou em glória para Mali. Durante toda a sua viagem, as pessoas corriam aos caminhos e estradas por onde passava, gritando vivas e louvores.
- Sundiata! Sundiata! Viva Sundiata! - gritavam à sua passagem.
Os Mansas que tinham ajudado Sundiata no exílio e nas suas batalhas, juraram-lhe fidelidade, e o Mansa do Mali, filho do leão e do búfalo, transformou assim o Reino do Mali num Império, constituído por todos esses Reinos.
Sundiata foi o primeiro Mansa Bá (Imperador) (18) do grande Império do Mali, sendo este o maior Império da África Ocidental.
Esta é uma das muitas versões da lenda de Sundiata.
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