Blogue coletivo, criado e editado por Luís Graça, com o objetivo de ajudar os antigos combatentes a reconstituir o puzzle da memória da guerra da Guiné (1961/74). Iniciado em 23 Abr 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência desta guerra. Como camaradas que fomos, tratamo-nos por tu, e gostamos de dizer: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
segunda-feira, 4 de outubro de 2021
Guiné 61/74 - P22597: Agenda cultural (786): Convite para a apresentação do livro "Nunca Digas Adeus às Armas (Os primeiros anos da Guerra da Guiné)", por António dos Santos Alberto Andrade e Mário Beja Santos, dia 18 de Outubro de 2021, pelas 18 horas, no Pálácio da Independência - Largo São Domingos, 11 - Lisboa
Nota do editor
Último poste da série de 30 DE SETEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22583: Agenda cultural (785): Apresentação do livro "Ataque a Conakry", de José Matos e Mário Matos e Lemos, dia 21 de Outubro, às 17 horas, no Palácio da Independência - Largo de São Domingos - Lisboa
Guiné 61/74 - P22596: Notas de leitura (1387): Imagens à procura de comentários: Augusto Trigo e a CART 1746 (Mário Beja Santos)
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Queridos amigos,
A folhear um acervo documental dos herdeiros do General Schulz, chamou-me a atenção a belíssima imagem de um álbum de Augusto Trigo, um artista luso-guineense a quem se faz a tremenda injustiça de não lhe conhecer a valiosa obra; e no meio daqueles dossiês e registos metodicamente organizados, saltou uma fotografia de gente que conheci, a CART 1746, por obra e graça da investigadora Lúcia Bayan aqui a faço chegar, ela é merecedora de comentários. Façamos isso em memória desse gentil camarada que foi o Capitão Vaz, é o meu pedido.
Um abraço do
Mário
Imagens à procura de comentários: Augusto Trigo e a CART 1746
Beja Santos
Sempre que me encontro com investigadores a estudar a Guiné Portuguesa, ou etnias da Guiné Portuguesa, ou estudiosos das guerras de África, não deixo de os alertar que continuamos com algumas lacunas graves no tocante a esses treze anos: a guerra da Guiné carece, e com algum grau de urgência, de uma tese de doutoramento sobre a governação de Arnaldo Schulz, nós pegamos nos manuais e não há investigador que habilidosamente circunscreva o período de 1964 a 1968 num arrazoado de linhas que não nos permite conhecer a estratégia utilizada por aquele oficial do Estado-maior quanto à ocupação da Guiné, depois das tremendas convulsões que se viveram em 1963; Portugal manteve relações diplomáticas com Cuba durante a guerra de África e não há nenhuma investigação que nos permita conhecer o que consta nos arquivos diplomáticos de Lisboa e Havana, nomeadamente quanto à participação cubana junto dos movimentos anticoloniais PAIGC e MPLA; o Estado de Israel apoiou a política colonial portuguesa, vendeu armamentos e explosivos, etc.
Em conversa com a investigadora Lúcia Bayan, que trabalho no doutoramento sobre a etnia Felupe, deu-me a saber que era depositária pelos herdeiros do general Schulz de um acervo documental e que mo gostaria de mostrar. E um dia aconteceu, folheámos um acervo impressionante de documentação de caráter institucional, vimos álbuns e recortes em doses maciças. No essencial, trata-se de documentação de utilidade subsidiária para quem estudar o Governador Schulz, são recortes de jornais, cópias dos seus discursos, álbuns com imagens à sua despedida, enfim documentação já publicada. Mas encontrei duas exceções. A lindíssima capa de um álbum fotográfico que lhe ofereceram com a cópia de um quadro de Augusto Trigo, um artista infelizmente pouco conhecido, guineense e com um trabalho apuradíssimo ao nível da banda-desenhada. Era bom que o Luís Vassalo, que tanta atenção tem dado à banda-desenhada com motivos na guerra de África, falasse da obra do Augusto Trigo.
No meio daquela caterva de documentos, saltou uma fotografia, via-se nitidamente que era uma imagem avulsa, sem nexo com tudo quanto ali aparecia organizado. Ela aqui está, refere uma viagem do General Schulz a Bissorã, à CART 1746, que esteve em Bissorã e no Xime, lembro-me perfeitamente do falecido Capitão Vaz, com quem estabeleci uma relação afetuosa, teve mesmo a gentileza de colaborar na apresentação de um livro meu. Apelo aos camaradas da CART 1746 que façam comentário desta fotografia, tão gentilmente cedida pela investigadora Lúcia Bayan. Ficamos todos a aguardar.
Capa de álbum fotográfico cedida pelos herdeiros do general Arnaldo Schulz à investigadora Lúcia Bayan, a quem se agradece a partilha. A capa do álbum reproduz um quadro a óleo de Augusto Trigo.
Nota do editor
Último poste da série de 3 DE OUTUBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22593: Notas de leitura (1386): "Um caminho de quatro passos", de António Carvalho (2021, 219 pp.): apontamentos etnográficos para o retrato da nossa geração, de antigos combatentes - Parte II (Luís Graça)
Guiné 61/74 - P22595: Convite (16): Vilma e João Crisóstomo convocam as famílias Crispim & Crisóstomo, mas também amigos e camaradas, para um encontro no Mosteiro do Varatojo, Torres Vedras, domingo, dia 24/10/21, com missa às 12h30 por alma de todos os falecidos
Conforme anúncio no "Badaladas", em anexo, este "encontro" tem uma dupla finalidade: reviver e alimentar a nossa amizade e ao mesmo tempo lembrar aqueles que nos foram/são nossos queridos e já nos deixaram.
Para este reviver e alimentar amizades…esperamo-vos a todos de braços abertos. (*)
Data - quinta, 23/09/2021, 03:14
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Assunto - Encontro no Varatojo, 24 de outubro de 2021
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Caro Luís Graça,
Não tinha intenção de te escrever hoje, mas o decorrer do dia de hoje aconteceu ser para mim muito rico em memórias, na maioria relacionadas com a Guiné e camaradas que já nos deixaram. E por isso quase me sinto na necessidade de o fazer ainda hoje, enquanto as coisas ainda estão bem frescas
Mas antes disso deixa-me falar-te dum encontro no Convento de Varatojo, de cuja intenção te falei há tempos.
Custar-me- ia imenso vir a Portugal e não ter possibilidade de ver/encontrar os meus familiares e amigos. É sempre essa uma das razões, senão mesmo a primeira, que me trazem a Portugal.
Mas as limitações impostas pela pandemia ainda não possibilitam fazer um encontro como tenho feito nos últimos 14 anos. Pelo que decidi desta vez cingir-me ao que fiz nas duas primeiras vezes em que reuni as minhas famílias Crisóstomo e Crispim.
No primeiro ano o encontro foi presidido por um padre, primo meu, e no segundo ano, na impossibilidade deste, foi o Sr. Padre Melícias que celebrou esta missa.
Além dos meus familiares falecidos eu vou incluir os meus colegas de seminário e amigos/camaradas da Guiné.
Acabei, entretanto, de visitar Coimbra (incluindo o cemitério da Conchada) e o Bussaco, e isso despertou em mim um rio, irrepremível, de emoções e memórias, nomeadamemte em relação a amigos e e camaradas da Guiné, que já nos deixaram, a cameçar pelo Maldonado, cuja campa descobri, mas também o Mano, o Abna na Onça, o Queba Soncó, o Açoriano e outros que acabaram a sua vida nas terras da Guiné a par dos que, tendo voltado, da lei da morte já entretanto se libertaram : o Zagalo, o Pires, o Rosales, o Eduardo… Falarei desta visita ao cemitério da Conchada, em Coimbra, em próximo poste.
João Crisóstomo
domingo, 3 de outubro de 2021
Guiné 61/74 - P22594: In Memoriam (408): Lissy Jarvik (1924-2021), de origem judia holandesa, foi salva por um visto do nosso Aristides Sousa Mendes; mais tarde, já eminente médica, especialista em psiquiatria geriátrica, tornou-se uma dos grandes paladinos da memória do cônsul português de Bordéus (João Crisóstomo, Nova Iorque, agora de passagem por Portugal)
1. Mensagem de João Crisóstomo dirigida aos embaixadores portugueses Domingos Fezas Vital (EUA) e Franscicsco Duarte Lopes (Nações Unidas), com conhecimento ao nosso blogue:
Data - sábado, 2/10, 23:03 (há 15 horas)
Assunto - Lissy Jarvik / Aristides de S. Mendes
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Exmos Senhores Embaixadores Domingos Fezas Vital e Francisco Duarte Lopes,
Permitam-me este e mail em simultâneo, pois que honestamente não sei a quem o deva dirigir.
Ao mesmo tempo informaram-me que o Senhor Embaixador Francisco Duarte Lopes ia deixar de ser o nosso representante nas Nações Unidas para ir representar Portugal e os portugueses em Washington. De coração a ambos as minhas felicitações e os melhores votos, sentimentos que minha esposa Vilma comunga também de coração.
E porque tenho sido privilegiado pelo favor da amizade de ambos, permitam-me um pedido , partilhado da mesma maneira pela minha esposa Vilma, que esta amizade que generosamente nos têm concedido continue como até aqui, na certeza de que faremos o possível para continuarmos a merecer a vossa amizade.
E agora o fim primeiro deste e-mail : Acabo de saber que a eminente Professora Dra. Lissy Jarvik, ( de 97 anos) que recebeu um visto de Aristides de Sousa Mendes, acaba de falecer. Ambos Vossas Excelências sabem tão bem ou melhor do que eu o papel que ela representou no reconhecimento de Aristides de Sousa Mendes, junto do Yad Vashem - Centro Mundial de Lembrança do Holocausto, filmes /documentários em que o seu testemunho e figura foram proeminentes, as muitas conferências e trabalhos, etc.
A família de Lissy Jarvik acaba de contactar a Sousa Mendes Foundation US pois querem convidar o consul português em Los Angeles para estar presente no seu enterro que deve ter lugar amanhã, domingo dia 3 ou na segunda feira, dia 4; ainda não tinham ou não sabiam a data certa.
Como disse atrás, não sei a quem me dirigir neste momento. Sei que a vossa compreensão compensará a minha ignorância. Mas peço-lhes encarecidamente que deem as vossas instruções a quem de direito nesse sentido. É o mínimo (ela merece muito mais!) que podemos fazer. Lissy Jarvik merece a nossa gratidão pelo que tem feito pelo reconhecimento de Aristides de Sousa Mendes.
A urgência (a notícia/pedido chegou-me há momentos) leva-me a pedir o favor que tal pedido seja atendido tão cedo quanto possível. Fico aguardando o favor da vossa compreensão e ajuda.
Os meus respeitosos cumprimentos.
João Crisóstomo
crisostomo.joao2@gmail.com
Guiné 61/74 - P22593: Notas de leitura (1386): "Um caminho de quatro passos", de António Carvalho (2021, 219 pp.): apontamentos etnográficos para o retrato da nossa geração, de antigos combatentes - Parte III (Luís Graça): a excursão de 4 dias, a Lisboa, em 1959
Marco de Canaveses > Paredes de Viadores > Quinta de Candoz > Vindimas > 1979 > "De calças arregaçadas até ao joelho ou em cuecas, lá vão eles [, amigos, vizinhos e familiares do dono] pisando e repisando os cachos das uvas tintas até que a grainha comece a boiar no cimo do mosto. Às mulheres era interdita esta função: 'estragavam o mosto', diziam os antigos. Era um tabu que, a custo, só hoje foi esquecido e ultrapassado." (*) ...
No foto, vê-se, de perfil, ao canto direito, o dono da casa e da quinta, o José Carneiro (1911-1996), aos 68 anos. Está a servir canecas de vinho tinto aos homens do lagar que fazem uma pausa para comer uns peticos (ovos mexidos com salpicão mais aletria quente com canela...). Faria 110 anos, se fosse vivo, no passado dia 26 de setembro.
Foto (e legenda) : © Luís Graça (2005). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].
Por isso, volta aqui a reproduzir-se alguns excertos das primeiras páginas do livro (pp. 15-19), com a amável condescendência do autor, e como incentivo à sua leitura integral.
Setembro era o mês de maior azáfama, porque se juntava a colheita do milho e a vindima, não havendo um minuto de folga naqueles dias ainda grandes, mas já sem as reparadoras sestas.
As desfolhadas eram feitas também à noite, ao ar livre, com a luz do luar, se fosse dia dele, com a ajuda de algumas pessoas vizinhas, das nossas boas relações, sobretudo mulheres e raparigas bem novas que se juntavam na nossa eira, a pouco mais de cem metros de casa. Alguns, ainda crianças, à medida que o folhelho se ia juntando, adormeciam cansados, debaixo dele.
Encontrando-se a terra bem desfeita logo se começava a semeadura. Numa ponta do campo, aproveitando a sombra de alguma árvore, à minha mãe cabia sempre o trabalho de partir as batatas de semente, o que ela fazia com uma rapidez impressionante, tendo ainda o cuidado de deixar um só galeiro para cada bocado.
Naquele tempo não se usavam herbicidas, por isso logo que as primeiras ervas daninhas afloravam à superfície recorria-se ao trabalho de mulheres que vinham fazer a sacha removendo toda a vegetação nociva.
Os campos de batatas ficavam disponíveis para nova cultura , a partir de agosto, semeando-se então, nabos, em quase todos eles, no mês de setembro, logo que, na mudança do vento, se adivinhava a ocorrência das primeiras chuvadas outonais, aproveitando-se a generosa estrumação de que tinham beneficiado.
A ÁREA BRAVIA E A LAVRADIA
Nenhuma casa de lavoura podia ter grande expressão nem sustentabilidade se não tivesse uma área de terreno bravio proporcional ao terreno lavradio, onde os lavradores tinham as suas reservas de mato para as camas do gado.
E a importância dos matos, constituídos fundamentalmente por queiró, carqueja e tojo, tornou-se mesmo decisiva, quando a cultura do milho e da batata se impuseram, em detrimento da cultura do linho e dos cereais de grão miúdo, no séc. XIX, exigindo a estabulação do gado bovino para, deste modo, se obter maior quantidade de estrume.
Ora nessa área de terreno inculto, dispersa por várias parcelas a que os lavradores chamavam sortes, por terem sido distribuídas por sorteio, em número proporcional à área agricultada de cada um, não crescia só o mato, mas medravam ainda o pinheiro e o eucalipto, para além das espécies autóctones, como o carvalho, o sobreiro, o castanheiro, o salgueiro e o medronheiro, estes em progressiva redução.
Os lavradores maiores que tinham excedentes de mato, vendiam, para os fornos do Porto, alguma carqueja e queiró, mas era na venda de lenha de eucalipto e pinho que eles, anualmente, incorporavam no seu orçamento familiar, uma verba significativa.
Habitualmente era no fim do verão fim do verão que vendiam os seus pinheiros, reservando para consumo doméstico toda a ramagem que era empilhada ao lado das casas, perto da cozinha, numa meda proporcional ao número de pessoas de cada família. Eram essas rameiras, em vez das lenhas mais nobres, que se utilizavam nas lareiras de quase todas as casas, antes da chegada dos fogões a gás e a eletricidade.
A lenha das videiras que resultavam da poda, bem como os carolos do milho eram também combustíveis excelentes usados nas lareiras e nos fornos domésticos. As famílias que não tinham sortes pediam aos lavradores autorização para cortar uma rodada de ramos em cada pinheiro, carregando-os em feixes à cabeça, até suas casa.
As medas de ramos de pinho feitas todos os anos, no fim do verão, à porta de cada família, faziam também parte dos monumentos rurais da minha freguesia e das vizinhas, e pelo seu tamanho também se ajuizava da pujança da casa.
O AZEITE , O ÓLEO DOURADO
Na agricultura de auto-suficiência tudo o que fosse importante para a alimentação havia de ser produzido numa casa de lavoura.
Mas a oliveira não gosta dos ares marítimos do litoral nem dos nevoeiros, por isso dificilmente alguma casa de lavoura das Medas, por maior que fosse, produzia meia pipa de azeite [talvez cerca de 200 litros]. em anos bons, sendo que, na rigorosa gestão da nossa casa, era imperativo guardá-lo, dos anos melhores para os minguados.
Entre novembro e dezembro era a altura de se colher a azeitona nas oliveiras invariavelmente plantadas no bordo dos campos, para não ensombrarem as outras culturas. O povo dizia que eram aneiras, por isso nunca acreditava que a um ano farto pudesse suceder outro igual e tratava-as como parentes pobres da agricultura, sem grandes cuidados, deixando que as copas se desenvolvessem na vertical, sempre com o propósito de evitar que se apoderassem do solo com a sua sombra.
A colheita era quase toda feita através de escadas de pinho com passais de oliveira que os rapazes ou homens feitos escalavam, de canistrel na mão, para chegarem até onde fosse possível. Nalguns casos era mesmo imperioso varejar os ramos mais altos.
Ultimamente estendíamos, debaixo de algumas oliveiras, um panal feito de serapilheira para a recolha da azeitona que varejávamos do chão e de cima das escadas.
A azeitona colhida mais cedo e sempre à mão era para curtir em talhas de barro almudeiras, e era também nestas talhas grandes que se guardava o azeite, esse preciosíssimo óleo que era servido à mesa muito moderadamente e quase só em batatas cozidas, quando não fossem acompanhadas de carne gorda.
Na culinária a gordura que se usava mais
frequentemente era o pingue de porco, branco como a neve, guardado em pequenas talhas para o ano.
António Carvalho
(Continua)
PS - Selecão de excertos, itálicos e negritos, da responsabilidade do editor LG.
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Fonte: António Carvalho - Um Caminho de Quatro Passos. Rio Tinto: Lugar da Palavra Editora, 218 pp., ISBN: 978-989-731-187-1.O livro pode ser adquirido, ao preço de 15,00 Euros (portes incluídos, no território nacional ou estrangeiro) Contactos do autor, António Carvalho, Medas, Gondomar
Email: ascarvalho7274@gmail.com | Telemóvel: 919 401 036
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Notas do editor:
(*) Vd. postes de:3 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22593: Notas de leitura (1386): "Um caminho de quatro passos", de António Carvalho (2021, 219 pp.): apontamentos etnográficos para o retrato da nossa geração, de antigos combatentes - Parte II (Luís Graça)
Guiné 61/74 - P22592: Parabéns a você (1994): Hélder Valério de Sousa, ex-Fur Mil TRMS - STM (Piche e Bissau, 1970/72)
Nota do editor
Último poste da série de 29 DE SETEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22578: Parabéns a você (1993): António Bastos, ex-1.º Cabo At do Pel Caç Ind 953 (Cacheu, Farim, Canjambari e Jumbembem, 1964/66)
sábado, 2 de outubro de 2021
Guiné 61/74 - P22591: Os nossos seres, saberes e lazeres (470): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (18): A Família Humana, exposição no Museu do Neorrealismo até maio de 2022 (Mário Beja Santos)
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Queridos amigos,
É uma bela oportunidade para conhecer uma coleção de fotógrafos famosos e o acervo, já hoje muito expressivo, da fotografia do Museu do Neorrealismo. O curador, Jorge Calado, delineou com enorme talento um percurso onde o humanismo faz fé e toma conta do nosso olhar, foi ambicioso e ganhou, quis revelar a universalidade da experiência humana, temos aqui inclusivamente a Lisboa de outras eras, imagens de Vila Franca e da Lezíria bem entrosadas com o mundo inteiro. Ninguém sairá daqui desiludido e muito menos a duvidar de que a fotografia, câmara escura e clara, é uma inegável dimensão do que melhor pode a arte.
Um abraço do
Mário
Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (18):
A Família Humana, exposição no Museu do Neorrealismo até maio de 2022
Mário Beja Santos
O acervo de fotografia internacional no Museu do Neorrealismo já tem muito que se diga. Como escreve o curador desta exposição, Jorge Calado, a coleção “Família Humana” deste museu, conta agora com 375 fotografias de mais de 175 artistas, gente de 25 nacionalidades que fotografaram em 60 países dos 5 continentes. Ele repertoria o nome destes grandes mestres a que não faltam nomes portugueses como Carlos Relvas e Ernesto de Sousa. Devido às limitações de espaço, só é possível mostrar um terço da coleção, haverá periodicamente uma rotação das peças expostas.
A missão subjacente, continua a observar Jorge Calado, é de grande ambição: revelar a universalidade da experiência humana, à semelhança da célebre exposição de 1955 “A Família do Homem”, no Museu de Arte Moderna em Nova Iorque, que deu inclusivamente um belo livrinho, que comprei num alfarrabista que então existia na Calçada do Combro, teria eu uns 18 anos. Como o mundo encolheu, sentimos nesta deambulação fotográfica que estamos cada vez mais próximos uns dos outros, este ágape de fotografia humanista é uma grande angular, e a dita fotografia humanista que teve o seu auge nas décadas de 1930 e 1940 coincidem historicamente com movimentos e sensibilidades neorrealistas. O mesmo curador nos oferece um belo texto na folha que nos é entregue na receção:
“Somos novos e velhas mais os concebidos à espera de nascer. Somos magras e gordos; baixas e altos, morenos, ruivos e louras. A tez pode ser clara, quase branca, amarelada, rosada a virar para o avermelhado, castanha e escura até ao preto. Os olhos, azuis, garços, verdes, castanhos ou quase pretos. O cabelo varia entre o liso e o crespo e encaracolado. Os pelos mudam, e as sardas, também. Formamos todos e todas uma espécie, Homo sapiens, a Família Humana. Os cinco sentidos de comunicação, as emoções, o raciocínio – aquilo a que o povo chama o coração e a razão. O ápice glorioso da evolução”. Vamos entrar na exposição.
Diz o curador que uma exposição fotográfica forma um discurso complexo que cabe ao visitante completar e decifrar e que para facilitar a leitura, a exposição está organizada em sete secções e três núcleos, de acordo com as idades do homem e da mulher, sete como os dias da semana, as cores do arco-íris, as notas da escala musical ou os pecados mortais. Vamos contemplar facetas da religião, inevitavelmente imergir na Lezíria ribatejana, recordar como seria Lisboa durante a II Guerra Mundial. Pela itinerância, tomaremos partido sobre o que se passa pela rua, como se goza o lazer, como o trabalho é exigente e por vezes tão avassalador, como combatemos com as armas na mão. E no fim, aguarda-nos o mesmo fim, o término é igual para todos. E aqui estou, embevecido, foi o casal Roberto Rossellini, um mago do cinema, e Ingrid Bergman, uma senhora dona diva que jamais poderei esquecer. Como associamos as coisas mais estrambóticas do mundo, recordei o dia em que fui rever à Cinemateca Nacional o filme “Um Crime no Expresso do Oriente”, Albert Finney fazia de Poirot. No intervalo encontrei José-Augusto França e contei-lhe que tinha vindo ver aqueles prodigiosos seis minutos em que a Ingrid Bergman conquistou um Óscar de Atriz Secundária e ele respondeu-me que não me ficava atrás, tinha vindo rever a prodigiosa Lauren Bacall. É assim a Família Humana, Rossellini e Bergman com a filharada, pareciam bem felizes.
Aqui prefiro o anonimato, fico alheio se são católicos ou protestantes ou judeus, lembro a alegria de vermos os filhos a crescer, de lhes dar alimento, elas ou eles de perninhas tenras a alimentar-se com o nosso sorriso, é isso que me chega, o talento do fotógrafo de pôr toda a gente em movimento menos esta trindade do amor, isto me enche o coração.
A diva não precisa de apresentações, o que o fotógrafo registou e hoje caminha para a eternidade é um ambiente de bairro típico, o encontro entre a novel fadista e o guitarrista, o encontro entre a voz e as cordas, é um pátio de pedra vetusta, ou um troço de rua, o olhar daquela senhora do fado é o que mais conta, está inspirada, e a postura das mãos realça o que ela vai entoar no desassossego da sua alma naquele bairro antigo.
Foi um dos casais mais célebres da literatura universal, Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre, o que a fotografia capta é que estão unidos, provavelmente com os mesmos combates, distanciados pelo que se escreve ou lê, o que é de pouca importância, o resto é lenda, se eram solitários e mesmo infiéis um ao outro, legaram-nos obras sublimes, ainda hoje o teatro de Sartre me enche as medidas, seja As Troianas baseadas em Eurípedes, As Mãos Sujas ou As Moscas, dela prefiro o documento da despedida da mãe, mas não enjeito que tenha sido uma peça fulcral para o estudo da mulher, porque foi a ascensão da condição feminina um dos fenómenos determinantes do século XX.
O que o fotógrafo aqui explora não é a meditação de Arthur Miller, o famoso dramaturgo norte-americano, mas a cadeira vazia da superstar que curiosamente filmava argumento seu, Os Inadaptados, a superstar contracenava com um monstro sagrado, Clark Gable, que já preludiava o fim do seu próprio mito, mas há outra leitura possível para a cadeira vazia, tudo na vida do casal Miller/Marilyn acabou mal. A fotografia impressionou-me muito, peço desculpa ao leitor ter captado mal a imagem, escolhi ângulo errado, meti fotografia alheia no peito de Miller, besteira de amador.
Prefiro de novo o anonimato, é a celebração de membros de família que condescendem em sorrir, sabe-se lá em que circunstâncias, a criança não esteve para fazer pose e voltou-nos as costas e aquele menino crescido achou por bem que o tomassem a sério, tem a criança ao colo e aquela enorme mão estendida é manifesto do zelo protetor, e provavelmente afetivo. Uma grande beleza.
Algures, numa daquelas ruas bem estandardizadas num bairro popular de um rincão britânico, um fotógrafo ajeitou a perícia para nos dar a profundidade, uns laivos da identidade e aquela menina quer mostrar que é virtuosa no pino, exibe-se para crescidos e miúdos, o resto é vazio, é a perícia do pino que conta, o resto seguirá, de acordo com a rotina e as circunstâncias.
Quantas e quantas imagens mostram a mulher mortificada, neste caso toda a encenação é dúbia, ou o barco anda em bolandas no mar encapelado e ela pede a benevolência do Senhor ou também se pode dar o caso de que há para ali uma volumosa contenda e ela manifesta posição. É mistério à beira-mar, jamais saberemos se ela é vendedora de peixe ou trabalhava na indústria conserveira ou veio esperar membro da família. Ela ajeita o protesto talvez mesmo a dor, ponto final.
É a marca do trabalho duro no rosto, serão mineiros, será pó de carvão ou sílica, o céu parece ameaçador, o que me faz deter diante da fotografia é a dignidade destes olhares, como se estivessem a dizer “é para que vocês saibam a dureza do que fazemos para que nada vos falte”.
Ribatejo, sabemos o trabalho do forcado, mas fica sempre uma interrogação se ele chora ou limpa o suor, não nos dão mais pormenores sobre a lida, não saberemos se é cansaço ou tristeza, na praça ter-se-á passado algo em que naquele momento o touro não é importante, é o rosto escondido que nos intriga, ele até está vestido a preceito, o traje não andou a rojo, aconteceu algo, quem vê interprete como pode. Não são mais que os outros.
Um artista convidou Cruzeiro Seixas, quase centenário, a tocar em Deus, crucificado num cabide, desde que Marcel Duchamp deu outra vida aos objetos não há artista, mesmo surrealista, que não se sinta tentado a profanar o sagrado. É como se Cruzeiro Seixas pusesse Deus à nossa consideração, só ele pode manietar o gancho do cabide, dá-nos a ilusão de uma oferta personalizada. Aqui me quedei um bom tempo a saudar o fotógrafo e um grande artista que já partiu.
Não conhecia esta fotografia de Uliano Lucas, ele terá seguramente querido reter não o líder em si mas o pensador africano, é um olhar que se estende ao infinito, há aquele braço que ajuda a meditar, o espaço é completamente nu, só o construtor de países é que conta.
Agora o leitor que se afoite, a exposição está à sua mercê até ao próximo ano, é uma boa ocasião para ir conhecer esta espantosa coleção de fotografia internacional, de sabor neorrealista mas não só.
(continua)
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Nota do editor
Último poste da série de 25 DE SETEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22571: Os nossos seres, saberes e lazeres (469): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (10) (Mário Beja Santos)
Guiné 61/74 - P22590: (Ex)citações (394): Em cerca de 600 militares do Batalhão de Comandos da Guiné, 200 estiveram inscritos numa lista para seguir para a metrópole, com as respetivas famílias, confirma o último 2º comandante e comandante (jun/out 1974), ex-cap art 'comando' Glória Alves, de "uma das mais nobres e heróicas unidades militares portuguesas", em depoimento público de 2007, aqui transcrito (Cor art ref Morais da Silva)
Em 13 de Junho de 1974 desembarquei no aeroporto de Bissalanca, em Bissau, nomeado 2º comandante do Batalhão de Comandos da Guiné (B.Cmds/G.), que se encontrava em Brá. Acompanhava o comandante nomeado para a mesma Unidade, Major Florindo Morais.
Após a apresentação, passei a ocupar-me das funções que normalmente cabem a um 2º comandante, que eu desempenhava com o posto de capitão – administração e logística, instalação, cargas, material de guerra e de aquartelamento, etc.
Entretanto regressaram a Portugal as duas companhias de comandos do recrutamento metropolitano que lá se encontravam, o que deixou o comandante do batalhão sozinho no comando das três companhias de comandos africanos, a 1ª,a 2ª e a 3ª.
Em determinada altura recebi ordens do comando para fazer uma lista do pessoal do B.Cmds/G., que estivesse interessado em ir para a Metrópole e continuar a prestar serviço no Exército Português. As condições propostas eram as seguintes: podiam fazer-se acompanhar das respectivas famílias (alguns, muçulmanos tinham mais do que uma mulher) e seriam reintegrados no actual posto (o que no caso dos soldados era equivalente ao de cabo readmitido).
Os que permaneceram na Guiné e optaram por integrar o novo País teriam que se adaptar ao trabalho normal na sociedade civil, com direito ao pagamento dos seus vencimentos até ao final de 1974.
Paralelamente a estas actividades de desmobilização e na sua consequência, teria que ser entregue todo o armamento orgânico pertencente ao Exército Português e que se encontrava distribuído ao B.Cmds/G. Estas instruções foram, como as restantes, determinadas pelo comando legítimo, comunicadas pela cadeia hierárquica do batalhão e cumpridas na íntegra pelos militares que o constituíam.
Ainda na sequência da desmobilização do B.Cmds/G., fui nomeado presidente da Comissão Liquidatária (CL) e passei a movimentar-me entre o quartel e o Quartel-General (QG), com vista à regularização dos vários processos de carácter administrativo-logístico, que foram sendo resolvidos e arquivados, como certamente constará da documentação, entregue pela CL no BC5, em 1975.
Das diligências para providenciar transporte a quem queria ir para a Metrópole, interessa referir que, dos 200 nomes de militares interessados em fazê-lo, e que perante mim se inscreveram, fui sendo contactado individualmente no meu gabinete do Quartel por cada um dos inscritos, no sentido de riscar o seu nome, porque tinham decidido ficar. Isto até ao riscar do último nome.
Para terminar, e embora não tenha anteriormente prestado serviço nesta Unidade, nem na Guiné, visto que fiz duas comissões nos “Comandos” de Moçambique, como alferes/tenente (4ªCCmds) e capitão (3ªCCmds / Moçambique), é justo referir que com o Batalhão de Comandos da Guiné se extinguiu uma das mais nobres e heróicas unidades militares portuguesas.
Por lapso, não chegou aa ser citada peli Prof Morais da Silva a fonte, que presumimos seja a mesma do texto do poste P22588 (*):
Título: Pronunciamento Militar do 25 de Abril de 1974
Sub Título: V Conferência do Núcleo Impulsionador das Conferências da Cooperativa Militar (NICCM)
Editor: NICCM
Coordenação e Revisão: Coronel António Carlos Morais da Silva | Transcrição de texto e Imagens: Ana Teresa Oliveira Marques | Design da capa: Coronel Sérgio Parreira de Campos
Impressão e Acabamento: ACD PRINT, S.A. Tiragem: 300 ex.
Depósito Legal: 375023/14 ISBN: 978-989-20-4761-4
Guiné 61/74 - P22589: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (16): Mais algumas fotos dos meus passeios: Bolama, junho de 2021
Foto nº 8 > Guiné-Bissau > Bolama > Junho de 2021 > Escola Superior de Educação (ESE), Unidade de Ensino Amílcar Cabral
![](https://mail.google.com/mail/u/0/images/cleardot.gif)
Assunto - Fotos de Bolama, junho 2021
Luís, envio mais algumas fotos, dos meus passeios.
Bolama, junho de 2021
Numa noite, no final de junho 21, em que a lua estava muito ativa, era a maior lua do ano, tirei esta foto ao Presidente Ulisses. (Foto nº 1).
A estátua tinha voltado para cima do pedestal “e com a sua cabeça” (Foto nº 2). Fiquei surpreendido…
O busto esteve deitado durante décadas no quintal da casa do governador (perto da estátua
dos aviadores Italianos) e de lá desapareceu a cabeça. O seu desaparecimento, originou diversos problemas a algumas pessoas.
Esta questão foi muito comentada em Bolama e Bissau, no meio da comunidade portuguesa (Na última foto que tinha eu enviado de Bolama para o blog, não havia estátua, só o pedestal).
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A estátua em 1964. Cortesia do blogue Bolama Minha Terra e do ACTD - Arquivo Científico Tropical Digiatl |
Junto mais algumas fotos, do que era a Bela Bolama. Por onde alguns, os últimos os amantes do Império se passearam, criando emprego aos antigos subordinados, até ao fim das sua vidas. Eram os “doidos do império” (Angoche, Carlos Vaz Marques)
Como podem ver nas fotos do Palácio (Camara Municipal), já só restam as colunas, os morcegos, perderam a casa grande. Junto foto (Fotos nº 5 e 6).
Saímos de Bissau de bote para Bolama de Baixo, foram 3,5 h de viagem, mesmo com os fatos para a chuva, tomamos banho de água salgada, chegamos à bonita praia que também é o porto (Foto nº 12). Depois seguimos de viatura até à cidade, pelo meio dos cajueiros.
A Ilha de Bolama transformou-se num grande produtor de caju. Teve influência a instalação da fábrica de descasque de caju, que o Comandante Alpoim Galvão instalou na ilha, a partir da qual exportava para todo o mundo o caju já descascado e biológico, em vácuo. Era transportado em canoas, até Bissau.
Fotos do porto de Bolama, por onde saíram milhares de toneladas de caju, que era transportado em canoas para Bissau. Este ano a Guiné, já exportou 200.000 toneladas.
Atualmente não há barco de carreira para Bolama, só para Enchudé, depois há que apanhar um camião e muito pó, até S. João, e dali a travessia é feita de bote de madeira, para Bolama.
No regresso a Bissau, mais uma vez na canoa de transporte, 2,5h, pelo canal da Coroa de Bolama, que fica seco, com a maré baixa.
Fotos para recordar, a quem por aqui andou há 50 Anos.
Abraço,
Patrício Ribeiro
impar_bissau@hotmail.com
Notas do editor:
(*) Último poste da série > 16 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21456: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (15): Obrigado a todos pelos parabéns que me deram no meu aniversário... Estou cá pelo "Puto", na minha "ponta" nas margens do Vouga, em Águeda, em "teletrabalho"
(**) Vd. poste de 1 de agosto de 2018 > Guiné 61/74 - P18886: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (9): Bolama e a Fonte Nova de São João (1945)