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sexta-feira, 28 de junho de 2019

Guiné 61/74 - P19925: Notas de leitura (1191): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (12) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 19 de Março de 2019:

Queridos amigos,
Estamos no início das atividades do BCAV 490, o bardo relata os primeiros sinistros, feridos na ocorrência de uma mina anticarro. É coloquial e íntimo, não esquece os nomes, é um cronista sentimental. E flui a memória para esse manancial inesgotável de relatos de minas como de emboscadas. Pois neste exato momento lê-se o cartapácio "A Nossa Guerra", dois anos de muita luta, o histórico da CCAÇ 675 redigidos por dois eméritos confrades do blogue, o Belmiro Tavares e o JERO, aproveita-se aquele dia nefasto de 28 de dezembro de 1964 em que o Furriel Mesquita exalou o seu último suspiro, e como a Companhia do Capitão do Quadrado prontamente reagiu. A associação não é fortuita, em toda esta narrativa de Belmiro Tavares e JERO se fala no Tenente-Coronel Fernando Cavaleiro e em Unidades da BCAV 490, eram próximos.
Aqui fica a minha homenagem às perdas que ambos tiveram.

Um abraço do
Mário


Missão cumprida… e a que vamos cumprindo (12)

Beja Santos

“Cumprindo a sua missão,
a 489 alinhava.
Feriu-se um rapaz nosso amigo,
quando a mina rebentava.

Muitas escoltas fazia
o José Pombo Cordeiro.
Quem para Bissorã saiu primeiro
foi a 3.ª Companhia.
Nesse tempo não havia
terroristas nesta região.
Passaram-se 18 dias então
e malvados ninguém viu
e a 487 os substituiu
cumprindo a sua missão.

O tempo vai-se percorrendo
e no mês de Outubro estamos
e todas as coisas que passamos
eu aqui vou escrevendo.
Todos nós fomos sofrendo.
Para isso alguém nos mandava.
Em Mansabá me preparava
para os terroristas deixar de ver
e para me vir render,
a 489 alinhava.

Em Bissorã se encontrava
o nosso Capitão Romeiras
e com as suas boas maneiras
a missão desempenhava.
De noite ou de dia mandava
a rapaziada para o castigo,
em busca do inimigo,
mas pouca vez o viram,
e, quando numa emboscada caíram,
feriu-se um rapaz nosso amigo.

Na última viatura ia
o Joaquim António Machado
que pelo ar foi levado
quando a mina explodia.
Ali se feriu o Francisco Maria
que no terreno se deitava
e o 314 gritava
com um ferimento muito forte.
Viu ali pertinho a morte
quando a mina rebentava.”

********************

Com estes feridos e minas, a memória voou para os livros que se têm escrito sobre a CCAÇ 675, contemporânea do BCAV 490. Muito se tem escrito sobre a tropa chefiada pelo Capitão do Quadrado, Alípio Tomé Pinto, também conhecido pelo Capitão de Binta. Esta unidade chegou em 1964 à região de Binta, então as forças do PAIGC e as populações que ele arregimentava movimentavam-se com total liberdade nesta quadrícula. No seu livro “A Nossa Guerra, a história da Ccaç 675”, Belmiro Tavares, de colaboração com José Eduardo Reis de Oliveira, edições dos autores, maio de 2017, fazem um histórico, um misto de diário, de agenda, de considerações soltas, sobre a sua presença em Binta e a amizade que ficou até aos dias de hoje. É impressionante a movimentação operacional que desenvolveram a partir de junho de 1964, limpeza das estradas cheias de abatises, destruição dos locais de residência das forças do PAIGC, emboscadas, golpes de mão, operações em Sambuiá, a abertura de estrada para Farim e igualmente para Guidage, havia jornal de caserna, acompanhamento médico para gente que vinha do Senegal. Tudo se lê e deixa-nos empolgados ao ver a consideração desmedida, a confiança incondicional que toda a Companhia depositava no Capitão do Quadrado. Combatiam e faziam obras de beneficiação, procuravam ajudar as populações, dava-se aulas regimentais para superar o analfabetismo de um conjunto de praças, tiveram dias memoráveis e dias nefastos.
Quanto a estes, ele relata um drama vivido em 28 de dezembro de 1964, é uma descrição pormenorizada e contextualizada:
“Sabíamos, por informações colhidas no Senegal, que os guerrilheiros de Sambuiá não queriam lá mais população não-combatente para beneficiarem de mais liberdade de movimento. Mantinham a população nas aldeias limítrofes, prometendo-lhes a segurança necessária; assim seria mais fácil prevenir-se, sempre que a tropa de Binta se aproximasse. Nós éramos os únicos a apoquentá-los.
Tudo foi feito para não denunciar a nossa presença, naquelas paragens: camuflagem, aproveitando as zonas de vegetação mais densa ao longo do rio e sem provocar ruídos desnecessários.
Apesar dos nossos esforços, eles aperceberam-se das nossas movimentações, dispararam sobre nós e obtiveram a nossa resposta no mesmo tom, mas com melhor pontaria; perseguimo-los e fizemos três prisioneiros, vários feridos e alguns foram abatidos.

Sem a surpresa habitual, não seria aconselhável atacar Udasse, já fora de horas. Iniciámos o regresso a Sansacutoto; pouco depois das 12 horas, as viaturas iniciaram a marcha rumo a Binta com todos os operacionais a bordo; seriam umas 12h30, quando o rebentamento medonho, um estrondo anormal, fez parar a coluna; toda a gente saltou para as bermas da estrada, tomando posição uns metros fora da via. O que mais preocupava era não saber claramente o que tinha acontecido; ninguém queria acreditar que se trataria de uma mina anticarro; a coluna era constituída por 10 viaturas e o espaço entre elas era demasiado grande; a primeira viatura e a última, devido à poeira, estavam separadas por cerca de mil metros. Lá à frente, os guerrilheiros, emboscados ao longo da estrada, desencadearam uma violenta emboscada. Os nossos atiradores responderam na máxima força e em breve fizeram calar as armas adversárias. Lá na frente, uma grossa coluna de fumo espesso e assustadoramente negro subia pelos ares; via-se uma viatura que, ardendo, se desfazia em chamas; havia feridos, mas lá atrás não se sabia quantos nem a gravidade das lesões.

Em murmúrio, foi passando a dolorosa notícia que uma minha potente explodira debaixo de um Unimog, provocando vários feridos; logo surge a nova e mais brutal e atroz: há um morto, o Furriel Mesquita, natural de Famalicão.
O nosso médico, Dr. Martins Barata, tal como por vezes acontecia, naquele dia acompanhou a tropa no mato. No meio daquele desastre, ele foi de uma utilidade extrema. Com tantos feridos, ele e os enfermeiros não tinham mãos a medir. Foi logo pedido um helicóptero e duas avionetas; como a nossa pista ainda não se encontrava devidamente operacional, as avionetas aguardaram em Farim que o helicóptero chegasse com os feridos e o morto.
Depois de um jantar mal deglutido e sem vontade, o enorme capitão reuniu com os seus colaboradores mais directos; nem uma palavra sobre o que acontecera naquele malfadado dia; aparentemente eram águas passadas, mas uma dor imensa, tristeza infinita estavam notoriamente espelhadas nos seus olhos. Agora, o essencial era recuperar o ânimo da rapaziada, moralizar aquela gente”. 

Como se disse, trata-se de uma descrição minuciosa, lista-se o morto, os sete feridos em combate, fala-se do Soldado Atirador António Filipe que enquanto esteve internado no Hospital Militar Principal concluiu o quinto ano liceal, o que lhe proporcionou um emprego na Mague, onde trabalhou até à reforma, ficara com uma incapacidade de 77%. Houvera comportamentos de bravura, abarcando praças europeias e guineenses.
A tropa pôs-se logo em movimento, partiram na manhã seguinte para uma emboscada. “Pretendia-se demonstrar ao inimigo que não era um desaire que nos quebrava o ânimo, embora aquele contratempo fosse tremendamente doloroso e marcante; não seria facilmente esquecido; ainda hoje, volvidos mais de 50 anos, quando relembramos aquele dia, a voz fica embargada e a alma dilacerada. Pela primeira vez, com todos os operacionais no mato, o excelso Capitão de Binta ficou no quartel; quando saíam dois pelotões… ele estava sempre ao nosso lado; mesmo quando saía só um grupo de combate, ele quase sempre nos acompanhava. Com uma dor de alma inimaginável”.

(continua)

Aguarela do pintor Manuel Botelho, viatura destruída por uma mina anticarro, coleção de Mário Beja Santos.
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Notas do editor

Poste anterior de 21 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19907: Notas de leitura (1189): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (11) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 24 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19916: Notas de leitura (1190): "Memórias de África, Angola e Guiné", pelo General José de Figueiredo Valente; Âncora Editora, 2016 (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 8 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19659: Notas de leitura (1166): “A nossa guerra, dois anos de muita luta, Guiné 1964/66 – CCaç 675”, por Belmiro Tavares e José Eduardo Reis de Oliveira, edição de autores, 2017 (3) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 21 de Março de 2019:

Queridos amigos,
Recomendo vivamente a leitura da obra assinada por Belmiro Tavares e JERO. Não se pode ficar insensível à fidelidade, à camaradagem e solidariedade que estes homens mantêm entre si, extravasa encontros regulares, entreajudam-se, procuram-se depois da natural diáspora em que no fim da comissão (1966) muita gente procurou dar outros rumos à vida. Toda a documentação sobre a Companhia de Binta é motivo de estudo: como fora possível chegar a tanto abandono aquele ponto da região norte, tão sensível, já que Guidage era um quase ponto de fronteira, ali perto passava um corredor por onde as forças do PAIGC iam até Sambuiá e depois ao Morés?
Pode-se avaliar que havia um certo equilíbrio de armamento entre guerrilheiros e contra guerrilheiros; e estão aqui os dados flagrantes da condição de milhares de guineenses forçados a abandonar as suas tabancas para não serem colhidos entre os dois fogos e permanentemente intimidados pela guerrilha; e ressalta uma história sublime, a relação com o Capitão do Quadrado, momentos há, na leitura deste cartapácio, e nos outros livros que têm a ver com Tomé Pinto e os seus homens na Guiné em que somos forçados a reconhecer que muitas vezes a realidade é mais potente e grandiosa que os voos da imaginação, em literatura memorial.

Um abraço do
Mário


Binta, Guiné, A Companhia do Capitão do Quadrado, novas memórias (3)

Beja Santos

O livro intitula-se “A nossa guerra, dois anos de muita luta, Guiné 1964/66 – CCaç 675”, por Belmiro Tavares e José Eduardo Reis de Oliveira, edição de autores, 2017. A capa é surpreendente, como se escreve: “Uma bonita abatis na estrada de Farim. Esta não cumprira a sua missão: impedir a passagem; as viaturas passavam por baixo!”. No blogue, já tive oportunidade de me debruçar sobre três livros referentes ao historial da CCaç 675: primeiro, o galvanizante “Diário de JERO”, um relato feito pelo enfermeiro da Companhia de tudo quanto se vai passando, e tudo quanto se vai passando gravita à volta de um oficial bem-amado, Alípio Tomé Pinto, que irá ficar conhecido pelo nome de “Capitão do Quadrado”, um documento publicado à sorrelfa em 1965, podia ter custado a carreira deste oficial que chegou a general; seguiu-se outra obra “Golpes de Mão’s”, se apresentava como o segundo volume do diário, leitura estimulante, mas não chegava ao sopro anímico do primeiro; terceiro, a biografia do general Tomé Pinto, da responsabilidade da jornalista e investigadora Sarah Adamoupoulos. O impulsionador deste quarto documento é um homem sentimental que ainda hoje nos impressiona tanto pela memória dos acontecimentos vividos, como pela sua arte de contar, não é a primeira vez que o oiço de voz embargada e lágrimas a bailar nos olhos, Binta e arredores não lhe saem do coração.

O fôlego, o ritmo da escrita do primeiro ano da comissão, vai conhecer quebras acentuadas na narrativa do segundo ano. A primeira condicionante é de que um homem não é de ferro, era inteiramente impossível manter aquela passada vertiginosa em limpezas de estrada, acolhimento das populações em fuga, fazer patrulhamentos ofensivos, operações e colunas de reabastecimento a Guidage. A segunda passará com uma alteração logística de tomo, a CCAÇ 675 é forçada a manter um pelotão em Guidage, começa a história do cavalo do inglês, o devaneio de que se pode fazer o mesmo com muito menos.

Fazem-se colunas, volta-se a Sambuiá, mantêm-se as batidas constantes. Na nota do diário de 12 de maio de 1965 lembram-se os três mortos, o que se passou, a frescura física já não é a mesma, a vida operacional vai-se mitigando, entenderam os autores apresentar uma galeria de retratos dos que mais se sobressaíram, uns mais desenvoltos ou desenrascados, outros introvertidos, são notas ternas sobre o Lua, o Aguardente, o Engrácia, o Moreira, o Eurico, o Vendas Novas, e muitos outros. O médico da Companhia também tem honras de destaque. O diário é mais sóbrio, resumido, aliás começam a aparecer súmulas mensais. O moral da tropa é oscilante, por motivos fúteis surgem quezílias. Um dos narradores, Belmiro Tavares, conta a morte do Nascimento que pisara uma mina antipessoal. Em Guidage, aconteceu algo de tétrico, fugira um prisioneiro, alguns soldados do pelotão espancaram até à morte o soldado Fó Gomes, houve decisão do tribunal militar. A guerrilha não perdeu totalmente a iniciativa, em agosto de 1965 ataca Guidage. O Capitão do Quadrado volta de férias e logo a seguir parte para fazer o curso do Estado-Maior, o novo Comandante é o Tenente Cruz. Partiu o BCAV 490, chegou o BART 733, vão começar os contenciosos com o Major Azevedo. Chegou a luz elétrica a Binta, as batidas e patrulhamentos entre Binta e Guidage são constantes, há consciência de que o PAIGC quer aumentar a perturbação com a afluência das populações que abandonam o Senegal e que pretendem acolher-se ao setor de Binta. Nisto, explode uma bomba numa festa em Farim, mortos e feridos aos montes, a maioria crianças e mulheres. Um velhinho Dakota faz várias viagens por essa noite para recolher os feridos às centenas. A PIDE executa prisões, o gerente da Sociedade Comercial Ultramarina em Farim, um madeireiro, o bailarino, um chefe do grupo de milícias, mas também funcionários da Administração de Farim, do Centro de Saúde, da Central Elétrica. Volta-se a Sanjalo, há notícias de um acampamento clandestino. Segue-se a história do soldado Joaquim Lopes Henriques que ficou com um braço esfacelado, uma história que ficou para a vida inteira. Crescem as tensões entre a CCAÇ 675 e o Major Azevedo. E assim se chega a 1966. Já não há diário, há resumos mensais, suspira-se pelo final da comissão. Recorda-se com saudade o soldado n.º 108 Mamadu Bangoran, um Fula valoroso, comportara-se heroicamente retirando das chamas vítimas de uma mina anticarro entre labaredas e ferros retorcidos, não temendo a explosão do depósito de gasolina, retirou todo o material de guerra que por ali se espalhava. O Capitão do Quadrado chamou-o para o elogiar e Bangoran que era um muçulmano heterodoxo pediu licença a Tomé Pinto para se embebedar.

A CCAÇ 675 passou à disponibilidade em 4 de maio de 1966 mas está viva da costa, as páginas finais deste cartapácio relatam encontros, episódios pessoais, lançamento de livros, gente que se dispersou pelas sete partidas do mundo, falecimentos, doenças. Todos os acontecimentos à volta do Capitão do Quadrado são pretexto para ajuntamento dos seus homens, caso do lançamento da sua biografia que ocorreu em Lisboa em abril de 2016. O álbum fotográfico completa a obra. Foram dois anos de muita luta, escrevem insistentemente os autores, e dizem concretamente porquê. Mas o que sobressai, o que ficará para todo o sempre é um caso particular de devoção ao Comandante de Companhia, isto para já não esquecer aqueles primeiros meses de turbilhão que transformaram a região de Binta de corredor livre do PAIGC num caso de êxito de contraguerrilha, e por isso se percebe muito bem a ligação inquebrantável entre o Capitão do Quadrado e os seus devotados militares.
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Nota do editor

Poste anteriores de:

25 de Março de 2019 > Guiné 61/74 - P19621: Notas de leitura (1162): “A nossa guerra, dois anos de muita luta, Guiné 1964/66 – CCaç 675”, por Belmiro Tavares e José Eduardo Reis de Oliveira, edição de autores, 2017 (1) (Mário Beja Santos)
e
1 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19639: Notas de leitura (1165): “A nossa guerra, dois anos de muita luta, Guiné 1964/66 – CCaç 675”, por Belmiro Tavares e José Eduardo Reis de Oliveira, edição de autores, 2017 (2) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 1 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19639: Notas de leitura (1165): “A nossa guerra, dois anos de muita luta, Guiné 1964/66 – CCaç 675”, por Belmiro Tavares e José Eduardo Reis de Oliveira, edição de autores, 2017 (2) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 21 de Março de 2019:

Queridos amigos,
Este cartapácio é uma obra de paixão. Não há memória, em toda a literatura da guerra colonial, de uma devoção tão sentida por um coletivo ao seu capitão, são-lhe tecidos todos os encómios, é temerário e visionário, sábio e previdente, líder de tal envergadura jamais abandonou ao longo de mais de meio século, a consideração dos seus subordinados. É tocante ver-se a agenda dos encontros, a entreajuda, a presença nos eventos dos filhos de quem já morreu, divulgação de notícias de quem está a merecer cuidados e precisa de ser acompanhado.
E lendo de fio a pavio o cartapácio assimila-se o que foram os horrores do início daquela guerra, os casos de jogo duplo, um deles será contado no episódio seguinte, como se procurou arredar a guerrilha, ela recuou mas não desesperou, e a comissão da CCAÇ 675 decorreu ainda numa fase em que o Senegal não se comprometera a fundo em deixar passar homens e armamento, e este era cada vez mais sofisticado.

Um abraço do
Mário


Binta, Guiné, A Companhia do Capitão do Quadrado, novas memórias (2)

Beja Santos

O livro intitula-se “A nossa guerra, dois anos de muita luta, Guiné 1964/66 – CCaç 675”, por Belmiro Tavares e José Eduardo Reis de Oliveira, edição de autores, 2017. A capa é surpreendente, como se escreve: “Uma bonita abatis na estrada de Farim. Esta não cumprira a sua missão: impedir a passagem; as viaturas passavam por baixo!”. No blogue, já tive oportunidade de me debruçar sobre três livros referentes ao historial da CCaç 675: primeiro, o galvanizante “Diário de JERO”, um relato feito pelo Enfermeiro da Companhia de tudo quanto se vai passando, e tudo quanto se vai passando gravita à volta de um oficial bem-amado, Alípio Tomé Pinto, que irá ficar conhecido pelo nome de “Capitão do Quadrado”, um documento publicado à sorrelfa em 1965, podia ter custado a carreira deste oficial que chegou a General; seguiu-se outra obra “Golpes de Mão’s”, se apresentava como o segundo volume do diário, leitura estimulante, mas não chegava ao sopro anímico do primeiro; terceiro, a biografia do General Tomé Pinto, da responsabilidade da jornalista e investigadora Sarah Adamoupoulos. O impulsionador deste quarto documento é um homem sentimental que ainda hoje nos impressiona tanto pela memória dos acontecimentos vividos, como pela sua arte de contar, não é a primeira vez que o oiço de voz embargada e lágrimas a bailar nos olhos, Binta e arredores não lhe saem do coração.

A CCaç 675, se atendermos à vertigem da atividade operacional dos primeiros meses, impôs-se pelo espírito ofensivo, pondo os guerrilheiros a respeito, limpou os caminhos, encetou obra em Binta, todo e qualquer local pertencente ao setor foi vasculhado. Área delicada, no entanto: muita população fugira para o Senegal, estava sujeita às ameaças do PAIGC, vinha cultivar, digamos que em terra de ninguém, aí se encontravam com as patrulhas de Binta, angústia como esta era possível nos primeiros anos de guerra, e em muitos pontos da Guiné. O primeiro ano da comissão espelhou essa capacidade ofensiva que foi sendo creditada nos guineenses que tinham fugido para o Senegal. No segundo ano da comissão, são frequentes os relatos de guineenses que se apresentam em Guidage intencionados para refazer as suas vidas na Guiné, confiam na Companhia do Capitão do Quadrado.

Com uma mão na espada, a outra no arado, combatia-se e procurava-se pôr Binta num brinquinho, a par das aulas regimentais, atendimento sanitário de populações da Guiné e do Senegal, e muito mais. Andam num virote, nesse primeiro ano, irão várias vezes à península de Sambuiá, percorrem Sanjalo, Ufudé, Fodé-Siráia, Genicó Mancanho, muitos cuidados entre a bolanha de Cufeu e Guidage, limpa-se a estrada de Farim a Binta, percorre-se Cansenha, Caurbá, os autores são incansáveis a dar-nos pormenores: golpe de mão a Canicó, os ferimentos do temerário Capitão de Binta, que andava sempre em movimento, vai-se a Lenquetó e Temanto, percorre-se a estrada até Bigene, emboscadas, patrulhas, nomadizações, destroem-se acampamentos precários, ruma-se a Banhima, faz-se ação psicossocial na fronteira, narram-se dramas de toda aquela população entalada entre dois fogos. Mesmo desalojado, o PAIGC não deixa de atribular a vida da CCAÇ 675, com abatises, queimando pontões, flagelando à distância.

Há um jornal de parede, nele em 8 de dezembro de 1964, alguém homenageia a sua mãe, aqui fica um fragmento:
“Nas circunstâncias actuais da minha vida, que por ser dura e difícil, mais maturidade me vai dando, em que melhor aprecio a formação que me deu, grato me é registar o amor, a personalidade, a pureza da minha querida Mãe que, diariamente, com as suas orações e as suas notícias, com as suas palavras amigas, me vai dando coragem para encarar com resignação cristã, esperança e optimismo, a separação, as dificuldades de uma guerra em terreno primitivo e selvagem.
É principalmente numa numerosa família como a constituída pelos 160 elementos de uma Companhia, que vivem em comum, que damos conta do que significa para cada um de nós a sua Mãe. Nos momentos mais difíceis, no perigo, na dor, na doença, um apelo mudo, a que nos agarramos com força, parte dirigido a quem nos deu a vida.
Num dia como este, em que todas as Mães sentem à sua volta todo o carinho dos filhos, eu, cá de longe, rendo-lhe o preito da minha estimada, da minha admiração.
Deus permita que continue assim, por muitos anos, a tornar felizes todos os que vivem perto de si. Transmita à minha querida Avó os parabéns, por ter dado ao mundo tal filha.”

Este quinhão de memórias também destaca aspetos facetos, brejeirices, comicidades. Havia o 1.º Cabo Enfermeiro António Martins a quem os habitantes das aldeias senegalesas chamavam Dr. Martins.
Fazia-se acompanhar pelo Soldado Machado que sentia ganas de ser enfermeiro. O Martins dava-lhe a bolsa para carregar, um grande saco de lona, o Machado seguia-o docilmente.
Eis o episódio:
“Com o andar do tempo, o Machado começou a fazer curativos e até dava injecções aos nativos. Um dia, acabadas as consultas, o Martins conferiu o material de serviço, verificou que faltava uma agulha de seringa e fez o reparo ao Machado: ‘Falta aqui uma agulha!’.
O Machado esbugalhou os olhos, concentrou-se, deu uma palmada na testa, e saiu, correndo, em direcção à bolanha que marcava a separação entre a Guiné e o Senegal, abeirou-se de uma das últimas mulheres que haviam sido tratadas, levantou-lhe a saia e sacou-lhe do traseiro a agulha que ela levava ali espetada. Sempre a correr, voltou ao quartel e eufórico informou o Dr. Martins: Está aqui a agulha que faltava.”

Este outro episódio ocorreu no dia 18 de julho de 1964, houve patrulhamento ofensivo em Sanjalo, a tropa estafada seguiu-se para Quenejara, novo combate, esfalfados, pediram ao telefonista para que insistisse com as viaturas a chegarem rapidamente, o telefonista avisa que o informaram que estão prestes a sair, o capitão manifesta o seu descontentamento:
“- Diz-lhes que eu mando tudo bardamerda! O telefonista, um alentejano castiço que carregava nos ‘rr’ teve vergonha de usar aquela zombaria em frente do seu capitão, fazendo uso do seu sotaque, transmitiu via rádio: 
- Charly Óscar Mike Delta Tango deste está muito chateado! 
- Não estou chateado! Mando tudo bardamerda! 
O telefonista repetiu aquela mensagem um tanto envergonhado: 
- Charly Óscar Mike Delta Tango deste manda tudo borrdamerrrda!”

Um primeiro ano de arromba, passou-se meio século e estes cronistas passeiam-se permanentemente por esta região de Binta e não vacilam em dizer que a Companhia do Capitão do Quadrado não tinha rival. Esfalfaram-se, surgiram mortos e feridos e muitos doentes, o Capitão do Quadrado irá partir para fazer um curso do Estado-Maior, o BCAV 490 parte, surgirão problemas com a unidade que os vem render, as relações Farim-Binta vão ser muito tensas.

(continua)
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Notas do editor:

Poste anterior de 25 de Março de 2019 > Guiné 61/74 - P19621: Notas de leitura (1162): “A nossa guerra, dois anos de muita luta, Guiné 1964/66 – CCaç 675”, por Belmiro Tavares e José Eduardo Reis de Oliveira, edição de autores, 2017 (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 29 de março de 2019 > Guiné 61/74 - P19630: Notas de leitura (1164): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (79) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 25 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19621: Notas de leitura (1162): “A nossa guerra, dois anos de muita luta, Guiné 1964/66 – CCaç 675”, por Belmiro Tavares e José Eduardo Reis de Oliveira, edição de autores, 2017 (1) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Março de 2019:

Queridos amigos,
É um tomo de mais de 500 páginas, primeiro diarístico e depois mensal, 1964, Binta completamente controlada por adeptos do PAIGC, o seu potencial fogo ainda é precário, como precária é a sua capacidade de aterrorizar, Alípio Tomé Pinto tem uma Companhia bem preparada, as primeiras semanas correm a um ritmo enlouquecedor, não tivesse o essencial desta trama aparecido em obras anteriores e julgávamos tratar-se de um romance de aventuras.
Lê-se e medita-se: como a guerrilha cresceu de 1963 para 1964, tudo parte e irradia do Morés, bem se procurou desalojar a força militar do PAIGC e a sua população, o insucesso por completo.
Belmiro Tavares é de uma enorme coragem, diz desabridamente que as Unidades à volta mal saíam dos quartéis, permitiam uma quase total liberdade às forças do PAIGC.
O homem inspirador de tudo, que nesta obra é sempre incensado chama-se Alípio Tomé Pinto, permanentemente adorado por quem combateu às suas ordens naquele rincão da Guiné.

Um abraço do
Mário


Binta, Guiné, A Companhia do Capitão do Quadrado, novas memórias (1)

Beja Santos

O livro intitula-se “A nossa guerra, dois anos de muita luta, Guiné 1964/66 – CCaç 675”, por Belmiro Tavares e José Eduardo Reis de Oliveira, edição de autores, 2017. A capa é surpreendente, como se escreve: “Uma bonita abatis na estrada de Farim. Esta não cumprira a sua missão: impedir a passagem; as viaturas passavam por baixo!”. No blogue, já tive oportunidade de me debruçar sobre três livros referentes ao historial da CCaç 675: primeiro, o galvanizante “Diário de JERO”, um relato feito pelo enfermeiro da Companhia de tudo quanto se vai passando, e tudo quanto se vai passando gravita à volta de um oficial bem-amado, Alípio Tomé Pinto, que irá ficar conhecido pelo nome de “Capitão do Quadrado”, um documento publicado à sorrelfa em 1965, podia ter custado a carreira deste oficial que chegou a general; seguiu-se outra obra “Golpes de Mão’s”, se apresentava como o segundo volume do diário, leitura estimulante, mas não chegava ao sopro anímico do primeiro; terceiro, a biografia do General Tomé Pinto, da responsabilidade da jornalista e investigadora Sarah Adamoupoulos. O impulsionador deste quarto documento é um homem sentimental que ainda hoje nos impressiona tanto pela memória dos acontecimentos vividos, como pela sua arte de contar, não é a primeira vez que o oiço de voz embargada e lágrimas a bailar nos olhos, Binta e arredores não lhe saem do coração.

Entendeu Belmiro Tavares, de colaboração com JERO, regressar ao tempo dos acontecimentos, começa quase como a forma de um diário, de uma agenda volumosa, pretende contar tudo o que aconteceu, relembrar factos desagradáveis, e aí mostra-se inabalável na descrição até de atos irresponsáveis, fraquezas várias, comportamentos impensados.

Seguindo uma cronologia convencional, temos a chamada para Mafra, a recruta e a especialidade em Mafra, tudo em 1963. No início de 1964, Belmiro Tavares está no RI 16, em Évora, onde em abril se forma a CCaç 675, inicialmente o seu futuro parecia talhado para Moçambique, dá-se a mudança de rumo para a Guiné. Convém não esquecer que por essa época se estavam a precipitar acontecimentos na colónia, tudo se agravava, Arnaldo Schulz pedia mais efetivos, alguns foram-lhe concedidos, inclusive meios aéreos. O Uíge leva-os até Bissau, a narrativa recorda uma vez mais que os oficiais e os sargentos iam bem instalados e as praças viajavam em condições imundas, nas entranhas do barco, escuras e fedorentas, numa atmosfera pestilencial. Estamos em maio, chega-se à Guiné, os oficiais ficaram alojados num avelhantado prédio sem água corrente, os soldados de novo alojados em péssimas condições, camas era coisa que não havia.

Da primeira à última página deste relato que excede as 500 páginas, a figura central, carismática, tratada com todos os encómios, é o capitão do quadrado, o autor recorda que nenhum dos homens da CCaç 675 veio a sofrer do síndroma pós-traumático de guerra, a sua unidade militar era a gloriosa, era e continua a ser. Em junho, rumam para Binta, nesse tempo a guerrilha toma praticamente conta de toda a região, cultiva placidamente, do Senegal, através de Dungal avança-se para Sambuiá e daqui para o Oio, será esta a rota preparada por Osvaldo Vieira para receber Amílcar Cabral e Gérard Chaliand quando ambos visitam a região, em 1964, o livro de um dos mais eminentes historiadores dos conflitos revolucionários do século XX será publicado no ano seguinte, na Maspero. Tomé Pinto pretende atrair populações a Binta e limpar o seu setor até Guidage. E o leitor imediatamente começa a ouvir falar em Sanjalo, Lenquetó, Caurbá, e outros pontos de constante visita.

O diário da guerra abre com uma descrição de Binta e no dia 3 de julho abrem-se as hostilidades, visita-se a Tabanca de S. João, a 4 quilómetros e depois Genicó Mandinga. População em fuga, há tiros, a tropa apercebe-se que toda aquela gente vive o drama de ter que tomar um partido, crueldade não falta, mesmo que se fuja para o Senegal há sempre ameaças, é preciso estar do lado da guerrilha, há aldeias queimadas, picadas intransitáveis. No dia seguinte, é o batismo de fogo, em Lenquentó, descobre-se que a picada para Guidage está polvilhada de abatises.
No adianto do relato, Belmiro Tavares explica-nos o funcionamento do quadrado:
“Saindo a pé do quartel, normalmente em noite escura, seguíamos em fila indiana; ao amanhecer, se aconselhável, passávamos a duas filas: os dois pelotões deslocavam-se lado a lado. Quando nos aproximávamos de um local potencialmente mais perigoso, ou havendo contacto com o inimigo, em escassos segundos, formávamos o nosso quadrado. Esta formação de combate era, para nós, muito querida, porque nos permitia grande poder de fogo em todas as direcções. Caminhar em fila, no meio do mato, entre árvores ou arbustos, no meio do capim, muitas vezes mais alto do que nós, não era tarefa fácil e o homem da frente tinha de ser substituído com alguma frequência. Caminhar pelas matas em quadrado, é uma tarefa muito mais desgastante porque a linha da frente tem de abrir 16 trilhos… Apenas tantos quantos os homens das duas secções que as constituem. Se seguíssemos em duas filas paralelas e se se tornasse obrigatório formar o quadrado fazíamo-lo em dois tempos: as duas secções da frente, uma de cada pelotão, formavam uma linha de 16 homens; as duas secções seguintes afastavam-se lateralmente uma da outra, colocando-se no enfiamento de dois extremos da linha da frente; as duas últimas secções formava, em simultâneo, a linha da retaguarda daquela hábil e eficiente formação de combate.
Progredir em quadrado no meio do matagal era difícil e extenuante; fazê-lo em corrida e debaixo de fogo, era dose para leão. Rodar o quadrado em velocidade, sem desalinhar (como se no cruzamento das diagonais houvesse um eixo vertical) para que enfrentássemos adversários sempre com uma frente de 16 atiradores, era tarefa hercúlea. A verdade é que fazíamos aquilo em absoluta sincronia. Se uma das laterais era atacada em força, a frente e a retaguarda alinhavam com esse lado e logo atacávamos com uma linha de 40 combatentes. Se fossemos atacados pela retaguarda, o quadrado não rodava; todos fazíamos meia volta e, em quadrado, logo atacávamos, afugentando os guerrilheiros. Estas mudanças bruscas eram uma grande surpresa para eles. Por vezes, o nosso sábio capitão e os subalternos entendiam que ainda não era hora de mudar a formação e já um outro soldado alertava os oficiais para se proceder à alteração. Era difícil e cansativo mas era preferível andar em quadrado e ter segurança do que procurar facilidade que só nos traziam perigo. As secções de cada pelotão rodavam as posições sempre que saíamos para o mato, para que não fossem sempre os mesmos a enfrentar o maior sacrifício, encabeçando o quadrado. Cada secção sabia, em cada dia, qual era o seu lugar na coluna. Se saíamos nas viaturas a ordem era a mesma”.

E vamos entrar agora num rodopio operacional tão persistente, tão atuante, que o PAIGC, à cautela, abandona todas as posições que detinha na região de Binta.

(continua)



Belmiro Tavares, o primeiro à direita, segue-se o  JERO, o comandante do navio e Virgínio Briote, um contemporâneo da CCaç 675, fotografia já existente no nosso blogue (, publicada aquando da entrada do Belmiro Tavares, em 1/11/2009, para a Tabanca Grande), A foto é do JERO.
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Nota do editor

Último poste da série de22 de março de 2019 > Guiné 61/74 - P19610: Notas de leitura (1161): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (78) (Mário Beja Santos)

sábado, 10 de dezembro de 2016

Guiné 63/74 - P16820: (De)Caras (57): Fotos da sessão de lançamento, em Lisboa, no passado dia 6, do novo livro de Mário Beja Santos, "História(s) da Guiné-Bissau"


Foto nº 1 > O autor Beja Santos, ladeado pelos seus amigos e convidados que falaram da obra, António Duarte Silva, à direita, e Eduardo Costa Dias, à esquerda (*)


Foto nº 2 >  António Duarte Silva, autor de “Invenção e Construção da Guiné-Bissau”  (Edições Almedina, 2010), e a quem eu convido para integrar a nossa Tabanca Grande


Foto nº 3 > Eduardo Costa Dias, antropólogo, professor e investigador, ICSTE-IUL, membro da nossa Tabanca Grande


Foto nº 4 > Mário Beja Santos


Foto nº 5 > Aspeto geral da assistência


Foto nº 6 > Dois grã-tabanqueiros: José Eduardo Oliveira (Jero) e Belmiro Tavares


Foto nº 7 > Outro nosso grã-tabanqueiro, Jorge Araújo, na  sessão de autógrafos


Foto nº 8 > O autor e a representante da editora (Edições Húmus, Vila Nova de Famalicão)


Foto nº 9 > À esquerda, o historiador Armando Tavares da Silva, recentemente galardoado com o prémio a Fundação Calouste Gulbenkian, História da Presença de Portugal no Mundo. pelo seu  livro "A Presença Portuguesa na Guiné, História Política e Militar (1878-1926)". O prémio foi dado pela Academia Portuguesa da História, e a cerimónia de entrega decorreu no dia 7 do corrente, na sede desta Academia, Palácio dos Lilases, Lisboa. A cerimónia foi presidida pelo Presidente da República.

O prof Armando Tavares da Silva foi convidado nesta data parta integrar a nossa Tabanca Grande.


Foto nº 10 > O mestre de corá Braima Galissá e, a seu lado, o nosso grã-tabanqueiro, que veio expressamente de Aveiro, onde mora, o Francisco Gamelas. Registo também a presença do José Brás (que não aparece aqui nas fotos, só na foto nº 5)... Lamentavelmente cheguei tarde, perdi o início da sessão, com a atuação do Braima Galissá. E devo acrescentar que o sistema de som, no auditório, estava péssimo. Fiz dois ou três  pequenos vídeos com as intervenções dos oradores (LG)

Lisboa > Auditório da Associação Nacional de Farmácias >  6 de dezembro de 2016 > Sessão de lançamento do novo livro de Mário Beja Santos, "História(s) da Guiné-Bissau" (**)

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2016). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

terça-feira, 8 de novembro de 2016

Guiné 63/74 - P16699: Debates da nossa tertúlia (I): Nós e os desertores (21): Mário Moutinho Pádua, o primeiro oficial português a desertar, em Angola, em outubro de 1961... Será, mais tarde, médico do PAIGC, no hospital de Ziguinchor, entre fevereiro de 1967 e setembro de 1969... Regressou a Portugal em novembro de 1974, e cumpriu o resto do serviço militar... Aposentou-se em 2003 como médico do Hospital Pulido Valente (Juvenal Amado)


Guiné > s/l > c. 1964/66 > Coluna em movimento 

Foto do álbum de Belmiro Tavares, ex-alf mil, CCAÇ 675 (Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), Prémio Governador da Guiné (1966).

Foto: © Belmiro Tavares (2010). Todos os direitos reservados. [Edição; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)


Imagem à esquerda: capa do livro No percurso de guerras coloniais, 1961-1969 , de Mário Moutinho de Pádua. 1ª ed. Lisboa: Avante, 2011, 246 p. : il. ; 21 cm. (Coleção Resistência).

1. Texto enviado pelo Juvenal Amado, com data de ontem, e que pretende enriquecer o nosso debate sobre o tema "desertores".


Luís eu tenho em meu poder este  livro do Mário Pádua sobre o qual o Mário Beja Santos já ez recensão para o blogue (*). Comprei-o para oferecer ao Carlos Filipe e depois tive que lho pedir emprestado para o Mário. Também já viajou até Luanda, mas isso são outras histórias...



[Foto à direita: capa do livro do Juvenal Amado
"A Tropa Vai Fazer De Ti Um Homem - Guiné, 1971 - 1974" (Lisboa: Chiado Editora, 2015, 308 pp.;  o nosso camarada foi 1.º Cabo Condutor Auto Rodas, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74]

Mário Moutinho de Pádua (, que eu pensava ter nascido em Angola, mas não, nasceu em Lisboa, ) é um homem politicamente comprometido, julgo porém que essa faceta não deve pesar na análise que se poderá fazer da sua obra, bem do que ele nos conta sobre a sua deserção do BCAÇ  88 estacionado em Maquela do Zombo e as dificuldades que enfrentou,  muito mais difíceis do que ele alguma vez esperava.

Neste livro narra a sua impressionante experiência a seguir à deserção, nomeadamente as prisões e torturas de que foi alvo no Congo, a sua passagem pela Checoslováquia e o seu desencanto com vários aspectos do "socialismo real", a sua participação na construção de uma Argélia recém-libertada do colonialismo, e por fim a sua contribuição como médico na luta travada pelo PAIGC na Guiné

A edição tem um prefácio de Pepetela ( praticamente quatro páginas) que começa assim;

Mário de Pádua foi o primeiro oficial português a desertar em Angola em Outubro de 1961, acompanhado pelo o 1º  cabo Alberto Pinto.

Este seu livro é uma espécie de crónica de vida, onde conhecemos a sua fuga do Norte do país, acompanhado pelo Alberto Pinto, as prisões que conheceram no Congo, então Leopldeville, hoje R P. do Congo onde era inconcebível que soldados portugueses se recusassem a combater contra angolanos.

No livro também são descritas condições e traições entre e dentro dos movimentos de libertação, bem como as alterações das condições nos países de acolhimento, que se alteravam em relação aos militantes do MPLA , após os derrube e morte de líder independentistas como Ben Bella e Pratice Lumumba como exemplo.

Em relação a deserções que tive conhecimento transcrevo aqui parte de um meu comentário a esse respeito.

Desde cedo se falou nas deserções e dos refractários. Eu próprio, estive numa situação delicada sem culpa nenhuma quando destacado numa diligência em Santta Margarida, os responsáveis pelo meu depois batalhão de caçadores 3872 que se estava a formar em Abrantes, andaram mais de 8 dias à minha procura. Quando me apresentei,  vindo directamente de Sta Margarida, ainda levei um raspanete do capitão e tive de explicar onde tinha estado.

Mas em Alcobaça,  logo no início da guerra em 1961, desertou na noite do embarque um individuo filho de um dos mais prestigiados médicos ligados à oposição [, o dr. Lameiras]. Segundo creio, foi apanhado por suspeitas de atitudes conspiratórias clandestinas na universidade e foi incorporado e mobilizado para Angola. Naquela noite desertou e mais tarde se lhe juntou a irmã, também perseguida pelas mesmas razões. Depois do 25 de Abril a irmã regressou e foi dirigente do MDP-CDE mas ele só regressou alguns anos depois. Vim a saber que a sua fuga não foi aceite pela organização no exílio e durante muito tempo esteve entregue à sua sorte, gravemente doente,  a correr perigo de vida. As infiltrações pela PIDE eram temidas e,  assim, quem desertava por sua conta e risco, acabava por passar muito mal sem a solidariedade militante.

Dos casos de Cancolim [, CCAÇ 3489,] já aqui foram mais que falados. Mas Cancolim também veio a receber alguns soldados que,  tendo sido refractários, acabaram por beneficiar de amnistia de Marcelo Caetano e resolveram assim regressar. Também alguns saíram das prisões por delitos vários para serem embarcados e assim serem indultados dos castigos que tinham sido impostos.

Bem,  se ir para a Guiné se poderá chamar de indulto, é discutível .

Também alguns comentários fazem-me pensar nas palavras da “Maria Turra",  que dizia que era o medo que tínhamos dos nossos superiores, que nos levava a combater.

É que algumas deserções são aqui descritas dessa forma. (**)

Um abraço
Juvenal Amado


2. Mário Moutinho de Pádua - Notas biográficas

(i) nasceu em Lisboa a 3/10/1935;

(ii) aos 8 anos emigrou com os pais e o irmão para Angola, tendo a família fixado residência em Benguela;

(iii) aos 10 anos matriculou-se no liceu do Lubango onde se manteve até aos 13;

(iv) transferiu-se então para Portugal; voltou a Angola dois anos depois, desta vez para o liceu de Luanda onde os pais se encontravam;

(v) aos 17 anos iniciou o curso de Medicina em Lisboa que terminou em 1960;
(vi) convocado em janeiro de 1961 para o serviço militar foi enviado para Angola em abril de 1961 com o posto de alferes médico;

(vii) desertou do exército colonial em Outubro de 1961 pedindo asilo político no Congo-Kinshasa, asilo que só lhe foi concedido em fevereiro de 1962, tendo ficado preso até esta data;

(viii) pouco depois tornou-se assistente de especialidade no Hospital de Lovanium;

(ix) do Congo viajou para a Checoslováquia em setembro de 1963;

(x) seis meses depois seguiu para a Argélia onde trabalhou no Hospital de Mustapha até fevereiro de 1967;

(xi) na Argélia fez parte da Frente Patriótica de Libertação de Portugal (FPLN) que operava a rádio "Voz da Liberdade";.

(xii) em fevereiro de 1967 começa a prestar a sua colaboração profissional ao PAIGC; a  maior parte deste serviço ocorreu no "Lar" (Hospital) do Partido,  em Ziguinchor, no Senegal, perto da fronteira
com a então Guiné portuguesa;

(xiii) em setembro de 1969 parte para França, onde durante 5 anos efectua os estudos de especialidade e trabalha num hospital dos arredores de Paris;

(xiv) em novembro de 1974 regressa a Portugal; aqui termina o serviço militar e exerce actividade médica em Centros de Saúde e no Hospital de Pulido Valente em Lisboa de onde se aposenta em 2003.

Fonte: Angola-eBooks.com (com a devida vénia...)
___________________


(**) 7 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16695: Debates da nossa tertúlia (I): Nós e os desertores (20): Mais um caso "atípico" ? A deserção do soldado escriturário nº mec 2055276, Carlos Alberto Sousa Emídio, da CCAÇ 3476 (Canjambari e Dugal, 1971/73), em 17/8/1972, e cujo rasto se perdeu desde então...

quinta-feira, 3 de março de 2016

Guiné 63/74 - P15819: Inquérito 'on line' (39): Camarada, qual a tua opinião sobre os três a cinco principais problemas das NT no TO da Guiné ? 112 de nós já respondemos...E tu ? Podes responder até 6ª feira, dia 4, 17h36



Foto: Belmio Tavares (2010)
OPINIÃO: LISTA DE PROBLEMAS NO CTIG,  LOGO EM 1963 (COM-CHEFE, BRIG LOURO DE SOUSA)... 



Resultados preliminares (112 respostas no blogue, "on line", no canto superior esquerdo):




1. Deficiente instrução das tropas e quadros >

80 (71%)

2. Deficiente equipamento das unidades no terreno > 
70 (62%) 

6. Instalações inadequadas > 
69 (61%)


7. Cansaço das NT, sempre ansiosas por acabar a comissão e voltar para a metrópole >  

69 (61%)


4. Abastecimento (material, munições, víveres e água)  > 
44 (39%)


Votos apurados: 112
Responder até 6ª feira, dia 4, 17h36

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Nota do editor:

Último poste da série > 2 de março de 2016 > Guiné 63/74 - P15816: Inquérito 'on line' (38): Os três principais problemas das NT em setembro de 1963: Deficiência ou inadequação de (i) instrução militar, (ii) equipamento, e (iii) instalações... Nº de respondentes até agora: 61... Prazo de resposta até 6ª feira, dia 4, 17h36

terça-feira, 21 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14497: Lembrete (11): Sessão de lançamento do livro de Dora Alexandre, jornalista e filha de militar da Marinha, "O Outro Lado da Guerra Colonial" (A Esfera dos Livros, 2015): hoje, 3ª feira, dia 21 de abril, pelas 18h30, na loja FNAC do Colombo, Lisboa


Capa do livro "O Outro Lado da Guerra Colonial", de Dora Alexandre (Lisboa, A Esfera dos Livros,  abril de 2015,  336 pp., 17 €) (*)


Convite

A editora A Esfera dos Livros lança no dia 21 de abril pelas 18h30 na loja FNAC do Colombo, [Lisboa, ] uma nova edição sobre o conflito no Ultramar: “O Outro Lado da Guerra Colonial”, de Dora Alexandre, lança um olhar diferente sobre os anos que os militares portugueses passaram no Ultramar. 

Que realidade encontraram os militares portugueses num continente distante e desconhecido? O que faziam no tempo livre? Que peripécias viveram? A autora entrevistou mais de meia centena de combatentes e também alguns artistas, que partilharam vivências paralelas ao conflito armado: vivências do dia a dia, histórias divertidas, caricatas e insólitas.

O prefácio é do Prof. Adriano Moreira e a apresentação ficará a cargo do Comendador José Arruda (ADFA) e do jornalista Joaquim Furtado, autor da série documental “A Guerra”.



Entre os combatentes entrevistados, contam-se algumas caras conhecidas do meio artístico como os atores Rui Mendes, Vítor Norte, João Maria Pinto, Domingos Machado (Belle Dominique) ou João Mota, e ainda Manuela Maria, Io Apolloni, Rodrigo e Octávio de Matos, que atuaram em África para entreter os militares.



Todos os interessados são bem vindos na apresentação. 






2. Mensagens de Dora Alexandre, trocadas com os nossos editores:

(i) Mensagem de 1 de abril de 2015:




Boa tarde, não sei se se lembra de mim, sou Dora Alexandre, jornalista, e ajudou-me a entrar em contacto com alguns combatentes ligados ao blogue, para um livro.

O livro está finalmente pronto, chama-se "O Outro Lado da Guerra Colonial" e contém histórias de 57 entrevistados.

Gostaria de lhe agradecer e convidar-vos para o lançamento - é dia 21 de abril às 18h30 na loja FNAC do Colombo. Teria muito gosto na vossa presença.

O prefácio é do Prof. Adriano Moreira e a apresentação ficará a cargo do Comendador José Arruda (ADFA) e do jornalista Joaquim Furtado.

Envio um pequeno texto à laia de press release, caso queiram partilhar.

Muito obrigada por tudo! Dora

(ii)  Mensagem de 20/10/12, que o coeditor Carlos Vinhal depois reencaminhou para o correio interno da Tabanca Grande:

Caros senhores,

Sou Dora Alexandre, jornalista, e estou a contactar-vos porque vou escrever um livro baseado em histórias da Guerra Colonial, para uma editora.

Sendo eu filha de militar - o meu pai esteve 4 anos na guerra da Guiné e Angola e reformou-se há pouco tempo da Marinha - e tendo eu própria nascido em Angola, tenho muito empenho em dar o meu modesto contributo para a preservação da memória e para dar mais um pouco de voz a quem serviu o país no Ultramar.

Vou entrevistar ex-militares que estiveram na guerra para saber histórias e vivências. Caso acedam a dar-me uma ajuda, com entrevistas e contactos, poderei dar mais pormenores sobre a abordagem deste livro.

Podem encontrar informação sobre o meu percurso profissional aqui http://www.linkedin.com/in/doraalexandre

Agradeço, desde já, a atenção dispensada e aguardo uma resposta. Saudações cordiais, Dora Alexandre

(iii) Mensagem de 20/11/13



Olá, boa tarde,

Não sei se se recorda de mim, sou jornalista e estou a escrever um livro para a Esfera,  baseado em testemunhos do Ultramar. Ajudou-me ao início com a divulgação do meu pedido para entrevistas. Foi uma ótima ajuda, mais uma vez obrigada!

O trabalho já está adiantado e estou apenas a compor o leque de entrevistados, que já vai em 4 dezenas. Gostaria que fosse minimamente representativo. Ainda não tenho nenhum Ranger e gostaria de contactar o sr. José Romeiro Saúde, de Beja. Pode por favor ajudar-me?

Agradeço desde já a sua atenção. Saudações cordiais, Dora.

(iv) Resposta do nosso editor Luís Graça,com data de  21/11/13



Dora: Estou em Luanda... Aqui vai o contacto do José Saúde  (...) (*)

Um kandando. Luis Graça

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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 4 de março de  2015 > Guiné 63/74 - P14318: Lembrete (10): Apresentação do livro "As Mulheres e a Guerra Colonial", da autoria de Sofia Branco, hoje, dia 4 de Março de 2015, pelas 19h00, na Associação 25 de Abril (A25A), em Lisboa

(**) Vd. poste de 7 de abril de  2015 > Guiné 63/74 - P14442: Agenda cultural (390): Dora Alexandre, jornalista, apresenta “O Outro Lado da Guerra Colonial” (José Saúde)

(...) Eis a lista de entrevistados (a negrito e a amarelo, camaradas da Guiné, muitos deles nossos grã-tabanqueiros):

Ilustrino Alexandre Júnior, Marinha, Guiné 1971-73 / Angola 1974-75 (PAI); 
Domingos Machado, Exército, Angola 1973-74; 
Octávio de Matos, Artista; 


Belmiro Tavares, Exército, Guiné 1964-66; 
Francisco Nicholson, Artista; 
Carlos Miguel, Exército (Psico), Guiné 1967-69; 
Carlos Pereira, Exército, Angola 1964-65; 

Mário Gualter Pinto, Exército, Guiné 1969-71; 
Carlos Rios, Exército, Guiné 1965-67; 
João Paulo Diniz, Exército, Guiné, 1970-72; 
Manuel Valente Fernandes (Médico) Guiné 1973-74; 
Farinho Lopes, Exército, Moçambique 1970-72; 

José Santos, Exército (Enfermeiro) Guiné 1971-73; 
Fernando Costa, Exército, Guiné 1972-74; 
José Manuel Lopes, Exército Guiné 1972-74; 
Rui Neves, Força Aérea, Angola 1970-72; 

Amílcar Mendes, Comandos, Guiné 1972-74; 
José António Pereira, Comandos, Guiné 1972-74; 
Romão Durão, Marinha, Angola 1968-70 / Angola 1971-75; 
João Maria Pinto, Exército, Moçambique 1969-71; 

Armando Carvalhêda, Exército, Guiné 1972-73; 
António Almeida, Exército, Moçambique 1972-74; 
Alfredo Brás, Marinha, Moçambique 1970-1974; 
João Mota, Exército, Angola 1965-66; 

Vítor Oliveira, Força Aérea, Guiné 1967-69; 
José Pedro Reis Borges, Força Aérea, Angola 1972-74; 

Hugo Borges, Paraquedistas, Guiné 1972-74; 
José Avelino Almeida, Exército, Guiné 1970-72; 
Luís Rolo, Exército (Enfermeiro) Angola 1970-72; 
António Prates da Silva, Polícia Aérea, Angola 1974-75; 

Vítor Norte, Exército (Enfermeiro) Guiné 1973-74; 
Luís Pinhão, Paraquedistas, 1973-74; 
Carlos Vinagre, Comandos, Angola, 1971-73; 

Rosa Serra, Paraquedistas (Enfermeira) Guiné 1969-70 / Angola 1970-71 / Moçambique 1973; António Godinho Luís, Comandos, Angola, 1961-63; 
António Leal, Comandos, Angola, 1961-63; 
Rui Mendes, Exército, Angola, 1962-64; 
Raul Patrício Leitão, Fuzileiros, Moçambique 1966-68 / Missão Hidrográfica N.H. «Carvalho Araújo», Angola e S. Tomé, 1970-75;

José Paracana, Exército, Guiné, 1971-73; 
João Dória, Exército (Médico) Guiné, 1968-70; 
Io Apolloni, Artista; 
António Vasconcelos Raposo, Fuzileiros, Angola, 1973-75; 

Nuno Mira Vaz, Paraquedistas, Angola 1963-65 / Guiné 1966-68 / Guiné 1970-72 / Moçambique 1973-74; 
Rodrigo, Artista;
Mário Henriques Manso, Fuzileiros, Angola 1963-65, Angola 1966-68; 

Nazário de Carvalho, Exército (Capelão) Moçambique 1961-64 / Guiné 1964-66 / Angola 1970-72; 

José Romeiro Saúde, Ranger, Guiné 1973-74; 
Joaquim Santos, Exército, Guiné 1967-69; 
Agostinho Rocha, Exército, Angola 1965-67; 
Manuel Roque dos Reis, Fuzileiros, Moçambique 1968-70; 
José Manuel Parreira, Fuzileiros, Guiné 1964-66 / Angola 1966-69; 

Otelo Saraiva de Carvalho, Exército, Angola 1961-62 / Guiné 1971-73; 
Manuel Lopes Dias, Exército, Moçambique 1970-71; 

António Carreiro e Silva, Fuzileiros, Angola 1967-69 / Angola 1972-74 / Guiné 1974; 
Francisco Guerreiro Soares, Fuzileiros, Angola 1964-66 / Guiné 1969-71 / Guiné 1972-74; 
Carlos Alberto Acabado, Força Aérea, Angola 1963-65 / Angola 1965-70 / Angola 1971-75; Norberto Cardoso, Exército, Angola 1974-75; e

 Manuela Maria, Atriz, Angola e Moçambique 1962, Guiné 1967. (...)

sexta-feira, 2 de maio de 2014

Guiné 63/74 - P13082: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (47): CCAÇ 675, "A Gloriosa": "Uma ilha isolada"


1. Em mensagem do dia 26 de Fevereiro de 2014, o nosso camarada Belmiro Tavares (ex-Alf Mil, CCAÇ 675, Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), fala-nos da sua Unidade como sendo "Uma ilha isolada", pelo que fez enquanto força de intervenção e quadrícula no sector de Farim e pelo que faz na actualidade em prol dos seus ex-militares vivos, não esquecendo honrar os camaradas mortos.




HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DE BELMIRO TAVARES

Resposta a: 

47 - “Uma ilha isolada”

Com muito agrado, acabo de ler (desta vez fora de horas por motivos que não cabem aqui) o editorial do “Jornal de Famalicão” da pretérita sexta-feira, dia 21 de Fevereiro. Entendi não dever calar-me, não para contrariar a Exma. Diretora de tão prestigiado semanário, a minha amiga muito cara, Drª Teresa Mesquita, mas para corroborar a sua opinião, trazendo a lume uma exceção – seguindo o velho ditado em que a “dita” confirma a regra.

Peço mil desculpas aos muitos e mui dignos leitores do referido jornal por voltar a falar dum tema que já aqui foi, em parte, largamente escalpelizado, quer por mim quer pelo amigo JERO, o meu querido companheiro de armas – “hermano de sables”, como se diz do outro lado da paliçada -; eu lutei de espingarda na mão e ele usou, quase sempre apenas, a seringa. Ele sabe o que isto significa! Hoje aproveito a oportunidade que surgiu, a talho de foice – como soe dizer-se – para expor uma não menos heróica faceta da nossa CCaç 675, a Gloriosa.

A esta unidade que combateu incansavelmente, na Guiné Bissau, de 1964 a 1966, pertenceu um brioso famalicense, Álvaro Manuel Vilhena Mesquita, que lá faleceu, a 28 de Dezembro de 1964; era irmão da Exma. Diretora do J.F. Por ele por todos nós a CCaç 675 portou-se digna e heroicamente, durante os dois anos de dura luta; no após guerra, a gloriosa tem vindo a provar que, sem espingardas na mão, continua a ser uma unidade de elite, exemplar e diferente de todas as outras unidades, sem desprimor para ninguém. Não é essa, juro, a nossa intenção.

Há tempos, escrevendo para ex-alunos do Colégio de Oliveira de Azeméis (estabelecimento de ensino que frequentei) eu defendi que a minha “ida à guerra” foi uma das coisas boas que me aconteceram na vida e apresentei as seguintes razões:

1º Lá aprendi muito e, como ser humano, cresci bastante – no respeito pelo próximo, na disciplina, na camaradagem, etc.
2º Como consegui sobreviver tenho matéria quase infinda para transmitir e o bom Deus deu-me vida para levar a cabo esta complicada tarefa;
3º Naqueles dois anos intermináveis vividos à sombra de tremendas intempéries e no meio de desmedidos perigos constantes – 60 minutos por hora e todos os dias – entre inimagináveis dificuldades e carências de toda a sorte, tivemos oportunidade (e aproveitámo-la da maneira mais conveniente) de edificar um numeroso agregado familiar de mais de 160 membros, amigos de todas as horas (antes quebrar que torcer) e sempre prontos a enfrentar os maiores sacrifícios para safar o companheiro do lado de qualquer situação calamitosa em que se encontre.

Isto só foi possível porque fomos superiormente comandados e ensinados por um oficial (capitão) rico em qualidades sublimes. Não uso mais adjetivos porque, mesmo que citasse todos os qualificativos do mais completo dicionário da nossa língua, todos não seriam suficientes para classificar com rigor tão destacada figura de homem e de militar. Alguém já disse que nós “endeusamos” aquele capitão (há anos que é general) mas fazemo-lo em plena consciência de que ele merece todo o nosso carinho e reconhecimento e que ele sente o mesmo por nós. A CCaç 675 foi célebre na Guiné, fomos a unidade mais badalada de todas durante aqueles dois anos porque:

- “Limpámos” completamente a nossa zona;
- Conseguimos trazer do Senegal largas centenas de portugueses que ali se refugiaram para escapar às represálias dos “independentistas” que os espoliaram de seus bens. Passada a fronteira, no regresso, eles diziam: “não temos nada a não ser a fiança do capitão”!
- Por solicitação, devidamente fundamentada, do célebre “capitão do quadrado” (como os adversários o apelidaram) o Governador-geral, Sr. General Arnaldo Shulz forneceu toneladas de arroz e amendoim para semear, toneladas de arroz para comer e 100.000$00 para adquirir alimentos para aquela gente;
- Beneficiámos estradas e reconstruímos pontes que haviam sido queimadas para impedir a nossa passagem;
- Construímos duas pistas de aterragem;
- Edificámos uma escola onde umas dezenas de crianças nativas aprendiam a ler e a escrever na língua de Camões e contratámos, a expensas nossas, um “professor” para as alfabetizar.

Um belo domingo, cerca de 30 crianças, alinhados por alturas, compareceram junto à sede da Companhia para assistir respeitosamente ao hastear da Bandeira; enquanto Ela subia garbosa ao longo daquela haste tosca e informe, as crianças cantaram jubilosamente o Hino Nacional – uma agradável surpresa para todos nós.

- Construímos um posto de enfermagem e a nossa equipa médica preparou um eficiente grupo de “enfermeiros” que ali tratavam com desvelo assinalável os seus familiares e amigos;
- À volta da nova aldeia construímos CREB (circular regional exterior de Binta) entre o arame farpado e o casario; militarizámos uma série de jovens que, sob a nossa supervisão, faziam a defesa da tabanca;
- Custeámos a transladação dos nossos mortos para que as famílias pudessem fazer o funeral condigno;
- A cereja no topo do bolo – pusemos a funcionar as aulas regimentais (certamente caso único) e 32 militares que tinham apenas a 3ª classe de adultos, fizeram, em Farim, o exame da 4ª classe;
- O indomável capitão de Binta pretendia que os seus rapazes estivessem permanentemente ocupados com tarefas válidas e úteis para que não pensassem em coisas tristes, o que os desencorajaria. Regressámos da Guiné, em Maio de 1966, e a nossa obra continuou, agora em moldes diferentes:
- Conseguimos os endereços completos de toda a gente; foi a primeira tarefa bastante complicada… mas conseguiu-se;
- Todos os anos, no primeiro ou no 2º domingo de Maio, a companhia reúne-se; no 1º ano éramos 24 elementos, mas chegámos a reunir 150 pessoas. É um encargo complicado juntar tanta gente, tendo em conta que temos militares em todas as províncias e na Madeira, apenas não tínhamos representação nos Açores. Se um companheiro não tem condições para pagar o almoço, pouco importa e alguém há-de pagar:
- todos os presentes o fazem sem regatear. Antes do almoço rezamos missa pelos nossos já 43 mortos;
- Temos vindo a colocar lápides nas sepulturas de todos os que já partiram;
- Os familiares de alguns dos nossos falecidos reúnem connosco;
-Conseguimos alguns empregos para companheiros ou familiares em dificuldades;
- No meio disto surgiu uma briga (uma boa briga) na nossa companhia; como todos somos adultos e pessoas de bem a contenda foi resolvida a contento. É caso para dizer: entre nós não há casos insanáveis; se surgem… ultrapassam-se sem molestar ninguém.

Um dos nossos “colocadores” de lápides alegava ter celebrado um contrato válido com o S. Pedro, segundo o qual ele ficava autorizado a viver até aos 120 anos, para colocar as lápides nas sepulturas de todos os companheiros; logo surgiu um desmancha-prazeres a “puxar a brasa à sua sardinha”: Não! Não! O último sou eu! Vimos a cara dele e todos concordámos, pois o seu nome é nem mais nem menos, este: Firmino António Carola Padre Eterno! Vejam só o que nós temos na CCaç 675!

- Surge agora a última obra de longo alcance que continuará a fazer-nos diferentes; vai ser agora divulgada para confirmar o editorial do Jornal de Famalicão da passada semana, sendo a exceção que confirma a regra. A CCaç 675 é agora também uma Associação se Socorros Mútuos.

Tivemos conhecimento que um dos nossos elos estava em dificuldades com o fisco; foi aconselhado a aceitar a divisão da dívida em parcelas suaves e temos vindo a colaborar no seu pagamento para que não vão “sobre a sua casa” o seu único bem material.

“Vejam agora os sábios da escritura / que segredos são estes da natura!”

Parece que não restam dúvidas que a CCaç 675… É realmente diferente de todas as outras.

Lisboa, 26 de Fevereiro de 2014
BT
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Nota do editor

Último poste da série de 9 DE FEVEREIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12700: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (46): Ocupação dos tempos livres

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12700: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (46): Ocupação dos tempos livres

1. Em mensagem do dia 23 de Dezembro de 2013, o nosso camarada Belmiro Tavares (ex-Alf Mil, CCAÇ 675, Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), fala-nos da ocupação dos "tempos mortos" e da actividade da sua Unidade para combater o stress do pessoal.


HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DE BELMIRO TAVARES

46 - Ocupação dos “Tempos Livres”

Uma das primeiras regras ordenadas pelo nosso capitão versava o tema dos “tempos mortos”; os oficiais foram “aconselhados” a acompanhar os seus soldados o mais possível e de sol a sol para que eles não se isolassem cada um em seu canto pensando em coisas tristes.
Podiam jogar a tudo e a nada; podiam escrever à namorada, à família, aos amigos e às madrinhas de guerra; era permitido contar anedotas, cantar e até assobiar; enfim: deviam estar sempre ocupados com qualquer tarefa.

Uma coisa era absolutamente proibida: passear em Bissau enquanto por lá estivemos, para não serem negativamente influenciados pelos boatos e aldrabices que circulavam vivamente entre a tropa da capital para que não partissem para o mato já “vencidos”.

Chegámos ao mato a 29 de Junho, dia de S. Pedro, à tarde; ao cair da noite, um pelotão fez uma caminhada de 3/4 km para incendiar umas “moranças”, já abandonadas (fogueiras de S. Pedro) avisando os independentistas da nossa chegada e das nossas boas intenções.

Iniciou-se logo, com grande azáfama a limpeza e a defesa do aquartelamento e o alojamento de todo o pessoal. Estas tarefas, porém, não se sobrepunham à actividade operacional.
Ao quarto dia, fizemos a primeira visita à “casa” do inimigo: fomos recebidos a tiro; houve mortos e feridos (do lado deles) e uma aldeia foi riscada do mapa.
O quinto dia foi célebre! Um imponente “baptismo de fogo” (ponham imponência nisso!) que nos marcou positivamente para o resto da comissão. O chamado pelotão de acompanhamento foi “desmantelado”; o pessoal (e respectivas armas) foi distribuído pelos outros pelotões que passaram a chamar-se “grupos de combate” (GComb).

A partir do baptismo de fogo, em dias alternados, dois GComb actuavam em qualquer recanto da zona. Ao fim de duas semanas (aproximadamente) alterávamos o ritmo actuando em dois dias consecutivos… para “enganar” o in., quebrando rotinas.

- Domingos e feriados eram diferentes… apenas porque se hasteava a bandeira.
- Nos dias livres (saída para o mato) continuávamos a preparar a defesa e a beneficiar as instalações.
- A Gulbenkian ofereceu-nos uma pequena biblioteca.
- De vez em quando, líamos jornais de há três ou quatro meses… mas líamos!
- Sempre que possível também líamos uns livros. Eu levei apenas os dicionários de alemão (correspondia-me com uma qualquer Merkel) e Os Lusíadas, o meu livro de cabeceira.
- Em Bissau só havia livros de guerra: J. Larteguy e L. Uris; comprei do que havia.
- Também dávamos lugar à música; a rádio Bissau emitia durante algumas horas em dois períodos; podíamos ouvir dezenas de vezes por dia o “Tango dos Barbudos” o disco que todos pediam – incrível!
- Também pescávamos, caçávamos e petiscávamos com os amigos; Mais tarde tivemos nativos (as) que regressaram no exílio forçado no Senegal; elas vieram embelezar as imediações do quartel
- Dedicámo-nos a construção civil:
- Reconstruímos pontes – beneficiámos estradas e picadas (uma picada com doze quilómetros passou a estrada)
- Construímos, partindo do nada, duas pistas de aterragem (uma era o aeroporto internacional de Binta)
- Ajudámos a reconstruir duas tabancas;
- Construímos o nosso estádio e a nossa igreja;
- Demos nomes às ruas (avenida Marginal, Avenida Capitão de Binta, Avenida do aeroporto, Rua Pathé Baldé, Largo “tomada da pastilha”, Rua 4 de Julho, etc.)
- Construímos uma escola para os miúdos “retornados”
- “Contratámos um professor (que não fazia greve) para leccionar a primária

NOTA: Para grande surpresa nossa, os alunos daquela escola, descalços e semi-nus, alinhados por alturas, assistiram ao hastear da bandeira e cantaram, orgulhosamente, o Hino Nacional (ainda com canhões).
Nesse dia, a nossa verde/rubra (ainda tinha o vermelho) “tremeu”, heroicamente, por ter mais aqueles dedicados filhos.


Reprodução das páginas 4 e 5 do trabalho do nosso camarada José Eduardo Oliveira (JERO), ex-Fur Mil Enf da CCAÇ 675, intitulado "O Sabre - 47 anos depois do regresso - Ontem e Hoje"

- Durante cerca 6/7 meses funcionaram eficientemente as aulas regimentais (prova que a nossa CCAÇ 675 se comportava como um grande Regimento) e trinta e duas praças, com apenas a 3ª classe de adultos, fizeram lá a 4ª classe.
- Quando nos acontecia um trágico acidente, no dia seguinte a companhia saía toda para o mato, ficando o quartel entregue ao 1º sargento (por vezes ao médico), aos “não operacionais” e doentes.
Dávamos assim cumprimento a duas teorias:
Primeira: se caíres de um cavalo monta logo outro cavalo;
Segunda: se formos todos para o mato os turras não têm a preocupação de vir procurar-nos ao quartel, pois estamos lá, perto deles.
- A nossa actividade operacional começou a diminuir - lentamente - a partir dos quinze meses porque já tínhamos a zona completamente limpa, e também porque seria humanamente impossível manter aquele ritmo durante os dois anos.
- Quando um alferes entrava de férias, os furriéis faziam o mesmo e o GComb só fazia serviço de escala; os soldados tinham assim as suas férias.
- Todos escreviam cartas e bate-estradas; alguns abusavam; eu escrevia e recebia 15 a 20 cartas por semana.
Como podem depreender, ali havia tempo para tudo e os “tempos mortos” eram quase, quase, quase nulos, graças ao nosso heróico e admirável capitão, o maior sábio da tropa àquela época que pretendia que o seu pessoal estivesse sempre ocupado. Penso que por isso mesmo nenhum dos nossos elos veio a sofrer do dito stress de guerra.

Valeu a pena!
Lisboa, 23 de Dezembro 2013
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Nota do editor

Último poste da série de 26 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12637: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (45): Carta de condução