quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15213: Álbum fotográfico de Jaime Machado (ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2046, Bambadinca, 1968/70) - Parte XV: fotos de despedida, em fevereiro de 1970, com as beldades locais


Foto nº 1


Foto nº 1 A 



Foto nº 1 B


Foto nº 1 C


Foto nº 2


 Foto nº 2 A 


Foto nº 2 B


Foto nº 2 C




Foto nº 3


Foto nº 3 A


Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > BCAÇ 2852 (1968/70) > Pel Rec Daimler 2046 (1968/1970) >   Fevereiro de 1970 > "Eu com um belo conjunto de bajudas junto à capela"...Não, não é foto de despedida, embora dias mais tarde, finda a comissão, em fevereiro de 1970, o Pel Rec Daimler 2046, comandado pelo Jaime Machado, partisse  para Bissau donde regressaria à metrópole, no T/T Niassa, em abril de 1970.

Fotos (e legenda): © Jaime Machado (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]



1. Continuação da publicação do belíssimo álbum fotográfico do Jaime Machado, ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2046 (Bambadinca, maio de 1968 / fevereiro de 1970, ao tempo dos BART 1904 e BCAÇ 2852) (*).




[foto atual à direita; o Jaime Machado reside em Senhora da Hora, Matosinhos; sua avó paterna era moçambicana; mantém com a Guiné-Bissau uma forte relação afetiva e de solidariedade, através do Lions Clube; voltou à Guine-Bissau em 2010]



2. Comentário do editor:

Ao tempo do BART 2917 (1970/72), que o Jaime já não conheceu, havia só no regulado de Badora (que incluía, Bambadinca, o principal núcleo populacional com c. de 1500 habitantes), uma população total (recenseada e controlada pelas NT) de c. de 12 mil, metade dos quais de etnia fula.

Os restantes eram mandingas (20%), balantas (20%) e outros (10%), onde se incluíam mansoanques, manjacos e alguns caboverdianos e metropolitanos, cristãos.

No conjunto  do setor L1 (que incluia ainda os regulados do Xime, Corubal, Enxalé e Cuor), o total da população sob o nosso controlo não ia além dos 15200. Segundo a  mesma fonte (a história do BART 2917), a população sob controlo do IN, andaria à volta das "5400 pessoas, na sua maioria de etnia Balanta, Beafada ou Mandinga" (nos regulados do Corubal, Xime, Enxalé e Cuor).

Perguntei ao Jaime Machado o que é que estas beldades, bem arranjadas, "bem produzidas" (como se diz no norte),  fariam aqui, junto à capela de Bambadinca,  em fevereiro de 1970 ? Era dia de festa ?  Era domingo ? Seriam cristãs ? Seriam mandingas ?

Apesar da sua "memória de elefante", o Jaime confessou que não se recorda de mais pormenores: não, elas não vieram despedir-se do "alfero", nenhum delas era sua conhecida, estavam em grupo, por ali, junto à capela (que ficava em frente ao edifíico de comando, quartos e messes de oficiais e sargentos) e o fotógrafo, oportuno, zás!, tirou-lhes uma chapa...

O outro militar que aparece no grupo  (fotos nº 2, 2 A, 2 B) pertencia à CCS/BCAÇ 2852 e não ao Pel Rec Daimler 2046... O Jaime admite que elas fossem cristãs, estavam com ar domimngueiro, bem vestidas e calçadas. (De facto, não há nenhuma descalça...).

Quanto a mim, seriam mandingas, a avaliar pelas feições, pelo vestuário e pelos adornos... Embora houvesse de facto uma pequena comunidade cristã em Bambadinca, não vejo crucifixos ao peito, mas sim colares, e numa delas com um amuleto (talvez em prata, uma figa, que é de origem europeia,  etrusca e romana, e não africana, estando associada originalmente ao erotismo e à fertiliddae, e hoje à proteção contra o mau olhado) (foto nº 2 B)... Mas,  vendo bem, a bajuda do lado direito, na foto nº 2 C, parece trazer ao peito um colar com um crucifixo... E a do lado esquerdo, traz um medalhinha...  a do meio usa sutião ("corpinho"), o que é um hábito ocidental... Se calhar, neste grupo todas já usavam "corpinho"...

Por outro lado, a porta da capela está fechada... Fica a dúvida: seriam bajudas cristãs ouu mandingas, islamizadas ? Um certeza: para estas lindas, amorosas, bajudas, era um "dia de ronco", talvez elas fossem, frescas, alegres e divertidas,  para algum casamento, ali em Bambadinca ou em Bambadincazinho.  (LG)



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > Crianças cristãs, em dia de primeira comunhão, ao tempo da CCS/BCAÇ 2952 (1968/70). Foto do álbum do ex-fur mil rebastecimentos José Carlos Lopes, nosso grã-tabanqueiro nº 604.

Foto: © José Carlos Lopes (2013). Todos os direitos reservados. (Edição: L.G.)

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Guiné 63/74 - P15212: Os nossos seres, saberes e lazeres (118): Entre Antuérpia e as Ardenas, e algo mais (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Setembro de 2015:

Queridos amigos,
O pretexto era uma estadia folgada em Antuérpia, mas ao chegar e o regressar, o viandante não gosta de tempos mortos e tem gente muito afável e que o estima por aquelas paragens.
Este é o relatório do primeiro dia, a partir da chegada à Portela, nem sete da manhã eram. O dia rendeu, foi um verdadeiro regresso ao local do crime, o tempo ajudou, amanhã já não será assim. Não escondo o fascínio que estes lugares me provocam, por alguma coisa eram conhecidos pelo nome de Países Baixos Meridionais. Estava excitado, há um ror de tempo que não visitava Antuérpia e mal conhecia as Ardenas, suspirava por conhecer aquela floresta que foi palco da última grande batalha ocidental da II Guerra Mundial.

Um abraço do
Mário


Entre Antuérpia e as Ardenas, e algo mais (1)

Beja Santos

Volto ao local do crime, Bruxelas, mesmo que o mesmo destino principal seja Antuérpia. Viajei no primeiro voo da manhã, um grande amigo vai-me buscar a Zavantem, o aeroporto, poucos dão por isso mas está em território flamengo. Quinze minutos depois, em linha reta, chego a Watermael-Boitsfort, a minha guarida. Despachei uma sopa e um pão, aparentemente está um dia radioso, temperatura suave, é uma questão de apanhar o metro, atiro-me para o centro da cidade. Ando com saudades de entrar na igreja de S. Nicolau, a poucos metros da Grand-Place, deve a sua imponência ao facto do Santo ser o padroeiro de padeiros, comerciantes e navegantes. É um tempo que entusiasma pois tem adossado às paredes laterais edifícios civis, hoje é uma igreja barroca, toda aquela pompa me deixa indiferente mas há detalhes de uma forte atração. Logo o esplendoroso relicário dos mártires de Gorkum, tem a ver com as guerras entre católicos e protestantes, é um trabalho assombroso. Como se contempla com ternura a imagem de Nossa Senhora da Paz, que vem do século XVI, o quadro atribuído a Rubens, a Virgem com o Menino Jesus, e deixo para o fim o Cristo Espanhol do século XVI.






Finda a visita a este edifício que vem dos séculos XI e XII, que foi severamente destruído pelos canhões do marechal de Villeroy, a mandado de Luís XIV, em 1695, atiro-me para os bulevares, estou esfaimado por ver livros. Por aqui andei, vi títulos sobre África a rodos, as edições que vendem prende-se sobretudo com o Norte de África, mas deixei de me deliciar uma obra espantosa sobre a arte dos Nalus e dos Bagas, já da Guiné-Conacri, mas com imensas semelhanças à arte genial que podemos visitar no Museu Nacional da Etnologia ou na Sociedade de Geografia de Lisboa. É apaziguador ver um dos focos mais criativos da arte africana admirado sem reservas.


Faço inversão de marcha, é altura de uma confidência. Nos primeiros anos em que calcorreei Bruxelas, fiquei num hotel baratucho que tinha um nome ofuscante, George V. Passava obrigatoriamente por um espaço que me intrigava, belo mas fechado. Anos depois abriu, fui logo lá espreitar. Chama-se os Halles de Saint Géry, era o antigo mercado do peixe no centro de Bruxelas. Criaram ali um espaço de lazer, a autarquia abriu serviços relacionados com a preservação ambiental e a proteção do património, e há exposições. Vejam um caso de sucesso na reabilitação de um mercado que parecia sem préstimo.



Não, esta imagem não é para encher, é para tentar dizer aos leitores que é relativamente fácil ver numa quase amálgama quatro estilos arquitetónicos distintos nesta cidade que já foi esplendorosa, em 1900 a Bélgica era a quinta potência industrial mundial e a fortuna do rei Leopoldo, o proprietário do Congo, era tão desmesurada que deu para imitar Paris. Punha-se pois o imperativo de adaptar, fazer novo junto do velho. E o resultado nem sempre é feliz.




Estava patente uma exposição de fotografia artística, procurei abocanhar tudo, está por aqui muita investigação, muita apuro técnico, para mim é uma fotografia que se aproxima do grafismo da banda desenhada, talvez quem estude publicidade e desenho não concorde comigo, mas que me fascina, fascina.





Aproveito a boa luz do fim de tarde para cirandar à volta dos grandes bulevares, o meu último trabalho de turista até regressar a casa é vascular num espaço familiar, a livraria Pêle-Mêle (significa desordem, bagunça), a ver se encontro livros e cds apetitosos, pelo caminho depara-se-me esta esplêndida porta, depois um prédio ferro-de-engomar, logo a seguir um falso gótico (é do século XIX, ainda do tempo de grande religiosidade) da Igreja de Santa Catarina e esta torre ficou-me no goto, será vestígio de uma igreja destruída durante a I Guerra Mundial? Seja o que for, tem muita beleza. Agora vou trabalhar à volta do papel e da música que me leva às estrelas. A viagem prossegue amanhã.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 30 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15179: Os nossos seres, saberes e lazeres (117): Un viaggio nel sud Italia (8): Roma, addio

Guiné 63/74 - P15211: O nosso querido mês de férias (17): Vim a casa uma vez, em agosto de 1965, na TAP, num Super Constellation, como simples passageiro... e estava longe de imaginar que cinco anos depois estaria aos comandos de um Caravelle, como piloto da mesma, saudosa, companhia... (João Sacôto, ex-alf mil, CCAÇ 617 / BCAÇ 619, Catió, Ilha do Como e Cachil, 1964/66)


O João Sacôto, em 1965, vinha de Catió para fazer férias de verão na metrópole. Embarcou em Bissau num Super Constellation L1049. Muito longe de imaginar que, em 1970, viria a pertencer aos quadros da TAP como Piloto de Linha Aérea.

Fotos: © João Sacôto (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]


1. Mensagem de ontem do João Gabriel Sacôto Martins Fernandes [, ex-alf mil da CCAÇ 617 / BCAÇ 619 (Catió, Ilha do Como e Cachil, 1964/66): comandante da TAP, reformado]

Assunto - O meu querido mês de férias

Vim de férias à Metropole uma vez, no verão de 1965. Coincidiu com uma carga de paludismo intensa, mas, com tudo já planeado há meses, e a ansiedade de umas férias com a família (meus pais, mulher e filha com 3 anos) não quis alterar nada. 

Embarquei em Bissau num Super Constellation L1049 da TAP.

Nessa altura estava bem longe de imaginar que, mais tarde, em 1970, viria a pertencer aos quadros da empresa com a profissão de Piloto de Linha Aérea. Já não voei o Super Constellation L1049 mas antes o saudoso Caravelle da Sud Aviation, o Boeing 707, o Lokeed Treestar, o Boeing 737 e finalmente o Airbus 310.

Durante a viagem para Lisboa ia causando, involuntariamente, um incêndio a bordo. Após a refeição e, como na altura fumava viciadamente e era permitido fumar a bordo, ainda antes de me tirarem da frente o tabuleiro da refeição, que, na altura era encaixado nos braços da cadeira, acendi o meu cigarro que devido ao meu estado palúdico, me soube tão mal, que logo o quis apagar. O facto de o cinzeiro se encontrar implantado no braço da cadeira, portanto de difícil acesso devido à colocação do tabuleiro da refeição e provavelmente, também aos meus tremores, a beata acabou por se introduzir entre o braço da cadeira e a antepara do avião.

Apesar dos meus esforços para o recuperar, isso não me foi possível e a solução foi chamar uma hospedeira, mais tarde designada por assistente de bordo, que, munida de uma cafeteira, despejou alguma água no sítio para onde tinha caído a ponta do cigarro. 

Chegado a Lisboa, matei as saudades e curei o paludismo assim como uma anemia que se associou ao meu estado de saúde. Passado um mês, acabaram as férias e regressei à Guiné e à minha unidade em Catió a CCaç 617.

Sobre a TAP e sua História, posso acrescentar que em 1974 e, após a nacionalização, a Companhia entrou numa recessão, que durou cerca de dez anos.

Foram vendidos à PIA (Pakistan International Airway) os 3 Boeing 747 e o pessoal deixou de receber os tão apreciados dividendos no fim de cada ano (foram, para não mais voltar).
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Nota do editor:

Último poste da série 6 de outubro de 2015 > Guiné 63/73 - P15209: O nosso querido mês de férias (16): Férias em Bissau para tirar a carta de condução de pesados (Abel Santos)

Guiné 63/74 - P15210: Parabéns a você (970): Jorge Rosales, ex-Alf Mil Inf da 1.ª CCAÇ (Guiné, 1964/66)

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Nota do editor:

Último poste da série: 4 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15196: Parabéns a você (969): Artur Conceição, ex-Soldado TRMS da CART 730 (Guiné, 1965/67) e Inácio Silva, ex-1.º Cabo Ap AP da CART 2732 (Guiné, 1970/72)

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Guiné 63/73 - P15209: O nosso querido mês de férias (16): Férias em Bissau para tirar a carta de condução de pesados (Abel Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), com data de 3 de Outubro de 2015:

Camaradas,
Aí vai o meu contributo para a temática férias durante o serviço militar.

Eu também gozei férias, mas na Guiné, duas vezes, já que os meus pais naquela altura não tinham posses para que o seu filho viajasse para a Metrópole e vice-versa, para usufruir de um merecido descanso.

As primeiras foram gozadas no mês de Março de 1968, a primeira semana em Nova Lamego, que me deu a oportunidade de apreciar a azáfama dos meus camaradas do Batalhão ao qual a minha companhia estava adstrita, vendo entrar e sair viaturas em constante movimento, pessoas se cruzavam na sua luta diária pela sobrevivência e, que ainda não me tinha apercebido de tal facto.

Parti de Nova Lamego à boleia numa coluna militar rumo a Bambadinca, local onde embarquei numa LDG rumo a Bissau, destino dos meus restantes dias de férias, que aproveitei ao máximo.

Aquando da minha apresentação no quartel dos Adidos, aconteceu um caso caricato, o oficial de dia ainda sem ler a documentação de que era portador, escalou-me logo para fazer serviço, tendo eu, perante tal situação, chamado atenção do senhor Alferes para o facto de eu estar ali em gozo de férias e não para qualquer atividade militar. Lendo então os documentos que lhe apresentei e, eis a exclamação do homem: ainda sou periquito - o que há socapa deu para rir.


Nesta foto, Abel Santos à esquerda

A segunda vez que gozei férias na Guiné, (a 1742 já se encontrava em Buruntuma) juntei o útil ao agradável, mas desta vez fiquei hospedado numa residencial junto das instalações da PIDE, foi entre Janeiro e Fevereiro de 1969. Viajei para Bissau num avião Dakota ido de Nova Lamego, no qual apanhei alguns sustos, principalmente quando sobrevoávamos a zona de Farim, devido aos poços de ar, ainda hoje me recordo dos estalidos na carlinga, que mais parecia parafusos a partirem-se, foi a primeira vez que voei e fiquei a gostar, já que no dia do meu batismo de voo o medo inicial logo se dissipou.

Férias propriamente não gozei, a minha missão era outra, tirar a carta de condução de pesados profissional, que obtive com distinção. Fui instruendo na Escola de Condução S. Cristóvão que ficava junto ao estádio de futebol. Fiz exame no dia 07 de Fevereiro de 1969 e durante o exame de mecânica fui massacrado, pelo engenheiro examinador, com perguntas sobre o tema. E porquê? Porque um cavalheiro de cor, que estava perfilado antes de mim, a poucas ou nenhumas perguntas respondeu acertadamente. Tive de responder por ele e por mim, mas lá consegui o que pretendia.

Foi um dia especial para mim, que hoje recordo com satisfação e orgulho, pois éramos 12 instruendos e só 3 passámos em todas as provas.

A tarde foi passada com grande euforia por todos nós, juntamente com o instrutor, e com a tal bazuca (cerveja) presente, acompanhando o marisco e não só.

E assim passei os meus dias de férias a que tive direito.
Para todos os camaradas da tabanca e não só, aquele abraço.

Abel Santos
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Nota do editor

Último poste da série de 6 de Outubro de 2015 > Guiné 63/73 - P15205: O nosso querido mês de férias (15): em agosto de 1971, entre a praia da Nazaré e as tertúlias de Vila Franca de Xira... enquanto em Lisboa, tudo na mesma, isto é, a vida corria... (Hélder Sousa)

Guiné 63/74 - P15208: Efemérides (199): Dia do Combatente do Concelho de Gondomar, 11 de Outubro de 2015. Início das Cerimónias às 10h00 com exposição de material militar (Carlos Silva)

 

1. Em mensagem de hoje, 6 de Outubro de 2015, o nosso camarada Carlos Silva (ex-Fur Mil Inf CCAÇ 2548/BCAÇ 2879, Jumbembem, 1969/71) pede para anunciarmos O Dia do Combatente do Concelho de Gondomar, com homenagem aos combatentes daquele Concelho caídos em combate, a levar a efeito no próximo Sábado 11 de Outubro.




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Nota do editor

Último poste da série de 18 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15125: Efemérides (198): Descerramento de uma placa de homenagem aos Combatentes caídos em Campanha na Guerra do Ultramar, a levar a efeito no dia 10 de Outubro de 2015, no Cemitério de Guifões-Matosinhos (Albano Costa)

Guiné 63/74 - P15207: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (23): De 27 de Outubro a 12 de Novembro de 1973

1. Em mensagem do dia 3 de Outubro de 2015, o nosso camarada António Murta, ex-Alf Mil Inf.ª Minas e Armadilhas da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74), enviou-nos a 23.ª página do seu Caderno de Memórias.


CADERNO DE MEMÓRIAS
A. MURTA – GUINÉ, 1973-74

23 - De 27 de Outubro a 12 de Novembro de 1973

Da História da Unidade do BCAÇ 4513:

(...)

OUT73/27Iniciaram-se os trabalhos de Engenharia na estrada A. FORMOSA-BUBA, frente de A. FORMOSA. [Sublinhados meus]

- Efectuou-se uma coluna a BUBA e outra ao R. CORUBAL para trazer população com vista ao acto eleitoral do dia 28 e festas do RAMADAN.

OUT73/28 – Processou-se o acto eleitoral e iniciaram-se as festas do RAMADAN, que trouxeram a A. FORMOSA muita população de BUBA, NHALA e SALTINHO.

OUT73/29 – Pelas 1800 horas apresentaram-se em A. FORMOSA 3 elementos de população, naturais da REP GUINÉ, um homem, uma rapariga e um rapaz. - Realizou-se mais uma coluna a BUBA para transportar de regresso as populações que se deslocaram a A. FORMOSA.

OUT73/30 – Esteve em A. FORMOSA o Exmº Comandante do CAOP-1, regressou a BISSAU mesmo dia. - Iniciaram-se os trabalhos de Engenharia da estrada A. FORMOSA-BUBA, frente de BUBA.

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Das minhas memórias:

Novembro de 1973: as primeiras férias

As férias de quem está na guerra não são como as outras. Pode descansar-se o corpo, repor-se o sono, disciplinar o metabolismo e, mais importante, encher a alma com as atenções daqueles que mais amamos. Mas, no fim, o doloroso regresso ensombra todas as coisas boas recém-adquiridas. Pelo menos no meu caso foi assim. Se a minha guerra tivesse sido a do Vietname, que não sendo pior nem melhor que a minha, pelo menos dava a benesse aos soldados de, com alguma regularidade, irem a Saigão desanuviar nas bebedeiras e na pele macia das vietnamitas. Com esse desanuviar eu poupar-me-ia a um doloroso regresso não fazendo estas férias. Mas quase nove meses de saudades, no caldo das agruras e do isolamento no mato, foram mais fortes que a razão. Melhor fora que tivesse ido até Bolama, por exemplo. Mas não fui. Por isso, ao princípio, senti a euforia e a impaciência dos preparativos como qualquer outro. Era a excitação de uma pessoa normal.

Quando levantei voo de Buba com destino a Bissau, essa excitação teve um pico alto, associada a uma sensação de libertação de efeitos quase sedativos. Mas o arrastar dos dias em Bissau até ao embarque, quatro dias, quase mataram a minha excitação e, quando embarquei, foi sem grande entusiasmo e com muitas dúvidas de que estava a fazer as coisas certas. Fora demasiado tempo para reflectir. Fora demasiado tempo a deambular naquela cidade estranha e egocêntrica que, ora se agita com efervescência, ora se arrasta com sonolência; onde até as crianças vivem de expedientes, esquecidas no último escalão da sociedade; onde a vasta tropa em trânsito extravasa tensões acumuladas e maluqueiras que já eram deles, num sentimento de quase impunidade, (nisso era parecida com Saigão); onde são reis e senhores os grandes comerciantes, os funcionários e os militares residentes. Não que tivesse razões de queixa destas gentes, mas fizeram-me sentir deslocado no seu seio. Se isto que digo não era bem assim, não deve andar longe da realidade mas, quatro dias em Bissau, excessivos para mim, talvez não fossem suficientes para ver mais fundo, concedo, mas foram excessivos – dolorosamente excessivos, para a minha resiliência. Como grata lembrança ficaram-me as ostras e a cerveja, mais as fragrâncias da avenida à noite, dissolvidas no ar morno dos trópicos, quando, solitário e finalmente em sossego, por aí descia até ao cais. Ainda sinto nostalgia.

Recuando um pouco no tempo para datar a partida: Nhala, 2 de Novembro de 1973 (sexta-feira), em carta para a Metrópole, “(...) daqui a cinco dias sigo para Buba onde tomarei uma avioneta que fretei com os camaradas de lá que também vão de férias. De Bissau devo partir, como já disse, no dia 13”.

Afinal, partiria de Buba às 9 horas do dia 9 de Novembro (sexta-feira). De Bissau, como previsto, parti ao fim da tarde do dia 13 (terça-feira). Não recordo detalhes do embarque, tão pouco da viagem mas, a chegada ficou gravada para sempre. Pouco antes, ouviu-se a mensagem que a todos deixou em polvorosa: “Atenção senhores passageiros: acabamos de passar a costa algarvia. Agradecemos que apaguem os vossos cigarros [!!!] e apertem os cintos. Dentro de momentos aterraremos no Aeroporto Internacional de Lisboa. A temperatura neste momento em Lisboa é de 9 graus. Obrigado.”

E depois surge o Tejo e a cidade espraiada junto dele, melancólica, sonolenta e escura, apesar dos milhares de pontinhos luminosos que se distinguiam lá de cima. Lisboa, finalmente, passados quase 9 meses. Lisboa, tantas vezes cantada no mato por tantos que nem sequer a conheciam, mas que a cantavam como o objecto da saudade da Mãe Pátria, “Cheira bem, cheira a Lisboa...”. Era quase meia-noite.

Não guardo grandes memórias destas férias de Inverno, tirando uma ida à Serra da Estrela com a namorada e família, para meu desconsolo, porque não gosto de neve nem de frio. De resto, visitas a familiares e alguns amigos, sempre com o desconforto das conversas “como é que está a guerra lá Guiné?”, mas logo patenteando um desinteresse enfadado, ou arrependimento da pergunta, mal começava a resposta... Dos amigos, alguns preferia nem ver, devido a lembranças do primeiro embarque, (Lisboa, 16-03-1973), coisas assim do género: “Vens despedir-te para ir para aquela guerra? Tu? Não acredito! E o que é isso aí nos ombros? Oficial? Ainda por cima vais como oficial? Não te estou a reconhecer, Murta! Pois não, não estás a reconhecer-me, porque se eu tivesse um papá rico como o teu, também estaria aqui no conforto de Lisboa na faculdade e, quando ela acabasse, punha-me nas putas para Paris, Berna, Londres ou o caraças, era só dizer ao papá para onde queria ir e ele punha-me lá de malas, bagagem e com a coerência impoluta, estás a perceber? Porque a coerência não está ao alcance de todos, tal como o popó, a faculdade e o fato de marca, estás a perceber, revolucionário de merda?”

Com a aproximação da data do regresso, a ansiedade foi-se avolumando, os semblantes ensombrando, à frente da minha mãe fingia que estava tudo bem comigo, fingia que não percebia a angústia dela. Mas, ambos sabíamos, irmos reabrir uma ferida que nunca fechara completamente. A favor, só o facto de eu ter regressado a casa como prometera. — Eu não te dizia, mãe, que não me aconteceria nada e que regressaria rijo como um pêro? — tentava eu animá-la, e fazendo-lhe crer que desta vez iria ser da mesma maneira. Sonhasse ela que por mais de uma vez podia ter ficado impedido de cumprir a promessa...

A despedida de Lisboa foi péssima. Noite de muita chuva, grande confusão no aeroporto e mau serviço, subida a um céu carregado de água e ventania. Logo após a passagem do Tejo, sentimos uma sacudidela que deixou todos estarrecidos e o pior estava para vir. Com insistentes apelos a que não se desapertassem os cintos, voámos aos safanões quase até ao Algarve, as asas do avião vibrando como se fossem papel de alumínio. Os deuses estavam contra nós mas, aos poucos, entrámos no limbo e quase todos adormecemos.

Já disse noutra ocasião, e não é novidade para ninguém porque a maioria dos que vieram de férias passaram pela mesma experiência: o difícil deste regresso era sabermos, com realismo, ao que íamos. A fantasia de conhecer África com as suas idílicas paisagens mais as suas gentes e os bichos tão diferentes e variados, enfim, nada disso fazia já parte do nosso imaginário no regresso de férias. O nosso pensamento estava na guerra. Todavia, todo o encanto africano se mantinha lá mesmo antes de virmos de férias, mas poucos ainda o viam.

Daí que, ainda no ar, ao sobrevoar o arquipélago de Cabo Verde e, ao sentir de novo a pele a humedecer-se (dentro do avião, sim) e o rosto a ficar como que gorduroso, pensasse que me ia afundar na angústia. Era aquele clima de novo e a guerra outra vez. Pior, só quando se abriu a porta do avião, já em chão da Guiné, e senti aquele bafo quente e húmido bater-me na cara. Senti-me fragilizado e sem ânimo, quase em estado de choque. A hospedeira arredou-se e eu desci as escadas como um autómato. E assim deambulei dois dias por Bissau até ao regresso a Nhala. A agravar tudo, as notícias a circular em Bissau eram as mais desanimadoras: perspectivas de endurecimento da luta do PAIGC; a cidade de Bissau ia ser atacada no Natal por aviões que o PAIGC já possui... Passei pelo QG, pela messe de oficiais, pelo Pelicano e outras repartições, sempre sem ânimo e, quase sempre, incomodado com o ânimo dos outros, os seus excessos e bebedeiras (detesto bêbados!). Não procurei companhias e só por acaso elas se chegaram, à roda de uma ou outra mesa, bem guarnecida de ostras e muita cerveja.

Certa vez, na esplanada da 5.ª REP, reconheci um ex-camarada de Mafra integrado num grupo muito agitado. Levantei-me e fui cumprimentá-lo, indagando da zona em que estava e de como era por lá. Sem grandes atenções, mais concentrado nas parvoeiras dos outros, foi-me dizendo que estava no leste e que, pior que aquilo, só o Inferno. Estava por tudo e estava-se cagando em tudo, dizia ele, já sem sequer estar a falar para mim. Virei-lhe as costas e fui-me sentar na minha mesa. Num instante, sem perceber como, ouço impropérios, cadeiras pelo ar e viro-me para o grupo que, feroz, parecia disposto a não deixar pedra sobre pedra. Levantei-me e berrei para o que estava mais próximo: — Não tarda, têm aí a PM em cima de vocês! — Que se f... a PM! Muita sorte era levarem-nos a todos presos! — Saí dali rapidamente, não me querendo misturar em embrulhadas. E, se conto isto, é só para se ter uma ideia do estado de espírito daquela onda de tropas que estava sempre em trânsito por Bissau. Em finais de 1973.

Embarco finalmente num Nord Atlas, com destino a Aldeia Formosa e já com ânsias de chegar a “casa”, farto de dois dias de Bissau. Para meu espanto, o aparelho, ronceiro e a gingar, levantou de Bissalanca em espiral até ganhar altitude como se estivesse no mato... Foi também em espiral que desceu em A. Formosa, mas isso já era assim há muito tempo. Estávamos a 21 de Dezembro de 1973 (sexta-feira). No dia seguinte saí cedo para Nhala e recordo que me senti bem ao chegar, farto de férias e de boémia forçada.

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Na minha ausência de Nhala, muitas coisas ocorreram no Sector, de que darei conta mais à frente em “postes” posteriores, extraindo resumos da História da Unidade, de onde sobressai o grande avanço na construção da estrada nova. Na tabanca de Nhala houve um incêndio que podia ter tido consequências maiores, não fora a intervenção dos militares da minha Companhia, dirigidos pelo Capitão Braga da Cruz, na ajuda à população. Com oportunidade, e para memória, alguém fotografou o sinistro, e é da série de fotografias que então adquiri, que faço agora uma selecção para partilhar. Não carecem de legenda.













Da História da Unidade do BCAÇ 4513:

NOV73/06 – Forças da CCAV 8351, detectaram a base de fogos utilizada pelo IN na última flagelação ao DEST CUMBIJÃ em GUILEGE 3 E 2-54. Assinalado o local de instalação do CAN S/R 82 e 12 ninhos de atiradores. (...).

NOV73/09 – A 3ª CCAÇ/4516 por determinação superior, é rendida no Sector pela CCAV 8350, deslocando-se para BUBA a fim de posteriormente seguir para BISSAU. A CCAV 8350 fica sedeada em COLIBUIA.

- Forças da CCAV 8351 procedem à implantação de um campo de minas na região da base de fogos IN detectada. (...).

NOV73/11 – As forças do Sector além da protecção aos trabalhos de Engenharia, continuam a executar em permanência patrulhamentos para a região de fronteira e contra-penetrações nos corredores tradicionais.

NOV73/12 – Realizou-se mais uma coluna de reabastecimento a BUBA, para transporte de material de Engenharia e víveres. Esteve em A. FORMOSA uma equipe da RTP a efectuar gravações para mensagens de NATAL.

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15174: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (22): De 09 a 23 de Outubro de 1973

Guiné 63/74 - P15206: Lembrete (13): Todos os dias, de 2ª a 6ª feira, na Antena Um, às 14h55, o programa de António Luís Marinho, "Canções da Guerra"... Destaque para "Lágrima da preta": poema de António Gedeão (1961), musicado por José Niza e interpretado por Adriano Correia de Oliveira (1970)



Portal da RTP > "Canções da Guerra": programa de rádio, passa todo os dias, de 2ª a 6ª na Antena Um, às 14h55. Os episódios mais antigos e os mais recentes podem aqui ser vistos.

 O nosso blogue noticiou o arranque do programa e tem dado sugestões à equipa de produção e realização (*). Os ex-combatentes da guerra colonial na Guiné também têm o seu "cancioneiro", os seus versos e canções têm vindo a ser recolhidos ao longo dos anos pelo nosso blogue: aqui vão alguns dos nossos marcadores/descritores:

cancioneiro (63)
Cancioneiro de Bambadinca (3)
cancioneiro de Bedanda (2)
cancioneiro de Canjadude (2)
cancioneiro de Gadamael (1)
Cancioneiro de Gandembel (10)
Cancioneiro de Mampatá (4)
Cancioneiro do Niassa (2)
canção de Coimbra (1)
Canções do Niassa (4)
fado (37)
Fado da Guiné (7)
música (86)
música da tropa (1) [recordada hoje por guineenses, homens e mulheres]


Mas há mais cancioneiros (dispersos): Xime, Mansoa, Cufar, Bafatá, Buba, Empada... São alguns que me lembro de cor, e que têm recolhas de letras...

Um dos nossos camaradas, que está a colaborar com o programa "Canções da Guerra", é o José Martins com uma canção do Cancioneiro de Canjadude, que era uma paródia à canção "Óculos de Sol", interpretada por Natércia Barreto (**)...

Está na altura de ir, novamente, rapar o baú das nossas memórias (neste caso, poéticas e musicais)... Vamos criar uma nova série, "O Nosso Cancioneiro", para reunir todos estes materiais... Algumas das letras não eram musicadas ou perdeu-se a música... LG


1. Sinopse > “CANÇÕES DA GUERRA”

A Antena 1 apresenta "As Canções da Guerra".

A guerra colonial, tendo em conta o seu enorme impacto social, foi motivo de canções.

Desde o hino “Angola é Nossa”, criado após o início da rebelião em Angola, que levou a uma guerra que durou 14 anos.

As canções ligadas à guerra, falam da vida dos soldados, da saudade da terra, ou criticam de forma mais dissimulada ou mais directa, a própria guerra.

De 2ª a 6ª feira, às 14h55 na Antena1, ou nesta página, escute as canções da guerra colonial, enquadradas por uma história. Que pode ser a da própria canção, do seu autor ou de um episódio que com ela esteja relacionado.


Um programa: António Luís Marinho
Produção: Joana Jorge



2. Lágrima da preta, de António Gedeao (letra) e José Niza (música). Intrepatação de Adriano Correia de Oliveira.

Dos episódios mais recentes, permito-.me destacar este poema do António Gedeão, retirado do seu livro livro Máquina de Fogo (1961).

A "Lágrima de Preta" vai ser musicada  por José Niza, e cantada por Adriano Correia de Oliveira, em 1970 (, incluída no seu álbum Cantaremos). 

"O poema é um magnífico hino à igualdade de todas as raças. Apesar disso, ou talvez por causa disso, a censura proibiu a canção.", diz o realizador do programa, António Luís Marinho,

Aqui fica, a seguir,  o poema,que não me lembro de ter ouvido no meu tempo na Guiné: compreensivelmente ainda não fazia parte do reportório dos nossos "baladeiros" no mato... Popularizou-se depois do meu regresso, em março de 1971.

Nas noites de insónia, música e  álcool de Bambadinca, o que estava em voga (em 1969/71) era um outro poema do António Gedeão, a "Pedra Filosofal", cuja letra tinha para alguns de nós um segundo sentido... O último verso ( "ELES" não sabem nem sonham"...)  era cantado a plenos pulmões para "ELES", ali ao lado, ouvirem: o comando de batalhão, os oficiais superiores (tanto do BCAÇ 2852 como sobretudo do BART 2917)...

Para quem a quiser recordar, aqui está, disponível o poema no portal do CITI. É um poema de 1956, do livro Movimento Perpétuo

A interpretação de Manuel Freire ,no progama Zip-Zip, tornou-se "viral", como diríamos hoje... Espero que o Luís Marinho a inclua na sua seleção de "Canções da Guerra"... Muita malta sabia a  letra (e a música) de cor!... (LG). (***)


Lágrima de preta,  de Anónio Gedeão (1961)


Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:

Nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio.


(Cortesia do portal CITI - Centro de Investigação para Tecnologias Interativas)

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 18 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15127: Agenda cultural (424): "Canções da Guerra", um programa da Antena 1, todos os dias, a partir de 14 do corrente, de 2ª a 6ª feira, às 10h45, 14h55 e 20h55, com António Luís Marinho...

(**) Vd. poste de 28 de junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4595: Cancioneiro de Canjadude (CCAÇ 5, Gatos Pretos) (2): Binóculos de Sol (José Martins)

Vd. também poste de 28 de fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - P576: Cancioneiro de Canjadude (CCAÇ 5, Gatos Pretos)

Guiné 63/73 - P15205: O nosso querido mês de férias (15): em agosto de 1971, entre a praia da Nazaré e as tertúlias de Vila Franca de Xira... enquanto em Lisboa, tudo na mesma, isto é, a vida corria... (Hélder Sousa)













Nazaré > Sítio da Nazaré > 24 de novembro de 2007 >  A terra que é, toda ela,  um magnífico "postal ilustrado",  e onde o Hélder Sousa,  passou 15 dias das suas férias da Guiné em agosto de 1971...

Fotos: © Luís Graça (2007). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG]



1. Mensagem de Hélder Valério de Sousa [ ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche eBissau, 1970/72]


Data: 30 de setembro de 2015 às 15:21
Assunto: Ainda as "viagens de férias". A propósito da "sondagem/inquérito".

Caros camaradas

Incentivado pelo comentário do Carlos V e, já agora, pelo que ele escreveu relembrando as suas férias, posso acrescentar mais alguma coisa às minhas, que entretanto foram sendo relembradas. Enquanto escrevia vi o comentário do Luís sobre o casamento, mas sobre esse assunto, as razões, os motivos, podem ficar noutro artigo.

Realmente o custo das viagens de ida e volta deveria ter sido então os tais 6.190$20 que foram liquidados em prestações. Acho que sim.

É bem verdade que isto que nos foi proposto para relembrarmos as nossas férias (*), onde foram passadas, se é que foram, e quantas vezes, não é uma verdadeira sondagem (palavra agora muito em voga), é apenas um inquérito, um incentivo à participação e que também pode servir para 'medir' mais coisas, por exemplo os nossos "estados de alma", a situação da chegada, a ansiedade, ou não, do regresso, e também sobre a capacidade económica de quem veio gozar férias à "Metrópole".

Não é certamente surpresa para ninguém que naqueles tempos a diferenciação 'social' e por extensão a hierarquia militar originasse situações de potencial económico diferentes para as diferentes 'camadas'. Por isso as respostas ao "inquérito" acabam por reflectir isso mesmo, não vejo razão para criticar a existência, em si mesmo, da "sondagem", basta mudar o nome e concluir o que já foi referido e que é que também, ainda hoje é assim, aqueles que tinham um enquadramento mais baixo tinham, em regra, menores habilitações, menores rendimentos e como tal, também de um modo geral, acedem menos a estes meios informáticos, pelo que a sua "amostra" fica prejudicada. Mas explicada.

Voltando às viagens...

A Guiné tinha a 'vantagem' em relação aos outros TO (Angola e Moçambique) de ser mais perto e os custos das viagens serem menores. Daí que, para aqueles que tinham meios económicos próprios, ou que os conseguiram obter, a partição (quando possível) do período da comissão em três permitia as tais duas viagens. Foi o que aconteceu comigo. Cheguei lá na primeira metade de Novembro de 70 e vim de férias na segunda metade de Julho de 71, oito meses depois, sensivelmente. A 2ª viagem foi de meados de Março a meados de Abril de 72, também sensivelmente.

Quanto às reacções quando cheguei e às vésperas do regresso, acho que não foi muito diferente do que já li por aqui, claro que com a 'nuances' próprias.

O Hélder Sousa no seu quarto em Bissau
(c. 1971/72)... Elegantíssimo
Não me recordo se avisei da data exacta da chegada para me irem buscar ao aeroporto mas acho que sim pois já tenho ouvido dizer que vinha 'muito magro e que um braço dava para agarrar pela cintura' (tomara agora essa 'elegância'....).

Retenho que no imediato me sentia como se estivesse num local estranho, as coisas, o movimento à minha volta não se encaixavam no meu (re)conhecimento. Parecia que estava 'no ar'. 

Aos poucos fui-me habituando mas o que mais me caracterizava era o meu mutismo, coisa estranha para a maioria dos amigos, já que eu era um tanto expansivo. Visitei os vários familiares procurando vincar que 'estava bem'. Fiz uma quinzena de férias na Nazaré, na casa do costume, da D.ª Maria José e do Sebastião Pinto Caneco.

Lembro-me de olhar por vezes à volta e aquela alegria toda do pessoal na praia, ao sol, no mar, etc., me incomodava quando o pensamento voava para a Guiné (e isso acontecia frequentemente), sendo que aí recordava uma passagem dum poeta português que, estando em Angola, reflectia sobre o que se passava na rectaguarda e escrevia ".... em Lisboa, na mesma, isto é, a vida corre!". Assim era ali também.[O poeta é o Manuel Alegre, que escreveu o já clássico "Nambuangongo, meu amor", e que curiosamente voltou a Nambuangongo, 48 anos depois, em 2010.] [LG].

O emblema da UDV - União
Desportiva Vilafranquense
Estive com amigos da "vida artística", de várias interpretações de como a sociedade devia evoluir.

Tive uma longa confraternização (quase um dia) com um amigo que entretanto tinha mudado de nome e de morada, onde se discutiu muito sobre a situação do País e da guerra, em particular da Guiné. Estive com outros que me davam outras perspectivas. Cada um procurava captar a minha atenção e simpatia. Fui-me mantendo equidistante, mas atento.

Em Vila Franca, terra da minha formação de cidadania, fiquei também um tanto perplexo como as coisas evoluíam. Antes de me ir embora havia uma Pastelaria, a "Lezíria", que era um local normalmente frequentado pela classe média e onde as 'mães de família' passavam o tempo com as suas meninas, bebendo chá, bolos, galões e outras coisas próprias das pastelarias. Era um local com pesados reposteiros a decorar os vãos de janela.

Pois esse local foi-se transformando aos poucos num 'ponto de encontro' em horas mais tardias, para aqueles de nós que saíam
 da Secção Cultural da UDV  [, União Desportiva Vilafranquense] 
e que iam beber um copo de leite quente retemperador, em tempo de inverno. Esse local rapidamente passou a ser conhecido entre os jovens como o "Kremlin", como alusão à actividade conspiratória que ia acontecendo.

Aquando dessas minhas férias, em Agosto de 71, já era mais conhecido como "Mesopotâmia".... acho que injustamente, mas era um 'sinal dos tempos'....

Quando se aproximou a data do regresso as coisas ficaram um bocado mais tensas. Os silêncios maiores. O olhar mais vago, mais "ausente". Mas a determinação mantinha-se e com maior ou menor angústia lá se embarcou para o regresso a Bissau, com passagem e paragem sem saída, no Sal. À chegada o tal choque térmico já por várias vezes aqui relatado, foi tal e qual como descrito.
Depois,.... depois foi o retomar da actividade!

Da 2ª viagem darei conta depois.

Abraços

Hélder Sousa

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Nota do editor:

(*) Último poste da série >  5 de outubro de 2015 > Guiné 63/73 - P15204: O nosso querido mês de férias (14): À procura de aconchego, e de amor temperado com algumas paródias, que um mês, naquele tempo, passava muito depressa (José Manuel Matos Dinis)