Mostrar mensagens com a etiqueta Açores. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Açores. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, 15 de março de 2022

Guiné 61/74 - P23081: Os nossos seres, saberes e lazeres (496): Guerra e Desporto, mais um artigo de Alexandre Silveira publicado no Jornal Fayal Sport Club (José Câmara, ex-Fur Mil Inf)

1. Em mensagem de 8 de Março de 2022, o nosso camarada José Câmara (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, BráBachile e Teixeira Pinto, 1971/73), enviou-nos mais um recorte da sua colaboração no Jornal Fayal Sport Club.

Mano Carlos,
Espero que esteja tudo bem. A vida por estes lados lá vai seguindo com altos e baixos, mas não nos podemos queixar. Fazê-lo é um autêntico sacrilégio perante o que vamos observando por este mundo fora.
Mas adiante.

Encontrei mais este artigo, “Eu… Desportivo” que então escrevi para o jornal do Fayal Sport Club, na sua Edição de 2/6/1973, que seria o último, em vésperas de emigrar para os Estados Unidos da América. Nem de propósito, …perante o panorama futebolês que grassa um pouco por todo o lado.

Compreendo que isto nada tem a ver com a nossa Guerra do Ultramar, no caso da Guiné, mas talvez sirva um propósito, unidos seremos sempre mais fortes no Crer e Querer.

Abraços e beijinhos da tua família “americana”.
Abraço fraterno do mano
José




____________

Notas do editor

Poste anterior de 23 DE DEZEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22835: Os nossos seres, saberes e lazeres (483): Guerra e Desporto, mais um artigo de Alexandre Silveira publicado no Jornal Fayal Spor Club, enviado a partir da Mata dos Madeiros (José Câmara, ex-Fur Mil Inf)

Último poste da série de 12 DE MARÇO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23071: Os nossos seres, saberes e lazeres (495): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (41): Em Cernache do Bonjardim e na Sertã, no dia em que aqui recebi a segunda dose da vacina (1) (Mário Beja Santos)

sábado, 12 de fevereiro de 2022

Guiné 61/74 - P22992: (In)citações (195): Estou a preparar a 2ª edição, revista e acrescentada, do meu livro "A Pesca à Baleia na Ilha de Santa Maria" (Arsénio Puim, ex-alf mil capelão, CCS/BART 2917, Bambadinca, 1970/72)


Arsénio Puim, natural de Santa Maria, Açores, a viver em São Miguel, 
escritor, ex-alf mil capelão, CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72):



1. Mensagem do nosso amigo e camarada Arsénio Puim:

Data - 11 de fevereiro de 2022 17:25
Assunto - Nota de leitura
 

Obrigado pela tua “nota de leitura” relativa ao meu livro (*). Um livro, sem dúvida, simples e limitado, de cariz popular e muito mariense-açoriano, mas que julgo será um bom documento para a posteridade.

Posso informar-te que, desde há algum tempo, estou a preparar uma nova 2.º edição, também revista e acrescentada. Desta vez , é a reedição do livro “A Pesca à Baleia na Ilha de Santa Maria”, que publiquei em 2001 (, edição do Museu de Santa Maria, 109 pp.). Espero que venha a lume no próximo verão.

Luís, apreciei o pequeno debate relativo a alguns termos marienses de influência americana (**). Penso que esta foi no passado, em maior ou menor dimensão, uma realidade frequente em meios populares mais isolados e menos escolarizados que sofreram a influência doutras culturas. 

Em Santa Maria a influência foi americana, noutros meios será francesa ou alemã e ainda noutros foi portuguesa. É o caso, “mutatis mutandis”, do crioulo, que também se insere nesta dinâmica linguística corrente, proporcionada pela oralidade corrente, no caso, a associação da língua nativa e a língua dos colonizadores. São fenómenos curiosos.

Relativamente ao termo “calafona”, não há duvida que vem de “Califórnia”. Porém, no uso mariense popular o termo foi alargado a todo os emigrantes de qualquer área da América que apresentam características muito americanizadas, tanto no sotaque como no vestuário, maneiras de ser e linguagem. Já o termo “calafão” é muito menos usual em Santa Maria.

Quanto ao termo “raivar”, é verdade que às vezes, numa versão mais evoluída, se diz draivar, mas num americanismo mais retinto é mesmo “raivar”.

Do termo “estôa” não conheço em Santa Maria a variante estoro. Sei, porém, que os termos podem adquirir nas diversas ilhas um cunho próprio. E quanto aos nomes próprios, eles sofrem habitualmente grandes adaptações na América.

E tu, Luís,, quando é que escreves o teu livro? Com a tua bagagem e capacidade, há que pensar nisso.

Sabes que o Mário Ferreira, médico do nosso Batalhão, também publicou em 2007 o livro “Tempestade em Bissau”? (***) Numa ocasião em que fui a Lisboa , há quinze anos, ele ofereceu-me um exemplar. É uma visão da Guiné e da guerra, romanceada mas ao mesmo tempo baseada na realidade, à maneira talvez de romance histórico - escrita por alguém que (vê-se) esteve lá - e onde afloram conceitos filosóficos e sociais muito válidos.

Muita saúde! Um grande abraço.

_____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 8 de fevereiro de 2022 > Guiné 61/74 - P22977: Notas de leitura (1418): "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada (2021), por Arsénio Chaves Puim, um caso de grande sensibilidade sociocultural e de amor às suas raízes (Luís Graça ) - Parte III: a influência dos "calafonas"

(**) Último poste da série > 10 de dezembro de  2021 > Guiné 61/74 - P22796: (In)citações (194): Divulgação do Prémio Literário Antigos Combatentes - Ministério da Defesa Nacional (Mário Beja Santos)

(***) Vd. poste de 29 de dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7525: Notas de leitura (181): Tempestade em Bissau, Ano 1970, de Mário Gonçalves Ferreira (Mário Beja Santos)

Vd. também poste de 10 de setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2092: Antologia (61): Tempestade em Bissau (Mário G. Ferreira)

terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Guiné 61/74 - P22977: Notas de leitura (1418): "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada (2021), por Arsénio Chaves Puim, um caso de grande sensibilidade sociocultural e de amor às suas raízes (Luís Graça ) - Parte III: a influência dos "calafonas"



Capa do livro do nosso camarada Arsénio Chaves Puim, "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada, Santa Maria, Câmara Municipal de Vila do Porto, 2021, 286 pp. Capa: Ilha de Santa Maria, do cartógrafo Luís Teixeira, 1587, Biblioteca Nacional de Florença.



1. Em 20/12/2021, por altura do Natal, o Arsénio Puim mandou-nos uma mensagem por email em que, para além dos votos natalícios,  nos dizia, entre outras coisas:


(...) "Talvez estranhamente depois da minha vivência como capelão militar na Guiné, em vez de publicar um livro sobre este território e a sua guerra e a minha experiência nesse meio, optei por escrever sobre aspectos etnográficos e históricos relativos à minha pacata ilha de Santa Maria, nomeadamente, a linguagem tradicional do seu povo.

Na verdade, sempre gostei e tive curiosidade por esta temática dos falares populares. Já na Guiné, como referes, interessei-me um bocado pelo estudo do crioulo, uma língua que sempre achei muito bonita, muito expressiva e muito sonante. E sobre isso escrevi mesmo alguns trabalhos, baseados no contacto com a população local.

Isto não que dizer que, depois de regressar aos Açores, não tenha publicado, nos jornais, diversos trabalhos de natureza social e política - sobre a guerra colonial, as guerras internacionais e , sobretudo, sobre a guerra, como realidade histórica, sem causa justa, fruto da loucura e estupidez dos homens. Nestes escritos jornalísticos também abordei criticamente a passividade e conluio escandaloso da Igreja com o monstro da guerra". (...)

Estamos a falar de Arsénio Chaves Puim que, além de nosso camarada, é apresentado na Wikipédia, na entrada sobre a Ilha de Santa Maria. como um dos nove marienses ilustres: "historiador, etnógrafo, co-fundador e primeiro diretor de 'O Baluarte de Santa Maria' (segunda série), opositor ao Estado Novo, presidente da Câmara de Vila do Porto e pároco de São Pedro e Santa Bárbara".

2. Vê-se que o seu último livro, agora em 2ª edição, "revista e acrescentada", e cuja capa voltamos a reproduzir acima (*), foi escrito com muito carinho, amor e até paixão... Sem pretender ser enciclopédico, nem se arrogar o estatuto de investigador académico, Arsénio Puim não quis que a geração dos seus pais desaparecesse de todo sem que a memória da suas marcas identitárias, e nomeadamente, o seu "falar", ficassem registadas para a posteridade... 

Para além do desaparecimento físico dos seus progenitores,  dos seus vizinhos e dos seus conterrâneos dos seus pais, o autor está, de certo modo,  a tentar prevenir, ou amortecer, de algum modo, os efeitos, avassaladores, da passagem do cilindro compressor da globalização... e a perda da identidade açoriana, em geral, e mariense, em particular.

Pequenas comunidades como as ilhas do arquipélago dos Açores estão de há muito sujeitas à influência de multiplos factores de "aculturação" externa... A periferia geográfica,  a colonização do território, a pesca da baleia, a emigração para a América do Norte, a presença militar norte-americana, os contatos com o exterior,e, mais recentememte,  os meios de comunicação, as novas tecnologias de informação e comunicação, a integração europeia, o desenvolvimento económico, o turismo, etc., tudo isso, teve e tem influência na cultura do povo da ilha, a sua maneira de ser, de estar e de falar.  

Santa Maria, é bom recordar, é a ilha mais  oriental e mais meridional do arquipélago, a mais antiga do ponto de vista geológico (mais de 8 milhões de anos) e a primeira a de ser descoberta (em 1427).

O autor dedica um subcapítulo aos "americanismos" no léxico mariense (pp. 97-110). Distingue-se três períodos que terão sido marcantes na formação desses "americanismos" ou "calafonismos" (de "calafona", termo de origem obscura, que designa, nos Açores, na linguagem informal, o emigrado que retorna aos Açores, em especial o que vem da América):

(i)  a emigração para os EUA  no últmo quartel do séc. XIX e primeiro do séc. XX;

(ii) a instalação, na ilha, de uma base militar de apoio às Forças Aliadas já no final da II Guerra Mundial (fins de 1944);

(iii) a emigração para os EUA e para o Canadá a partir da década de 50 do século passado, e que levou à redução da população, em menos de  três décadas, em cerca de metade (, tendo a ilha  hoje cerca 5,5 mil habitantes, segundo o censo de 2001).

"Embarcados, às vezes clandestinamente, em barcos baleeiros ou navios cargueiros, tiveram de enfrentar dias ou meses, e mesmo, anos muito difíciais no mar antes de desembarcarem nas costas do novo mundo (...). Uma vez na América, trabalhavam duramente, a troco de um salário módico, e viviam em condições bastante precárias (pág. 97).

Parte desta vaga de gente migrante voltou para a ilha, com algum pé de meia, logo no virar do século XIX.  Um número mais significativo de famílias de Massachusetts tiveram de  regressar na sequência da Grande Depressão de 1929-1933. Analfabetos na sua maior parte, estes emigrantes que retornam à ilha natal,  vêm "acalafonados" e vão "enriquecer" o léxico popular local com vocábulos e expressões do inglês falado na América.

Uma segunda influência é a dos militares norte-americanos estacionados na ilha a partir de finais de 1944, em número da ordem de algumas boas centenas.

"Desde os primeiros tempos, o nosso emigrante, que, na quase totalidade, não possuía qualqier conhecimento da língua inglesa, foi apreendendo uma série de vocábulos deste idioma, sobretudo chavões, que exibia insistentemente nas suas visitas à iha" (pág. 100).

Feito este pequeno enquadramento, o autor elenca mais de uma centena de "americanismos" ou "calofonismos" que, no entanto, têm tendência para irem desaparecendo lentamente do falar quotidiano, nomeadamente entre as camadas mais jovens, escolarizadas.

3. Aqui vão, a título exemplificativo (e não exaustivo, a lista do autor são 121 entradas), e com a devida vénia, alguns vocábulos e expressões, que também ilustram bem a capacidade de adaptação e o espírito prático e expedito do mariense que passou por terras do tio Sam e que "aportuguesou" o inglês do dia a dia... Há termos "deliciosos", corruptelas do inglês, e que têm de ser ouvidas com o sotaque mariense. Entre parênteses, a origem em inglês. 


Aisiulieira ("I'll see you later"): até logo, vemo-nos mais tarde...

Alvarozes ("overall"): fato-macaco que se veste por cima de outra roupa;

Àpestéres ("upstairs"); o andar de cima;

Beibicêra ("babysitter): aquela que toma conta de crianças;

Bisi ("busy"): ocupado, atarefado;

Biznas ("business"): negócios, assuntos;

Camâne ("come on"). vamos lá embora;

Chança ("chance"): oportunidade;

Chape ("shop"): fábrica, oficina;

Côrte ("court"); tribunal;

Dampo ("dump"); lixeira;

Drinque ("drink"): bebida;

Esquiusemi ("excuse me): peço desculpa;

Estôa ("store): loja, armazém;

Faite ("fight"): luta, briga;

Frijueira ("refrigerator"): frigorífico;

Friza ("freezer"): congelador;

Garbitche ("garbage"): lixo:

Jampar ("to jump"): saltar;

Landre ("laundry"); lavandaria;

Lóia ("lawyer"): advogado;

Màquêta ("market"): mercaddo;

Mechim ("machine"); máquina;

Maneija ("manager"): gerente, gestor;

Naice ("nice): bonito;

Naife ("knife"): naavalha;

Ófas ("office"): escritório, oficina;

Pari ("party"): festa;

Perigôde ("very good"): muito bom;

Pinche ("pension"): pensão de reforma;

Pinotes ("peanuts"): amendoim;

Pinhos ("pins"): alfinetes de pendurar roupa;

Raivar ("to drive"): guiar, conduzir um carro;

Râladeis ("holidays"): férias (, mais usado pelos emigrantes canadianos);

Ritaia ("retired"):  reforma, reformado;

Sanababicha ("son of a bitch"):  filho da mãe;

Sinó ("snow"): neve;

Spicar ("to speak"): falar;

Tanquiú ("thank you"); obrigado;

Teicarizi ("take it easy"):  calma, devagar!;

Tèlaveija ("television"): televisão;

Trablas ("troubles): problemas, chatices;

Ueiramanète ("wait a minute"): espera um minuto;

Vaqueichas ("vacations"): férias... 


(Continua) (**)
_________________

Notas do editor:

(*) Vd. postes anteriores :


18 de dezembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22819: Notas de leitura (1399): "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada (2021), por Arsénio Chaves Puim, um caso de grande sensibilidade sociocultural e de amor às suas raízes (Luís Graça ) - Parte I: "Muitos parabéns, muitos parabéns, muitos parabéns!"

(**) Último poste da série > 7 de fevereiro de 2022 > Guiné 61/74 - P22975: Notas de leitura (1417): “A crise alimentar e o estado socialista na África Lusófona”, por Rosemary E. Galli, artigo publicado na Revista Internacional de Estudos Africanos, n.º 6 e 7, Janeiro/Dezembro de 1987 (2) (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

Guiné 61/74 - P22922: Notas de leitura (1411): "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada (2021), por Arsénio Chaves Puim, um caso de grande sensibilidade sociocultural e de amor às suas raízes (Luís Graça ) - Parte II: as dolorosas memórias do tempo da pirataria




Capa do livro do nosso camarada Arsénio Chaves Puim, "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada, Santa Maria, Câmara Municipal de Vila do Porto, 2021, 286 pp. Capa: Ilha de Santa Maria, do cartógrafo Luís Teixeira, 1587, Biblioteca Nacional de Florença.


1. Não se trata de um trabalho académico, previne o autor, não sem alguma modéstia. Em "palavras prévias", da 1ª edição (2008),  diz-nos que o seu livro não pretende "ser obra de carácter científico", podendo todavia  "interessar a estudiosos e ao grande público".

Mais importante  é o seu objetivo expresso de "contribuir para o estudo e salvaguarda do patrmónio cultural mariense, preservar a memória daquilo que se fazia no passado e do modo como se dizia,e não se perder o elo de ligação entre as gerações novas e as antigas" (pág. 10).

Eu diria que é uma obra de amor e de reconciliação do autor com o seu passado, a sua infância, a sua terra, as suas gentes.  É,  por outro lado, uma obra singular: "Tudo o que escrevi neste livro foi o que eu vivi, particularmete numa prineira fase da minha vida, entre meados da década de trinta e meados da década de cinquenta" (pág. 12).

E não é por acaso que o livro é dedicado aos seus Pais, António Carvalho Puim e Maria da Encarnação Chaves (, a querida mãe que perdeu num  naufrágio em 19 de Setembro de 1958), e ao Povo da ilha de Santa Maria, mostrando-se o autor "grato pela herança moral, cultural e linguística que me legaram".

É um trabalho de investigação etnolinguística  (, área da linguística que estuda as relações de uma língua com a cultura de um dado grupo étnico) , devendo remontar, pelo menos a meados dos anos 70. Em 1979, visitou a ilha de Santa Maria o grupo do "Atlas Linguístico- Etnográfico de Portugal e Galiza (ALEPG)", e na altura o bom do Puim cedeu "todo o material que recolhera". E acrescenta: 

"Algum tempo depois, reiniciei o meu trabalho de investigação, agora mais sistematizado e tendencialmemte orientado numa linha de relação entre a linguagem e a vida". Publicaria a seguir  uma séria de artigos, a partir de 1985, sob o título "O Povo de Santa Maria e o seu Falar",  artigos esses que vieram a lume no jornal "O Baluarte de Santa Maria", II série (, de que foi cofundador e primeiro diretor,  em 1977).

Lamentavelmente o Arsénio Puim foi vítima de apropriação indevida de parte do seu trabalho: alguns dos seus textos apareceram a público, noutro contexto, sem qualquer referência ao nome do autor e às  fontes originais... Houve até um caso que veio a público em 2006.

Já reproduzidos, em nota de leitura anterior, o índice do livro. Deliberadamente o autor optou por não apresentar um "glossário" de termos e expressões do falar mariense, mas antes "enquadrar, tanto quanto possível. os elementos selecionados em pequenos recortes explicativos ou resenhas de cariz social e histórico" (pág. 16).

É aqui que o livro ganha em vivacidade, originalidade e autenticidade, tornando-se a sua leitura uma fonte de saber e prazer. É impossível sermos exaustivos na análise do seu conteúdo, mas vamos ilustrar algumas das centenas de vocábulos do léxico popular mariense,  bem como locuções e expressões, americanismos, terminologia anatómica e sexual popular a par das expressões linguísticas das actividades tradicionais (como  a lavoura,  o linho, a pesca da baleia,  o artesanato, a arquitetura, a gastronomia, etc.).

Há vocábulos e expressões que ainda, infelizmente, não estarão grafados pelos nossos lexicógrafos (ou pelo menos pelos dicionários mais correntes, disponíveis "on line"), e que não podem deixar de contribuir para a diversidade e riqueza da nossa língua.

Por exemplo, o termo "achadas" que, na ilha de Santa Maria, usa-se para designar "os objetos diversos arrastados pelo mar e achados na costa" (pág. 20). Também se diz "achadas do mar"  ou "cacaréus",  por se tratar de coisas habitualmente sem grande valor material. Mas noutros tempos, uma simples garrafa de rum, vazia, deitada fora ao mar pela tripulação dos navios, era um bem valioso.  E com a  II Guerra Mundial e a batalha do Atlântico começaram a dar à costa as coisas mais diversas, e alguns de maior volume, como bidões de gasolina, pacotes de géneros alimentícios, madeira, borracha, etc.

Ainda hoje, diz o Arsénio Puim,  as "achadas do mar" teriam "um fascínio especial para as pessoas, como se fossem um dádiva maravilhosa dum mundo ignoto e longínquo" (pág. 21).

Uma palavra que seria "exclusiva e bem típica de Santa Maria é a interjeição "bei" (mais raramente, "buei"). Trata-se de "uma exclamação de admiração, a qual aspessoas reforçam alongando o som 'ei' em ondas sonoras de intensidae decrescente" (pág. 27),  sendo equivalente a expressões como "parece impossível!" ou  "quem haveria de dizer?!". 

Diz-se que a palavra  provém de um nome próprio, "Bei", um chefe mouro, do tempo das incursões dos piratas do Norte de África ao longo dos séc. XVI e XVII. (Segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuesa, "bei" é um nome masculino: (i) Governador de província muçulmana; e (ii) título do soberano da Tunísia.)

Também o termo "facho", substantivo masculino, parece estar relacionado com  os tempos da pirataria.  Facho ou o pico do pacho designa "determinados montes existentes em diversas localidades da ilha onde (...) se vigiavam os piratas (...) e se costumava acender um facho sempre que se  avistava a sua aproximação ou desembarque" (pág. 38). Vem do latim: fasculu(m) > fasclu > facho.

 Curioso é o verbo transitivo "guerrear" (fazer guerra, andar à bulha) que também já ouvimos, há muitos anos, em finais dos anos 70, princípios de 80,  a um velho pescador do Alvor, no Algarve,  a quem alugámos uma parte de casa na altura das férias... Levávamos miúdos, e ele perguntou-nos: "Atão, os moços na guerreiam?!"...

Na pronúncia de Santa Maria, há a tendência para "mudar o primeiro 'e' em 'a' fechado": "garrear", garreiam"... 

Uma expressão que ainda se usa, na ilha, é "Olha os Moiros!", sinal de que  não se apagaram de todo, da memória coletiva mariense, "as marcas trágicas e dolorosas das incursões dos piratas do Norte de África " (pág. 77). A expressão era usada, no passado, para incutir temor à crianças e prevenir alguma percalço ou perigo.

Costume antigo também era o das crianças, e até dos adultos,  atirarem para cima das telhas do forno um dente caído ou partido, dizendo: "Moirão, moirão / toma lá o teu dente podre / e dá cá o meu são|"... No imaginário popular e infantil  surgia então " um  homem  barbudo e desgrenhado, de dentes estragados e aspecto horrível" (pág. 77).  

A palavra "moirama", por sua vez, também ainda hoje é usada para significar o carácter rude e o feitio violento de alguém, pessoa, grupo ou comunidade. (**)

(Continua) 
_________

Notas do editor:

(*) Vd.  poste da série 18 de dezembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22819: Notas de leitura (1399): "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada (2021), por Arsénio Chaves Puim, um caso de grande sensibilidade sociocultural e de amor às suas raízes (Luís Graça ) - Parte I: "Muitos parabéns, muitos parabéns, muitos parabéns!"

(**) Último poste da série > 17 de janeiro de 2022 > Guiné 61/74 - P22915: Notas de leitura (1410): “África Dentro”, por Maria João Avillez; Texto Editores, 2010 (1) (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Guiné 61/74 - P22835: Os nossos seres, saberes e lazeres (483): Guerra e Desporto, mais um artigo de Alexandre Silveira publicado no Jornal Fayal Spor Club, enviado a partir da Mata dos Madeiros (José Câmara, ex-Fur Mil Inf)

1. Em mensagem de 17 de Dezembro de 2021, o nosso camarada José Câmara (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Brá, Bachile e Teixeira Pinto, 1971/73), enviou-nos mais um recorte da sua colaboração no Jornal Fayal Sport Club, a partir da Mata dos Madeiros, Guiné.

Mano Carlos,
Junto mais um dos meus escritos publicados no Jornal “Fayal Sport Club”, em 1971. Infelizmente não consigo saber exactamente o mês da publicação.
Ao tempo, ainda eu estava em Bissau, numa das minhas noites livres fui ao Estádio “Sarmento Rodrigues” para assistir a um jogo de futebol. Independentemente dos objectivos das minhas observações ao jogo e ao recinto, hoje isso pouco interessa, espero que o escrito traga memórias e recordações a alguns dos nossos companheiros.

Abraço fraterno do mano,
José


Recorte do Jornal Fayal Sport Club, com artigo publicado em 1971 pelo nosso camarada José "Alexandre da Silveira" Câmara, hoje radicado nos EUA.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 18 DE DEZEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22818: Os nossos seres, saberes e lazeres (482): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (22): As surpresas que o Museu de Lisboa nos reserva (Mário Beja Santos)

sábado, 18 de dezembro de 2021

Guiné 61/74 - P22819: Notas de leitura (1399): "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada (2021), por Arsénio Chaves Puim, um caso de grande sensibilidade sociocultural e de amor às suas raízes (Luís Graça ) - Parte I: "Muitos parabéns, muitos parabéns, muitos parabéns!"

 

Capa do livro do nosso camarada Arsénio Chaves Puim, "O Povo de Santa Maria, seu falar e suas vivências", 2ª edição revista e acrescentada,  Santa Maria, Câmara Municipal de Vila do Porto, 2021, 286 pp. Capa: Ilha de Santa Maria, do cartógrafo Luís Teixeira, 1587, Biblioteca Nacional de Florença.


1. Estou em dívida para com o meu amigo e camarada da Guiné, o ex-alf mil capelão Arsénio Puim (CCS / BART 2917, Bambadinca, 1970/72) que me mandou, pelo correio, um exemplar autografado (e com dedicatória) do seu livro, há 5 meses atrás.

Prometi-lhe fazer uma ou mais notas de leitura, mesmo que o livro não tenha a ver diretamente com a Guiné, ou as memórias da guerra da Guiné. Mas a Guiné está sempre presente, entre nós (*), até na dedicatória, que reza assim: 
"Ao companheiro da Guiné e grande amigo de sempre, Luís Graça. Vila Franca do Campo, 5 de julho d2 2021, Arsénio Chaves Pum".   Confesso que já li o livro, de fio a pavio, e, não sendo sequer açoriano, e só conhecendo 4 ilhas do arquipélago (Terceira, onde fiz férias em 1993, São Miguel, Horta e Pico) fiquei com ganas de dar um saltinho a Santa Maria, logo    que as "novas" pernas mo permitam...

Esta primeira nota de leitura é apenas  para dar conta da publicação  da obra que teve uma 1ª edição em  2008. E fazer uma apresentação (sumária) deste trabalho de pesquisa, revelador de uma grande sensibilidade socioantropológica e, mais do que isso, de um grande amor à sua terra, à sua gente, às suas raízes.  O livro é dedicado aos seus pais e ao povo da ilha, mostrando-se o autor "grato pela herança moral, cultural e linguística que me legaram". E começa por lembrar que o seu pai, António Carvalho Puim, nascido em 1903, "foi uma enciclopédia viva da linguagem mariense de sabor arcaico" (pág. 15).

Este interesse etnográfico pelo "falar" (, a língua mais oral que escrita,) que dá identidade a cada povo ou comunidade, já se revelava, na Guiné. Veja-se por exemplo, o poste P13314, da série "Memórias de um capelão" em que ele exalta as competências linguísticas do povo guineense, a que chama, com propriedade, um povo "poliglota" (**).

O autor, um "jovem" de 85 anos, natural da freguesia de Espírito Santo, Santa Maria,  vive atualmente na Ilha de São Miguel,  em Vila Franca do Campo, estando reformado (desde 1995)  da sua profissão de enfermeiro, do Serviço Regional de Saúde, a que se dedicou em exclusividade, tendo deixado em 1979, o múnus espiritual enquanto sacerdote católico.  Foi ainda professor de História e Português no Externato do Aeroporto, Santa Maria, na década de 60. Opositor político ao regime então vigente, foi mobilizado para a Guiné como capelão militar em 1970, sendo expulso do CTIG, um ano depois,  em maio de 1971. Regressado aos Açores, continuou a paroquiar, manteve o seu empenho cívico e concluiu, entretanto, o curso de enfermagem em 1976. É casado, tem dois filhos e dois netos.

Nunca abandonou, porém, o prazer e o dever da escrita, nomeadamente como jornalista e escritor: foi cofundador da  II série do jornal “O Baluarte”, juntamente com João de Braga e José Dinis Resendes. Foi diretor deste mensário entre 1977 e 1982.
 
É autor ainda  dos  livros «A Pesca à Baleia na Ilha de Santa Maria"  (edição do Museu de Sta Maria e da junta de Freguesia de Sto Espírito, 2001), e  «As Ribeiras de Santa Maria - Seus Percursos e História» (edição do jornal “O Baluarte”, 2009).
 
 2. E de  que é que trata esta 2ª edição de "O Povo de Santa Maria: seu falar e suas vivências" ? Embora fazendo apelo a técnicas da pesquisa etnográfica (como a  observação participante, a entrevista, a biografia, a acão-investigação, a análise documental, etc.), o autor não tem a pretensão de fazer obra académica, o seu objetivo é apenas o de "identificar, coligir e contextualiar um vasto conjunto de elementos e características respeitantes ao falar, muito castiço, muito expressivo e muito bonito, da pequena comunidade de Santa Maria", com a introdução, nesta 2ª edição, de novos temas como a cozinha tradicional,  a cultura da vinha nas fajãs e o casamento rural. 

Mas vejamos o índice do livro (de que se fizeram 500 exemplares). Esquematicamente:

I - Linguagem Popular Mariense (pp.. 19-114), incluindo: léxico popular, locuções e expressões populares, terminologia anatómica e sexual popular, americanismos, e alguns aspectos específicos do falar mariense. 

II - Atividades Tradicionais Marienses e sua Expressão Linguística (pp. 115-218): o carrear e o carro de bois; a lavra da terra, o arado e a grade; a debulha do trigo na eira; o trabalho doméstico do linho; o artesanato; a cozinha tradicional; a arquitetura rural ( a casa tradicional e sua chaminé; moinhos de água e de vento);  a cultura da vinha nas fajãs; a pesca à baleia e o seu léxico baleeiro).

III - Celebrações Festivas: sua Caracterização e Linguagem ( pp. 219- 268):  a Senhora das Candeias na Freguesia do Espírito Santo;  o Império Mariense: praxes, folias e linguagem: o São João de antigamente; os serões na aldeia: a 'matação' do porco; o casamento rural em tempos passados.

Breves Notas sobre a Literatura Popular Mariense (pp. 269-283).

Bibliografia.

Ficam os nossos leitores, espero, com "água no bico", aguardando a segunda nota de leitura, que há de sair, em passando o Natal... Ao nosso autor, só tenho que felicitá-lo pelo seu livro, usando uma expressão tipicamente mariense (das muitas que ele recolhe): ""Muitos parabéns, muitos parabéns, muitos parabéns!".. Remeto a explicação para o autor: "Era assim, em repetição tripla emitida num só fôlego, que as pessoas felicitavam os vizinhos e conhecidos por ocasião de uma acontecimento feiz, como um nascimento, um casamento, a chegada da vida militar, a recuperação deuma doença, etc." (pp. 75/76)... E eu acrescento: a publicação de um livro, como este, que é uma prova de muio amor, paciência e saber.  (***)

Parto também mantenhas natalícias, com o nosso camarada Puim!... Muita saúde e longa vida, que tu mereces tudo!... LG

(**) 20 de junho de 2014 > Guiné 63/74 - P13314: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69 / Mai 71) (12): O crioulo (e as suas virtualidades)

segunda-feira, 22 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22739: Os nossos seres, saberes e lazeres (478): Guerra e Desporto, um artigo de Alexandre Silveira publicado no Jornal Fayal Spor Club, enviado a partir da Mata dos Madeiros (José Câmara, ex-Fur Mil Inf)

1. Em mensagem de 19 de Novembro de 2021, o nosso camarada José Câmara (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Brá, Bachile e Teixeira Pinto, 1971/73), enviou-nos um recorte de imprensa através do qual nos desvenda mais uma das suas facetas, a de colaborador do Jornal Fayal Sport Club, a partir da Mata dos Madeiros, Guiné.

Mano Carlos,
Amigo meu está a publicar cópias dos jornais do Fayal Sport Club dos anos 60 e 70. Nesse clube, apesar de jovem, desenvolvi várias actividades deportivas e outras tais como festas de angariações de fundos monetários, na feitura do jornal e, como não podia deixar de ser, lá ia publicando alguns artigos, pobres na escrita, mas que me dava prazer.
Aqui vai um artigo que escrevi na Mata dos Madeiros, sem a possibilidade de revisão adequada. Depois de leres, diz-me se isso tem algum interesse para o blogue.
Aquele Alexandre Silveira sou eu (José Alexandre da Silveira Câmara). Eu tenho mais alguns escritos na Guiné.

Abraço fratero do mano José


Recorte do Jornal Fayal Sport Club, com artigo publicado em 1971 pelo nosso camarada José Alexandre da Silveira Câmara, hoje radicado nos EUA.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 20 DE NOVEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22734: Os nossos seres, saberes e lazeres (477): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (18) (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 29 de outubro de 2021

Guiné 61/74 - P22668: Peter Francisco (Ilha Terceira, Açores, 1760 - Richmond, Virgínia, 1831): um herói português na América... praticamente desconhecido em Portugal (José Belo, Key West, Florida)


Peter Francisco: retrato miniatura, óleo (meados do século XIX). 
Imagem do domínio público.


New Bedford, Massachusetts: Monumento a Peter Francisco  (Porto Judeu, Ilha Terceira, Açores, 1760 - Richmond, 16 de Janeiro de 1831), "patriota americano, de origem portuguea". 


New Bedford, Massachusetts > Monumento a Peter Francisco > Na placa lê-se: "Em honra de Peter Francisco, o Hércules da Independênca Americana. '“Sem ele teríamos perdido duas cruciais batalhas, talvez mesmo a guerra, e com ela a nossa liberdade. Peter Francisco é verdadeiramente um exército de um só homem!.' General George Washington."



Outro monumento a Pedro Francisco, 
Guilford Courthouse,  National Military Park



F
Foto à direita:  José Belo, jurista, o nosso luso-sueco, cidadão do mundo, membro da Tabanca Grande, reparte a sua vida entre a Lapónia (sueca), Estocolmo e Key-West (Flórida, EUA); foi nomeado por nós régulo (vitalício) da Tabanca da Lapónia, agora jibilado; na outra vida, foi alf mil inf, CCAÇ 2391, "Os Maiorais", Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70); é cap inf ref do exército português; durante anos alimentou, no nosso blogue, a série "Da Suécia com Saudade"; tem  mais de 210 referências no nosso blogue.


1. Mensagem de J. Belo: 

Data . 24 out 2021, 14h11
Assunto - Heróis portugueses quase desconhecidos em Portugal

Caro Luís

Vou enviar-te a história do soldado de origem açoriana que foi considerado um dos maiores heróis da guerra norte-americana pela independência:  Pedro Francisco, conhecido nos Estados Unidos como Peter Francisco, nascido em Porto Judeu, Angra do Heroísmo, Ilha Terceira, Açores em 1760.

O próprio comandante-chefe das tropas americanas, George Washington, escreveu referindo-se ao Peter Francisco :

“Sem ele teríamos perdido duas cruciais batalhas, talvez mesmo a guerra,e com ela a nossa liberdade. Peter Francisco é verdadeiramente um exército de um só homem!”


Noutros e-mails segue a história e algumas fotos, que recolhi na Net.  Ainda estou na Suécia até ao fim do mês, mas gostava de levar uma boa tradução do 
poste ,que irei espalhar entre amigos e conhecidos nos States, principalmente entre os que vivem na Virgínia e Pensilvânia, locais de algumas das batalhas.


Um abraço. J. Belo



O mais famoso soldado da Guerra pela Independência 
Norte-Americana era de origem portuguesa, 
Peter Francisco (1760-1831)


Pedro Francisco, ou Peter Francisco,  como é conhecido nos Estados Unidos, nasceu em 1760 no Porto Judeu, Ilha Terceira, Açores.

Existem duas versões sobre o seu aparecimento na América.

Numa delas conta-se ter sido raptado, quando tinha cinco anos de idade, por marinheiros de passagem com vista à sua posterior venda nas Américas.

Na outra versão, terão sido os pais de Francisco que o terão entregue a um comandante de navio com vista a uma educação para a vida no mar.

De qualquer modo ele acabou por ser abandonado na enseada de City Point (hoje Hope Well) no actual Estado da Virgínia.

Foi inicialmente recolhido num hospício para órfãos e pobres de onde acabou por ser retirado por um conhecido juiz,e proprietário de plantações locais, Antony Wiston.

Aos 16 anos de idade, em 1776, apresenta-se como voluntário no 10º Regimento da Virgínia.
Passa deste modo a fazer parte do Exército Continental em luta contra os ingleses pela independência.

A sua coragem, fora do comum, aliada a um voluntarismo constante, rapidamente o fizeram notar tanto por camaradas como por superiores.

Procurou sempre o centro dos violentos combates,  tendo sido ferido nas batalhas de Brandywine, Pensilvânia,  e na de Monmouth (, travada perto de 
Monmouth Court House, que hoje fica em território do estado de New Jersey).

Em Julho de 1779 salientou-se na conquista do campo fortificado de Stony Point onde foi o segundo homem a conseguir transpor as muralhas depois de inúmeras baixas em seu redor.
Conseguiu tomar posse da bandeira inimiga e, apesar de gravemente ferido no abdómen, fez questão em ser ele a entregá-la pessoalmente ao seu comandante.

Neste período o Peter Francisco já era uma figura lendária em todo o exército. Mas foi na batalha de Camden, na Carolina do Sul,  em 16 de agosto de 1780, que a sua fama atingiu o topo.

Esta batalha correu mal para os revoltosos que foram obrigados a retirar. Sendo um dos últimos a retirar da linha da frente, Peter Francisco verificou que um canhão tinha sido abandonado pelos seus camaradas e estava meio enterrado na lama.

As tropas inglesas aproximavam-se rapidamente para se apoderar desta arma. Peter Francisco separa a peça do seu transporte e sozinho leva-a nos braços até à nova linha de defesa americana.

O canhão, então de modelo muito usado, pesava 1.100 libras (pound) ou seja...499 quilos!


Peter Francisco não era um homem pequeno. Aos vinte anos de idade tinha de altura 6  pés (feets) 6 polegadas (inches), ou seja, 1,92 metros, o que era mais de um pé  (30, 48 cm) do que a altura média na época. Pesava então 260 libras (pounds) (118 quilos).

Tendo chegado ao conhecimento do comandante-chefe, George Washington, que Peter Francisco se lamentava sempre de que a espada do seu armamento era pequena para a sua estatura, ordenou que se forjasse uma espada especial para ele com o tamanho de 6 pés  (1,83 m).

Espada que lhe foi solenemente entregue e se tornou muito útil na tropa de Cavalaria de que Pedro Francisco passou a fazer parte, alistado em 1781.
 
Foi a batalha de Guilford Courthouse que ficou especialmente ligada às proezas deste militar.
Com o seu exemplo e coragem influenciou os seus camaradas e, ele próprio, acabou por abater,  em combate corpo a corpo,  11 soldados ingleses.


A casa-museu de Peter Francisco na Virgínia


Aquando das comemorações do segundo centenário da independência norte-americana. em o serviço postal editou uma coleção de selos em que figuram os principais heróis da revolução. 

No selo dedicado a Peter Francisco (imagem à direiat) está escrito: “Lutaram pela causa…..um lutador extraordinário”. (Acompanhado pela imagem do herói, carregando ao ombro o famoso canhão referido acima.)

Recorde-se que a independência das treze colónias (os Estados Unidos da América) foi declarada em 4 de julho de 1776 e reconhecida pelos ingleses em 1783, após cinco anos de guerra. 


"Consideramos que essas verdades são evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais, que são dotados por seu Criador com certos direitos inalienáveis, que entre eles estão a Vida, a Liberdade e a busca da Felicidade."

Por sua vez, a casa de Peter Francisco, na Virgínia, foi totalmente recuperada pelos seus descendentes, sendo hoje um museu dedicado à sua vida.



J. Belo

(Fotos rec9lhidas na Net, e reproduzidas com a devia vénia aos seus autores)

PS - Pedro Francisco Machado foi homenageado na sua terra natal, Porto Judeu, concelho de Angra do Heroísmo, Ilha Terceira, Açores,  com nome de rua e  estátua em bronze, da autoria de Rui Goulart (fundição Lage, 2015). A estátua representa um menino, de 5 anos, de pé, perscrutando o horizonte, o mar. Foi inaugurada no 25oº aniversário da chegada de Pedro à América, Fotos podem ser ser vistas aqui. O escultor, açoriano da ilha do Pico, tem página no Facebook, aqui. (LG)

________________

quarta-feira, 27 de outubro de 2021

Guiné 61/74 - P22663: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - XI (e última) Parte: Leiria, 27/1/1970: "Faz hoje exactamente três anos que cheguei da guerra e o relógio psíquico interior acusou a efeméride e quis condignamente celebrá-la".


LIsboa > Benfica > Biblioteca-Museu República e Resistência – Espaço Grandella  > 27 de novembro de 2008 > O Cristóvão de Aguiar,  à esquerda, na  na apresentação da nova edição do seu livro Braço Tatuado (2008). Foto:  cortesia de Alberto Branquinho (2008)



Capa do romance "Braço Tatuado - Retalhos da Guerra Colonial, 2ª ed Editora: Dom Quixote, Lisboa Colecção: Autores de Língua Portuguesa Ano de edição: 2008- Preço com IVA: 12,00 €

 
1. Continuação da (re)publicação do "Diário de Guerra", do nosso camarada açoriano e escritor Cristóvão de Aguiar (1940-2021), que faleceu na passada dia 5, aos 81 anos (*).  

Organização: José Martins; revisão e fixação de texto (para efeitos de publicação no nosso blogue): Virgínio Briote (,a partir da parte VI, Carlos Vinhal).

Estes excertos, que o autor selecionou e cedeu amavalmente ao José Martins, para divulgação no blogue, fazem parte do seu livro "Relação de Bordo (1964-1988)" (Porto, Campo das Letras, 1999, 425 pp). (**). São onze ao todo os postes publicados no blogue, este será o último. 



Cristóvão de Aguiar.
Foto: Wook (com a devida vénia...)



Diário de Guerra

por Cristóvão de Aguiar


Coimbra, 18 de Maio de 1968

Não merecia tanto. Há mais de um ano que regressei da guerra e não há maneira de me sentir inteiro. Ando por aí, caindo aos bocados, vomitando pelas ruas, agarrado às grades de ferro de certos muros, cheio de pânico no futuro, que o presente, estou-o desperdiçando, por isso me agarro doentiamente ao passado, que bem sei que nunca foi um paraíso e a prova visível sou eu próprio. 

As dores de cabeça são por vezes terríveis e prolongam-se por mais de um dia. Dizem-me os médicos que tenho de ajudar-me, caso contrário a vida deixa de me ter sentido. Já deixou. Pelo menos em certas ocasiões, que se estão multiplicando e tornando cada vez mais frequentes. 

Tenho feito exames e passado com classificações muito razoáveis, até fiz mais do que eu próprio esperava, talvez por pressentir que ninguém acreditava nas minhas possibilidades. Faltam-me apenas quatro cadeiras, três das quais de envergadura, para concluir o plano de estudos do meu curso. Por este andar ainda me formo em menos de um ano. Bem entendido que pago alto preço por cada disciplina que arrecado. Sempre que faço um exame, fico uns dias acrescentados de cama, desfalecido, pele e osso, o cérebro vazio, tentando reconstruir-me para enfrentar outro [...].

Tomar, 17 de Dezembro de 1968

Vim esperar meu irmão Artur. Chegou hoje de Moçambique. Quando me abraçou, disse-me à queima-roupa que eu parecia um esqueleto ambulante. Respondi-lhe que era do estudo intenso a que me tinha submetido, já que me estava preparando para concluir o curso dentro de pouco tempo. Menti-lhe. Nunca o meu estudo teve uma intensidade por aí além. E nunca a teve, não porque não desejasse, mas porque nunca tive tempo. O que me sobra, depois das preocupações que tenho comigo, pouco ou nada representa. 

De oficial de dia ao Regimento de Infantaria 15 estava o capitão da minha Companhia da Guiné, o que não veio connosco por ainda lhe faltar algum tempo para terminar a comissão de serviço. Enquanto meu irmão foi tratar da sua desmobilização, fui para o gabinete do oficial de dia, onde também eu já estivera algumas vezes de serviço, conversar um pouco com o velho capitão. Parecia que estávamos os dois na tropa. Quando o cabo de transmissões lhe veio trazer uma mensagem confidencial vinda do QG, leu e depois passou-ma, para que a lesse também. Tal qual como na Guiné. 

Valeu meu irmão, já desmobilizado, ter vindo buscar-me, caso contrário ainda me metia de novo na pele de alferes. Magreza quase igual à que trazia quando desembarquei, tenho-a também agora. De forma que só me faltava a farda. Meu irmão vem tão ansioso por embarcar para a América que me disse que vai já começar quanto antes a tratar dos papéis.

Gerês, 21 de Julho de 1969

Vim para as termas em cata de alívio. Perguntei ao Louzã Henriques se fazia bem em vir. Disse-me que sim, que mal não me faria. Vai sempre ao meu jeito e não sei se isso me faz bem. Estou aqui há mais de uma semana. Saiu o Doutor Quintela e vim eu para o seu lugar. Ficou combinado em Coimbra. Ele costuma dizer que vem limpar a isca. Não me queixo do fígado, mas a função que exerce está alterada. Deve ser dos nervos. 

Estou todo alterado. Enquanto aqui esteve o Doutor Paulo Quintela, enviei-lhe todos os comunicados da crise académica produzidos durante a sua ausência. Sem remetente, que nunca se sabe. Rebentou em 17 de Abril, dia em que se inaugurou o edifício das Matemáticas. Houve greve geral aos exames, que foi um êxito, o que abalou o regime primaveril de Marcelo. 

Cumpro à risca a dieta prescrita. Bebo as águas com fé, como a comida sem sal, tomo banho de agulheta. Ao princípio tomava apenas um. Dois dias mais tarde, queixei-me ao médico de que não dormia. Receitou-me mais um banho de agulheta, à tarde. Um de manhã e outro ao fim da tarde. De tal maneira me desceu a tensão arterial, que ando aos tombos e nem sequer consigo ler.

 O resto do tempo, que é quase todo, ouço as asneiras dos africanistas em férias. Vieram tratar da figadeira e encontram-se aqui na Pensão da Ponte. E entro em ebulição, porque não posso ficar calado. Suspiram por Salazar e ainda têm esperança num milagre que o reponha no poder. Quem há meses lhe sucedeu na Presidência do Conselho é ainda demasiado liberal para tal gente habituada a lidar com pretos, como se fossem animais de estimação. Bem lhes conheço a crónica. 

Mas hoje houve tréguas. O homem poisou na Lua. Vi tudo pela televisão com o coração nas mãos. E à noite fui passear para a ver com outros olhos boiando no mar do céu .

Leiria, 27 de Janeiro de 1970

Fui hoje a mais um consultório médico. Já tenho percorrido vários. O costume. Sou um doente crónico. Tenho bem a quem sair, isto é, a mim mesmo ou ao outro que coabita em mim. Mas, hoje, sentia-me terrivelmente angustiado. Tinha comprado ontem um livro intitulado Viva sem Medo. Li-o de uma assentada, mas fiquei na mesma ou com mais medo ainda. 

E há pouco resolvi ir a um médico para ver como se comportava comigo. Escolhi-o pela tabuleta. E gostei. Fez-me perguntas e mais perguntas sobre o meu passado. Até que eu próprio cheguei à raiz e à razão da minha redobrada angústia neste dia sentida - faz hoje exactamente três anos que cheguei da guerra e o relógio psíquico interior acusou a efeméride e quis condignamente celebrá-la.


[ Revisão / fixação de textos / imagem e legenda / links / notas entre parêntesis rectos / subtítulo, paar efeitos de publicação deste poste: LG ]
__________


Postes anteriores:

22 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22651: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte IX: Bissau e Contuboel. Consulta de psiquiatria. Poema "O Menino de Sua Mãe". Nascimento do primeiro filho. Exame em Bafatá de militares sem a instrução primária. Sedução da senhora professora, cabo-verdiana... (Set - dez 1966)

20 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22646: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte VIII: Contuboel , Fajonquito e Sonaco. Gravidez da Otília (Jan - ago 1966)

16 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22634: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte VII: Contuboel e Dunane (entre Piche e Canquelifá) (Out - dez 1965)

14 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22628: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte VI: Contuboel (mai-set 1965), com gozo licença de férias nos Açores (de 24/8 a 25/9/1965) onde se foi casar...

13 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22626: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte V: Do Tejo ao Geba (17 de Abril de 1965/25 de Maio de 1965)

10 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22617: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte IV: Mafra e Tomar (Julho 1964/Abril 1965)

9 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22612: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte III: Mafra, maio-junho de 1964

8 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22611: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte II: Mafra, fevereiro-março de 1964

8 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22609: "Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar" (texto cedido pelo escritor ao José Martins para publicação no blogue) - Parte I: Mafra, janeiro de 1964

segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Guiné 61/74 - P22661: Tabanca Grande (527): António G. Carvalho, a viver em Ponta Delgada, ex-fur mil op esp, CCAÇ 2592 / CCAÇ 14 (Bolama e Cuntima, 1969/70). É Deficiente das Forças Armadas. Senta-se no lugar nº 853, à sombra do nosso poilão



Foto nº 1 > Guiné > Bolama >  Centro de Instrução Militar > CCAÇ 2592 / CCAÇ 14 > 1969 > Da esquerda para a direita, os furriéis milicianos Eduardo Estrela, o Manuel Ramos Marques Cruz (, de Vila Real de Santo António, já falecido) e o  António G. Carvalho.


Foto nº 2 > Guiné > Região do Oio > Sector de Farim > Cuntima  > CCAÇ 2592 / CCAÇ 14 > 1969 > "Eu e dois soldados da etnia Felupe (esta etnia era canibal, mas estes diziam que já tinham deixado de ser), que faziam parte da nossa companhia. No mês de Novembro de 1969 (penso), fizeram queixa ao gen Spinola, dizendo que tinham ido para o exército, para aprender armas de branco para defender as suas famílias que estavam em S. Domingos, por isso não queriam ficar em Cuntima e realmente foram logo transferidos.


Foto nº 3 > Guiné > 
Região do Oio > Sector de Farim > Cuntima  > CCAÇ 2592 / CCAÇ 14 > Em Cuntima. Eu e o vagomestre Germano (do Porto). A inscrição que está no pedestal é de uma das  companhias que  esteve  aqui, a  CCAÇ 1789, do BCAÇ 1932 (1967/69), mobilizado pelo RI 15 (Tomar). A CCaç 2592 (futura CCAÇ 13) foi colocada  em 6 de novembro de 1969, em Cuntima, a fim de substituir a madeirense CCaç 2529 como força de intervenção e reserva do BCaç 2879,

Este vagomestre mandava fazer muitas vezes bife com batatas fritas, e sempre servia uísque, quando estavámos em Portalegre, no IAO. Grande Germano.

Fotos (e legendas): © António G. Carvalho (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de António Manuel Gaspar de Carvalho, novo membro da Tabanca Grande, nº 753:


Data - domingo, 24/10, 21:10 (há 16 horas)
Assunto - Blogue 


Olá, boa noite,  Camaradas.

Terei muito gosto em pertencer como elemento activo na tertúlia.

Pertencia à CCAÇ 2592, ao que depois se veio a formar a CCAÇ 14, não foi rendição individual

Como diz o Estrela (eu já não me lembrava), pertencia ao 3.º pelotão, cujo alferes era o Azevedo.

Para não ficar pesado irei enviando fotos com algumas legendas. A foto n.º 1  foi tirada em Bolama, alguns dias antes de termos sido atacados (com mísseis) a partir de S. João, cujo comandante do IN (soube-se depois) era o 'Nino' Vieira, que certamente sabem, tinha sido cabo do exército Português.

Sou António Manuel Gaspar de Carvalho. (agora escolham o nome que pretendem usar). Actualmente sou 2.º Sarg. DFA

Na altura do embarque no navio Niassa, penso que a 24 de Maio de 1969,  era Furriel Miliciano com a especialidade de Operações Especiais (Ranger), 1.º Classificado do 3.º turno de 1968, o 2.º Classificado foi o Humberto Reis, penso que da CCAÇ 2590 / CCAÇ12

No dia 2 de Março de 1970, por volta das 9 da manhã, em Cabele Uale caí numa mina antipessoal, com amputação abaixo do joelho), depois contarei a história.

Regressei a 11 de Abril de 1970, por evacuação, com destino ao HMP, após 38 dias de férias no HM 241, em Bissau

Abraço
AC

PS - Seguem também as fotos n.ºs 2 e 3


António Manuel Gaspar Carvalho (foto gentilmente cedida pelo seu amigo e camarada da CCAÇ 2592 / CCAÇ 14,  Edurado Estrela, ex-fur mil at inf (que esteve em Bolama e Cuntima, 1969/71) 


2. Através do Formulário de Contacto do Blogger,  o nosso camarada António G. Carvalho tinha-nos mandado a seguinte mensagem, sucinta, com data de sábado, 23/10, 17:23


"Estive na CCaç 14, furrriel, ferido em combate, tenho algumas fotos, como faço?
Cumprimentos,
António G. Carvalho"

3. Resposta do nosso editor LG, na mesma data, às 17h23:


António: Sê bem vindo. Gostaria de te ter aqui ao lado do teu camarada Eduardo Estrela, que é do meu tempo (eu sou da CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71). Manda duas fotos tipo passe, uma atual e outra do tempo da Guiné. Diz mais qualquer sobre ti. Terei muito gosto em apresentar-te à Tabanca Grande: somos já dois batalhões...

As fotos têm que vir digitalizadas (passas-as pelo scan), com legendas (data, local, etc.). E com boa resolução... Mantenhas. Um alfabravo. Luis Graça

4. Logo a seguir o Carlos Esteves Vinhal escreveu-lhe (e ele respondeu logo, na volta do correiro, vd. ponte 1, acima):

Data - Sábado, 23/10, 20:03
Assunto - Contacto com o Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

Caro camarada António Carvalho: Uma vez que já temos na tertúlia um camarada António Carvalho, por favor diz-nos o teu nome do meio. 

Entretanto, muito obrigado pelo teu contacto. Se aceitares a nossa proposta, teríamos muito gosto em receber-te como elemento activo da tertúlia do nosso Blogue.

Para o efeito, manda-nos uma foto actual e outra do tempo de Guiné (fardado), diz-nos o teu nome, posto, especialidade, data de ida e de regresso. Poderás ter ido integrado na CCAÇ 2592 que mais tarde passou a designar-se CCAÇ 14, ou mais tarde em rendição individual, depois confirma.

E finalmente diz-nos os locais onde usufruiste das férias que o governo de então te proporcionou nos melhores "resorts" da Guiné. Terás andado pelo Norte (Farim), não muito longe de Mansabá, onde estive entre 1970 e 1972.

Podes começar a mandar-nos as tuas fotos, com as respectivas legendas (à parte) que indicarão, se te lembrares, o local, a data, a situação e quem está retratado.

Também nos podes mandar memórias escritas, em forma de estórias, com acontecimentos que ainda retenhas.

Para contactares connosco, utiliza este meu endereço (carlos.vinhal@gmail.com) e o do editor Luís Graça: luis.graca.prof@gmail.com

Ficamos na espectativa da tua resposta.

Em nome da tertúlia e dos editores segue um abraço e os votos de boa saúde.
Carlos Vinhal

Ex-Fur Mil da CART 2732
Mansabá/Guiné/1970-72

Co-Editor dos Blogues:
Luís Graça & Camaradas da Guiné
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt

CART 2732
https://cart2732.blogspot.pt

 5. Entretanto, o Eduardo Estrela, nosso amigo e camarada, da CCAÇ 14, deu-nos mais informação sobre o António G. Carvalho, em mensagem de sábado, dia 23, às 2oh33:

Boa noite Luís!

O António Carvalho era o outro furriel do meu grupo de combate da CCAÇ 14. (3.º  Pelotão). Era um grupo só com 2 furriéis, eu atirador de infantaria e ele de operações especiais. Grande companheiro e amigo com o qual temos mantido, não obstante ele viver há muitos anos em Ponta Delgada, um relacionamento que se traduz nalgumas presenças físicas em almoços onde o António faz questão de participar.

Ainda hoje estivemos a falar ao telefone e voltei a falar-lhe do blogue.

Lamentavelmente no dia 2 de Março de 1970 por volta das 9 da manhã, em Cabele Uale, a caminho do corredor de Sitató, foi vítima duma mina A/P e perdeu um pé.

Ele tem coisas e histórias para contar e fá-lo-á tenho a certeza. É mais um a engrossar as tropas desmobilizadas mas activas.

Grande abraço
Eduardo


6. Nova mensagem do Eduardo Estrela:

Data - 24/10/2021, 23:11

Olá Luís,  boa noite!

Na fotografia que o Carvalho mandou (Foto n.º 1), o da esquerda sou eu, ainda sem o bigode que me tem acompanhado até hoje.

Ao centro está o saudoso Manuel Ramos Marques Cruz, bom amigo que nos deixou há vários anos. Era natural de Vila Real de Santo António. À direita, está o António Carvalho.

Julgo não estar enganado se disser que a fotografia foi tirada no dia do juramento de bandeira e do desfile a seguir, das CCaç 13 e 14. Em Bolama.

Abraço, 
Estrela


7. Comentário final do editor LG:

António, és recebido de braços abertos. Tens aqui um lugar, o n.º 853, para te abrigares à sombra do nosso polião, árvore sagrada para os nossos amigos guineenses, guarmecendo e protegendo as suas tabancas. Para nós tem um grande simbolismo.

Há mais de um mês que não entrava, pelo seu prório pé, nenhum novo membro da Tabanca Grande. O último foi o Manuel Oliveira (n.º 850) (*). Os dois últimos entraram, infelizmente, a título póstumo: o  Celestino Bandeira (1946-2021) e Manuel Dias Sequeira (1944-2008), respetivamente os n.ºs 851 e 852.

Temos então mais um "ranger" na Tabanca Grande, um bravo "ranger" que felizmente sobreviveu à explosão de uma mina A/P, que lhe custou a amputação de uma perna (abaixo do joelho). É uma recordação dolorosa da Guiné que carregas toda a vida. 

Mas deixa-me confirmar que fostes connosco para o CTIG (CCAÇ 2590, CCAÇ 2591, CCAÇ 2592, etc. incluindo o hoje secretário geral do PCP, Jerónimo Sousa, soldado condutor auto da da CPM 2537, além de  outras unidades...) no Niassa, a 24 de maio de 1969, conforme podes verificar aqui, nesta ordem de transporte, constante do poste P19839.

Estás devidamente apresentado ao resto da malta. Conheces as nossas regras de convívio, que deves reler. Só espero que fiques connosco ainda por muitos e bons anos. 

A tua entrada ajuda-nos a mitigar a dor da perda recente de vários camaradas que faziam (e fazem) parte da história deste blogue. Como sabes, aqui partilhamos memórias (boas e más), mas também afectos. 

Ficamos  então a aguardar que nos envies  mais fotos e histórias da tua CCAÇ 14. Da Tabanca Grande também faz parte outro camarada da CCAÇ 2592 / CCAÇ 14, do teu/nosso  tempo, o António Bartolomeu: vê aqui. (O Bartolomeu esteve comigo em Contuboel,  a dar instrução de especialidade a um pelotão de mandingas, na mesma altura, em junho e Julho de 1969, em que eu, o Humbero Reis e outros estávamos a formar a CCAÇ 12, oriunda da CCAÇ 2590). 

Sei que tu e o Estrela estiveram no CIM de Bolama. Sobre Cuntima temos cerca de 60 referências. Sobre a vossa CCAÇ 14 só temos três dezenas de referências, enquanto sobre a CCAÇ 12 há 425. Espero que nos ajudes a encurtar as distâncias...

Ficas registado na Lista Alfabética da Tabanca Grande (vd. coluna estática do lado esquerdo) como António G. Carvalho, para te distinguir do António Carvalho, que chegou primeiro que tu, e que é de Medas, Gondomar.

Espero um dia destes poder conhecer-te pessoalmente. Um grande alfabravo para ti e para o Eduardo Estrela (que tem 18 referências no blogue). 
___________