Guiné > Bissau > 1973 > O Coronel Henrique Vaz, de óculos, ao lado esquerdo do general Bethencourt Rodrigues (ao centro), numa cerimónia oficial, em Bissau, no ano de 1973.
1. Mensagem,de ontem, de Luís Gonçalves Vaz [, foto à direita], dirigida ao Sousa de Castro, e com conhecimento aos nossos editores:
Leia [este texto em anexo] com cuidado, por favor, e dê a ler ao editor-chefe [do Blogue Luís Graça & Camaradas da Gui´né], e em sintonia decidam se é ou não de publicar, já que nas notas pessoais, retiradas das agendas pessoais do meu falecido pai - e não censuradas por mim!!! – fala-se um pouco de alguns casos de indisciplina. Mas foi o que se passou (, muito embora possam ferir susceptibilidades).
Com mais ou menos "dignidade", o fim do Império Português teve episódios menos felizes.
A decisão é vossa, antigos combatentes e mentores destes blogues. Como tal aceito a decisão que for tomada, qualquer que ela seja, inclusive a sua publicação. Podem retirar algumas notas, se assim o entenderem.
Abraço, bom trabalho e bom fim de semana:
Luís Beleza Gonçalves Vaz
(filho do Coronel Henrique Gonçalves Vaz)
2. Resposta de LG:
Meus caros Sousa de Castro e Luis Vaz: As minhas melhores saudações para os dois. Muito obrigado pela confiança que em mim depositam, em mim e neste blogue que é de todos. Acabei de ler, na vertical, as notas pessoais do Cor Henrique Vaz. Julgo que são preciosas e publicáveis...É um bom serviço que o Luís presta à memória do pai e dos demais ex-combatentes no CTIG. Este período [, de Janeiro a Outubro de 1974,] foi doloroso para todos nós. Mas a sua gestão também foi inteligente e corajosa. Temos que saber todos, através do testemunho de atores como o pai do Luís, a importância e a delicadeza da missão... Vou publicar, mas antes vou apresentar o Luís à Tabanca Grande. Ele merece estar entre nós. Ele e a memória do seu pai. Um bom fim de semana. Luis Graça.
PS - Fico a aguardar a resposta explícita do Luís Gonçalvez Vaz, que - tanto quanto sei - viveu em Bissau com o pai e a restante família - este último ano de guerra e de paz, ao meu convite para ingressar na Tabanca Grande. Sentir-nos-emos honrados com a sua presença neste blogue que é de todos os camaradas e amigos da Guiné.
3. Alguns excertos dos registos pessoais, manuscritos, do Coronel do CEM, Henrique Manuel Gonçalves Vaz, no ano de 1974, no Teatro de Operações da Guiné Portuguesa:
Parte I: Jan/Fevereiro de 1974
Forto à esquerda: Cor CAv CEM Henrique Gonçalves Vaz (Chefe do Estado-Maior do CTIG, 1973/74)
Nomeação de pessoal para o Ultramar:
"…Que, segundo a nota nº 015372 Pº 102.020 de 09MAI73 da RO/DSP/ME, por despacho de 18ABRIL de 1973, foi nomeado para servir no CTIG, por ESCOLHA, nos termos da alínea a) do nº1 do artº 20º do Dec. Lei 49107 de 1969, o Exmº Coronel do CEM HENRIQUE MANUEL GONÇALVES VAZ, Comandante deste Regimento de Cavalaria nº 6, para substituição do Exmº Coronel do CEM JOSÉ GONÇALVES DE MATOS DUQUE, nas Funções de Chefe do Estado-Maior do CTIG …"
(In: O. S. nº119 de 21/05/1973, do Regimento de Cavalaria nº 6)
Nota biográfica do Coronel Henrique Manuel Gonçalves Vaz (comissão na Guiné)
(i) Em 1973 é nomeado (Escolhido, segundo a Ordem de Serviço nº119, de 21/05/1973, do Regimento de Cavalaria nº 6) para servir novamente no Ultramar;
(ii) Embarca em Lisboa, em 7 de Julho, com destino desta vez para o CTIG (Comando territorial independente da Guiné), onde é colocado como Chefe do Estado Maior, e sob o comando do General Spínola, posteriormente do General Bettencourt Rodrigues;
(iii) Esta missão, numa altura de grandes ofensivas do inimigo de então, o PAIGC, é levada até ao 25 de Abril, com alguns incidentes, sempre ultrapassados com muito "Mérito Profissional", nomeadamente "estadas forçadas" em aquartelamentos no teatro de operações, devido a ataques ou flagelações do Inimigo a essas pequenas unidades militares na altura em que o Coronel Vaz as visitava como Chefe do Estado-Maior; bem como a sobrevivência à explosão de uma bomba (22/02/1974) que colocaram no QG (Quartel General), tendo-lhe causado apenas pequenas escoriações;
(iv) A partir desta data (25 de Abril), e como um dos militares (do Corpo do Estado-Maior) mais graduados do Exército Português, neste teatro de operações, leva outra missão até ao seu términus, a de em colaboração com as restantes autoridades civis e militares, entregar paulatinamente, os territórios até então sob a administração portuguesa, ao PAIGC: O Comodoro Almeida Brandão desempenhou as funções de comandante-chefe interino, o tenente-coronel (graduado em Brigadeiro) Carlos Fabião as de delegado da Junta de Salvação Nacional e de representante do Governo Português na Província da Guiné e o Brigadeiro Galvão de Figueiredo de Comandante Militar do CTIG;
(v) Também terá simultaneamente de acantonar e desmobilizar algumas das tropas portuguesas africanas e de implementar o regresso de milhares de soldados portugueses ao Continente:
(vi) Só regressará a Lisboa no dia 14 de Outubro de 1974, cerca de seis meses após a Revolução de 25 de Abril;
(vii) Esta missão só será terminada na Comissão Liquidatária em Lisboa, onde permanecerá até Dezembro de 1976. (*)
Guiné > Chão Felupe > 1973 > O Coronel Henrique Vaz e o Brigadeiro Banazol (Comandante Militar do CTIG), durante uma cerimónia em Chão Felupe.
Guiné > Chão Manjaco > Pelundo > 1973 > O Coronel Henrique Vaz, Chefe do Estado-maior, comandando exercícios com fogos reais, na zona oeste da Guiné (Pelundo,1973).
Fotos: © Luís Gonçalves Vaz (2011). Todos os direitos reservados.
Alguns excertos dos registos pessoais, manuscritos, do Coronel do CEM, Henrique Manuel Gonçalves Vaz, no ano de 1974, no Teatro de Operações da Guiné Portuguesa
Bissau, 6 de Janeiro de 1974
"...Às 16h 15m, houve uma reunião de análise operacional na Sala de Operações do CC (Comando Chefe). Decorreu bem. Foi a 1ª Operação planeada pelo nosso General (Bettencourt Rodrigues), seu Estado Maior e Estado-Maior do CTIG e demais ramos das Forças Armadas ... e nossa análise. No final, o General Comandante-chefe recordou-a com emoção!..."
Coronel Henrique Gonçalves Vaz
(Chefe do Estado-Maior do CTIG)
Bissau, 7 de Janeiro de 1974
"... Soubemos hoje à noite, que em Canquelifá foram mortos, em combate, 6 Cubanos e mais 6 Africanos do IN (inimigo). Uma equipa fotográfica do Batalhão Fotocine, seguiu de madrugada para lá, a fim de obter imagens. ..."
Coronel Henrique Gonçalves Vaz
(Chefe do Estado-Maior do CTIG)
Nota de LGV: Nesse combate morreu um militar das NT, o Ranger Luís Filipe Pinto Soares (Furriel Miliciano de Operações Especiais), Companhia de Caçadores 3545.
Bissau, 28 de Janeiro de 1974
"... Visita a Bambadinca, voamos num Dornier 28 dos TAGP. Regressamos depois do almoço. De tarde visitou-se o Bat de Engenharia e o Bat de Serviços de Material na ... . Em seguida Briefing no CC (Comando Chefe)...."
Coronel Henrique Gonçalves Vaz
(Chefe do Estado-Maior do CTIG)
Bissau, 1 de Fevereiro de 1974
"... Às 07h30m estava no QG a preparar os despachos dos dois Brigadeiros. Às 19h50m, estava a sair do Quartel General. ..."
Coronel Henrique Gonçalves Vaz
(Chefe do Estado-Maior do CTIG)
Bissau, 6 de Fevereiro de 1974
"... Em visita particular, vem ao QG o General Câmara Pina, antigo CEME. Foi recebido na Sala de Operações [...]. No final conversou no gabinete do Comandante do CTIG. ..."
Coronel Henrique Gonçalves Vaz
(Chefe do Estado-Maior do CTIG)
Bissau, 22 de Fevereiro de 1974
"... Cerca das 19h e 10 m quando me encontrava na gabinete do brigadeiro Comandante Militar (Banazol), com este e com o Brigadeiro 2º Comandante (Figueiredo), rebentou um explosivo colocado na casa de banho que a destruiu, assim como algumas das dependências contíguas. A forte deslocação do ar rebentou a porta e os vidros que foram projectados em frente, onde se encontrava o Brigadeiro 2º Comandante, de pé, e que caiu na direcção onde eu me encontrava sentado. O Brigadeiro Comandante Militar sentado na minha frente ainda sofreu. O 2º Comandante foi levado para o Hospital de Bissau, visto sangrar bastante de uma ferida na parte posterior da cabeça. Eu tive leves arranhões, de que me tratei no posto de saúde da CCS (Comando da Companhia de Serviços). Estavam também presentes, no Gabinete Central, o Major Ferreira da Costa e o Tenente Abrantes. Também presentes, nos respectivos gabinetes, a minha ordenança (Ernesto), o Sambu J., 1º cabo e ordenança do 2º comandante e o Jaló (Djaló) meu condutor, estava também no meu gabinete.
Ninguém ficou ferido gravemente. Foi um verdadeiro milagre! ..." (**)
Coronel Henrique Gonçalves Vaz
(Chefe do Estado-Maior do CTIG)
[Continua]
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Nota do editor:
(*) Dados Biográficos do Coronel Henrique Vaz
Henrique Vaz nasceu em Barcelos em 10 de Março de 1922, e faleceu em 26 de Agosto de 2001. Viveu nesta cidade até concluir os seus estudos secundários no Colégio Alcaides de Faria.
Depois de frequentar os preparatórios na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, ingressa na Escola do Exército. Em 1944 termina o Curso de Cavalaria na Escola do Exército enquanto na Europa decorria a guerra.
Toda a sua vida profissional foi dedicada ao Exército, e enquanto decorreu, o nosso país foi sujeito a grandes transformações políticas e sociais que alteraram definitivamente o rumo da sua história. Os militares foram protagonistas activos dessas alterações. A sua formação fica concluída depois de tirar o curso do Estado-Maior já com a patente de capitão.
A carreira militar de Henrique Vaz, depois de concluir em 1959 o Curso Complementar do Estado-Maior, vai decorrer entre as ex-colónias e o Continente. Em 1963 tem início a sua comissão em Angola. Uma vez regressado, irá chefiar o Estado-Maior da Região Militar do Porto. Em 1972 está a comandar o Regimento de Cavalaria Nº6 (Dragões de Entre Douro e Minho) na cidade do Porto e no ano seguinte parte para Bissau onde é colocado como chefe do Estado Maior do Comando Territorial Independente da Guiné, sendo então Governador e Comandante-Chefe desta província o general Spínola.
As condecorações e louvores referentes a todo este período, atestam a envergadura profissional, a sua dedicação e o seu perfil de militar culto.
O 25 de Abril que traz consigo o final da guerra colonial, conflito que na Guiné se agudiza de forma particular, vai encontrar o coronel Henrique Vaz chefiando o Estado-Maior deste Comando Territorial, mas já com o general Spínola ausente. Apesar de não estar inicialmente ligado ao M.F.A., era considerado pelos seus camaradas como um oficial íntegro, competente e não afecto ao regime deposto. Será ele um dos militares responsável pela organização do acantonamento de milhares de soldados portugueses, pela desmobilização de parte dos soldados portugueses guineenses e pelo regresso ao Continente de milhares de soldados.
O tenente-coronel Carlos Fabião, graduado em Brigadeiro, assumirá entretanto as funções de Governador da Guiné. Passado seis meses do 25 de Abril, ambos embarcam em meados de Outubro rumo a Lisboa. A transferência de poder na Guiné-Bissau foi considerada exemplar, tendo cumprido, na íntegra, todos os prazos estipulados no acordo de Argel, transferência esta que ocorreu no dia 10 de Setembro de 1974.
Até ao ano da sua aposentação, em 1982, prestará serviço como juiz presidente, no 1º Tribunal Militar Territorial do Porto. Como Juiz Presidente deste tribunal, terá mais uma ocasião de demonstrar o seu sentido de justiça e imparcialidade no julgamento de muitos casos "difíceis" e polémicos, não pactuando com qualquer tipo de pressões.
Quando passou à reserva, no início dos anos oitenta, regressou definitivamente a Barcelos onde se instalou na sua casa de Levandeiras, rodeado dos seus livros, das suas árvores, muitas das quais ele próprio plantou, e da atenção da sua numerosa família.
Os Filhos do Coronel Gonçalves Vaz
Levandeiras, Fevereiro de 2004
(**) Comentário que Luís Gonçalves vaz deixou no blogue Coisas da Guiné, do nosso camarada A. Marques Lopes, a propósito deste atentado:
Levandeiras, Fevereiro de 2004
(**) Comentário que Luís Gonçalves vaz deixou no blogue Coisas da Guiné, do nosso camarada A. Marques Lopes, a propósito deste atentado:
Caro Editor: Gostava apenas de acrescentar ao seu texto, que considero interessante, de que me lembro como se fosse hoje!... Sim é verdade que " ...no dia 22 de Fevereiro de 1974 rebentou uma carga explosiva no QG de Bissau, ficando ferido o segundo-comandante...". Mas, além do 2º comandante, o Coronel Galvão de Figueiredo (o caso mais grave), também o Chefe do Estado Maior do CTIG, Coronel Henrique Gonçalves Vaz, sofreu algumas escoriações! Ainda me lembro de o ver a chegar a casa, com os óculos sem lentes, a cara cheia de vidros e algum sangue na zona dos ouvidos.... mas com um grande sorriso, a comunicar-nos (à família): "Estejam descansados que eu estou bem,ainda não foi desta ..."
No dia seguinte estive a visitar a zona da explosão e ouvir alguns soldados que assistiram, no momento da explosão, à projecção de portas e janelas pela parada fora..... Segundo esses testemunhos, o impacto foi deveras impressionante, nomeadamente a destruição dos gabinetes dos Oficiais do Estado Maior do CTIG, especialmente o do Chefe do Estado Maior, Coronel Henrique Gonçalves Vaz, que ficou totalmente destruído....
Recentemente ouvi, num programa da Televisão, os pormenores do transporte dos explosivos para "essa acção terrorista" no QG em Bissau, bem como o transporte dos detonadores... Foram transportados no interior de melões por militares portugueses, pertencentes às Brigadas do PRP [, Partido Revolucionário do Proletariado]..... Às horas da explosão, tudo indica que não teriam "intenção de matar militares", talvez apenas desmoralizar "as nossas forças" no Teatro de Operações da Guiné!
27 de Novembro de 2011
Luís Beleza Gonçalves Vaz
(filho do Coronel Henrique Gonçalves Vaz)
27 de Novembro de 2011 23:06
27 de Novembro de 2011
Luís Beleza Gonçalves Vaz
(filho do Coronel Henrique Gonçalves Vaz)
27 de Novembro de 2011 23:06