1. Mensagem do nosso camarada António Martins de Matos, TGen Pilav
Ref (ex-Tenente Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74), com data de 6 de Outubro de 2014:
CURSO CALDAS XAVIER
Caros amigos
Hoje foi um dia de festa e boas recordações para os militares do Curso Caldas Xavier, completaram-se 50 anos
que o Miguel Pessoa, o António Costa, este vosso amigo e mais 134 jovens
ingressaram na Academia Militar (AM).
Desde já uma clarificação, quando
em OUT64 decidimos seguir a carreira militar não íamos à procura de mordomias,
galões dourados, vencimentos chorudos ou donzelas casadoiras, o lema da
Academia dizia-nos:
Dulce et decorum est pro patria mori
A guerra no Ultramar já estava ao
rubro nas 3 frentes.
Éramos jovens mas sabíamos ao que
íamos...
E fomos!!!
Éramos militares do “Quadro”, mas
em tudo iguais aos restantes portugueses mobilizados para o Ultramar, pelo
número de intervenientes quase poderíamos dizer que éramos uma … “Companhia
do Quadro”.
O curso na AM ainda estava como
nos anos 50, voltado para o estudo dos grandes conflitos, mais estratégia que
táctica e nem uma palavra sobre guerrilha, os que haveriam de nos ensinar algo sobre
o tema ainda não tinham regressado de África.
Por isso e apesar de sermos do
“Quadro” a nossa experiência para o que íamos encontrar era praticamente nula,
ou seja, … igual à dos milicianos.
Entre 1968 e 1974 e com o posto
de Alferes, Tenente e/ou Capitão, calcorreámos e sobrevoámos a Guiné, Angola e
Moçambique, quando a Revolução dos Cravos eclodiu alguns de nós já iam na
segunda comissão.
À semelhança de todos os outros
combatentes, também nós tivemos de quase tudo, heróis, normais, rambos,
cagarolas e… desenfiados.
Mas nunca tivemos colaboradores
com o inimigo nem desertores.
Durante os sete anos em que
andámos pelo mato, oito de nós justificaram a máxima do filósofo Horácio, … deram a vida pela Pátria,.
Alguns outros também receberam a
sua dose de metralha mas conseguiram sobreviver, logo o Estado se encarregou de
os descartar, passando-os à disponibilidade, a engrossar o contingente dos
Deficientes das FAs.
E o tempo foi passando…
Fizemos não só a Guerra do
Ultramar, mas também o 25 de Abril, o Verão Quente, a Descolonização, o 25
Novembro, Timor, o reentrar na NATO, a Reestruturação das FAs.
Fizemos coisas boas, menos boas,
assim assim, algumas ruins…., umas vezes por convicção, outras enganados por
mentes politicamente mais “espertas e/ou oportunistas”,
Com o passar dos anos alguns de
nós acabaram por deixar a vida militar e seguir caminhos civis, na Engenharia,
no Direito, na TAP, no Ensino, no Comércio e Industria, outros foram para a PSP
ou GNR, alguns (poucos) acharam por bem dedicar-se à política, ainda hoje andam
a pisar as “alcatifas”, a maior parte manteve-se nas fileiras, a nova missão
era…. “Modernizar as FAs”!
Nesta confusão técnico/política,
ideias não nos faltavam, entre outras acções queríamos melhorar o apoio às
populações, (que a parturiente de Bragança tivesse o mesmo apoio que a de
Empada), modernizar o sistema de apoio aos fogos, (sem fazer disso um negócio),
repensar o recrutamento …
Umas vezes opinámos sobre o que
sabíamos, a substituição dos ALIII, das Chaimites ou da G-3, outras vezes sobre
o que não sabíamos, por exemplo,… qual a melhor solução, a Unidade ou a Unicidade
Sindical?.
Mas não fomos só nós os maus “opinadores”
já que, em contrapartida, temos assistido aos políticos a dissertarem sobre se
as FAs devem ter carros de 4, 8 ou 13 rodas, ou F-16, 17 ou 19, o recrutamento
de 12, 4, 1 ou zero meses. (sempre e só a pensarem em votos), ou a compra de
uns pequenos submarinos (qual o valor
das “luvas”????).
Discussões
bacocas e que nunca levam a bom porto, os políticos só têm de dizer se
querem ou não FAs, a discussão do tipo de equipamentos é da competência
dos militares.
Com todos estes mal-entendidos, o
“Modernizar as FAs” passou rapidamente a um outro escalão, “Reduzir e Modernizar”….
Mais tarde ficou-se apenas pelo
“Reduzir, Reduzir, Reduzir”.
Hoje já estamos velhotes, alguns
de nós até já partiram…., estou-me a lembrar do Cadete 478, o Salgueiro Maia, afectuosamente
conhecido como “O Bazuca”, que deu o
corpo ao manifesto no 25 Abril enquanto alguns mais finórios e politizados se
ficavam pela “ombreira da porta”, ou o aviador Melo que, paraplégico, resolveu
dar a volta ao mundo num teco-teco, ou o
“Mala”, o “Cunhado”,…
No rescaldo do que fizemos penso
poder afirmar que, de uma maneira ou de outra, todos tentaram dar o seu
contributo para um Portugal melhor.
Por tudo o que acabo de escrever
acho injusto quando alguém, por ignorância, maledicência ou recalcamento,
resolve fazer uma apreciação deturpada e tendenciosa dos do “Quadro” por
comparação com os “Milicianos”.
Afinal todos pertencemos ao mesmo
povo, todos andámos pelas mesmas picadas, todos comemos o mesmo pó, e, que eu
saiba, o sangue dos do Quadro e dos Milicianos continua a ser da mesma cor.
Aos 24 militares do Curso Caldas
Xavier entretanto falecidos…. um abraço.