Mostrar mensagens com a etiqueta CCAÇ 1439. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta CCAÇ 1439. Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

Guiné 61/74 - P22940: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte XVI: brutal ataque ao destacamento e tabanca de Missirá na véspera do Natal de 1966


Foto nº 1 > Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 1439 (1965/67) > Destacamento de Missirá > Malan Soncó, Régulo de Missirá com o Alferes Crisóstomo




Foto nº 2 > Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 1439 (1965/67) > Destacamento de Missirá > 
O Régulo de Missirá e os homens grandes da tabanca de Missirá com o “novo” alferes de pé entre ele e o seu irmão; com os homens grandes estão os 3 furriéis do 2º pelotão : Agostinho Neiva, de pé à direita, o furriel Lopes no meio e no lado esquerdo o furriel Bonifácio.




Foto nº 3 > Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 1439 (1965/67) > Destacamento de Missirá > 
Esta foto com as bajudas de Missirá evidencia o bom relacionamento existente.


Foto nº 4 > Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 1439 (1965/67) > Destacamento de Missirá > Mesmo  num destacamento havia momentos de descontracção. Não sei qual a ocasião . Na foto estou com o novo médico do BCAÇ 1888, Paulo Patracki que substituiu o medico Francisco Pinho da Costa que tinha sido evacuado para Bissau e daí para Lisboa, vítima duma mina em 21 de Agosto de 1966.


Fotos (e legendas): © João Crisóstomo (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


A CCAÇ 1439 teve como unidade mobilizadora o BII 19 (Funchal), partiu para o CTIG em 2/8/1965 e regressou a 18/4/1967, tendo passado por Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole, Missirá, Fá Mandinga. O comandante era o cap mil inf Amândio Manuel Pires, já falecido. Alferes (milicianos): Freitas (Funchal, Madeira), Crisóstomo (Torres Vedras, hoje a viver em Nova Iorque), Sousa (Vila Nova de Famalicão), Zagalo (Lisboa, ator de teatro, já falecido).






João Crisóstomo, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (1965/67)
(a viver em Nova Iorque desde 1977,
depois de ter passado por Inglaterra e Brasil)


I. Continuação da publicação das memórias do João Crisóstomo, ex-alf mil at inf, CCAÇ 1439 (1965/67)


CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, luso-americano,
ex-alf mil, Nova Iorque) (*)


Parte XVI: Dia 23 de Dezembro de 1966 : Ataque ao destacamento e tabanca de Missirá



1. O ataque a Missirá foi um choque para todos. O Régulo de Missirá (Foto nº 1)  era como um amigo para todos e isso refletia-se na população com quem tínhamos um relacionamento muito bom, direi quase de família (Fotos nºs 2 e 3).

Virei a saber que,  depois de termos ido embora,  o mesmo relacionamento continuou como tive o prazer de ler nos escritos e livros de Beja Santos, especialmente no seu “Diário da Guiné, em Terras de Soncó.” As fotos que acima de reproduzem, tiradas antes do ataque,  ilustram bem este bom relacionamento

Embora o destacamento de Missirá nesta data ainda estivesse sob a responsabilidade da CCaç 1439 no Enxalé, o destacamento de Missirá já tinha recebido nesta altura, como já tinha sucedido em Porto Gole, o reforço de um pelotão de nativos, (o Pel Caç Nat 54, segundo me informaram) devidamente treinados pelas NF, comandado pelo Alferes Marchand. Isto dava mais flexibilidade e possibilidades à CCaç  1439 para outras “tarefas”.



Foto nº 5 >
 Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 1439 (1965/67) > Destacamento de Missirá >  Aspeto geral da tabanca



Foto nº 6 > Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 1439 (1965/67) > Destacamento de Missirá > O sold trms Júlio Martins Pereira.

Estas duas fotos (nº 5 e 6) são da autoria de Júlio Pereira : a 1ª mostra parte da tabanca; na 2ª foto o Júlio Pereira e o seu rádio de transmissões no largo dessa tabanca

Fotos (e legendas): ©  Júlio Martins Pereira  (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].





Foto nº 7 >
 Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 1439 (1965/67) > Destacamento de Missirá  > O 
Alferes Marchand, cmdt do Pel Caç Nat 54, no dia do ataque do IN a Missirá.



Foto nº 8 >
 Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 1439 (1965/67) > Destacamento de Missirá  > O alf mil Freitas.



Foto nº 9 >
 Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 1439 (1965/67) > Destacamento de Missirá >  Sob o comando do Alferes Freitas (foto nº 8)  veio uma coluna do Enxalé, na qual me incorporei. Nesta foto, aqui estou eu,   “sem poder acreditar”, olhando os resultados do ataque.  O ex-fur mil José António Viegas, do Pel Caç Nat 54. tem também excelenets fotos do dia seguinte ao ataque a Missirá: vd. postes  P2105 e 2107 (**).


Fotos (e legendas): © João Crisóstomo (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



2. No dia 23 de Dezembro de 1966,  o IN atacou em grande força o destacamento de Missirá com efectivo muito numeroso, cercou toda a tabanca, tendo utilizado morteiro 82, canhão sem recuo, metrelhadoras pesadas 12.7 e toda a espécie de armamento automático.

"As NF reagiram convenientemente pelo fogo e com calma, não permitindo,  apesar do incêndio declarado na tabanca em consequência do fogo IN e do grande volume da forca atacante,  qualquer desmoralização nas nossas fileiras. 

"O ataque que durou cerca de 75 minutos alertou as forcas aquarteladas em Enxalé que,  não tendo ligação rápida com o destacamento de Missirá, decidiram ir em seu auxílio. Devido à distância Enxalé-Missirá, as forças idas do Enxalé quando chegaram à região de Missirá não encontraram já os elementos atacantes,  tendo-se verificado que os mesmos tinham dispersado para N por vários itinerários."

Resultados: f
eita uma batida a toda a zona  em volta de Missirá foi encontradomo seguinte material:

  • 1 granada de mão defensiva REGD-5;
  • 1 cunhete de granadas para canhão sem recuo;
  • vários invólucros de calibre 12,7 e 7,62 e uma fita de met 12,7.

O IN sofreu baixas confirmadas em número não estimado. Não houve baixas nas NT. A população civil, por seu turno,   sofreu 4 mortos e três feridos,  os quais foram evacuados para Bissau.

Do incêndio resultaram avultados prejuízos materiais- quer em material de querra e aquartelamento, quer em artigos de cantina e rancho em virtude de terem ardido 3 casas pertencentes à tropa e 5 à população civil.

Diversos - Foi salientado na acção o seguinte pessoal:

  • Régulo de Missirá, Malan Soncó;
  • Soldado Cond Auto  nº 5406064, António dos Santos Campos;
  • Soldado At nº 820 27666, Armando Félix Dionf, do Pel  Caç Nat 54.

Todos estes elementos foram louvados pelo Exmo Comandante Militar.

Referência apreciativa do Agrupamento 24:

"Comunico a V.Excia que causou a melhor impressão, neste Comando, a decisão tomada pelo Comandante da CCaç 1439 e medidas que pôs em prática para interceptar o IN, atacá-lo e aniquilá-lo se possível.

Gorou-se o esforço dispendido por falta de contacto mas o poder de determinaçnao daquele comandante, sua capaciade para montar uma operação, espírito de sacrifício e combatividade de suas tropas ficou bem vincado, o que me apraz registar.”

(Continua)
____________

Notas do editor:


(**) Vd. postes de:

14 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2105: Recordações do 1º Comandante do Pel Caç Nat 52 (Henrique Matos) (1): Ataque a Missirá em 22 de Dezembro de 1966 (Parte I)

domingo, 26 de dezembro de 2021

Guiné 61/74 - P22847: Memória dos lugares (434): Hospital Militar de Hamburgo, onde estiveram internados, para tratamento e reabilitação, camaradas nossos deficientes como o Quebá Soncó (CCAÇ 1439) e o António Dias das Neves (CCAV 2486): não se sabe quantos, mas devem ter sido algumas centenas de um total de mais de 1800 "amputados", entre 1964 e 1974


Alemanha Ocidental > Hospital Militar de Hamburgo > c. 1970 > "O meu Pai é o que está na cadeira de rodas com o prato na mão. Esteve lá 8 meses. Antes passou pelo anexo de Campolide, em Lisboa, onde fez 18 operações" (Marisa Neves).



Alemanha Ocidental > Hospital Militar de Hamburgo > c. 1970 > "O meu pai é o que está no lado direito, de camisola acastanhada, sentado na cadeira de rodas" (MN)


Alemanha Ocidental > Hospital Militar de Hamburgo > c. 1970 > "O meu pai é o que está de frente, de  camisola acastanhada" (MN)


Alemanha Ocidental > Hospital Militar de Hamburgo > c. 1970 > "O meu pai é o que vem com duas muletas,  de camisola branca" (MN)



Alemanha Ocidental > Hospital Militar de Hamburgo > c. 1970 > "O meu pai é o de camisola castanha, sentado na cadeira de rodas, em primeiro plano " (MN)



Alemanha Ocidental > Hospital Militar de Hamburgo > c. 1970 > "O meu pai sentado na cadeira de rodas, e com um camarada ao lado" (MN)



Alemanha Ocidental > Hospital Militar de Hamburgo > c. 1970 > "O meu pai, junto a um lago, amparando-se a m camarada" (MN)

Antiga Alemanha Ocidental  (ex-RFA - República Federal Alemã) > Hamburgo > Hospital Militar de Hamburgo > Álbum fotográfico de António Dias das Neves (1947-2001) (*) 


Fotos (e legendas): © Marisa Neves (2011) Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Depois de ter ficado sem as duas pernas, devido ao acionamento de uma mina A/P, a norte de Bula, no decurso da tão mediatizada Op Ostra Amarga, 18 de Outubro de 1969, o sold at cav António Dias das Neves, da CCAV 2486/BCAV 2868 (1969/70), foi evacuado para a metrópole, longe dos holofotes da televisão e do voyeurismo dos jornalistas franceses... e daqui para a Alemanha

Sabemos que passou esteve no Hospital Militar da Estrela, anexo de Campolide, desde finais de 1969. Deve ter ido no ano seguinte   para o prestigiado Hospital Militar de Hamburgo, na Alemanha  onde recebeu, com sucesso, duas próteses que lhe permitiram refazer a sua vida como civil... na sua terra natal, Ramada, Odivelas.

"O meu pai fez bastantes amigos durante os 8 meses que esteve em recuperação no hospital de Hamburgo. Sei que fartou-se de passear, pois tenho alguns postais de vários sítios da Alemanha que o meu pai mandava para a minha avó", escreve-nos a sua filha Marisa Neves.

"Sei também que o meu pai foi um caso de sucesso na adaptação das próteses, sei que fizeram bastantes arquivos documentados para próximos doentes".

"As pessoas que acompanham o meu pai nas fotos, infelizmente não sei quem são, só ele poderia dizer ou a minha avozita que infelizmente faz agora dia 6 de Novembro [ de 2011] num ano que me deixou. O meu pai sempre foi um homem de coragem e de orgulho".


Em 1979 nasceu a sua primeira filha, Marisa Neves. Estas fotos, recebidas originalmente sem legenda, documentam a parte final, germânica, do seu calvário da Guiné...

Sobre a hospitalização do seu pai, a Marisa disse-nos o seguinte:

 "Em relação aos hospitais, infelizmente não sei datas concretas, acho que ele foi, primeiro, para Bissau [ HM 241]   e depois veio para Portugal [ HMP] . A seguir foi transferido para Alemanha. Sei que esteve algum tempo na Alemanha em tratamentos e recuperação para adaptação das próteses". 

E, ao que parece, adaptou-se bem, do ponto de vista funcional, às suas novas pernas artificiais, segundo o testemunho da filha.

Há um ponto que não conseguimos (ainda)  esclarecer com a Marisa. Diz ela que, de acordo com a caderneta militar, o pai foi "evacuado para o HMP em 6/11/71"... "por despacho de 30/12/70 de sua Excia o Secretário de Estado do Exército" (?)... 

Admitamos que é um erro de transcrição, dela ou do burocrata do exército... Não é crível que tenha ficado mais de dois anos no HM 241, em Bissau (contando o período que medeia entre a data dos ferimentos em combate, 18/10/1969, e a alegada mas improvável data de evacuação para o HMP, 6/11/71)... É mais provável que a data seja 6/11/1969... Por outro não se entende a referência ao "despacho" do Secretário de Estado do Exército, de 30/12/70.

Por outro lado,  foi-lhe contado 100% o  tempo  de  serviço militar no TO da Guiné, desde 1/3/169 (data de desembarque da CCAV 2486) ate´31/12/1970.

Foi condecorado com a Cruz de Guerra de 4ª Classe.




Fonte: Revista de Cavalaria: Anais da Cavalaria Portuguesa, Ano de 1971, pág. 96



2. De qualquer modo, o que importa é sublinhar a novidade destas fotos do álbum da filha de uma camarada nosso, já falecido, integrado na Tabanca Grande a título póstomo (poste P8910) (*),  em 2011, quando aqui foram publicadas (poste P8914) (**) eram as primeiras de camaradas nossos, feridos gravemente na guerra de África, e n0meadamente amputados, que foram beneficiários do programa de tratamento e reabilitação do Hospital Militar de Hamburgo...  

Não sabemos quantos por lá passaram, pro Hamburgo, por causa das próteses...Um deles foi o Quebá Soncó, que também perdeu uma perna, no dia 7 de dezembro de 1966, ao serviço da CCAÇ 1439 (***). 

 O mesmo se passa com o CMRA - Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitção, inaugurado em 1966 ... Não sei se a ADFA - Associação dos Deficientes das Forças Armadas tem informação estatística, ou dados históricos, adicionais, com referência  aos utentes portugueses do Hospital Militar de Hamburgo, entre 1964 e 1974.

Segundo Pedro Marquês de Sousa ("Os números da Guerra de África". Lisboa, Guerra & Paz Editores, 2021, pág. 144),  dos cerca de 28 mil feridos graves evacuados durante a guerra (nos 3 teatros de operações),  "resultaram cerca de 14 mil deficientes  (5120 com grau de deficiência superior a 60%)"...  

Desses 14324 feridos graves e deficientes, 1852 estão classificdos na categoria de "amputados" (12,9%), dos quais 480 em Angola, 540 na Guiné, 697 em Moçambique e 135 na instrução e serviço militar. (Algumas centenas destes amputados deverão ter sido tratados e recuperados no Hospital Militar de Hamburgo, acrescentamos nós.)

À Marisa já aqui deixámos, em 2011, o nosso profundo reconhecimento por querer partilhar, connosco, com os camaradas do seu pai, este cantinho da sua intimidade, o álbum fotográfico do seu querido pai e seu grande herói (**).



3. Sobre o programa de reabilitação dos deficientes da guerra colonial no Hospital Militar de Hamburgo (****), iniciado em 1963, publicamos uma "nota histórica",  excerto da revista ELO, da ADFA - Associação dos Deficientes das Forças Armadas, julho de 2013, pág. 9, com a devida vénia:


Pequeno historial

Em 1963 uma delegação alemã visitou Portugal. Integrava essa mesma delegação o General médico, Diretor do Serviço de Saúde Militar da República Federal da Alemanha, que foi convidado pela Cruz Vermelha Portuguesa, através do então Movimento Nacional Feminino, a visitar o Hospital Militar Principal, onde já se encontravam um número significativo de deficientes vindos dos conflitos das ex-colónias portuguesas de Angola, Guiné-Bissau e Moçambique.

Na sua maioria, esses mutilados eram vítimas de rebentamentos de minas. Esta visita deu origem à assinatura de um protocolo em que os médicos militares alemães aplicariam a sua ampla experiência adquirida com mutilados das primeira e segunda guerras mundiais, no tratamento dos mutilados portugueses. O referido protocolo também estava relacionado com a presença da Força Aérea Alemã na base de Beja e dependências em Alverca.

Em 1964, os primeiros deficientes de guerra foram internados no Serviço de Cirurgia do Hospital Militar de Hamburgo (nessa data chamava-se Standortlazarett, depois Bundeswehrlazarett) e eram levados diariamente para tratamentos para o hospital de acidentados em Hamburgo – Hospital de Bergedorf.

Em 1966, foi colocado no Hospital Militar de Hamburgo o então Capitão-de-Fragata, médico, Dr. Franz Traut, especialista em ortopedia de guerra, que criou o Serviço de Ortopedia e também foi o responsável pela instalação de uma casa ortopédica dentro do Hospital Militar.

Para complementar o processo, disponibilizou duas enfermarias, uma com seis camas e outra com quatro, destinadas aos deficientes das Forças Armadas portugueses. Criou também o Serviço de Fisiatria e chamou a fisioterapeuta, Srª. Frauke Maltusch, docente no Hospital Universitário de Eppendorf, em Hamburgo.

Os mutilados eram transportados de e para Portugal nos aviões militares de transporte alemães – a princípio Noratlas, depois Transal, sempre acompanhados por um oficial médico ou sargento enfermeiro portugueses. Os custos inerentes a todo o processo, eram suportados pelo Estado alemão.

Em 1975 e em virtude dos conflitos coloniais terem terminado, o número de camas foi reduzido para seis.

Em 1986, o então Capitão de Mar-e-Guerra, médico, Dr. Franz Traut, passou à situação de reforma (os médicos alemães eram obrigados a passar à reforma aos 60 anos) e foi substituído pelo Coronel médico, Dr. Joachim Niehaus.

Este acordo terminou em 1991 e os últimos deficientes militares regressaram a Portugal, em setembro de 1991. A partir desta data, apenas aqueles que necessitavam de tratamentos que não encontravam resposta em Portugal, eram autorizados a irem para o Hospital Militar de Hamburgo.

Atualmente, a chefia do Serviço de Ortopedia e Cirurgia de Acidentados é exercida pelo Coronel Médico, Dr. Bernhard Klein, o qual já efetuou diversas deslocações a Portugal, tendo visitado o então Hospital da Força Aérea e a ADFA.

O Dr. Franz Traut, a fisioterapeuta Frauke Maltusch e outros elementos ligados aos Deficientes das Forças Armadas (DFA), em 1981, foram condecorados pelo então Chefe do Estado-Maior do Exército, General Garcia dos Santos, em cerimónia pública no Estado-Maior do Exército.

Em 1977, o General Ramalho Eanes, na qualidade de Presidente da República, visitou os Deficientes da Forças Armadas no Hospital Militar de Hamburgo.

(***) Vd. poste de 25 de dezembro de  2021 > Guiné 61/74 - P22845: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte XV: Dezembro de 1966: a Op Harpa em que é ferido com gravidade o Quebá Soncó, que depois irá para o hospital de reabilitação de Hamburgo, na Alemanha
 
(****) Último poste da série > 8 de dezembro de  2021 > Guiné 61/74 - P22788: Memória dos lugares (433): Tabatô, a tabanca da utopia, a 10 km, a nordeste de Bafatá - Parte IV

sábado, 25 de dezembro de 2021

Guiné 61/74 - P22845: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte XV: Dezembro de 1966: a Op Harpa em que é ferido com gravidade o Quebá Soncó, que depois irá para o hospital de reabilitação de Hamburgo, na Alemanha


Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadicna) > CCAÇ 1439 (1965/67) > Missirá > O alf mil João Crisóstomo e o régulo do Cuor, Malan Soncó, alferes de 2ª linha.

Foto (e legenda): © João Crisóstomo (2021) Todos os direitos reservados. Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




João Crisóstomo, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (1965/67)
(a viver em Nova Iorque desde 1977, 
depois de ter passado por Inglaterra e Brasil)



1. Continuação da publicação das memórias do João Crisóstomo, ex-alf mil at inf, CCAÇ 1439 (1965/67)


CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, luso-americano,
ex-alf mil, Nova Iorque) (*)

Parte XV: Memórias do Quebá Soncó



Dias 2, 3 e 4 de Dezembro de 1966

Realizou-se a Op FIFA no Chão Balanta que consistiu em emboscadas e batidas na região de Colicunda, Durante as emboscadas não houve contacto com o IN.

Foram capturados três elementos , sendo dois de menor idade e entregues ao posto Administrativo e o terceiro entregue ao BCAç 1888.


Dia 7 de Dezembro de 1966

Eu fiz parte desta operação, mas não me recordo de pormernores, excepto do momento em que Quebá Soncó foi ferido. Por isso transcrevo o que consta do relatório até esse momento, e falarei/lembrarei depois Quebá Soncó.

(...) A CCaç 1439 realizou a Op Harpa na região a N de Cherel, a fim de explorar uma informação dum prisioneiro que disse conhecer a casa de mato de Cubadjal.

O prisioneiro que serviu de guia não colaborou devidamente com a tropa, tendo conduzido por um itinerário muito vigiadoo pelo IN. Desta forma as NT foram detectadas a cerca de 1.000 metros do acampamento por uma a sentinela dupla que se encontrava colocada sobre uma árvore absolutamente camuflada. À aproximaçnao das NT a sentinela disparou várias rajadas de P. M. alertando desta forma todo o acampamento. Quando as NT, numa tentativa de aproximação rápida do referido acampamento o mesmo encontrava-se abandonado. Feita uma batida, foi encontrada uma tabanca a qual tinha sido da mesma forma abandonada." (...) 

"Resultados obtidos: Destruiram-se 13 casas de mato no acampamento IN e 10 casas na tabanca satélite.

Foi destruida grande quantidade de arroz e capturados 4 pentes de munições cal 7.9.

Baixas estimadas em número não estimado."


E o relatório diz então que, "quando a sentinela disparava sober as NT ( portanto no início da aproximação) foi atingido numa perna o caçador auxiliar contratado Quebá Soncó, evacuado para o HMP". 

E o relatório prossegue:

(...) "Mais uma vez foi distinguido o 1º cabo nº 5939264, Dionísio Lopes Ferreira, tendo demostrado a sua competência e sangue frio,  não abandonado o ferido mesmo debaixo de fogo IN,  prestando uma assistência permanente e cuidadosa." (...)

Lembro bem esses momentos e a dedicação e sangue frio do cabo enfermeiro, como vem descrito.

O que discordo é do momento e situação em que isso aconteceu. Se isto tivesse sucedido durante a aproximação, não teria havido mais esse assalto ao campo inimigo, deixando o enfermeiro a cuidar de Quebá Soncó.

Estas “rajadas de metralhadora” e o ferimento de Quebá Soncó foram depois do assalto quando já regressávamos e de repente começou um forte tiroteio, que era a uma distância razoável e que durou algum tempo. 

 Lembro-me que estava a disparar a minha G3 como um louco para onde me parecia vir o fogo IN, quando o o Quebá Soncó, que estava mesmo ao meu lado esquerdo,   foi ferido. E lembro que o fogo, embora de longe, ainda continuou por algum tempo, e de ver o enfermeiro Dionísio, ainda o tiroteio não tinha acabado, a ajudar o Quebá Soncó e logo a pedir que chamassem um helicópetro para o evacuar para Bissau.

Não sei se Quebá Soncó era considerado “caçador auxiliar contratado”. Ele era o filho do régulo de Missirá, Malan Soncó, a quem na devida altura iria suceder como régulo de Missirá. O que sei é que ele estava sempre connosco,  sempre com um grande sorriso contagiante e sempre voluntário inspirando com o seu exemplo o resto do pessoal da tabanca. 

Depois do meu regresso a Portugal,    escrevemo-nos por algum tempo. A sua volta à Guiné, em outubro de 1967.   simultânea com a minha ida para a Inglaterra,  ocasionou a perda de contactos. Mas lembro-o sempre assim, amigo e brincalhão também. E assim continuou, mesmo depois de ter sofrido a amputação duma das pernas. 

Uma das cartas que seguem, foi escrita já depois de ter regressado à Guiné  (, datada de Bambadinca, 18 de outubro de 1967). A outra carta que junto também, escrita quando ele estava na Alemanha Ocidental (, Hamburgo, 6 de agosto de4 1967), é uma boa amostra da sua jovialidade. Nunca mais o esquecerei. Já falei de Quebá Soncó numa outra ocasião (Vd. poste P21797)  (**)

Acabada a Guiné, quando voltei, logo que fui a Lisboa  fui visitá-lo ao Hospital Militar Principal.  Ficou contente de me ver e mostrou vontade de conhecer Lisboa antes de partir para a Alemanha onde ia para lhe porem uma perna artificial. E, mesmo na condição em que ele estava, de muletas  – ele insistia que não era problema e se podia movimentar – eu peguei nele e de taxi andei com ele  dum lado para outro  e mostrei-lhe Lisboa tanto quanto pude fazer.  Ele não o esqueceu e  depois de voltar à Guiné escreveu-me uma carta lembrando isso, carta essa que faz parte  do mencionado Poste de 23 /01/21 (**).


Dia 17 de Dezembro de 1966

No dia 17 de Dezembro de 1966 realizou-se a Op Hera, no Chão Balanta. Noto que esta operação é quase uma repeticão de uma que teve lugar em 10 de Junho, operação GOLO 1. A região era realmente muito perigosa, como tristemente e à custa de muitas mortes nas NT,  se viria a  confirmar depois da CCaç  1439 ter voltado, acabado o seu tempo de comissão na Guiné. E por isso a  frequente presença da CCaç 1439 nesta região, durante a nossa “comissão”.

Para que conste  transcrevo o relatório:

(...) "No dia 17 de Dezembro de 1966 realizou-se a Op Hera, no Chão Balanta, que  consistiu em montagem de emboscadas a N de Chubi e Sée seguida de batida às tabancas de Bissá, Funcor, Blassé, Sée e Chubi.

Durante esta operação não foram detectados quaisquer elementos supeitos. Verificou-se que a população  manifesta desejos de melhor colaborar com a tropa, dando a impressão de fadiga de descontentamento perante as atitudes do IN que visita aa tabancas, exigiundo tudo inclusive bufalos. As NT através de palestras e pequenos serviços de enfermagem continuous a exercer influência psicológica no seio da população.

 Dia 23 de Dezembro de 1966 : Ataque a Missirá (vd. próximo poste, Parte XIX)

 



Carta do (António Eduardo) Quebá Soncó, filho do régulo de Missirá, enviada ao João Crisóstomo,  Datada de Hamburgo, 6 de agosto de 1967. Reprodução de alguns excertos:

(...) "Sr. Crisóstomo, recebi a sua carta, há já algusn dias, mas foi-me impossível respodner-lhe mais cedo, do que peço muita desculpa. (...) Fui operado à bexiga, pois apareceram-me uns micróbios nela: não é nada de grave, pois há me levanto e não dói quase nada..

"Logo que cheguei à Alemanha, dali por poucos dias, deram logo a perna [prótese] e agora ando a treinar a andar. Ainda conto ficar na Alemanha durante pelo menos mais um mês. Ainda me custa um bocadinho mas, depois de estar mais habituado,já não me vai custar tanto. No princípio custava-me muito mais porque a perna [prótese] estava um pouco grande, mas depois tiraram-lhe 2 centímetros e agora isto vai bem".

E depois acrescenta: "Ainda conto ficar na Alemanha durante pelo menos mais um mês."

Sabemos que partiu para a Alemanha a 23/6/1967, pela carta que escreveu nessa data ao João Crisóstomo, a despedir-se dele e a agradecer-lhe a sua amizade (**).   Deve ter regressado a Lisboa em setembro de 1967. Esteve no Depósito Geral de Adidos à espera de transporte para Bissau aonde chegou a 3 de outubro de 1967, conforme aerograma datado de Bambadinca, 18 desse mês e ano.

Sobre o hospital disse ainda o seguinte:

(...) "Isto aqui é muito bonito e muito bom. Eu logo que possa sair para a rua, ponho-me logo a mexer pois as meninas aqui são muito boas e andam quase todas de mini-saia (...)

"A assistência médica aqui é tão boa como em Portugal ou ainda melhor, estamos todos muito satiosfeitos (...).

"Sr. Crisóstomo, como o Sr vai para Inglaterra e não pode ir ver-me ao hospital em Lisboa, eu fico muito triste, palavra de honra. Aproveito para lhe desejar boa viagem e muitas felicidades na Inglaterra" (...)

 



Aerograma do Quebá Soncó, para o João Crisóromo, datada de 18 de outubro de 1967, quando o destinatário já estava em Inglaterra. Num português quase impecável, o remetente dá conta do seu regresso a Bissau, depois de ter estado internado no Hospital de Reabilitação de Hamburgo, Alemanha  (então Ocidental) e pede desculpa de não ter podido responder mais cedo ao João Crisóstomo:

 " (...) estive muito tempo no Depósito Geral de Adidos  [em Lisboa] e só cheguei a Bissau em 3 do corrente ".

E acrescenta: 

"Já estive com a minha família que ficou não só muito satisfeita por me ver como também ficou muito agradecida ao amigo João Francisco  [Crisóstomo ] pelas atenções que teve comigo quando da minha estadia na Metrópole. Eu também nunca esquecerei a sua amizade e toda a vida hei de recordar os belos passeios que me proporcionou"


Fotos (e legendas): © João Crisóstomo (2021) Todos os direitos reservados. Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
____________

terça-feira, 2 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22680: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte XIV: um mês de novembro de 1966 relativamente tranquilo: no decurso da Op Hino, foi abatido o antigo pescador de Enxalé de nome Jorge, de etnia papel, que servira de guia ao IN aquando do ataque a Porto Gole




João Crisóstomo, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (1965/67)
(a viver em Nova Iorque desde 1977)



1. Continuação da publicação das memórias do João Crisóstomro, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (1965/67)


CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história” como eu a lembro e vivi
(João Crisóstomo, luso-americano, 
ex-alf mil, Nova Iorque) (*)

Parte XIV:  Um mês de niovembro de 1966 relativamente tranquilo


Dia 1 de Novembro de 1966

A CCaç 1439 efectuou a Op Gamarra. O relatório menciona ter sido uma “acção defensiva” que "não foi possível realizar-se em virtude do mato entre Sinchã Corubal e Medina se encontrar absolutamente fechado e sem vestígios de qualquer picada.Verificou-se que o In não pretica este itinerário e o guia embora da região perdeu-se não tendo sido possível às NT seguir a corta mato."


Dia 7 de Novembro de 1966.

Efectuou-se a Op Hélice, que #consistiu numa patrulha de reconhecimento e combate a N.do Geba, Desde o Rio Guaturandim até à região de Mato Cão. Em toda esta zona não há vestígios de passagens de grupos IN e as picadas existentes deixaram de ser visíveis."


Dia 11 e 12 de Novembro de 1965

"Realizou-se  a Op Hino à região do Chão balanta (...) e uma batida as tabancas de Bissá, Funcor, Sée, Nafo e Chubi."

Durante a batida efectuada em Nafo foi referenciado um grupo de 4 elementos IN os quais reagiram com fogo de P.M. 

Perseguidos foram abatidos dois elementos verificando-se que um era chefe da morança e o outro o antigo pescador de Enxalé de nome Jorge, de raça papel. "A morança ficou deserta porque foi incendiada."

Resultados obtidos:

 "Dois mortos sendo o tal Jorge o elemento que serviu de guia ao In aquando do ataque a Porto Gole. Foi detido como suspeito o chefe de uma morança de Bissá de nome Nhasse Nadai,  o qual foi posto em liberdade mais tarde. " 

(...) "Do contacto havido com a população balanta de Bissá parece o mesmo estar disposto a colaborar com as NT".


Dia 24 e 25 de Novembro de 1966

Realizou-se a Op Hangar a N de Cã Mamadu que "consistiu em montar emboscadas e patrulhas de reconhecimento" (...).

"Foi montada uma armadilha em Cã Mamadu a qual foi accionada posteriormente por um elemento IN."


Dias 29 e 30 de Novembro de 1966


Realizou-se a Op Gume na região a N. de Porto Gole sudoeste de Nantem que consistiu num golpe de mão ao acampamento IN de Mato Gorba. A aproximação das NF  foi detectada ( pelo IN) e seguiram-se ataques, emboscadas, contra ataques, e perseguições . No fim o IN dispersou recusando-se ao combate e não houve mais contactos,

Resultados obtidos:

Três feridos confirmados, material diverso e documentos vários , entre os quais material escolar e guias da PAIGC

(Continuação)

_____________

Nota do editor:

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Guiné 61/74 - P22558: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte XIII: o fatídico dia 6 de outubro de 1966, duas minas A/C, dois mortos, no Mato Cão


Guiné > Zona Leste> Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 1439 (Enxalé, Missirá, Porto Gole, 1965/67)  > Estrada que atravessava a bolanha depois de Mato Cão  quando se vinha de Missirá para Enxalé



Guiné > Zona Leste> Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 1439 (Enxalé, Missirá, Porto Gole, 1965/67) > Ao meio, o furriel de transmissões, à direita de costas, o capitão Pires e à esquerda o fur mil op esp António dos Santos Mano, que irá morrer em 6/10/1966, na sequência de uma mina A/C, na estrada Missirá-Enxale.


Guiné > Zona Leste> Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 1439 (Enxalé, Missirá, Porto Gole, 1965/67) >Embora não possa pôr as mão no fogo sobre a sua exactidão, creio que foi este o Unimog  da coluna de 6 de outubro  que vinha a Missirá  a Enxalé. Eu estou nesta  foto ( em pé, o 3º da esquerda) que me parece ter sido tirada um dia quando eu estava em Missirá  antes do Zagalo .   

Fotos ( e legendas): © João Crisóstomo (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



João Crisóstomo
(a viver em Nova Iorque desde 1977)


1. Continuação da publicação da publicação das memórias do João Crisóstomo, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (1965/67)


CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé,
Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história”
como eu a lembro e vivi
(João Crisóstomo, luso-americano,
ex-alf mil, Nova Iorque) (*)


Parte XIII: Um dia fatídico, 6 de outubro de 1966, duas minas A/C, dois mortos


Depois de 9 Set 1966 (o ataque a Enxalé):

Haverá com certeza muito a lembrar sobre a vida e actividades da CCaç 1439 depois do ataque a Enxalé. Recordo apenas de ter ficado surpreendido e consternado que o IN tivesse tido a coragem de vir atacar a própria Sede da Companhia, onde, pensávamos, estávamos bem seguros.

Lamentavelmente nem eu (mea culpa, mea culpa) nem ninguém mais teve o cuidado de pôr algo em papel para memória desses dias que se seguiuram e portanto nada mais me resta do que continuar esta “história da CC1439” como se tudo continuasse como antes e este ataque não tivesse acontecido. 

De facto, as várias minas de que fomos vítimas, a seguir, o ataque a Missirá e outros acontecimentos levam-me a concluir que este ataque a Enxalé é evidência de que o IN se sentia cada vez mais à vontade para se aproximar das NT, intensificar os seus ataques e aumentar o seu campo de acção. Foi isso que senti e mais tarde vim a confirmar ao ler o primeiro livro de Beja Santos ,“ Diário da Guiné, na Terra dos Soncó”.


Dia 23 de Setembro de 1966

Copio à letra o relatório:

(...) " Um grupo de combate da CCaç 1439 participou na Op Girândola que consistiu numa acção ofensiva na mata de Belel. As NT detectarm um acampamento IN o qual se encontrava abandonado. Foram destruidas as casas de mato e culturas, No regress as NT foram emboscadas duas vezes não tendo sofrido qualquer baixa." (...)

Não posso dizer as datas, mas sei que entre as muitas lacunas deste relatório contam-se muitas “patrulhas de reconhecimento” que fazíamos, e que não chegavam a receber o termo pomposo de “operações”. Umas fáceis e outras “menos fáceis”. 

Lembro de várias vezes termos permanecido , como que emboscados junto de picadas suspeitas de serem usadas pelo IN. Lembro de ter uma vez descansado ao fim do dia com a minha cabeca em cima de uma pedra antes de tomarmos posições para passar a noite junto a uma picada ; não sei se foi nesta mesma ocasião ou foi noutra em que fiquei numa depressão de terreno ( talvez fosse mesmo terreno de bolanha, não sei) e eu fiquei com água pela cintura, quase louco de frio,  esperando que o dia chegasse depressa e não aparecesse ninguém na picada.

Um destes casos, que não constam deste relatório, aconteceu nos dias 4 e 5 de Outubro. E creio que o efectivo das NT neste dia não era de um simples pelotão mas bem maior . A razão de eu lembrar este caso e não outros deve-se ao seu relacionamento com o dia fatídico de 6 de Outubro.



Guiné >Zona Leste> Sector L1 > Bambadinca > Estrada Enxalé-Missirá > Sítio do Mato Cão > 6 de Outubro de 1966 > Cratera povocada por uma mina A/C cuja explosão provocou a morte do Soldad Manuel Pacheco Pereira Junior, da CCaç 1439. Era natural de São Miguel, Açores. Os restos mortais (cerca de 3kg) ficaram no Cemitério de Bambadinca, Talhão Militar, Fileira 2, Campa 1, Guiné-Bissau. NO regresso de Missirá, a mesma coluna accionou outra mina A/C que decepou a perna do Fur Mil Op Esp António dos Santos Mano, acabando por morrer.

Foto (e legenda): © Henrique Matos (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Dia 6 de Outubro de 1966, um dia fatídico

Copio à letra o que consta no relatório: e escreverei depois “a minha versão” como as coisas se passaram, baseado na minha memória, por vezes bem fresca sobre casos como este, e também na memória de outros com quem tenho falado sobre o assunto.

(...) "As NT acionaram dois engenhos explosivos quando se efectuaram duas colunas, uma vinda de Missirá (para) Enxalé, e outra ao encontro da primeira. Os engenhos explosivos encontravam-se em pequenas poças de água, embora se tivesse os cuidados julgados necessaries na picada da estrada.

"Resultados dos dois engenhos explosivos:

Dois Unimogs destruidos
Uma espingarda G3 perdida em virtude de ter sido projectada para o Rio Geba.

Baixas sofridas pelas NT:

Furriel Mil António dos Santos Mano ( morto em combate) (**)

Soldado 203/65 Manuel Pacheco Pereira Jr. ( morto em combate) (***)

Furriel Mil ( Mec Auto) Octávio Albuquerque da Silva ( ferido)

1º cabo 7316565 Manuel Abreu Velosa 

1º cabo 3456665 José Firmino Quintal 

Soldado 9311265 Ernesto Camacho Rodrigues 

Sold 7317965 Manuel Correia

Sold 5974165 Francisco de Freitas Timóteo 

Sold 1011265 Manuel de Sousa Mendes

1º Cabo 9271565 José Ilídio Andrade Gouveia .

Soldado 8356465 Manuel Alves Junior

Sold 9805565 Agostinho Gerardo 

Sold cond auto  2630164 José Maria Mendes 

Sold cond auto5140464 Jerónimo Gonçalves Sadio 

Caç Nat Contratado Pucha Nanan, ferido

Foi detectado na região de Mato Cão uma armadilha antipessoal a qual foi destruida. Foi distinguido nesta acção o soldado telefonista 2642365 Júlio Martins Pereira, louvado pelo Cmdt Militar e condecorado.

Este foi um dia fatídico e traumático para todos e que todos mais ou menos lembram imediatamente quando se fala dele.

O Alferes Zagalo estava destacado neste momento em Missirá e precisava de reabastecimentos. Sabendo que o pessoal em Enxalé estava exausto e não podia fazer uma coluna para o abastecer, resolveu vir ele mesmo a Enxalé buscar o que precisava. A sua coluna constava de um jipe e um Unimog, com todo o pessoal que estes podiam transportar.

Antes de chegar a Mato Cão o Unimog pisou uma mina anticarro escondida numa poça de água. O jipe tinha-se desviado para evitar essa poça, precaução que o Unimog não teve.

Os resultados podem-se avaliar pelas fotos e pelo número de mortos e feridos. Entre estes o Furriel Mano. Como o Unimog vinha superlotado , ele vinha em cima do Unimog mas com a perna de fora e veio a falecer no local antes da chegada do helicóptero.

Houve ainda um outro morto, José Moreira, caçador nativo “contratado” e uma dezena de feridos, alguns deles com muita gravidade que foram evacuados para Bissau. A situação era desesperada e nem meios de comunicações para pedir auxílio tinham. Pelo que o soldado de comunicações Júlio Pereira que felizmente não estava ferido, pegou na sua G3 a tiracolo e foi a correr vários quilómetros , sujeitando-se a ser apanhado pelo IN em direcção a Finete, na margem do Geba, oposta a Bambadinca.

Aqui ,com a ajuda do pessoal amigo desta tabanca, conseguiu passar o Geba numa canoa e chegar a Bambadinca onde lhe facultaram um rádio para chamar os helicóperos e avisar Enxalé do sucedido.

 Em Enxalé esperávamos passar esse dia como um dia de descanso .O pessoal da Companhia tinha acabado de regressar duma dura saída ao mato ( embora nada conste no relatório) e estávamos todos exaustos. E de manhã ouvimos ao longe um estrondo, mas não fazíamos idéia do que fosse. Passado o que me perece ter sido mais de um hora recebemos notícia de que a coluna do Zagalo tinha sofrido uma mina, havia feridos e que os helicópteros já estavam a caminho.

Ficamos todos preocupados, incluindo o capitão Pires. Quando este disse que era preciso ir ao encontro da coluna para ajudar o Zagalo, eu ofereci-me. Ele aceitou logo e disse-me: “Eu sei que o pessoal está todo estafado. Pega em todo o pessoal de serviços que ficaram no quartel (nos dois dias anteriores) e vê se arranjas mais alguns voluntários. Se não arranjares voluntários, diz-me que eu arranjo-os."

Assim fiz e depois de ter dados instruções a todo pessoal de serviços, antes de perguntar a outros por voluntários,   eu chamei o meu pelotão, certo de que haveriam alguns que iriam comigo. Foi para mim uma sensacão tremenda quando, logo após eu ter dito o que precisava, eles barafustavam como se eu os tivesse ofendido; que não havia um nem dois e que iam todos . “O que é que o nosso alferes está a pensar da gente?” ouvi o “Figueira” a dizer para os outros .

E assim fomos, picadores à frente, um Unimog vazio a seguir e o resto da coluna atrás , caminhando tão ligeiro quanto possível. A região de Mato Cão é uma passagem muito perigosa: a estrada passa perto do Geba e do lado esquerdo há uma colina. Era sempre com o coração nas mãos que aí passava.

Por isso ao passar a bolanha que precede Mato Cão, já perto deste eu disse ao furriel Lopes: "Olha, Lopes, isto é mesmo um bom sítio para uma emboscada; eles sabem ( o IN) que a gente (ao ouvir o rebento duma mina) não deixa de vir e são capazes de estar à nossa espera. Pega na tua secção, sobe e faz um reconhecimento pela esquerda". 

Ele assim fez e a coluna continuou; e depois, logo passada a bolanha, de repente houve um grande estrondo e o Unimog deu um salto pelos ares. A mina, como o que sucedeu com a coluna do Zagalo, estava dentro duma poça de água e não foi detectada pelos picadores.

Imediatamente nos deitámos nas redondezas do buraco e do Unimog destruido, prontos a responder, mas nada sucedeu. E depois de algum tempo respirei fundo; ao fim e ao cabo podia ter sido muito pior, pensei eu: perdeu-se o Unimog, mas o importante é que não há mortos nem feridos. E não me recordo do que sucedeu a seguir, e o que foi o resto do dia, mas imagino (agora) o que terá sido para todos quando soubemos da morte do furriel Mano e dos vários feridos.

De volta no Enxalé, no dia seguinte fez-se a formatura geral de manhã. E parecia estar tudo certo, até que quando foi chamado o nome do Manuel Pacheco ( conhecido de todos como o Açoriano por ser dos Açores e o único soldado que não era madeirense) ele não respondeu. Perguntei se alguém o tinha visto ou se alguém sabia onde ele estava e foi então que alguém disse : "Quando o vi ontem a última vez ele estava a caminhar junto do Unimog… com certeza por não ter ouvido as intruções do furriel Lopes a cuja secção ele pertencia, ele estava junto do Unimog quando a mina rebentou"…

Imediatamente voltamos ao local (recordo que o Alferes Henrique Matos que estava naquele dia em Enxalé decidiu ir connnosco ) . Reproduzo o testemunho que sobre este momento ele deixou neste blogue, referindo-se ao Manuel Pacheco: no dia 10 de maio de 2008, poste P 2830 (***):

(...) "Quando digo pulverizado é o termo que melhor descreve a situação, pois sou um dos que andou à procura de restos do corpo e apenas encontrámos pequenos fragmentos de ossos com que fizemos um embrulho que pesava poucos quilos. Tem a sua campa em Bambadinca, como se pode ver na relação do Marques Lopes (...). A G3 dele nunca mais se viu, pensando-se que terá voado para o Geba que passa a não muitos metros de distância."

Mais informa ainda no poste P15998 (**), referenciando o lugar da sua sepultura: (...) "Era natural de São Miguel, Açores. Os restos mortais (cerca de 3 kg) ficaram no cemitério de Bambadinca, talhão militar, fileira 2, campa 1, Guiné-Bissau".

Como já está dito foram momentos tristes e difíceis estes,  em que com todo o respeito fomos juntando o que restava do nosso querido ‘Açoriano'. Lembro também o momento em que os seus restos sairam depois do Enxalé, num caixão normal, como se dentro estivessem uns restos mortais completos.

Durante esta busca pelos seus restos mortais e pela G3 que desapareceu , e que deve ter sido projectada com tanta violência que atingiu o Geba , mesmo ao lado da estrada, veio-se a descobrir uma mina antipessoal. A nossa sorte foi que alguém viu um fio, suspeitou e …lá estava uma mina, que foi destruida no mesmo momento.

16 e 27 de Outubro:

O relatório menciona a seguir três operações neste mês de Outubro de 1966:

Operação Grude a 16 de Outubro, 
Operação Grisu a 16 de Outubro 
Operação Giesta, a 27.

As três são descritas como “patrulhas de reconhecimento fluvial e terrestre ao longo do Rio Geba.” Sem qualquer acontecimento digno de nota. Mas há com certeza engano nas datas pois, tendo nós os forças divididas/destacadas em Missirá e Porto Gole, além de não podermos deixar Enxalé sem protecção, não me parece que fosse possível fazer duas operações no mesmo dia.

(Continua)

__________



segunda-feira, 23 de agosto de 2021

Guiné 61/74 - P22478: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte XII: Mina A/C em 21/8/1966, e violento ataque ao Enxalé em 9 de setembro



Armamento do PAIGC: Metralhadora Pesada Degtyarev (DShK),cal. 12,7 mm, m/ 938/56, de fabrico soviético,  também conhecida, na gíria do mato, como Deka, Desseque ou DCK (*)



João Crisóstomo 
(a viver em Nova Iorque desde 1977)


1. Continuação da publicação da publicação das memórias do João Crisóstomo, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (1965/67)


CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé,
Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história”
como eu a lembro e vivi
(João Crisóstomo, luso-americano,
ex-alf mil, Nova Iorque) (**)


Parte XII:

Dia 20, 21 e 22 Agosto: Op Gorro


Não me parece que o relatório contenha uma “completa” informação sobre esta operação Gorro. Contudo eu não me lembro de pormenores que me possibilitem contradizer o que está escrito. A info pode estar correta, mas está definitivamente incompleta. 

Se me não engano depois do rebentamento do engenho explosivo em que sofremos vários feridos, alguns deles graves, a CCaç 1439  voltou para o quartel no mesmo dia. O relato não menciona isso, mas dá a entender que a operação Gorro se prolongou no dia seguinte, dia 22.

Eu fazia parte deste deslocamento em que sofremos o rebentamento de uma mina, mas não me lembro da finalidade deste deslocamento. Não me lembro sequer se estávamos picando a estrada ; acredito que não. Não sei se era eu que estava a comandar a coluna (, penso que não!),  pois a presença do médico de batalhão dá-me a entender que o efectivo das NT era mais do que um simples pelotão e que não era eu quem estava a comandar as NT.

No fim do relato deste dia vem mencionado que,  além do Médico , o "Furriel Mil da CCav 1482 Higino F. Silva" também se distinguiu nesta acção ; o que confirma as minhas reservas sobre o relato, como está escrito.

Lembro sim que eu ia na frente ao lado do condutor, o António Figueiredo. Iamos numa GMC, uma viatura pesada. E eu não ia aí por acaso: eu sabia do natural nervosismo dos condutores de viaturas, especialmente em casos assim em que se "confiava” que "aquela estrada” era segura e não havia minas. E quis (, o que tentei fazer sempre durante todo o meu tempo na Guiné), "cutir confiança e descanso” de que não havia motivos para demasiados medos. Não quis nunca que houvesse nos meus homens a percepção de que eu pedia deles o difícil, ficando eu em local ou posição menos perigosa. Isso foi norma que segui desde o primeiro dia até voltar de regresso. E sei que os meus soldados o sentiam assim pois um dia sem querer eu tive disso provas. Como passo a descrever:

Lembro-me de estar em Bambadinca, creio que foi durante o mês que estivemos lá, antes de irmos para Enxalé. Sei que à minha frente apareceu um indivíduo que eu à primeira vista nem sabia quem era , mas logo o reconheci. Era o Jaime, ainda meu primo afastado, que vivia numa aldeia perto do meu casal e tinha sido meu companheiro de escola. Tenho bem vivo o que se seguiu, pois nunca esqueci mais o que me disse nesse dia. Depois de longa conversa (,ele estava no mesmo batalhão que eu, mas numa outra companhi),  ele disse-me que "tinha uma coisa para me dizer” . E era que os meus soldados lhe tinham pedido para ele falar comigo; que "eles gostavam de mim, mas que eu era muito afoito”; e que não devia ser assim pois era muito perigoso para todos”. "Oh senhor Alferes", disse , imagine como o seu paizinho ia ficar se ele sabia disto!”.

Retomando o que me lembro: sei que de repente houve um grande estrondo e eu fui pelos ares. Dei comigo batendo com a cara no chão do lado direito da viatura; a minha G3 a meu lado, de cano enterrado no chão. A mina tinha sido preparada para rebentar na segunda passagem: a roda da frente passou, e a mina rebentou com o impacto da roda de trás. Os que vinham atrás, incluindo o médico do batalhão, foram todos pelos ares ; se tivesse sido uma viatura mais ligeira, o impacto teria causado vários mortos com certeza. 

 Felizmente que tínhamos tido o cuidado de reforçar dentro do possível todas as nossas viaturas pesadas. Havia mesmo uma viatura a que chamávamos "o granadeiro" que foi reforçada com chapas de aço a toda a volta, para a tornar "à prova de bala”; o chão da viatura ficou com duas camadas, de cimento e areia entre as duas camadas. O fim dela era exactamente de ir à frente de colunas para servir de ‘rebenta minas”…neste dia o granadeiro não fazia parte da coluna.

Lembro bem o ter ouvido disparos que me pareceram ser ao longe, como que alguém a dizer que tinha ouvido o estrondo da mina; mas não tenho lembrança de qualquer "emboscada” séria como dá a entender este relatório. Lembro sim de termos tomado posições de seguranca, e embora não lembre o “ tendo-se organizado um grupo de perseguição” acredito que se tenha procedido a buscas nos arredores, para prevenir quaisquer surpresas. 

 Lembro a chegada do helicóptero, que se destinava à evacuação do 1º cabo José Manuel Afonso Ferreira; e sabíamos que o médico Alferes Francisco Pinho da Costa também apresentava dificuldades; não sabíamos porém a sua gravidade, pois ele não deixava de prestar socorros a toda a gente. Só nos disse da sua gravidade quando o helicóptero já estava a chegar e ele disse que também tinha de ser evacuado: depois de violentamente projectado pelo sopro da mina , ao cair no chão tinha partido as pernas…

Copio literalmente o que está escrito no relatório sobre esta “op. GORRO”:

(...) "Dia 20, 21 e 22 Agosto — A CC 1439 realizou a Op Gorro na zona do chão balanta que consistia numa Batida na região de Colicunda. Tendo sondado o espírito da população balanta , parece o mesmo estar saturado da pressão In. manifestando a mesma popoulação desejar colaborar com NT. Não houve contactos com IN.exerceu-se uma acção de captação e simpatia na população balanta. Foi uma operação de grande desgaste físico.>>

Em 21 de Agosto as nossas tropas acionaram um engenho explosivo tendo simultaneamente sofrido uma emboscada na estrada de Porto Gole-Enxalé entre Porto Gole e Ressunhá. Apesar das NT sofrerem o rebentamento deste engenho explosivo,  reagiarm eficazmente à emboscada IN tendo-se organizado um grupo de perseguição e tendo o IN dispersado, urtando-se ao combate.

Do rebentamento do engenho explosivo resultaram danos materiais e físicos:

(i)n Destruição de uma viatura GMC

(ii) Feridos das NT:

  • Alf Mil Médico Francisco Pinho da Costa, do BCAÇ 1888, evacuado
  • 1º cabo 682 1364 José Manuel Afonso Ferreira, evacuado
  • 1º cabo aux. enfer. 647 4664, Alexandrino Pestana F. Leitão
  • 1º cabo 182 6865 Carlos Tibúrcio Nunes
  • 1º cabo 7351565, José Luís Fernandes Martins
  • Soldado condutor 8563364, António de Almeida Figueiredo
  • Sold 22665 António Francisco Caneca de Oliveira
  • Sold 651 7665 Álvaro de Sousa
  • Sold 0483065 José Dionísio Vieira de Castro
  • Sold 09/63 Nagna Chete, da 1ª CCaç
  • Sold da Polícia Administrativa 241/64 , Buli Mané.

Distinguiram-se nesta acção o Alferes Mil. Médico Francisco Pinho da Costa e o Furriel Mil da CCav 1482, Higino F. Silva.
 
Dia 9 de setembro de 1966- O Quartel de Enxalé sofreu um violento ataque IN:

Copio o que consta no “relatório":

(...) "Dia 9 de setembro de 1966 -  O Quartel de Enxalé sofreu um violento ataque IN tendo este feito uso pela primeira vez nesta zona do canhão sem recuo além da Met Pes 12,7 e toda a gama de armas aut. com bazuca e morteiros 82 e 60.

Todo o pessoal reagiu da melhor maneira, opondo ao IN uma resistência tenaz. O ataque durou duas horas e dez minutos. Durante a madrugada organizou-se um grupo de perseguição, tendo sido detectado um grupo IN o qual depois de alvejado abandonou uma Met Pes 12,7 reagindo à força de perseguição com granadas de mão.

RESULTADOS OBTIDOS- O IN sofreu baixas em número não estimado. Foi apreendido o seguinte material:

  • Uma Met Pes. 12,7 Degtyarev m/938/46 (DShK)
  • Um cunhete de transporte c/1 G.E. Mort 82 e embalagem c/9 cgr.Blt.
  • Uma granada de mão of. (RG4)
  • Um carregador c/ cartuchos calibre 9 mm P.M. Beretta

As NT sofreram os seguintes feridos ligeiros:

  • Furiel Mil Eduardo José Ferreira de Oliveira
  • Soldado nº 56/65 Américo Fernandes

Referência elogiosa do Comandante Int. Militar: “Motivo de muito apreço a captura da Metralhadora Pesada 12,7 mm”. (...)

______

Nota do autor:

Para não ser acusado de omissão e "desculpas de mau pagador” , devo acrescentar que tenho ouvido várias vezes que eu tive um papel pouco lisonjeiro neste acontecimento:

Com razão ou não, aqui fica o que várias vezes me têm dito : que o ataque, assim dizem, devia estar a ser preparado para ter lugar na manhã do dia seguinte mas que eu de alguma maneira forcei o IN a atacar mais cedo do que tinham intenção de fazer. Que eu fui à tabanca e aí acendi uma lanterna de mão. E o IN, pensando que eu estava os estava a descobrir, no mesmo momento abriu fogo e começou o ataque. Assim dizem !

Não me lembro mas é natural que fosse eu que estava de oficial de serviço nesse dia; se decidi ir à tabanca estava de serviço com certeza. A verdade é que eu não tinha em Enxalé nenhuma “bajuda” especial; mas, talvez para ajudar a passar o tempo, decidi dar uma vista de olhos pela tabanca de Enxalé que ficava mesmo pegada ao quartel, separada deste apenas uns 50 a 100 metros com uma rede de arame farpado a meio. Não me lembro dos pormenores senão do tiroteio que começou quando eu estava junto do arame farpado; e eu nem a minha G3 tinha trazido comigo. Lembro, sim, do inferno de ataque que de repente explodiu. E lembro de me ter atirado ao chão onde permaneci de cara e barriga contra o chão por muito tempo sem me mexer; e depois, não sei quando nem porquê, decidi que podia voltar-me: e de costas colado no chão eu via as balas tracejantes passando por cima. Eu ouvia bem o inferno do ataque e a nossa resposta; não sei quanto tempo passei nessa posição. Lembro que depois de muito esperar ( meia hora, duas horas? não faço a mínima ideia…) o fogo parou e eu fui a rastejar ( como eu tinha bem aprendido e praticado em Mafra…) e cheguei ao quartel. 

 Os meus cotovelos e os meus joelhos eram uma chaga… e lembro no dia seguinte o Zagalo todo empolgado a organizar um grupo para ir atrás do IN antes que este tivesse tempo de regressar aos lugares/bases de onde tinham vindo. Não me lembro desta mencionada metralhadora pesada, mas lembro ouvir que tinham visto muitos rastos de sangue, mas que não havia nenhum morto ou ferido, que o IN tinha tido muito tempo durante a noite de os levar com eles.    

____________

Notas do editor:


(...) Características desta arma:

Origem: URSS
Calibre: 12,7 mm
Data de fabrico inicial: 1938
Comprimento: 1,625 m
Velocidade Inicial à Boca do Cano: 860 m/s
Alcance Prático em Tiro Terrestre:  2000 m
Alcance Prátio em Tito Anti-Aéreo: 1000 m
Peso: 35,5 Kg
Alimentação: Fitas de 250
Cadência de Tiro: 540 a 600 tpm
Munição: 12,7 x 108 mm
Funcionamento: Arma automática, a funcionar por gases.