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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Guiné 63/74 - P15759: (In)citações (84): Opinião sobre os Governadores e Comandantes-Chefes das Forças Armadas da Guiné - 1 (Coutinho e Lima, Cor Art Ref)

1. Em mensagem do dia 5 de Fevereiro de 2016, o nosso camarada Alexandre Coutinho e Lima, Coronel de Art.ª Reformado (ex-Cap Art.ª, CMDT da CART 494, Gadamael, 1963/65; Adjunto da Repartição de Operações do COM-CHEFE das FA da Guiné entre 1968 e 1970 e ex-Major Art.ª, CMDT do COP 5, Guileje, 1972/73), enviou-nos um trabalho com a sua opinião sobre os Governadores e Comandantes-Chefes da Guiné, durante a sua permanência naquela Província: Arnaldo Schulz, António de Spínola e Bettencourt Rodrigues.

Aceitando o repto do Tabanqueiro-mor Luís Graça, entendi apresentar algumas considerações sobre o tema.
Por ter cumprido 3 Comissões, por imposição, na Guiné (tenho a convicção que não haverá muitos militares nestas condições), eis a minha opinião resultante, fundamentalmente, das funções que desempenhei em cada um dessas comissões.

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Opinião sobre os Governadores e Comandantes-Chefes das Forças Armadas da Guiné - 1

Sr. General Arnaldo Schulz / (964/68) 

O Senhor Brigadeiro Arnaldo Schulz (foi promovido a General em 1965), iniciou as suas funções de Governador e Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné (o primeiro a acumular as duas tarefas), em 20MAI64. Estava eu na minha 1.ª Comissão (63/65), comandando a CART 494, em Gadamael, com um destacamento em Ganturé.

O Sr. Brigadeiro Schulz substituiu o Sr. Brigadeiro Louro de Sousa, como novo Comandante-Chefe e o Sr. Comandante Vasco Rodrigues como novo Governador, porque até à sua nomeação, as duas funções eram desempenhadas por entidades distintas.

Quando o novo Comandante-Chefe assumiu as suas funções, estava em curso a ocupação da fronteira Sul (com a República da Guiné Conakry), iniciada pelo seu antecessor, a cargo do BCAÇ 513 (Batalhão, com sede em Buba, no qual foi incorporada a CART 494, que eu comandava). Já estavam guarnecidas as seguintes localidades:

. Cacine – CART 496, desde 04AGO63
. Gadamael – CART 494, desde 17DEZ63
. Guileje – Grupo de Combate da CART 495 (sede em Aldeia Formosa), desde 04FEV64
. Ganturé – destacamento da CART 494 (sede em Gadamael), desde 21FEV64

Já com o novo Comandante-Chefe, continuou o programa em curso e foram ocupadas as seguintes localidades:

. Sangonhá – CART 640, desde 21MAI64
. Cacoca – destacamento da CART 640, desde 24JUN64
. Cameconde – destacamento da CART 496 (sede em Cacine), desde 01DEZ64.

Estava assim reestabelecido o itinerário Aldeia Formosa/Cacine, com tropa em Guileje, Gadamael/Ganturé, Sangonhá/Cacoca e Cameconde/Cacine.

Em 17NOV64, o destacamento de Guileje (Grupo de Combate da CART 495), foi substituído pela CCAÇ 726.

Durante o mandato do Sr. General Schulz, em 65, verificou-se o alastramento da guerra ao Leste da Guiné (Pirada, Canquelifá e Beli) e o desenvolvimento de acções no “chão” Manjaco (Jolmete e Pelundo). Também naquele ano, o PAIGC realizou as primeiras acções militares na fronteira Norte, (região de São Domingos), onde até então apenas actuava a FLING (Frente de Libertação e Independência da Guiné), que então já passava por grandes dificuldades, porque a OUA (Organização de Unidade Africana) ter decidido canalizar o seu apoio para o PAIGC.

Em 30MAR65, foi ocupada a localidade de Mejo, com um destacamento da Companhia de Guileje. Com a ocupação de Mejo, criaram-se as condições necessárias para atingir Salancaur Fula e efectuar a ligação com Cumbijã, através de Nhacobá e Samenau, completando-se portanto praticamente a reinstalação dos povos fulas das tabancas cujas populações tinham sido forçadas a abandonar as suas tabancas (conforme consta na História do BCAÇ 513 – Buba).

Em ABR68, o Sr. Comandante-Chefe, Sr. General Arnaldo Schulz, ordenou a Ocupação de Gandembel – Operação “Bola de Fogo”.

A Operação, que teve início em 8 ABR 68, foi comandada pelo 2º. Comandante do BART 1896 e tinha como objectivo implantar um aquartelamento permanente na região de Gandembel. Tomaram parte na operação, as seguintes forças:

. 3.ª Companhia de Comandos
. 5.ª Companhia de Comandos
. CART 1612, CART 1613 e CART 1689
. CCAÇ 2316 e CCAÇ 2317 (esta ficaria no novo quartel)
. Pel Caç Nativos 51
. Pel Milícias 138 e 139
. Pel Sapadores / BART 1689
. Elementos do Batalhão de Engenharia 447
. 27 carregadores de apoio

Partiram forças de Guileje e outras de Aldeia Formosa, encontrando-se no local do futuro quartel. Este tinha sido escolhido, na fase de planeamento, na carta militar.

Devido ao adiantado da hora, as tropas pernoitaram nesse local, tendo sido flageladas, durante a noite, com metralhadoras ligeiras, morteiro 82 e RPG, sem consequências. No dia seguinte, porque no local não havia água, avançaram cerca de 3 Km para Norte, próximo do rio Balana, onde foi decidido começar a construir o quartel. Dias depois, verificou-se a necessidade de garantir a ponte sobre o rio Balana, bastante alta, indispensável para a ligação a Aldeia Formosa, tendo sido ali estabelecido um destacamento da Companhia – Ponte Balana.

No período de 08/14ABR, as NT sofreram 2 Mortos, 13 graves e 34 feridos ligeiros. Em 14ABR, de noite, começaram as flagelações, que se mantiveram praticamente todos os dias.

Em 17ABR, as NT sofreram 1 Morto (Furriel), em consequência do rebentamento de uma armadilha nossa, da qual também resultou mais 1 Ferido – Capitão Moreira Maia, Comandante de Companhia, que foi evacuado.

Em 19ABR, de noite, o IN flagelou as NT, com tiro intenso, 4 vezes, na última das quais e, pela primeira vez, disparou mais de 100 granadas de morteiro 82. As NT tiveram 1 Morto e 4 Feridos graves, do Pelotão de Caçadores Nativos 51.

Na noite de 26ABR, o IN desencadeou o primeiro ataque próximo, com armas ligeiras e lança roquetes.

Em 30ABR, de noite, verificaram-se 6 flagelações.

Na noite de 09MAI, houve 2 fortes flagelações, que causaram às NT 3 Feridos graves.

Em 15MAI, a CART 1689 regressou a Aldeia Formosa, deixando nos que ficavam em Gandembel/Ponte Balana muita saudade, pelo companheirismo, solidariedade e actuação denodada, esforçada e altamente meritória, durante a sua permanência, desde o início – 8 ABR.

No período de 15/26MAI, foi efectuada a Operação “ Pôr Termo”, com o objectivo de manter a segurança das colunas de reabastecimento de e para Aldeia Formosa e procurar dificultar a actividade inimiga na zona, nela participando 3 Companhias (1 de Comandos).

As baixas provocadas ao PAIGC foram diminutas e as NT sofreram 6 Mortos, 3 Feridos graves e 6 Feridos ligeiros.

Em 21MAI, o rebentamento de uma mina anti-carro, com emboscada, na estrada Mampatá/Uane, provocou 4 Mortos da CART 1612, bem como foram capturados pelo PAIGC, 3 elementos da CART 1612 e 1 da CCS do Batalhão. Estes 4 militares viriam a ser libertados em NOV70, na Operação “Mar Verde”, descrita adiante.
 
Comentário

A ocupação de Gandembel, em pleno “Corredor de Guileje”, foi, em minha opinião, uma decisão acertada do Sr. General Schulz; foi pena não ter sido efectuada no início do seu Comando, aproveitando a embalagem da ocupação da fronteira Sul, completada em 01DEZ64, já o Sr. General era o Comandante-Chefe. Se tal tivesse acontecido, o IN, provavelmente, não teria oferecido tanta resistência, desde que fossem tomadas as devidas precauções; seguramente, não possuía ainda os Morteiros 120.

Quero no entanto referir que, no meu entendimento, houve algumas falhas, a começar no planeamento. Desde logo, a escolha do local do novo quartel devia ter merecido a melhor atenção do Quartel-General do Comando Chefe, o que não aconteceu, pois foi feita na carta militar da região; teria sido perfeitamente justificado, para esse efeito, um reconhecimento ofensivo no terreno, o que podia ser efectuado por tropa especial helitransportada. Também não foi assegurado, desde início (e devia tê-lo sido), o Apoio de Armas Pesadas (Artilharia, Metralhadoras Pesadas e Morteiros Pesados), porque era quase uma certeza que o IN iria reagir violentamente à ocupação, porquanto o seu reabastecimento através do “Corredor de Guileje” (por onde fazia entrar cerca de 70 a 80% dos reabastecimentos), era vital para a sua actividade de guerrilha. O aquartelamento Gandembel/Ponte Balana deveria constituir uma base de apoio para a actuação de tropa especial (Paraquedistas ou Comandos), em constante actividade, não só para impedir que o IN atacasse as NT, da forma violenta e persistente como o fez, mas também desorganizar e desmantelar os diversos bigrupos que o PAIGC deslocara para a região. Tal não se verificou e teria sido adequado, por exemplo, que uma das Companhias de Comandos, que participou na operação desde o dia 8 ABR, tivesse permanecido em apoio da CCAÇ 2317, a Companhia residente.

O Sr. Governador e Comandante-Chefe, Sr. General Arnaldo Schulz, foi substituído pelo Sr. General António de Spínola.

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Sr. General António de Spínola (68/73) 

O novo Governador e Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, iniciou as suas funções em 20MAI68.

Tinha experiência de guerra, pois comandara um Batalhão de Cavalaria em Angola, na sequência de se ter voluntariado para esse efeito.

O novo Comandante-Chefe alterou significativamente a estratégia dos seus antecessores. Remodelou o dispositivo militar, de forma a tentar reganhar a iniciativa, criando as Zonas de Intervenção (ZI) do Comando Chefe, áreas de domínio preponderante do PAIGC, onde actuavam unidades especiais com o apoio de Artilharia e Força Aérea. A par das operações militares, põe em prática um projecto de conquista dos “corações e mentes” da população, consubstanciado no slogan “Uma Guiné Melhor”.

Seguramente também para marcar, desde início, uma forma diferente de comandar, totalmente diversa da do seu antecessor, visitou pela primeira vez o aquartelamento de Gandembel em 26 MAI 68, isto é, apenas 6 dias depois do início do seu mandato. Foi uma prática que manteve durante toda a sua permanência na Guiné, aparecendo muitas vezes inopinadamente nos locais em que se verificavam situações anormais, como por exemplo, deslocando-se a Gadamael em 2JUN73, quando esse aquartelamento estava a ser objecto de um ataque em força, por parte do PAIGC.

O Sr. General Spínola fez-se rodear de Oficiais da sua inteira confiança, como era natural, não só no seu Quartel-General e respectivo Estado Maior, como também para determinados Comandos, por si criados, como foram os Comandos de Agrupamento Operacionais (CAOP) e Comandos Operacionais (COP).

No Quartel-General do Comando Chefe introduziu algumas alterações, para suportar a sua estratégia de contra-subversão; assim, foi criada uma nova Repartição de Assuntos Civis e Acção Psicológica (REP ACAP) e, também o Comando Geral das Milícias, quando a criação de várias Companhias e Pelotões destas forças assim aconselhava.

Relativamente à actividade operacional, difundiu directivas gerais para a sua dinamização; semanalmente, à quarta-feira, era feita uma análise da actividade operacional, seguida de um relatório, enviado a todas as Companhias, traduzindo o resultado dessa análise. Foi esta mais uma inovação, pois na minha 1.ª Comissão, sendo Comandante de Companhia, em operações, tal não acontecia.

Lidava mal com o que considerava comportamentos que indiciassem, na sua análise, incompetência; por este facto, tomou algumas decisões que conduziram à retirada de Oficiais de funções de Comando, o que se verificou em relação, especialmente, a Oficiais Superiores (Major, Tenente Coronel e Coronel). Tinha uma condescendência especial para com os Oficiais de Cavalaria e oriundos do Colégio Militar.


1. Remodelação do dispositivo 

Relativamente à remodelação do dispositivo militar, decidiu retirar tropas das seguintes localidades:
. Gandembel/Ponte Balana . Ganturé (destacamento da Companhia com sede em Gadamael)
. Sangonhá/Cacoca
. Mejo
. Madina do Boé e Beli (únicas tropas na região do Boé)

A retirada de efectivos militares das 4 primeiras localidades, significava um desinvestimento na ocupação da fronteira Sul, com a República da Guiné Conakry, determinada pelos seus antecessores (Sr. Brigadeiro Louro de Sousa e Sr. General Arnaldo Schulz) e concretizada pelo BCAÇ 513, com as suas subunidades; regressava-se à situação encontrada por este Batalhão, quando assumiu o Comando do Sector S2, em Buba (tropas apenas em Aldeia Formosa e Cacine, este agora com um destacamento em Cameconde), com a excepção da presença de tropas em Guileje e Gadamael, que o Sr. General Spínola manteve.

No que concerne a Gandembel/Ponte Balana, o Sr. General Spínola, na sua primeira visita, já referida atrás (26MAI73), tomou conhecimento das condições de defesa do aquartelamento. Passados 3 dias, chegavam a Gandembel:
. Pelotão de Artilharia – 2 Obuses de 10,5 cm
. 2 Metralhadoras Pesadas Browning

Seguramente, este reforço de Armamento Pesado (a pergunta que se faz é, porque não se tinha verificado desde início – 08ABR68), foi consequência imediata da sua visita, em 26MAI68.

Importa referir que, desde a chegada da CCAÇ 2317, Gandembel esteve sujeito a ataques constantes, normalmente com grande intensidade e violência. Em 15MAI, o PAIGC iniciou uma série de flagelações, que se mantiveram, diariamente até ao dia 26MAI.

No dia 15JUL, cerca das 02H00, o In desencadeia um intenso ataque ao aquartelamento, mesmo junto ao arame farpado. Vinha fortemente apostado em tomar de assalto o quartel. O efectivo era poderoso, atendendo aos quantitativos de armamento ligeiro, com grande utilização de metralhadoras e lança granadas RPG; destaca-se a presença de 11 canhões sem recuo e 9 morteiros 82. Foram deixados 236 invólucros de granadas de canhão sem recuo 82 e milhares de munições de metralhadora, junto ao arame farpado; a bateria inimiga de morteiros 82 disparou mais de 300 granadas.

A reacção das NT foi enérgica, imediata e adequada, principalmente através do morteiro 81, Artilharia em tiro directo e as Metralhadoras Browning. As NT sofreram 1 Morto (Alferes Miliciano, que chegara há dias) e 6 Feridos graves, dois dos quais tiveram que de ser evacuados.

Como seria de esperar, o Sr. General Spínola, passados 4 dias (19JUL) marcava a sua presença em Gandembel, para tomar conhecimento do que se tinha passado. O grupo que o acompanhava, a que se juntou o Comandante da Companhia, subiu para a cobertura da caserna abrigo que tinha sido mais atingida, para lhe serem referenciadas as posições ocupadas pelo IN durante o ataque; de repente, rebentam algumas granadas de morteiro 82, bem fora do arame farpado. De imediato, todos saltam para o chão (a 2,5 metros), excepto um, que com o seu monóculo e pingalim (sua imagem de marca), manteve-se impávido e sereno; de seguida, o Sr. General desce, calmamente, pela escada de acesso. Era uma prova evidente de uma qualidade que todos lhe reconheciam – a sua grande CORAGEM.

Ciente das condições em que se encontrava a guarnição de Gandembel (com um destacamento em Ponte Balana), face ao numeroso e aguerrido efectivo do PAIGC, sob o comando de Nino Vieira, o Sr. Comandante Chefe faz publicar, em 28JUL, a Directiva n.º 20/68, determinando:
“Transferir, em fase ulterior, os estacionamentos das NT de Guileje e Gandembel, para Salancaur e Nhacobá, devendo proceder-se, desde já, ao estudo da localização e das vias de comunicação”.

Dessa directiva, inferia-se que se pretendia transferir a missão de impedir ou, no mínimo, criar grandes dificuldades ao reabastecimento IN, um pouco mais para o interior (15 Km a Oeste de Gandembel), com um dispositivo de três aquartelamentos bem próximos uns dos outros, possibilitando uma defesa conjunta: Mejo, Salancaur (6 Km a Norte) e Nhacobá (4 Km a Norte de Salancaur).

Em 28JUL, verificou-se um acontecimento imprevisto: o Sr Ten. Cor. Piloto Aviador Costa Gomes, Comandante do Grupo Operacional da Base Aérea 12 (Bissau), pilotando um Avião FIAT G 91 na região, foi abatido pelo fogo de metralhadoras quadruplas inimigas; conseguiu ejectar-se, tendo aterrado, com o seu pára-quedas, a poucos centenas de metros do quartel, onde foi recolhido.

No dia 04AGO, a Companhia, numa coluna vinda de Aldeia Formosa, sofreu 4 Mortos; pouco dias depois, no rebentamento de uma mina, implantada pelo IN, foi morto um Alferes.

Em 05AGO, aterrou em Gandembel, o Sr. Comandante do Batalhão de Paraquedistas, para se inteirar das condições que poderiam encontrar os seus homens, que brevemente viriam reforçar a guarnição, o que se verificou em 20AGO, com a chegada de 2 Grupos de Combate (GC) de Paraquedistas. Não obstante o acompanhamento que o Sr. General Spínola fez, desde o início do seu mandato, à situação das NT em Gandembel, o que é de realçar, levou cerca de três meses a determinar o seu reforço com os paraquedistas.

A presença desta tropa especial, que se manteve cerca de 3 meses, foi fundamental para moralizar e estabilizar emocionalmente todo o pessoal, devido à reconhecida competência e capacidade operacional dos paraquedistas. A partir dessa data, o PAIGC iria enfrentar uma tropa que lhe provocaria muitas preocupações e grande insegurança. O primeiro grande êxito teve lugar em 30 AGO, quando os paraquedistas detectaram, junto à fronteira, um bigrupo inimigo, totalmente desprevenido, que foi cercado e dizimado, tendo sido recolhido quase todo o armamento. Outros guerrilheiros, vindos do outro lado da fronteira, montaram algumas emboscadas, causando à tropa paraquedista 2 Mortos. Face a um efectivo de apenas 2 GC, o PAIGC sofre, seguramente, uma humilhante derrota.

Não obstante tão importante como oportuno reforço, o aquartelamento de Gandembel sofre, durante o mês de Setembro, 2 fortes ataques. Em 07SET68 o IN aparece, pela primeira vez, com o Morteiro 120.

Na noite de 07/08NOV, Gandembel/Ponte Balana foram objecto do último grande ataque, com o emprego massivo de Morteiros 120 e de canhões sem recuo, sobre o fortim de Ponte Balana.

Passadas duas semanas, devido aos dias de mais acalmia, os Paraquedistas regressam a Bissau, não deixando de aparecer, de vez em quando, o que era sempre muito moralizador e tranquilizante.

A actuação dos paraquedistas foi notável, proporcionando, com a sua presença, uma vida muito menos atribulada, em Gandembel/Ponte Balana.

O Sr. General Spínola, em 28JAN69, determinou a retirada dos aquartelamentos de Gandembel/Ponte Balanta. Passados 9 meses e 20 dias, terminava assim o verdadeiro ”inferno na terra”, para aqueles bravos e heróicos militares que, durante a sua estadia no corredor de Guileje, sofreram 372 ataques do IN.

Tendo eu, com as tropas que comandei, passado por situações também muito difíceis (sem fazer qualquer comparação, por inadequada), aqui fica a minha enorme admiração e singela homenagem aos bravos defensores de “Gandembel das morteiradas”.
 
Comentário

O Sr. General Spínola, ao mandar retirar as NT de Gandembel/Ponte Balana (o que se adivinhava desde a sua primeira visita), não concretizou o que determinara, na sua Directiva 20/68 de 28JUL, (tropas de Guileje e Gandembel para Salancaur e Nhacobá), ficando a interdição do “corredor de Guileje”, a cargo da tropa de Guileje, o que era tarefa muito além das suas possibilidades. O abandono também do aquartelamento de Mejo, por ordem igualmente do Sr. General Spínola, teve como consequência o isolamento a que foi remetido o aquartelamento de Guileje, totalmente dependente, sob o ponto de vista logístico, à ligação terrestre a Gadamael. Parece não ser descabido afirmar que esta situação permitiu que, mais tarde, o PAIGC tenha preparado, com muita antecedência (sabe-se agora) e sem grandes sobressaltos, a acção em força sobre Guileje, desencadeada em 18MAI73.

Não pode ser questionada a legitimidade das determinações do Sr. Comandante-Chefe, relativamente ao “corredor” de Guileje. Em minha opinião, descartada a ocupação permanente pelas NT, deveria ter sido assegurada a actuação de tropas especiais sobre o referido corredor tão frequente quanto possível, pois quanto mais obstáculos fossem criados ao PAIGC, na zona, menos reabastecimentos chegariam às regiões em que a guerrilha actuava, nas diversas bases de apoio do IN. Assim não foi o entendimento do Sr. General Spínola.

Com o abandono das localidades indicadas atrás, foram recuperadas 3 Companhias, utilizadas para reforçar outras zonas.


2. Chão Manjaco

O Sr. General Spínola dedicou especial atenção ao Chão Manjaco.

Criou, em Teixeira Pinto, o CAOP 1 (Comando de Agrupamento Operacional n.º 1), sendo o seu primeiro Comandante o Sr. Coronel Pára (Paraquedista) Alcino. Colocou em Teixeira Pinto a sua elite de Oficiais:

. Major do Estado-Maior (EM) Passos Ramos – Oficial de Operações
Era o cérebro do Comando Militar, o pensador de toda a estratégia e o que fazia as sínteses do cumprimento da missão para toda a zona.

. Major de Artª Pereira da Silva – Oficial de Informações
Em colaboração com a Pide, dirigia o grupo de informadores e foi o principal negociador com os “dissidentes” do PAIGC, dispostos a entregarem-se.

. Major de Inf. Magalhães Osório - Era o operacional, o homem do combate.

Fruto de várias acções de acção psicológica e depois de diversas reuniões, toda a guerrilha do Chão Manjaco e outras zonas do Norte, tinha decidido render-se e passar para o lado do exército colonial. Estava tudo tratado até ao pormenor. Havia fardas portuguesas já prontas para os guerrilheiros e estava tudo decidido sobre patentes e instalação das famílias. Cada um teria casa e comida e o soldo correspondente à sua patente, em igualdade com os militares europeus. Aquela seria a grande vitória política e militar do Sr. General Spínola.

Enquanto decorriam as conversações no Chão Manjaco, o Sr. Comandante-Chefe promoveu no seu Quartel General, em Bissau, uma reunião, para a qual foram convocados todos os Comandantes de tropas em operações, desde o posto de Capitão. Nessa reunião, o Sr. General Spínola determinou que, a partir dessa data, as NT deixariam de efectuar acções ofensivas, limitando-se à sua defesa e das populações.

Os guerrilheiros colocaram uma única condição. Fariam a sua rendição em pleno mato, junto ao Pelundo, mas os Oficiais Portugueses teriam de comparecer desarmados como prova de confiança. A delegação para aceitar a rendição das forças do PAIGC, foi constituída pelos 3 Majores do Estado-Maior do CAOP, referidos atrás, o Sr. Alferes Mil Cav Joaquim Mosca e os guias nativos Mamadu Lamine Djaure, Patrão da Costa e Aliu Sissé. O Sr. General Spínola foi dissuadido, à última hora, de também fazer parte da delegação. Foram, ao encontro dos guerrilheiros ultraconfiantes, sem arma, em dois Jeep e sem qualquer escolta. Felizes pelo sucesso eminente.

Chegados ao local do encontro, os 3 Majores e os outros acompanhantes foram recebidos com tiros de Kalashnikov e acabados de matar à catanada, sem dignidade e com requintes de malvadez.

O assassínio da delegação portuguesa só se explica por uma ordem vinda da direcção do PAIGC, na altura instalada em Dakar (Rep. do Senegal), quando soube da traição em marcha e, temendo o risco de a rendição vir a ser seguida por outros chefes de guerrilha, agiu com brutalidade.

Dirigentes intermédios do partido, foram enviados ao Chão Manjaco e confrontaram os comandantes locais, que acabaram por colaborar na chacina dos negociadores portugueses e dos seus guias, para se “limparem” da traição. André Gomes, o interlocutor privilegiado dos Majores, continuou a comandar a guerrilha no Chão Manjaco. Após o massacre, a guerrilha continuou adormecida e demorou um ano a intensificar os combates.

Há alguns anos, o dirigente Luís Cabral (foi o primeiro Presidente da Rep. da Guiné Bissau, depois da independência, que ocorreu em 07SET74), referindo-se, na RTP a este triste e dramático acontecimento, disse que o PAIGC não podia aceitar o que estava a decorrer e resolveu “cortar o mal pela raiz” e que não podiam ter feito outra coisa, podendo a sua afirmação ser interpretada, inequivocamente, como sancionando o procedimento adoptado. Permito-me discordar, pois podiam ter aprisionando a delegação portuguesa, evitando-se assim a perda de vidas humanas. A captura teria tido também grande impacto e seria, com toda a certeza, largamente explorada pela máquina de propaganda do PAIGC.

A barbárie que aconteceu não foi nada abonatória, pelo contrário, da aura de humanista que era atribuída a Amílcar Cabral, o primeiro responsável do Partido.

A morte trágica dos 3 Majores e seus acompanhantes, em 20ABR70, na região Pelundo/Jolmete, foi um rude golpe para a estratégia da condução da guerra, definida pelo Sr. General António de Spínola, Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné.


3 . Operação “ MAR VERDE” – 22NOV70

Esta Operação foi concebida e executada, pelo Sr. Comandante Fuzileiro Alpoim Calvão, com a autorização do Sr. General Spínola, Comandante-Chefe (como não podia deixar de ser).

Extremamente audaciosa e altamente secreta, porque envolvia o ataque, com um pequeno número de homens, à capital – Conakry, de um país soberano – Rep. da Guiné, que servia de “santuário” aos rebeldes do PAIGC.

Uma das condições para o sucesso da operação era que não houvesse vestígios da participação de forças portuguesas no golpe; por isso, foram tomadas medidas especiais, como o uso de uniforme indistinto e armamento de uso corrente em África, especialmente adquirido para o efeito no mercado paralelo (basicamente AK-47 e RPG).

Até os 6 navios que iriam transportar os executantes não continham nenhuma informação exterior que os pudesse identificar e os poucos combatentes brancos teriam o rosto pintado de preto e usavam perucas de carapinha. Todos os militares tiveram posteriormente que assinar um documento onde se comprometeram a nunca falar desta operação, que ainda hoje esta não é reconhecida pelo Estado Português.

Objectivos 

Ataque anfíbio a Conakry, com as seguintes tarefas:
- destruir, neste porto, as lanchas rápidas (6/7 unidades), fornecidas pela União Soviética ao PAIGC – Missão Cumprida.
- libertar os 26 prisioneiros de guerra portugueses, entre os quais o Sr. Ten. Pil. Av. António Lobato – Missão Cumprida.
- atacar e destruir o QG do PAIGC, havendo a hipótese de aprisionar Amílcar Cabral (AC) – Missão Cumprida (excepto captura de AC).
- destruir os Aviões MIG-15 e MIG-17 da Rep. da Guiné, para não serem atacados por eles – Missão Não Cumprida.
- proporcionar o desembarque de opositores guineenses da FLNG (Frente de Libertação Nacional Guineense), treinados na Ilha de Soga (Arquipélago dos Bijagós); a finalidade era auxiliá-los no golpe de mão ao Governo da Rep. Guiné, com a captura ou eliminação física de Sekou Touré; ia a bordo um Governo Provisório - Missão Não Cumprida.

Para o sucesso da operação era necessário um grande número de raides de Comandos, simultâneos, com um objectivo específico para cada um, como por exemplo ir à central eléctrica e pôr a cidade às escuras (conseguido), tomar a estação de Rádio (não conseguido), eliminar ou capturar Sekou Touré na sua residência (não conseguido) e destruição de edifícios relevantes. No total, foram identificado 26 alvos; estes raides não tinham apoio aéreo e tudo teria que ser feito em lanchas, barcos pneumáticos e utilizando armamento ligeiro.

As forças portuguesas que participaram na operação foram, na sua maioria, militares africanos:

- Destacamento de Fuzileiros Especiais Africano 21 (61 homens)
- Companhia de Comandos Africanos (150 homens)
- um pequeno número de paraquedistas
- contingente da FLNG (200 homens)

O efectivo total foi cerca de 400 homens.

Resultados

A Operação foi considerada, por alguns, como tendo sido um fracasso, porque não foi realizado o desejado golpe de estado; a ausência dos MIG fez com que o Comandante tivesse dado ordem para reembarcar, com receio do ataque desses aviões. Ironicamente, soube-se depois que os Pilotos dos MIG ainda não estavam aptos para entrar em combate, nem se encontravam em Conakry.

Os elementos da FLNG quiseram avançar, mas foram incapazes de derrubar o regime, devido à falta de apoio da população, com o que contavam, mas também em resultado do contra-ataque das forças fieis a Sekou Touré, apoiadas por um contingente de tropas cubanas. Os combates duraram vários dias, sofrendo os militares da FLNG muitos mortos; 100 dos seus membros foram capturados, torturados e posteriormente executados, assim como um grupo de 20 militares portugueses que desertaram; estes ainda foram à rádio, manifestar apoio ao PAIGC, mas nada os salvou.

Obviamente que os prisioneiros relataram pormenores da Operação e revelaram os nomes dos seus mentores, a que se seguiu o escândalo internacional, habilmente explorado pela Rep. Guiné, que apresentou queixa no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Sekou Touré aproveitou a oportunidade para liquidar milhares de adversários políticos.

Esta “extravagante” Operação, para muitos, foi um sucesso, porque as forças portuguesas sofreram relativamente poucas baixas: 3 Mortos e 3 Feridos graves, além de 20 desertores; foi destruída grande parte de material bélico do PAIGC e da Rep. Guiné; o IN teve cerca de 500 Mortos; foram libertados os 26 prisioneiros portugueses, o que é de realçar, a todos os títulos.

O Sr. Prof. Marcelo Caetano, Primeiro-Ministro de Portugal comunicara, quando lhe foi dado conhecimento prévio da Operação, que só a libertação dos prisioneiros justificava o ataque.

Para finalizar, sou de opinião que, caso o golpe de estado tivesse tido êxito, nomeadamente a captura ou eliminação física do Sr. Presidente da Rep. da Guiné Conakry, Portugal teria ficado, no seio da Comunidade Internacional, em muito maus lençóis.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 3 de Fevereiro de 2016 Guiné 63/74 - P15703: (In)citações (83): Depoimento de um antigo combatente na diáspora (José Câmara, ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56) (2): Reintegração na vida civil e saída para a diáspora

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Guiné 63/74 - P15432: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (31) (1): Dia 23 de Abril de 1974, visita do General Bettencourt Rodrigues a Nhala

1. Em mensagem do dia 26 de Novembro de 2015, o nosso camarada António Murta, ex-Alf Mil Inf.ª Minas e Armadilhas da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74), enviou-nos mais uma página do seu Caderno de Memórias.


CADERNO DE MEMÓRIAS
A. MURTA – GUINÉ, 1973-74

31 - Dias 23 e 24 de Abril de 1974 (1)


Da História da Unidade do BCAÇ 4513: 

ABR74/23 – Pelas 08h00 chegou a A. FORMOSA Sua Excelência o General e Comandante-Chefe, acompanhado pelo seu Chefe do Estado-Maior COR. HUGO DA SILVA, Comandante do BENG TEN-COR MAIA E COSTA e Ajudante de Campo, a fim de visitarem a frente de trabalhos da estrada A. FORMOSA-BUBA. Depois de serem prestadas as honras do estilo, Sua Excelência percorreu demoradamente o aquartelamento, apreciando as obras em curso. Depois de um briefing no Gabinete de Operações, e acompanhado pelo Comandante e 2.º Comandante do Batalhão e restante comitiva, deslocou-se à frente de estrada e ao aquartelamento de NHALA. [Sublinhado meu]. Na frente de trabalhos reuniu-se com o pessoal de Engenharia, o qual felicitou pelo trabalho desenvolvido. Após esta visita regressou a A. FORMOSA, onde almoçou, seguindo depois do mesmo para BISSAU. (...).

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Apontamento: O General Bettencourt Rodrigues.

O General Bettencourt Rodrigues foi um militar brilhante e teve uma carreira longa e preenchida de altos cargos, ensombrada apenas por um final inesperado e sem glória, quem sabe, por preferir manter-se coeso com os seus ideais a aderir ao Movimento das Forças Armadas que acabara de depor o governo de Lisboa. Por via deste desfecho, nunca saberemos que impacto teria a sua acção na administração da Guiné e no evoluir da guerra que, naquela época e nalguns sectores, atingia estádios decisivos e preocupantes, mormente no meu Sector S-2, (com informações ainda muito secretas mas alarmantes sobre os planos do PAIGC), como mais tarde darei conta.

O General Bettencourt Rodrigues não precisa de grandes apresentações. Ainda assim, relembro alguns dados biográficos. [Fonte Wikipédia para factos e datas]. José Manuel Bettencourt Rodrigues [Bettencourt, na Wikipédia], (Funchal, 5 de Junho de 1918 – Lisboa, 28 de Abril de 2011).

- Em 1939 concluiu o Curso de Infantaria da Escola do Exército como 1.º classificado.
- Em 1951 concluiu o Curso de Estado-Maior com a classificação “Distinto”.
- Até à sua promoção a general em 1972, sucederam-se os cursos e as distinções, numa carreira militar notável, tendo sido também Ministro do Exército (1968-1970) e adido militar e aeronáutico junto da Embaixada de Portugal em Londres.
- Em 21 de Setembro de 1973 (a História da Unidade do BCAÇ 4513 refere 29 de Setembro a chegada à Guine), toma posse como Governador-Geral e Comandante-Chefe do Comando Territorial e Independente da Guiné.
- Em 26 de Abril de 1974 foi preso no Forte da Amura (Bissau), por militares do MFA.
- Em 14 de Maio de 1974 passou à situação de reserva por despacho da Junta de Salvação Nacional.


Das minhas memórias: 

23 de Abril de 1974 – (terça-feira) - A visita do General.

A visita do General Bettencourt Rodrigues a Aldeia Formosa e a Nhala foi, provavelmente, a última que fez na Guiné na qualidade de Comandante-Chefe. Pareceu-me uma pessoa muito acessível, afável e atenta aos problemas que lhe eram colocados. Mas foi a impressão de um contacto muito breve.

Nas imagens que mostrarei a seguir, “reportagem” que não é de todo exaustiva, pode notar-se uma certa ausência de tropa em Nhala, pela mesma razão da ocorrida aquando da visita da Cilinha, mas que não referi no relato que dela fiz. Essa ausência deve-se ao que a História da Unidade do BCAÇ 4513 expressa sem rodeios:

“ABR74/23 – (...). Em virtude da visita de Sua Excelência o Comandante-Chefe, foi montado na estrada A. FORMOSA-BUBA um dispositivo especial de segurança, com forças da 1.ª CCAÇ, 2.ª CCAÇ, 3.ª CCAÇ/4513, CART 6250”.

Como última nota referente a este dia, diz ainda o seguinte a História da Unidade: “Pelas 22h30 GR IN destruiu um pontão da estrada alcatroada BUBA-NHALA em região XITOLE 2 G 7-39”.

Mas o senhor General já não ouviria o grande estouro, recatado em Bissau para onde regressou após ter almoçado em A. Formosa. No final deste poste mostrarei algumas imagens colhidas no local, no dia seguinte à sabotagem, 24 de Abril de 1974.


Fotografias da visita do General Bettencourt a Nhala comentadas ao jeito de legendas



Foto 1 - 23 de Abril de 1974, Aldeia Formosa - O General Bettencourt Rodrigues recebe honras militares, ladeado à sua esquerda pelo Major Dias Marques, 2.º Comandante do BCAÇ 4513. [Fotografia inestimável do camarada Fernando Costa, com a devida vénia].

Foto 2 - 23 de Abril de 1974, Nhala - Chegada do General Bettencourt Rodrigues às imediações do aquartelamento, descendo a base recente da estrada nova. Na frente do jeep, preparando-se para descer, o Comandante do Batalhão 4513, Ten-Cor Carlos Alberto Ramalheira.

Foto 3 - 23 de Abril de 1974, Nhala – Depois das honras militares o General cumprimenta o CMDT de Nhala, Capitão Braga da Cruz, da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513. Atrás de si, o Oficial de Dia, Alf Mil Campos Pereira.

Foto 4 - 23 de Abril de 1974, Nhala – A comitiva dirige-se para o aquartelamento. À esquerda da imagem o Coronel Hugo da Silva, Chefe do Estado-Maior, cumprimenta o Oficial de Dia. Em primeiro plano, de Kalashnikov, o Tenente Ajudante de Campo. E guarda-costas, pareceu-me.

Foto 5 - 23 de Abril de 1974, Nhala – No centro do aquartelamento o General dialoga com o Cmdt de Nhala.

Foto 6 - 23 de Abril de 1974, Nhala – Detalhe da fotografia anterior.

Foto 7 - 23 de Abril de 1974, Nhala – O Tenente guarda-costas aproveita para ler uma carta chegada da Metrópole, quero crer. Porquê? Porque o envelope é debruado pelo tracejado característico do correio aéreo.

Foto 8 - 23 de Abril de 1974, Nhala – Por uma mania que ainda uso quando calha, fechei num círculo visitantes e anfitriões. De bigode, fitando-me, o Major Dias Marques, que percebeu a maldade, (inocente, diga-se), parece pensar: Lá está este gajo outra vez com as suas maluqueiras...

Foto 9 - 23 de Abril de 1974, Nhala – Após inspecção ao depósito de géneros (com cão a sair), da responsabilidade do Fur Mil Vaguemestre Sebastião Oliveira.

Foto 10 - 23 de Abril de 1974, Nhala – Diálogo à porta do Cmdt de Companhia, com a presença de um homem grande que deve ser um “notável” da tabanca, mas que não recordo.

Foto 11 - 23 de Abril de 1974, Nhala – O homem grande dialoga com o General através do intérprete atrás de si. O rapaz à direita parece rir-se do português do homem grande ou do dialecto do General.

Foto 12 - 23 de Abril de 1974, Nhala – Outro homem grande chega-se à conversa, enquanto começam a aparecer as mulheres da tabanca com ar decidido.

Foto 13 - 23 de Abril de 1974, Nhala - Começa o ajuntamento popular movido pela curiosidade e pelo tributo de honra ao homem grande da tropa. Manga de ronco.

Foto 14 - 23 de Abril de 1974, Nhala – Já não vai haver hipótese de reunir no gabinete. Tudo irá a “despacho” ali à porta.

Foto 15 - 23 de Abril de 1974, Nhala – Esta bajudinha linda, indiferente à atenção devida ao General, fixa-se na minha objectiva, entre curiosa e apreensiva, não podendo imaginar, nem eu, que um dia a mostraria ao mundo e que, nessa altura (agora), já teria mais de quarenta anos.

Foto 16 - 23 de Abril de 1974, Nhala – O diálogo prossegue e nosso cabo vai assegurando o entendimento das esquisitas falas, sob o olhar atento do Sr. Tenente guarda-costas.

Foto 17 - 23 de Abril de 1974, Nhala – Continua a chegar população. Ou melhor: mulheres e crianças, quase só. As palmas vibram, secas, e a mulher grande dança como um tornado. Manga de ronco.

Foto 18 - 23 de Abril de 1974, Nhala – As visitas preparam-se para partir. Ao volante do jeep, o Cmdt do Batalhão Ten-Cor Carlos Ramalheira e, ainda a subir, à esquerda, o Cmdt de Operações do BCAÇ 4513, Capitão Cerveira. De cigarro, à direita, o Coronel Hugo da Silva. No jeep de trás o resto da comitiva, apenas se reconhecendo ao volante o Major Dias Marques.

Foto 19 - 23 de Abril de 1974, Nhala – Tudo a postos trocam-se os últimos cumprimentos. Ao fundo, a messe de sargentos com alguns deles a assistir às despedidas.

Foto 20 - 23 de Abril de 1974, Nhala – A comitiva saindo de Nhala rumo a A. Formosa. No jeep de trás, reparo agora, segue o intérprete africano que, afinal, já acompanhava o General Bettencourt.

(Continua)

Texto e fotos: © António Murta
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Nota do editor

Últimos 10 postes da série de:

22 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15139: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (21): De 2 a 25 de Setembro de 1973

29 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15174: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (22): De 09 a 23 de Outubro de 1973

6 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15207: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (23): De 27 de Outubro a 12 de Novembro de 1973

13 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15244: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (24): De 14 de Novembro a 22 de Dezembro de 1973

20 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15271: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (25): De 6 a 26 de Janeiro de 1974

27 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15297: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (26): De 29 de Janeiro a 26 de Fevereiro de 1974

3 de novembro de 2015 Guiné 63/74 - P15320: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (27): De 01 a 31 de Março de 1974

10 de novembro de 2015 Guiné 63/74 - P15348: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (28): De 01 a 7 de Abril de 1974

17 de novembro de 2015 Guiné 63/74 - P15376: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (29): De 08 a 16 de Abril de 1974
e
24 de novembro de 2015 Guiné 63/74 - P15404: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (30): Abril de 1974

terça-feira, 10 de novembro de 2015

Guiné 63/74 - P15348: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (28): De 01 a 7 de Abril de 1974

1. Em mensagem do dia 8 de Novembro de 2015, o nosso camarada António Murta, ex-Alf Mil Inf.ª Minas e Armadilhas da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74), enviou-nos a 28.ª página do seu Caderno de Memórias.


CADERNO DE MEMÓRIAS
A. MURTA – GUINÉ, 1973-74

28 - De 1 a 7 de Abril de 1974

Quando nos parecia que o mês anterior seria inultrapassável em intensidade de emoções, com empolgamentos e apreensões, surge-nos um Abril ainda mais emotivo, com factos marcantes e históricos a par de uma actividade operacional exigente e sensível.

Um dos acontecimentos locais mais importantes foi, por certo, o encontro das duas frentes de trabalho da estrada Aldeia Formosa-Buba, ainda que demorasse a ficar transitável em pleno devido à useira falta de alcatrão. Acho que todos vivemos este momento como se fôssemos co-autores da obra, pelo acompanhamento e protecção permanentes desde o início da desmatação, com muito empenho, dedicação e, diga-se, com muito risco.

Como suspeitávamos e temíamos, a actividade da guerrilha recrudesceu, tentando-nos estragar a obra e sua prossecução. Levaram a cabo várias acções e tentaram outras que a nossa tropa frustrou. Tanto apareciam na estrada entre Nhala e Buba como, do outro lado, entre Nhala e Mampatá, tendo conseguido sabotar a estrada uma vez, cortando-a, e emboscarem-nos pelo menos uma vez e tentando outras. Daí que se vivesse uma certa intranquilidade, sobretudo quando tínhamos que dormir no mato mesmo em cima do “carreiro” de Uane, em protecção às máquinas ali recolhidas, por estarem muito afastadas dos aquartelamentos.

Abril seria também o mês das visitas ao Sector, dos mais diversos comandantes incluindo o Comandante-Chefe, General Bettencourt Rodrigues.

Como é evidente, a nível local e nacional, o acontecimento do mês e do ano, (de 1974 e dos seguintes), foi, sem dúvida, a Revolução de Abril, que pôs fim a uma ditadura velha de muitos anos. Sob o efeito da surpresa, a maioria, creio, não teve a percepção plena do alcance do acontecimento e, ainda no desconhecimento das intenções de quem o promovia, tomando o poder, apenas acalentou a esperança de que acabasse a guerra para poder regressar a casa.

 Os mais esclarecidos, poucos, perceberam que uma revolução assim, com tais protagonistas, só podia ser de consequências irreversíveis para a guerra colonial, sendo eles, os protagonistas, parte interveniente nessa guerra e, esta, porventura a maior chaga nacional à época. Mas, como poucas coisas são assim tão singelas e lineares, (apenas a preto e branco, não é?), muito tempo passaria até que o caldo estabilizasse e se começassem a reconhecer os ingredientes. 

Logo, os efeitos do 25 de Abril no terreno não foram imediatos, longe disso, e trouxeram incertezas, ansiedades e situações ambíguas, assim como a penosa busca de soluções para problemas novos e muito sensíveis. Alguns nunca completamente resolvidos, como a segurança e a vida dos guineenses que combateram ao nosso lado. 

Esta foi a minha leitura pessoal e superficial na época, apenas corrigida pontualmente, mais tarde, pela posse de dados que, então, eram quase nulos. Para a maioria, nunca tive dúvidas, indiferentes às consequências políticas (ou que nem sequer descortinavam), a grande alegria que lhes trouxe a revolução foi pensarem que, se escapei até agora, com o fim da guerra irei para casa de certeza. Como se sabe, isso não foi assim para todos, infelizmente.


Da História da Unidade do BCAÇ 4513: 

(...)

ABR74/02 – O Exm.º Comandante Militar Brig. BANAZOL, acompanhado do seu Chefe do Estado-Maior, Coronel VAZ; Comandante do BENG, Ten-Coronel Maia e Costa; Comandante da Companhia de Engenharia, Cap. Branquinho e Ajudante de Campo do Exm.º Comandante Militar, visitaram A. FORMOSA. Após um briefing no Gabinete de Operações, e acompanhados pelo Comandante e 2.º Comandante do Batalhão, visitaram o aquartelamento de A. FORMOSA, onde apreciaram as obras em curso, assim como posteriormente se deslocaram à frente de estradas. Quando do regresso ao aquartelamento o Exm.º Comandante Militar reuniu-se com os Oficiais e Sargentos presentes na Unidade a quem dirigiu algumas palavras, regressando seguidamente a BISSAU.

(...)

ABR74/07 – Pelas 11h30 os dois Destacamentos de Engenharia uniram as duas frentes da estrada, com grande regozijo de todo o pessoal, que manifestaram uma grande alegria pelo facto.
O Exm.º Comandante deslocou-se à frente de estradas a fim de observar o local de união das duas frentes.


Das minhas memórias:

7 de Abril de 1974 (domingo) - A estrada: os trabalhos e a união das frentes de trabalho numa selecção de algumas fotografias, sem grandes pretensões mas tentando mostrar um pouco da azáfama da Engenharia no local.

Foto 1 - 1974, Abril - Frente de trabalhos da estrada Aldeia Formosa-Buba, troço de Nhala-Mampatá. Uns dias depois, ao fundo, há-de surgir a frente que vem de Mampatá, unindo-se as duas. 

Foto 2 - 1974-04-07 - Frente de trabalhos: Elementos do meu 4.º GComb/2.ª CCAÇ/BCAÇ4513, fazem a picagem a caminho da frente de trabalhos que avança na direcção de Mampatá. 

Foto 3 - 1974-04-07 - Frente de trabalhos: Chegada do GComb à frente de trabalhos. Ao fundo vê-se uma pequena zona de luz na mata escura. É a frente de trabalhos oposta e já próxima, lado de Mampatá. 

Foto 4 - 1974-04-07 - Frente de trabalhos em actividade plena. A frente oposta é agora mais visível ao fundo à direita.

Foto 5 - 1974-04-07 - Frente de trabalhos: Através da galeria ao centro, vê-se claramente o seguimento da estrada para Mampatá. 

Foto 6 - 1974-04-07 - Frente de trabalhos: Com grande perícia, o operador da máquina sacode a palmeira e derruba-a. 

Foto 7 - 1974-04-07 - Frente de trabalhos: A palmeira é enfiada pela mata dentro. 

Foto 8 - 1974-04-07 - Frente de trabalhos: Imagem colhida na frente de trabalhos de Mampatá, vendo-se o seguimento da estrada para Nhala. Uma pequena fileira de árvores separa as duas frentes.

Foto 9 - 1974-04-07 - Frente de trabalhos: O derrube das últimas árvores. 

Foto 10 - 1974-04-07 - Frente de trabalhos: Concluída a ligação das duas frentes de trabalho e a jornada do dia, as máquinas recolhem a lugar seguro. Está feita a ligação Aldeia Formosa-Buba em termos de desmatação. Algures do lado de Nhala (e de Mampatá, creio), avança a construção da sub-base, base e alcatroamento da estrada.

(Continua)

Texto e fotos: © António Murta
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Nota do editor

Poste anterior da série de 3 de novembro de 2015 Guiné 63/74 - P15320: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (27): De 01 a 31 de Março de 1974

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15305: Inquérito "on line" (13): Os três Comandantes da Guiné (Mário Vitorino Gaspar)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Vitorino Gaspar (ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68), com data de 11 de Outubro de 2015:

E valerá a pena ser resistente, antes diria, combatente?

O tema 3 Comandantes, estando num período de 1967/68 foram dois:
- Arnaldo Schulz, que chegou em Maio de 1964 (ouvi falar dele…).

- O Spínola que chegou a Bissau em Agosto de 68. Muito simpático, educado ao descer do helicóptero, com o seu monóculo, de camuflado como combatente, tinha luvas e a varinha – devia parecer-se com aquele Senhor Oficial de Santarém, também de varinha ou ceptro que dizia na parada a um soldado após vislumbrar um fósforo no chão: “Tira-me este barrote daqui”! – pois o Spínola com essa chibata, quando o vi pela primeira vez, parecia-se muito com um Professor que tive na Primária – todos usavam – uma cana da índia que servia de apontador como para dar com ele na cabeça de um mal comportado.

Na primeira vez aparece um helicóptero e somos informados ser o Governador e Comandante das Forças Armadas da Guiné. Todos de férias numa magnífica terra africana, chinelos e calção de banho e, por que não, tronco nu?
Todo o mundo correu para os abrigos onde nada faltava desde um telhado de palmeiras, paredes de bidão com terra e mosquitos de volta do mosquiteiro e chão de terra batida. Mudar a vestimenta. Todos bem, só que com camuflados rasgados e rotos. Feita a segurança à pista lá está ele vestido como dito. Visto é diferente. A Companhia formada – não era Companhia por estar um Pelotão e uma Secção no destacamento de Ganturé – surge ele e a comitiva.

Do discurso recordo principalmente esta, após uns elogios à CART 1659:
- Vão todos vestirem-se como estavam quando o helicóptero sobrevoou Gadamael!

Todos surgiram, estilo Charlot, mas de calções, chinelos e cabeça ao vento. Foi então que afirmou:
- Não venho prometer nada, só mais sacrifícios e privações!

Um rebelde da Companhia disse:
- Mas fizemos o cais de Gadamael e disseram se conseguíssemos seriam 18 meses de Comissão!
- Meu filho mais carências e privações! – Ao mesmo tempo que batia ora com a chibata na mão ou endireitando o monóculo…

Colocaram-se em posição para irem ao destacamento, e foram. Houve qualquer problema com um elemento da comitiva que, julgo queria ir na viatura. E ele não gostou. Fui escrever aerogramas e cartas para a mesa enorme e forte – Messe de Sargentos – feita de caixas de munições – tudo do melhor. E as cadeiras? De baloiço, pois! Era uma Estância de Férias.

O tempo passara. Sinto algo se passa nas minhas costas e volto a cabeça e ponho-me de pé. Lá estava Spínola que me toca no ombro para me sentar. Olhou para o cozinheiro da Messe e ouviu-se num tom de voz paternal:
- Meu filho, estás muito magro! O que andas a fazer?

O Lima (nome do Cozinheiro da Messe), acrescentei:
- Por causa da irmã da canhota!

Ainda me fez umas perguntas. Simpático, não digo que não.

Voltou a Gadamael mais tarde, verificando estarem os camuflados todos velhos falou com o 1.º Sargento Barreira para pedir camuflados novos para Bissau. Julgo ter sido neste período muito difícil – inúmeras Operações e o PAIGC não atirava granadas com cavilhas do Lança-Roquetes. Caiu-me uma a poucos metros de mim no “Corredor da Morte”. Estratégia militar? E para com as populações civis? Nem a parte militar como a humana – considerando estarmos numa guerra – considero que os abandonos de aquartelamentos de Sangonhá e Cacoca (que estavam no final da comissão), como o aparecimento de Gandembel – em pleno “corredor da morte” – e com mais tarde abandono de Mejo, Ganturé e Gandembel para que te quero!

Com a simpatia de querer que a população fosse aproximando, centenas e centenas de naturais que viviam em Conacri, Gadamael cresce de dentro para fora e abrigos melhorados, outros arranjados e o caso de um abrigo-caserna, fui eu o arquitecto fica no interior e a defesa começa a fazer-se em valas. Guileje e Gadamael Porto ficam ali à mão de semear.

Regressei e passados uns anos encontrei o Spínola na esquina da Avenida de Roma com a Avenida EUA. Viu-me e estendeu a mão e cumprimentou-me.

NOTA: Carlos e Luís como vejo que os votantes dizem acreditarem no General Spínola, curiosamente penso o contrário dele, Quanto a Arnaldo Schulz penso não ser um bom militar.


O General Bettencourt Rodrigues, ouvi falar dele.
Curiosamente existia uma figura nas Companhias que era o Furriel Miliciano PSICO – estava lá mas não era mencionado na História da Unidade da CART 1659. Não sei se sucedia o mesmo em todas as Companhias que tiveram um Furriel Miliciano da PSICO.
Se pretenderem a minha opinião sobre Spínola, é só pedir (sabem à partida que só tenho de me referir àquele militar que conheci, e considero que não sabia a realidade da Guiné.
O troféu de trazerem muitos indivíduos de Conacri para o nosso lado foi péssimo.


Encontrei esta relíquia entre os destroços

Mário Vitorino Gaspar
Furriel Miliciano Atirador de Artilharia e MA
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Nota do editor

Último poste da série de 20 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15274: Inquérito "on line" (12): A Guerra da Guiné e os seus comandantes que, de derrota em derrota, propiciaram a vitória final ao PAIGC… (Manuel Luís Lomba)

terça-feira, 20 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15274: Inquérito "on line" (12): A Guerra da Guiné e os seus comandantes que, de derrota em derrota, propiciaram a vitória final ao PAIGC… (Manuel Luís Lomba)

1. Mensagem do nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil da CCAV 703/BCAV 705,  Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66), com data de hoje, 20 de Outubro de 2015:

Viva, Carlos!
Correspondo ao "inquérito" com um texto algo extenso, sem ser exaustivo, referido aos nossos patrões da Guerra da Guiné.

Abraço,
Manuel Luís Lomba


A Guerra da Guiné e os seus comandantes que, de derrota em derrota, propiciaram a vitória final ao PAIGC… 


Comandante Melo e Alvim, Governador entre 1954-56:

A PIDE só se instalou na Guiné a partir de 1958 e Amílcar Cabral, director dos Serviços Agrícolas e Florestais do seu governo, escudou-se no carácter aberto e tolerante desse oficial da Armada para semear os ventos da subversão, aliciando elites, pequena burguesia dos centros urbanos e chefes de tabanca Balantas e Nalús, com a sua boa nova da libertação da suserania de Portugal, enquanto percorria os chãos daquelas tribos, por conta do Estado, na roulotte dos seus Serviços, ao abrigo do Recenseamento Agrícola desse território, elevado a Província Ultramarina Portuguesa, desde 1951.

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Comandante Peixoto Correia, Governador entre 1959-62: 

Entretanto, Amílcar Cabral aderira ao PAI, Partido Comunista da Guiné, fundado por Rafael Barbosa, alcandorara-se ao cargo de secretário-geral e reciclou-o no PAIGC. Em 1960, frequentou a União Soviética com passaporte português, em demanda de apoio e da lavagem ao cérebro, a seguir viajou para a China com Nino Vieira e mais 29 aderentes por si seleccionados, para tirocinar na Academia Militar de Pequim, na qual o próprio também se terá sujeitado a formação acelerada nas tácticas da guerra de guerrilhas (a complementar a formação militar clássica, recebida na Escola Prática de Cavalaria, em Santarém, onde terá atingido a patente de alferes miliciano) e começou a remeter as reivindicações políticas do PAIGC a Salazar.
Naquele ano, a guarnição militar da Guiné tinha o efectivo de 1850 elementos, metropolitanos e locais, na proporcionalidade de 80% e de 20%, respectivamente, que se manterá até ao seu abandono, em 1974.
Emigrou para Conacri, em 1961, contratado pelo governo de Sekou Touré como conselheiro técnico do ministério da Economia Rural e, com recurso à conta bancária da mulher Maria Helena, metropolitana e de família abastada, mandou incendiar a Guiné Portuguesa, em extensão e profundidade, com o corte dos fios da rede telefónica, sabotagem de viadutos, abatizes nas estradas, no norte e no sul, visando a paralisia económica e o isolamento de vilas e tabancas, e duas embarcações de cabotagem foram capturadas, uma à Casa Gouveia e outra à Sociedade Comercial Ultramarina.

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Comandante Vasco Rodrigues, Governador entre 1962-64, e 
Brigadeiro Louro de Sousa, Comandante Militar: 

Em Junho/Julho de 1962, o PAIGC de Conacri, em coligação operacional com o MLG de Ziguinchor, lançaram ataques terroristas a Susana e a Varela, mobilizando centenas de manjacos maioritariamente senegaleses, comandados por Pierre Mendy, de Casamança, ex-sargento do exército francês na guerra da Argélia, enquadrados por 10 instrutores ex-FNLA daquele país. O efectivo da guarnição militar havia crescido para 5070 elementos.
O PAIGC deu início oficial à sua guerra na Guiné em Janeiro de 1963, com o ataque ao aquartelamento de Tite, seguido de outros, no sul, cento e norte, conforme dispositivo táctico e de manobra belicoso, concebido e implementado pelo próprio Amílcar Cabral, em oposição ao dispositivo militar da autoria do ministro da Defesa General Santos Costa e implementado pelo Secretário de Estado do Exército, o então Ten-Coronel Francisco da Costa Gomes. O grupo atacante a Tite procedera de Koundara, na República da Guiné, a sua primeira base recuada, a 150 km de distância do objectivo, para salvar as aparências, enquanto Nino Vieira e Manuel Saturnino Costa regressados do seu tirocínio de Pequim, arvorados em comandantes, à testa de 300 guerrilheiros bem armados e melhor adestrados, apoiados pelo exército regular da República da Guiné, proclamavam as três ilhas como a República Independente do Como, para a primeira sede de governo revolucionário e da primeira assembleia popular - símbolos da Guiné libertada da suserania de Portugal, para financiadores e ONU verem.
Paulo Costa Santos, Comandante da Defesa Marítima, em Bissau, superou a hesitação do Governador e o cepticismo do Comandante Militar, referido à perícia militar portuguesa para enfrentar essa guerra, como o impulsionador da famigerada “Operação Tridente”, levada a cabo nos princípios de 1964, na qual foram investidos 1150 homens dos três ramos das FA, incluindo um grupo de Comandos vindo de Angola, contra as ilhas do Como, Caiar e Catunco. Não obstante a renhida resistência terrestre e antiaérea oposta pelo PAIGC, ao fim de 70 dias, as três ilhas regressaram à plena soberania de Portugal e uma Companhia de Caçadores ficou a nomadizar na ilha do Como. O PAIGC viu-se inibido de instalar o seu primeiro governo na tabanca do Cachile e de organizar a sua assembleia popular constituinte na tabanca de Cassacá, ali ao lado, enquanto os seus insofridos defensores sobrevivos se retiravam para a República da Guiné ou iam continuar a sua guerra para as matas continentais do Cantanhez e de Cufar.
A vigência de mais de um ano dessa República Independente do Como, pela mão militar dos nacionalistas, teve consequências, entre outras, a de Salazar demitir o Governador e o Comandante Militar, criar o posto de Comandante-Chefe, fundido com o de Governador e dilatar-lhe o mandato para 4 anos.
Em 1963, o efectivo do PAIGC seria de 800 elementos, a maioria transitada do bando do MLG que fizera terrorismo nas aludidas povoações balneares do noroeste, enquanto o efectivo da Guiné era de 9650 elementos e atingirá 15194, em 1964. A componente propagandística do PAIGC aproveitou o evento e a sua prolongada resistência para cantar a vitória da batalha do Como, sem que alguma vez os seus chefes militares que a protagonizaram, nomeadamente Nino Vieira, a houvesse reclamado.
Não obstante tantas provas de facto, documentais e ainda vivas, nomeadamente a malta da Operação Tridente agregada à nossa Tabanca Grande, não raro surgem escribas nacionais perseverantes na aculturação do nosso atávico complexo de inferioridade, dando-nos como os derrotados da Operação Tridente, às mãos dessa efémera e mitológica República Independente do Como.

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Brigadeiro Arnaldo Schulz, Governador e Comandante-Chefe, entre 1964-68 e
Brigadeiro Sá Carneiro, Comandante Militar da Guiné:

Na Abrilada de 1961, Arnaldo Schulz, então Ministro do Interior, fora simultaneamente fiel a Salazar e leal aos conspiradores seus pares que, em 1964, o transferiu de Comandante do Norte de Angola para o mais elevado posto na Guiné. Chegámos e ficámos um ano de reserva às suas ordens, e rebentou connosco, em plena época das chuvas, em operações de “cerco, assalto, destruição e limpeza” em objectivos no Oio, Morés, Fulacunda, Cafine, Cacine, Cantanhez, Catió, Cufar, etc. Até Amílcar Cabral se queixava da guerra ofensiva e sem quartel por ele desancada. Iniciou o dispositivo do fecho das fronteiras, designadamente ao longo dos 350 km da fronteira da República da Guiné, instalando forças em Buruntuma, Beli, Madina do Boé, Gandembel, Balana, Guileje, Gadamael, Ganturé, Sangonhá, Cacoca e Cameconde. Com mais de 2 anos de atraso – demasiado tarde. O PAIGC já havia incendiado perto de dois terços da Guiné.
Revelava-se oficial da velha guarda, discreto, que nunca vi de camuflado. Lembro-me de se sentar a meu lado, informalmente, no banco de lona corrido do Dakota, naquele voo madrugador para Nova Lamego, em meados de Maio de 1965, quando fomos dar luta à abertura da frente Leste pelo PAIGC, retirados apressadamente da “Operação Razia”, à mata de Cufar Nalu. Dirigiu-se a pé para o aquartelamento e eu e a minha Secção fomos logo despachados para Cheche, com a missão de montar segurança à fatídica jangada da cambança do rio Corubal.
Proibia terminantemente a perseguição além-fronteiras, direito de que nem sempre abdicamos, inibição que, associada à sua falta de guarnições, favorecia o crescimento exponencial e a perícia guerreira do PAIGC. Era o tempo do devaneio romântico do chefe da nossa diplomacia Franco Nogueira, pela negociação de tratados de não-agressão com os vizinhos. A lógica dos nossos supremos chefes políticos e militares não objectivaria a aniquilação do PAIGC, mas um “policiamento” musculado, susceptível do seu desgaste conduzir à sua desistência. Desperdício dos esforços e sacrifícios dos seus soldados.
Os triunfos dos tácticos após as batalhas são grandes e fáceis as suas análises posteriores. Mas a eloquência dos números do crescimento da guarnição militar da Guiné constitui elemento de prova da escalada da guerra imposta pelo PAIGC e dos nossos ingloriosos sacrifícios, como soldados.

Efectivos:
Ano de 1964 - 15.194
Ano de 1965 - 17.252
Ano de 1966 - 20.801
Ano de 1967 - 21.650
Ano de 1968 - 22.835

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Gen. António de Spínola, Governador e Comandante-Chefe, entre 1969-73: 

Revelou-se o actor militar mais carismático e exuberante da Guerra do Ultramar. Começou pelo trabalho de casa, com a repatriação dos oficiais profissionais, incompetentes ou acomodados, cultivou a omnipresença no terreno, junto dos combatentes, ganhou jus à adulação de “Homem Grande”, de amigo e protector das populações e criou poderosos anticorpos na corporação castrense. Na linguagem de caserna, a Guiné passou a designar-se como a “Spinolândia”.
Desmantelou a protecção fronteiriça iniciada pelo antecessor, na tentativa de a compensar, potenciando o tal “policiamento” musculado no interior, politicamente correcto, empenhando tropas especiais, recorrente na cobrança do esforço e sacrifício dos soldados e aproximou o PAIGC às cordas da desistência, recorreu não sistematicamente à perseguição além-fronteiras, sendo a mais notável a Operação Mar Verde, sobre Conacri, em finais de 1970, cujo fracasso parcial poderá ser imputa à tibieza da decisão de não ter investido a aviação nessa empresa.
O seu desempenho, a partir do ano de 1972 inclusive, merecerá a acuidade de investigadores e analistas, em ordem à verdade histórica.
Após a sua preterição por Marcelo Caetano, como candidato a Presidente da República nas eleições desse ano, que um núcleo dos seus “rapazes”, fiéis e dedicados oficiais da nova geração - os “spinolistas” -, incentivavam, terá baixado a espada, conluiado com a criação do MFA, subestimado o seu potencial de desagregação das Forças Armadas, e se retirado na expectativa íntima de se poder transformar no De Gaulle da nossa circunstância. Sairá da cena, sem honra nem glória.
A minha admiração, pela sua dimensão de chefe militar, esmoreceu a partir do momento em que este blogue me deu a conhecer a sua comparência em Gadamael em crise, na manhã de 1 de Junho de 1973, e a sua rápida retirada no seu helicóptero, ao rebentar uma violenta flagelação desencadeada pela artilharia pesada do PAIGC. Um Comandante-Chefe e a sua circunstância, a braços com o abandono de Guileje e com a guarnição de Gadamael em debandada em pânico no exterior do aquartelamento, deixaria outro retrato na História, se tivesse aguentado firme, ao comando e a animar a malta, ao lado do Cabo Raposo, do Furriel Carvalho, do Capitão Comando Ferreira da Silva e do punhado de militares de Gadamael, que nunca claudicaram.

Eloquência dos números do crescimento da guarnição militar, como prova de facto da escalada da guerra da iniciativa do PAIGC, em contraste com o sucesso do aludido “policiamento”: 

Efectivos:
Em 1969 - 26.851
Em 1970 - 26.775
Em 1971 - 29.210
Em 1972 - 29.957
Em 1973 - 32.035

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Gen. Bettencourt Rodrigues, Governador e Comandante-Chefe, entre 1973-74: 

Oficial distinto, foi para a Guiné com aura de haver resolvido a guerra de Angola, juntamente com Passos Ramos, Soares Carneiro e mais alguns oficiais. Deslocou-se e calcorreou a “capital” de Madina do Boé, decidido a reformular o dispositivo militar, colocando as posições fronteiriças fora do alcance dos morteiros de 120 do PAIGC – contra o potencial de fogo do IN, abrigar, abrigar!
Em 27 de Abril de 1974, à revelia da autoridade e da cadeia de comando reposta em Lisboa pelo MFA da Metrópole/Junta de Salvação Nacional, o MFA de Bissau desencadeou o seu próprio golpe, prendendo o Comandante-Chefe e desnatando a guarnição das suas principais chefias. Foi o “golpe de Bissau”, no contexto do PREC, de tão má memória.

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Ten-Coronel Mateus da Silva, Comandante-Chefe, entre 27 de Abril a 7 de Maio de 1974:

Oficial de Transmissões, alcandorado pelo MFA da Guiné. Sem História.

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Brigadeiro Carlos Fabião, Alto-Comissário e Comandante-Chefe, entre 6 de Maio e 11 de Outubro de 1974:

Desembarcou em Bissalanca, imbuído da missão de conduzir a Guiné a uma descolonização civilizada, encontrou a situação totalmente minada pelo esquerdismo do seu MFA, mas não teve outro remédio senão alinhar pelo seu diapasão, capitular perante o PAIGC e desempenhar-se como um presidente de comissão liquidatária.
O abandono da Guiné, a forma como as tropas locais foram desarmadas e abandonadas à sua sorte constituem medonha indignidade, uma nódoa na História, a crédito do MFA.
Em 1974, o efectivo de tropas locais era de 6425 elementos, bem preparados, superiorizando o efectivo do PAIGC. Se colocadas num tabuleiro de negociação, tender-se-ia ao compromisso, na expectativa de contribuírem para prevenir que o PAIGC pudesse transformar a Guiné-Bissau num Estado falhado.
Efectivos e a eloquência dos seus números, referidos a 1974: 32.035 referem-se a 1973; os desse serão difíceis de quantificar, dado que, por impulso da componente marxista e comodista do MFA de Bissau, os militares portugueses e os combatentes guineenses passaram a misturar-se…
O camarigo José Martins apresentou números referidos aos operacionais. Os números agora apresentados respeitam os efectivos brutos, colhidos do livro A Guerra em África, da autoria do Major-General Sérgio Bacelar, pags. 137 e 138.

À guisa de conclusão: Se é verdade que a vitória final do PAIGC foi alcançada de derrota em derrota, iniciadas em Tite e consolidadas no Como, temos de reconhecer e render homenagem à capacidade de sacrifício e à valentia da malta do PAIGC, seus comandantes e soldados.

Manuel Luís Lomba
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Nota do editor

Último poste da série de 20 de Outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15272: Inquérito "on line" (11): Sobre o tema Com-Chefes da Guiné, encontrei algumas lembranças e fotos do General Spínola (Ernestino Caniço)

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15256: Inquérito "on line" (9): Em 166 respondentes, 72% votaram em António de Spínola como "com-chefe" com a "melhor opinião"... Segue-se Bettencourt Rodrigues (8%) e Schulz (6%)... Cerca de 15% não sabe ou não escolheria nenhum dos três...


A. INQUÉRITO "ON LINE": "DOS 3 ÚLTIMOS COM-CHEFES DA GUINÉ, AQUELE DE QUE TENHO MELHOR OPINIÃO É...":


1. Arnaldo Schulz (1964/68) > 10 (6,0%)



2. António de Spínola (1968/73) > 119 (71,7%)





3. Bettencourt Rodrigues (1973/74) > 14 (8,4%)

4. Nenhum deles > 16 (9,6%)


5. Não sei / não tenho opinião > 7 (4,2%)


Votos apurados: 166 | 100,0%
Sondagem fechada 15/10/2015, 15h32

B. Comentário:

Reprodução, com a devida vénia, de um excerto de um entrevista de Alpoim Calvão ao jornal CM - Correio da Manhã, em que são referidos três homens que comandaram as NT no TO da Guiné e com quem o entrevistado trabalhou: Louro de Sousa, Arnaldo Schulz e António de Spínola. 

A entrevista foi conduzida pelo jornalista José Carlos Marques (que eu conheci na Guiné, em março de 2008) e foi publicada em 7/10/2012. Título e subtítulo: "O eterno guerreiro Herói da Guerra em África, Alpoim Calvão foi bombista do MDLP no Pós-25 de Abril. Conta em livro uma vida de batalhas"




O cmdt Alpoim Calvão numa tira da banda desenhada “Operação Mar Verde”,
da autoria de A. Vassalo [ex-fur mil comando Vassalo Miranda,
nosso camarada da Guiné], uma edição da Caminhos Romanos, 2012.

(...) Quando conheceu António de Spínola? 

- Conheci o então brigadeiro António de Spínola, que era o comandante-chefe e governador da Guiné, logo no aeroporto.  Foi-me apresentado por um amigo. Ele estava como sempre, impecável no seu monólogo e casaco aprumado. Não suava, era uma coisa formidável. Disse-me ele: ‘Sr. Comandante, espero que nos vamos entender muito bem’. E eu respondi ‘não sei se é possível, porque eu tenho três grandes defeitos: primeiro, sou oficial de marinha; segundo, não sou de cavalaria; e não sou do Colégio Militar’. 

Ficou um silêncio de morte, que ele quebrou ao rir-se à gargalhada. Fui colocado a comandar o COP 3 a Norte em Bigene. Tínhamos uma actividade de assaltos, operações, golpes de mão, patrulhas nos rios… Além dos fuzileiros tinha uma unidade do exército. Depois fiquei a chefiar as operações especiais no território. 

- Spínola alterou a estratégia da guerra. O que mudou? 

- A guerra teve uma continuidade, mas Spínola tornou-se mais agressivo. Intensificou as operações, mas também o apoio às populações. No COP3 fartei-me de fazer casas que eram entregues aos nativos. As populações gostavam mesmo do Spínola. Ele aparecia de helicóptero, com o ajudante, fosse onde fosse. Tinha um certo carisma, aparecia com o monóculo, luvas, camuflados retocados pelo alfaiate, fazia figura. Além dele, conheci dois outros comandantes-chefes na Guiné-Bissau. Louro de Sousa era um bom oficial do Estado-Maior, mas não tinha jeito nenhum para comandar as tropas. Arnaldo Schulz era muito inteligente, mas levava as coisas com mais calma. Para Spínola, para a frente é que era o caminho. Com Schulz eu fazia operações no Sul da Guiné, em que entrava na Guiné-Conacri e ele chegou a suspender-me os movimentos para não criar problemas. Só pude realizar esse tipo de operações cinco anos depois, com o Spínola, que me deixava fazer tudo. (...)
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Nota do editor:

Último poste da série de 13 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15246: Inquérito "on line" (8): O General Spínola foi uma figura controversa, e para ilustrar tal ilação, vou referir alguns aspectos que me sensibilizaram (José Manuel Matos Dinis)