1. Comentário, ao poste P8858, pelo nosso camarada José da Câmara, que vive nos EUA, e que foi Fur Mil da CCAÇ 3327 e do Pel Caç Nat 56, Brá, Bachile e Teixeira Pinto, 1971/73) [, fioto à direita]
Caros amigos,
O professor Carlos Cordeiro, com a modéstia que o caracteriza, deixou-nos com imagens que valem palavras mil.
Em boa hora o fez, na medida que nos permite usufruir da nossa capacidade interpretativa para lermos a sua mensagem.
O nosso amigo não está só nesta sua iniciativa, nem nunca pretendeu estar. Bem pelo contrário, envolveu a Universidade dos Açores, o seu departamento de História e a Comissão Científica.
Desde logo, a universidade com o seu apoio colocou-se ao serviço da comunidade onde está inserida, dando exemplo daquilo que deveria ser o paradigma de todas as instituições públicas de educação escolar, independentemente das vertentes educativas para que estão dimensionadas.
Todas elas se o tivessem feito atempadamente teriam feito o nosso país economicamente mais viável, socialmente menos dividido, mais humanista, mais sensível e culturalmente muito mais bem apetrechado.
Porém é no centro, entre as imagens que abrem e fecham a conferência e o debate, que está a essência da mensagem que se pretendeu passar e que está a ser muito bem conseguida. Aliás, o mesmo aconteceu com as conferências anteriores e certamente acontecerá com aquelas que chegarão nos próximos tempos e pelas mesmas individualidades.
Todo o cuidado tem sido posto para que estas conferências não sejam um ponto de encontro de nadas, onde se contam histórias de guerras, de minas, de fome, de ataques aos superiores hierárquicos e às instituições constituídas. Bem pelo contrário, o que nelas se pretende é contar a história humana do que foi a guerra do ultramar e o impacto familiar, social e económico que ela teve, neste caso particular na vida dos açorianos.
Presentes estiveram combatentes e as esposas que ouviram pela primeira as suas cândidas confissões de amarguras, os porquês das suas reacções, dos seus sonhos destruídos, certamente de alguns construídos.
Entre os outros, a particularidade de se verem muitos jovens presentes. Para ouvirem e para aprenderem de nós que um dia também fomos jovens como eles, com as mesmas aspirações de vida um dia truncadas por uma guerra que não escolhemos combater, mas à qual fomos chamados. Era a nossa obrigação enquanto mancebos de Portugal.
Ali souberam que nós dignificamos o uniforme que envergámos e que não envergonhámos os nossos antepassados que em outras ocasiões e outras guerras se cobriram de glória e contribuíram para a rica história dos portugueses.
Também não será menos verdade que ali aprenderam quantos dos seus irmãos ilhéus deram a vida na defesa daquilo que, pelo menos ao tempo, tínhamos aprendido ser nosso: o Portugal Ultramarino.
Como lição última, aperceberam-se que nas euforias do 25 de Abril de 1974 e do findar da guerra, a sociedade portuguesa nos definiu e nos julgou na praça pública. Que nem esboçámos a nossa defesa, porque nos faltou a coragem e a dignidade que tantas vezes nos sustentaram nos confins de África.
Por tudo isso e muito mais, há que colmatar a nossa falha colectiva, aproximando-nos dos que então estavam em linha para nos substituir nas bolanhas da Guiné e nos planaltos e planícies de Angola e Moçambique.
Temos que nos dirigir aos jovens de hoje, aos nossos netos e aos seus amigos e contar-lhe apenas e só a verdade da guerra que combatemos enquanto soldados de Portugal.
Finalmente, julgo que se pode chegar à conclusão lógica da mensagem. É imperativo que nós, combatentes que fomos nas províncias ultramarinas, façamos um esforço sincero e persistente, não necessariamente reivindicativo, para nos reconciliarmos com a sociedade portuguesa e antes de a fazermos com o nosso inimigo de então, como alguns pretendem.
Obrigado, Carlos Cordeiro por esta lição de vida.
Um abraço amigo do tamanho do oceano que nos une.
José Câmara
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Nota do editor
Último poste da série > 29 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8835: (Ex)citações (149): Riscando os dias do calendário e ouvindo, até à exaustão, o Mendigo do José Almada, nos em bu...rakos do Cantanhez (Manuel Maia)