sábado, 7 de maio de 2011

Guiné 63/74 - P8238: Tabanca Grande (279): Manuel Domingos Santos, ex-Fur Mil da CCAÇ 1684/BCAÇ 1912 (Susana e Varela - 1967/69)

1. Mensagem do nosso novo camarada e amigo Manuel Domingos Santos, ex-Fur Mil da CCAÇ 1684/BCAÇ 1912, Susana e Varela, 1967/69, com data de 4 de Maio de 2011:

Camarada Luís Graça
Depois de ter feito o meu primeiro contacto com os Camaradas da Tabanca Grande em Dezembro último (P7451 - Livro de visitas 104*), venho agora com grande desejo de entrar na grande família da TABANCA GRANDE.

Apresento-me:
Manuel Domingos Santos
Ex-Furriel Miliciano
Batalhão 1912-Companhia 1684
Guiné - Susana e Varela
Maio de 1967 a Maio de 1969
E-mail: domingossantos44@gmail.com


Entrei na vida militar em 11 de Janeiro se 1966 no CISMI em Tavira, onde fiz a recruta e a especialidade, até Junho do mesmo ano.

Depois da especialidade de atirador (não havia outra especialidade nessa altura) ou não nos deram outra a escolha, fui com outros camaradas obrigado a fazer testes para ir formar uma Companhia de Comandos para Lamego. Fizemos os testes ainda em Tavira, testes bastante difíceis e rigorosos, basta dizer que no meu grupo de vinte e cinco só ficamos seis aprovados.

Depois de uns dias de férias a descansar em casa, lá fui de comboio até Lamego, mais propriamente Lamelas, um pouco afastada de Lamego, no cimo de um monte junto a um cemitério. Aqui permanecemos durante uns tempos a treinar tudo o que nos esperava nas guerras do Ultramar. Aprendiamos e aperfeiçoávamos a lidar com as várias armas, enfermagem, minas e armadilhas, pára-quedismo e tudo o que dizia respeito a poder sobreviver no mato vários dias sem comer nem beber.

Só para dar uma ideia do que era, basta dizer que não tínhamos horas de descanso nem de noite nem de dia. A qualquer hora da noite íamos fazer patrulhamentos, dar uns tiros na carreira de tiro, fazer instrução para dentro do cemitério, tudo isto e muito mais. Nesse tempo tudo isto era realmente difícil e complicado, mas depois já no cenário de guerra foi realmente muito útil para mim e para os que eu levava para o mato.

Depois no final, não segui com a Companhia de Comandos para Angola, aqui já não obrigado, mas sim se tivesse essa vontade. Falava-se nessa época que iríamos dar instrução a futuros Comandos em África.

Como não segui com essa Companhia, fui para o RAL 1 em Lisboa dar instrução durante dois meses. Depois vim para perto de casa, RI 7 em Leiria, onde estive dois meses, até que fui para Santa Margarida para me incorporar no Batalhão que me levou a terras da Guiné.

No dia 8 de Abril de 1967 embarcámos no velhinho "UIGE" e desembarcámos em Bissau a 13 do mesmo mês.

O Batalhão seguiu para Mansoa e a minha Companhia ficou um mês em Bissau no quartel da Amura, à espera de ir para Susana e Varela.

Susana era uma tabanca não muito grande, mas tinha um povo muito grande, muito guerreiro, muito unido e muito do nosso lado. Armados com arco e flecha nada os fazia temer. Guardavam bem o seu chão "O CHÃO FELUPE".

Na minha passagem por Susana, não posso deixar de falar do amigo João Uloma, o grande guerreiro Felupe e chefe de toda a zona Felupe, que ao sair para patrulhamentos era sempre o primeiro e todos os outros o seguiam logo atrás. Era temido por aqueles que combatiam contra nós e contra os Felupes, e nessa época já tinha a cabeça a prémio, isto dito por alguns combatentes do PAIGC que apanhamos em operações.

Vim a saber mais tarde por camaradas nossos que por lá passaram depois, e confirmado por um amigo susanense que se encontra em Portugal a trabalhar, que o tinham matado. Foi um grande guerreiro e um grande condutor de homens. Veio à metrópole em 1968 com o prémio Governador da Guiné, e no dia 10 de Junho em Lisboa recebeu uma medalha de Grande Mérito Militar.

Nesta foto, João Uloma no dia dos seus anos. Não era normal ele festejar os anos, mas nesse dia aconteceu. Eu e mais dois camaradas fomos a casa dele fazer esta surpresa.

Aqui está a prova de como os Felupes agiam com os ataques. Depois de sermos atacados durante a noite, ei-los vindos de Tabancas bem longínquas a chegarem para nos ajudar a combater o inimigo. Alguns caminharam a pé durante várias horas para aqui chegarem, armados de arco e flecha

Havia também em Susana outras pessoas que nos marcaram nesse tempo. Falo de um casal maravilhoso que era a D. Helena e seu marido José Valente, que foi militar antes de nós e que por lá fico com essa Senhora que tinha um negócio de vários artigos. Era tudo para nós. Mãe, Madrinha, Namorada, enfim tudo aquilo que nós não tínhamos lá. Fazia-nos grandes petiscos bem apetitosos á sua maneira, e acolhia-nos como seus filhos se tratasse.

Nesta foto José Valente com o seu bigode característico. De vez em quando também nos fazia companhia na nossa messe. Era homem da casa.

Aqui estamos no seu terraço a comer um petisco. Ao fundo, penso ser a sua filha, que segundo sei será hoje a senhora que tem a residencial CHEZ HELENE em Varela.

Aqui também nos honrou com a sua presença na passagem do ano de 1967 para 1968. Está ao fundo com o seu bigodito.

Nesta foto, a sua residência que nos vários ataques que sofremos também não escapou aos efeitos da guerra.

Estrada de Susana para Varela > Esta situação era vulgar acontecer no nosso tempo. Havia uma grande extensão de bolanhas que nos meses das chuvas ficavam cobertas de água. Era também uma boa oportunidade para sermos atacados como aconteceu algumas vezes.

Foi bem perto de Cassolol que tivemos uma mina na ponte e de seguida confronto de tiroteio, de que resultaram dois mortos e vários feridos. A viatura onde seguíamos ficou neste estado.

Cassolol > Deixamos lá este pequeno monumento dedicado à nossa Companhia "Pantera 1684", com os nomes dos nossos mortos.

Susana > Monumento aos mortos da CCAÇ 1684

O Fanado > Eu e o mais novato dos que foram fazer a circuncisão.

Ao falar de Susana e dos Felupes, é obrigatório também falar do Fanado, ou Circuncisão que se realiza de trinta em trinta anos. Eu tive o privilégio de assistir no ano de 1968, pois o seguinte foi em 1998.

Recordo-me que nessa cirurgia que era feita aos Felupes, nesse ano não houve mortes porque fomos autorizados a assistir e a fazer a higiene necessária, ao contrário dos anos anteriores que houve sempre mortos.

No final do Fanado, em que os Felupes estão isolados na mata durante cerca de dois meses sem poderem ver os familiares, há festa e apresentam-se aos familiares e amigos em traje de gala.

Durante o tempo que estão na mata depois da circuncisão, eles fazem festa durante o dia e noite. Diziam que era para não sentirem as dores do acontecido. E diziam que durante o tempo que estavam por lá, não seriamos atacados. Foi o que aconteceu. Tinham medo dos Felupes nessa altura, pois ganhavam mais força, e tornavam-se ainda mais agressivos.

Susana > O fim do Fanado > Estes são os adultos vestidos a rigor prontos para o fim da festa. À frente está o chefe dos Felupes que era o pai do grande amigo João Uloma.

Os Felupes e as lutas > Eu no meio dos vencedores

Eu a apreciar as lutas

A morte > Na etnia Felupe era normal o defunto ser colocado numa poltrona e ser velado pelos familiares com cânticos antes de ser enterrado. Ali estava uns dias e depois desaparecia sem nos apercebermos de mais nada.

Aqui era o cemitério dos crânios e dos objectos de feitiçaria.

Fotos: © Domingos Santos (2011). Todos os direitos reservados


Este é um pequeno resumo do que foi a minha passagem na vida militar. Foram 1225 dias com a farda militar vestida. Uns dias melhores outros menos bons como todos os camaradas que por lá passaram. Todos nós temos imensas histórias para contar, só que por vezes não temos a coragem de as deitar cá para fora.

Estão cá dentro guardadas, e não temos a coragem de as contar, a não ser em convívio com outros camaradas que também por lá passaram.

Um forte abraço para todos aqueles que trabalham e procuram dar voz aos que combateram em terras de África.

2/05/2011
Domingos Santos

[Edição de fotos, revisão e fixação de texto: Carlos Vinhal]


2. Comentário de Carlos Vinhal:

Caro Domingos Santos,
Bem-vindo à família do Blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné. Instala-te na Tabanca e continua com as narrativas da tua vivência numa das zonas mais características da Guiné, o Chão Felupe. A tua apresentação promete.

Como muito bem dizes no fim deste teu trabalho ora publicado, as nossas histórias, só as ouvem e entendem quem passou por experiências similares. Portanto este é o local ideal onde, à vontade, poderás escrever as tuas memórias porque estás entre pares.

Temos na tertúlia um camarada que se dedicou a observar os usos e costumes dos Felupes, pois como tu, também esteve em Susana, estou a falar do ex-Fur Mil TRMS Luís Fonseca da CCAV 3366/BCAV 3846, que embora há muito não nos mande nada, deixou-nos uns óptimos apontamentos sobre esta etnia. Podes aceder a eles clicando nas palavras Felupes e/ou Luís Fonseca, na cor laranja e sublinhadas.

Porque este poste está já muito longo, deixo-te um abraço de boas vindas em nome da tertúlia e dos editores, e os votos de uma colaboração profícua.

Deste teu camarada e novo amigo segue também um abraço fraterno
Carlos Vinhal
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 16 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7451: O Nosso Livro de Visitas (104): Camaradas da Guiné (Domingos Santos)

Vd. último poste da série de 21 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8145: Tabanca Grande (278): Jorge Manuel Magalhães Coutinho, ex-Alf Mil OpEsp/RANGER da CCS/BCAÇ 4610/73 (Piche, Bissau – 1974)

Guiné 63/74 - P8237: Convívios (331): 11.º Encontro da Tabanca do Centro com comemoração dos aniversários da Giselda e Miguel Pessoa, ocorrida no dia 27 de Abril de 2011 (Joaquim Mexia Alves)

Tabanca do Centro - Pode ser visitada em http://tabancadocentro.blogspot.com/


11º Encontro da Tabanca do Centro - Comemorando os aniversários da Giselda e do Miguel



No dia 27 de Abril, pela “fresquinha” das 12 horas da tarde, lá começaram a chegar os “atabancados centralmente”, para mais um Encontro da Tabanca do Centro, desta feita o Décimo Primeiro!

Entre os habituais nestas andanças, chegavam também caras novas, que foram muito bem-vindas e vamos lá a ver se não me esqueço de nenhuma.

O Hugo Borges, General pára-quedista, o José Miranda, pára-quedista também, (a quem não dou patente porque não me lembro qual era), Mário Garcia, Presidente da Direcção do Núcleo de Leiria da Liga dos Combatentes e, ainda, a Glenda Seara, filha do José Seara que tem estado connosco nestes Encontros e fez a “sua” guerra em Angola.

A animação foi desde o início a habitual, para a qual contribui muito o nosso “Almirante” Vasco da Gama, com a sua proverbial boa disposição.

A propósito do “Almirante” lembrámo-nos que não temos connosco até à data nenhum camarigo da Marinha!
E Monte Real, que fica tão perto do mar!!!

Entretanto, à socapa, nos dias anteriores, os atabancados presentes e ausentes, tinham-se arregimentado para adquirirem um presente para o casal Pessoa, (não é Fernando), mas sim a Giselda e o Miguel, visto que, ele tinha feito anos no dia 9 de Abril e ela iria fazer no dia 29 do mesmo mês, o que só revela o extremo bom gosto de fazer anos em Abril!!!

Pela sua simpatia, pela sua dedicação, pelo seu empenho, pela sua permanente boa disposição, por tudo enfim, eles mereciam uma homenagem especial dos seus camarigos.

E há-os de mão cheia!

O Jero, de Alcobaça, mesmo não podendo vir ao Encontro, pois a sua mulher fazia anos no dia, logo se prontificou a adquirir o presente que se impunha, libertando assim este pobre comandante dos inúmeros afazeres que tanto o ocupam, “tá-se mesmo a ver, não tá-se”???

Com o seu bom gosto, comprou um serviço de café, denominado “Pedro e Inês”, para homenagear o casal Pessoa, que é para nós um exemplo de união e camariguismo.

Mas fez mais o bom do Jero!

Pois metendo-se no seu carro, veio de propósito á Marinha Grande trazer-me o referido presente! Grande Jero, obrigado!

Trouxe ainda uma primeira página de jornal como sua oferta pessoal ao Miguel Pessoa, pelo seu aniversário.

Poderão ver nas fotografias tudo muito bem documentado pela arte e engenho do Miguel Pessoa e do Vasco da Gama.

Por aqui fico nesta noticia tão importante, dando mais uma vez as boas vindas aos “piriquitos” que vieram pela primeira vez e desejando que se façam por cá “velhos”!

Um grande e camarigo abraço para todos
Joaquim Mexia Alves

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8234: Convívios (324): Almoço de confraternização do pessoal da CCAÇ 2464, ocorrido no dia 30 de Abril de 2011 em Fátima (António Nobre)

Guiné 63/74 - P8236: Notas fotocaligráficas de uma viagem de férias à Guiné-Bissau (João Graça, jovem médico e músico) (10): Bafatá, 15/12/2009: "África é um cego em cima de um diamante" (Ali dixit)



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 15h36 > O João sentado frente ao Rio Geba... Uma das muitas paisagens repousantes deste país lusófono...



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 15h42 > Um pescador, com a sua piroga, no Rio Geba




Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 15h43 >  Pescadores  lançando as redes ao rio





Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 15h33 >  Cais de Bafatá



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 15h45 > As pirogas do Rio Geba




Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 16h07 >  Uma tarde calma. nas calmas águas dfo Rio Geba



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bambadinca > 15 de Dezembro de 2009 > 11h28 > Da esquerda para a direita: Ali e Antero... A caminho de Bafatá...
 

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 15h13 > A portuguesa Célia, o seu filho e o João


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 15h22 > Restos do passado colonial (hoje, sede do Tribunal Regional de Bafatá) e estátua de Amílcar Cabral, que é filho de Bafatá






Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 16h26 > O antigo Resturante Transmontana...



 Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 17h21 >   Jovens de Bafatá... Um dos poucos sinais de modernidade na decadente Bafatá (que perdeu importância, económica, social e administrativa, em relação a Gabu)...



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 17h543 >   Um das nossas conhecidas ruas de Bafatá, já ao entardecer...


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 18h06 >    O velho cinema de Bafatá, parado há muitos anos.. Dizem que há  um homem que toma conta do velho cinema, abandonado... Um habitante local, surdo-mudo, fotografado com o João e o Antero...


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 18h23 > A magia do pôr do sol sob o Rio Geba, capaz de por uns momentos nos reconciliar com tudo: o mundo e a vida, o lado feio do mundo e da vida...
Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 15h25 >  A Loja das Libanesas... A Dona Vitória... 



Fotos: ©João Graça (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


1. Continuação da publicação das notas do diário de viagem à Guiné, do João Graça, acompanhadas de um selecção de algumas das centenas fotos que ele fez, nas duas semanas que lá passou (*)... 

(i) 1º dia, 5, chegada a Bissau e partida para Iemberém (às 13h30 com chegada às 21h50);


(ii) Nos cinco primeiros dias seguintes (de 6 a 10 de Dezembro de 2009) fomos encontrá-lo, como médico, voluntário, no Centro de Saúde Materno-Infantil de Iemberém;

(ii) O fim de semana, de 11 a 13 (6ª, sábado e domingo) de Dezembro de 2009, foi passado em Bubaque e Rubane, no arquipélago de Bolama-Bijagós, como simples turista;

(iii) Dia 13, 9º dia, domingo, à tarde, regressou a Bissau, ao bairro do Quelelé, onde se situa casa do Pepito e da Isabel, que lhe deram guarida;

(iv) É também aqui a sede da AD - Acção para o Desenvolvimento, cujos trabalhadores tiveram, na segunda feira de manhã, exame médico de vigilância... Viu 18,  de manhã (e no dia 17, viu mais 5);

(v)  À tarde, nesse dia 14,  segunda-feira, o João Graça foi, de carro, visitar, nos arredores de Bissau o Hospital de Cumura, gerido por um Missão Católica portuguesa... 

(vi) Ao fim da tarde e noite, esteve no centro de Bissau e juntou com novos amigos... 

(vii) E no dia seguinte, 11º dia  segue para uma curta viagem de dois dias ao Leste (Bambadinca, Bafatá, Tabatô, Gabu, Contuboel...), por alguns paragens onde o seu pai andou... (LG).



Páginas do diário de viagem do João Graça, correspondente ao 11º dia: Visita a Bafatá (com pernoita em Tabatô).


15/12/2009, 3ª feira, 11º dia, Bafatá, Tabatô


11.1.Partida [, de Bissau, ] às 10h00 com Antero (motorista) e Ali (funcionário da AD).

11.2. Ida ao quartel de Bambadinca, mas os militares recusaram [a entrada] , pela 2ª vez.

11.3. Campos (bolanhas) de arroz. Ali disse: “África é um cego em cima de um diamante”.

11.4. Paragem em Bafatá. Encontro com Demba, músico dos Super-Camarimba [, grupo de música tradicional afro-mandinga, com origem em Tabatô, tabanca a 12km de Bafatá; vd. também a sua página na Net].





11.5. Almoço no restaurante da Célia, portuguesa radicada em Bafatá desde os anos 70. Marido – não me recordo o nome – esteve na guerra, nos anos 68/70 […]. Agora tem uma escola de condução.


11. 6. Decadência de Bafatá velha. Sem pessoas, prédios degradados. Telefono ao meu pai: Libanesas (Vitória), piscina, cinema, [Restaurante] Transmontana.


11.7. Passeio de piroga com pescador no Rio Geba.


11.8. Encontro com surdo-mudo que nos levou à sua tabanca (são familiares de Tabatô). Moram numa colina do Geba à entrada de Bafatá. Ofereceram-me uma cadeira e em 20 segundos juntaram-se 20 pessoas à volta da morança.


11.9. Ida para Tabatô (aguardada), passando antes pela casa do Victor [, cooperante espanhol, que conheci na viagem para Bubaque].


(Continua)

[ Revisão / fixação de texto / selecção, edição e legendagem de fotos: L.G.]

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Nota do editor

Último poste da série > 30 de Abril de 2011 >Guiné 63/74 - P8184: Notas fotocaligráficas de uma viagem de férias à Guiné-Bissau (João Graça, jovem médico e músico) (9): 14/12/2009, depois das 18h: ida ao centro de Bissau, Residencial Cloimbra, feira da CPLP...

Guiné 63/74 - P8235: Convívios (330): Almoço de confraternização do pessoal do BCAV 8323, dia 28 de Maio de 2011 em Braga (Amílcar Ventura)


1. O nosso Camarada Amílcar Ventura, ex-Fur Mil da 1.ª CCAV/BCAV 8323, Bajocunda, 1973/74), enviou-nos uma mensagem solicitando a divulgação do programa da festa da sua Companhia.

22º Almoço Convívio do BCAV 8323
Caro Colega do Batalhão de Cavalaria 8323.
Para cumprir a tradição vamos novamente reunir no próximo dia 28 de Maio de 2011, para mais um almoço de confraternização do nosso Batalhão.
Realizar-se-á em Braga no Restaurante Solar do Paço.
O local de encontro será junto ao mesmo, sito no Largo do Paço, Freguesia de Tebosa, Concelho e Distrito de Braga, pelas 11h00.
Para quem vem pela Auto-estrada A3 (Porto-Braga) sai na portagem da Cruz, em direcção a Braga e pára km 3 fica (do lado direito).
Contactos:
253 672 374 das 09h00 ás 18h00.
964 241 854 (Paula).
253 673 929 a partir das 21h00.
Reservas até ao dia 20 de Maio de 2011.
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Nota de M.R.:
Vd. o último poste desta série em:

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Guiné 63/74 - P8234: Convívios (329): Almoço de confraternização do pessoal da CCAÇ 2464, ocorrido no dia 30 de Abril de 2011 em Fátima (António Nobre)

1. Mensagem de António Nobre* (ex-Fur Mil, CCAÇ 2464/BCAÇ 2861, Buba, Nhala e Binar, 1969/70), com data de 30 de Abril de 2011:

Amigos
Com a eficiência que naturalmente conhecem da minha pessoa, pese o facto ser um pouco “cota informático” aqui vão algumas fotos do nosso Almoço de hoje.

Frequentemente refiro que a AMIZADE…. Quando sincera e desinteressada, deverá ser mantida, porventura dinamizada.

Tudo isto a propósito de pessoalmente entender que estas jornadas de confraternização deverão ser mantidas.

Não poderemos esquecer que estamos no último ciclo da nossa vida e como tal há que gozá-lo.

Um abraço para todos vós

Por ultimo uma palavra de simpatia e agradecimento para o CABO PEREIRA, pelo esforço que continua a desenvolver na prossecução destes nossos almoços, que, como compreenderão, são muito trabalhosos.

Dentro deste contexto, todos nos deveremos estar gratos ao Pereira pelo esforço que continua a desenvolver.

Um grande abraço para todos
António Nobre

Foto 1 > Em primeiro plano o Cabo Freire, vulgarmente conhecido por mini-cabo, e Fur Mil Varão

Foto 2 > Da esquerda para a direita > Cabo Pereira, Soldado Enf Carrilho, Soldado Condutor Agostinho, Fur Mil Antonio Nobre, Cabo Camões, Soldado Lemos e Soldado Condutor Domingos, vulgarmente conhecido por “Técnico das bajudas”


Fotos 3 e 4 > Cap Mil (CMDT da CCAÇ 2464) Francisco Lindengrun, o Cabo Pereira da Costa (mentor dos nossos almoços) e Soldado Lemos

Foto 5 > Alf Mil Sardinha e Soldado Condutor Domingos ”Técnico”




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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 22 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7841: Convívios (288): Almoço de confraternização do pessoal da CCAÇ 2464, dia 30 de Abril de 2011 em Fátima (António Nobre)

Vd. último poste da série de 5 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8226: Convívios (323): 13º Convívio da CCAÇ 2313 vai decorrer em 4 de Junho de 2011, Águeda (Manuel Moreira)

Guiné 63/74 - P8233: Blogpoesia (147): Senhora Aparecida, freguesia de Torno, concelho de Lousada (Manuel Sousa)

1. Segunda parte das Memórias de um ex-combatente, trabalho enviado pelo nosso camarada Manuel Sousa* (ex-Soldado da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4512, Jumbembem, 1972/74, Sargento-Ajudante da GNR na situação de Reforma), enviado em mensagem do dia 1 de Maio de 2011:

Camarada Carlos Silva:
Mando-te em anexo um texto sobre a lenda e o contexto em que conheci a Senhora Aparecida, que tem a ver com o contacto que tenho com um nosso camarada ex-combatente, António Pereira Magalhães, natural da vila com o mesmo nome, que também integrava o meu pelotão em Jumbembém.

Um abraço
Manuel Sousa


Senhora Aparecida

Senhora Aparecida é um santuário que dá o nome à vila de Aparecida, formada pelas freguesias de Torno e Alentém, no concelho de Lousada, situada nas fraldas da serra da Cumieira.

Tem origem numa lenda em que um eremita, um mendigo cuja nacionalidade se desconhecia, vagueava periodicamente naquela localidade, muito estimado por todos, pela sua bondade, fazendo-se acompanhar de uma imagem de Nossa Senhora.

Depois de alguns anos de deixar de aparecer por lá aquele ermitão, populares aperceberam-se de raios de luz que incidiam sobre uma mina, no meio de um silvado, onde era costume ele pernoitar, próximo da Igreja de Nossa Senhora da Conceição.
Levados pela curiosidade sobre o fenómeno, descobriram então no local os restos mortais do ermitão e a imagem de Nossa Senhora de que ele se fazia acompanhar.
Daí o nome de Nossa Senhora Aparecida e a Igreja de Nossa Senhora da Conceição ter tomado a designação de igreja da Senhora Aparecida.

Decorrem ali as festividades em sua honra nos dias 13, 14 e 15 de Agosto, cujo ponto alto é a majestosa procissão no dia 14 e a imponência do andor, com mais de 20 metros de altura, transportado por cerca de 80 rapagões.

Em 2009 estive presente, pela primeira vez, naquelas festividades, a convite de um colega e amigo ex-combatente, que integrava o meu pelotão em Jumbembém, António Pereira Magalhães.

Fiquei encantado pela beleza do local e não resisti fazer-lhe este poema:

Igreja de Nossa Senhora Aparecida
Foto pesquisada na Internet



POEMA A NOSSA SENHORA APARECIDA

No fundo do vale verdejante,
Entre ramagem exuberante,
Corre o rio Sousa a serpentear!
Vai ligeiro e cioso dizer ao Douro,
Que para trás deixou um tesouro,
Lá na cumieira a branquejar!

É Nossa Senhora Aparecida
Na sobranceira e bonita ermida,
Erigida, imponente, de pedra e cal!
Sentinela em alerta permanente,
Protectora de toda a sua gente,
Dispersa ao longo de todo o vale!

Em Agosto, no majestoso andor,
Sobre ombros fortes com fervor,
Percorre as ruas de todo o burgo.
A multidão, em solene romagem,
Segue devota a altaneira imagem,
Rogando-lhe graças em sussurro!

Ao cair da noite em arraial profano,
Para esquecerem as agruras do ano,
Novos e Velhos animam a romaria!
Entre acordes em coro de concertinas,
Foguetes, repastos e boas cardinas,
Cantam ao desafio até ser dia!

Oh Nossa Senhora Aparecida,
Mãe por muitos nomes conhecida:
Fátima, Monserrate, Conceição…!
Por qualquer deles que eu te invoque,
Dá-me a ventura, dá-me a sorte,
De ser outro teu mendigo ermitão.

Manuel Sousa
Julho/2010


Em 2010, voltei a estar presente naquelas festividades, novamente a convite do meu amigo Magalhães, fazendo-lhe a surpresa de lhe oferecer o poema escrito sobre a fotografia seguinte, que, para o efeito, mandei emoldurar.

Andor da Senhora Aparecida
Foto pesquisada na Internet
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 19 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8134: Memórias de um ex-combatente (2): O desembarque, a viagem e a estadia no Cumeré (Manuel Sousa)

Vd. último poste da série de 23 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8157: Blogpoesia (146): Elegia para um paisano (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P8232: In Memoriam (76): Isabel Raimundo Conde homenageia seu tio José Luís Inácio Raimundo, Soldado Comando da 38.ª CCOM (morto em combate em Guidaje a 12 de Maio de 1973), no dia do seu 61.º aniversário

1. Mensagem da nossa amiga Isabel Raimundo Conde*, com data de hoje, 6 de Maio de 2011:

Bom dia
Sou sobrinha de um camarada que pertenceu à 38.ª Companhia de Comandos "OS LEOPARDOS", José Luís Inácio Raimundo** e gostaria que hoje dia 6 de Maio fosse posto na vossa página o seguinte:

Faz hoje 61 anos que um ser lindo por dentro e cativante por fora... um SER que segundo dizem, robusto, moreninho e que todos os que o rodeavam diziam: "Que lindo bébé"

Deus o quis para Sua companhia ainda muito jovem.

Todos nós, família e amigos, ficamos só com a sua imagem e a saudade em nossos corações.

"Onde quer que estejas, MEU ADORADO TIO, este, nunca deixa de ser o teu dia de aniversário.
Que tua alma esteja em paz e que o teu poder de Anjo permaneça sempre em nós"

Tua Sobrinha
Isabel Raimundo Conde
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 9 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5431: O Nosso Livro de Visitas (73): Doce lembrança do meu tio José Raimundo, da 38ª CComandos, Os Leopardos, natural da Azambuja

(**) Vd. poste de 3 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6307: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (14): Cemitérios de Guidaje e Unidades mobilizadas na Madeira

Vd. último poste da série de 29 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8181: In Memoriam (75): Gen Bettencourt Rodrigues (1918-2011), último Com-Chefe e Governador Geral da Guiné (Joaquim Mexia Alves / José Martins / Fernando Costa / Editores)

Guiné 63/74 - P8231: Resumo da actividade do BCAÇ 3833 (1971/73) (5): Pel Caç Nat 59 e Pel Milícias (Augusto Silva Santos)



1. Fim do resumo dos Factos e Feitos do BCAÇ 3833, enviado pelo nosso camarada Augusto Silva Santos (ex-Fur Mil da CCAÇ 3306 / BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73, em mensagem do dia 21 de Abril de 2011:



Historial/Resumo do que foi a actividade do BCAÇ 3833 (5)


PEL CAÇ NAT 59 E PEL MILÍCIAS








OBS: - Clicar nas imagens para ampliar
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Nota de CV:

Vd. postes da série de:

2 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8197: Resumo da actividade do BCAÇ 3833 (1971/73) (1): CCS - Pelundo (Augusto Silva Santos)

3 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8207: Resumo da actividade do BCAÇ 3833 (1971/73) (2): CCAÇ 3306 - Jolmete (Augusto Silva Santos

4 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8215: Resumo da actividade do BCAÇ 3833 (1971/73) (3): CCAÇ 3307 - Pelundo (Augusto Silva Santos
e
5 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8221: Resumo da actividade do BCAÇ 3833 (1971/73) (4): CCAÇ 3308 - Có (Augusto Silva Santos)

Guiné 63/74 - P8230: Notas de leitura (236): Alvorada em Abril, de Otelo Saraiva de Carvalho (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Abril de 2011:

Queridos amigos,
“Alvorada em Abril” é um testemunho determinante para se entender o desencadeamento das operações que levaram ao derrube do antigo regime.
Otelo Saraiva de Carvalho rememora acontecimentos militares e descreve o que viu na Guiné, teatro de operações que teve um papel crucial na génese do Movimento dos Capitães.
A tal propósito, deixa-nos as suas impressões sobre os acontecimentos de 1970 a 1973, naturalmente controversos mas com uma importância soberana.

Um abraço do
Mário


Otelo Saraiva de Carvalho e a Guiné

Beja Santos

"Alvorada em Abril "é o título das memórias de uma figura lendária do 25 de Abril em torno da história portuguesa dos anos 50 aos anos 70, culminando com a concepção e execução do derrube do regime chefiado por Tomás e Caetano. Temos nestas memórias o que para ele foi determinante, no seu percurso pessoal e no seu modo de interpretar os acontecimentos contemporâneos, a génese e o triunfo do Movimento dos Capitães e como este desaguou no 25 de Abril ("Alvorada em Abril", Editorial Notícias, 4ª Edição, 1998). A sua terceira e última comissão foi na Guiné, pelo que tem todo o sentido fazer o registo das suas lembranças e observações.

Ele parte para a Guiné em Setembro de 1970 e logo recorda que se encontrava em Nova Lamego, em 22 de Novembro, quando soube da invasão da Guiné-Conacri. A notícia deixou-o estupefacto, ele que trabalhava em Bissau de nada sabia e acrescenta que posteriormente veio a saber que o assunto já era discutido pelas mulheres dos oficiais nos cabeleireiros da Baixa de Bissau antes de se ter realizado. Nessa noite, enquanto decorria a operação, houvera vigília em Bissau, Spínola aguardava ansioso das notícias da missão rodeado dos seus leais colaboradores, tenente-coronel Robin de Andrade, major Firmino Miguel e major Jorge Pereira da Costa. E adianta: "Ainda hoje desconheço quais seriam, exactamente, os objectivos da missão, mas parece não restarem dúvidas de que, entre eles, estariam os assassínios de Amílcar Cabral e de Sékou Touré, o silenciamento da Rádio Conacri, a destruição de sede do PAIGC, a destruição de aviões na base aérea local e a libertação de prisioneiros de guerra portugueses retidos nas prisões da cidade".

Dá-nos em água-forte um retrato de Spínola que culmina com uma apreciação corrosiva: "Medularmente vaidoso e autoritário, sempre o reconheci totalmente incapaz de se atribuir o mínimo erro ou de debitar a mais suave autocrítica. Sendo detentor da razão e da verdade absolutas, era com displicência e sem remorso que liquidava o bode expiatório escolhido para arcar com as responsabilidades de qualquer falhanço pessoal... demagogo em extremo nunca entendi com clareza se as qualidades que nele admirava era autênticas e humanas ou se cultivadas com esforço a fim de construir artificialmente uma personagem".

Descreve o seu trabalho no QG e alude mesmo o nome de oficiais milicianos, da extrema-direita, que mais tarde acompanharão Spínola na aventura do MDLP. Colocado na Subsecção de Operações Psicológicas, assistiu ao exibicionismo propagandístico é à construção de imagem que Spínola quis criar em Portugal e internacionalmente, o que ele procurava era sugerir um extraordinário surto de progresso na Guiné com a sua governação e minimizar os êxitos no combate do PAIGC. Narra peripécias com jornalistas internacionais, certames de propaganda, a realização de Congressos do Povo. Refere os efectivos militares, do lado português e os do PAIGC, as argumentações de aliciamento, de um lado e do outro. A narrativa não é cronológica, dá saltos, vai até ao futuro repentinamente, conta histórias passadas, de supetão. Está-se a falar da propaganda do PAIGC, seguem-se referência ao seu programa político, destaca-se a figura de Rafael Barbosa como agitador, que foi preso em Março de 1962, tendo permanecido encerrado num cubículo durante quase 8 anos, onde foi espancado e torturado. Em Agosto de 1969, Spínola ordenou que fosse libertado. Tempos mais tarde, Rafael Barbosa manifestará publicamente o seu arrependimento por ter aderido à luta armada. Em 1977, será julgado em Bissau pelo PAIGC pelo crime de traição ao partido e ao povo e ser-lhe-á comutada para 15 anos de prisão a pena de prisão perpétua a que fora inicialmente condenado.

Já em 1973, o autor descreve a chegada dos mísseis terra-ar Strella e depois depõe sobre o controverso "I Congresso dos Combatentes do Ultramar". Para Otelo, os organizadores eram antigos oficiais milicianos com ideologia de extrema-direita que garantiam publicamente ao regime a entrega devotada dos oficiais das Forças Armadas à nobre missão de, através da continuidade da guerra colonial, assegurar a perenidade da Pátria. Os oficiais do quadro ter-se-ão apercebido da essência da manobra e reagiram. Almeida Bruno terá sido quem mais actividade desenvolveu, promovendo uma resposta concertada. Para os oficiais na Guiné já não subsistiam dúvidas que o Governo procurava tirar dividendos da "entusiástica adesão dos patrióticos combatentes do Ultramar". E escreve: "Enquanto em Lisboa Ramalho Eanes, Hugo dos Santos, Vasco Lourenço e outros encabeçavam um vasto movimento de protesto, eram recolhidas na Guiné 400 assinaturas de oficiais do QP com a mesma intenção, subscrito em primeiro lugar por oficiais possuidores das mais elevadas condecorações”. O autor inscreve estes acontecimentos num processo mais vasto de descontentamento das Forças Armadas que veio a ser ateado pelo Decreto-Lei nº 353/73, nova peça da bola de neve que irá conduzir à queda do regime.

Passando para outro campo de considerações, Otelo de Saraiva de Carvalho fala dos acontecimentos de Guileje, em Maio de 1973, quando o major Coutinho e Lima mandou evacuar o aquartelamento, para tal escrevendo: "Para o major Coutinho e Lima o motivo era suficientemente forte: incontável número de flagelações da artilharia inimiga tinha destruído quase por completo as instalações aquartelamento e o moral do pessoal. Apesar dos pedidos insistentes e aflitivos, o apoio aéreo não fora concedido, no receio de que a acção fosse um chamariz para o abate de mais alguns aviões. Ao ter notícia da evacuação, Spínola não viu outra alternativa senão ordenar a prisão de Coutinho e Lima e mandar instaurar-lhe um auto de corpo de delito por crime essencialmente militar de cobardia: abandono de praça militar ao inimigo". É neste contexto que surge Manuel Monge, graduado em major, foi sobre os seus ombros que caiu a responsabilidade de aguentar a tragédia de Gadamael.

Estamos praticamente no final na sua narrativa referente à Guiné. Marcelo Caetano decidira, em 1972, apoiar a nomeação de Américo Tomás para novo mandato. Spínola considerava que gozava de alguns apoios muito influentes do panorama político e financeiro português (Azeredo Perdigão, Jorge de Melo, Manuel Vinhas, António Champalimaud). Em Agosto de 1973, Spínola regressa a Portugal, é promovido a general de 4 estrelas e nomeado vice-chefe do EMGFA. Spínola mudara, observa o autor. Fizera um longo, longo percurso, fora administrador e colaborador do boletim da Legião Portuguesa, no início da carreira; baseado na sua experiência guineense, sentia-se agora apto a defender o federalismo para contornar uma guerra não susceptível de ter solução militar.

Em Setembro de 1973, Otelo Saraiva de Carvalho participa pela última vez numa reunião do Movimento de Capitães, em Bissau. E escreve: "Exactamente três meses depois da minha chegada a Bissau seguirei para a metrópole em fim comissão. Recebo a incumbência de, em Lisboa, de me integrar no Movimento e ser o porta-voz das preocupações que assaltam os camaradas no TO da Guiné". Preocupações que ele desenha num quadro de tintas carregadas: é previsível que o PAIGC irá proclamar a independência do território. Nas reuniões do Movimento dos Capitães em embrião já se debate o que irá mudar com essa independência reconhecida pela ONU. E escreve: ”O Governo Central não proporcionará às Forças Armadas no TO da Guiné qualquer apoio, provocando a sua derrota calculada para as transformar em bode expiatório da perda da colónia como acontecera antes com o Estado da Índia, e canalizar todo o esforço militar para a defesa de Angola.”

E tece o seu comentário sobre o que se estaria a passar na mente de Marcelo Caetano:” Em entrevista concedida por Marcelo Caetano no Brasil, em 1977, a um jornalista português, o antigo Presidente do Conselho confirma que tencionava na verdade provocar a queda da Guiné através de uma derrota militar para, salvando a face do regime, reforçar a todo o custo a defesa de Angola por tempo ilimitado. Não posso acreditar que Spínola não estivesse perfeitamente consciente de todo este drama. Considero, pelo contrário, que essa seria a razão fundamental que o teria levado a não regressar para concluir o sexto ano do seu mandato. Ele não poderia nunca, após mais de cinco anos de intensa actividade desenvolvida na Guiné e que era para si motivo de orgulho e honraria, transformar-se no comandante-chefe de umas Forças Armadas enxovalhadas e derrotadas em consequência da ineficácia do regime.”
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 3 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8209: Notas de leitura (235): O Meu Testemunho, uma luta, um partido, dois países, por Aristides Pereira (3) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P8229: Memória dos lugares (153): Cacine, ao tempo do Pel Rec Daimler 2049 e da CART 1692 (António J. Pereira Costa)

1. Mensagem do nosso camarada António José Pereira da Costa, em resposta ao poste P8227:


Data: 5 de Maio de 2011 23:1

Assunto: Pel Rec Daimler 2049


Boa noite Camaradas

Não me lembro do Júlio Dias, do Pel Rec Daimler [2049].


Lembro-me do Alferes dele: Couceiro Costa, do Porto.


O 2049 substituiu o Pel Rec Daimler 1136,  do Alf Pinheiro Torres, também do Porto, fur Gonçalves e o soldado Zé. Dos outros também não me lembro.


Cada pelotão tinha 1 Oficial, 1 Sgt, 6 soldados e 6 cabos. 

Já em 1969, o Couceiro Costa contou-me que a coluna para Cameconde foi emboscada e uma das Daimler accionou uma mina. A GMC da metralhadora pesada foi atingida por um RPG que matou o Alberto, da Companhia de Milícia 21. 

O furriel Isidro pertencia à [CART] 1692 (saíu do sector em Dezembro de 68) e accionou uma mina anti-pessoal, julgo que nas imediações do Porto Cantede. Ficou cego de um olho e sem três dedos. Foi num campo com 66 minas A/P PMD - 6, talvez em Set/Out 68. Foi evacuado e morreu no HM 241, com uma "doença de guerra": um úlcera fulminante que ninguém sabia que ele tinha nem o próprio.

Fiquei satisfeito por ter revisto a enfermaria do quartel mobilada à custa do desenrascanço da malta da ferrugem. Até tinha marquesa ginecológica feita com chapa de bidon e coberta com cobertor.

Vêem-se também os mangueiros gigantescos que havia perto da caserna e o "tapete" da entrada feito com garrafas de cerveja cheias de terra e enterradas de gargalo para baixo.

O fur Vilaça adoeceu e já não pertencia à CArt 1692 quando o Júlio chegou a Cacine.

Um Abraço do

António Costa

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Nota do editor:

Último poste da série >  20 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8138: Memória dos lugares (152): A cidade de Bissau em 1968/70: um roteiro (Carlos Pinheiro)