terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5382: Efemérides (39): 1 de Dezembro de 1640, evocado pelo nosso bardo, Manuel Maia


Com a devida vénia, aqui ficam algumas estrofes do nosso poeta épico, o Manuel Maia (*), alusivas ao dia de hoje que a generalidade dos portugueses, sobretudo os mais novos, só sabe que é feriado... O nosso poeta do Cantanhez trouxe, à Tabanca Grande, o gosto pela poesia épica e a paixão da História pátria. Bem hajas, camarada! (LG)


História de Portugal em Sextilhas
por Manuel Maia

(...) 160-A saga filipina avançará:
terceiro aqui, é já o quarto lá,
mais opressor ainda que anteriores.
Impostos são garrote asfixiante,
vexame cada vez mais ultrajante,
havia que expulsar os invasores...





161-Se na primeira fase houve acalmia,
pois nobres têm sempre a tença em dia...
segunda etapa é fogo de vulcão.
Agravo tributário é uma constante,
o povo abomina o ocupante,
no sul, Manuelinho entra em acção...

162-Prisões são arbitrárias, quais insultos,
gerando mil protestos e tumultos,
no ar pairava a sede de vingança...
Mil seis quarenta estava no final,
Dezembro em pleno dia inaugural,
foi marco, para a Casa de Bragança...



"Armas da Monarquia Ibérica
após a integração da Coroa de Portugal
nos Estados de Filipe II; o brasão português
em ponto de honra, no abismo do chefe"
Fonte: Wikipédia (Imagem do domínio público)


163-A vida alentejana de acalmia
que o duque para sempre pretendia,
forçada a corte abrupto, teve um fim.
P´ra trás ficou de vez Vila Viçosa,
que a Pátria está de si esperançosa,
fidalgos receberam o seu sim...

164-Sucesso da revolta determina
que seja um sucessor de Catarina,
duquesa de Bragança, a governar.
João Pinto Ribeiro e sublevados,
quarenta atacam paço esperançados
da honra, então, poderem reganhar...




D. João IV, o Restaurador (1640-1656),
o 22º monarca de Portugal, o 1º da IV Dinastia.
Nasceu em 1604, morreu aos 52 anos.
Fonte: Wikipédia (Imagem do domínio público)


165- ‘stratégia tem João Pinto Ribeiro
a dirigir o acto aventureiro
que D. João iria sancionar.
O povo só mais tarde é informado
e logo adere assaz entusiasmado,
saindo à rua p´ro rei aclamar...






166-Tal como a foice corta a erva ruim,
também a Vasconcelos se deu fim
na lâmina afiada de uma espada,
que vai trazer, de volta, a dignidade
a um povo que vivia a adversidade,
sentindo ocupada a Pátria amada...

167-Sessenta anos tempo deste jugo,
que teve o castelhano por verdugo
e apoio vil, de, poucos, nobres lusos.
Renasce a fé e a esp´rança de vivência,
agora retomada a independência,
punidas as traições e os abusos...

In: Manuel Maia - História de Portugal em Sextilhas (*)
a ser lançada no dia 9 do corrente, na Tabanca de Matosinhos, ao preço de 12,5€.
Uma primeira tiragem de 80 exemplares está já praticamente esgotada.
______________

Nota de L.G.:

(*) 3 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4456: Blogpoesia (48): História de Portugal em sextilhas (Manuel Maia) (V Parte): III Dinastia (Filipina)

Vd. também:

27 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5353: Notas de leitura (38): Prefácio ao livro do Manuel Maia, História de Portugal em Sextilhas, a ser lançado na Tabanca de Matosinhos, em 9/12/09 (Luís Graça)

25 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5335: Agenda Cultural (47): Lançamento do livro do Manuel Maia, dia 9 de Dezembro, em Matosinhos (José Manuel Dinis)

Guiné 63/74 - P5381: Histórias de José Marques Ferreira (11): 111 – O Têmpera de aço



1. O nosso Camarada José Marques Ferreira, que foi Sold. Apontador de Armas Pesadas da CCAÇ 462, Ingoré - 1963/65 -, enviou-nos com data de 30 de Novembro de 2009, a seguinte mensagem:


A todos os camaradas desta tertúlia;

Votos de boa saúde.

Como estava "quase" a falhar, envio a minha modesta colaboração para o blogue. Recordo que socorri-me de um «periódico» que naquele tempo servia para distrair e «gastar» umas horas, ou dias, na sua elaboração. Como sabemos os computadores daquele tempo, era a máquina de escrever. Havia necessidade de utilizar um material, que já não sei como era conhecido, mas a que chamávamos "stencyl" (é assim que se escreve?). Depois era dar a manivela no “chapilógrafo”, borrar as mãos em tinta. E lá saía qualquer coisa.

Estou numa fase em que aproveito para dar a conhecer, conforme sabemos, o estilo de escrita, a maneira de expressar ideias, frases... enfim, palavras.

A de hoje, como outras, é da autoria de Ramiro Fernandes Figueiredo que, como tenho dito, era o Alferes Médico da Companhia, Utilizava, quando lhe dava na bolha, alguns pseudónimos. Não sei porquê, não me lembro e, quase tenho a certeza, nunca lhe perguntei. Estas últimas estórias um tanto ficcionadas, mas, mesmo assim, mais próximo possível de realidades, muitas realidades.Deixo-vos mais esta, com renovados desejos de felicidades, que, muitos, bem precisam.

Um abraço a estes editores que trabalham até mais não e com o meu muito obrigado pelas simpatias demonstradas e por me aturarem.

111 – O «TÊMPERA DE AÇO»

A coluna auto seguia pelo caminho previsto pelo oficial de operações. Eram oito viaturas.

Precisamente antes do pontão como marco acutilante nas recordações de hoje, o 111 sente-se impulsionado pelos ares por abalo seguido de um estampido infernal. Neste salto de acrobacia imprevisto não tem tempo para pensar um vislumbrar o que se passara.

Sente-se aparado pela terra amolecida e lamacenta da bolanha ao lado. Olhando a custo, um tanto contundido e abalado, tem um movimento instintivo de apalpar os ossos das pernas e braço e passar as mãos borradas de lema pela cara.

À massa plúmbea daquela argamassa mole e pegajosa não adere sangue. Não está ferido, pode mesmo movimentar os membros a custo. Procura pôr-se de pé, mas não consegue. Vê somente no caminho uma nuvem poeirenta e gritos de desespero, de lamentações e palavras raivosas do comandante que impávido e não muito sereno, ditava ordens.

Sente-se sem forças e desanimar. Mas não podia ser; o 111 é de fibra de aço e tem sete fôlegos. Cerra os dentes e põe-se com dificuldade a rastejar em direcção ao mato limítrofe da bolanha.

A arma desaparecera-lhe das mãos no meio da confusão e explosão que estalara, mas coladas ao seu peito estão duas granadas de mão e no cinto uma sua faca de mato para o que desse e viesse. Respira fundo, arranja novas forças, finca os cotovelos na lama e vai-se arrastando.

A sua atenção é sacudida pela troca inesperada de tiroteio que se travava entre os colegas das viaturas e o inimigo emboscado na berma do mato – e soberbamente instalado. Sentia o metralhar de uma arma que pelo som não era dos seus camaradas. Espevita o ouvido e vê que é do monte de baga-baga a uns cinquenta metros.

Apalpa as granadas e contorcendo-se em dores, com as bátegas de suor a pingarem-lhe da cara, arrasta-se penosamente naquela direcção. Pára um instante – é impossível continuar… - mas a metralhadora inimiga flagela impiedosamente os seus camaradas. Sente as balas que choviam das viaturas sibilarem-lhe sobre a cabeça empada em lama. Quase que não podia abrir os olhos – a lama começava a secar.

Arrasta-se mais, as lágrimas correm-lhe pela cara, talvez de dor e de emoção… nunca se sabe. Está a vinte metros do inimigo e distingue quatro vultos atrás da baga-baga. São negros e rebeldes. Cerra os dentes e com os mesmos arranca a cavilha de segurança duma granada.

Aperta a paleta, mas sente que não tem forças para a lançar a vinte metros. Rasteja… e está a 10 metros. Ninguém no meio da barafunda mortífera o notara. Abriga-se atrás de uma árvore, arranja novas forças e aí vai a granada pelo ar. Caiu a uns cinco metros do objectivo e a arma cala-se. Na fuga, dois do grupo dos quatro emboscados vêm o nosso camarada e dirigem-se para ele, mas antes que o atinja com a pistola que lhe vai ser apontada já a segunda granada voara pelo ar.


O 111 nada mais sentiu a não ser a explosão, cuja onda de sopro o envolvera. Desfalecera…


A seguir o comandante ordenou o envolvimento e vão encontrar o 111. O seu coração batia ainda, o sangue gotejava-lhe dos ouvidos e uns leves estilhaços estavam cravados na lama do rosto. A arma da baga-baga lá estava meia desmantelada. Junto dela dois corpos dos rebeldes. Perto do 111, a uns cinco metros, se tanto, o corpo dum terceiro rebelde mutilado pela segunda explosão.

Ao visitar o 111 há dias no hospital, vi-o satisfeito e já refeito dos ferimentos. Estava radiante, feliz e nos seus lábios dançava um sorriso maroto de superioridade.

Ao entregar-lhe uma pequena lembrança qualquer e já quando me retirava fiquei emocionado, surpreendido e quedei-me uns instantes a meditar nas palavras dele que se repercutiam em mim: «O maior heroísmo ou coisa que o valha, não são as medalhas ou citações, mas o sentido de amizade e o espírito de corpo para com os nossos camaradas, e acredita meu amigo, quando os vi, não tive medo, só pensei nos nossos».

Senti-me emocionado e a custo retorqui:

«Sem dúvida, 111, a nossa Companhia é uma verdadeira família. Sentimos a morte de um camarada como a de um irmão».

“ÓKEY”
(Pseudónimo de Ramiro Fernandes Figueiredo, ex-Alf Mil Médico)
In «Jornal da Caserna», CCaç. 462, Guiné 1963/1965
Guiné - Ingoré, 29 de Fevereiro de 1964.

Para todos um abraço,
J.M. Ferreira
Sold Ap Armas Pes


Foto: José M. Ferreira (2009). Direitos reservados.

__________
Nota de M.R.:

(*) Vd. último poste da série em:


Guiné 63/74 - P5380: Os nossos camaradas guineenses (13): Homenagem aos 53 comandos africanos fuzilados no pós-independência (Manuel Bernardo)


Lisboa > Monumento aos Mortos do Ultramar > 14 de Novembro de 2009 > Regina Mansata Djaló, viúva do Alferes graduado 'comando' africano Demba Cham Seca, apontando com o dedo o nome do seu marido, um dos 53 militares do Batalhão de Comandos Africanos, fuzilados no pós-Independência, e que passaram a figural na memorial dos Mortos do Utramar.

Fotos: © Manuel Bernardo (2009). Direitos reservados



1. Mail enviado ao nosso editor Virgínio Briote, com data de 17 de Novembro:


Assunto - Homenagem aos 'comandos' africanos fuzilados II

Caro Senhor/Amigo:


Com pedido de divulgação junto remeto o 2.º texto sobre este assunto.

Cor Ref Manuel Bernardo


2. Homenagem aos 'Comandos' africanos fuzilados clandestinamente na Guiné
por Manuel Bernardo

(…) O meu marido era o Alferes graduado 'Comando' Demba Cham Seca.


(…) Á terceira vez foi novamente detido, no dia 21 de Março de 1975, pelas duas horas da tarde. Quando, à noite, fui levar-lhe comida à esquadra de polícia de Bafatá, disseram que ele já não precisava dos alimentos. Soube, depois, que, nessa noite foi mandado para Bambadinca, onde foi fuzilado juntamente com outros. Os Tenentes Armando Carolino Barbosa e o Tomás Camará foram dois deles.

(…) Na certidão de óbito, conseguida apenas em 2000, consta: 'Faleceu de fuzilamento, por ter servido com entusiasmo o Exército Português'.

Regina Mansata Djaló, in 'Guerra Paz e Fuzilamento dos Guerreiros' (...) (2007), p 358.



Decorreu no passado dia 14 de Novembro, as celebrações do aniversário do armistício (I Guerra Mundial), da fundação da Liga dos Combatentes e do 35.º aniversário do final da Guerra do Ultramar.

A cerimónia foi presidida pelo novo Ministro da Defesa Nacional, Santos Silva, que foi acompanhado pelo também novel Secretário de Estado da Defesa Nacional [e dos Assuntos do Mar], Marcos Perestrello [...]. Estiveram igualmente presentes os quatro chefes militares e o Presidente da Liga dos Combatentes, General Chito Rodrigues.

Depois das habituais honras militares, foram homenageados os três militares falecidos na Guiné, na zona de Guidaje (cerco por muitas centenas de guerrilheiros do PAIGC a esta povoação, durante quase um mês), em Maio de 1973, e cujos corpos foram recuperados pela Liga dos Combatentes, num programa a decorrer nos três teatros de operações para esse efeito; isto é, no caso da Guiné para identificação e concentração no cemitério de Bissau em condições com alguma dignidade. Depois, os que as famílias demonstrarem interesse em serem trasladados para Portugal, julgo que tal poderá ser levado a efeito com o patrocínio de outras entidades.

Foram eles o Furriel Mil José C. M. Machado, de Valpaços, o 1.º Cabo Gabriel F. Telo, da Calheta/Madeira, e o Soldado Manuel M. R. Geraldes, de Vimioso, que depois seguiram aos seus destinos.

E ninguém falou nos 'comandos' africanos fuzilados…

De seguida, o Ministro da Defesa, acompanhado pelo Presidente da Liga dos Combatentes e do Presidente da Associação de Comandos, Dr. Lobo do Amaral, procederam ao descerramento das placas com os nomes de 53 'comandos' africanos (20 oficiais, 29 sargentos e 4 soldados), fuzilados clandestinamente a partir de Março de 1975, 'apenas' por terem combatido com honra e brio no Exército Português, no teatro de operações da Guiné, vários deles durante quase toda a guerra.

Nos discursos do General Chito Rodrigues, do General CEMGFA Valença Pinto e do Ministro da Defesa esta situação de fuzilamento nunca foi referida. Nem D. Januário Torgal Ferreira, na sua oração por alma dos militares, ou o locutor de serviço o mencionou.

Assim, não podemos ficar admirados pelo facto do Correio da Manhã, na sua edição do dia seguinte tenha noticiado: “No Monumento aos Combatentes foi ainda descerrada uma placa com o nome de 53 comandos mortos na Guiné.” Nem disseram que eram africanos e guineenses, nem que foram fuzilados pelo PAIGC.

Deste modo a mensagem que passou para o público foi que os 53 militares portugueses foram agora colocados por, do antecedente, lá não estarem por qualquer lapso da organização do Memorial (**)…

Pode perceber-se o melindre desta situação, já que se trataram de crimes contra humanidade (não prescrevem), mas volto a repetir o que já disse em texto anterior. O General Nino Vieira, em Novembro de 1980 (confirmado nos meses seguintes), depois de ter tomado conta do poder na Guiné-Bissau, assumiu a autoria, por parte do PAIGC, antes liderado por Luís Cabral, dos fuzilamentos clandestinos de cerca de 500 pessoas e que foram enterradas em valas comuns de 35 a 38 pessoas. Isto veio publicado no jornal oficial do PAIGC - edições de 14 e 29-11-1980 e 18-1-1981 (in Manuel A. Bernardo, Guerra, Paz e Fuzilamento dos Guerreiros Guiné: 1970-1980, Lisboa 2007, pp 119 a 127).

O combate à corrupção vai ser a sério?

Lembro o que afirmou o Ministro da Defesa Nacional: “(…) Todos os soldados mortos ao serviço da Pátria merecem momentos de reflexão e que o século XX foi duro a todos os níveis”. E mais à frente acrescentou: “Homenageamos os esforços de todos, curvamo-nos perante os que morreram e apoiamos os ex-combatentes e os deficientes das Forças Armadas. (…)”

Será que esse apoio, agora reafirmado, também tem que ver com a revisão das decisões tomadas pelo seu antecessor, que retirou aos combatentes direitos adquiridos, tal como a diminuição do quantitativo da fraca pensão anual, que um governo de maioria PSD/CDS tinha atribuído (na minha ocorreu uma redução de cerca de 75%)? Não acredito, já que, para este Governo, a crise internacional e nacional parece justificar tudo, excepto os casos de corrupção que vão proliferando ao longo dos tempos. [...]

Enfim, a Verdade dos acontecimentos, quer já de natureza histórica, como o ocorrido com os referidos fuzilamentos clandestinos dos 'Comandos' africanos, quer dos casos de corrupção que alastram por esse País, acabará por vir ao de cima. Demorar mais ou menos tempo depende de uma sociedade civil mais activa, que exerça os seus direitos de cidadania e os accione através dos mecanismos, que tem ao seu dispor numa Democracia e num Estado de Direito.

PS - Junta-se a fotografia de Regina Djaló que, em 14-11-2009, aponta para o nome do marido Demba Seca, fuzilado na Guiné e agora constante do Memorial dos Combatentes do Ultramar.


Cor Inf Ref Manuel Amaro Bernardo

16-11-2009

[Revisão / fixação de texto / título: L.G.]
___________

Notas de L.G.:

Sobre o Cor Inf Ref Manuel Bernardo:

"O Coronel, na situação de refoma, Manuel Amaro Bernardo cumpriu quatro comissões em Angola e Moçambique. Em 25 de Abril de 1974 encontrava-se colocado na Academia Militar. Na altura do 25 de Novembro de 1975, então no Regimento de Comandos, fez parte do Posto de Comando que coordenou as acções militares" (VB).

Vd. alguns dos postes que já publicados sobre o livro de Manuel Bernardo (e não Bernardes, como às vezes por lapso foi publicado no nosso blogue):

30 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2318: Notas de leitura (4): Na apresentação de Guerra, Paz e Fuzilamento dos Guerreiros: Guiné 1970/80 (Virgínio Briote)

31 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2706: Notas de leitura (5): Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros, de Manuel Amaro Bernardo (Mário Beja Santos)

2 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2711: Notas de leitura (6): Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros, de M. Amaro Bernardo (Mário Fitas)

2 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2713: Notas de leitura (7): Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros: Resposta a um Combatente (M. Amaro Bernardo)

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Guiné 63/74 – P5379: Histórias do Jero (José Eduardo Oliveira) (22): Operação “Ananases”


1. O nosso Camarada José Eduardo Reis de Oliveira (JERO), foi Fur Mil da CCAÇ 675 (Binta, 1964/66), enviou-nos a sua 22ª história, com data de 29 de Novembro de 2009:

Operação “Ananases”

O registo desta operação é dada”à estampa” quarenta e tal anos depois de ter acontecido...

Oficialmente nunca aconteceu e julgamos até poder afirmar que pouca gente da C.Caç.675 se lembrará dela...

Aconteceu no mês de Outubro de 1965 - o Capitão Tomé Pinto já não estava na Guiné -em data que não nos é possível confirmar com exactidão até... porque... foi uma «operação secreta»...

Antes de avançarmos na estória é preciso explicar o contexto em que a mesma aconteceu, fazendo notar um pormenor que não é de somenos.

A Companhia de Caçadores 675 foi durante a sua estadia na Guiné uma «Companhia Independente».Numa primeira fase pertenceu ao Batalhão de Cavalaria 490 (Ten. Coronel Fernando Cavaleiro) – de Junho de 64 a Abril 65 – e na segunda fase - a partir de Maio de 65 até ao final da comissão – esteve na dependência operacional do Batalhão de Artilharia 733 (Ten. Coronel Glória Alves).

Quer se queira quer não uma Companhia Independente é (quase) sempre uma «filha bastarda» do Batalhão, com direito a embates – leia-se "chatices" de diversos graus entre chefias - que tiveram no caso da nossa Companhia diversos tipo de encaixes...

Com o Batalhão 490 alguns «desencontros» iniciais esbateram-se e a Companhia 675 passou até a ser, a partir de determinada altura, a “filha dilecta” do Comando sedeado em Farim.

Com o Batalhão 733 as relações nunca foram boas nem más... antes pelo contrário!

Na tal segunda fase – a partir de Maio 65 – a «675» provocou sempre “azias” ao “733”, a quem só a citação do nome do Capitão Tomé Pinto provocava alergias do tipo «DC» (*).

Posto isto... estamos agora em condições de contar os quês e... porquês da ultra-secreta “Operação Ananases». Tem a palavra o cérebro da operação, Belmiro Tavares de seu nome, ao tempo Alferes Milº. de Infantaria da CCaç. 675:

«...O nosso Capitão já nos tinha deixado. Um dia o Cabo Cifra (1º.Cabo Operador Cripto nº. 2542, José Manuel Moura) deu-me conhecimento que tinha chegado uma mensagem de Farim. A CArt. 731 avisava que no dia seguinte iria patrulhar a zona de Canicó.

Fiquei abismado...

A CArt. 731 mal patrulhava a sua zona e propunha-se «invadir» a nossa!? Que se passaria naquelas cabeças!?

Aguarda. – Disse ao Moura.»


Procurei o nosso saudoso e malogrado Guia Malan Sissé e perguntei-lhe: Que haverá em Canicó que atraia a tropa de Farim?

A resposta foi imediata:

O régulo (Mamadu Baldé, Alferes de 2ª. Linha) vive em Farim e tem em Canicó uma plantação de ananases.

Está na época de os colher.

Ordenei ao Cifra:- Transmite que a zona de Canicó está armadilhada!

No dia seguinte, pela manhã, o 3º. Grupo de Combate, fez uma proveitosa batida... aos ananases de Canicó.

Trouxemos um Unimog bem carregado de ananases... afora os que comemos... in loco!

A tropa de Binta não se deixa enganar».

Ser “comido” pela malta do Batalhão 733... é que era bom!


Guia Malan Sissé. Binta, Setembro de 1965.
Fotografia de Belmiro Tavares.


Perder com eles... nem a feijões... quanto mais a ananases!»

Aconteceu... em Outubro de 1965.

O dia exacto... não ficou... mas que o sabor daqueles ananases era especial... era!

No regresso a Binta... um militar, de que já não recordamos o nome, dizia para o Alferes Tavares:

«Oh meu alferes acabei de encontrar um ananás que parece que tem um código de barras!

Um Código de Barras!? O que é que diz?

733... já foste!

É... pá... come lá o teu ananás e... não inventes. Isto é uma «operação que nunca aconteceu»!

Uma pausa e o Alferes Tavares, depois de comer mais um pouco de ananás, disse entre dentes:

«Só faltava o Furriel Oliveira daqui a alguns uns anos pôr esta “estória” nalgum livro de memórias da Guiné. E quando começar a mania dos blogues está-se mesmo a ver que ele vai entrar nessa…»

-O meu Alferes disse alguma coisa?

-Não pá…estava só a falar com os meus botões!

Premonitório este Alfero, digo eu.

(*) - DC = Dor de Corno.

Um abraço,
JERO
Fur Mil Enf da CCAÇ 675

Fotos: José Eduardo Oliveira (2009). Direitos reservados.
___________
Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:


Guiné 63/74 - P5378: Blogoterapia (133): Falando do povo da Guiné-Bissau... e alguns poemas (Regina Gouveia)

1. Mensagem da nossa tertuliana Regina Gouveia*, com data de 28 de Novembro de 2009:

Caro Luís Graça
Com a saída e apresentações do livro**, juntamente com gripe A nos netos, dispersei-me um pouco e não sei se cheguei a mandar um texto para publicação no Blog.
Envio-o agora. Se já recebeste, desculpa a duplicação.
Um abraço
Regina Gouveia



Nha Fala

NHA FALA é uma parábola sobre a voz (...) A fala de Vita é a fala da África (...)
Quis contar esta história por meio de uma comédia musical para mostrar a vitalidade deste continente. A música é o melhor modo de expressão dos africanos
”.
(Flora Gomes)


Se há no Porto espaços em que me sinto bem, um deles é o Clube Literário. Mesmo quando os eventos não me atraem muito, tenho sempre o rio em frente para deleite do olhar. Mas foi mais que isso na Semana Cultural dedicada à Guiné Bissau.

Terça feira, 17 de Novembro, bar do Clube, encontro sobre Contos tradicionais da Guiné-Bissau.

Já há muitos anos adquiri um livro de contos guineenses pelo que os contos não constituíram uma novidade. Um sociólogo guineense fez uma análise sobre os mesmos, o que foi minimamente enriquecedor. Sempre com um fundo moral, nos contos figuram muitos animais entre eles o lobo, egoísta e agressivo, a lebre e a tchoca, símbolos de esperteza. Figuram também animais solidários que emprestam os seus olhos a outros animais cegos, e animais ingratos que depois de recebidos os olhos tentam apropriar-se deles para sempre

Enquanto o encontro decorria, um tocador dedilhava um cora. Cora é um instrumento de cordas, tradicional dos povos mandingas da África Ocidental. Construído a partir de uma meia cabaça fechada por uma cobertura de pele, e com um braço que sustenta até 25 cordas, é o instrumento que acompanha os trovadores errantes, um misto de poetas e cronistas. O seu som, belíssimo, pretende reproduzir o de uma ave

Sexta feira, 20 de Novembro, auditório do Clube, projecção do filme "Nha Fala" de Flora Gomes. Fantástico. Lembrando um pouco Kusturica, Flora Gomes busca, através da personagem Vita, um rumo para um povo que, para renascer, precisa de cortar com uma parte do passado

A banda sonora, muito bem conseguida, como que proclama a importância da música na cultura africana

Embalada pela música africana viajo no tempo….

Dezembro de 1969, visita de Spínola a Bafatá.

Acompanha-o a mulher, Helena Spínola, a quem é oferecida uma recepção, enquanto o marido trata de assuntos que ali o levaram. Para a recepção são convidadas as mulheres dos militares.

Fui colocada perante um dilema. Estar presente seria como que uma conivência com uma guerra sem sentido, que sempre abominei.
Faltar significaria perder um espectáculo que, provavelmente, jamais iria ter oportunidade de ver. A balança pesou para este segundo lado.

Dirigi-me à casa do Administrador onde estava Helena Spínola na varanda, acompanhada por várias senhoras. Como não conhecia ninguém isolei-me a um canto. Helena Spínola, muito gentil, veio ter comigo e integrou-me no grupo. Em breve a música africana ecoava no ar. Marimbas, guitarras, coras, tambores, num inesquecível festival de sons.

E outros sons me assomaram agora à memória: os sons dos tambores num choro (funeral) bem perto de minha casa, os sons de um batuque num casamento e os sons dos guizos nas pernas e nos braços de uma criança.

Foi numa tabanca perto de Bafatá. A criança estava ao colo da mãe que, orgulhosa, ma estendeu para eu pegar nela ao colo. Emocionada peguei na criança, que ao ver-se fora dos braços da mãe começou a gesticular, perninhas e bracinhos em grande agitação. Do tilintar dos guizos emergia uma espécie de toada que tornou mágico o momento

A música é o melhor modo de expressão dos africanos (Flora Gomes)

Mas a estas imagens e a tantas outras recordações que deixaram em mim marcas indeléveis, associam-se outras que já não deveriam existir no século XXI. Refiro-me ao programa “Dar a vida sem morrer” apresentado por Catarina Furtado.

E apesar de tudo ainda continuam a cantar. Que força é essa amigo…

Vi-te a trabalhar o dia inteiro, construir as cidades pr'ós outros, carregar pedras, desperdiçar muita força pra pouco dinheiro.
Vi-te a trabalhar o dia inteiro. Muita força pra pouco dinheiro (…)

Sérgio Godinho, Que força é essa

Em 2005, a propósito das comemorações do 30.º aniversário da independência do seu país, Mia Couto quando proferia na Suiça, uma conferência subordinada ao tema: “No passado, o futuro era melhor?” disse a dada altura:

- Em 1975, nós mantínhamos a convicção legítima mas ingénua de que era possível, no tempo de uma geração, mudarmos o mundo e redistribuirmos felicidade. Não sabíamos quanto o mundo é uma pegajosa teia onde uns são presas e outros predadores.

Ao ver a situação da Guiné-Bissau nos dias de hoje, sei que o futuro com que sonharam no passado era bem melhor que o futuro que lhes estava reservado. Tal como nos contos, o povo continua solidário capaz de dar os olhos, mas há sempre lobos predadores egoístas e sem escrúpulos.

Ao escrever estas palavras lembrei-me de três poemas que de certo modo, põem o dedo na ferida.

Hipocrisia

Lactarius deliciosus. Não sei se foi Lineu quem o nome lhes deu.
Eu, no meio do pinhal, com gestos suaves, subtis, vou-as colhendo uma a uma.
São as sanchas, frágeis, delicadas, como que envergonhadas,
por baixo da caruma.
Chapéu e pé em tom alaranjado, já em pequenina, a medo, eu as colhia
pois sabia que mesmo ali ao lado, outros cogumelos, alguns muito mais belos,
teciam seus ardis. Insidiosos, perigosos, escondem em si a muscarina,
a psilocibina, tanta, tanta toxina, tantas vezes fatal.
Tal qual a hipocrisia nos humanos, desumanos, antes eu diria,
que enchem a boca com a democracia e a globalização, visando um mundo novo,
enquanto vendem armas para matar o povo que subjugam pela exploração.

Regina Gouveia, Magnetismo Terrestre
***

Tchador

Déboras, Irinas, Svetlanas ucranianas, sul- americanas, não importa.
Partiram em busca de uma porta que lhes desse acesso a melhores vidas.
e acabaram ludibriadas, iludidas, nas mãos de proxenetas.
São traficadas são exploradas, vezes sem conta são violadas
e quando, apesar de jovens, acabadas, são abandonadas, jogadas nas sarjetas.
Sandras, Bintas, não importa o nome, a vida deu-lhes até hoje violência e fome.
Aquela com onze anos, tão menina, de uma outra menina já é mãe.
Por certo é a primeira boneca que ela tem. E nos olhos, em vez de ódio
e de revolta, uma lágrima solta, enquanto embala a filha com amor.
Aquela outra ali é argelina, talvez a "pietá" que correu mundo.
Nos olhos um desgosto tão profundo, maior que o próprio mundo.
E aquelas outras das quais não vejo o rosto que, se doentes, não podem ser tratadas, que são impuras, se desvirginadas, que se forem violadas
poderão por castigo ser queimadas?
O que dirão os seus olhos por baixo do tchador?
Humilhação? Desgosto? Resignação? Rancor? Talvez revolta?
Se eu um dia usar tchador por meu querer acreditem que não é para me esconder
é só para tentar não ver tanta injustiça, tanto horror,
tanto fanatismo, tanta dor, neste mundo cruel à nossa volta.

Regina Gouveia em Reflexões e Interferências
***

Pai Natal

Pai Natal, acabo de perceber que não és imparcial
A alguns meninos deste tudo e a outros não deste nada
Será que perdeste a morada, não estava a tundra gelada,
ou estava a rena cansada?
No Natal que logo vem, pensa bem pois não pode ser assim.
Ou dás presentes a todos ou não os dás a ninguém. Nem a mim.

Regina Gouveia em Ciência para meninos em poemas pequeninos
***

E já que o Natal se aproxima, termino desejando a todos um Bom Natal
Regina Gouveia
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 15 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5276: Agenda Cultural (45): Semana Cultural da Guiné-Bissau, 16 a 20 Novembro, no Clube Literário do Porto (Regina Gouveia)

(**) Vd. poste de 25 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5341: Agenda Cultural (48): Lançamento do livro Era uma vez... Ciência e Poesia no Reino da Fantasia, de Regina Gouveia (José Teixeira)

Vd. último poste da série de 30 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5377: Blogoterapia (132): Fotos, recordações e divagações (Juvenal Amado)

Guiné 63/74 - P5377: Blogoterapia (132): Fotos, recordações e divagações (Juvenal Amado)

1. Mensagem de Juvenal Amado*, ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1972/74, com data de 28 de Novembro de 2009:

Caros Luís, Carlos, Virgínio, Magalhães e restante Tabanca Grande:
Hoje apeteceu-me falar dos meus avós, de bajudas e coisas simples que contribuíram para o que sou hoje.
Um abraço
Juvenal Amado



FOTOS, RECORDAÇÕES E DIVAGAÇÕES

Começou por ser um punhado de fotografias mais um monte de recordações mal alinhadas na minha cabeça.
Eram recordações e vivências rejeitadas, fora um tempo de que não me orgulhava particularmente.

Tudo em que acreditava rejeitava o que ia fazer em terras estranhas. Mas o poder da aventura o sentir que passado esse tempo voltaria às ruas e praças da minha juventude, fez-me conformar com a sorte e lá embarquei para aquele destino desconhecido, um entre milhares de anónimos.

Oriundos de um país com muros altos, onde a paz podre se definia popularmente pela politica do três F, com os ideais do meu avô republicano das barricadas, condenado à deportação e salvo pela instauração da Republica, éramos amarfanhados por uma polícia política, onde se falava à socapa da merda mole ou da propriamente dita...dura.

Homem nascido lá para Mangualde,  que serviu sem se servir, que deu aos filhos somente os ideais pelos os quais lutou, sofreu e fez sofrer. Casa simples e pobre, embora parente de famílias endinheiradas, (os pobres gostam de ter família rica, os ricos acham que aqueles parentes foram com o mesmo nome registados por engano),  solidário, repartia o que tinha para 7 (sete) filhos da altura, (chegou aos onze) , com quem chegasse à sua modesta casa.
- Deolinda, põe mais um prato na mesa.

A minha avó levantava a cara da camisa onde cozia um botão, olhava para o retrato dele e depois para mim,  com aqueles olhos míopes, através das lentes grossíssimas, talvez para ver o efeito que as suas recordações tinham em mim, que o não cheguei a conhecer.

Dele também herdei somente o nome, o seu amor às causas do Homem pela justiça e distribuição mais equitativa da riqueza.

Os netos combateram nos três teatros de operações, o mais novo com idade militar participou no levantamento das Caldas da Rainha,  em 16 de Março 1974.

A rudeza das condições de vida dos nossos jovens nos campos e nas fábricas, forneceram as condições físicas para aguentarem,  sem revoltas, o que mais nenhuns por essa Europa livre e próspera suportariam.

São muitos os actos de coragem calados pelos  próprios intervenientes, esses são valentes a dobrar. Muitos nunca tiveram consciência da bravura dos seus actos. Não se escolhe o momento, a acção justifica o acto.

Passados trinta e quatro anos sobre o regresso, apeteceu-me reviver e contar o que nunca tinha contado a ninguém. Se calhar,  também nunca ninguém tinha querido ouvir. O chegar ao blogue deu-me essa oportunidade de assumir,  fora de um pequeno grupo de pessoas, que tinha lá estado e que a vontade de lá voltar era uma realidade.

Leio os postes concordo, discordo com alguns, emociono-me com outros, vejo este espaço como um espaço de liberdade aceite e consentida, onde cada um tem a sua visão. Não é obrigatório que não se mude de opinião.

Bebo toda a informação que me chega. Lamento que as nossas televisões filmem em locais restritos, que foquem mais as pessoas que os sítios. Tento ver aquele pedaço de Bafatá, de Gabu, Bissau, etc, que possa reconhecer, mas as grande angulares das câmaras de filmar ficaram esquecidas e normalmente só nos chegam imagens,  as quais não conseguimos referenciar.

Revejo as fotos. Como estará a minha lavadeira Mariama. Era uma menina quando no início da comissão a aceitei, duvidei sempre que fosse ela que me lavava a roupa.

Na Tabanca com a minha lavadeira, Mariama,  e irmãos

Aparecia sempre com crianças mais pequenas de olhos grandes e barrigas inchadas da subnutrição. Pedia-me sempre um peso para comprar sabão ou linha para coser botões. Mentira, nunca comprava sabão e os botões eram cozidos com fios de várias cores que elas tiravam dos seus panos.

No fim da comissão fui com ela comprar-lhe um corpinho à venda que, para além de vender algumas coisas à população, também comprava mancarra aos agricultores, roubando deliberadamente no peso. Dizia ele que era para descontar a terra que vinha agarrada à casca do amendoim. Enfim, lá como cá, roubava-se sempre os mesmos, os mais pobres e desfavorecidos.

Mas voltando ao corpinho, máxima aspiração das jovens bajudas que assim teimavam em tapar o que nós mais gostávamos de ver. Lá escolheu e lá se tapou muito orgulhosa.

No dia da partida lá estava ela mais os garotos à sua volta com o corpinho vestido a dizer-me adeus quando passei a caminho do Xime, pela última vez trinquei e esfreguei os olhos do pó da picada.

Mas lá está imortalizada na minha cabeça e nas fotos que ganharam valor inestimável à medida que os anos passam por mim.

Como todos os que já se foram lá e cá, que por estranho que pareça continuam a ser recordados (os nomes de cada um é dito todos os anos num momento de recolhimento) como baixas do 3872, nunca lhes retirarão esse estatuto, pois eles estão no tal punhado de fotos e recordações.

Juvenal Amado

Fotos: Juvenal Amado (2009). Direitos reservados.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 1 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5041: Estórias do Juvenal Amado (23): O velho milícia

Vd. último poste da série de 23 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5328: Blogoterapia (131): Sobe a calçada, camarada, sobe (Luís Carvalhido, CCS/BART 3873, Bambadinca, 1972/74)

Guiné 63/74 - P5376: Os nossos camaradas guineenses (12): Os 53 comandos africanos mortos... Fuzilados, corrige o velho Issumane Baldé (Francisco Costa / Lusa)


1. O nosso camarada Fernando Costa (ex-Fur Mil Trms da CCS do BCAÇ 4513, Aldeia Formosa, 1973/74) ) mandou-nos há dias cópia de notícia da Lusa, sobre a cerimónia da Liga dos Combatente, do dia 14 do corrente, com o seguinte comentário:  "O Velho Baldé foi o único que disse a verdade"

[Reprodução, com a devida vénia]


Defesa: Santos Silva descerrou placa com 53 militares comandos mortos na Guiné


Lisboa, Portugal 14/11/2009 19:19 (LUSA)

Temas: Política, Defesa, governo, Sociedade

Lisboa, 14 Nov (Lusa) - O ministro da Defesa Nacional descerrou hoje uma placa com 53 nomes de militares comandos mortos na Guiné, numa cerimónia inserida nas comemorações do 91º aniversário do Armísticio de 1918 e no 86º  aniversário da Liga dos Combatentes.

Após receber honras militares no Monumento dos Combatentes, no Forte do Bom Sucesso, em Belém, Lisboa, Augusto Santos Silva participou também nas condecorações a membros da Liga dos Combatentes e na condecoração, a título póstumo, com a Grã Cruz da Medalha de Mérito Militar, do major general Carlos Manuel Costa Lopes Camilo.

O ministro, que esteve acompanhado do secretário de Estado da Defesa Nacional, Marcos Perestrello, assistiu também à cerimónia que assinalou a transladação dos restos morrtais de três soldados mortos na guerra da Guiné.

"Curvemo-nos perante os três corpos dos militares tombados na Guiné e pelos 53 soldados portugueses cujos nomes passam a figurar numa placa hoje descerrada", disse Santos Silva, ao intervir na cerimónia que contou com a presença dos diversos chefes militares, incluindo o Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, Valença Pinto.

Na ocasião, o ministro enfatizou o importante papel da Liga dos Combatentes não só no apoio e solidariedade para com os seus associados mas também na promoção e difusão dos valores e símbolos que fazem a identidade nacional.

Santos Silva considerou "excepcional" a ideia da Liga dos Combatentes de englobar também nestas comemorações o 35º  aniversário do fim da guerra portuguesa em África (Moçambique, Angola e Guiné), um palco de conflito armado em que "as tropas portuguesas deram o seu melhor, executando as missões que lhe foram confiadas" pelo poder político vigente na altura - a ditadura.

Pela guerra em África passaram "mais de um milhão de portugueses", referiu o ministro, que falou também do cruzamento de civilizações e do encontro de culturas subjacente aquele "destino português".

Quanto ao presente e ao futuro, o ministro apontou as importantes missões que as Forças Armadas Portugueses têm na imposição e manutenção da paz e em acções humanitárias, num quadro das alianças a que pertencem.

Quanto à placa hoje descerrada com os 53 nomes de militares comandos mortos na Guiné, já o ministro tinha abandonado o local e ainda ali permanecia um idoso, de nome Issumane Baldé, que assegurou à Lusa que, apesar de não ter sido dito na cerimónia, aqueles soldados naturais da Guiné tinham sido "fuzilados" após o regresso das tropas portuguesas.

FC.
Lusa/Fim

[ Revisão / fixação de texto / título / bold e sublinhados: LG]

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Nota de L.G.:

Vd. os últimos postes desta série:

 26 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4582: Os Nossos Camaradas Guineenses (11): Ernesto… procuro saber algo sobre este meu Amigo guineense (António Matos)

 14 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4526: Os Nossos Camaradas Guineenses (10): Bodo Jau, mais uma história de miséria, que nos revolta (Carlos Silva)

25 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4411: Os Nossos Camaradas Guineenses (9): O que (não) sabemos sobre os comandos africanos (Virgínio Briote)

13 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4332: Os Nossos Camaradas Guineenses (8): Braima Baldé, ex-Alf Cmd Graduado, BCA (1938-1975) (Amadu Djaló / Virgínio Briote)

Guiné 63/74 - P5375: Patronos e Padroeiros (José Martins) (5): Serviço de Administração Militar - Rainha Santa Isabel





1. Mais poste da série Patronos e Padroeiros das Armas do Exército Português, um trabalho de pesquisa do nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil, Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70).





PATRONOS E PADROEIROS - V

SERVIÇO DE ADMINISTRAÇÃO MILITAR – RAINHA SANTA ISABEL


Isabel de Aragão, nasceu em Saragoça, Reino de Aragão, em 1271, filha mais velha do rei Pedro III de Aragão e Constança da Sicília.

Na sua árvore genealógica, pelo lado materno, descende de Frederico II, Sacro Imperador Romano-Germânico, e Manfredo de Hohhenstauffen, rei da Sicília, e, além disso, uma sua tia materna foi Santa Isabel da Hungria, considerada santa pela Igreja Católica.

D. Dinis, que subiu ao trono em 1279, aos 19 anos de idade, enviou uma embaixada, constituída por João Velho, João Martins e Vasco Pires, a Aragão onde se encontravam embaixadas dos reis de França e de Inglaterra, com propostas matrimoniais para os respectivos príncipes herdeiros. A preferência recaiu sobre o monarca português.

Casaram, por procuração em 11 de Fevereiro de 1288. Deu entrada em Portugal, por Trancoso, em 26 de Junho seguinte, vila que foi acrescentada ao dote de Isabel, que constava das vilas de Abrantes, Óbidos, Alenquer, e Porto de Mós, os castelos de Vila Viçosa, Monforte, Sintra, Ourém, Feira, Gaia, Lamoso, Nóbrega, Santo Estêvão de Chaves, Monforte de Rio Livre, Portel e Montalegre, além das rendas em numerário das vilas de Leiria, Arruda, Torres Novas e Atouguia da Baleia. Também tinha os reguengos de Gondomar, Rebordões e Codões, além de uma quinta em Torres Vedras e da lezíria da Atalaia.

Deste casamento nasceram Constança (3 de Janeiro de 1290 - 18 de Novembro de 1313), que casou em 1302 com o rei Fernando IV de Castela, e Afonso (8 de Fevereiro de 1291 - 28 de Maio de 1357), sucessor do pai no trono de Portugal, com o título de D. Afonso IV.

D. Isabel evitou um confronto entre seu marido e rei de Portugal, D. Dinis, e seu filho D. Afonso, quando este sentiu que a sua sucessão podia estar em risco, dado que seu pai demonstrava ter por Afonso Sanches, seu filho bastardo, e lhe pretendeu dar combate em Alvalade em 1325.

D. Dinis morre nesse mesmo ano. D. Isabel, vestindo o habito da Ordem das Clarissas recolhe ao Convento de Santa Clara-a-Velha, em Coimbra, donde só saiu em 1366.

Foi nessa altura que D. Afonso IV, rei de Portugal, declara guerra ao seu sobrinho, o rei D. Afonso XI, filho da sua irmã Constança de Portugal, porque o rei castelhano tratava mal a esposa, D. Maria, filha do rei português.
D. Isabel, a rainha-mãe, deslocou-se para Estremoz, evitando, mais uma vez, pela sua intercessão. A paz só foi assinada em Sevilha no ano de 1339.

D. Isabel, veio a falecer em Estremoz, em 4 de Julho de 1336, vindo a ser sepultada em Coimbra no Convento de Santa Clara-a-Nova.

Sobre a Rainha Santa, como ficou conhecida, na Crónica dos Frades Menores de Frei Marcos de Lisboa de 1562 diz que “levava uma vez a Rainha santa moedas no regaço para dar aos pobres (...) Encontrando-a el-Rei lhe perguntou o que levava, (...) ela disse, levo aqui rosas. E rosas viu el-Rei não sendo tempo delas.”

A Rainha Santa Isabel de Portugal foi beatificada pela Igreja Católica em 1516, durante o pontificado do Papa Leão X e canonizada em 1625, pelo Papa Urbano VIII. Tem a sua festa Litúrgica no dia 4 de Julho.

Foi proclamado Padroeira do Serviço de Administração Militar por Portaria de 16 de Agosto de 1983 e Ordem do Exército n.º 3 (1.ª Série), de 31 de Março de 1984.

José Marcelino Martins – 24 de Novembro de 2009
[Organizado a partir de imagens e textos da Wikipédia]

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 29 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5371: Patronos e Padroeiros (José Martins) (4): Exército - Arma de Engenharia - Nossa Senhora da Conceição

domingo, 29 de novembro de 2009

Guiné 63/74 - P5374: As nossas mulheres (9): Homenagem à D. Teresa, nossa leitora e funcionária na Biblioteca da Liga dos Combatentes (José Martins)

1. Mensagem de José Martins*, (ex-Fur Mil, Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), com data de 26 de Novembro de 2009:

Caros camaradas
Junto um texto de homenagem a uma leitora assídua do nosso blogue.
Conheço-a desde 30 de Junho de 2003 e, desde então, tem sido uma óptima amiga e uma preciosa colaboradora, nunca se furtando a proporcionar-me todos os elementos que lhe solicito.
Tambem já foi referida pelo JERO.

A D. Teresa não merece só este texto. Merece todo o nosso reconhecimento, no sentido mais lato do termo.

Um abraço
José Martins


“30 Minutos”

Este programa foi passado no Canal 1 da RTP em 24 de Novembro de 2009.

Pode ser visto na página ultramar.terraweb.biz e no site http://www.ligacombatentes.org.pt/

O trabalho desenvolvido pelos profissionais Patrícia Machado (Jornalista), Pedro Boa-Alma (imagem) e Guilherme Brízido (edição), merece o nosso, de combatentes que somos, merece, dizíamos, o nosso agradecimento, por trazer, mais uma vez, à discussão a questão dos sem abrigo e, desta feita, aqueles que também deram o seu melhor na juventude e, passados largos anos, ainda não conseguiram a reintegração na sociedade ou, esta mesma, acabou por exclui-los.

Não vou comentar o trabalho da Liga no campo do Apoio Médico, Psicológico e Social, que conhecemos, pois fomos convidados para uma sessão em que intervieram o Major Dr. António Correia (Psicólogo) e a Dr.ª Filipa Santos (Assistente Social) e, no final da mesma, fiquei com a certeza de que se iniciava um novo ciclo em relação aos antigos combatentes, mas que, como sempre, muito tempo irá passar para se conseguirem resultados. No entanto o “pontapé de saída” foi dado.

Mas na reportagem o que mais me emocionou, e que merece maior destaque, foi a forma como o nosso camarada Carlos, que foi 2.º Sargento Miliciano pois cumpriu duas comissões, foi acarinhado por uma funcionária da Liga dos Combatentes.


A D. Teresa e o ex-2.º SRGT Carlos.
Imagem retirada do Programa 30 Minutos, editada e postada por CV, com a devida vénia à RTP


D. Teresa Almeida no seu local de trabalho.
© Foto José Martins – 17Nov2009


Na D. Teresa Almeida, que presta serviço na biblioteca da Liga dos Combatentes há cerca de 40 anos, e que neste momento tem em mãos uma tarefa enorme – digitalizar fotos e memórias – os combatentes têm não só uma amiga, mas diria uma “fada” madrinha de guerra ou uma irmã.

Pessoalmente sinto-me lisonjeado sempre que a procuro, e não são poucas vezes, para obter um ou outro elemento para os escritos que faço. Sempre com uma satisfação imensa, recebe e trata todos os que se lhe dirigem: parece que estamos perante alguém que sempre nos conheceu, e a quem dedica uma amizade extrema.

Basta ver a forma como se emocionou com a visita do Carlos e o acompanhou até à porta da sede da Liga ou à porta da própria casa do Carlos: a Rua.

D. Teresa Almeida no seu local de trabalho.
© Foto José Martins – 17Nov2009


Mas naquele abraço senti-me também abraçado, um abraço longo e sentido. É assim que a nossa amiga Teresa Almeida recebe os combatentes. Naquele seu espaço de trabalho, rodeado de História, parece que o tempo pára. Por isso quando temos de partir, partimos já com saudade, mas com o propósito de ali voltar o mais breve possível.

Para ELA o nosso carinho e reconhecimento eterno. Bem-haja, querida amiga!

José Marcelino Martins
26/Novembro/2009
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 29 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5371: Patronos e Padroeiros do Exército (José Martins) (4): Arma de Engenharia - Nossa Senhora da Conceição

Vd. último poste da série de 28 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5368: As nossas mulheres (12): Mãe, eu estou aqui (José Teixeira)

Guiné 63/74 - P5373: Convívios (177): O Bando do Café Progresso, reune-se uma vez por mês na cidade do Porto (Jorge Teixeira (Portojo)

1. Em mensagem do dia 28 de Novembro de 2009, o nosso camarada Jorge Teixeira (Portojo), ex-Fur Mil do Pelotão de Canhões S/R 2054, Catió, 1968/70, deu-nos a conhecer mais um local físico, que se quer venha a ser uma referência, e um local (site/sítio) de internete, ambos pontos de encontro de velhos camaradas do tempo de tropa.

Estes nossos camaradas que já estão devidamente organizados, adoptaram o nome de " O Bando do Café Progresso", vá-se lá saber porquê, esta coisa de Bando não me é estranha, mas passemos à frente.


Quem quiser aceder a esta página só terá que ir a: http://bando-do-cafe-progresso.blogspot.com/

Com a devida vénia, a fim de que se possa fazer uma ideia de quem compõe aquele Bando e o que pretendem, transcrevo o P1 da sua página.


P.1 - Apresentação do nosso sítio


O Café Progresso

Neste mais que centenário espaço, situado próximo a Carlos Alberto e ao velho edifício da Universidade, aos Leões, no Porto, começaram-se a reunir há cerca de 5 anos velhos amigos e ex-camaradas militares.

Alguns já se conheciam dos tempos de infância e adolescência. Outros foram chegando, mas somos ainda poucos os que habitualmente, todas as segundas quartas-feiras de cada mês, aqui nos juntamos.

Sempre esperamos que algum ex-camarada se nos junte, quer seja fisicamente, pela net ou por qualquer outro meio.

O convívio é o nosso prazer. Por isso estamos sempre inventando formas de o fazer. Mas é aqui, no velho Progresso, que delineamos as nossas estratégias, partilhamos as conversas de velhos tempos, comentamos outros blogues (as Tabancas do Luís Graça e a de Matosinhos são os principais), vamos revendo fotos, enfim, as velhas coisas de velhos ex-camaradas.

Escrevam-nos e apareçam.



Aqui fica a apresentação do Bando do Café Progresso.
Consultem a sua página e/ou vão numa segunda quarta-feira de um mês qualquer ao Café Progresso para encontrarem um saudável grupo de jovens que querem reviver tempos idos e passar um bom bocado de tempo.

CV
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 24 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5149: Direito à indignação (8): Fomos forçados como presidiários a cumprir pena no degredo (Jorge Teixeira/Portojo)

Vd. último poste da série de 18 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5291: Convívios (174): Camaradas da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851 procuram restaurante em Fátima para o seu convívio de 2010 (Raul Albino)