~
Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Contuboel > 1969 > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > > O Valdemar Queiroz, com os recrutas Cherno, Sori e Umarau (que irão depois para a CCAÇ 2590 / CCAÇ 12). Estes mancebos aparentavam ter 16 ou menos anos de idade. Eram do recrutamento local.
Foto: © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados
Envelope da carta enviada pelo Umaru Baldé ao José Valdemar Queiroz Silva (foi deliberadamente rasurado o nome da rua do destinário)
Fotos: © Valdemar Queiroz (2016). Todos os direitos reservados
Transcrição, revisão e fixação de texto (LG):
[Carta sem data nem local, tem a sua foto ao canto superior esquerdo]
AMOR NUNCA ACABA
Amor nunca acaba,
ninguém esquece dos passados ceja [seja] bem ou de mal,
eu me lembro de dia 12 de março de [19]69,quando foi [fui]
chamado para [a] vida militare [militar] Portugues[a]. na
verdade eu tinha pouco[s] anos de idade e eu era
único filho deo meu pai, e na verade minha Mamãe
revoltou[-se].disse que eu não tenho [tinha] idade para ir na guerra,
mas a pena [é que] Alferes que tinha vindo para nos levar, não podia
ouvir esta revolta, Alferes disse-nos todos somos Portugueses,
saímos [de] muito longe para defender [a] Pátria Portuguesa, antão [então],
para povo saber que [em] Portugal não há raça ben [gente] de cores, todos [todo]
cidadadão tem que ir cumprir serviço militar português.
Minha mamãe chorou, disse ai, meu Deus, ten ho meu filho único
que vai me deixar para ir morrer na guerra. Esta data era[foi] dia
de tristeza i [e] lágrimas para [o] povo de Demba Taco e Taibatá, na
verdade ficámos até às 4 horas das tarde [até] entramos no [bas] viaturas militares
para Bambadinca.
Eu com a pouca idade que eu tinha, o que podia fazer ? Todo como
homem, que sou, quando foi [fui] na recruta [em Contuboel], foi [fui] o melhor apontador de morteiro 60 1115mm [?]. Depois na especialidade foi [fui] levado para mesmo na primeira companhia [que] foi na CCAÇ 2590 [/] CCAÇ 12] onde nunca esqueço [o] sufrimento [sofrimento] que sofri para [pela]
Minha Pátria Portuguesa, na Guiné Portuguesa.
Na verdade, [em] dois anos e alguns meses que fez [fiz] como operacional,
fez [fiz] 78 operações no mato do Xime, [na] zona do Xitole e até [em] Medina [Madina] do Boé, ao lado de Ganjadude [Canjadude]. Na minha companhia,
durante dois anos só sofremos 5 soldados [mortos], 4 pretos e um vranco [branco].
Depois fui transferido para Bissau como primeiro cabo, onde fui colgado [colocado]
no comando das transmissões [, quartel de Santa Luzia,]
até ao fim de[da] guerra em 1974.
A pena [Apesar de] todosos portugueses era para [terem de] sair, eu com toda a vontade e [como ]sou [era] militar português, fui entre [foi-me entregue] um documento que disse [dizia que] tenho [tinha] licneça não limitada, até 31 de dezembro [de] [19]74, para [me a]presentar
em qualquer parte [em] que encontrar [enciontrasse] serviço português militar
ou civil. Na verdade já não podia estar na Guiné-Bissau
porque [o] partido que venceu [, o PAIGC], não quer [queria] ver nenhum soldado que era [fosse] português. Depois eu fui morar na República do Senegal
onde teve [estive] 11 anos [, até cerca de 1985]. Não tenho [tinha] meio[s] para ir para Portugal.
Depois de[do] Senegal, fui para a República do Mali onde teve [estive] um ano,
[também] não podia ira para Portugal, depois fou [fui] para [a] Costa do Marfim onde teve [estive] dois anos, [de seguida] fui para [o] Gana, 2 meses, fui para Burkina-Faso, onde fez [fiz] sete meses, fui oara [o] Togo, duas semanas,
fui para [o] Benin, [d]donde regressei-me para [a] Guiné-Conacri,
porque eu era [estava] já doente da perna direita.
Na verdade não podia voltar na [à] Guiné-Bissau
porque eu sabia muito bem que o ódio não acabou [acabara ainda] na governante [no Governo], é por isso [ e por essa razão eu] não tinha coragem de entrar nos hospitais de [dos] antigos inimigos. [Assim], curei-me [tratei-me] no estrangeiro [e] quando teve [tive] saúde, procurei-me caminho para a [voltei à] Guiné-Bissau.
Desde que regressei na [à] Guiné-Bissau já é [há] 6 anos,
na verdade ainda não temos democracia no País, é por isso [que]
hoje vou procurar onde está [estão] Portugueses no mundo,
dico [digo] bem alto Adeus, Guiné-Bissau, sou Umaru Baldé, antigo militar Português na Guiné. [Assinado U Baldé, presumindo-se que a carta seja datada de 1999, ano em que finalmente conseguiu um visto e chegou a Portugal]
1. Mensagem, de 17 do corrente, de Valdemar Queiroz [ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70] [, foto à direita]
Anexo umas cartas que me foram enviadas, nos finais dos anos 90 e princípio dos anos 2000, pelo Umaru Baldé que estava a residir na Amadora.[São quatro cartas, só duas das quais datadas, uma de 2000 e outra de 2003].
Por cá também não teve grande sorte, quer por não arranjar trabalho [estável], quer por já estar muito doente [, em 2000 esteve interno no Hospital Curry Cabral, emLisboa]. Por cá andou uns anos, voltou a ver camaradas do tempo da guerra [João Ramos, António Fernando Marques, Pina Cabral...] e sempre a tentar arranjar forma de ser reconhecido como militar do Exército Português.
Sempre concretizou o seu desejo, mas pouco tempo depois veio a morrer da grave doença que o apoquentava.aonde viria a morrer em Portugal [no antigo Hospital do Barro, em Torres Vedras, por volta de 2007/2008, com cerca de 55 anos].
Valdemar Queiroz
______________Anexo umas cartas que me foram enviadas, nos finais dos anos 90 e princípio dos anos 2000, pelo Umaru Baldé que estava a residir na Amadora.[São quatro cartas, só duas das quais datadas, uma de 2000 e outra de 2003].
O Umaru Baldé foi aquele menino soldado da CArt 11 e da CCaç 12 que já foi por nós muito falado. [Foto à esquerda, Bambadinca, 1970, foto de Bemjamim Durão]
Estas cartas que julgava desaparecidas, foram por ele ditadas a alguém com máquina de escrever ou computador e até por ele escritas.
Faz a narrativa, muito interessante, de como foi para a tropa [, recrutado em 12 de março de 1969, em Demba Taco, regulado de Badora] e como passou as passas do Algarve, neste caso a mancarra, depois da independência da Guiné, quando atravessou quase metade de África para chegar a Portugal [, em 15 de abril de 1999, tendo vivido ou sobrevido no Senegal (11 anos), Mali (1 ano ), Costa do Marfim (2 anos), Gana (2 meses), Burkina Faso (7 meses). etc, passando por Benin, Guiné-Conacri, de novo Guiné-Bissau, etc. e, por fim, Portugal].
Por cá também não teve grande sorte, quer por não arranjar trabalho [estável], quer por já estar muito doente [, em 2000 esteve interno no Hospital Curry Cabral, emLisboa]. Por cá andou uns anos, voltou a ver camaradas do tempo da guerra [João Ramos, António Fernando Marques, Pina Cabral...] e sempre a tentar arranjar forma de ser reconhecido como militar do Exército Português.
Por fim e, depois, de passar por várias internamentos hospitalares tentou arranjar dinheiro para regressar à Guiné e à sua Demba Taco em Bambadinca.
Sempre concretizou o seu desejo, mas pouco tempo depois veio a morrer da grave doença que o apoquentava.aonde viria a morrer em Portugal [no antigo Hospital do Barro, em Torres Vedras, por volta de 2007/2008, com cerca de 55 anos].
As cartas estão com as letras um pouco sumidas, pelo que para serem lidas terão de ser um pouco aumentadas para melhor leitura.
Valdemar Queiroz
Nota do editor:
Último poste da série > 11 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16473: (In)citações (98): Porque continuamos a precisar de comandos e outras tropas especiais... (Garcia Leandro, ten gen ref)
Último poste da série > 11 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16473: (In)citações (98): Porque continuamos a precisar de comandos e outras tropas especiais... (Garcia Leandro, ten gen ref)