1. Quadragésimo terceiro episódio da estória Na Kontra Ka Kontra, de Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), enviado em mensagem do dia 8 de Março de 2011:
NA KONTRA
KA KONTRA
43º EPISÓDIO
Em Lisboa, o ainda Alferes Magalhães, desembarca por volta das nove da manhã e como era de rendição individual, toma um táxi, leva as malas à Estação de Santa Apolónia onde as deposita e sempre no mesmo táxi vai aos Adidos e à sua Unidade de Mobilização, o RAL 1, tratar da sua desmobilização. Chega novamente a Santa Apolónia, paga a corrida de toda a manhã com uma nota de cinquenta escudos e ainda tem tempo para almoçar um óptimo coelho de cebolada, num restaurante ao lado da estação.
Porque do barco, por questões de segurança, não se podiam mandar telegramas, apenas receber, o agora simplesmente Magalhães Faria não pode avisar ninguém da sua chegada, pelo que aparece no Porto de surpresa.
Junho de 1970. Com a mulher colocada no Liceu Alexandre Herculano no Porto, Magalhães Faria tenta reatar o curso de Arquitectura que interrompera. Devido às convulsões académicas existentes nesta altura na Escola de Belas Artes, onde se tenta implementar um novo processo de ensino, a chamada “Experiência”, sente-se desfasado, sem os antigos colegas, e acaba por desistir. Para essa tomada de posição muito contribui o facto de o sogro ser empresário e lhe “acenar” com um emprego estável na sua empresa.
Um belo dia, o agora Senhor Magalhães Faria, ao inspeccionar um armazém de matéria prima da empresa, onde se encontravam vários empregados a trabalhar ouve nas suas costas a alguma distância dois C… F…
Magalhães Faria como que ficou paralisado. Aquelas expressões com aquela voz só podiam ter vindo de uma pessoa, o Dionildo. Não se voltou de imediato pois custava-lhe a acreditar na aparição daquele que passaria a ser conhecido pelo morto-vivo.
Neste espectacular NA KONTRA o Dionildo conta a sua história:
Depois de o Alferes ter ido embora de Madina Xaquili e devido à pressão do PAIGC, passou a andar aterrorizado. Logo no primeiro ataque à tabanca, conhecendo o caminho para Bambadinca, resolve desertar. Contorna Galomaro de forma a não ser visto e em Bambadinca, apanha boleia de uma coluna que vai para o Xime com pessoal e material para embarcar numa LDG, com destino a Bissau. Numa situação como esta não era costume os próprios camaradas perguntarem pelas Guias de Marcha. Chegado a Bissau, junto do Cais da Amura onde as lanchas costumavam atracar, logo verificou que na Ponte Cais estava também o navio Uíge, de transporte de tropas. Soube que o barco ia partir à noite e pensou embarcar. Se bem o pensou melhor o fez. Apesar de ser o único militar a bordo vestido de camuflado, ninguém lhe perguntou o que quer que fosse, também pelo facto de irem no barco muitos militares de rendição individual. Ele seria mais um. Passada uma semana, desembarcava em Lisboa. Veste-se à civil com roupa que levava num pequeno saco e ruma ao Porto apresentando-se ao trabalho na empresa onde tinha trabalhado antes de ir para a tropa, a empresa do agora sogro do nosso Magalhães Faria. Passados precisamente quarenta dias aparece-lhe na empresa a Polícia Militar que rapidamente o mete num avião rumo a Bissau, agora com Guias de Marcha para a sua antiga Companhia, sediada em Madina Xaquili. Como perspectiva tinha outra comissão, a começar agora. Com o contínuo agravar da situação, passados poucos dias é planeada uma operação de alto risco, com a intervenção de um Pelotão de Comandos helitransportados e, para a qual, se pediram voluntários. O Dionildo viu ali uma possibilidade de limpar a sua “folha militar” e ofereceu-se. Tudo correu muito melhor do que esperava e até veio a ter um louvor. Retiraram-lhe o castigo e regressou à Metrópole com a sua Companhia. E o Dionildo termina dizendo:
- E aqui estou na empresa onde sempre trabalhei Senhor Faria.
- Magalhães Faria, Faria há muitos.
Fim deste episódio
Até ao próximo camaradas.
(Fernando Gouveia)
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 8 de Março de 2011 > Guiné 63/74 - P7910: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (78): Na Kontra Ka Kontra: 42.º episódio