quinta-feira, 16 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14478: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (18): Operação Bola de Fogo - Construção de Gandembel (O Inferno)

1. Em mensagem do dia 7 de Abril de 2015 o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos esta memória da sua guerra que lembra a Operação Bola de Fogo - Construção de Gandembel.

Caros amigos
Tenho este trabalho pronto para encerrar o meu livro. Ele é fruto de alguns testemunhos que registam a participação da minha Companhia – a CART 1689. Portanto, perdoem-me a visão parcial e redutora dessa enorme e injustificada Operação que ficou bem marcada na história da Guerra Colonial.
Não sei se isto terá interesse para a publicação no nosso Blogue, até porque há vários testemunhos que já foram ali publicados.
Como hoje decorre o 47.º aniversário do início dessa Operação, lembrei-me de por o assunto à vossa consideração.

Um forte abraço do
Silva da CART 1689


Outras memórias da minha guerra

17 - Operação “Bola de Fogo” – construção de Gandembel 
(O inferno)



1 - DESTINO FELIZ OU PRÉMIO AO DEVER

Fui criado num ambiente extremamente humilde e bastante castigado pelo regime salazarista. Todavia, quando ouvi a minha Professora D. Irene, logo na primeira classe, ensinar-nos marchas e louvores a Portugal e aos nossos heróis, senti-me eternamente ligado à nossa Pátria. Recordo que, mais tarde, numa das redações que costumávamos fazer, exaltei o meu sentimento patriótico, prometendo que estaria disponível para dar a vida por Portugal. A Professora ficou comovida e, em lágrimas, aproveitou para me elogiar, arrancou a folha do meu caderno e colou-a na parede.

Orgulhoso pela história dos nossos antepassados, cimentei esse sentimento patriótico pela vida fora. Ainda hoje vibro de alegria ou choro de raiva, sempre que algum português se salienta ou é injustiçado.
Porém, quando a guerra do ultramar despoletou, já não sentia a mesma vontade e a mesma coragem de menino. No entanto, apesar de se notar bastante o interesse comunista em África, através da sua propaganda e apoio à libertação desses povos, era comum, entre nós, um sentimento de obrigação de lutar pela nossa defesa, pela defesa da nossa Pátria. Por outro lado, não havia grandes possibilidades de escolha; ou vais ou foges. Muitos fugiram porque tinham possibilidades financeiras ou contactos para fazer isso. Mais tarde, com o 25 de Abril, alguns deles beneficiaram, ainda, do estatuto de revolucionários, de antifascistas e de grandes patriotas.

Em 1965, quando ingressei no serviço militar, alimentava a esperança de que a guerra terminaria em breve. Porém, à medida que o tempo passava, as coisas pareciam piorar. Assim que me apercebi de que poderia ir para a guerra, procurei assimilar bem a instrução, especialmente quando tive que frequentar a especialidade de “Ranger” – Operações Especiais.

Na Guiné, tal como os outros combatentes, sofri com tristeza, raiva e angústia, os piores momentos da minha vida. Todavia, esforcei-me para dar o meu melhor na defesa dos meus interesses e dos meus camaradas, tendo participado nos maiores combates em que a minha CART 1689 esteve envolvida. Mas também tive a sorte de me safar positivamente deles.

Nunca faltei a nenhuma Operação até vir de Férias. Nem à OP Diabo Negro faltei (Vd. P7921 - Celebrando os meus 25 anos). Como fazia anos, poderia ter tido uma folga, normalmente concedida. Nessa altura o meu Pelotão estava mais desfalcado de graduados. Previa-se uma grande Operação e eu não me baldei. Quando falei nisso com o nosso Capitão, tive a oportunidade de lhe dizer:
- Enquanto estivermos em Intervenção, participarei em todas as Operações, mas quando regressar de férias “vou engolir um garfo” e não vou poder fazer mais nada!

Sempre soubemos que, depois de um ano em Intervenção, teríamos o chamado descanso. Por isso, programei as férias para Abril, com a convicção de que, atingido esse mês, poderia considerar-me livre de perigo.
Já de férias, enquanto me sentia efectivamente livre dos perigos da guerra e, ao mesmo tempo, já a entrar numa fase de projectos e de sonhos, coisas impensadas anteriormente, os meus camaradas da CART 1689 entravam (sem eu saber) na sua pior fase da guerra na Guiné.


2 - A CAMINHO DE GANDEMBEL
(Texto da autoria de Carneiro de Miranda)

"Depois da saída de Catió, a 22 de Março e passada a noite ao largo de Bolama, recordo bem aquela calma e descontraída deslocação em LDG, a caminho de Buba.

Os militares foram-se acomodando junto das suas mochilas, já rompidas de tanto uso e de tanta mudança. Quase não falavam. Limitavam-se a poucas palavras mas a muitos pensamentos, interrogando-se e matutando neste momento apreensivo. Quem se mostrava mais inquieto era o Machado, que questionava:

- Estamos a poucos dias de fazer um ano de Intervenção, cheio de porrada, de cansaço e de ronco, porquê sacrificar-nos mais uma vez?

Logo respondeu o Viana:

- Vamos pagar o custo do nosso bom comportamento.

- Claro - acrescentou o Rodrigues, que concluiu:

- Orgulhem-se do reconhecimento ao nosso valor.

- Boa Rodrigues. Só esperamos que esse valor não nos fique caro. – acrescentou o Zacarias.

Entretanto, enquanto alguns, mais isolados, mexiam no saco das fotos, cartas e outras recordações, quase a meio da LDG, estava o nosso capitão, sentado num mocho, de cabeça curvada, mais parecido com um condenado à decapitação. Esperava a intervenção do nosso Barbeiro. Talvez com alguma apreensão devido à sua necessária apresentação formal ao Comandante do Sector, o coronel Celestino Rodrigues. O tal que viria a ser punido com dez dias de prisão agravada, por problemas nesta Operação Bola de Fogo. Coisa nunca vista num Oficial Superior – segundo lamentava o sargento Viscoso.
Passámos mais de uma semana de “férias”, com actividades de lazer e de treino de tiro. Ainda me rio de ver o Sargento Biscaia a tomar banho com umas cuecas, cheias de carimbos, a fazer de conta que eram calções de banho. Até ao dia 6 de Abril ocupou-se o tempo com patrulhamentos com pelotões alternadamente, fez-se instrução de tiro, com competições de tiro ao alvo e outras de índole desportiva.
Dia 7 de Abril deu-se início à OP BOLA DE FOGO, uma das maiores realizadas na Guiné. Foi, talvez, a mais difícil, mais violenta e mais estúpida, depois da tomada da Ilha do Como.

O objectivo apontava para a implantação de um Aquartelamento (Gandembel) para efectivo de Companhia, no Corredor do Guileje, na região entre Gandembel e Ponte Balana.
Durante a Operação e dias subsequentes, além da nossa Cart 1689, actuaram também:

3.ª Companhia de Comandos
5.ª Companhia de Comandos
CCAÇ 2316
CCAÇ 2317
CART 1612
CART 1613
Pel Sap do BART 1896
Pel Caç Nat 67
Pel Caç Nat 51
Pel Mil 138
Pel Mil 139
Pel Rec Fox 1165
Pel Rec Daimler de Aldeia Formosa
BEng 447
27 Carregadores de apoio

A ida para Aldeia Formosa, por terra, em coluna auto, fez-se sem grandes receios aparentes. Na chegada reinava a calma. Foi muito agradável termos jantado com a Companhia de Comandos e ter-me encontrado com o tenente Carapeta, meu comandante de pelotão em Vendas Novas.
Saímos dali, pelas 22h00, também em coluna auto, em direcção a Chamarra, onde estacionámos até as 03H00 (08.Abril.1968). Estava iniciada a OP “Bola de Fogo”, uma das maiores e mais perigosas de toda a Guerra Ultramarina".


3 - OPERAÇÃO BOLA DE FOGO

Por José Neto

(Memórias de Guileje (1967/68) – blogue “luísgracaecamaradasda guine”)

"(…) A abertura da picada estava a dar pelas barbas à nossa tropa.

Era impossível jogar com o elemento surpresa porque tornava-se necessário retirar abatizes, detectar e fazer explodir fornilhos (até uma viatura GMC em tempos abandonada pelas NT foi pelos ares porque se desconfiava que estava armadilhada) e, principalmente, derrubar árvores para substituir os troncos apodrecidos que, no leito dos regatos, serviam de ponte para a passagem de viaturas.
Os turras nem precisavam de atravessar a fronteira para morteirar os lenhadores. E nós não podíamos ripostar por respeito às convenções internacionais.
Ao fim de duas ou três semanas, com muitos ferimentos ligeiros, mas sem qualquer morto, o itinerário foi dado como praticável e ia seguir-se a segunda fase, que era a marcha da Companhia para Gandembel.

Parecia-nos que, das duas, a CCAÇ 2316 era a que ia avançar, já que a CCAÇ 2317 tinha sido inicialmente designada para nos substituir em Guileje, mas afinal veio a ser esta última, a do 1.º sargento Martins, comandada pelo capitão Barroso de Moura, a quem coube o petisco.
Ao mesmo tempo, como manobra de pressão, iniciou-se do lado norte a abertura da picada Chamarra – Gandembel.
A valentia e pertinácia dos bravos de Gandembel devem ter impressionado o inimigo que fez deslocar para aquela zona um potencial de fogo considerável.
Pelo itinerário de Chamarra juntou-se à CAÇ 2317 a CART 1689 e, com acções pontuais dos Paraquedistas e dos Comandos e o apoio do fogo de artilharia e bombardeamentos dos Fiat da Força Aérea a posição consolidou-se, mau grado as flagelações contínuas de que era alvo.
Mas o cerne da questão continuava. Como o IN precisava de manter o reabastecimento dos seus grupos que actuavam no interior do território, passou a utilizar trilhos um pouco a sul de Gandembel, perto de Paroldade, e esses trilhos cruzavam-se com as nossas colunas que também iam reabastecer o novo aquartelamento.
Nestas condições, cada reabastecimento nosso era uma autêntica operação de três, quatro dias, com fogachadas por todos os lados.

Na última das três operações desta natureza em que a minha Companhia e outras unidades estiveram empenhadas, houve três mortos, sendo um nosso (o 1.º Cabo José Augusto da Silva Leal), outro do Pel Caç Nat 51 (o Fur Mil Sebastião Dionísio) e o terceiro do Pel Rec Fox 1165 (o Soldado Manuel Vieira).
Dois soldados nossos foram gravemente feridos e evacuados para Lisboa, o Júlio Rodrigues Calado e o José Alves Pereira e mais doze, de várias patentes, dos quais três do Pel Rec Fox 1165, feridos com menos gravidade e evacuados para Bissau.

O regresso ao quartel foi difícil e dramático.

O Capitão Corvacho teve de pedir fogo dos obuses de 8,8 dando as coordenadas dum lugar já bem do outro lado da fronteira, mas que sabia ser o ponto de onde o IN o estava a atacar com armas pesadas. O alferes comandante da força de artilharia hesitou e, ao pedir a rectificação dos elementos de tiro, fez saber que o fogo ia cair na zona da fronteira da Guiné-Conacri. Pelo rádio percebeu-se bem a irritação do capitão que insistiu e perguntou ao alferes se desconhecia que ele era oficial de Artilharia.

Resta um pormenor que revela a grandeza dos homens quando confrontados com situações extremas. Aquando do regresso desta última operação os tempos calculados para o trajecto modificaram-se devido à forte concentração de fogo do IN, com as consequências que já descrevi, e o Capitão Corvacho tinha a certeza que, se permanecessem na mata depois do sol-posto, poucos sairiam dali com vida. As viaturas rodavam em marcha lenta porque havia que inspeccionar cada metro da picada. (…)
Mais ou menos por esta altura chegou à Guiné o Brigadeiro António de Spínola, logo depois promovido a General, para substituir o General Schulz no Governo e Comando-Chefe da Província.
Notou-se perfeitamente uma alteração na cadeia de comando principalmente porque, como diziam os soldados, enquanto o primeiro nunca tinha saído do asfalto de Bissau, o segundo aparecia em todo lado sem se fazer anunciar.
Uma das suas primeiras visitas foi ao inferno de Gandembel onde quase obrigou à força o tenente piloto do helicóptero a descer. Foi-lhe fácil concluir que a posição era pouco sustentável e ordenou a retirada progressiva de modo a salvar a face das nossas tropas.

Constou, não posso garantir, mas acredito, que naquela aventura, as NT tiveram cinquenta e dois mortos e muitos feridos graves”.

(P527 de 16 de Fevereiro de 2006 - blogue “luisgracaecamaradasdaguine”)


4 – Do primeiro dia da OP Bola de Fogo
(Texto do livro “Cambança Final” de Alberto Branquinho)

“SÃO JOÃO NO PORTO”

Havia muita tropa envolvida na operação junto à fronteira com a Guiné-Conakri. Uns vindos de norte, outros de sul, em coluna auto.
A tropa que progredia na mata no sentido norte-sul começou a ouvir água a correr em declive acentuado. Era o rio assinalado na carta, que tinham de atravessar. Quando começou a ser visível, constataram que, então, na época seca, era um riacho com três ou quatro pequenos braços de água. Água doce, sem lodo nas margens, devido à altitude, embora muito baixa.
O pessoal que ia à frente e se preparava para atravessar o rio, agachou-se atrás das árvores, aguardando autorização para encher os cantis. A zona era muito perigosa. Não passava por ali tropa havia muitos anos. A autorização foi dada, mas, antes disso, devia passar para a outra margem um número suficiente de homens, por razões de segurança. Quando os primeiros se tivessem abastecido, iriam os outros substitui-los e depois a coluna, seguindo-se andamento lento.

A primeira secção preparava-se para sair da mata e atravessar o rio, quando surgiu, descuidado, na outra margem, um rapaz com sete ou oito anos. Trazia um barrete camuflado. Acocorou-se e retirou da água um pequeno caniço, dentro do qual se debatiam dois peixes. Depois de um momento de espanto e indecisão, um soldado apontou-lhe a G-3 e ia fazer fogo. O alferes agarrou-lhe a arma pelo guarda-mão e empurrou-a para baixo.
- Jubi ! – chamou-o.

O rapaz olhou em volta, procurando de onde vinha a voz. Viu os militares. Levantou-se e ficou estacado, largando caniço e peixes.
- Jubi, bô bem. – e fez-lhe sinal com a mão para se aproximar.

O rapaz fez menção de ir dar um passo em frente, mas voltou-se e desatou a correr para uma baixa do terreno do outro lado da margem e desapareceu na mata, não muito densa. O mesmo soldado e outro levaram as armas à cara, mas o alferes gritou-lhes:
- Não!

Toda a secção desatou numa correria, tentando agarrar o rapaz. Os que vinham atrás correram, também, sem entenderem o que se estava a passar. O alferes foi incapaz de os deter porque estava a comunicar ao capitão, pela rádio, o que acontecera.
- Instalar! Passa a palavra: instalar.
A correria parou e alguns começaram a regressar.
O capitão e o alferes, agachados, passaram para o outro lado do rio. Um furriel, que fora na perseguição, veio ter com eles.
- Há gajos por aqui. Há fogueiras apagadas, com cinzas quentes.
O capitão chamou o guia e deu-lhe instruções.
Recomeçou a marcha, lenta e cuidadosamente.

Não tinham passado mais que dez minutos – uma emboscada. Pouco tempo depois - outra emboscada. A marcha prosseguiu assim, entre emboscadas e tiros de morteiro, disparados não de muito longe, causando só ferimentos ligeiros, de estilhaços e areias.
Sobre o meio da tarde ou porque se lhe escassearam as munições ou porque detectaram a coluna de viaturas vinda do sul, pararam os ataques.
Feito o contacto entre as duas colunas, começou a preparar-se a instalação para passar a noite.
Em pequenos grupos, foram encher os cantis no auto-tanque.

Mal a noite ficou bem cerrada, recomeçaram os ataques. Agora muito fortes. Ora de leste, ora de norte, ora de nordeste – armas ligeiras, metralhadoras pesadas, lança-granadas e morteiros. Ao rasto das tracejantes, silvos de balas, acrescentavam-se os rebentamentos, quase ininterruptos. Na escuridão da noite, sem qualquer abrigo adequado, era impressionante e aterrador.
O alferes, instalado com o pelotão no lado oeste, teve de mudar de lugar, onde estava bem abrigado atrás de um poilão, para não ouvir o soldado que o acusava:
- A culpa é sua, meu alferes. Se eu tivesse “lerpado” o “puto”, isto não acontecia.

Junto à nova posição de abrigo do alferes, um outro soldado, deitado de costas, com a G-3 ao lado, no chão, olhava para cima e dizia, repetidas vezes, em sotaque nortenho:
- Parece o São João no Porto, carago!»

(IN: “Cambança Final” de Alberto Branquinho – Página 199 – Edição Vírgula, Maio de 2013)



Gandembel

Fotos: © Alberto Branquinho (2012). Todos os direitos reservados


5 - O INÍCIO DE GANDEMBEL/PONTE BALANA
(Texto de Idálio Reis)

"(...)
E por via disso, na superior linha de festo do rio Balana, nos viemos a quedar nessa manhã, para de imediato dar início à odisseia que representou a construção de um posto militar fixo, que se viria a chamar Gandembel e mais tarde a uma anexa afastada apenas de poucas centenas de metros, de nome Ponte Balana.

Sob a vigilância directa de uma tropa já bastante mais experimentada - a CART 1689 -, que já reconhecera o local antecipadamente, e que teve uma acção extraordinária durante a permanência que teve connosco até à sua retirada a 15 de Maio, e que é de elementar justiça salientar o papel relevante que sempre demonstrou, começámos a arranjar as nossas guaridas colectivas, autênticos abrigos-toupeira, que nos ofertassem uma maior segurança pessoal durante o tempo de construção dos abrigos definitivos.

Mas antes do mais, houve que proceder à limpeza arbórea da zona, onde a única ferramenta mecânica - a moto-serra -, nos propiciou uma ajuda preciosa. Não foi assim, mestre-soldado Horácio Almeida? Tu que desde criança, tens tido uma vida mancomunada com a floresta.”(…)

(P1654 de 12 de Abril de 2007 – blogue “luisgracaecamaradasdaguine”)


6 - EM GANDEMBEL
(Texto da autoria de Carneiro de Miranda)

"O furriel Marta, que se havia desviado para arrear a giga, ao sentir as formigas assassinas, a morder-lhe as partes, larga-se a correr agarrado às calças. Com este restolho, alerta uns turras que fugiram. Estavam a escamar peixe junto à margem. A nossa tropa, em descanso, não reagiu, para não espantar a caça.
Teríamos que continuar em direção ao Pontão, local apontado para nos juntarmos à CCAÇ 2317, futura defensora do aquartelamento a construir, com a designação de Toupeiras de Gandembel. Sob um sol escaldante, passámos entre um capim altíssimo, onde fomos atacados por moscas que, coladas ao suor, faziam de alguns de nós, pretos retintos. Seguíamos cautelosamente, tendo em atenção que o alerta já fora lançado, através dos fugitivos da beira rio.

Pelas 13H00, com o PCV e os T-6 à nossa vertical e quando já se ouvia o barulho das viaturas da coluna que vinha do Sul, o IN, instalado do lado Leste da estrada, desencadeou uma emboscada, cujo tiroteio demorou uns 10 minutos. Felizmente, tudo correu bem. De seguida avançámos para ver o ronco e fomos surpreendidos pelas abelhas. Situação resolvida e recebemos a ordem para avançar para o Pontão.
Inicialmente ficámos na dúvida se aqueles nativos, que vinham na frente. Seriam turras ou milícias. Valeu a nossa calma e uma dedução muito lógica: aquele barulho que os acompanhava não podia ser dos turras. Eles nunca se ouviam. Efectivamente, tratava-se da coluna que trazia os periquitos da CCAÇ 2317, acompanhados de outro pessoal, para iniciarem a instalação do aquartelamento. (…)
Fez-se a junção e procedemos à inversão de rumo, visando um local mais próximo do rio, para se fazer o aquartelamento. Guileje.
Mal nos distribuímos no espaço idealizado e logo sofremos um violento ataque de morteiros. Valeu-nos a 3.ª Companhia de Comandos, que acompanhava de perto a coluna e que deteve o avanço das tropas inimigas. Esta rápida intervenção dos Comandos deve ter tido grande influência intimidatória junto do IN, uma vez que passou a atacar mais de longe.

Nesta primeira noite em Gandembel, sofremos ataques às 20H00, às 23H30 e às 2h30.
Mal amanheceu, sofremos ataques às 6H00 e às 6H20.
Pelas 8H00, depois de reconhecido o local, procedeu-se à construção dos abrigos, cabendo à nossa CART 1689, a zona Norte e Oeste de um aquartelamento idealizado em forma de quadrado.
Neste dia 9, tivemos a primeira evacuação (por doença). Foi a de Joaquim Sousa Campos.
Grupos de 3 ou 4 elementos, com pequenas sacholas individuais, iniciaram escavações para se abrigarem do IN. Mal se cabia nas covas, cobriam-se com madeira e tudo que aparecesse. Enquanto uns trabalhavam no duro, outros tratavam da protecção da zona e do acesso à água. Apesar desta diminuta distância de 100 metros aproximadamente, o percurso foi sempre picado pela nossa CART 1689. Foram quase sempre os mesmos a fazer esta tarefa.

No dia seguinte (10 de Abril), pelas 10H30, sofremos um ataque que nos provocou dois feridos; João Inácio Sousa e o Eduardo Rodrigues Lopes.
O dia 11, que iniciou com um ataque sofrido durante 40 minutos, foi muito activo. Depois de uma boa resposta das NT, distribuímos pelotões por lugares chave, onde estiveram emboscados durante o dia. A partir deste dia, foi evidente o aparecimento de elementos doentes, que não podiam sair dos abrigos.
No dia 12, o ataque veio pelas 3H30. Nestes dias já encontrámos vário material deixado pelo IN e vestígios de sangue. Voltou a ser atacado pelas 22H30.
Este dia destaca-se pela chegada do primeiro correio e pelo início da construção da padaria.
Cedemos quatro “especialistas” para isso. O pessoal da nossa 1689, andava sempre ocupado em emboscadas e a montar segurança aos trabalhos da CCAÇ 2317, que veio a ser apelidada de “Os Toupeiras de Gandembel”. Abate das árvores e construção dos abrigos, eram trabalhos quase ininterruptos.
O tempo corria vagarosamente. Normalmente sofríamos ataques todas as noites. Por vezes, nem tempo nos davam para dormir.

Enquanto nós ansiávamos pelo regresso, cientes que terminaria o nosso período de intervenção, pensávamos nos desgraçados dos Toupeiras que iriam viver naquele inferno.
No dia 13 foi evacuado, por doença, Fernando Martins da Cunha.
No dia 17, quando faziam um patrulhamento de reconhecimento, foram atingidos por uma mina, o Furriel Belmiro Santos João e o nosso Capitão Manuel Moreira Maia. Foram evacuados para Bissau, onde viria a falecer o Belmiro.
No dia 19, dia em que deixou de haver pão, Foram atingidos por um dilagrama: Una Infalé, José M. Martins Costa Rêgo e Raul Pires. Foram evacuados para Bissau, onde veio a falecer o Una Infalé.
No dia 20, houve a primeira visita de um médico.

Dia 24. Já se havia entrado em comportamentos de rotina. Várias baixas, vários doentes inertes, dentro dos abrigos e muitos elementos debilitados, já se acomodavam ao esforço mínimo. Os Toupeiros, talvez mais cansados fisicamente, devido ao trabalho permanente, parecem agora pouco motivados e muito acomodados. Os militares da 1689, já com algumas baixas e sem o Capitão, chegaram a protestar por esta situação.
Lembro-me de termos ido montar segurança para protecção a uma coluna vinda do Guileje, comandada pelo Cap Corvacho, em que nos acompanhou um pelotão dos “Toupeiras”. Os turras soltaram as abelhas, que se dirigiram para este pelotão. Ia sendo um desastre! Estes militares descontrolaram-se e fugiram para o trilho, aos gritos, sujeitos a outro tipo de acção do IN. Muitos estavam tão inchados das ferradelas que nem se reconheciam. Regressámos ao aquartelamento e esperámos o que fazer. Chega a ordem para se voltar para a segurança à coluna e a maioria dos militares da 1689 recusa-se a fazê-lo, alegando o perigo da actuação da Companhia dos periquitos (Toupeiras). Estes apareceram mas, da 1689, só foram 14 elementos. Alguns, mais afoitos, isolam-se na coluna e provocam alguma confusão, porque outros não querem ir na frente. Rebenta um forte ataque do IN, que se havia emboscado à espera da coluna de Guilege. Aproximámo-nos do local do “assalto” e vimos o camião GMC carregado de cerveja, metido na cratera de um fornilho. Quando perguntei ao Corvacho o que iriam fazer à GMC e à cerveja, uma vez que estava a ficar tarde, ele disse:
- Não te preocupes, se a GMC não sair, rebento as garrafas com meia dúzia de granadas. Estes filhos da puta não vão beber nenhuma.

Felizmente a GMC saiu do buraco, para bem de todos e, muito especialmente, para os da 1689 que se abasteceram razoavelmente. Soubemos que no seu regresso a Guileje, esta coluna sofreu mais ataques em emboscadas e teve mais feridos.
Dia 26 de Abril, a nossa CART 1689 completava um ano. E todos os dias 26 davam motivo há maior bebedeira do mês. Ali, não havia Messes, Refeitórios ou Bares. Só buracos no chão e alguma água do rio. No entanto, sabe-se lá como, o nosso pessoal foi bafejado com a oferta de algumas garrafas de bagaço. Fracos e doentes como andavam, os soldados acusaram rapidamente o efeito exponencial de tais cargas etílicas. E o IN, talvez sabedor do significado desta data, resolveu atacar desmedidamente. Valeu-nos o ânimo bagaçal adquirido, para uma resposta compatível. E quando o festival acabou e se concluiu que ninguém havia sofrido ferimentos, foi a alegria generalizada".


7 – NOS PRIMEIROS DIAS

Vejo, pela História da Companhia, que a minha CART 1689 permaneceu naquele espaço, que veio a ser o quartel de Gandembel, cerca de um mês e meio.

Eu já tinha vivido com a Companhia a experiência de longos dias na construção de outro quartel totalmente novo (“Gubia”, no sector de Empada). Mas, devido a perigosidade da zona onde ia sendo construído o quartel de Gandembel, a poucos quilómetros da fronteira com a Guiné-Conakry, situado no chamado Corredor da Morte/Corredor de Guileje, eu calculava que os primeiros dias deveriam ter sido muito difíceis. Eram os ataques constantes de que falavam, a necessidade de água, organização do terreno para efeitos defensivos, para albergar (com a segurança necessária) duas-Companhias-duas num espaço tão limitado e em terreno praticamente plano.

Já tinha abordado estes aspectos com alguns graduados, mas a conversa derivava sempre para outros aspectos pessoais, de cada um, relacionados com a actividade operacional em período de tempo mais avançado e não durante a bagunça que, entendia eu, teriam sido os primeiros dias.

Num convívio da CART 1689 abordei este aspecto com alguns soldados:

- Então e nos primeiros dias, como é que foi? Muita confusão? E água? Havia água ou era cerveja?

Vou tentar reproduzir, com a realidade possível, partes do diálogo que as minhas perguntas causaram.

- Água? Água, a gente tinha. Havia um rio ali pertinho. Foi o único rio que eu vi na Guiné que não tinha água salgada.

- De dia os gajos atacavam, mas era só de longe. Com canhões e morteiros. Mas de noite os filhos da puta vinham de ao pé e com metralhadoras e tudo. E era todos os dias, de manhã e à noite e se não era de dia, chateavam-nos a noite toda.

- Então, quando a gente ainda estava a cavar os abrigos para três ou quatro de nós (que ficaram tapados com troncos em cimba e despois com chapas de bidões e depois com terra por cimba), não havia mais nada e tínhamos que ir “arrear o calhau”. Ora, pois! Como não havia inda onde ir, cagávamos do lado de lá das árvores maiores. Arreávamos as calças, púnhamos a G3 encostada às árvores, sempre com os olhos a olhar à volta. Feito o serviço, voltávamos p’rá picareta e p’rá pá. Quando os gajos vinham à noite p’rá atacar, deitavam-se ó detrás dessas árvores e cagavam-se todos. Eh! Eh! Eh! Eh! Eh!

- Póis! Mas as mais das vezes a gente andava a montar emboscadas e a fazer patrulhamentos de segurança às obras que os periquitos andavam a fazer.

- Mas, quando precisavas, também cagavas assim, daquela maneira, ou não?


8 - 15 de Maio – DIA TERRÍVEL
Primeiro ferido grave da CCAÇ 2317 – Furriel António Alves
(Texto da autoria de Carneiro de Miranda)

“Julgo que era o segundo ou terceiro dia em que os Toupeiras efectuavam o trabalho do abastecimento de água. A Cart 1689 sairia neste dia de Gandembel e já deixara de o fazer.

A Companhia “Os Ciganos”, apesar dos seus cuidados bastante experimentados, tivera ali, em Gandembel, 2 mortes e dezenas de evacuados. Todavia, sempre manteve os cuidados essenciais de comportamento, incluindo, neste caso, a prática diária de picar esse escasso percurso de cerca de 150 metros.
Ora, os Toupeiras, ao contrário dos “Ciganos”, não sentiram necessidade de picar esse pequeno percurso. Claro que o experimentado IN estava atento a estes facilitismos e, logo no dia seguinte, ouviu o rebentamento das minas colocadas.
Disse-me o Cabo Mendes:
- Ó furriel, foi chocante ver o estado do seu colega que, com as pernas esfaceladas, dos joelhos para baixo, gritava:
- Tirem-me as botas! Tirem-me as botas!”


9 – No último dia da CART 1689 na OP BOLA DE FOGO
(Texto do livro “Cambança Final” de Alberto Branquinho)l

“DESPOJOS”

"Eram cerca de nove horas da manhã. O calor começava já a apertar. O pessoal da Companhia estava pronto e equipado para sair, com os seus pertences dentro dos sacos de lona. Estavam encostados nas sombras possíveis, na proximidade dos abrigos, prevenindo a necessidade de terem que se proteger em caso de ataque.
Aguardavam a coluna auto que estava a chegar, de norte, para, depois, saírem desse quartel fortificado, com as mesmas viaturas, em marcha apeada, fazendo o movimento de retorno. A norte ouviram-se três ou quatro (cinco?) rebentamentos de grande potência. A primeira reacção foi correr para os abrigos. Muitos estacaram imediatamente, porque, estouros com aquela força, não tinham nada a ver com “saídas” de canhão ou de morteiro. Todos os rostos se viraram, com expressão ansiosa para norte. Uma nuvem de fumo e pó começou a surgir e a avantajar-se muito ao longe.
- Que merda foi aquela?

A resposta chegou pouco depois, via rádio e retransmitida boca a boca: “Fornilhos”.
Chamam-se os enfermeiros e saem viaturas, com mais pessoal, em socorro.
A coluna tarda e não há mais notícias.
Chegam as viaturas que tinham saído. Os homens vêm com ar soturno. Duas viaturas tinham sido despedaçadas e havia muitos pedaços de corpos.
Quantos? Ninguém sabe responder.
As primeiras viaturas da coluna começam a chegar. Entra a viatura, de caixa aberta, com os pedaços de corpos. Alguns, curiosos, agarram-se às cancelas e espreitam:
- Foda-se! Queimados! Parecem todos pretos.

A viatura é coberta com panos de tenda amarrados, depois de enxotarem as moscas, que teimavam em ficar por debaixo dos panos.
Mais do que medo, uma raiva enorme, surda, irracional enche as cabeças e os peitos. Muitos cospem para o chão de forma maquinal, contínua, inconscientemente.
As viaturas são abastecidas de combustível para o regresso, directamente dos bidões, ao mesmo tempo que é retirada a carga que se destina ao quartel
Reorganiza-se a coluna para o regresso, com a indicação de que a viatura com os pedaços de corpos seguirá em último lugar. O pessoal da Companhia que aguardava seguirá apeado, espaçado, pelotão a pelotão, entre as viaturas.

Começa o andamento, desenrolando o “novelo” de viaturas e de homens. A raiva sobe-lhes às cabeças. Os dentes cerrados. Há indicação para estarem, também, atentos às copas das árvores.
Não demoraram muito tempo a chegar ao local de rebentamento dos “fornilhos”. Cabia um homem agachado dentro de cada buraco. Um furriel, quando viu um braço ou, talvez, uma perna, pendurado de um ramo, disse para um soldado:

- É pá, deixa aí a G-3 e vai lá em cima buscar aquilo, que a gente dá-te cobertura.
- Foda-se! Ir lá em cimba?! Bá lá bocê!

Frente à recusa, ficou parado, a olhar fixamente para “aquilo” e desistiu.
Ia recomeçar a andar e olhou para o chão. Viu, junto ao tronco de uma árvore, três ou quatro formigas grandes, pretas, que, com as pinças da cabeça cravadas, tentavam arrastar um pedaço de carne, ainda com um farrapo de farda camuflada agarrado. Com raiva, elevou o pé para esmagar as formigas (e, ao mesmo tempo, o pedaço de carne), mas susteve o pé no ar, com a perna flectida e acabou por dar um passo mais largo, passando adiante. Voltou-se para observar melhor e verificou que havia mais pedaços de carne, em volta. Ficou a olhá-los, sem dar conta que viaturas e homens iam passando por ele. Ele já não estava ali. Pairava, cérebro vazio…
Retomou a marcha, maquinalmente, devagar, muito devagar, titubeante e, entre dentes, ia repetindo Lavoisier: “Na natureza nada se cria… nada se… nada se… nada se perde… nada se perde… nada se perde…"

(IN: “Cambança Final” - página 157, edição Vírgula - Maio de 2013)


10 - O ALFERES MONTEIRO
(Texto do livro “Na Tenda do Mestre Isaías” de Emídio Soares)

"Quando passámos por Aldeia Formosa, onde jantámos na noite de 7 de Abril, tivemos a oportunidade de conviver com os militares ali estacionados. Dentre eles, destacamos o alferes Monteiro que, com a comissão quase terminada, aguardava, sem pressa, o seu regresso a Bissau e a Lisboa. Para além de manifestar essa satisfação do dever cumprido, o Monteiro, exteriorizava uma agradável camaradagem e uma evidente simpatia. Parecia que todos o admiravam. Todavia, quem mais o apreciava era o seu grupo de africanos com quem viveu intensamente quase dois anos.
No dia 14 de Maio, o Monteiro ainda estava em Aldeia Formosa. Precisamente nesse dia, o seu Comandante dava-lhe conhecimento que o seu pelotão teria que seguir de madrugada na coluna auto para Gandembel, a fim de levar materiais de construção e géneros alimentícios e, ao mesmo tempo, trazer de volta a CART 1689 que havia terminado a sua missão.
O Monteiro, numa atitude de solidariedade e de despedida do seu grupo, solicitou ao Comandante que o deixasse fazer esse último serviço.

A coluna seguia normalmente e cerca das nove horas já estava perto de Gandembel. Perante umas rajadas de armas ligeiras, a coluna parou e os militares atiraram-se para a as margens da estrada, a fim de se posicionarem e de se defenderem. Logo de seguida explodiram 12 fornilhos, transformando as valetas em crateras, e massacrando a maioria do pelotão do alferes Monteiro.
Seguiram-se cenas horrorosas na procura de corpos e pedaços de carne humana, espalhados em redor daquela zona de morte. Grande parte deles pendiam das árvores, para onde foram disparados.
(…)
No início desta recta, à terceira cratera, do lado direito, e junto à estrada, via-se um tufo de três palmeiras. Numa delas, estava uma perneira de calças de camuflado, com uma bota amarrada e pendurada na copa da palmeira. No tronco da palmeira central, estava a tampa do crânio de uma cabeça com cabelo loiro, à altura de um metro e quarenta, do chão. O resto do tronco até ao chão, era uma massa de carne e sangue, impregnada na casca da palmeira. Deduzimos que eram os restos mortais do alferes Monteiro. Ele era o único branco e loiro do pelotão”.(…)

(IN: “Na Tenda do Mestre Isaías” – página 120, de Emídio Soares, edição do autor)


11 – GANDEMBEL - A TERRA DOS HOMENS DE NERVOS DE AÇO

Por Idádio Reis

"(…) A briosa e colaborante CART 1689 despede-se definitivamente do nosso convívio, e a partida-separação deste bravo punhado de homens, deixou-nos claramente mais pobres, porquanto ficávamos francamente mais indefesos e inseguros. Em mais de um mês que nos acompanhou, até 15 de Maio [e 1968], desenvolveu um trabalho extremamente meritório, tendo-se empenhado denodada e esforçadamente em nos acompanhar. Passou também por graves vicissitudes, em que perde fatidicamente um furriel, alvo de um dos vários artefactos armadilhados por ela mesma, e sofre mais de uma dezena de evacuações, por ferimentos e doenças, entre os quais o seu capitão-comandante.” (…)

(IN: “No Corredor da Morte – A CCAÇ 2317, na guerra da Guiné” – página 112 de Idálio Reis, edição do autor – Fevereiro de 2012)


12 - HINO DE GANDEMBEL
Recolha de José Teixeira
Revisão e fixação de texto: L.G.

“Ó Gandembel das morteiradas,
Dos abrigos de madeira
Onde nós, pobres soldados,
Imitamos a toupeira.

- Meu Alferes, uma saída! -
Tudo começa a correr.
- Não é pr’aqui, é pr’ponte! (i),
Logo se ouve dizer.

Ó Gandembel,
És alvo das canhoadas,
Verilaites (ii) e morteiradas.
Ó Gandembel,
Refúgio de vampiros,
Onde se ligam os rádios
Ao som de estrondos e tiros.

A comida principal
É arroz, massa e feijão.
P’ra se ir ao dabliucê (ii)
É preciso protecção.

Gandembel, encantador,
És um campo de nudismo,
Onde o fogo de artifício
É feito p’lo terrorismo.

Temos por v’zinhos Balana (i),
Do outro lado o Guileje,
E ao som das canhoadas
Só a Gê-Três (iv) te protege.

Bebida, diz que nem pó,
Só chocolate ou leitinho;
Patacão, diz que não há,
Acontece o mesmo ao vinho!”

(P2319 de 1 de Dezembro de 2007 – blogue “luisgracaecamaradasdaguine”)


13 – NOTAS FINAIS

1 – Já em Catió, regressado de férias, deslocava-me amiúde para o Cais, esperando a chegada da minha Companhia. Na manhã do dia 24 de Maio ouvi um tiroteio a jusante. Era a LDG a ser atacada de ambas as margens, tendo-lhe sido causado dois rombos: um do lado esquerdo e outro à ré.
2 – Ao registar aqui a maior e mais perigosa OP realizada pela minha CART 1689, sem ter participado nela, pretendi somente transmitir alguns testemunhos que possam vincar a sua acção.
3 – Para assimilar melhor o que foi a guerra em Gandembel, aconselhamos o livro” No Corredor da Morte”, escrito pelo alferes Idálio Reis, da CCaç 2317, que esteve lá desde o início da OP Bola de Fogo até ao abandono do quartel, por ordem de Bissau (10 meses depois), do qual são transcritas acima algumas passagens.

Silva da Cart 1689
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Nota do editor

Último poste da série de 23 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12887: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (17): O Asdrúbal do Cu da Serra e os seus amores tardios

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14477: Em busca de... (256): Raul Rodrigues Ferreira que foi chefe do Posto Estagiário do Quadro Administrativo da Colónia da Guiné (Alexandre Cardoso)

1. O nosso Camarada Alexandre Alberto Correia Cardoso, ex-Soldado Apontador de Armas Pesadas da CCAÇ 2464/BCAÇ 2861, Biambe, 1969/70, enviou-nos o seguinte apelo.



Camaradas, 

Envio os dados de uma pessoa de que gostava de saber o que é feito dela neste momento.

O seu nome é Raul Rodrigues Ferreira e, segundo documento que mantenho na minha posse, era chefe do Posto Estagiário do Quadro Administrativo da Colónia, nos termos do artigo 126, nº 2 alínea b) da carta orgânica do Império Colonial de 06/01/1948, visto do tribunal administrativo. 

Boletim oficial nº 19/950, folha 177, chefe do Posto do Quadro Administrativo, recebeu guia em 19/6/1951 para se apresentar no Distrito de Recrutamento e Mobilização do Comando Militar da Província da Guiné, por ter sido convocado para o serviço militar como alferes miliciano e nomeado para desempenhar em comissão de serviço civil e dependente do ministério do ultramar como ajudante de campo de sua excelência, o governador da província de Bissau, 21/06/51, boletim oficial 25 folhas 309 e 321... 

Assim, agradeço toda e qualquer informação possível que me possa ser prestada.

Um abraço,
Alexandre Cardoso
Sold Apontador de Armas Pesadas da CCAÇ 2464

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
___________
Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em: 



Guiné 63/74 - P14476: Convívios (663): Encontro do BCAV 3864, dia 23 de Maio de 2015 em Leiria (Vânia Santos/Vitor Santos)

1. A filha do nosso Camarada Vitor Santos, BCAV 3864, solicitou-nos a publicação do seguinte convite para a festa do convívio anual:

Boa noite,

Caro Luís Graça,

Sou filha de um ex-combatente na Guiné, Vitor Santos - BCAV 3864, e gostaria de saber se é possível divulgar através do blogue o encontro organizado por ele em Leiria.

Encontro em Leiria de Ex-combatentes da Guerra do Ultramar - Guiné B. CAV. 3864, a realizar dia 23 de Maio.

Telemóvel de contacto 912 246 267

Aguardarei por uma resposta.

Atentamente,
Vânia Santos
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Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em: 

15 DE ABRIL DE 2015 > Guiné 63/74 - P14475: Convívios (662): Almoço do pessoal e familias da CCAÇ 2315 (Bula, Binar, Mansoa, Bissorã e Mansabá, 1968/69), dia 2 de Maio de 2015 em Cantanhede (Manuel Moreira de Castro)

Guiné 63/74 - P14475: Convívios (662): Almoço do pessoal e familias da CCAÇ 2315 (Bula, Binar, Mansoa, Bissorã e Mansabá, 1968/69), dia 2 de Maio de 2015 em Cantanhede (Manuel Moreira de Castro)


1. Mensagem da nossa amiga Arminda Castro, fila do nosso camarada Manuel Moreira de Castro (ex-Soldado da CCAÇ 2315/BCAÇ 2835, Bula, Binar, Mansoa, Bissorã e Mansabá, 1968/69), com data de hoje, dando conta do próximo Convívio da Companhia de seu pai, a realizar no próximo dia 2 de Maio de 2015, em Cantanhede:

Sr. Carlos Vinhal,
Gostaria em nome do meu pai Manuel José Moreira de Castro, deixar o programa do almoço de convívio, da Companhia de Caçadores 2315 a realizar a 02/05/2015.



Entretanto envio também uma foto do Encontro realizado em Agosto de 2012 em minha casa, onde juntei os amigos/camaradas que tanto o meu pai procurava (Poste 8285), e que após varias tentativas para os descobrir lá tive resultados positivos e se realizou este encontro magnifico!

Da esquerda para a direita: meu pai o Castro, Sr. António Dias de Almeida (emigrado, "descoberto" em França), Sr. José Figueiredo Oliva (emigrado, "descoberto" em França), Sr. Francisco Rodrigues Silva (emigrado, "descoberto" em França), Sr. Macedo e Sr. Marcelino.

A partir dessa altura em Agosto temo-nos reunido como de família se tratasse, vejo na cara do meu pai a grande satisfação poder reencontrar estes amigos/camaradas!!
Áh!, também em Janeiro do ano passado o meu pai reencontrou o Sr. Evaristo Pinto da Companhia 2316, foi outra alegria!

Temos que lutar por aquilo que queremos e acreditamos, pois eu acreditei que iria conseguir dar esta satisfação ao meu pai de reencontrar os seu amigos e consegui!

Um bem haja para todos.
Acreditar é viver!!

Um forte abraço,
Arminda Castro


2. Comentário do editor:

Caríssima amiga Arminda.
É com grande admiração que vemos o quanto tem feito pelo seu pai no sentido de encontrar os seus camaradas. Não é muito vulgar este tipo de iniciativa, uma vez que é muito difícil encontrar camaradas que entretanto se dispersaram, até na emigração, e que pertencem a uma geração que não lidam muito bem com a informática.

Bem haja pelo que fez e continua a fazer. Creia-nos ao seu dispor e do seu pai, o nosso camarada Manuel Castro, para divulgação dos convívios, sejam eles a nível de CCAÇ 2315 ou até aí em casa.

Dê, da nossa parte, um abraço a seu pai, e a Arminda receba um beijinho deste grupo de combatentes da Guiné que se consideram como seus pais adoptivos.

Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 2 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14430: Convívios (661): Pessoal de Bambadinca 68/71: Trofa, 30 de maio de 2015 (Silvino Carvalhal / Fernando Sousa)

Guiné 63/74 - P14474: Agenda cultural (389): documentário sobre memórias de combatentes guineenses, de um lado e de outro ("Pabia di Aos", de Catarina Laranjeiro), na Cinemateca, Ciclo Panorama, 5ª feira, 16 de abril, 15h30


Fotograma do filme "Pabia di Aos", de Catarina Laranjeira (57', Portugal, 2013)


"PABIA DI AOS", da realizadora portuguesa Catarina Laranjeira
Produção: Portugal, 2013
Duração: 57'

Exibição:

16 de abril, 5ª feira, pelas 15h30
Sala M. Félix Ribeiro
Ciclo Panorama - Mostra do Documentário Português

Rua Barata Salgueiro, 39
1269-059 Lisboa
Tel: 213 596 200 - Fax: 213 523 180
GPS: 38°43'15.27"N, 9° 8'55.73"W


1. O documentário “Pabia di Aos” [, em crioulo, por via de hoje, ou por causa de hoje], da realizadora portuguesa Catarina Laranjeiro, foi filmado na Guiné em 2013 e estreou no Doclisboa' 13.  

É um documentário de longa duração (quase uma hora, 57'). Passa amanhã, 5ª feira, dia 16, na Cinemateca, em Lisboa, às 15h30, no âmbito do Ciclo Panorama - Mostra do Documentário Português (a decorrer entre 15 e 19 de abril).

O filme reúne testemunhos de guineenses sobre a guerra colonial/guerra de libertação que se travou no país, entre 1963 e 1974. Na Guiné-Bissau, quarenta anos depois da guerra, aqueles que aderiram ao movimento nacionalista de Amílcar Cabral e aqueles que lutaram no exército colonial põem em cena uma multiplicidade de discursos e memórias, fragmentados e dificilmente reconciliáveis. 

O nosso camarada Alberto Branquinho já viu o filme há um ano atrás  e deixou aqui a sua nota crítica (*).

2. Catarina Laranjeiro: (i)  é licenciada em Psicologia pela Universidade de Lisboa; (ii) tem um  mestrado em Antropologia Visual e dos Media pela Universidade de Berlim; (iii) é atualmente doutoranda em Pós-Colonialismo e Cidadania Global pelo CES/UC - Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra; (iv) trabalhou em diferentes associações de imigrantes em Portugal e em educação para o desenvolvimento na Guiné-Bissau; (v) dedica-se, desde 2010, a projetos de investigação e criação que cruzam a imagem e a antropologia. (**)

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Vd. também poste de 31 de outubro de 2013 > Guiné 63/74 - P12225: Agenda cultural (293): Estreia do filme da jovem realizadora portuguesa Catarina Laranjeiro, "Pavia de Ahos", sobre memórias guineenses da guerra de libertação / guerra colonial. Doclisboa'13, hoje, 5ª feira, 31/10/2013, 17h00, Cinema São Jorge, Sala 3

Guiné 63/74 - P14473: Inquérito online: X Encontro Nacional da Tabanca Grande, Monte Real, sábado, 18 de abril de 2015: resultados finais (b=63): menos de um terço dos respondentes gostariam de poder vir, mas infelizmente não podem vir...


Cartão (vitalício) de identificação do nosso editor Carlos Vinhal, aqui ampliado. Cartão análogo foi enviado para os inscritos (, camaradas e seus acompanhantes). É só imprimir e trazer afixado ao peito,  no sábado... Mais uma vez, uma criação do nosso "designer" Miguel Pessoa...

I. SONDAGEM: "VOU AO PRÓXIMO ENCONTRO DA TABANCA GRANDE, EM MONTE REAL, DIA 18" (n=63)


1. Sim, e já estou inscrito > 34 (54%)

2. Sim, mas ainda não me inscrevi > 1 (1,6%)

3. Talvez, ainda não me decidi > 4 (6,3%)

4. Não, infelizmente não poderei ir > 19 (30,2%)

5. Não, não tenciono ir > 5 (7,9%)

Encerrou às 11h54. 14/4/2015

Votos apurados: 63

II. Já está tudo a postos para mais um reedição do nosso encontro nacional. Neste caso é o X Encontro Nacional, que se realiza todos os anos, desde 2006. Será, mais uma vez, em Monte Real, Leiria, no hotel das termas de Monte Real.

Fizemos, pela primeira vez, o pleno: 200 inscrições. Houve mais camaradas a querer inscrever-se à última da hora, mas não foi possível, com muita pena nossa, aceitar o seu pedido, por razões meramente logísticas... Se mais espaço houvera, ainda mais gente haveria, para alegria de todos nós. Neste caso, temos 131 camaradas, ex-combatentes, e mais 79 acompanhantes (esposas, filhos/as, netos/as, amigos/as),  (*)

De resto, as respostas à nossa última sondagem já apontavam, numa proporção de 1 para 3, para a existência de um número relativamente elevado de camaradas que gostariam de poder estar connosco, mas não vão estar pelas mais variadas razões (que passam certamente do conflito de agendas aos problemas de orçamento familiar, da saúde, etc.).

De todos nos lembraremos no próximo sábado, e em especial dos que estão passar por um momento menos bom. Contrariando um pouco as previsões (que dão um dia primaveril mas com céu nebulado...), achamos que vamos ter bom tempo. Foi, de resto, o que pedimos a Deus e aos bons irãs que tutelam e protegem a nossa Tabanca Grande.

Façam boa viagem, camaradas e amigos. Não se esqueçam, ontem como ontem; "a segurança em primeiro lugar".
´
Carlos Vinhal

PS - Não  se também esqueçam do cartão (vitalício) de identificação que foi enviado para os inscritos, através de email. É só imprimir e afixar ao peito no sábado... Mais uma vez, foi uma criação do nosso "designer" Miguel Pessoa, ele próprio membro da comissão organizadora do encontro e um dos "heróis vivos" que vai estar presente no sábado,  em Monte Real... Recorde-.se que ele foi o primeiro piloto da FAP, aos comandos de um çaça-bombardeiro Fiat G91,  a ser "strelado", em 25 de março de 1973, sob os céus de Guileje. (**)

_________

Notas do editor:


(**) Vd. poste de 19 de março de 2009 > Guiné 63/74 - P4051: FAP (18): Kurika da Mata (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)

Guiné 63/74 - P14472: Os nossos seres, saberes e lazeres (86): Bruxelles, mon village (Parte 1) (Mário Beja Santos)

1. Dizia-nos o nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) na sua mensagem de 7 de Abril de 2015:

Queridos amigos,
Ao longo de décadas, e ao princípio por razões meramente profissionais, fui estabelecendo uma relação muito afetuosa com uma cidade de quem os eurocratas não têm uma opinião lisonjeira, alegando que ali chove a cântaros, o tempo sempre escuro, muita friagem, um centro histórico que à noite fica entregue aos turistas.
A verdade é bem diferente, Bruxelas tem lindos parques, guarda monumentos que nos lembram que a Bélgica, em 1900, era a quinta potência mundial, e a sua arquitetura ainda hoje espelha essa opulência de outrora e a vida farta do presente. Bruxelas oferece por metro quadrado mais vida cultural que Nova Iorque em museus, exposições, eventos étnicos espantosos, pois alberga gentes de mais de 120 países.
Esta é a Bruxelas com que ganhei intimidade e onde tenho a dita de guardar amigos indefetíveis.

Um abraço do
Mário


Bruxelles, mon village (1)

Beja Santos



Tenho uma relação inquebrantável com Bruxelas, mais positiva não podia ser. Aqui arribei em 1977, naquela ocasião em que se bateu à porta da então CEE. Tive direito a um programa para conhecer as instituições ligadas ao meu trabalho e foi nesses contactos que encetei esta duradoura amizade com André Cornerotte, mal sabia eu que viria a ser o meu guru, foi sobretudo graças a ele que vim a conhecer os fundamentos de uma política que dava, desde 1975, os seus primeiros passos. Com a adesão propriamente dita, passei a vir regularmente a Bruxelas, e a conhecer o país, muitíssimo belo e variado como o nosso. O André passou em minha casa a quadra do Natal e do Ano Bom, fui agora retribuir, fiquei alojado na Cité du Logis, em Watermael-Boisfort, um quase arredor, mesmo em frente à Floresta de Soignes. Espaço classificado, um património habitacional integrado, foi concebido como habitação social, e dá gosto ver como é um bairro bem mantido, conforme a imagem junta.


Estamos no dealbar da Primavera, o céu está plúmbeo, vou comprar vitualhas para preparar as coisas do jantar. Este é dos lagos de Watermael, árvores nuas que se projetam no espelho que parece oleoso. Dou meia volta e vou fazer uma passeata pela floresta, vou à espreita dos primeiros acordes da Primavera.


Considerado como um dos nomes mais sonantes da pintura belga, Rik Wouters (1882-1916) foi igualmente um nome determinante na escultura do seu tempo. Morreu tragicamente no exílio, nos Países Baixos. Os jardins de Bruxelas guardam recordações da sua mestria, aqui fica uma imagem captada em Watermael, e agora meto-me ao caminho para a floresta.


Ora cá está, a Primavera despertou, estes junquilhos parecem alvoroçados a anunciar o novo tempo, o sol abriu um pouco e vou tirar vantagem do que a floresta nos oferece, pois claro.


As nuvens parecem galopar, contentes, com esta nesga de sol. Aproveito os contrastes de luz, esta maquineta tem poucos recursos, mas não escondo a satisfação pelos efeitos obtidos. E ponho-me ao caminho, sempre são uns quilómetros por estes caminhos de terra batida, passarei por Rouge-Cloître, como fiz em Janeiro do ano passado, mais à frente conto.


O que nasce terá de morrer, esta árvore monumental estatelou-se no seu último suspiro, em pó se há de tornar. Mas há outras leis da natureza, este desfazer-se levando-nos à contemplação de um madeirame que se cobre de musgo e apodrece com encanto, embelezando a floresta, como numa pose melancólica. Prossigo o passeio, estou agora no Rouge-Cloître. E veio-me então à memória um textinho que escrevi depois dessa viagem de Janeiro de 2014 e enviei a alguns amigos, com o título:

David e Denise

Previa-se uma manhã sem chuva naquele dia de Janeiro, em Bruxelas. O André e eu acordámos num passeio pela Floresta de Soignes. Depois do pequeno-almoço, atravessámos o Boulevard du Souverain pouco passava das dez horas, vínhamos de Watermael-Boitfort, num instantinho desapareceu o bulício urbano, tínhamos à entrada do caminho um piso saibroso e alcantilado, por vezes passávamos pela berma para não nos enlamearmos, o sol timidamente começou por se infiltrar no arvoredo e desanuviar o céu de chumbo, tão frequente no período invernal.

Rondam os 5º, pelo que procuramos estugar o passo nesta magnífica floresta que tem milhares de hectares, que atravessam Bruxelas, Flandres e a Valónia, um arvoredo soberbo, um silêncio cortado pelo voo dos corvos, dos lugarejos limítrofes surgem alguns pedestres encasacados, por vezes com os seus cães, o André nem parece ter 80 anos, vai bem embiocado e conta o que a Floresta de Soignes oferece aos amantes da natureza, em vegetação, casas de campo, flora prodigiosa que não desperdiça aqueles terrenos húmidos e férteis. Aqui e acolá despontam florinhas bravias. Que bela manhã, que belo passeio nas curtas férias da visita que viera fazer aos meus amigos. Íamos com rumo certo, mesmo deambulando por veredas serpenteantes caminhamos em direção a um importante conjunto arquitetónico dentro da floresta, mas já no limiar de Auderghem, Rouge-Cloître, uma comunidade que foi de Agostinhos, tem pelo menos cinco séculos, belos edifícios cercados de lagos e charnecas, há para ali moinhos e terrenos agrícolas de que a comunidade se alimentava.

Vamos em conversa desopilante, aproveito para fazer perguntas sobre a Cité du Logis, o bairro onde vivem os meus anfitriões, casas classificadas do período entre as guerras, moradias com portadas verdes em ruas, todas elas, com nomes de pássaros. Quando chegamos a Rouge-Cloître a manhã aqueceu, paramos para ver os regatos que travessam prados encharcados, há para ali muitos lameiros, visitamos as velhas cavalariças, as dependências agrícolas, o espaço conventual em parte ocupado por artífices que se dedicam às artes do vidro, tecelagem, encadernação. E rumamos para Auderghem, já passa do meio-dia, apetece um bom café, contornamos Rouge-Cloître, ainda parámos para ver belas moradias antes de entrar nos arredores movimentados da velha comuna, outrora fora de Bruxelas. E entrámos no restaurante “Les Deux Petits Diables” que anuncia especialidades italianas, massas, saladas e carpaccio. Pedimos café no balcão, o patrão, sorridente convida-nos a sentarmo-nos, a clientela do almoço ainda não chegou, e tagarelamos os três.

O patrão chama-se David, é um quarentão ágil, enquanto conversa vai dando instruções, apercebe-se que estou curioso quanto à decoração, conta detalhes da compra destes objetos, muitos deles vieram de um empreendimento anterior, mantém a mesma sociedade com o mesmo sócio, está encantado com o bairro, tem fregueses fiéis, houve mesmo uma cliente que lhe deixou uma lembrança inesquecível, quando entrara no ramo da restauração, confessa, nunca suspeitara que há amizades insuspeitadas que superam a morte. Fez-se um silêncio constrangedor, senti-me picado pela curiosidade, de que amizade se tratava, que lembranças perenes ficaram? O patrão olha-me frontalmente, pergunta se temos ainda alguns minutos mais, claro que temos, não íamos sair daqui sem ver o enigma desvelado, e ele então desfiou a sua história.
“Aqui nas redondezas vivem muitos velhos, alguns deles completamente sós. É gente com meios, aqui não há pobreza, estas casas são dispendiosas. Mal abri o restaurante e um sábado, tocavam as badaladas do meio-dia no campanário, e entrou uma senhora, teria entre 85 e 90 anos. Pediu a carta, escolheu uma entrada, um prato principal, uma sobremesa, um copo de vinho e uma garrafa de água. Vinha só, a partir daí veio sempre só, nunca lhe conheci companhia. Uma mulher seca de carnes, mas sólida, desempenada, com um discurso muito lógico, cheia de lembranças, bem-humorada. Coisa rara, enquanto comia interpelava-me frequentemente, com o andar dos anos metia-se mesmo nas conversas entre mim e o meu sócio, gostava de dar opiniões. Nunca me disse adeus, disse-me sempre até breve, e nunca veio a não ser ao sábado, aparecia pontualmente ao meio-dia, gostava daquela mesa virada para o parque, almoçava, falava connosco e deixava-nos aí pelas três da tarde.
Mas houve um sábado que não apareceu. Fiquei inquieto, nunca a vira fazer férias, pensei que estava adoentada. Claro que eu sabia onde ela vivia, o nome da rua e o número da moradia. Fui lá e bati à porta, ninguém respondeu. Voltei para aqui. E passei uma semana à espera da minha cliente. Acreditem que tinha saudades, senti um vago mal-estar. E no sábado seguinte voltou a não aparecer. Pela uma da tarde, apoderou-se de mim uma enorme angústia, voltei lá a casa, não houve resposta e bati à porta dos vizinhos mais próximos. Quem me abriu a porta era uma senhora de idade, assim que a interpelei o rosto ficou sombrio, o olhar triste:  
“A Denise morreu de noite, a meio da outra semana, a empregada deu com ela já morta na cama, quando chegou de manhã. O filho já tratou do funeral, estamos profundamente consternados, a Denise era uma vizinha amorosa, participava em várias iniciativas de solidariedade, visitava enfermos e gente que vivia tão só como ela. Perdemos uma grande amiga”.

Regressei melancólico, pus-me a trabalhar com uma grande mágoa, tinham sido pelo menos cinco anos a ouvir a porta abrir-se quando soavam as badaladas do meio-dia de sábado. O mais importante está para vir.

Passaram-se uns meses e um dia entra alguém que pergunta por mim. Pediu para nos sentarmos, escolhi a mesma mesa onde almoçava a Denise, não sei porquê. Tratava-se de uma herança, precisava de falar comigo em privado. E fui-o ouvindo de cara à banda, ele ia falando e tudo me parecia inacreditável:
“Sou o filho único da Denise, aquela sua cliente que apreciava muito a vossa comida e o vosso ambiente. A minha mãe deixou no testamento o automóvel para si. Escreveu-me uma cartinha a explicar que aquele automóvel só tinha valor simbólico, funcionava muito bem, estava afinado, mas tinha escasso valor comercial. Ela ouvira uma conversa entre si e o seu sócio, parece que os dois por vezes tinham que disputar a única viatura do restaurante. Ela pensou vezes sem conta que lembrança lhe devia deixar, achou que não tinha sentido oferecer uma jóia ou qualquer objeto decorativo, não conhecia os seus gostos, queria mesmo que fosse uma lembrança útil, que ficasse na memória. O carro está ali à porta, aqui tem a chave e toda a documentação. Agradeço-lhe a companhia que deu à Denise”.

O André e eu regressámos à Cité du Logis, tínhamos sopa, endívias com presunto e uns queijinhos para finalizar. Pela tarde, queria ir até ao centro da cidade. A história da Denise não nos largou, estávamos impressionados, há laços afetivos insondáveis. Mal sabia eu que essa tarde, num alfarrabista do Boulevard Anspach, a pretexto de umas grossas bátegas, iria encontrar, sublinhado e comentado o livro de contos “Objeto Quase”, de José Saramago, pertencera a alguém que se chamava Soraya, o texto todo anotado, mergulhei nas preocupações da leitora, muitas vezes ganhamos muito em reler um texto pela mão de outra pessoa. E por aqui nos ficamos.


Agora é que vou mesmo às compras e depois entrego-me aos desvarios da cozinha. Quero ir cedo para a cama, amanhã, haja friagem ou um sol retumbante, vamos de manhã ouvir música coral de Dietrich Buxtehude e Bach, o sublime. E depois percorrer à pata a Bruxelas típica, e a outra, com muita Arte Nova e Arte Deco. Depois conto.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14450: Os nossos seres, saberes e lazeres (85): Berlim, cidade ainda hoje invisivelmente dividida: as marcas da guerra e do terror (Parte III) (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P14471: Parabéns a você (890): António Pimentel, ex-Alf Mil Rec Inf do BCAÇ 2851 (Guiné, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 12 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14458: Parabéns a você (889): Francisco Santiago, ex-1.º Cabo TRMS do BART 3873 (Guiné, 1972/74)

terça-feira, 14 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14470: Tabanca Grande (457): Alexandre Alberto Correia Cardoso, ex-Soldado Apontador de Armas Pesadas da CCAÇ 2464/BCAÇ 2861, Biambe, 1969/70

1. Hoje apresenta-se nesta nossa Tabanca Grande o nosso Camarada Alexandre Alberto Correia Cardoso, ex-Soldado Apontador de Armas Pesadas da CCAÇ 2464/BCAÇ 2861, Biambe, 1969/70.


Camaradas, Fui mobilizado no R.I.10, em Fevereiro de 1969,com destino aos Adidos, tendo seguido para Encheia e, posteriormente, para Biambi.

Mais tarde tomamos o rumo a Buba onde fizemos escolta e segurança à capinagem.
Finda esta missão, seguimos para Inhala.
Eu era conhecido pelo “Cardoso Metralha”.

Um abraço,
Alexandre Cardoso

Sold Apontador de Armas Pesadas da CCAÇ 2464






2. Camarada Alexandre Cardoso, em nome do Luís Graça de demais Camaradas integrantes desta nossa Tabanca Grande.  quero dar-te as boas-vindas. 

Com a tua prestação são já 4 os elementos do teu batalhão de que temos aqui notícias.

Os outros 3 Camaradas são, como podes constatar no link: 


- José Maria Claro, DFA, (ex-Soldado Radiotelegrafista de Engenharia) da CCAÇ 2464;

- António Nobre (ex-Fur Mil) da CCAÇ 2464;

- Armando Pires (ex-Fur Mil Enf.º) da CCS.

Resta-me desejar que se te lembrares de alguma(s) história(s) nos as envies bem com mais fotos que possuas no teu álbum de memórias.

Um abraço Amigo do MR.

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:


Guiné 63/74 - P14469: X Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 18 de Abril de 2015 (10): a lista final dos 200 magníficos, por ordem alfabética e por concelho de residência


X Encontro Nacional da Tabanca Grande: Distribuição das incrições pro concelho de residência (n=200)

Observ.

(*) Águeda, Almada, Barcelos, Covilhã, Espinho, Figueira da Foz, Loures, Marinha Grande, Óbidos, Oliveira do Bairro, Paredes, Ponta Delgada (RA Açores), Régua, Sta. Maria da Feira, Torres Vedras e Viana Castelo (n=32)

(**) Alvaiázere, Aveiro, Barcelos, Cadaval, Cantanhede, Coimbra, Condeixa, Gondomar, Guimarães, Ílhavo, Lamego, Mafra, Montemor- Velho, Nazaré, Ourém, Penamacor, Seixal, Tomar e Vila Real (n=19)




Distribuição dos inscritos por regiões (n=200)





Infografias: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2015)



OS 200 INSCRITOS PARA O X ENCONTRO NACIONAL DA TABANCA GRANDE - MONTE REAL, 18 DE ABRIL DE 2015

Abel Santos - Leça da Palmeira / Matosinhos
Acácio Dias Correia e Maria Antónia - Linda-a-Velha / Oeiras
Agostinho Gaspar - Leiria
Albano Costa e Maria Eduarda - Guifões / Matosinhos
Alberto Godinho Soares - Maia
Almiro Gonçalves e Amélia - Vieira de Leiria / Marinha Grande
António Augusto Proença e Beatriz - Covilhã
António Brito da Silva e Isabel - Madalena / V. N. de Gaia
António Dias - Porto
António Estácio - Mem Martins / Sintra
António Faneco e Tina - Massamá / Sintra
António Fernandes Neves - Setúbal
António Fernando Marques e Gina - Cascais
António Joao Sampaio e Clara - Leça da Palmeira / Matosinhos
António José P. Costa e Isabel - Mem Martins / Sintra
António Manuel Garcez Costa - Lisboa
António Manuel S. Rodrigues e Rosa Maria - Oliveira do Bairro
António Maria Silva e Maria de Lurdes - Lisboa
António Martins de Matos - Lisboa
António Osório, Ana e Maria da Conceição - V. N. de Gaia
António Paiva - Lisboa
António Pimentel - Figueira da Foz
António Santos Pina - Lisboa
António Santos e família (6) - Caneças / Odivelas
António Sousa Bonito - Carapinheira / Montemor-o-Velho
António Souto Mouro - Paço de Arcos / Oeiras
Arlindo Farinha - Almoster / Alvaiázere
Armando Pires - Algés / Oeiras
Arménio Santos - Lisboa
Artur Soares - Figueira da Foz
Baltazar Rosado Lourenço - Nazaré
Belarmino Sardinha e Maria Antonieta - Odivelas
Benjamim Durães, Fábio, Rafael, Marta, Tiago, Pedro e Sérgio - Palmela
C. Martins - Penamacor
Carlos Alberto Cruz, Irene e Paulo Jorge - Paço de Arcos / Oeiras
Carlos Alberto Pinto e Maria Rosa - Reboleira / Amadora
Carlos Vinhal, Dina e 2 amigas- Leça da Palmeira / Matosinhos
David Guimarães e Lígia - Espinho
Delfim Rodrigues - Coimbra
Eduardo Ferreira Campos - Maia
Eduardo Magalhães Ribeiro e Carlos Eduardo - Porto
Ernestino Caniço - Tomar
Fernando Gouveia - Porto
Fernando de Jesus Sousa - Lisboa
Gil Moutinho - Fânzeres / Gondomar
Hernâni Joel Silva e Branca - Lisboa
Hélder V. Sousa - Setúbal
Idálio Reis - Cantanhede
J. L. Vacas de Carvalho - Lisboa
Joao Alves Martins e Graça - Lisboa
Joao Maximiano - Santo Antão / Batalha
Joao Sacoto e Aida - Lisboa
Joaquim Carlos Peixoto e Margarida - Penafiel
Joaquim Gomes Soares e Maria Laura - Porto
Joaquim Luís Fernandes - Maceira / Leiria
Joaquim Luís Mendes Gomes - Mafra
Joaquim Mexia Alves, Catarina e André - Monte Real / Leiria
Joaquim Pinto de Carvalho - Cadaval
Jorge Araújo e Maria João - Almada
Jorge Cabral - Lisboa
Jorge Canhão e Maria de Lurdes - Oeiras
Jorge Picado - Ílhavo
Jorge Pinto e Ana Maria - Agualva / Sintra
Jorge Rosales - Monte Estoril / Cascais
José Alberto Pinto - Barcelos
José Almeida e Antónia - Viana do Castelo
José António Chaves - Paço de Arcos / Oeiras
José Augusto MIranda Ribeiro - Condeixa
José Barros Rocha - Penafiel
José Botelho Colaço - Lisboa
José Casimiro Carvalho - Maia
José Diniz Faro - Paço de Arcos / Oeiras
José Eduardo R. Oliveira - Alcobaça
José Fernando Almeida e Suzel - Óbidos
José Leite e Ana Maria - Sintra
José Manuel Cancela e Carminda - Penafiel
José Manuel Lopes e Luísa - Régua
José Manuel Matos Dinis - Cascais
José Marques e Florinda - Paredes
José Miguel Louro e Maria do Carmo - Lisboa
José Nunes Francisco e família (5) - Batalha
José Pereira Augusto Almeida - Lamego
José Ramos Romão e Emília - Alcobaça
José Vieira Machado - Lisboa
José Zeferino e Duarte - Loures
Juvenal Amado - Fátima / Ourém
Liberal Correia e Maria José - Ponta Delgada (RA Açores)
Lucinda Aranha e José António - Santa Cruz / Torres Vedras
Luís Duarte - Seixal
Luís Graça e Alice- Alfragide / Amadora
Luís Lopes Jorge - Monte Real
Luís Moreira - Mem Martins / Sintra
Luís Paulino e Maria da Cruz - Algés / Oeiras
Manuel Domingos Santos - Leiria
Manuel Domingues - Lisboa
Manuel Fernando Sucio - Vila Real
Manuel Joaquim, Alexandra e José Manuel - Agualva / Sintra
Manuel Lima Santos e Maria de Fátima - Viseu
Manuel Luís Lomba e Maria Arminda - Barcelos
Manuel Ramos - Lisboa
Manuel Reis - Aveiro
Manuel Resende e Isaura - S. Domingos de Rana / Cascais
Mario Fitas e Helena - Estoril
Mario Vasconcelos - Guimarães
Miguel José Ribeiro Rocha e Olinda - Linda-a-Velha / Oeiras
Miguel e Giselda Pessoa - Lisboa
Mário Gaspar - Lisboa
Paulo Santiago - Aguada de Cima / Águeda
Raul Albino e Rolina - Vila Nogueira de Azeitão / Setúbal
Ribeiro Agostinho e Elisabete - Leça da Palmeira / Matosinhos
Ricardo Figueiredo e Cândida - Porto
Ricardo Sousa e Georgina - Lisboa
Rogé Guerreiro - Cascais
Rui Gouveia e Eulália - Leiria
Rui M. D. Guerra Ribeiro - Lisboa
Rui Pedro Silva - Lisboa
Rui Silva e Regina Teresa - Sta. Maria da Feira
Valentim Oliveira, Maria Joaquina, Cyndia e Carina - Viseu
Victor Tavares - Recardães / Águeda
Virgínio Briote e Irene - Lisboa
Vítor Caseiro e Maria Celeste - Leiria

A Comissão Organizadora

CarlosVinhal
Joaquim Mexia Alves
Luís Graça
Miguel Pessoa

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Nota do editor:

13 de abril de  2015 > Guiné 63/74 - P14465: X Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 18 de Abril de 2015 (9): Em 2015, como era esperado mais ano menos ano, atingimos o limite físico da sala que habitualmente ocupamos, as duzentas pessoas.

Guiné 63/74 - P14468: Notas de leitura (703): Sinopse do livro "Guerra na Bolanha", por Francisco Henriques da Silva

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Henriques da Silva (ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, , Mansabá e Olossato, 1968/70; ex-embaixador na Guiné-Bissau nos anos de 1997 a 1999), com data de 7 de Abril de 2015:

Meus caros amigos,
Não é usual e pode até parecer presunçoso que um autor se pronuncie sobre a sua própria obra. Todavia, tendo em conta que as recensões sobre o meu recente livro - “Guerra na Bolanha - de estudante, a militar e diplomata” - foram até à data escassas, decidi publicar uma sinopse sobre a obra, com um ou outro comentário, apenas para despertar a atenção e o interesse dos eventuais leitores. Entendi que devia, de algum modo, divulgar o que escrevi, em especial junto dos antigos combatentes e dos meus contemporâneos e amigos. Adianto que um ou dois excertos da obra já foram publicados neste blog.

O livro lançado pela Âncora Editora, tem o patrocínio da Liga dos Combatentes, da Comissão Portuguesa de História Militar, do Programa Fim do Império e da Câmara Municipal de Oeiras. Já se encontra disponível nas livrarias e pode também ser encomendado on-line.

Mais esclareço todos os interessados que em 5 Maio, pelas 18h00, no Palácio da Independência, ou seja na Sociedade Histórica da Independência de Portugal, no Largo de S. Domingos, em Lisboa será levada a efeito uma sessão de apresentação seguida de debate. A entrada é livre e oportunamente darei conhecimento por esta via de mais pormenores e avivarei a memória dos potenciais interessados.

Com um abraço cordial e amigo
Francisco Henriques da Silva
(ex-Alferes miliciano de infantaria da CCaç 2402
e ex-embaixador de Portugal em Bissau (1997-1999)


"Guerra na Bolanha"

À semelhança de muitos jovens da minha geração, fui alferes miliciano de infantaria na então Guiné Portuguesa, entre 1968 e 1970. 27 anos mais tarde fui nomeado embaixador de Portugal na Guiné-Bissau independente, onde assisti e intervim, como testemunha privilegiada e como mediador, na guerra civil daquele país entre 1998 e 1999, o que já descrevi numa minha obra anterior “Crónicas dos (des)feitos da Guiné” (2012).

Não é de mais salientar que se tratou de uma situação sui generis, na medida em que, tanto quanto sei, fui o único embaixador que exerceu a chefia de uma missão diplomática, num território onde havia previamente combatido como militar.

O presente livro assume um carácter marcadamente intimista e autobiográfico. Para alguns talvez demasiado intimista, quase roçando a linha vermelha do pudor. Mas trata-se, como escreveu o nosso camarada de armas Mário Beja Santos, do “crepúsculo dos combatentes” – ou seja, a nossa hora - em que podemos dizer tudo o que nos vai na alma: para nós, hoje, com a idade que temos, já não existem segredos, nem angústias. Somos transparentes e frontais. Chegou o momento de nos assumirmos plenamente, e com a coragem dos cabelos brancos.

Este livro refere-se a três momentos distintos, na vida de um jovem. Antes da guerra, ou seja, a dia-a-dia de um adolescente no Portugal dos anos 60 do século passado, da classe média urbana, que foi estudante e roqueiro, os seus hábitos, as suas leituras, o seu percurso académico e os respectivos namoros, até ao seu ingresso nas fileiras e as minhas primeiras experiências, como militar.

Durante a guerra, a confrontação com um cenário bélico real numa terra estranha consistiu num reality shock complexo - o quotidiano da luta, as condições de vida, os dramas humanos envolvidos, as questões psicológicas, enfim, tudo o que marca de modo indelével um jovem para sempre.

Depois da guerra, surge uma nova etapa: o regresso definitivo. Como se processou a reinserção na sociedade portuguesa dos anos 70? Que objectivos de vida tinha quando voltou: a retoma ou não dos estudos, o emprego, a vida sentimental e sexual, a diluição dos traumas de guerra? Que acolhimento lhe (nos) reservou o Portugal e os portugueses desse tempo?

Via de regra, a maioria dos autores menciona o que foi o conflito nas suas diferentes dimensões, por vezes, com uma incursão ou outra no passado anterior à ida para África, mas muito poucos mencionam a reintegração na sociedade que deixaram, aspecto que procurei abordar na minha perspectiva própria, com franqueza, sem subterfúgios e sem silêncios.
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Nota do editor

Último poste da série de 13 de Abril de 1025 > Guiné 63/74 - P14466: Notas de leitura (702): "O Meu Avô Andou na Guerra", por Armando Queirós e Diogo Gomes, Âncora Editora, 2014 (Mário Beja Santos)