Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
segunda-feira, 6 de outubro de 2014
Guiné 63/74 - P13698: Os Últimos Anos da Guerra da Guiné Portuguesa (1959/1974) (José Martins) (9): 7 de Abril de 1974
1. Chegados ao 25 de Abril de 1974, a independência da Guiné estava por um fio. Assim termina este trabalho de pesquisa e compilação do nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), que diz respeito aos últimos 5517 dias de luta pela independência daquele novo país.
José Marcelino Martins
Setembro de 2014
josesmmartins@sapo.pt
(FIM)
____________
Nota do editor
Postes da série de:
28 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13660: Os Últimos Anos da Guerra da Guiné Portuguesa (1959/1974) (José Martins) (1): Preâmbulo e O Início
29 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13665: Os Últimos Anos da Guerra da Guiné Portuguesa (1959/1974) (José Martins) (2): 3 de Agosto de 1959
30 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13670: Os Últimos Anos da Guerra da Guiné Portuguesa (1959/1974) (José Martins) (3): Recenseamento, Inspecção e Distribuição de Pessoal; Os Tombados em Campanha e Os Que Foram Agraciados
1 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13673: Os Últimos Anos da Guerra da Guiné Portuguesa (1959/1974) (José Martins) (4): 8 de Agosto de 1962
2 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13678: Os Últimos Anos da Guerra da Guiné Portuguesa (1959/1974) (José Martins) (5): 23 de Dezembro de 1964
3 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13684: Os Últimos Anos da Guerra da Guiné Portuguesa (1959/1974) (José Martins) (6): 4 de Setembro de 1968
4 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13689: Os Últimos Anos da Guerra da Guiné Portuguesa (1959/1974) (José Martins) (7): 3 de Agosto de 1969
e
5 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13694: Os Últimos Anos da Guerra da Guiné Portuguesa (1959/1974) (José Martins) (8): 7 de Janeiro de 1973
Guiné 63/74 - P13697: In Memoriam (199): Lisboa, Cemitério dos Olivais: a última homenagem ao comandante Alpoim Calvão (1937-2014) (Vídeo de José Colaço, ex-sold trms, CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65)... Missa do7º dia, hoje, às 19h15, na igreja paroquial de Cascais
Lisboa, parque do cemitério dos Olivais, 2 de outubro de 2014 > Alpoim Galvão (1937-2014): cortejo fúinebre com as devidas honras militares
Vídeo e foto: © José Colaço (2014). Todos os direitos reservados
1. Mensagem do José Colaço, com data de 2 do corrente, mandando-os a foto e o vídeo que publicamos acima
Lisboa, parque do cemitério dos Olivais, 2-10-2014: o tenente coronel Marcelino da Mata e o nosso camarada ex-furriel trms José Marcelino Martins enquanto esperavam o cortejo fúnebre com os restos motais do Comandante Alpoim Calvão (1937-2014).
Se acharem que devem publicar ok, caso contrário pode ficar para arquivo do blogue.
Junto também um pequeno vídeo: Cortejo fúnebre, com carro que antecede o carro fúnebre, transportando as insígnias do falecido. Uma comopanhia de fuzileiros com um terno de cornetins fazem a continêbncia
José Colaço
[ex-sold trms, CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65, que conheceu o então 1º tenente Alpoim Calvão, conandante do DFE 8, por ocasião da Op Tridente,jan-mar 1964]
PS - Sabemos pela leitura dos jornais que hoje será celebrada missa do7º dia, hoje, às 19h15, na igreja paroquial de Cascais, por sua intenção. _____________________
[ex-sold trms, CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65, que conheceu o então 1º tenente Alpoim Calvão, conandante do DFE 8, por ocasião da Op Tridente,jan-mar 1964]
PS - Sabemos pela leitura dos jornais que hoje será celebrada missa do7º dia, hoje, às 19h15, na igreja paroquial de Cascais, por sua intenção. _____________________
Nota do editor:
Último poste da série > 2 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13681: In Memoriam (198): Lisboa, Cemitério dos Olivais: uma última homenagem ao comandante Alpoim Calvão (1937-2014), por uma Companhia a três pelotões de Fuzileiros, com ternos de clarins. Fuzileiro uma vez, fuzileiro para sempre! (José Martins)o.
Guiné 63/74 - P13696: Notas de leitura (639): “Do Outro Lado das Coisas", do Embaixador João Rosa Lã (2) (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Outubro de 2014:
Queridos amigos,
O embaixador João Rosa Lã conheceu a Guiné nos primórdios do multipartidarismo.
É um observador mordaz, tanto usa a ironia fina como a farpa envenenada. Discreteia sobre o processo eleitoral, a subsidiodependência, mostra-nos um Nino Vieira tirado das peças mais virulentas de Shakespeare, cruel e timorato, em confronto com os camaradas da luta de libertação, prendendo-lhes até familiares. Passa em revista a nossa cooperação, desvela episódios anedóticos, não terá gostado do país mas amou as gentes.
Até hoje.
Um abraço do
Mário
Embaixador João Rosa Lã na Guiné-Bissau (2)
Beja Santos
Em livro recentemente dado à estampa, intitulado “Do Outro Lado das Coisas, (In) confidências Diplomáticas”, o embaixador João Rosa Lã descreve ao pormenor a sua missão na Guiné-Bissau nos anos de 1993 e de 1994, período que correspondeu às primeiras eleições livres e democráticas que o país conheceu. Repare-se que Nino Vieira e o PAIGC não eram adeptos fervorosos da democratização, foi o termo da Guerra Fria que lhes exigiu a organização de processos eleitorais transparentes e pluripartidários, se acaso não aderissem teriam consequências funestas na cooperação oferecida pelos países desenvolvidos. Nino recorreu a todas as astúcias e manobras dilatórias com o processo eleitoral, temia os resultados das eleições livres, sabia sofrer quebra na popularidade e via em ascensão o Movimento de Bafatá e o PRS, ligado a um jovem demagogo, Kumba Yalá. Apercebendo-se que as manobras dilatórias se tinham tornado insustentáveis, Nino recorreu a Portugal, pediu ajuda ao Secretariado Técnico de Apoio aos Processos Eleitorais - STAPE. Toda a oposição apoiou. Nino Vieira fez uma comunicação pública comprometendo-se a respeitar as regras democráticas. A ONU designou o antigo presidente da Comissão Eleitoral que tinha organizado as eleições em Angola, Dr. Onofre Martins dos Santos, para dirigir toda a operação de fiscalização.
O STAPE veio a revelar-se eficaz. Enquanto esta máquina era posta em funcionamento, Nino Vieira angariava novas forças de segurança, os “Ninjas”, um elemento desestabilizador e que podia conduzir a um fiasco eleitoral. As eleições aconteceram, Nino Vieira não conseguiu a maioria absoluta, teve que ir a uma segunda volta com Kumba Yalá. Mas o PAIGC manteve uma larga maioria de assentos, o Movimento de Bafatá ficou em segundo lugar e o PRS em terceiro. E o diplomata comenta: “Apesar das chuvas intensas e das dificuldades nas comunicações terrestres, com o auxílio das duas lanchas LDM, que oferecêramos à Marinha guineense, e dos helicópteros dados pelos soviéticos, que a todo o momento ameaçavam cair, a segunda volta realizou-se sob fiscalização internacional. O ato eleitoral decorreu na maior calma, mas sem grande entusiasmo popular. As pessoas estavam cansadas, os candidatos tinham esgotado os seus argumentos e a chuva, imensa, desmobilizara muita gente”. Vencedor, Nino mantinha-se silencioso, Kumba tinha lançado foguetes antes da festa, muitas forças da oposição temiam confrontos, a situação tinha-se tornado explosiva já que os partidários de Kumba tomaram conta das ruas da capital, festejando a vitória. Finalmente Nino fez uma declaração presidencial, a oposição, em parte relutante, aceitou os resultados.
Para segunda prioridade da sua missão, Rosa Lã pretendia o reforço da posição portuguesa, sentia-se o rolo compressor da influência francesa, e comenta: “Historicamente, a França, como potência colonizadora da África Ocidental, dificilmente aceitava a presença portuguesa num território que pertencia, em sua opinião, a uma zona da sua influência exclusiva”. Os diplomatas franceses faziam tudo para bajular a elite política, não havia projeto de cooperação que não incluísse uma prebenda, ao tempo a administração guineense tinha um número impressionante de Peugeots. Os problemas não acabavam aqui, Bissau, sempre a sonhar com milagres, queria substituir o peso pelo franco CFA, como veio a acontecer. Os franceses também tudo fizeram para afastar a TAP e para que a TAGB fosse integrada na AIR-AFRIQUE, operação que falhou porque esta última abriu falência. Rosa Lã, além de mordaz é por vezes chocarreio, como exemplifico: “O comportamento do embaixador francês merece uma referência especial. O homem viera desesperado para Bissau, depois de lhe terem prometido a missão em Reiquejavique, na Islândia. Descendente de uma família islandesa, o embaixador adorava o frio e a escuridão. Na sua residência, moderníssima, toda de vidro feita, com um gigantesco pé direito, mais parecendo uma gare de aeroporto, punha a temperatura ambiente a níveis dos da Islândia. Quando tínhamos a desdita de nos deslocarmos até lá, víamo-nos obrigados a vestir roupas de inverno, incluindo cascol e casaco grosso. Dava o homem a desculpa de que a aparelhagem do ar condicionado ficara mal dimensionada e ele era obrigado a ter aquela temperatura em casa”. E é igualmente impiedoso com a falta de coluna vertebral na política externa, a Guiné-Bissau vendia despudoradamente o seu reconhecimento diplomático aos Estados que dele necessitassem e mais pagassem: “Periodicamente, Bissau abria relações com o Estado e cortava com o rival. Passados uns anos, denunciava esse reconhecimento e recuperava as relações com o outro. E assim sucessivamente, desde que essa mudança desse lugar a uma compensação conveniente”. Rosa Lã desce por vezes ao nível do pátio e soalheiro, fala expressamente em Vasco Cabral sempre a pedinchar subsídios ou bilhetes de avião para Lisboa, era a imagem descarada da subsidiodependência.
O diplomata passa em revista as jóias da cooperação como o projeto do Quebo, uma experiência piloto em que fazia investigação sobre novas espécies e culturas a introduzir: “Quando saí da Guiné, o projeto derrapava e os abutres das cooperações concorrentes tentavam absorvê-lo. Apesar de todas as vicissitudes por que a Guiné-Bissau passou, ainda hoje aquele projeto se mantém e continua a ser o melhor projeto em matéria agrícola, da nossa cooperação em África”. Amante da pequena história e da historieta picante, descreve Mário Soares num almoço oferecido às delegações dos países lusófonos, após a cerimónia de posse de Nino Vieira, Soares deliciava-se vagarosamente com digestivos e charutos, fazendo pagar a Nino a indelicadeza da véspera, em que o deixara à mesa para ir acompanhar ao aeroporto o chefe de Estado do Senegal. Os últimos meses da sua estadia deram para perceber como o governo de Saturnino Costa caminhava para o colapso, faltava combustível, havia um surto de cólera, as tensões político-militares cresciam. Saído de Bissau, foi encaminhado para São Bento, tornou-se assessor diplomático do primeiro-ministro Cavaco Silva, de quem não esconde a admiração e a colaboração dada até para a sua candidatura presidencial. Rosa Lã não voltou a África, a não ser em viagens meteóricas. O povo guineense e o seu lindo sorriso ficaram-lhe no coração, di-lo abertamente.
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Notas do editor
(*) Vd. poste de 3 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13685: Notas de leitura (637): “Do Outro Lado das Coisas", do Embaixador João Rosa Lã (1) (Mário Beja Santos)
Último poste da série de 4 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13691: Notas de leitura (638): Algumas considerações às perguntas deixadas por Rui A. Ferreira no seu livro "Quebo - Nos Confins da Guiné" a propósito da retirada do Guileje (Coutinho e Lima)
Queridos amigos,
O embaixador João Rosa Lã conheceu a Guiné nos primórdios do multipartidarismo.
É um observador mordaz, tanto usa a ironia fina como a farpa envenenada. Discreteia sobre o processo eleitoral, a subsidiodependência, mostra-nos um Nino Vieira tirado das peças mais virulentas de Shakespeare, cruel e timorato, em confronto com os camaradas da luta de libertação, prendendo-lhes até familiares. Passa em revista a nossa cooperação, desvela episódios anedóticos, não terá gostado do país mas amou as gentes.
Até hoje.
Um abraço do
Mário
Embaixador João Rosa Lã na Guiné-Bissau (2)
Beja Santos
Em livro recentemente dado à estampa, intitulado “Do Outro Lado das Coisas, (In) confidências Diplomáticas”, o embaixador João Rosa Lã descreve ao pormenor a sua missão na Guiné-Bissau nos anos de 1993 e de 1994, período que correspondeu às primeiras eleições livres e democráticas que o país conheceu. Repare-se que Nino Vieira e o PAIGC não eram adeptos fervorosos da democratização, foi o termo da Guerra Fria que lhes exigiu a organização de processos eleitorais transparentes e pluripartidários, se acaso não aderissem teriam consequências funestas na cooperação oferecida pelos países desenvolvidos. Nino recorreu a todas as astúcias e manobras dilatórias com o processo eleitoral, temia os resultados das eleições livres, sabia sofrer quebra na popularidade e via em ascensão o Movimento de Bafatá e o PRS, ligado a um jovem demagogo, Kumba Yalá. Apercebendo-se que as manobras dilatórias se tinham tornado insustentáveis, Nino recorreu a Portugal, pediu ajuda ao Secretariado Técnico de Apoio aos Processos Eleitorais - STAPE. Toda a oposição apoiou. Nino Vieira fez uma comunicação pública comprometendo-se a respeitar as regras democráticas. A ONU designou o antigo presidente da Comissão Eleitoral que tinha organizado as eleições em Angola, Dr. Onofre Martins dos Santos, para dirigir toda a operação de fiscalização.
O STAPE veio a revelar-se eficaz. Enquanto esta máquina era posta em funcionamento, Nino Vieira angariava novas forças de segurança, os “Ninjas”, um elemento desestabilizador e que podia conduzir a um fiasco eleitoral. As eleições aconteceram, Nino Vieira não conseguiu a maioria absoluta, teve que ir a uma segunda volta com Kumba Yalá. Mas o PAIGC manteve uma larga maioria de assentos, o Movimento de Bafatá ficou em segundo lugar e o PRS em terceiro. E o diplomata comenta: “Apesar das chuvas intensas e das dificuldades nas comunicações terrestres, com o auxílio das duas lanchas LDM, que oferecêramos à Marinha guineense, e dos helicópteros dados pelos soviéticos, que a todo o momento ameaçavam cair, a segunda volta realizou-se sob fiscalização internacional. O ato eleitoral decorreu na maior calma, mas sem grande entusiasmo popular. As pessoas estavam cansadas, os candidatos tinham esgotado os seus argumentos e a chuva, imensa, desmobilizara muita gente”. Vencedor, Nino mantinha-se silencioso, Kumba tinha lançado foguetes antes da festa, muitas forças da oposição temiam confrontos, a situação tinha-se tornado explosiva já que os partidários de Kumba tomaram conta das ruas da capital, festejando a vitória. Finalmente Nino fez uma declaração presidencial, a oposição, em parte relutante, aceitou os resultados.
Para segunda prioridade da sua missão, Rosa Lã pretendia o reforço da posição portuguesa, sentia-se o rolo compressor da influência francesa, e comenta: “Historicamente, a França, como potência colonizadora da África Ocidental, dificilmente aceitava a presença portuguesa num território que pertencia, em sua opinião, a uma zona da sua influência exclusiva”. Os diplomatas franceses faziam tudo para bajular a elite política, não havia projeto de cooperação que não incluísse uma prebenda, ao tempo a administração guineense tinha um número impressionante de Peugeots. Os problemas não acabavam aqui, Bissau, sempre a sonhar com milagres, queria substituir o peso pelo franco CFA, como veio a acontecer. Os franceses também tudo fizeram para afastar a TAP e para que a TAGB fosse integrada na AIR-AFRIQUE, operação que falhou porque esta última abriu falência. Rosa Lã, além de mordaz é por vezes chocarreio, como exemplifico: “O comportamento do embaixador francês merece uma referência especial. O homem viera desesperado para Bissau, depois de lhe terem prometido a missão em Reiquejavique, na Islândia. Descendente de uma família islandesa, o embaixador adorava o frio e a escuridão. Na sua residência, moderníssima, toda de vidro feita, com um gigantesco pé direito, mais parecendo uma gare de aeroporto, punha a temperatura ambiente a níveis dos da Islândia. Quando tínhamos a desdita de nos deslocarmos até lá, víamo-nos obrigados a vestir roupas de inverno, incluindo cascol e casaco grosso. Dava o homem a desculpa de que a aparelhagem do ar condicionado ficara mal dimensionada e ele era obrigado a ter aquela temperatura em casa”. E é igualmente impiedoso com a falta de coluna vertebral na política externa, a Guiné-Bissau vendia despudoradamente o seu reconhecimento diplomático aos Estados que dele necessitassem e mais pagassem: “Periodicamente, Bissau abria relações com o Estado e cortava com o rival. Passados uns anos, denunciava esse reconhecimento e recuperava as relações com o outro. E assim sucessivamente, desde que essa mudança desse lugar a uma compensação conveniente”. Rosa Lã desce por vezes ao nível do pátio e soalheiro, fala expressamente em Vasco Cabral sempre a pedinchar subsídios ou bilhetes de avião para Lisboa, era a imagem descarada da subsidiodependência.
O diplomata passa em revista as jóias da cooperação como o projeto do Quebo, uma experiência piloto em que fazia investigação sobre novas espécies e culturas a introduzir: “Quando saí da Guiné, o projeto derrapava e os abutres das cooperações concorrentes tentavam absorvê-lo. Apesar de todas as vicissitudes por que a Guiné-Bissau passou, ainda hoje aquele projeto se mantém e continua a ser o melhor projeto em matéria agrícola, da nossa cooperação em África”. Amante da pequena história e da historieta picante, descreve Mário Soares num almoço oferecido às delegações dos países lusófonos, após a cerimónia de posse de Nino Vieira, Soares deliciava-se vagarosamente com digestivos e charutos, fazendo pagar a Nino a indelicadeza da véspera, em que o deixara à mesa para ir acompanhar ao aeroporto o chefe de Estado do Senegal. Os últimos meses da sua estadia deram para perceber como o governo de Saturnino Costa caminhava para o colapso, faltava combustível, havia um surto de cólera, as tensões político-militares cresciam. Saído de Bissau, foi encaminhado para São Bento, tornou-se assessor diplomático do primeiro-ministro Cavaco Silva, de quem não esconde a admiração e a colaboração dada até para a sua candidatura presidencial. Rosa Lã não voltou a África, a não ser em viagens meteóricas. O povo guineense e o seu lindo sorriso ficaram-lhe no coração, di-lo abertamente.
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Notas do editor
(*) Vd. poste de 3 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13685: Notas de leitura (637): “Do Outro Lado das Coisas", do Embaixador João Rosa Lã (1) (Mário Beja Santos)
Último poste da série de 4 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13691: Notas de leitura (638): Algumas considerações às perguntas deixadas por Rui A. Ferreira no seu livro "Quebo - Nos Confins da Guiné" a propósito da retirada do Guileje (Coutinho e Lima)
domingo, 5 de outubro de 2014
Guiné 63/74 - P13695: Estórias avulsas (80): Hojé, há pássaros! (João Rebola)
1. Mensagem do nosso camarada João Rebola (ex-Fur Mil da CCAÇ 2444, Có, Cacheu, Bissorã e Binar, 1968/70), com data de 26 de Setembro de 2014:
Olá, Carlos, boa noite
Envio-te este artigo para publicação, se assim o entenderes.
Conforme digo no início, a estória é verdadeira. No entanto, juntei-lhe uma pitada de fotos, confirmando o que se afirma para a tornar mais agradável de se ler e para aqueles que estiveram em Bissorã, possam também recordar alguma coisinha.
Aceita um abraço do
João Rebola
Hoje, há pássaros!
Esta é uma estória passada na vila de Bissorã, no já longínquo ano de 1969. Não se torna difícil para mim recordar alguns pormenores que aconteceram há mais de quatro décadas, isto porque, aí permaneci a maior parte da comissão, aí passei os melhores momentos, embora também houvesse outros menos bons, aí fiz amizades que ainda hoje perduram.
Em 2011 voltei lá e encontrei o simpático casal de comerciantes libaneses, Soad e Alfredo Kallil, onde, no seu estabelecimento, adquiri vários artigos, entre os quais, se bem me lembro, um rádio com gira-discos para ouvir as músicas e os discos em voga,”in illo tempore”. Depois de lhes mostrar fotos antigas, reconheceram-me, rejubilando de alegria.
Bom, voltemos à estória. Junto ao bar dos sargentos da CCAÇ 2444, havia (e há) uma grande mangueira, onde em determinada época do ano, ao cair da tarde, afluía enorme quantidade de pássaros para passarem a noite.
Então, pus-me a pensar como é que havia de fazer para, de vez em quando, termos uma boa ceia. Quando vim de férias, em junho de 69, levei desmontada a minha Diane 850, espingarda de pressão de ar, mas verifiquei que, de pouco ou nada servia: matava um, fugiam dezenas. Não podia ser, tinha de haver outra maneira. E ela surgiu. Havia em Bissorã um pelotão de polícia administrativa que não dependia do exército, mas sim do Administrador, Sr. Gramaxo. Como responsável pela polícia, encontrava-se o cabo Pedro.
Alguém me disse que ele (Pedro) tinha uma espingarda calibre 12. Como sabia onde era a sua tabanca, lá o encontrei, pedindo-lhe que ma emprestasse, ao que ele acedeu, depois de lhe dizer o porquê do meu pedido. Com cartuchos no bolso e arma na mão, entrei no bar e aguardei que a passarada chegasse. Não demorou muito tempo a sua vinda. Dois pretinhos, tidos como “funcionários” encarregavam-se da limpeza do bar, dos quartos, faziam as camas, etc, e que nos dias em que a arma funcionava, com a colaboração de outros e de nós próprios, ajudavam a apanhar os pássaros caídos, a depenar e a assá-los. Assim, por volta da meia-noite, começava a ceia. E que ceias! Numa dessas noites, encontrava-me de serviço no abrigo/posto de Missirá, um pouco distante do quartel e vim ao bar, no meu transporte, para petiscar com quem lá se encontrava.
O alf. António Marcão manisfestou-se negativavamente à minha chegada, deu-me cabo do juízo, mas depois de alguma discussão, acabei por ficar e acompanhá-los nesse saboroso petisco, ou não fosse eu que tivesse matado a passarada. A foto que se segue reporta essa situação, mostrando a sua indiferença.
Bissorã - 1969 - Na célebre ceia, fur. João Rebola, os alf. Vinagre (já falecido), Marcão e Carreiro (meio escondido); de costas os fur. Firmino, Cardoso e Orlando Silva.
Como se sói dizer “não há bem que sempre dure nem mal que nunca acabe”, daí, que estas ceias não terem ultrapassado mais de dois meses. E por quê? Porque até setembro de 1969, a responsabilidade do sector de Bissorã era da CCAÇ 2444, única companhia aí sediada, mas a partir daquele mês, a sede do Batalhão 2861, procedente de Bula, transferiu-se para esta localidade. E como se tal não chegasse, dias depois, surgiu o TCor Polidoro Monteiro, oficial extremamente exigente, de poucas falas e de grande respeitabilidade. Perante este quadro, não arrisquei mais tiros. Havia também outra razão, pois o comando ficava relativamente perto do bar e qualquer detonação seria facilmente ouvida.
Assim, só me restou ir entregar a arma ao cabo Pedro, deixar a passarada em paz e utilizar a pressão de ar nas rolas, quando, distraidamente, se entretinham a comer mancarra, junto à estrada de Bissorã/Mansoa.
____________
Nota do editor
Último poste da série de 18 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13624: Estórias avulsas (79): A melhor coisa que me poderia acontecer, uma viagem sem pressa que até parecia que estava no país das maravilhas (José Maria Claro)
Olá, Carlos, boa noite
Envio-te este artigo para publicação, se assim o entenderes.
Conforme digo no início, a estória é verdadeira. No entanto, juntei-lhe uma pitada de fotos, confirmando o que se afirma para a tornar mais agradável de se ler e para aqueles que estiveram em Bissorã, possam também recordar alguma coisinha.
Aceita um abraço do
João Rebola
Hoje, há pássaros!
Esta é uma estória passada na vila de Bissorã, no já longínquo ano de 1969. Não se torna difícil para mim recordar alguns pormenores que aconteceram há mais de quatro décadas, isto porque, aí permaneci a maior parte da comissão, aí passei os melhores momentos, embora também houvesse outros menos bons, aí fiz amizades que ainda hoje perduram.
Em 2011 voltei lá e encontrei o simpático casal de comerciantes libaneses, Soad e Alfredo Kallil, onde, no seu estabelecimento, adquiri vários artigos, entre os quais, se bem me lembro, um rádio com gira-discos para ouvir as músicas e os discos em voga,”in illo tempore”. Depois de lhes mostrar fotos antigas, reconheceram-me, rejubilando de alegria.
Bissorã - 1969 - Aqui está a minha suite. À esquerda, o rádio gira-discos.
Bissorã – 2011 - Manuel Sá e João Rebola com Alfredo Kallil e Soad
Bissorã – 1970 - Soad com um dos filhos de Zé Manjaco, ao colo
Bissorã – 1969 - Com Alfredo Kallil, em dia de “ronco“
Bom, voltemos à estória. Junto ao bar dos sargentos da CCAÇ 2444, havia (e há) uma grande mangueira, onde em determinada época do ano, ao cair da tarde, afluía enorme quantidade de pássaros para passarem a noite.
Bissorã - 2011 - O bar e a mangueira ainda lá estão!
Então, pus-me a pensar como é que havia de fazer para, de vez em quando, termos uma boa ceia. Quando vim de férias, em junho de 69, levei desmontada a minha Diane 850, espingarda de pressão de ar, mas verifiquei que, de pouco ou nada servia: matava um, fugiam dezenas. Não podia ser, tinha de haver outra maneira. E ela surgiu. Havia em Bissorã um pelotão de polícia administrativa que não dependia do exército, mas sim do Administrador, Sr. Gramaxo. Como responsável pela polícia, encontrava-se o cabo Pedro.
Bissorã - 1969 - Visita do Administrador ao refeitório dos soldados
Alguém me disse que ele (Pedro) tinha uma espingarda calibre 12. Como sabia onde era a sua tabanca, lá o encontrei, pedindo-lhe que ma emprestasse, ao que ele acedeu, depois de lhe dizer o porquê do meu pedido. Com cartuchos no bolso e arma na mão, entrei no bar e aguardei que a passarada chegasse. Não demorou muito tempo a sua vinda. Dois pretinhos, tidos como “funcionários” encarregavam-se da limpeza do bar, dos quartos, faziam as camas, etc, e que nos dias em que a arma funcionava, com a colaboração de outros e de nós próprios, ajudavam a apanhar os pássaros caídos, a depenar e a assá-los. Assim, por volta da meia-noite, começava a ceia. E que ceias! Numa dessas noites, encontrava-me de serviço no abrigo/posto de Missirá, um pouco distante do quartel e vim ao bar, no meu transporte, para petiscar com quem lá se encontrava.
Bissorã – 1969 - Esta era a minha Honda 50, comprada em Bissau
O alf. António Marcão manisfestou-se negativavamente à minha chegada, deu-me cabo do juízo, mas depois de alguma discussão, acabei por ficar e acompanhá-los nesse saboroso petisco, ou não fosse eu que tivesse matado a passarada. A foto que se segue reporta essa situação, mostrando a sua indiferença.
Bissorã - 1969 - Na célebre ceia, fur. João Rebola, os alf. Vinagre (já falecido), Marcão e Carreiro (meio escondido); de costas os fur. Firmino, Cardoso e Orlando Silva.
Bissorã – 1969 - Ao fundo o alf. Beirão, fur. Firmino, alf. Carreiro e fur.Rebola, brindando
Como se sói dizer “não há bem que sempre dure nem mal que nunca acabe”, daí, que estas ceias não terem ultrapassado mais de dois meses. E por quê? Porque até setembro de 1969, a responsabilidade do sector de Bissorã era da CCAÇ 2444, única companhia aí sediada, mas a partir daquele mês, a sede do Batalhão 2861, procedente de Bula, transferiu-se para esta localidade. E como se tal não chegasse, dias depois, surgiu o TCor Polidoro Monteiro, oficial extremamente exigente, de poucas falas e de grande respeitabilidade. Perante este quadro, não arrisquei mais tiros. Havia também outra razão, pois o comando ficava relativamente perto do bar e qualquer detonação seria facilmente ouvida.
Assim, só me restou ir entregar a arma ao cabo Pedro, deixar a passarada em paz e utilizar a pressão de ar nas rolas, quando, distraidamente, se entretinham a comer mancarra, junto à estrada de Bissorã/Mansoa.
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Nota do editor
Último poste da série de 18 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13624: Estórias avulsas (79): A melhor coisa que me poderia acontecer, uma viagem sem pressa que até parecia que estava no país das maravilhas (José Maria Claro)
Guiné 63/74 - P13694: Os Últimos Anos da Guerra da Guiné Portuguesa (1959/1974) (José Martins) (8): 7 de Janeiro de 1973
1. Publicação da oitava e penúltima parte do trabalho de pesquisa e compilação do nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), que diz respeito aos últimos 5517 dias de luta pela independência da então Guiné Portuguesa.
(Continua)
____________
Nota do editor
Último poste da série de 4 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13689: Os Últimos Anos da Guerra da Guiné Portuguesa (1959/1974) (José Martins) (7): 3 de Agosto de 1969
Guiiné 63/74 - P13693: Blogpoesia (392): Boca seca ... [Mafra, 5 de outubro de 2014, 4h14] (J. L. Mendes Gomes)
Boca seca…
por J. L. Mendes Gomes
[, ex- alf mil da CCAÇ 728. Cachil, Catió e Bissau, 1964/66]
[, ex- alf mil da CCAÇ 728. Cachil, Catió e Bissau, 1964/66]
Tenho a boca seca
De pregar aos peixes,
Como Santo António de Lisboa.
Levanto-me de madrugada
Preparando diligentemente,
O comer do dia.
Pelo raiar da aurora,
Vou de porta em porta,
Pôr um saco na maçaneta,
Ainda quentinho,
Ali fica o pão esperando
Que se entreabra
E uma, ainda nua,
O tire, por uma greta.
E, pouco depois,
O barre quente
Com pouca manteiga.
E o mastigue
E saboreie…
Como Santo António de Lisboa.
Levanto-me de madrugada
Preparando diligentemente,
O comer do dia.
Pelo raiar da aurora,
Vou de porta em porta,
Pôr um saco na maçaneta,
Ainda quentinho,
Ali fica o pão esperando
Que se entreabra
E uma, ainda nua,
O tire, por uma greta.
E, pouco depois,
O barre quente
Com pouca manteiga.
E o mastigue
E saboreie…
E, não é que,
Horas depois,
No meu regresso,
O saquinho triste
Ainda lá sofre,
Calor ou frio, dependurado…
Mafra, 5 de Outubro de 2014
4h14m
( foi para esta miséria e desgraça…que há cem anos, os nossos egrégios fizeram a revolução da República!?...)
Joaquim Luís Mendes Gomes
_______________Horas depois,
No meu regresso,
O saquinho triste
Ainda lá sofre,
Calor ou frio, dependurado…
Mafra, 5 de Outubro de 2014
4h14m
( foi para esta miséria e desgraça…que há cem anos, os nossos egrégios fizeram a revolução da República!?...)
Joaquim Luís Mendes Gomes
Nota do editor;
Últ6imo poste da série > 11 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13598: Blogpoesia (391): Baladas de setembro... (J. L. Mendes Gomes, ex- alf mil, CCAÇ 728. Cachil, Catió e Bissau, 1964/66)
Últ6imo poste da série > 11 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13598: Blogpoesia (391): Baladas de setembro... (J. L. Mendes Gomes, ex- alf mil, CCAÇ 728. Cachil, Catió e Bissau, 1964/66)
Guiné 63/74 - P13692: Álbum fotográfico do Victor Neto, ex-fur mil, CCAÇ 557 (Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65) > Cachil: parte I
Guiné > Região de Tombali > Cachil > CCAÇ 557 (Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65) > Foto nº 3 > Mata destruída e a vista parcial do quartel do Cachil do lado do cais... porque no lado oposto seria muito perigoso para o fotógrafo, nunca se sabia quando é que um turra poderia estar na mata grande do Cachil... Uma das baixas que a companhia teve logo quase à chegada foi de um tiro isolado quando o soldado estava a cavar o abrigo. Além disso era uma zona que estava armadilhada e pessoal estava avisado para não a usar, embora durante o dia e nos dias em que havia batidas à mata do Cachil as armadilhas eram desactivadas para evitar acidentes.
Guiné > Região de Tombali > Cachil > CCAÇ 557 (,Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65) > Foto nº 3 A > O sistema de deteção de intrusos... As famosas garrafas de cerveja vazias, presas ao arame farpado... Mas um exemplo prtático da arte do desenrascanço dos tugas... (LG)
Guiné > Região de Tombali > Cachil > CCAÇ 557 (Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65) > Foto nº 2 > .> Cais do Cachil ainda na época seca.
..
Guiné > Região de Tombali > Cachil > CCAÇ 557 (Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65) > Foto nº 7 > A lancha do Cachil [, que vinha de Catió,] o lodo e a lama e o trabalho de escravos.
Guiné > Região de Tombali > Cachil > CCAÇ 557 (Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65) > Foto nº 9 > Escravatura em ação.... O transporte dos toros para a construção da paliçada e casernas.
Fotos (e legenda): © Victor Neto / José Colaço (2014). Todos os direitos reservados [Edição : LG]
1. Fotos falantes do Cachil, diz o José Colaço. E, se são falantes, (quase) não precisam de legenda... Pertencem ao do álbum do ex-fur mil Victor Neto (CCAÇ 557, Cachil, Bissau, Bafatá, 1963/65).
Cá aqui fizemos o convite público para ele ingressar na Tabanca Grande (*). É um camarada do tempo da caqui amarelo. Vou mandar um mail, à esposa, Maria Elisa Neto. Só preciso de uma foto atual...
Um grupo de combate da CCAÇ 557 também participou diretamente na Op Tridente (jan-mar 1964) (**)
Guiné > Ilha do Como > 1964 > Op Tridente (de 14 de Janeiro a 24 de Março de 1964) > Posição relativa de Cachil, a sudoeste de Catió, na ilha de Caiar... As outras ilhas eram Como e Catundo... Croquis de Mário Dias.
Infografia: © Mário Dias (2005) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados
[As ilhas de Caiar, Como e Catunco estavam separadas do continente, a norte pelo Rio Cobade, a oeste pelo Rio Tombali, a leste pelo Rio Cumbijã, e a sul pelo oceano Atlântico... A ligação de Cachil (na margem esquerda do Rio Cobade) a Catió fazia-se de barco, pelo Rio Cobade e depois pelo seu afluente, o Rio Cagopère (em cuja margem direita se situava o porto exterior de Catió)] (LG)
[ "A designada Ilha do Como é, na realidade, constituída por 3 ilhas: Caiar, Como e Catunco mas que formam na prática um todo, já que a separação entre elas é feita por canais relativamente estreitos e apenas na maré-cheia essa separação é notória.
"Na ilha não existia qualquer autoridade administrativa nem força militar pelo que o PAIGC a ocupou (não conquistou) sem qualquer dificuldade em 1963. As tabancas existentes são relativamente pequenas e muito dispersas. Possui numerosos arrozais, o que convinha aos guerrilheiros pois aí tinham uma bela fonte de abastecimento, acrescido do factor estratégico da proximidade com a fronteira marítima Sul e o estabelecimento de uma base num local que facilitava a penetração na península de Tombali e daí poderia ir progredindo para Norte.
"Não tinha estradas. Apenas existia uma picada que ligava as instalações do comerciante de arroz, Manuel Pinho Brandão (na prática, o dono da ilha) a Cachil. A partir desta localidade o acesso ao continente (Catió) era feito de canoa ou por outra qualquer embarcação. A casa deste comerciante era, se não estou em erro, a única construída de cimento e coberta a telha.
"Portugal não exercia, de facto, qualquer espécie de soberania sobre a ilha. Tornava-se imperioso a recuperação do Como. Foi então planeada pelo Com-Chefe a Operação Tridente na qual foram envolvidos numerosos efectivos, divididos em 4 Agrupamentos (...), num total de cerca de 1200/1300 homens"] (Mário Dias)
____________________
[As ilhas de Caiar, Como e Catunco estavam separadas do continente, a norte pelo Rio Cobade, a oeste pelo Rio Tombali, a leste pelo Rio Cumbijã, e a sul pelo oceano Atlântico... A ligação de Cachil (na margem esquerda do Rio Cobade) a Catió fazia-se de barco, pelo Rio Cobade e depois pelo seu afluente, o Rio Cagopère (em cuja margem direita se situava o porto exterior de Catió)] (LG)
[ "A designada Ilha do Como é, na realidade, constituída por 3 ilhas: Caiar, Como e Catunco mas que formam na prática um todo, já que a separação entre elas é feita por canais relativamente estreitos e apenas na maré-cheia essa separação é notória.
"Na ilha não existia qualquer autoridade administrativa nem força militar pelo que o PAIGC a ocupou (não conquistou) sem qualquer dificuldade em 1963. As tabancas existentes são relativamente pequenas e muito dispersas. Possui numerosos arrozais, o que convinha aos guerrilheiros pois aí tinham uma bela fonte de abastecimento, acrescido do factor estratégico da proximidade com a fronteira marítima Sul e o estabelecimento de uma base num local que facilitava a penetração na península de Tombali e daí poderia ir progredindo para Norte.
"Não tinha estradas. Apenas existia uma picada que ligava as instalações do comerciante de arroz, Manuel Pinho Brandão (na prática, o dono da ilha) a Cachil. A partir desta localidade o acesso ao continente (Catió) era feito de canoa ou por outra qualquer embarcação. A casa deste comerciante era, se não estou em erro, a única construída de cimento e coberta a telha.
"Portugal não exercia, de facto, qualquer espécie de soberania sobre a ilha. Tornava-se imperioso a recuperação do Como. Foi então planeada pelo Com-Chefe a Operação Tridente na qual foram envolvidos numerosos efectivos, divididos em 4 Agrupamentos (...), num total de cerca de 1200/1300 homens"] (Mário Dias)
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Notas do editor:
(**) Vd. poste de 20 de junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2970: Ilha do Como, Cachil, Cassacá, 1964: O pós-Operação Tridente (José Colaço)
(...) Li com muito apreço o relato correcto que o camarada Mário Dias escreve sobre a Operação Tridente, em Cauane - a que nós que estávamos no Cachil chamávamos a Praia - , os desmentidos a João de Melo e a José Freire Antunes. OK, nós, companhia de caçadores 557, também lá tínhamos um pelotão que era uma força activa às ordens do Tenente-coronel Fernando Cavaleiro.
Parece que o Mário desconhece este facto, pelo menos não li nada em que o Mário fizesse referência a esses homens.
As declarações que o Coronel Fernando Cavaleiro faz ao programa A Guerra, de Joaquim Furtado, são de uma veracidade a toda a prova embora, como se compreende, bastante resumidas. Os meus parabéns a ambos. (...)
sábado, 4 de outubro de 2014
Guiné 63/74 - P13691: Notas de leitura (638): Algumas considerações às perguntas deixadas por Rui A. Ferreira no seu livro "Quebo - Nos Confins da Guiné" a propósito da retirada do Guileje (Coutinho e Lima)
1. Mensagem do dia 27 de Agosto de 2014 do nosso camarada Alexandre
Coutinho e Lima, Coronel de Art.ª na situação de Reforma (ex-Cap Art.ª, CMDT da
CART 494, Gadamael, 1963/65; Adjunto da Repartição de Operações do COM-CHEFE das FA da Guiné, 1968/70 e ex-Major Art.ª, CMDT do COP 5, Guileje, 1972/73):
Há dias tive conhecimento da publicação do livro QUEBO - NOS CONFINS DA GUINÉ, cujo Autor é o nosso Camarada RUI ALEXANDRINO FERREIRA, a quem felicito por nos deixar mais uma excelente obra sobre a guerra da Guiné.
Nota - Os sublinhados são meus.
Nota do editor
Último poste da série de 3 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13685: Notas de leitura (637): “Do Outro Lado das Coisas", do Embaixador João Rosa Lã (1) (Mário Beja Santos)
Há dias tive conhecimento da publicação do livro QUEBO - NOS CONFINS DA GUINÉ, cujo Autor é o nosso Camarada RUI ALEXANDRINO FERREIRA, a quem felicito por nos deixar mais uma excelente obra sobre a guerra da Guiné.
No último capítulo, o Autor formula várias perguntas, das quais se transcreve a que se refere à Retirada de Guilleje:
"7.
Porque não se realizou. relativamente ao abandono de Guileje, o
julgamento de Coutinho e Lima? Quais os motivos para uma amnistia, tão
rápida? Porque não prosseguiu o julgamento todo o caminho que lhe
faltava? Quem tinha medo que a verdade não correspondesse à sua?"
Sobre estas interrogações, entendo fazer algumas considerações.
O
meu julgamento não se realizou e não prosseguiu todo o caminho que lhe
faltava porque, em 10MAI74, a Junta de Salvação Nacional (JSN) mandou
publicar o Decreto-Lei n.º 194/74, que amnistiava vários crimes, entre
os quais aqueles de que era acusado e, em consequência, o processo que me
foi instaurado, foi arquivado.
Os motivos para uma amnistia tão rápida só poderiam
ser esclarecidos pelo Sr. General António de Spínola, Presidente da JSN
ou, eventualmente, outros elementos da mesma Junta.
Quem tinha medo que a verdade não correspondesse à sua?
Antes de arriscar uma resposta, vou dar as informações que se relacionam com o assunto.
O Comando Chefe das Forças Armadas da Guiné teve conhecimento, pelo menos, em 27DEZ72, das intenções do PAIGC sobre Guileje.
Com efeito, consta do Anexo VI - Extracto do
Relatório de Interrogatório - 27DEZ72 (pág. 410 do meu livro - A
Retirada de Guileje, este interrogatório foi efectuado, nessa data, ao
nativo, Mário Mamadu Baldé, de 25 anos, natural de Cacine), o seguinte:
"INTENÇÕES DO IN
...........
2.
NA FRONTEIRA SUL: Refere que o IN pretende fazer um ataque com bastante
força a GUILEJE, porque pretende obter uma maior liberdade de
movimentos logísticos de pessoal no corredor de GUILEJE. Para isso,
ficaram em KANDIAFARA alguns elementos que vieram recentemente dum
estágio de Artª. na Rússia, para futuros reconhecimentos na área de
GUILEJE e preparar a acção."
..........
Só tive conhecimento deste importante documento quando tive acesso ao processo que me foi instaurado.
É INACREDITÁVEL que não me tivesse sido dado conhecimento deste documento, quando fui nomeado Comadante do COP 5, em 8 JAN 73.
Em 15MAI73,
teve lugar no Quartel General do Comando-Chefe das Forças Armadas da
Guiné, sob a presidência do Sr. General António de Spínola, uma
reunião de Comandos, na qual participaram os Senhores Comandantes dos 3
Ramos das Forças Amadas - Exército, Marinha e Força Aérea, o Sr.
Comandante Adjunto Operacional, o Sr. Chefe de Estado-Maior do Comando
Chefe e os Senhores Chefes das Repartições de Informações (REP/INFO) e
de Operações (REP/OPER).
A acta dessa importante reunião, com 63 páginas, encontra-se no Arquivo Histórico-Militar e já foi difundida no nosso blogue.
Dessa acta, transcrevo, a seguir, algumas declarações-
O Sr. Comandante Adjunto Operacional - Sr. Brigadeiro Leitão Marques, afirmou:
"..............
No mínimo, e disso não restam quaisquer dúvidas, o IN está a preparar as necessárias condições de destruição de guarnições menos apoiadas por dificuldades de acesso (GUIDAGE, BURUNTUMA, GUILEJE, GADAMAEL, etc), a fim de obter os êxitos indispensáveis à sua propaganda internacional e manobra psicológica - isto está já ao alcance das suas possibilidades militares.
Quanto às vantagens para a manobra psicológica In, não podemos esquecer que qualquer
êxito pode conduzir à captura de prisioneiros em número tal que possa
constituir um elemento de pressão psicológica sobre a Nação Portuguesa.
..............
Assisti ao pressionamento
psicológico ao povo americano, por causa dos seus prisioneiros no
Vietnam do Norte durante quatro anos e senti em toda a sua profundidade o
efeito desmobilizador desse pressionamento, o qual, em larga medida,
juntamente com o elemento económico, levou à agitação interna das massas
e à capitulação , apesar de todo o poderio militar americano.
O que acontecerá se tivermos de enfrentar situação semelhante?
................."
Nota - Os sublinhados são meus.
Da intervenção do Sr. Chefe da REP/INFO ( Sr. Ten Cor. de Infª. Artur Baptista Beirão), transcreve-se:
"...........
No imediato, julga-se que o IN:
..........
_ intente uma acção tipo
convencional com carros de combate contra GADAMAEL, GUILEJE e/ou
BURUNTUMA, tirando partido da vulnerabilidade destes pontos a este tipo
de acções e visando o aniquilamento ou captura das guarnições;
..........
Num futuro próximo, prevê-se que o IN, partindo do clima de denso agravamento que a sua actividade imediata proporcionará:
_ temte a eliminação sistemática das guarnições mais expostas sobre a fronteira, em acções isoladas de tipo convencional;....
...........
Resta
referir , a finalizar, ....não permitem, como desejaria, uma melhor
adjectivação das zonas preferenciais de esforço do IN...
...e apenas pode concluir-se por uma situação na qual todo o T.O., sem qualquer exclusão, acaba por constituir uma vasta área de preocupação, na qual dificilmente se podem, no momento, visualizar priorizações.
..........."
Ainda, relativamente às intenções do IN, no âmbito da REP/INFO, transcrevo parte da pág, 40 do meu livro:
"Em 09MAI73, a CCAÇ 3556 (EMPADA), enviou a mensagem 499, comunicando a
existência de um grupo In na fronteira, com carros de combate que
pretendiam atacar GUILEJE; a mesma Companhia rectificou esta mensagem
através de outra - 507/73, referindo a presença nas matas de GUILEJE de
um grupo de 35 cubanos e dois grupos de 45 elementos cada, preparados
para atacar e aguardando ordens de "NINO".
Em 15MAI73, a CCAÇ 6 (BEDANDA) informou, através da mensagem
586/C, a chegada em 10MAI, de 4 grupos vindos da REP. GUINÉ e a
chegada a KANDIAFARA de cerca de 50 cubanos. Esta mensagem não foi
enviada ao COP 5".
Da intervenção do Sr. Chefe da REP/OPER (Sr.Ten Cor. do CEM Mário Martins Pinto de Almeida), transcreve-se:
".............
Se não forem concedidos os reforços solicitados as armas que permitam às NF enfrentar o IN actual...
julga-se que será necessário remodelar o dispositivo, reforçando
guarnições que sob o ponto de vista militar se considerem essenciais e
que permitam, à luz de outras concepções de manobra, desencadear mais
tarde acções ofensivas de grande envergadura para recuperação das
posições enfraquecidas, ou estruturar uma manobra de feição
caracterizadamente defensiva baseada na implantação de um certo número
de pontos de apoio a sustentar a todo o custo. Mas neste caso, as
missões actualmente dadas às NF, em termos de protecção das populações e
apoio ao esforço principal da manobra de contra-subversão centrado na
manobra sócio-económica, teriam de ser revistas.
...........
A ameaça de utilização,
pelo IN, de carros de combate, em golpes de mão sobre as guarnições de
fronteira, aconselha a, desde já, dotar, pelo menos as guarnições
indicadas pela Repartição de Informações como mais susceptíveis de
ataques deste tipo, de meios que permitam a sua defesa anti-carro. Com o
armamento que possuem e com o pessoal treinado para o tipo de guerra
que temos enfrentado até ao presente, as guarnições apresentam-se
impotentes e inaptas para fazer face à nova ameaça."
Lembra-se que, na data
(15MAI73), em que se realizou a Reunião de Comandos, já estava em
curso, desde 08MAI, o ataque do PAIGC a GUIDAGE: É bastante estranho
que, na acta da referida reunião não apareça nenhuma alusão a tal
acontecimento.
As transcrições atrás indicadas, merecem-me os comentários seguintes.
Acerca da intervenção do Sr. Brigadeiro Leitão Marques, Comandante Adjunto Operacional que, em 22MAI73, foi nomeado, pelo Sr, General Comandante-Chefe para proceder a auto de corpo de delito contra mim.
Se eu tivesse conhecimento desta acta de Reunião de Comandos,
quando fui por ele ouvido, em 31MAI73, perante a última pergunta:
"Quando decidiu retirar tinha ponderado os altos prejuízos para a Nação resultantes desse procedimento?"
Certamente, ter-lhe-ia respondido com a pergunta seguinte:
"Pensou bem na hipocrisia desta pergunta, face às suas declarações na Reunião de Comandos de 15MAI73?"
Acerca das declarações do Sr. Ten. Cor. de Inf.ª Artur Baptista Beirão, Chefe da Repartição de Informações, teria formulado as seguintes perguntas:
- Quais as diligências que mandou efectuar,
relativamente ao Relatório de Interrogatório, feito em 27DEZ72, ao
nativo Mário Mamadu Baldé, tendo em vista a verosimilhança e fiabilidade
desse relatório e a que conclusões chegou?
- Porque não me foi dado conhecimento desse relatório, depois de eu ter sido nomeado, em 08JAN73, Comandante do COP 5?
-
Porque julgava que o IN intentasse, no imediato, "uma acção tipo
convencional, com carros de combate, contra GADAMAEL, GUILEJE,...",
quando esta comunicação da Companhia de EMPADA, em 09MAI73, foi
rectificada por outra mensagem da mesma Companhia?
-
Porque não foi enviada ao COP 5, em 15MAI73, a mensagem 586/C da
Companhia de BEDANDA, informando a chegada em 10MAI, de 4 grupos vindos
da REP. GUINÉ e a chegada a KANDIAFARA de cerca de 50 cubanos?
- As mensagens das Companhias de
EMPADA e BEDANDA, associadas a outras eventuais informações que a
REP/INFO tinha, não eram suficientes para prever, com grande
probabilidade um ataque do IN a GUILEJE?
Acerca das declarações do Sr, Ten. Cor. do CEM Mário Martins Pinto de Almeida Chefe da Repartição de Operações, teria feito as seguintes perguntas:
- Nas suas declarações na Reunião de Comandos de
15MAI73, quando referiu que era necessário reforçar guarnições... que
se considerasssem essenciais, estava a pensar na guarnição de GUILEJE?
Se a resposta for SIM, que propostas fez para que esta guarnição fosse
reforçada?
- Tendo afirmado que era necessário dotar
com meios de defesa anti-carro, as guarnições que a REP/INFO
considerasse mais susceptíveis de ataques desse tipo e tendo esta
Repartição indicado GUILEJE como uma das mais ameaçadas, no imediato, que propostas fez para que GUILEJE fosse dotada de meios de defesa anti-carro?
Para
concluir e atendendo às considerações feitas, atrevo-me a afirmar que quem tinha medo que a verdade não fosse a sua, seriam o Sr.
Comandante-Chefe, o Sr. Comandante Adjunto Operacional ( que, da
maneira como conduziu o auto de corpo de delito, não teve como objectivo
primeiro a procura da verdade) e os Senhores Chefes das Repartições de
Informações e Operações.
Com os meus cumprimentos
Alexandre da Costa Coutinho e Lima
(Coronel de Artª. Reformado
Ex-único Comandante do COP 5, em GUILEJE)
************
OBS: O nosso pedido de desculpa ao Coronel Coutinho e Lima pela demora na publicação desta sua mensagem.
O editor
____________************
OBS: O nosso pedido de desculpa ao Coronel Coutinho e Lima pela demora na publicação desta sua mensagem.
O editor
Nota do editor
Último poste da série de 3 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13685: Notas de leitura (637): “Do Outro Lado das Coisas", do Embaixador João Rosa Lã (1) (Mário Beja Santos)
Guiné 63/74 - P13690: Bom ou mau tempo na bolanha (69): Da Florida ao Alaska, num Jeep, em caravana (9) (Tony Borié)
Sexagésimo oitavo episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGRU 16, Mansoa, 1964/66.
Da Florida ao Alaska, nono dia
Já há algum tempo que tínhamos passado o Paralelo 48 N, onde dizem que são mais ou menos 48 graus a norte do plano equatorial terrestre e, a esta latitude o sol nos aquece e ilumina por muitas horas ao dia, pelo menos no verão, tudo isto era verdade, pois na viajem pelo “Klondike Loop”, que é como chamam ao desvio de estrada de terra, com algum alcatrão, pedra e lama, pois dizem que o pavimento é “seal coat & gravel”, que está aberta todo o ano, mas no inverno, quando o tempo é de tempestade, algumas partes do trajecto fecham. Tem uma distância mais ou menos de 500 milhas, é uma estrada “deserta”, vêem-se alguns animais selvagens, sobretudo “coiotes”, começa pouco depois da cidade de Whitehorse, portanto no “Alaska Highway”, na província de Yukon, no Canadá, e termina já no estado do Alaska, na povoação de Tok, também no “Alaska Highway”.
Explicando um pouco melhor, interrompemos o nosso trajecto que ia directo ao território do Alaska, seguindo agora mais para norte, onde íamos cruzar a fronteira com o Alaska em diferente local, mas regressaríamos à mesma cidade, já dentro do território do Alaska, tal como se continuássemos directos pelo Alaska Highway, em outras palavras, fizemos o “Klondike Loop”, que é o mesmo que estar em Aveiro, querer ir de carro para a cidade de Salamanca, em Espanha, e no lugar de ir directo, atravessando a fronteira em Vilar Formoso, tomar a direcção do norte, atravessar a fronteira em Vigo, regressando depois a Salamanca.
Este trajecto é muito popular entre quem viaja no “Alaska Highway”, pois passado mais ou menos 520 quilómetros, chegam à cidade de Dawson City.
Esta cidade está situada na província do Yukon, cuja população anda à volta de 2000 habitantes, recebendo mais ou menos cerca de 60.000 turistas por ano. Os habitantes locais referem-se à localidade como "Dawson", mas a indústria turística prefere chamar-lhe "Dawson City", para a diferenciar de Dawson Creek, na província de Colúmbia Britânica, que se situa no “Historic Milepost 0”, do “Alaska Highway”, pelo menos foi isto que uma simpática senhora, vestida tal como os habitantes de Dawson City usavam no século passado, nos explicou no Centro de Turismo, convidando-nos a passar um dia ou dois na cidade.
A povoação foi fundada no ano de 1897 e baptizada em homenagem a um geólogo do Canadá chamado George Mercer Dawson, que tinha explorado e realizado um mapa da região em 1887. Foi a capital da província do Yukon desde a fundação do território, em 1898, até 1952, quando a sede foi trasladada para a cidade de Whitehorse, de onde tínhamos saído no dia anterior. A corrida ao ouro de “Klondike”, começou em 1896 e produziu uma grande mudança no que era então um acampamento indígena de Verão, orientado para a pesca, transformando-o numa cidade próspera de cerca de 40.000 habitantes por volta de 1898. No ano seguinte a febre do ouro tinha chegado ao seu fim, fazendo com que a população se reduzisse para 8000 pessoas. Quando Dawson se tornou cidade em 1902, tinha cerca de 5000 habitantes.
A maior parte dos edifícios da área junto ao rio Yukon, da cidade de Dawson City, parecem antigos, em madeira. Todos os novos edifícios têm que seguir esta regra, a população manteve-se bastante estável até à década de 1930, decaindo após a Segunda Guerra Mundial, quando a capital territorial passou a ser a cidade de Whitehorse. No início da década de 1950 uma rota unia Dawson City ao Alasca e, no outono de 1955 a Whitehorse, pela estrada que faz parte da rota de “Klondike”.
Percorremos a cidade, as ruas estão tal e qual como no século passado, o seu piso é de terra, com algumas poças de lama, existem passadeiras em madeira junto das casas, onde antes de entrar tem uma grande “escova”, pregada ao chão, tipo vassoura, para as pessoas limparem o calçado. Visitámos um bar local, o chão era cimento, já um pouco deteriorado, coberto de serrim, onde as pessoas bebiam cerveja à temperatura ambiente, atirando as cascas de amendoim, e não só, para o chão. Os preços de comida, hotéis, gasolina ou daquelas pequenas coisas a que chamamos “lembranças”, que se compram de momento, como se compreendia, eram um pouco acima da média.
É uma cidade pequenina, muito linda, que fica no pensamento e, vista do cais do rio, onde, depois de mais ou menos 2 horas, na linha de espera pelo “ferry”, que é da graça e atraca na margem do rio Yukon, onde se encontra em ambas as margens uma máquina, tipo “caterpilar”, para ajeitar o “cais” em areia, e que varia de superfície conforme a corrente do rio, atravessámos o rio Yukon, subindo uma pequena montanha, onde tem um miradouro, onde se pode apreciar a cidade perdida de Dawson City, que ficou para trás, do outro lado do rio, mas que, como antes dizíamos, se leva no pensamento.
Continuámos andando mais ou menos 130 quilómetros, sempre subindo as montanhas, por uma estrada de terra com algumas pedra miúda, a que chamam “Top of the World Highway”, passando por zonas com gelo, que se derretia suavemente, onde alguns animais vinham beber a sua água, desfiladeiros, cordilheiras, com algum vento frio, mesmo muito frio, vindo cruzar a fronteira internacional no posto fronteiriço de Poker Creek, que tem neste momento 3 habitantes, sendo a porta de fronteira terrestre situada mais a norte de todo o território dos USA, e está aberta das 9 da manhã até às 9 da noite, e fechada durante o inverno que é mais ou menos de Outubro a Abril, mas informaram-nos que a fronteira abre somente em Maio.
Estávamos finalmente no território do Alaska, parámos, tirámos as primeiras fotos junto da placa que diz Alaska, os guardas do posto fronteiriço riram-se, dizendo: “long way from Florida”, (longo caminho desde a Florida).
A partir daqui era território do Alaska, era sempre em frente, não havia que enganar, mas, aquilo a que chamam o “Taylor Highway”, já no estado do Alaska, que tem uma distância de aproximadamente 100 milhas, pois no Alaska a contagem já é feita no sistema de milhas, que são quase sempre a descer. Na altura, a estrada estava em reparação, com um piso de pedras muito grandes, o que danificava muito as viaturas, pois eram frequentes Vê-las paradas, com pneus rotos, molas partidas, desvios pela berma, algumas quase a tombar. Nós fomos seguindo, devagar, mas seguindo, também se viam em pequenos ribeiros, já onde a zona era mais plana, muitas pessoas pesquisando ouro, enterrados na água e na lama.
Passámos, entre outras, pela povoação de Chicken, uma povoação mineira onde comprámos alguma gasolina, seguindo sempre, devagar e sem qualquer acidente até à tal povoação de Tok, onde chegámos por voltas das 11 horas da noite, mas ainda de dia, pois continuámos a viajem até à cidade de Delta Junction, onde dormimos, com o carro e a Caravana, coberta de lama e cimento.
Neste dia percorremos 567 milhas, com o preço da gasolina variando entre $1.89 e $1.98 o litro.
Tony Borie, Agosto de 2014
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Nota do editor
Último poste da série de 27 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13658: Bom ou mau tempo na bolanha (67): Da Florida ao Alaska, num Jeep, em caravana (8) (Tony Borié)
Da Florida ao Alaska, nono dia
Já há algum tempo que tínhamos passado o Paralelo 48 N, onde dizem que são mais ou menos 48 graus a norte do plano equatorial terrestre e, a esta latitude o sol nos aquece e ilumina por muitas horas ao dia, pelo menos no verão, tudo isto era verdade, pois na viajem pelo “Klondike Loop”, que é como chamam ao desvio de estrada de terra, com algum alcatrão, pedra e lama, pois dizem que o pavimento é “seal coat & gravel”, que está aberta todo o ano, mas no inverno, quando o tempo é de tempestade, algumas partes do trajecto fecham. Tem uma distância mais ou menos de 500 milhas, é uma estrada “deserta”, vêem-se alguns animais selvagens, sobretudo “coiotes”, começa pouco depois da cidade de Whitehorse, portanto no “Alaska Highway”, na província de Yukon, no Canadá, e termina já no estado do Alaska, na povoação de Tok, também no “Alaska Highway”.
Explicando um pouco melhor, interrompemos o nosso trajecto que ia directo ao território do Alaska, seguindo agora mais para norte, onde íamos cruzar a fronteira com o Alaska em diferente local, mas regressaríamos à mesma cidade, já dentro do território do Alaska, tal como se continuássemos directos pelo Alaska Highway, em outras palavras, fizemos o “Klondike Loop”, que é o mesmo que estar em Aveiro, querer ir de carro para a cidade de Salamanca, em Espanha, e no lugar de ir directo, atravessando a fronteira em Vilar Formoso, tomar a direcção do norte, atravessar a fronteira em Vigo, regressando depois a Salamanca.
Este trajecto é muito popular entre quem viaja no “Alaska Highway”, pois passado mais ou menos 520 quilómetros, chegam à cidade de Dawson City.
Esta cidade está situada na província do Yukon, cuja população anda à volta de 2000 habitantes, recebendo mais ou menos cerca de 60.000 turistas por ano. Os habitantes locais referem-se à localidade como "Dawson", mas a indústria turística prefere chamar-lhe "Dawson City", para a diferenciar de Dawson Creek, na província de Colúmbia Britânica, que se situa no “Historic Milepost 0”, do “Alaska Highway”, pelo menos foi isto que uma simpática senhora, vestida tal como os habitantes de Dawson City usavam no século passado, nos explicou no Centro de Turismo, convidando-nos a passar um dia ou dois na cidade.
A povoação foi fundada no ano de 1897 e baptizada em homenagem a um geólogo do Canadá chamado George Mercer Dawson, que tinha explorado e realizado um mapa da região em 1887. Foi a capital da província do Yukon desde a fundação do território, em 1898, até 1952, quando a sede foi trasladada para a cidade de Whitehorse, de onde tínhamos saído no dia anterior. A corrida ao ouro de “Klondike”, começou em 1896 e produziu uma grande mudança no que era então um acampamento indígena de Verão, orientado para a pesca, transformando-o numa cidade próspera de cerca de 40.000 habitantes por volta de 1898. No ano seguinte a febre do ouro tinha chegado ao seu fim, fazendo com que a população se reduzisse para 8000 pessoas. Quando Dawson se tornou cidade em 1902, tinha cerca de 5000 habitantes.
A maior parte dos edifícios da área junto ao rio Yukon, da cidade de Dawson City, parecem antigos, em madeira. Todos os novos edifícios têm que seguir esta regra, a população manteve-se bastante estável até à década de 1930, decaindo após a Segunda Guerra Mundial, quando a capital territorial passou a ser a cidade de Whitehorse. No início da década de 1950 uma rota unia Dawson City ao Alasca e, no outono de 1955 a Whitehorse, pela estrada que faz parte da rota de “Klondike”.
Percorremos a cidade, as ruas estão tal e qual como no século passado, o seu piso é de terra, com algumas poças de lama, existem passadeiras em madeira junto das casas, onde antes de entrar tem uma grande “escova”, pregada ao chão, tipo vassoura, para as pessoas limparem o calçado. Visitámos um bar local, o chão era cimento, já um pouco deteriorado, coberto de serrim, onde as pessoas bebiam cerveja à temperatura ambiente, atirando as cascas de amendoim, e não só, para o chão. Os preços de comida, hotéis, gasolina ou daquelas pequenas coisas a que chamamos “lembranças”, que se compram de momento, como se compreendia, eram um pouco acima da média.
É uma cidade pequenina, muito linda, que fica no pensamento e, vista do cais do rio, onde, depois de mais ou menos 2 horas, na linha de espera pelo “ferry”, que é da graça e atraca na margem do rio Yukon, onde se encontra em ambas as margens uma máquina, tipo “caterpilar”, para ajeitar o “cais” em areia, e que varia de superfície conforme a corrente do rio, atravessámos o rio Yukon, subindo uma pequena montanha, onde tem um miradouro, onde se pode apreciar a cidade perdida de Dawson City, que ficou para trás, do outro lado do rio, mas que, como antes dizíamos, se leva no pensamento.
Continuámos andando mais ou menos 130 quilómetros, sempre subindo as montanhas, por uma estrada de terra com algumas pedra miúda, a que chamam “Top of the World Highway”, passando por zonas com gelo, que se derretia suavemente, onde alguns animais vinham beber a sua água, desfiladeiros, cordilheiras, com algum vento frio, mesmo muito frio, vindo cruzar a fronteira internacional no posto fronteiriço de Poker Creek, que tem neste momento 3 habitantes, sendo a porta de fronteira terrestre situada mais a norte de todo o território dos USA, e está aberta das 9 da manhã até às 9 da noite, e fechada durante o inverno que é mais ou menos de Outubro a Abril, mas informaram-nos que a fronteira abre somente em Maio.
Estávamos finalmente no território do Alaska, parámos, tirámos as primeiras fotos junto da placa que diz Alaska, os guardas do posto fronteiriço riram-se, dizendo: “long way from Florida”, (longo caminho desde a Florida).
A partir daqui era território do Alaska, era sempre em frente, não havia que enganar, mas, aquilo a que chamam o “Taylor Highway”, já no estado do Alaska, que tem uma distância de aproximadamente 100 milhas, pois no Alaska a contagem já é feita no sistema de milhas, que são quase sempre a descer. Na altura, a estrada estava em reparação, com um piso de pedras muito grandes, o que danificava muito as viaturas, pois eram frequentes Vê-las paradas, com pneus rotos, molas partidas, desvios pela berma, algumas quase a tombar. Nós fomos seguindo, devagar, mas seguindo, também se viam em pequenos ribeiros, já onde a zona era mais plana, muitas pessoas pesquisando ouro, enterrados na água e na lama.
Passámos, entre outras, pela povoação de Chicken, uma povoação mineira onde comprámos alguma gasolina, seguindo sempre, devagar e sem qualquer acidente até à tal povoação de Tok, onde chegámos por voltas das 11 horas da noite, mas ainda de dia, pois continuámos a viajem até à cidade de Delta Junction, onde dormimos, com o carro e a Caravana, coberta de lama e cimento.
Neste dia percorremos 567 milhas, com o preço da gasolina variando entre $1.89 e $1.98 o litro.
Tony Borie, Agosto de 2014
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Nota do editor
Último poste da série de 27 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13658: Bom ou mau tempo na bolanha (67): Da Florida ao Alaska, num Jeep, em caravana (8) (Tony Borié)
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