domingo, 23 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6457: Convívios (243): XX Encontro do pessoal do BCAÇ 2884, no dia 15 de Maio de 2010 na Guarda (José Firmino)

1. Recebemos do nosso camarada José Firmino, ex-Soldado da CCAÇ 2585, o pedido de publicação do XX Encontro do pessoal do BCAÇ 2884 (MAIS ALTO), que ocorreu no passado dia 15 de Maio de 2010 na Cidade da Guarda


XX ENCONTRO CONVÍVIO DO BCAÇ 2884 (MAIS ALTO) - CIDADE DA GUARDA, 15 DE MAIO DE 2010

Desta vez na Cidade da GUARDA com recepção aprazada para as 11:30h junto à IGREJA de RAPOULAS, depois da respectiva apresentação dos elementos presentes os cumprimentos habituais, o ver de quem faltou à chamada.

Eis que surge a primeira ordem de ataque mas desta vez nos esperavam umas deliciosas bolas de carne, chouriço e bacalhau que serviram para que nossos estômagos ficassem muito mais aconchegados, as bebidas apropriadas não faltaram ao acto, depois de este dever cumprido um outro muito mais importante nos esperava ou seja a celebração da Santa Missa pelos camaradas já falecidos, finda a cerimónia religiosa com algumas fotos pelo meio, com boa disposição e muita alegria.

Seguidamente tomamos o caminho do HOTEL LUSITÂNIA PARQUE, onde foi servido o almoço a gosto de todos penso, a animação também marcou presença pois um jovem de garganta afinada e finos dedos sobre o teclado de seu órgão animou e bem a rapaziada: caso para dizer assim sim.

Prestes a dar por terminado este convívio mais um se avizinha ou seja o vigésimo primeiro, desta vez na cidade da RÉGUA, lá estaremos de novo assim DEUS o permita.

Mais uma vez de referir todo empenho do nosso amigo e ex-combatente PINTO DA COSTA. BEM HAJA
FIRMINO

Pessoal do BCAÇ 2884 (Mais Alto)

Pessoal da CCS/BCAÇ 2884

Pessoal da CCAÇ 2584/BCAÇ 2884

Pessoal da CCAÇ 2585/BCAÇ 2884

Pessoal da CCAÇ 2586/BCAÇ 2884

Bolo comemorativo
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 21 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6446: Convívios (157): 21º Convívio do BCAV 8323, 6 de Junho de 2010, em Coimbra (Amílcar Ventura)

Guiné 63/74 - P6456: Álbum fotográfico do Arlindo T. Roda (ex-Fur Mil, CCAÇ 12, 1969/71) (1): Futebol em Bambadinca


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > O Fur Mil Arlindo T.Roda, natural de Pousos, Leiria, e hoje professor reformado em Setúbal, trajando à civil nos arredores de Bambadinca (numa aldeia seguramente balanta, a avaliar pela proximidade do porco preto: Santa Helena, muito provavelmente)... Ele teve a gentileza de me mandar uma selecção dos seus "slides", através do ex-Fur Mil Pel Rec Inf, CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), que vive em Palmela... Com o atraso de mais de um ano, a "encomenda" chegou finalmente às minhas mãos, isto é, ao meu Portátil...

Já não vejo o Roda desde 1994, ano em que se realizou o 1º Encontro do Pessoal de Bambadinca, 1968/71, e que teve lugar em Fão, Esposende... Na CCAÇ 12, ele era comandante da 2ª Secção da 3º Grupo de Combate (comandado pelo transmontano Abel Rodrigues) (*).  À primeira secção pertencia o infortunado Fur Mil Luciano Severo de Almeida, a quem a sorte foi madrasta: morreu de morte violenta, depois de regressar da Guiné.. E ainda à 1ª secção, também o meu amigo Carlos Alberto Alves Galvão, 1º Cabo, natural da Covilhã, o homem que cometeu a proeza de ser duas vezes ferido no decurso de uma mesma operação, a segunda vez quando ia de padiola, aos ombros de quatro camaradas, à altura do capim (**)...

Arlindo, meu querido camarada e amnigo: Fizemos operações juntos. Fomos camaradas, passámos a mesma fome e a mesma sede, corremos os mesmos riscos... Tu na altura tinhas um vantagem sobre mim: uma máquina fotográfica, que gostavas de levar em operações...

Onde quer que estejas daqui vai um abraço emocionado e um pedido: que me envies as legendas das imagens (recuperadas dos "slides")... Algumas poderei legendá-las, mas em relação a muitas falta-me informação sobre os lugares (em especial,  as tabancas em autodefesa onde estivemos juntos) e as datas...

Quero-te dizer ainda que, ontem, no 16º Convívio do Pessoal de Bambadinca, 1968/71, em Óbidos (superiormente organizado pelo nosso Fernando Almeida, ex-Fur Mil Trms, da CCAÇ 12), o visionamento das tuas imagens foi acompanhado com emoção e interesse...

Hoje limito-me a fazer uma selecção de meia de imagens referentes às grandes futeboladas que se jogavam em Bambadinca e de que o Arlindo T(eixeira) Roda era um dos grandes paladinos... Espero que os nossos leitores (em especial   a malta da CCS/BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras unidades adidas deste tempo) me possam ajudar a identicar alguns dos craques da bola cujos nomes fiquem omissos...



Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > Da esquerda para a direita: (i) primeira fila: Gabriel Çonçalves (1º Cabo Cripto),  Moreira (Alf Mil Op Esp), Arlindo Roda (Fur Mil At Inf),  Arménio Fonseca (Sold At Inf) e um 5º elemento que não identifico: (ii) segunda fila:  Fernando Sousa (1º Cabo Enf), seguido de três elementos que não identifico (o 4º parece ser um condutor auto da CCAÇ 12),  o Branco (1º Cabo At Inf) e o Branquinho (Fur Mil At Inf).


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > Da esquerda para a direita: (i) primeira fila: elemento que não identifico mas que é da CCAÇ 12, Moreira (Alf Mil Op Esp),  Carlão (Alf Mil At Inf),   Tibério Rocha (ex-Sold Cond Auto, que morreu em 2007), e Arlindo Roda (Fur Mil At Inf); (ii) segunda fila, de pé:  Gurada-redes (elemento não identificado), Fernando Sousa (1º Cabo Enf),   Arménio Fonseca (Sold At Inf), Eduardo Tavares (1º Cabo Escriturário), Branco (1º Cabo At Inf) e   e um 5º elemento que também..




Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > Mais outra equipa maioritariamente copmposta por malta da CCAÇ: Da direita para a esquerda: (i) segunda  fila, de pé: Fur Mil Joaquim Fernandes,  1º Sargento Fragata, 2º Sargento Videira, mais dois elementos que não identifico, 1º Cabo Galvão e o 1º Cabo Alves; (ii) primeira fila:  1º Cabo Branco, Moreira (?), Levezinho, Arménio Fonseca,   Roda e mais elementos não identificados.




Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) >  O nosso Roda  a evoluir com a bola, no magnífico campo de futebol de Bambadinca, à direita da pista de aviação (magnífico, no tempo seco...) (vd. foto aérea de Bambadinca


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) >  Uma movimentada jogada, com expectadores,l ao fundo, sentados em cima de um abrigo



Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) >  O campo de futebol no tempo seco


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) >  Possivelmente 2º semestre de 1969 (tempo das chuvas)

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) >  O campo de futebol no tempo das chuvas, a partir de Maio / Junho...


Fotos: © Arlindo T. Roda (2010). Direitos reservados

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Notas de L.G.:



(**) 9 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCLXXXVIII: Violenta emboscada em L (Op Boga Destemida, CCAÇ 12, CART 2520 e Pel Caç Nat 63, em Gundagué Beafada, Fevereiro de 1970) (Luís Graça)

(...) "Em marcha lenta, devido ao transporte do ferido em maca, os 2 Dest seguiram o trilho de Darsalame Baio-Gundagué Beafada, através do capim alto.

"Próximo da antiga tabanca beafada, cerca das 13h, as NT sofreriam uma violenta emboscada montada em L e com grande poder de fogo, especialmente de lança-rockets. A secção que ia na vanguarda do Dest B ficou praticamente fora de combate, tendo sido gravemente feridos, entre outros, o respectivo comandante e a praça encarregada da segurança do prisioneiro Jomel Nanquitande que, aproveitando a confusão, conseguiu fugir, embora algemado e muito provavelmente ferido.

"Devido ao dispositivo da emboscada, quase todos os Gr Com foram atingidos pelo fogo de armas automáticas e lança-rockets (testa e meio da co¬luna) e mort 60 (retaguarda).

"Devido à reacção das NT, o IN retirou na direcção de Poindon e Ponta Varela, tendo ateado o fogo ao capim para evitar a sua perseguição. O incêndio lançaria sobre as NT um enxame de abelhas, obrigando-as a fugir para uma mata próxima onde se trataram os feridos.

"Em resultado da acção fulminante do IN, as NT sofreriam 1 morto e 7 feridos entre graves e ligeiros (urn dos quais viria a falecer mais tarde), sendo 2 da CCAÇ 12 (1º Cabo Galvão, do 3º Gr Comb, e Soldado Samba Camará, do 2º Gr Comb).

"Feito o reconhecimento, não foi encontrado o prisioneiro. Apesar do incêndio provocado pelo fogo pegado ao capim, ainda se conseguiu recuperar parte do material abandonado. Levados os feridos para Gundagué Beafada, donde foram heli-evacuados, as NT retiraram para o Xime, protegidas por heli-canhão e T-6, tendo chegado ao aquartelamento por volta das 17h" (...).

Guiné 63/74 - P6455: O Spínola que eu conheci (22): Conclusão da visita de inspecção ao BART 2917 (Benjamim Durães / Jorge Cabral / Luis Graça)



COMANDO-CHEFE DAS FORÇAS ARMADAS DA GUINÉ

VISITA DE INSPECÇÃO AO BART 2917


DESPACHO ASSUNTO: - VISITA DE INSPECÇÃO AO BART 2917 (*)


(...) 12. Visita a NHABIJÕES em 15DEZ70

O Comandante do Destacamento não é o oficial que tinha feito o estágio dos reordenamentos no CC, mas sim o Comandante de um Pelotão da CCAÇ 12 sedeada em BAMBADINCA.

- Não é de aceitar este critério de que resulta um deficiente aproveitamento dos oficiais e quebra dos laços orgânicos das unidades. O Comandante do Destacamento não se revelou com capacidade para levar a cabo trabalho de tanta responsabilidade.

- Há que acertar o regime de trabalho com a população e dinamizar os trabalhos de reordenamento.

- A escola civil não tinha material didáctico nomeadamente cadernos.

13. Visita a FINETE em 19DEZ70

- O Comandante de Pelotão e os Comandantes de Secção das milícias usavam distintivos do Exército o que está expressamente proibido.

- Foram encontradas três armas mal limpas pertencentes a: - IERO BALDÉ (Comandante de Secção), UMARO DJALÓ e MALI DJAU. Estas milícias devem ser punidos com perda de vencimentos respectivamente por 15 dias o Comandante de Secção e por 10 dias os restantes.

- A população pediu armas para serem distribuídas pelos homens válidos. Há que aproveitar esta reacção para organizar a tabanca em “Auto Defesa”.

- O Comandante do Pelotão de Milícias não está à altura das suas funções; Ou melhora a sua aptidão ou dever-se-á escolher outro.

- O esquema da defesa deverá ser revisto luz do novo conceito.

14. Visita a MISSIRÁ em 19DEZ70 (**)

- O heliporto está muito atrasado, não tendo sido cumprido o determinado pelo CC, que estabeleceu a data do Natal para inauguração de todos os heliportos da Província.

- O esquema de defesa apresenta-se manifestamente deficiente; Abrigos muito mal construídos e falta de trincheiras.

- Ao sinal de alarme o pessoal concentrou-se nos abrigos em precaríssimas condições para tirar rendimento do armamento, com a agravante de entre os abrigos se situarem áreas não vigiadas nem batidas pelo fogo.

- Foi notada a carência de reabastecimentos devido ao “sintex” (único meio de reabastecimento) se encontrar avariado. Trata-se de um problema que compete resolver aos Comandos imediatamente superiores.

- A impressão geral da Inspecção a este Destacamento foi má.

15. CONCLUSÃO

A impressão geral da Inspecção ao Batalhão de Artilharia Nº 2917 foi francamente desfavorável. O Comando do BART não se encontra devidamente integrado no cumprimento da sua missão, pelo que terá de reajustar conceitos e rever modalidade de acção à luz de um novo espírito.

No campo propriamente da execução, o Batalhão não tem exercido acção de controlo e de inspecção sobre as suas Companhias, porquanto todas as anomalias constatadas pelo Comandante-Chefe já deviam ter sido remediadas pelo Comandante do Batalhão. Salvaguarda-se a acção diligente do Comandante do XITOLE e o do Comandante do Destacamento do ENXALÉ.

O Sr. Comandante-Adjunto Operacional deverá advertir o Comandante do Batalhão e orientá-lo no sentido de serem corrigidas urgentemente as anomalias verificadas.

15. DESPACHO:

- Dê-se conhecimento deste Despacho aos CMDTS de CAOP, BAT e COP. Bissau, 07 de Janeiro de 1971 O COMANDANTE-CHEFE

aa) ANTÓNIO SEBASTIÃO RIBEIRO SPINOLA


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Notas de L.G.:

(*) Conclusão da publicação do Despacho do Com-Chefe, de 7 de Janeiro de 1971, na sequência da visita de inspecção ao BART 2917. Versão transcrita por Benjamim Durães, ex-Fur Mil, Pel Rec Info, CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72).

Vd. último poste da série > 15 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6396: O Spínola que eu conheci (21): Fiquei com óptima impressão do subalterno Comandante do Destacamento do Enxalé (Benjamim Durães / Jorge Cabral / Luís Graça)

(**) O Pel Caç Nat 63 era, desde 19 de Outubro de 1970 a unidade que guarnecia o destacamento de Missirá, sendo comandado pelo Alf Mil Art Jorge Cabral. Em Missirá havia ainda o Pel Mil 201. E em Finete o Pel Mil 202.

sábado, 22 de maio de 2010

Guiné 63/74 – P6454: Estórias avulsas (36): A sabedoria do “Homem Grande” (José Nunes, ex-1º Cabo do BENG 447)


1. O nosso Camarada José Nunes (José Silvério Correia Nunes), ex-1º Cabo no BENG 447 (Brá, 15JAN68 a 15JAN70), enviou-nos em 21 de Maio de 2010, a seguinte mensagem:

Camaradas,

Das memórias que tenho da Guiné, não posso esquecer o meu ajudante na Central Eléctrica do QG, o Iotna - o meu balanta -, soldado do contingente do CTIG.

Sempre disponível, trabalhador, leal e cumpridor.

Que terá acontecido ao IOTNA? Será ainda vivo? Que fará ele hoje na dura luta pela sobrevivência na Guiné?

Aqui vai uma estória que se passou com o IOTNA:

Certo dia vi o Iotna muito sofrido e perguntei-lhe: “Que se passa?”

“Sabes dói-me muito minha cabeça!”

Fui buscar dois comprimidos LMs, que ele tomou, e mandei-o ir para a sua Tabanca.

No dia seguinte lá regressou o Iotna com uns ramos na mão.

“Deixa eu usar o teu placa.”

A placa era o disco eléctrico, que tínhamos para aquecer as refeições e cozinhar os nossos petiscos.

Fiquei curioso e a assistir ao que ele fazia, colocando as folhas em cima da placa que entretanto ia aquecendo.

As folhas aqueciam e o Iotna começou a pô-las sobre a cabeça, bem quentes.

"Mesinho prás dores." – dizia-me ele.

O dia foi decorrendo mas as melhoras não apareciam, até que ele me disse: “Tenho de ir fazer sangria.”

Eu fiquei incrédulo, pois sabia e já tinha visto fazerem sangrias a muares, mas nunca pensei que fossem efectuadas também a seres humanos.

Disse-lhe que era perigoso cortar uma veia, pois nem todos sabiam laqueá-la, mas ele insistiu que o “homem grande” da sua tabanca sabia fazê-lo e que era a única maneira de tratar tão incómoda dor.

E mais me disse, que tinha sangue a mais e pediu-me se podia ficar na Tabanca para fazer o “mesinho”.

Não lhe podia dizer que não, pois ele estava sempre a ajudar-nos a ter a Central impecável.

“Está bem, vai lá fazer o teu mesinho.”

No dia seguinte o Iotna não veio, fiquei preocupado a pensar se teria feito bem e se lhe teria acontecido alguma coisa.

Até o Iotna aparecer andei sempre angustiado, mas ele um dia apareceu todo lampeiro, sorridente e bem disposto.

Numa das "fontes" apresentava uma cicatriz sobre uma veia, cozida com um ponto.

Fiquei boquiaberto.

Como era possível tanta sabedoria acumulada no “homem grande”?

Que universidade frequentou ele?

Havia tanta coisa para aprender naquela tabanca.

Oxalá que o Iotna tenha continuado a sua vida e, onde quer que se encontre hoje, tenha ao menos boa saúde física.

Saudações cordiais.
José Nunes
1º Cabo Mec Elect do BENG 447

Emblema: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.
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Nota de MR:

Vd. último poste da série em:

22 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 – P6453: Estórias avulsas (86): Os gémeos e o Regulamento Militar (Armandino Alves, ex-1º Cabo Auxiliar de Enfermagem da CCAÇ 1589)

Guiné 63/74 – P6453: Estórias avulsas (35): Os gémeos e o Regulamento Militar (Armandino Alves, ex-1º Cabo Auxiliar de Enfermagem da CCAÇ 1589)


O nosso Camarada Armandino Alves (ex-1º Cabo Auxiliar de Enfermagem da CCAÇ 1589 - Beli, Fá Mandinga e Madina do Boé -, 1966/68), enviou-nos a seguinte mensagem, em 20 de Maio de 2010:

Camaradas,

Durante o 3º Convívio da minha Companhia, estava o pessoal junto do nosso Capitão (hoje Coronel Reformado) a relembrar os idos tempos da formação da companhia no RI 15, em Tomar, e veio à baila uma história que eu desconhecia, pois não estive lá (fui em rendição individual) e que é a seguinte.

Conforme o pessoal se ia apresentando, o 1º Sargento ia conferindo as papeladas individuais, até que, às tantas, descobriu que haviam dois irmãos gémeos na Companhia.

Pelas leis do exército dessa altura (1966), estava impedido que dois irmãos fossem mobilizados ao mesmo tempo para o mesmo TO e, se não me engano, mesmo para TOs diferentes.

Logo o 1º Sargento foi ter com o Tenente (promovido a Capitão em Fevereiro de 1967, já na Guiné) e expôs-lhe o caso em apreço, isto é, ter dois irmãos gémeos na Unidade.

Como isto se passou antes de um fim de semana, o Tenente mandou chamar os soldados ao seu gabinete e disse-lhes: “Como os regulamentos não permitem a mobilização de vós dois, ide passar o fim de semana e, entre ambos, resolvessem qual o que fica na Metrópole.”

Passou-se o fim de semana e, na segunda-feira seguinte, o Tenente voltou a chamá-los para saber qual deles ia para a Guiné e qual deles ficava.

A resposta inequívoca de ambos foi directa e clara: “Vamos os dois.”

Assim foi e felizmente vieram os dois bem vivos.

Soubemos entretanto que os dois já faleceram (morte natural).

Paz às suas almas.

Penso que esta pequena estória mostra como os nossos serviços de mobilização estavam atentos e cumpriam os Regulamentos do Exército.

Um Abraço,
Armandino Alves (Dr. Jivago)
1º Cabo Aux Enf CCAÇ 1589
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Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:

13 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 – P6385: Estórias avulsas (85): Ataque a Jumbembem no dia de Carnaval de 1974 (Fernando C. G. Araújo, ex-Fur Mil OpEsp 2ª CCAÇ/BCAÇ 4512)

Guiné 63/74 - P6452: Em busca de... (133): Jorge Barbosa, ex-Operador de Mensagens da CCS/BCAÇ 2861, Bula e Bissorã, 1969/70, procura camaradas

Em busca de camaradas, Jorge Barbosa ex-Operador de Mensagens da CCS/BCAÇ 2861, Bula e Bissorã, 1969/70.


1. No dia 6 de Maio de 2010 recebemos de João Barbosa, filho do nosso camarada Jorge Barbosa, a seguinte mensagem:

Boa tarde Sr Luís Graça,
Chamo-me João Barbosa e vim por este meio contactá-lo acerca do Blogue dos Camaradas da Guiné. O meu pai também esteve lá situado nos anos de 69 e 70 e costumo conversar com ele acerca dessa sua vossa altura.
Infelizmente não tem nenhum contacto com antigos camaradas, pois o contacto perde-se e torna-se difícil trocar quaisquer impressões. No entanto, lembrei-me de fazer uma pesquisa sobre o tema e contactos, inclusive cruzar informações na internet dos dados que ele me deu (hei-de também mostrar-lhe o blog, tem bastante valor).

Ele esteve em Binar, Encheia e Biambe, com os batalhões de caçadores 2861, 2864, 2865 e 2866, nos anos que já referi, nos operacionais de comandos e serviços, e o seu nome é Jorge Barbosa.

É possível descobrir alguém ou coisas desse teu tempo?
Quem sabe, como o blog propõe, descobrir camaradas com quem ele possa ter estado?

Eu sou seu filho, e interesso-me muito sobre o assunto. Em breve terei acesso a fotografias dessa altura que ele tem, pois de momento não estou em casa e poderei disponibilizá-las.
Era importante estabelecer o contacto, acho que seria bom, e como vejo tantos anúncios de antigos combatentes terem encontros podia ser que o meu pai também tivesse esse prazer.

Obrigado pela atenção, aguardando resposta sua.
João Barbosa.
joaocmbarbosa@gmail.com


2. No dia 16 foi enviada esta mensagem ao nosso amigo João Barbosa:

Caro amigo João Barbosa
O seu pai pertenceu ao Batalhão de Caçadores 2861, certo?

Este Batalhão foi composto pela CCS (Companhia de Comando e Serviços) e pelas Companhias Operacionais 2464; 2465 e 2466.

Confirme com o seu pai se ele pertenceu à CCS ou a uma das Companhias Operacionais. Ajudava saber o Posto e a Especialidade dele.

Entretanto pergunte-lhe se ele se lembra do Alferes Miliciano Aníbal Xavier Magalhães da CCAÇ 2465 ou do Furriel Enfermeiro Armando Pires da CCS.

Vá aos links seguintes e mostre-lhe os postes respectivos onde estão as fotos destes camaradas

Guiné 63/74 - P6378: Tabanca Grande (219): Aníbal João Vilhena Xavier Magalhães, ex-Alf Mil da CCAÇ 2465/BCAÇ 2861 (Có e Bissum-Naga, 1969/70)
e
Guiné 63/74 - P4778: Tabanca Grande (168): Armando Pires, ex-Fur Mil Enf da CCS/BCAÇ 2861, Bula e Bissorã (1969/70)

Depois diga-me qualquer coisa para eu ver se posso ajudar ainda mais.

Um abraço para si e outro para o seu pai.
Carlos Vinhal


3. No dia 19 tivemos novo contacto do João Barbosa que incluia as duas fotos reproduzidas

Sr Carlos Vinhal,
Foi com entusiasmo que recebi o seu email e mais esclarecido fiquei, pois o meu pai foi um pouco vago nas primeiras informações que me deu. Mostrei-lhe o email e em seguida a sua pagina, sobre o qual não reconheceu, mas, felizmente, o outro link que deixou sobre o Sr Armando Pires ele reconheceu logo! Em Bula e Bissorã, disse ele.

Por norma ele contou-me também que por nomes de BI era dificil ele reconhecer mais gente (dos incritos no blog) e que se tratavam lá mais pelo nome das terras donde tinham vindo. (Ex: "Oh Arouca!" Este, ao que parece, era um tipo dos morteiros, segundo ele me disse.)

O meu pai teve na CCS, era operador de mensagens, disse ele que eram no serviço dele, tratados por "charlemike". Época de Maio de 69 até Dezembro de 70. Sobre as companhias, ele disse-me que esse pessoal é que eram os verdadeiros heróis, porque íam para o mato e era norma a lei do "desenrascanso". Se no quartel pouco tinham, então os operacionais muito menos... Mais bem equipados eram os comandos e os paraquedistas, com bons camuflados e armamento, comida e etc. Ele falou-me que os uniformes não havia com números certos, eram standardizados com pouco números, que faria então eles vestirem mesmo qualquer coisa. O tecido era muito duro, e mesmo com lexívia, para amaciar, depois desfazia o uniforme.
Dado o aparte, em relação à comida, diz isto porque na Base Aérea em Bissalanca foi lá por consulta externa e viu os pequenos almoços com sumo de laranja, bife e batatas fritas que perguntou se aquilo era pequeno almoço ou almoço mesmo! (enquanto escrevo isto ele vai-me contando coisas. A organização dos soldados, disse-me por alto, que eram distribuidas 3 companhias por cada batalhão destacadas para Binar, Biambe e Encheia, diz ele, para efeitos de me fazer compreender melhor como os destacamentos funcionavam).

Perguntou-me também no momento se conhecia o Zé Maria, dono dum tasco que servia refeições, em Bissorã, antigo soldado que ficou lá.

Sobre o sr Armando Pires, o meu pai disse que jogava muito bem Ping-Pong e andava sempre de óculos, como a foto que tem na página, e que dava aos habitantes de lá que íam à enfermaria do quartel e que ele lhes dava quase sempre os comprimidos LM... "tome uma caixa deles!" quando eles se queixavam que não resultava! Injecções de água destilada às vezes também levavam! (Este email está um pouco desconexo porque estou a escrever enquanto que ele me vai contando coisas sobre esse tempo)

E que realmente o Tenente Coronel Polidoro era muito rígido, era... Diz o meu pai, que estava na tabanca da lavadeira dele, uma altura e que o Polidoro o viu, de tarde, enquanto andava a ver se apanhava algum soldado a facilitar. Mandava então o "marrachinho", o motorista dele ir buscá-los, o que aconteceu efectivamente com o meu pai uma vez, e que ficou detido durante cinco dias no quartel.

Falou-me também dum vendedor Libanês que tinha duas filhas muito bonitas, e que uma delas namorava com o alferes Barbosa, do reabastecimento. Quando ele fechava as portas do estabelecimento, cedo, era porque por norma, o quartel ía ser atacado durante a noite... Eles já sabiam que por volta das 9, 10 da noite. Nos últimos dias do mês eram quase sempre atacados, por canhões sem recuo, armas ligeiras...

Pronto, para já foram algumas notícias! Creio que se continuasse a falar com ele enquanto fosse escrevendo isto não iria sair daqui durante um bom tempo, escrevendo um ponto de vista com aspectos que nos livros não se referem e que só vocês, que estiveram mesmo lá, podem falar. Como já se faz tarde decidi resumir isto com alguns elementos que identificassem o que de comum podessem saber e relembrar. Juntamente com este texto envio-lhe duas fotografias de onde o meu pai esteve, com os colegas, de certa forma para que se quiser publicar no blogue possam alguns verem-se ou reconhecerem outros. O meu pai é o do fundo da direita direita na primeira foto e na de baixo é o segundo da esquerda agachado. Comunique o que eu lhe contei ao Sr Armando Pires, caso entenda que tenha algum valor e mostre-lhe o email que lhe enviei.

Muito obrigado pela atenção, tanto a si como o encaminhador do meu email, o Sr Luís Graça.

P.S. Se mais informação que possa prestar por parte do meu pai, (pois é comigo que ele fala muito disto, e porque eu PUXO para que ele fale, não há problema que eu colabore e lhe envie tais dados, seja a si ou ao Sr Luis Graça ou ao Sr Armando Pires!)




Cumprimentos,
João Barbosa.


4. Esta mensagem foi encaminhada por nós ao camarada Armando Pies, ex-Fur Mil Enf.º do BCAÇ 2861, do que resultou a seguinte resposta:

Camarada Vinhal
Hoje mesmo escrevi ao João Barbosa dando-lhe indicações para que ele possa estabelecer contacto com o restante pessoal da Companhia porque, como me foi dito pelo Furriel Miliciano que então chefiava as Transmissões, aquilo na foto é tudo pessoal da mesma equipa.

Foi pena só agora o João Barbosa ter batido à porta da Tabanca porque o almoço da Companhia foi no passado dia 8.

Enfim, vamos ver se o pai, que parece andar arredado dos nossos convívios, ganha ânimo para vir ao nosso encontro.

Um Grande Bem Haja pelo vosso trabalho e um abraço camarada do
armando pires
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Vd. último poste da série de 17 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6414: Em busca de... (132): Procuro Tobias Queirós, ex-Fur Mil do 15.º Pel Art.ª, Guileje e Gadamael, 1972/73 (Luís Paiva)

Guiné 63/74 - P6451: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (30): Diário da ida à Guiné - 10 e 11/03/2010 - Dias sete e oito

1. Mensagem de Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), com data de 20 de Maio de 2010:

Caro Carlos
Junto envio o relato, neste caso correspondente a dois dias, pois passou a haver uma certa acalmia no empreendimento onde estávamos.

Ter ido já a Bafata também ajudou a isso, embora começasse logo a pensar ir outra vez como se verá no próximo relato.

Um abraço.
Fernando Gouveia


A GUERRA VISTA DE BAFATA - 30

Diário da ida à Guiné – Dias Sete e Oito (10/11-03-2010)


Dia Sete:

Neste dia estava autenticamente na ressaca dos acontecimentos do dia anterior. A dose Bafatá tinha sido muito forte para mim.

Neste dia embora, não tivesse acontecido algo de muito relevante, houve porém algumas mudanças. O Pimentel e o Mesquita resolvem ir embora, tornando a fazer o mesmo caminho, África acima. Ficámos no “Anura Club” só eu e o Chico Allen. Até aí, e porque grande parte do equipamento dos “bangalôs” estava avariado, eu e o Allen ocupávamos o mesmo quarto. Com a saída dos dois camaradas pude mudar para um “bangalô” só para mim. Deixávamos de ouvir os roncos um do outro. Passámos a usufruir da privacidade tão necessária naquele clima.

Depois dos dois companheiros terem ido embora, resolvemos ir comprar qualquer coisa para comer ao almoço. Fomos ao mercado de Bula a uns 6 quilómetros (mercado mesmo, não de rua), onde pude constatar que havia de tudo o que se podia precisar: peixe, carne, legumes como os de cá e mais os de lá, e toda a espécie de fruta e produtos africanos.

A negociar a compra das bentaninhas.

A comprar uma abobrinha para a sopa.

Comprámos umas bentaninhas. Percorri todo o mercado e filmei grande parte das bancas repletas de produtos. Vieram-me à lembrança mercados que vira no Brasil semelhantes, quer pela diversidade de produtos, quer pelo colorido dos mesmos.

Enquanto eu fazia uma panela de arroz o Chico preparava as bentaninhas “au” caldo branco. Enquanto as coisas cozinhavam aperitivámos, como sempre fazíamos. Havia sempre mancarra, caju, presunto, salpicão.

Depois do café fiz a muda das minhas coisas para o novo quarto e fomos dormir a sesta, pela primeira vez em privado.

Em determinada altura (e porque apontei isso) perdi a noção do tempo. A ida a Bafatá, no dia anterior, parecia ter sido há séculos. A ideia de voltar a Bafatá começava a ganhar forma.

Depois devemos ter jantado e ido dormir mas toda essa parte foi cortada pela censura.
Até amanhã camaradas.


Dia Oito:

Ainda me lembro que há 42 anos, quando cheguei a Bafatá e na primeira noite que dormi no quarto com mais dois camaradas, as baratas eram tantas que nos dias seguintes depois de espalhar um pó próprio para resolver a situação, as tive que juntar com uma vassoura, num monte enorme. Nos dias seguintes era cada vez menor. Os camaradas estavam no fim da comissão e totalmente apanhados pelo clima.

Pois bem, também agora, quando cheguei ao Anura Club e entrei no “bangalô” que ia compartilhar com o Chico Allen, a quantidade de bichos rastejantes no pavimento era talvez de uns cem por metro quadrado. Eram baga-bagas, formigas de vários tamanhos, centopeias grandes e pequenas, etc. Como já não era periquito nessas questões, fui prevenido. No dia seguinte, no quarto só coexistiam dois seres vivos, o Allen e eu.

Ainda sobre bicharada: No empreendimento há um espaço comum a que chamam “gembrém” e cuja parte central, rebaixada uns 15cm, se destinaria a pista de dança. À volta dessa pista, era a onde cozinhávamos e fazíamos as refeições. Como na pista de dança havia um buraco, para escoar possíveis águas na época das chuvas, as formigas baga-baga instalaram-se lá e à noite era uma invasão à procura das migalhas. No dia anterior tinha criado um dispositivo para acabar com o formigueiro e como deu resultado, contrariamente ao cepticismo do Allen, neste dia a primeira coisa que fiz logo pela manhã foi varrer a bicharada.

O “gembrém” com a pista de dança.

Como tenho referido, esteve sempre muito calor durante a minha estadia. As temperaturas rondaram sempre os 40 graus. Nessa manhã, porém, esteve sempre o sol encoberto com uma camada de neblina o que tornou mais ameno esse princípio de dia.

Com pouca gente a deambular por ali era comum agora ver bandos de pássaros azuis muito brilhantes e esquilos a pequena distância.

Depois do café fomos a Bissau pois tinha que pagar a taxa correspondente ao adiamento do meu regresso a Portugal. À vinda e depois de passarmos pela ponte sobre o rio Mansoa (Amílcar Cabral), passa-se mais uma situação caricata: Há portagem no sentido para Bissau, mas à vinda, embora não se pague, existe também um portajeiro só para levantar a cancela!!!

À direita é a portagem (em direcção a Bissau) e à esquerda, não havendo portajem pode ver-se o funcionário que levanta a cancela.

Logo a seguir à ponte há uma venda de peixe e marisco e nesse dia paramos para comprar um balde de ostras (1,5 euros) com que iríamos aperitivar, para em seguida almoçarmos uma lebre de cebolada… bem regada.

A ponte Amílcar Cabral sobre o rio Mansoa.

O Allen a comprar as ostras, próximo da ponte.

A seguir à sesta fui apanhar kabaseras (frutos do embondeiro – em crioulo) para trazer, pois é muito agradável chupar o seu miolo.

Uma kabasera que nos embondeiros parecem ratos pendurados pelo rabo.

À noite faltou a energia eléctrica no sector dos nossos quartos. Tento ido ver se descobria a anomalia no quadro eléctrico verifiquei que através dele passava um enorme formigueiro de baga-baga e que também lá existia um ninho de rola (ou semelhante) com ovos. Porém o problema não estaria aí como mais tarde se veio a verificar. Certo é que inaugurei o toco de vela que tinha levado.

Até amanhã camaradas.
Fernando Gouveia
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 13 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6384: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (29): Diário da ida à Guiné - 09/03/2010 - Dia seis

Guiné 63/74 - P6450: Ser solidário (71): Visita de Guineenses a Portugal (Agostinho Gaspar)


1. Mensagem de Agostinho Gaspar* (ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas, 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1972/74), com data de 17 de Maio de 2010:

Visita de uma delegação Guineense a Portugal
Caros amigos,
Comandante, sargentos de dia à Unidade e todos os oficiais, sargentos e praças tertulianos da TABANCA GRANDE:

Como ainda sou pira nesta coisa de blogues, tenho poucos conhecimentos pessoais sobre a matéria.

Hoje venho falar de guineenses que representam grandes cidades daquele país.
Muito se tem falado ao longo do tempo de Mansoa, Bafatá, Nova Lamego (Gabu) e Catió.
António Bamba, Ana, Armando Baldé e Carlos Jaló

À uns tempos atrás: 14, 15 e 16 de Outubro de 2006, esteve em Portugal uma delegação da Guiné-Bissau, a que me juntei mais dois Camaradas ex-Combatentes (que há vários anos mantemos contacto com o povo da Guiné) e acompanhamos estes nossos visitantes numa pequena volta pelo nosso Portugal.
  • De Mansoa, veio o Engº António Bamba e sua esposa Ana (quem esteve em Catió talvez conheça a família dela, pois é filha do então chefe da tabanca e régulo de Catió), que estudou em Aveiro e é professora em Bissau. O Engº António Bamba era tropa no meu tempo, 1972/74, em Mansoa e pertencia à CCAÇ 15, com o posto de furriel miliciano, pertencendo, talvez, ao grupo do nosso caramigo Mexias Alves (que também fez parte da C.CAÇ.15). Chegou a fazer parte de um Governo, como Ministro da Saúde, e quem leu, ou tem, o livro (GUERRA PAZ E FUZILAMENTOS DOS GUERREIROS, GUINÉ 1970-1980), cujo autor é o Cor Inf Manuel Amado Bernardo (que esteve presente na mesa e foi orador no lançamento do livro Amadú Bailo Djaló), sabe que lá está escrito um depoimento dele, narrando os maus momentos por que passou, em 1975, pelo facto de ter vestido a farda portuguesa…
  • De Bafatá, veio o governador da região de Bafatá - professor Carlos Adulai Jaló.
  • De Nova Lamego (Gabu), veio também o governador Armando Mamadú Alfa Baldé.
Foi um fim-de-semana em cheio.
No sábado depois do almoço seguiram-se as visitas a Tomar e barragem de Castelo Bode (os visitantes nunca tinham visto uma barragem).
No Domingo continuaram as visitas a vários locais de Coimbra, como o Portugal dos Pequenitos, a Universidade, a Biblioteca Joanina, a Igreja de Santa Cruz e mais alguns locais que marcaram a história local.
Para grande alegria dos guineenses, encontramos um grupo de estudantes também naturais da Guiné, incluindo alguns alunos do professor Carlos Adulai Jaló e uma sobrinha da esposa do Engº António Bamba.
Reparei e tomei parte neste feliz, alegre e descontraído encontro e notei grande amizade, lado a lado, falando mistamente português e crioulo.
Fixei uma frase (que me chamou mais a atenção) disse o mestre aos seus ex-alunos: “Estamos em Portugal, falamos português!”
Até parecia um combinado ponto de encontro.
Seguimos então viagem e parámos na Mealhada para o almoço, escolhemos o restaurante “Painel”,cujo proprietário é um antigo companheiro de armas da Guiné (mais conhecido por o Simões do restaurante de Mansoa).
Foi uma grande surpresa para o Simões, ver tais visitas trinta e tal anos depois de sair da Guiné e de vender o restaurante a um cabo-verdiano, que já tinha uma casa de comidas no meu tempo, em 1972-74, onde o prato mais vendido era o bife de macaco (mais rijo do que a sola de um sapato).
Dito pelo Simões, o restaurante que o cabo-verdiano lhe comprou estava fechado e o filho do cabo-verdiano era médico num hospital em Lisboa.
Depois de bem tratados, com as conversas em dia e com uma entrada oferecida e feita especialmente preparada com produtos picantes, com o sabor a Guiné (mesmo com a língua arder o prato ficou limpo), regressamos a casa.
Ao jantar éramos uma família, a que se juntaram mais quatro ex-Combatentes, as respectivas esposas e alguns filhos, num restaurante da Boa Vista – Leiria.
A ementa foi leitão e como entre nós havia pessoal de religiões diferentes (o casal Bamba é crente em Cristo, Carlos Jaló e Alfa Baldé são crentes em Alá), cada um respeitou a crença dos outros.
Pelo motivo descrito, os nossos amigos guineenses não gostaram muito de estar a ver comer carne de porco, tendo a ementa deles sido outra acompanhada de sumos de fruta.
O casal Bamba pernoitou em minha casa, os outros dois foram para casa do Manuel Faria, que também cumpriu serviço militar na Guiné, nos últimos meses da comissão ficou-se pelo bar dos oficiais (no QG) e já visitou a Guiné três vezes (na última visita foi entregar um contentor de livros e roupas para a zona de Bafatá).
Segunda-feira continuou a viagem, desta vez para Chaves (para quem não sabe esta cidade está geminada com Bafatá), com os portugueses armados em motoristas particulares dos embaixadores.
Com marcação prévia na Câmara de Chaves fomos recebidos no Salão Nobre, pelo Sr. Presidente da Câmara.
A representar Bafatá estava o Prof. Carlos Adulai Jaló, que depois das honras protocolares e de breves discursos dos dois lados, procederam à troca de oferendas.
Os edis agradeceram-nos a visita com um almoço, num restaurante da cidade, onde estiveram presentes o Sr. Presidente e os Vereadores.
Feitas as despedidas, nós os motoristas “profissionais do volante”, ajustamos o azimute directos a Lisboa, onde os deixamos sãos e salvos das “emboscadas” existentes nas nossas “picadas” (leia-se auto-estradas).
Para a próxima vez conto mais uma passagem da Guiné.

Um abraço a todos os Camaradas tertulianos e leitores Amigos,
Agostinho Gaspar
1º Cabo Mec Auto Rodas da 3ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72
1 – Coimbra > Visita ao Portugal dos Pequenitos > Armando Amadu Baldé – Governador de Nova Lamego, Ana Bamba, António Bamba, Carlos Adulai Jaló – Governador de Bafatá, Agostinho Gaspar - "Motorista"

2 – Coimbra > Portugal dos Pequenitos > Pavilhão da Guiné
3 – Coimbra > Portugal dos Pequeninos > Pavilhão da Guiné > Bamba a explicar-me algumas das peças de artesanato
4 – Coimbra > Grupo de estudantes Guineenses que se encontraram com a comitiva (apenas por mero acaso da vida)
5 – Coimbra > Biblioteca Joanina > Agostinho Gaspar, Carlos Jaló, Ana Bamba, Engº Bamba e Armando Baldé
6 – Leiria > Santa Eufémia > Junto à casa do segundo "motorista" (Manuel Faria). Da direita para a esquerda: Carlos Jaló, Armando Baldé, Ana, António Bamba, Manuel Faria, Agostinho Gaspar, a minha Secretária Pessoal que envia os meus e-mails (a minha filha Rosa)
7 – Visita a Chaves > Executivo da Câmara Municipal de Chaves
8 – Visita a Chaves > Comitiva Guineense e “motoristas”
9 – Visita a Chaves > Troca de lembranças
10 – Visita a Chaves > Fotografia de família
11 – Visita a Chaves > Almoço

Fotos: © Agostinho Gaspar (2006). Direitos reservados.

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Notas de M.R.:
Vd. último poste desta série em:

Guiné 63/74 - P6449: O Nosso Livro de Visitas (88): Albano Dias Pereira Gomes, ex-1.º Cabo da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4615, Teixeira Pinto, 1973/74

1. Mensagem do nosso camarada Albano Gomes, ex-1.º Cabo da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4615*, Teixeira Pinto, 1973/74, com data de 13 de Maio de 2010:

Neuchâtel
Suissa

Caro Colega e Camarada
Um bom dia e muita saúde

Agradecia se publicava no seu blog, algumas fotografias minhas, enquanto militar na Guiné-Bissau.

Albano Dias Pereira Gomes
Natural de Caldas de São jorge
Santa Maria da Feira

1.° Cabo Albano Gomes, NMEC 024456873 - 73/74 - Serviço em Teixeira Pinto
Bissau - Guiné - 4.° Pelotão/2.ª CCaç/BCAÇ 4615.

Para divulgaçâo a camaradas nossos, que me têm pedido fotografias dessa época.

Um abraço a todos nossos camaradas da guerra do ultramar.
Albano Gomes.
gomesalbano@bluewin.ch


Teixeira Pinto > Albano Gomes

Teixeira Pinto > Albano Gomes, um camarada e o seu cão

Teixeira Pinto > Albano Gomes e os camaradas Vila Maior e Lourosa


2. Comentário de CV:

Caro Albano, és mais um camarada que nos lê na diáspora. É reconfortante e uma alegria para nós quando algum camarada que vive fora do nosso país se nos dirige.

A exemplo de outros ex-combatentes da Guiné na tua situação, porque não te juntas a nós. Se tens mais fotos e histórias para contares, manda uma foto tua actual e começa a fazer parte da numerosa tertúlia deste Blogue que aqui deixa por escrito e por imagens as suas memórias.

Com os mais sinceros votos de que estejas pleno de saúde, enviamos-te um abraço fraterno e solidário.

Pela tertúlia
CV
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Notas de CV:

Vd. postes no marcador BCAÇ 4615

Vd. último poste da série de 30 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6286: O Nosso Livro de Visitas (88): Aníbal João Vilhena Xavier Magalhães, ex-Alf Mil da CCAÇ 2465/BCAÇ 2861 (Guiné, 1969/70)

Guiné 63/74 - P6448: Notas de leitura (111): Rumo a Fulacunda, de Rui Alexandrino Ferreira (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso Camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil At Inf, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Maio de 2010:

Luís,
Li os teus comentários sobre as guloseimas de Bambadinca. Seria bem interessante que se desencadeasse aí uma tempestade de recordações à volta da mesa, não os acepipes de Bissau mas os desenrascanços das gazelas de mato e peixe da bolanha, bem como os cantineiros que ainda conhecemos e que nos ajudaram a levantar a moral da muita comida sorumbática a que éramos obrigados.
Quase me sinto a entrar na loja do Rendeiro (o concorrente do José Maria de Bambadinca) onde eu encomendava o caldo de mancarra à subida da rampa, para todo o contingente que me acompanhava, naquele dia.
Estou convencido que ainda vamos fazer um livro de recordações gastronómicas...

Um abraço do
Mário


O privilégio de ter combatido com grandes amigos de hoje

Beja Santos

Em 6 de Março de 2008, aquando do lançamento do primeiro livro sobre a minha comissão na Guiné, na Sociedade de Geografia de Lisboa, recebi, com uma tocante dedicatória, “Rumo a Fulacunda”, que o Rui Alexandrino Ferreira me entregou depois de me ter abraçado. Como trabalho por objectivos, e é muito difícil sair de disciplina auto-imposta, reservei a oportunidade de o ler quando me lançasse na empreitada desde demencial inventário que ninguém me pediu. Chegou o momento azado, eis as minhas impressões.

Primeiro, desvanece ver alguém que reteve, com carinho, boas memórias dos seus camaradas do grupo de combate a que esteve associado na CCaç 1420. Ilustro com o que ele escreveu sobre o soldado António Pacheco Sampaio:

“Foi o caso mais espantoso de evolução de um ser humano a que tive oportunidade de assistir.

Completamente analfabeto, era meio marreco, deformado fisicamente pela posição em que trabalhava horas a fio, quando ingressou na vida militar. De feitio introvertido e pouco falador, mais parecia um “bicho”.

Frequentou as “escolas regimentais”, aproveitou as lições que lhes ia dando e tendo rapidamente a ler e a escrever passou a interessar-se por quanto o rodeava, ganhou complexão com a ginástica que nunca tinha tido e a correr atrás de um bola como nunca tinha feito. A par de alimentação apropriada como nunca tivera, do convívio em grupo, do contacto com elementos mais evoluídos e de ideias mais abertas, ganhou novas perspectivas do mundo. Foi se transformando aos poucos, passou a ser um elemento totalmente novo, muitas coisas em que nunca tinha reparado lhe chamavam à atenção e eram motivo de espanto.

Nunca ao longo da vida voltei a ter um caso tão extremo e tão marcante como este. Nunca mais vi alguém tirar tantos benefícios da sua passagem pela tropa. Tenho por ele um imenso carinho e uma grande amizade que nem o facto de nunca mais o ter visto os diminuem. Sei por outros camaradas que leva uma vida perfeitamente normal e que se encontra bem. É quanto me basta, me orgulha e me enche de satisfação pois sei nisso que tenho o meu quinhão”.

O Rui aparece na CCaç 1420 em condições dramáticas, vinha em rendição individual. Numa emboscada, um alferes e mais cinco militares separaram-se da coluna, desorientaram-se e andaram açulados por tropas do PAIGC. Só sobreviveu um soldado. O Rui veio substituir o alferes Vasco Cardoso. Ele descreve esses terríveis acontecimentos de modo impressionante. Antes, fala-nos da sua mobilização e, chegado à Guiné, dá-nos conta da sua inserção da companhia sediada em Fulacunda. O que à partida parecia um remedeio acabou por se transformar por uma profunda estima pela gente do seu grupo de combate. Foi uma relação gradual, com inequívocas provas dadas no terreno de combate. O Rui vai deixando desfiar a sua memória, nota-se que a cronologia não é o seu forte, é muito tentado pela divagação e pelo arrastar da corrente emocional. O que ele nos oferece em livro é o crescimento de uma amizade, da formação de vínculos entre combatentes, numa atmosfera de excepção, decorrente do trauma de, logo no início da comissão, terem desaparecido seis camaradas. “Rumo a Fulacunda” deve ser percebido pela energia positiva das suas memórias e pela construção dessa relação poderosa, inquebrantável. A CCaç 1420 irá depois para Bissorã, vai ser confrontada com emboscadas, minas e operações de grande risco, abarcando Olossato, Mansabá, Cutia e a estrada para Mansoa. O Rui torna-se um frequentador da região do Oio, passaram a andar à volta do Morés à procura de bases como Mansodé, Iracunda, Santambato e Cambajo. Tudo é descrito, as grandes capturas de armamento, os grandes dissabores, os sustos tremendos, as tropas à deriva, a selvajaria em combate, as chuvas torrenciais, a sede, o cansaço extremo. Segue-se Mansoa, a CCaç 1420 não foi descansar: reabastecimentos a Bissau, havia que os transportar para Mansabá, K-3, Bissorã e Olossato. O Rui anota inúmeras solidariedades, dá conta das refregas, o K-3 era um verdadeiro quebra-cabeças, as gentes dos Morés vinham testar regularmente a resistência deste destacamento.

O segundo aspecto que gostaria de destacar é a relação do Rui com Angola, as páginas sobre Sá da Bandeira são de uma beleza incomparável, percebe-se à légua que ele tem nesta sua infância e adolescência o filão para reconstruir o mundo que se perdeu: desde os professores aos vizinhos, a natureza dos tempos livres, as transformações operadas naquela região angolana entre os anos 50 e 60, ele tem aqui um alfobre para um livro espantoso.

O Rui prometeu voltar a escrever sobre a sua segunda comissão, aquela em que ele foi determinante na preparação da CCaç 18, a operar em Aldeia Formosa. Vamos ficar naturalmente a aguardar, com expectativa, raros são os registos (como os seus) tão detalhados no campo operacional. Estou convicto que ele irá aproveitar a oportunidade para eliminar referências e críticas desajustadas e seguramente desnecessárias para o objectivo em causa: o dever de memória do combatente. Aprendemos com a vida que há recriminações, denúncias, zangas que perdem a sua razão de ser, além disso ele foi mesmo um grande combatente e é timbre das pessoas valorosas e de bom carácter deixar no anonimato a vilania e mediocridade.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 21 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6444: Notas de leitura (110): A Guerra Colonial e o Romance Português, de Rui de Azevedo Teixeira (Mário Beja Santos)