Mensagem de José Francisco Borrego, Ten Cor na Reserva, que pertenceu ao Grupo de Artilharia n.º 7 de Bissau e ao 9.º Pel Art, Bajocunda (Guiné, 1970/72), com data de 8 de Março de 2009:
Assunto: HISTÓRIA DO GA N.º 7 - BISSAU (SANTA LUZIA)
Caríssimo Carlos Vinhal,
espero que te encontres bem na companhia da excelentíssima família. Eu fico bem, graças a Deus.
Venho novamente incomodar-te com mais uma edição, respeitante à nossa sempre Guiné!
Penso que muitos artilheiros vão ficar satisfeitos por saberem como foi a evolução do GA N.º 7!
À falta de melhor, junto também uma foto do brasão de armas da Bateria de Artilharia Campanha n.º 1 (BAC 1), antecessora do GA N.º 7.
Recebe um abraço amigo e de consideração do
JOSÉ BORREGO
TCOR (RES)
Brasão de Armas da Bateria de Artilharia de Campanha N.º 1 (BAC 1), antecessora do Grupo de Artilharia N.º 7 (GA 7)
1. O GA 7 estava aquartelado em Bissau (Santa Luzia), sendo uma Unidade de Guarnição Normal a que tive a honra de pertencer durante 27 meses (13JUL70 a 30OUT72) e teve como antecedentes as seguintes Unidades:
Bateria de Artilharia de Campanha (BAC);
Bateria de Artilharia de Campanha n.º 1 (BAC 1);
Grupo de Artilharia de Campanha n.º 7.
Comandantes de Bateria:
Cap Artª António Soares Fernandes;
Cap Artª Carlos Rodrigues Correia;
Cap Artª José Júlio Galamba de Castro;
Cap Artª João Carlos Vale de Brito e Faro;
Cap Artª Ernesto Chaves Alves de Sousa;
Cap Artª José Augusto Moura Soares.
Divisa: Os Olhos na Pátria e a Pátria no Coração
Criação da Bateria de Artilharia de Campanha (BAC)
A sua criação é anterior a 01JAN61. Era uma subunidade de guarnição normal e foi constituída por quadros metropolitanos e praças indígenas do recrutamento local, estando enquadrada nas forças do CTIG então existentes.
Síntese da Actividade Operacional
Inicialmente, destacou efectivos para guarnecer algumas localidades até à chegada de forças de Caçadores, nomeadamente para Bissorã, de finais de ABR61 a meados de AGO61; para Mansabá, de finais de ABR61 a princípios de NOV61 e para Enxalé, de princípios de JUN61 a princípios de NOV61.
Após ter destacado Pelotões de Material 8,8cm para Mansabá, a partir de 01OUT63, para Bissorã, em 06NOV63, para Olossato, a partir de 24DEZ63 e para Catió, a partir de 04FEV64 – este destacamento, inicialmente, para apoio da Operação Tridente, nas ilhas de Como, Caiar e Catunco.
Formação de Pelotões
Continuou a formar Pelotões para atribuição em apoio de fogos a diversas guarnições. Assim, constituiu durante o ano de 1964 mais três Pelotões, em 1966 mais seis Pelotões, dos quais, três de material 11,4cm e em 1967 mais três Pelotões, estes de material 14cm.
Criação da Bateria de Campanha n.º 1 (BAC 1)
Em 01ABR67 a subunidade BAC passa a designar-se Bateria de Campanha n.º 1. A partir de 1968 os Pelotões de 8,8cm passaram a ser equipados com material de 10,5cm, tendo ainda sido formados mais sete Pelotões de 10,5cm e mais quatro pelotões de 14cm, um dos quais, por extinção de um pelotão de 11,4cm.
Localização dos Pelotões
A localização dos Pelotões foi caracterizada fundamentalmente pela capacidade de actuação sobre as linhas de infiltração do IN e de reacção aos ataques sobre os aquartelamentos fronteiriços, como S. Domingos, Guidage, Cuntima, Buruntuma, Cabuca, Aldeia Formosa, Guilege e Cameconde, entre outras e para prolongar as acções de fogo sobre as áreas de refúgio tradicionais do Morés, Tiligi, Caboiana, Quínara, Tombali e Cubucaré, entre outras. Em 01JUL70, a subunidade foi extinta e os seus meios e tradições históricas foram transferidos para o GAC 7, então criado.
Criação do Grupo de Artilharia n.º 7 (GAC 7)
Comandantes:
TCOR ARTª António Luís Alves Dias Ferreira da Silva;
TCOR ARTª António Cirne Correia Pacheco;
TCOR ARTª Martinho de Carvalho Leal;
MAJ ARTª José Faia Pires Correia.
2.ºs Comandantes:
MAJ ARTª João Manuel Melo Mexia Leitão;
MAJ ARTª José Joaquim Vilares Gaspar;
MAJ ARTª José Faia Pires Correia;
CAP ARTª Jaime Simões da Silva.
Síntese da Actividade Operacional
O GAC n.º 7 foi criado em 01JUL70, a partir dos meios de artilharia da BAC 1, os quais já englobavam, na altura, 114 bocas-de-fogo constituídas em 27 Pelotões, dos quais 16 pelotões eram de material 10,5, 2 Pelotões de 11,4cm e 9 pelotões de 14cm.
Posteriormente, foram ainda organizados mais um Pelotão de 10,5cm, em 1972, e em 1973, mais um Pelotão de 8,8cm, outro de 10,5cm e dois Pelotões de 14cm.
Na sequência da missão da BAC 1, continuou a exercer o comando e controlo técnico dos diferentes Pelotões colocados em apoio de fogos das diversas guarnições do interior, tendo comandado e coordenado diversas acções de fogo sobre bases inimigas situadas junto da fronteira. Comandou e coordenou ainda a actividade das subunidades de Artilharia Antiaérea.
Criação e Extinção do Grupo de Artilharia n.º 7
Em 14NOV70, passou a designar-se Grupo de Artilharia n.º 7, a fim de harmonizar a sua designação com o comando e controlo das baterias de Artilharia Antiaérea, entretanto colocadas no CTIG, de acordo com despacho ministerial de 11AGO70.
Após a recolha dos Pelotões existentes, de acordo com o plano de retracção do dispositivo, a Unidade foi desactivada a partir de 02SET74, tendo sido posteriormente extinta.
2. Dedico esta pesquisa a todos os Artilheiros de Campanha, que pertenceram às Unidades acima identificadas e que em Bissau ou no mato cumpriram as missões superiormente definidas.
Linda-a-Velha, 08 de Março 2009
Saudações Artilheiras e um abraço fraterno,
JOSÉ BORREGO
TCOR (RES)
(Fonte: 7.º Volume. Tomo II Guiné)
__________
Nota de CV
Vd. último poste de José Borrego de 14 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3893: Tributo aos nossos Sargentos do QP que mantinham as contas em dia (José Francisco Borrego)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quinta-feira, 12 de março de 2009
Guiné 63/74 - P4020: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (11): Bula, foguetões e confusões no abrigo
1. Mensagem de Luís Faria, ex-Fur Mil Inf MA da CCAÇ 2791, Bula e Teixeira Pinto, 1970/72, com data de 8 de Março de 2009:
Carlos Vinhal
Para desanuviar um pouco dos Jornalistas e do Ninos, segue uma estória que talvez o consiga
Um abraço a todos
Luis Faria
Bula - Foguetões
A 28 de Janeiro de 1971 o IN resolveu agradecer e retribuir as nossas visitas a Ponta Matar ofertando-nos simpaticamente com uma espécie de fogo de artifício, festa a que o pessoal da Artilharia se juntou e respondeu educadamente com os seus obuses, conseguindo-se uma chinfrineira das antigas com cantares à desgarrada!!
O quartel de Bula situava-se num dos extremos da Vila, mais propriamente no extremo Oeste, início da estrada Bula - Teixeira Pinto. Daí que, julgo por não quererem que a população que lhes seria próxima entrasse nos festejos, o IN não facilitou e os foguetões 122 ultrapassaram em pouco o quartel e caíram próximo! Valeu o susto.
Como referi no Post anterior, nesse dia o Urbano, Fur Enf concedeu-me o tal único dia de balda prometido pelo que, desenfiado aos patrulhamentos e emboscadas, fiquei pelo quartel e Vila procurando fugir da vista do Cap Mamede e do Ten Cor Andrade, Comandante do Batalhão.
Estava no bar a tomar uma bebida, fazendo horas para a janta, quando um rebentamento estranho me faz correr para o quarto, apanhar a G3 e cinturão com os carregadores e arrancar sem objectivo, já que o meu GComb assim como os outros dois estavam fora do quartel. A rapaziada do Batalhão parecia coelhos a correrem para posições de defesa e abrigo.
Saído do bloco dos quartos e ao entrar na parte cimentada por detrás do palco de espectáculos, parece-me ouvir uma espécie de assobio forte, vejo o Cap Mamede a correr em direcção ao abrigo dos oficias e a olhar para o ar empunhando a sua pequena pistola Walter civil, como que tentando avistar o projéctil para calcular a trajectória e o ponto de impacto. Achei curiosa esta cena.
Ao ouvir aquele som, penso que o projéctil que julguei ser de morteiro 120 ia cair perto e... atiro-me em voo para a frente procurando a protecção de uma árvore existente e de um murete, local onde o barbeiro por vezes exercia a profissão.
O estrondo do rebentamento dá-se e então reparo que aterrei exactamente no meio da cabelagem que o barbeiro, sem tempo para a apanhar, tinha deixado em monte.
Cuspidos e sacudidos os cabelos, há que levantar e dirigir-me para o abrigo. Chegado lá constato que está superlotado e coisa estranha, um magote de militares aglomera-se em jeito de formação raguebiana parecendo forçar a entrada. Coisa esquisita!!! Até porque de pouca ou nenhuma protecção usufruíam. Procuro outro poiso.
Acabada a flagelação vejo que da entrada do abrigo saem também... duas mulheres brancas! Afinal, aquele magote estaria altruisticamente a tentar protegê-las, digo eu!
Fotos e legendas: © Luís Faria (2009). Direitos reservados
Um abraço a todos
Luís Faria
__________
Nota de CV
Vd. último poste da série de 20 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3918: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (10): Bula-Janeiro de 1971
Carlos Vinhal
Para desanuviar um pouco dos Jornalistas e do Ninos, segue uma estória que talvez o consiga
Um abraço a todos
Luis Faria
Bula - Foguetões
A 28 de Janeiro de 1971 o IN resolveu agradecer e retribuir as nossas visitas a Ponta Matar ofertando-nos simpaticamente com uma espécie de fogo de artifício, festa a que o pessoal da Artilharia se juntou e respondeu educadamente com os seus obuses, conseguindo-se uma chinfrineira das antigas com cantares à desgarrada!!
O quartel de Bula situava-se num dos extremos da Vila, mais propriamente no extremo Oeste, início da estrada Bula - Teixeira Pinto. Daí que, julgo por não quererem que a população que lhes seria próxima entrasse nos festejos, o IN não facilitou e os foguetões 122 ultrapassaram em pouco o quartel e caíram próximo! Valeu o susto.
Como referi no Post anterior, nesse dia o Urbano, Fur Enf concedeu-me o tal único dia de balda prometido pelo que, desenfiado aos patrulhamentos e emboscadas, fiquei pelo quartel e Vila procurando fugir da vista do Cap Mamede e do Ten Cor Andrade, Comandante do Batalhão.
Estava no bar a tomar uma bebida, fazendo horas para a janta, quando um rebentamento estranho me faz correr para o quarto, apanhar a G3 e cinturão com os carregadores e arrancar sem objectivo, já que o meu GComb assim como os outros dois estavam fora do quartel. A rapaziada do Batalhão parecia coelhos a correrem para posições de defesa e abrigo.
Saído do bloco dos quartos e ao entrar na parte cimentada por detrás do palco de espectáculos, parece-me ouvir uma espécie de assobio forte, vejo o Cap Mamede a correr em direcção ao abrigo dos oficias e a olhar para o ar empunhando a sua pequena pistola Walter civil, como que tentando avistar o projéctil para calcular a trajectória e o ponto de impacto. Achei curiosa esta cena.
Ao ouvir aquele som, penso que o projéctil que julguei ser de morteiro 120 ia cair perto e... atiro-me em voo para a frente procurando a protecção de uma árvore existente e de um murete, local onde o barbeiro por vezes exercia a profissão.
O estrondo do rebentamento dá-se e então reparo que aterrei exactamente no meio da cabelagem que o barbeiro, sem tempo para a apanhar, tinha deixado em monte.
Cuspidos e sacudidos os cabelos, há que levantar e dirigir-me para o abrigo. Chegado lá constato que está superlotado e coisa estranha, um magote de militares aglomera-se em jeito de formação raguebiana parecendo forçar a entrada. Coisa esquisita!!! Até porque de pouca ou nenhuma protecção usufruíam. Procuro outro poiso.
Acabada a flagelação vejo que da entrada do abrigo saem também... duas mulheres brancas! Afinal, aquele magote estaria altruisticamente a tentar protegê-las, digo eu!
Fotos e legendas: © Luís Faria (2009). Direitos reservados
Um abraço a todos
Luís Faria
__________
Nota de CV
Vd. último poste da série de 20 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3918: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (10): Bula-Janeiro de 1971
Guiné 63/74 - P4019: Venturas e Desventuras do Zé do Olho Vivo (Manuel Traquina) (6): Estrada nova Buba - Aldeia Formosa
A Estrada Nova
Manuel Traquina(*)
Havia pouco tempo que o General António Spínola, tinha sido nomeado Governador e Comandante Chefe das Forças Armadas da Guiné. Tinha chegado àquela colónia meses antes, acompanhado de alguns militares de sua confiança, entre eles o Major Carlos Fabião, que logo foi nomeado Comandante Operacional da Zona de Buba, designada por COP 4.
Foi nesta época que se começou a idealizar uma nova estrada entre Buba e Aldeia Formosa. A estrada antiga era bastante sinuosa, atravessava uma zona pantanosa e dois cursos de agua, que na época das chuvas se tornavam bastante difíceis de transpor. À partida o traçado da nova estrada trazia algumas vantagens, fugia de zonas pantanosas e era mais em linha recta, no entanto era necessário penetrar na floresta virgem.
No início do ano de 1969 começaram a desembarcar em Buba as Buldozers da Engenharia e muitos trabalhadores. Pouco depois, debaixo de fortes medidas de segurança, dava-se início aos trabalhos. Todos os dias máquinas e trabalhadores regressavam a Buba, para no dia seguinte voltarem ao local de trabalho. Os trabalhadores em número de 1500, cuja missão era capinar uma extensão de 50 metros dos dois lados ao longo da estrada, tinham sido “recrutados à força” na zona de Bissau, não estavam habituados à guerra e tinham que ser vigiados, caso contrario evadiam-se. Ao mais pequeno sinal de perigo, num todo, desatavam a correr e só paravam em Buba…
Certo dia, ao proceder à habitual pesquisa do terreno, os nossos soldados depararam com o desenho de um cemitério no meio da estrada, tinha campas, cruzes, e até flores, uma inscrição em letras grandes dizia “ Este é o vosso destino cães brancos”.
Depois de muito trabalho, muitos sacrifícios, alguns mortos e feridos, a estrada de terra batida foi concluída, porém revelou-se mais insegura que a antiga e, as poucas colunas que por ali se efectuaram, tiveram um resultado desastroso em termos de segurança. As terras movimentadas constituíam bons abrigos para o inimigo montar emboscadas, e também no novo piso era mais fácil montar e disfarçar minas. Assim esta estrada foi considerada inoperacional, voltando-se à antiga estrada (na Foto) que sendo um trajecto mais difícil oferecia mais segurança.
(*) Ex-Fur Mil da CCAÇ 2382, Buba, 1968/70
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 8 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3855: Venturas e Desventuras do Zé do Olho Vivo (Manuel Traquina) (5): As colunas Buba-Aldeia Formosa
Guiné 63/74 - P4018: As abelhinhas, nossas amigas (3): As lassas e os Lassas: a colmeia-armadilha, a morte do 2º Srgt Madeira... (Mário Fitas)
Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 763 (1965/66), Os Lassas > A Secção de cães ...
Foto: © Mário Fitas (2008). Direitos reservados.
As abelhas lassas e os Lassas (*)
por Mário Fitas (Ex-Fur Mil Op Esp, CCAÇ 763, Cufar, Março de 1965/Novembro 1966)
Trechos (corrigidos) de Putos, Gandulos e Guerra, de Mário Vicente
Pag. 75:
Por informações recolhidas a CCAÇ 763 será conhecida no PAIGC com a alcunha de Lassas(1). Pelo que se veio a saber, “lassa” será uma espécie de abelha existente na Guiné, a qual não sendo molestada não tem problemas, mas se for atacada é terrivelmente perigosa tornando-se fortemente enraivecida.
Esta alcunha resultaria da actuação da CCAÇ, pois ao chegar a uma povoação em que a população não fugisse, não haveria problemas, falava-se com a mesma e tentava-se resolver os problemas que houvesse. Em caso contrário, se a população fugisse e abandonasse as suas moranças, estas eram literalmente destruídas.
Pelo que ficou assim com este procedimento, a CCAÇ crismada de Lassas.
...................
Pag. 94
Voltamos a Cabolol. O guia enviado pelo Batalhão garante-nos haver um novo Acampamento na mata de Cabolol.
Não encontramos nada, leva-nos ao antigo que verificamos continua destruído, desde a Operaçºão Saturno de 10 de Junho. Dirigimo-nos para Cantumane que verificamos se encontra deserta.
Quando procedíamos à sua destruição, fomos violentamente atacados pelo IN que se encontrava emboscado na mata. Três ataques sucessivos, e aqui entramos em contacto com outro truque da Guerrilha: a utilização de abelhas.
Colocam os cortiços em locais estratégicos, fazendo fogo sobre eles, à nossa passagem. As abelhas lassas saem enfurecidas e desarticulam completamente as NT, ficando muita gente incapacitada para o combate.
A CCAÇ sofre mais um ferido grave que não resiste. O sargento Madeira (2) não se aguentou e morreu no dia seguinte no Hospital Militar de Bissau. Com picadas de abelhas e em estado grave, foram evacuadas mais três praças para o HM de Bissau. Acaba assim a operação Trovão.
............
Pag. 101
Na operação Rastilho, a CCAÇ volta a Camaiupa e Cantomane, da mesma forma que acontecera na operação Trovão e no mesmo local, fomos novamente emboscados e atacados com o sistema das abelhas.
O grupo de Combate que seguia em primeiro escalão, é obrigado a recuar. Só depois do envolvimento feito pela CCAÇ e após mais de uma hora de fogo intenso e ajuda da FAP (3) se conseguiu repelir o IN.
O soldado Marinho (4) regressou à sua terra, para nela repousar eternamente. Alguém irá ao Terreiro do Paço, a medalha postumamente atribuída. Para além deste morto, houve que evacuar mais oito feridos, pelo que a CCAÇ se teve de deslocar para a bolanha para o efeito.
Continua a cobrança!...
.................
Foi assim a experiência da CCAÇ 763 com as Abelhas na Guiné. Felizmente só participei bem como os meus homens nesta festança, como combatentes. Picados fomos por mosquitos e formigas, daquelas grandes, que se arrancavam, mas só o corpo, pois a cabeça ficava segura à carne pelas pinças.
Para toda a Tabanca, o velho abraço do tamanho do Cumbijã! Bonito e tão comprido.
Mario Fitas
__________
Notas de M.F.:
(1) Informação fornecida pelo guerrilheiro SUZA NA MONE, desertor do PAIGC
(2) 2º. Sargento Leandro Vieira Barcelos, natural da Madeira.
(3) O saudoso Comandante Zeferino da TAP que já não se encontra entre nós.
Ao ler Putos, Gandulos e Guerra telefonou-me a falar deste caso, informando- me ter assistido do ar, pois era um PILAV da parelha de T6 que nos ajudou. Em Pami na Dondo a Guerrilheira, existe uma história com este PILAV cujo alcunha seria Seca-Adegas.
(4) Soldado 1881/64 Diamantino Jorge Martinho
___________
Nota de L.G.:
(*) Vd. poste anterior > 12 de Março de 2009 > Guine 63/74 - P4017: As abelhinhas, nossas amigas (2): Desbaratavam uma coluna, uma companhia, um batalhão... (Rui Silva)
Foto: © Mário Fitas (2008). Direitos reservados.
As abelhas lassas e os Lassas (*)
por Mário Fitas (Ex-Fur Mil Op Esp, CCAÇ 763, Cufar, Março de 1965/Novembro 1966)
Trechos (corrigidos) de Putos, Gandulos e Guerra, de Mário Vicente
Pag. 75:
Por informações recolhidas a CCAÇ 763 será conhecida no PAIGC com a alcunha de Lassas(1). Pelo que se veio a saber, “lassa” será uma espécie de abelha existente na Guiné, a qual não sendo molestada não tem problemas, mas se for atacada é terrivelmente perigosa tornando-se fortemente enraivecida.
Esta alcunha resultaria da actuação da CCAÇ, pois ao chegar a uma povoação em que a população não fugisse, não haveria problemas, falava-se com a mesma e tentava-se resolver os problemas que houvesse. Em caso contrário, se a população fugisse e abandonasse as suas moranças, estas eram literalmente destruídas.
Pelo que ficou assim com este procedimento, a CCAÇ crismada de Lassas.
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Pag. 94
Voltamos a Cabolol. O guia enviado pelo Batalhão garante-nos haver um novo Acampamento na mata de Cabolol.
Não encontramos nada, leva-nos ao antigo que verificamos continua destruído, desde a Operaçºão Saturno de 10 de Junho. Dirigimo-nos para Cantumane que verificamos se encontra deserta.
Quando procedíamos à sua destruição, fomos violentamente atacados pelo IN que se encontrava emboscado na mata. Três ataques sucessivos, e aqui entramos em contacto com outro truque da Guerrilha: a utilização de abelhas.
Colocam os cortiços em locais estratégicos, fazendo fogo sobre eles, à nossa passagem. As abelhas lassas saem enfurecidas e desarticulam completamente as NT, ficando muita gente incapacitada para o combate.
A CCAÇ sofre mais um ferido grave que não resiste. O sargento Madeira (2) não se aguentou e morreu no dia seguinte no Hospital Militar de Bissau. Com picadas de abelhas e em estado grave, foram evacuadas mais três praças para o HM de Bissau. Acaba assim a operação Trovão.
............
Pag. 101
Na operação Rastilho, a CCAÇ volta a Camaiupa e Cantomane, da mesma forma que acontecera na operação Trovão e no mesmo local, fomos novamente emboscados e atacados com o sistema das abelhas.
O grupo de Combate que seguia em primeiro escalão, é obrigado a recuar. Só depois do envolvimento feito pela CCAÇ e após mais de uma hora de fogo intenso e ajuda da FAP (3) se conseguiu repelir o IN.
O soldado Marinho (4) regressou à sua terra, para nela repousar eternamente. Alguém irá ao Terreiro do Paço, a medalha postumamente atribuída. Para além deste morto, houve que evacuar mais oito feridos, pelo que a CCAÇ se teve de deslocar para a bolanha para o efeito.
Continua a cobrança!...
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Foi assim a experiência da CCAÇ 763 com as Abelhas na Guiné. Felizmente só participei bem como os meus homens nesta festança, como combatentes. Picados fomos por mosquitos e formigas, daquelas grandes, que se arrancavam, mas só o corpo, pois a cabeça ficava segura à carne pelas pinças.
Para toda a Tabanca, o velho abraço do tamanho do Cumbijã! Bonito e tão comprido.
Mario Fitas
__________
Notas de M.F.:
(1) Informação fornecida pelo guerrilheiro SUZA NA MONE, desertor do PAIGC
(2) 2º. Sargento Leandro Vieira Barcelos, natural da Madeira.
(3) O saudoso Comandante Zeferino da TAP que já não se encontra entre nós.
Ao ler Putos, Gandulos e Guerra telefonou-me a falar deste caso, informando- me ter assistido do ar, pois era um PILAV da parelha de T6 que nos ajudou. Em Pami na Dondo a Guerrilheira, existe uma história com este PILAV cujo alcunha seria Seca-Adegas.
(4) Soldado 1881/64 Diamantino Jorge Martinho
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Nota de L.G.:
(*) Vd. poste anterior > 12 de Março de 2009 > Guine 63/74 - P4017: As abelhinhas, nossas amigas (2): Desbaratavam uma coluna, uma companhia, um batalhão... (Rui Silva)
Guine 63/74 - P4017: As abelhinhas, nossas amigas (2): Desbaratavam uma coluna, uma companhia, um batalhão... (Rui Silva)
1. Mensagem do Rui Silva (ex- ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67):
Caros Luís, Vinhal e Briote:
Muita saúde e bom humor nas Vossas pessoas é para já o meu primeiro e grande desejo.
Envio-vos um trabalho sobre as abelhas africanas e conto alguns estragos que elas fizeram na 816.
Julgo que sobre as abelhas na Guiné devem haver muitos camaradas nossos com histórias para contar. Não sei se este trabalho terá cabidela no Blogue. Se não tiver, passem adiante e tudo como dantes. Sempre amigos. Um abraço, Rui Silva
2.ABELHAS (*)
por Rui Silva
Caro Luís;
Abriu-se aqui há pouco um item no Blogue sobre o macaco-cão na Guiné e com histórias muito interessantes. E porque não abrir agora um item sobre as abelhas (as célebres abelhas africanas) que não queriam mesmo nada com os Tugas ?
Ai daquele que lhes tocasse ou fizesse ruído perto!
Deve haver por aí “menino” que terá muito que contar… É curioso que, em praticamente 2 anos, nunca foi picado por uma abelha que fosse, mas foi mordido por um macaco-cão!Este, propriedade de um militar da 643 (Olá, Águias Negras, da 643) estava preso junto à tasca da D.ª Maria e do Sr. Maximiano (julgo cabo-verdianos) aonde íamos comer, em Bissorã.
Metia-me sempre com ele puxando-lhe o pelo sobre a cabeça, mas, num certo dia, ao tentar recuar com mais rapidez do que ele investia, estava um colega atrás de mim que me atropelou…
ABELHAS!!!... era este o grito de alerta. Era este o grito que fazia o pessoal da Companhia, a correr a sete pés.
Assustava mais este grito, que o grito ”Aí estão eles!”, grito que acontecia no milésimo de segundo imediato a um tiro do inimigo.
Duas histórias para contar:
Certa vez, vinha a Companhia de regresso ao quartel de Olossato e, como sempre, extenuada, de uma operação muito perto da base de Morés.
Sei que naquela zona evitávamos sempre que possível os trilhos, pois sabíamos e alguns até, infelizmente, na pele, que naqueles trilhos era frequente aparecerem minas anti-pessoais.
A certa altura, já perto do aquartelamento do Olossato (aproximadamente 1 Km.), voltamos inevitavelmente a um trilho.
Vínhamos em fila indiana e, cada um, como já era usual, vinha com a atenção redobrada, o coração a rebater forte e a respiração sustida e vinha a ver aonde o da frente punha os pés para pôr os dele também, pois assim julgava livrar-se ele da causa directa do accionamento duma mina e das respectivas consequências. Lembro que o indivíduo que tinha a desdita de pisar uma mima A/P, normalmente ia a bota e o pé dentro pelos ares. Esta atenção obrigava a Companhia a deslocar-se com alguma lentidão e morosidade.
Chegou-se até fazer o levantamento de uma mina A/P.
De repente, um pouco atrás de onde eu ia na coluna, alguém grita: ABELHAS!!! Foi como o tiro de pistola num prova de 100m, nas Olimpíadas.
Toda a gente enceta uma correria (que me fez lembrar o filme “A Revolta dos Cossacos” onde neste filme vê-se uma frente alongada de soldados a fugir) em direcção ao quartel. Esqueceram-se as minas, deixou-se o trilho, acabaram os cuidados com emboscadas e… foi, mas, um “ver se te avias”.
Um nativo, ao arrancar num arbusto uma espécie de lianas ou coisa parecida, para fazer uma rodilha para pôr as granadas de morteiro à cabeça, não reparou que estava lá um enxame, daí…
Lembro-me que um pouco depois, já no quartel, vi o Flector irreconhecível. As pálpebras de tal modo inchadas e os lábios mais grossos do que os de um nativo, a cara e o pescoço todo inchado, se não me dissessem que era o Flector (o morteirista da minha secção) eu julgaria que estava ali um extra-terrestre. Houve um colega que chegou mesmo a perguntar-me se eu conhecia dalgum lado aquela figura. Confesso que estive longos segundos a ver se acertava.
Mas não passou do susto… e das pequenas, e logo contornadas, consequências para o Flector, que com mais injecção menos injecção ficou logo pouco tempo depois operacional. (Ai a força dos 20 anos!)
Mas não foi só o Flector o atingido. Houve muitos a queixarem-se
Houve mais alguns casos (isolados) com as abelhas, mas tudo passava passadas algumas horas e com tratamento na enfermaria.
Soube no entanto mais tarde, através de um oficial, hoje na reforma, que houve um caso numa outra Companhia, que um soldado foi vítima de tal ataque das abelhas, que praticamente o cobriram, e que ele num acto desesperado matou-se com a sua própria G3. Foi verdade? Vai pelo mesmo graveto. Se alguém sabe efectivamente deste caso, pode contar. Eu rendo desde já sentida consternação e o lamento pelo infortúnio desse infeliz camarada.
O meu camarada Martins (Furriel também da 816), também tem uma história para contar, quando foi picado por grande quantidade de abelhas, quando foi pôr abaixo, julgo com TNT, uma árvore de grande porte, junto ao aquartelamento de Olossato e que vinha servindo de abrigo ao inimigo sempre que este nos vinha “visitar”. Deu-se o estoiro e… estava lá um enxame… e elas escolheram-no a ele…
O Martins apareceu cheio de pintas vermelhas (parecia a rubéola) mas dizia ele que não lhe doía mas a quem olhava para ele até parecia que ficava mesmo com dores.
3. Algumas curiosidades sobre as Abelhas (reproduzido com a devida vénia...)
Abelhas (Apis mellifera) são insectos himenópteros (com 2 pares de asas membranosas) que polinizam as plantas, produzem mel… e também picadas mortais.
Há cerca de 20.000 espécies de abelhas no mundo. O seu tamanho varia de 2 mm a 4cms. Algumas são pretas ou cinzentas, mas há as de cor amarelo brilhante, vermelhas, verdes ou azul metálicas.
As abelhas africanas ou “abelhas assassinas”, são originárias do Leste da África e são mais produtivas e muito mais agressivas.
São menores e constroem alvéolos de operárias menores que as abelhas europeias. Sendo assim, suas operárias possuem um ciclo de desenvolvimento precoce (18,5 a 19 dias) em relação às europeias (21 dias), o que lhe confere vantagem na produção e na tolerância ao Ácaro do género Varroa.
Possuem visão mais aguçada, resposta mais rápida e eficaz ao feromônio de alarme. Os ataques são, geralmente, em massa, persistentes e sucessivos, podendo estimular a agressividade de operárias de colmeias vizinhas.
Ao contrário das europeias, que armazenam muito alimento, elas convertem o alimento rapidamente em cria, aumentando a população e libertando vários enxames reprodutivos.
Migram facilmente se a competição for alta ou se as condições ambientais não forem favoráveis.
Essas características têm uma variabilidade genética muito grande e são influenciadas por factores ambientais internos e externos.
O ferrão da abelha, que se situa na extremidade posterior do abdómen da abelha fêmea, é um sistema complexo, compreendendo uma parte glandular, na qual se produz o veneno, e uma estrutura quitinosa e muscular, que serve para ejecção do veneno e profusão e introdução do ferrão. Apresenta rebarbas na sua superfície que dificultam sua saída, de tal sorte que, após a ferroada, todo o sistema é destacado, permanecendo na vítima. E a abelha morre logo a seguir. Geralmente, a profundidade de inserção é de 2 a 3 milímetros. No local, movimentos reflexos de sua estrutura muscular fazem com que o ferrão se introduza cada vez mais.
Na rainha, as farpas do ferrão são menos desenvolvidas que nas operárias e a musculatura ligada ao ferrão é bem forte para que a rainha não o perca após utilizá-lo.
Um cacho de Abelhas algures (podia ser ....na Guiné.. Ai daquele que lhe tocasse ou fizesse barulho perto!!! ... Impressionante, eram milhares de abelhas)
P.S. - Foto e texto em itálico tirados do sítio Abelhas (com a devida vénia..)
____________
Nota de L.G.:
(*) Vd. poste anterior desta série > 10 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4008: As abelhinhas, nossas amigas (1): Com NEP ou sem NEP ... (Luís Graça / António Matos)
Caros Luís, Vinhal e Briote:
Muita saúde e bom humor nas Vossas pessoas é para já o meu primeiro e grande desejo.
Envio-vos um trabalho sobre as abelhas africanas e conto alguns estragos que elas fizeram na 816.
Julgo que sobre as abelhas na Guiné devem haver muitos camaradas nossos com histórias para contar. Não sei se este trabalho terá cabidela no Blogue. Se não tiver, passem adiante e tudo como dantes. Sempre amigos. Um abraço, Rui Silva
2.ABELHAS (*)
por Rui Silva
Caro Luís;
Abriu-se aqui há pouco um item no Blogue sobre o macaco-cão na Guiné e com histórias muito interessantes. E porque não abrir agora um item sobre as abelhas (as célebres abelhas africanas) que não queriam mesmo nada com os Tugas ?
Ai daquele que lhes tocasse ou fizesse ruído perto!
Deve haver por aí “menino” que terá muito que contar… É curioso que, em praticamente 2 anos, nunca foi picado por uma abelha que fosse, mas foi mordido por um macaco-cão!Este, propriedade de um militar da 643 (Olá, Águias Negras, da 643) estava preso junto à tasca da D.ª Maria e do Sr. Maximiano (julgo cabo-verdianos) aonde íamos comer, em Bissorã.
Metia-me sempre com ele puxando-lhe o pelo sobre a cabeça, mas, num certo dia, ao tentar recuar com mais rapidez do que ele investia, estava um colega atrás de mim que me atropelou…
ABELHAS!!!... era este o grito de alerta. Era este o grito que fazia o pessoal da Companhia, a correr a sete pés.
Assustava mais este grito, que o grito ”Aí estão eles!”, grito que acontecia no milésimo de segundo imediato a um tiro do inimigo.
Duas histórias para contar:
Certa vez, vinha a Companhia de regresso ao quartel de Olossato e, como sempre, extenuada, de uma operação muito perto da base de Morés.
Sei que naquela zona evitávamos sempre que possível os trilhos, pois sabíamos e alguns até, infelizmente, na pele, que naqueles trilhos era frequente aparecerem minas anti-pessoais.
A certa altura, já perto do aquartelamento do Olossato (aproximadamente 1 Km.), voltamos inevitavelmente a um trilho.
Vínhamos em fila indiana e, cada um, como já era usual, vinha com a atenção redobrada, o coração a rebater forte e a respiração sustida e vinha a ver aonde o da frente punha os pés para pôr os dele também, pois assim julgava livrar-se ele da causa directa do accionamento duma mina e das respectivas consequências. Lembro que o indivíduo que tinha a desdita de pisar uma mima A/P, normalmente ia a bota e o pé dentro pelos ares. Esta atenção obrigava a Companhia a deslocar-se com alguma lentidão e morosidade.
Chegou-se até fazer o levantamento de uma mina A/P.
De repente, um pouco atrás de onde eu ia na coluna, alguém grita: ABELHAS!!! Foi como o tiro de pistola num prova de 100m, nas Olimpíadas.
Toda a gente enceta uma correria (que me fez lembrar o filme “A Revolta dos Cossacos” onde neste filme vê-se uma frente alongada de soldados a fugir) em direcção ao quartel. Esqueceram-se as minas, deixou-se o trilho, acabaram os cuidados com emboscadas e… foi, mas, um “ver se te avias”.
Um nativo, ao arrancar num arbusto uma espécie de lianas ou coisa parecida, para fazer uma rodilha para pôr as granadas de morteiro à cabeça, não reparou que estava lá um enxame, daí…
Lembro-me que um pouco depois, já no quartel, vi o Flector irreconhecível. As pálpebras de tal modo inchadas e os lábios mais grossos do que os de um nativo, a cara e o pescoço todo inchado, se não me dissessem que era o Flector (o morteirista da minha secção) eu julgaria que estava ali um extra-terrestre. Houve um colega que chegou mesmo a perguntar-me se eu conhecia dalgum lado aquela figura. Confesso que estive longos segundos a ver se acertava.
Mas não passou do susto… e das pequenas, e logo contornadas, consequências para o Flector, que com mais injecção menos injecção ficou logo pouco tempo depois operacional. (Ai a força dos 20 anos!)
Mas não foi só o Flector o atingido. Houve muitos a queixarem-se
Houve mais alguns casos (isolados) com as abelhas, mas tudo passava passadas algumas horas e com tratamento na enfermaria.
Soube no entanto mais tarde, através de um oficial, hoje na reforma, que houve um caso numa outra Companhia, que um soldado foi vítima de tal ataque das abelhas, que praticamente o cobriram, e que ele num acto desesperado matou-se com a sua própria G3. Foi verdade? Vai pelo mesmo graveto. Se alguém sabe efectivamente deste caso, pode contar. Eu rendo desde já sentida consternação e o lamento pelo infortúnio desse infeliz camarada.
O meu camarada Martins (Furriel também da 816), também tem uma história para contar, quando foi picado por grande quantidade de abelhas, quando foi pôr abaixo, julgo com TNT, uma árvore de grande porte, junto ao aquartelamento de Olossato e que vinha servindo de abrigo ao inimigo sempre que este nos vinha “visitar”. Deu-se o estoiro e… estava lá um enxame… e elas escolheram-no a ele…
O Martins apareceu cheio de pintas vermelhas (parecia a rubéola) mas dizia ele que não lhe doía mas a quem olhava para ele até parecia que ficava mesmo com dores.
3. Algumas curiosidades sobre as Abelhas (reproduzido com a devida vénia...)
Abelhas (Apis mellifera) são insectos himenópteros (com 2 pares de asas membranosas) que polinizam as plantas, produzem mel… e também picadas mortais.
Há cerca de 20.000 espécies de abelhas no mundo. O seu tamanho varia de 2 mm a 4cms. Algumas são pretas ou cinzentas, mas há as de cor amarelo brilhante, vermelhas, verdes ou azul metálicas.
As abelhas africanas ou “abelhas assassinas”, são originárias do Leste da África e são mais produtivas e muito mais agressivas.
São menores e constroem alvéolos de operárias menores que as abelhas europeias. Sendo assim, suas operárias possuem um ciclo de desenvolvimento precoce (18,5 a 19 dias) em relação às europeias (21 dias), o que lhe confere vantagem na produção e na tolerância ao Ácaro do género Varroa.
Possuem visão mais aguçada, resposta mais rápida e eficaz ao feromônio de alarme. Os ataques são, geralmente, em massa, persistentes e sucessivos, podendo estimular a agressividade de operárias de colmeias vizinhas.
Ao contrário das europeias, que armazenam muito alimento, elas convertem o alimento rapidamente em cria, aumentando a população e libertando vários enxames reprodutivos.
Migram facilmente se a competição for alta ou se as condições ambientais não forem favoráveis.
Essas características têm uma variabilidade genética muito grande e são influenciadas por factores ambientais internos e externos.
O ferrão da abelha, que se situa na extremidade posterior do abdómen da abelha fêmea, é um sistema complexo, compreendendo uma parte glandular, na qual se produz o veneno, e uma estrutura quitinosa e muscular, que serve para ejecção do veneno e profusão e introdução do ferrão. Apresenta rebarbas na sua superfície que dificultam sua saída, de tal sorte que, após a ferroada, todo o sistema é destacado, permanecendo na vítima. E a abelha morre logo a seguir. Geralmente, a profundidade de inserção é de 2 a 3 milímetros. No local, movimentos reflexos de sua estrutura muscular fazem com que o ferrão se introduza cada vez mais.
Na rainha, as farpas do ferrão são menos desenvolvidas que nas operárias e a musculatura ligada ao ferrão é bem forte para que a rainha não o perca após utilizá-lo.
Um cacho de Abelhas algures (podia ser ....na Guiné.. Ai daquele que lhe tocasse ou fizesse barulho perto!!! ... Impressionante, eram milhares de abelhas)
P.S. - Foto e texto em itálico tirados do sítio Abelhas (com a devida vénia..)
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Nota de L.G.:
(*) Vd. poste anterior desta série > 10 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4008: As abelhinhas, nossas amigas (1): Com NEP ou sem NEP ... (Luís Graça / António Matos)
Guiné 63/74 - P4016: Ser solidário (29): Unidos no passado, unidos no presente (Pepito / Carlos Fortunato)
Guiné-Bissau > Bissau > Bairro do Quelelé > Casa do Pepito e da Isabel > 9 de Março de 2009 > Festinha em honra dos nossos camaradas da Associação Ajuda Amiga > O anfitrião, Pepito, está ao meio, em segundo plano, ladeado à sua direita pelo Miranda, e à esquerda pelo Carlos Silva, presidente da Assembleia Geral da Associação. Os amigos que estão em primeiro plano, não os conheço pessoalmente, mas devem pertencer à Associação e, tal como o Carlos Silva, viajaram para Bissau esta sexta-feira passada, antes portanto do funeral do Nino. (Não se deixaram intimidar pelos boatas de que poderia haver distúrbios por ocasião da cerimónia fúnebre). Vejo, pelas fotos que me chegaram, que não estava presente o Carlos Fortunato, presidente da direcção da Ajuda Amiga e membro da nossa TabanCa Grande, tal como o Carlos Silva, o Pepito e o Patrício Ribeiro.
Aspecto da sala com as duas mesas. Na primeira, ao meio temos o nosso amigo Patrício Ribeiro, de bigode e camisa branca, outro membro da nossa Tabanca Grande, mais conhecido em Bissau como o verdadeiro embaixador... dos tugas.
Mais uma foto do Patrício Ribeiro, ao centro, ladeado de tugas, da Associação Ajuda Amiga. Antigo fuzileiro, natural de Angola, o Patrício leva já 25 de Guiné, a sua segunda pátria.
Dois portugueses que estavam na mesa do Patrício Ribeiro.
A mesma mesa, vista de outro ângulo, com o Patricio Ribeiro, de costas, à esquerda
Em primeiro plano, a Alice Mané, a presidente da Rede Ajuda, parceira da associação portuguesa Ajuda Amiga.
A Alice Mané e o Carlos Silva
Alice Mané, à direita, mais dois membros da Associação Ajuda Amiga (de que eu só conheço os dois Carlos, o Fortunato e o Silva)
Outro aspectio da mesa onde estava a Alice Mané.
Novamente o Carlos Silva e a Alice Mané. O Camarada da direita não o conheço.
Mais três portugueses da Ajuda Amiga.
Outros dois membros da Associação
Fotos: Pepito (2009). Direitos reservados
1. Mensagem do Pepito com data de 10 do corrente:
Envio-te algumas fotos dos companheiros da Ajuda Amiga que partiram esta manhã para Cantanhez, onde vão passar 2 dias a gozar as belezas da Mata e a partilhar amizade com a população local.
Tenho a certeza que se vão entusiasmar com o ecoturismo (vão ver os chimpanzés e vão de barco à Ilha de Melo, tomar uma banhoca na praia, que o calor já aperta).
Ontem estivemos a conviver lá em casa com a participação da Alice Mané, Presidenta da Rede Ajuda, parceira da Ajuda Amiga.
Também esteve o Patrício Ribeiro da nossa Tabanca Grande, conhecido como o Embaixador dos Portugueses; finalmente o ex-furriel Rui Miranda, meu grande amigo e marido da Isabel, Presidenta da AD. Como são muitas fotos tenho de as ir enviando aos poucos.
abraços do amigo pepito
2. Mensagem do presidente da Ajuda Amiga, Carlos Fortunato, que reproduzimos da respectiva página na Net, com a devida vénia:
Unidos no passado, Unidos no presente!
Amigos e Camaradas
A história da nossa Associação, tem origem em vários combatentes que participaram na guerra da Guiné (1963-1974), os quais sensibilizados pela situação dos antigos camaradas de armas que por lá ficaram, e pela grande amizade que os deixou ligados aquela gente e aquela terra, decidiram tocar a reunir e implementar um movimento de ajuda à Guiné-Bissau, dando seguimento a acções de apoio individuais, ou de pequenos grupos que alguns já vinham realizando na Guiné.
Este movimento cresceu, evoluiu, sempre orientado por um grande espírito humanitário e de solidariedade, tendo em 7/6/2008 sido realizada a Assembleia Geral que deu origem à constituição da Ajuda Amiga - Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento, e em 17/7/2008 a respectiva escritura.
A necessidade de criação desta Associação, sem fins lucrativos, surgiu para poder permitir a continuidade do trabalho anterior de um modo mais eficaz, para poder crescer na sua acção, e para poder obter apoios adicionais, de modo a ajudar quem mais necessita, mas mantendo sempre o principio de acompanhamento no terreno das acções de ajuda, de modo a garantir que estas chegam aos destinatários.
A Associação está organizada por núcleos, o que tem uma dupla finalidade, por um lado responder às motivações dos dadores que são mais sensíveis a ajudar determinadas zonas, por outro lado, utilizar os seus conhecimentos e vontade de se deslocaram a essas zonas, para pessoalmente ajudarem, e verificarem que a ajuda chega aos destinatários, actuando assim cada núcleo sobre uma zona geográfica à sua responsabilidade, a qual acompanha de perto, nomeadamente através de visitas, e de contactos directos com o Grupo Local de Apoio, garantindo a concretização dos objectivos definidos.
A criação destes núcleos e a concretização dos objectivos, depende das vontades e recursos que cada núcleo mobilizar, obviamente que para além disto existirá sempre um espírito de solidariedade global.
As acções iniciais realizadas pelos membros da nossa Associação, são parte da herança que a Associação vai continuar a dar seguimento.
As primeiras acções remontam a 1996, com entrega de artigos escolares e brinquedos no sector de Farim na zona de Cuntima e Jubembem.
Em Bissorã em resultado das acções de ajuda realizadas, criou-se em 2007 um Grupo Local de Apoio, em que vários amigos e camaradas que ali possuem alguns meios, dentro das suas fracas possibilidades, disponibilizaram o seu tempo e os seus meios de produção, para que fosse possível prestar ajuda aquela zona.
A criação deste Grupo Local de Apoio em Bissorã, em 2007, permitiu criar ali um Centro Logístico, assim passamos a ter acesso a um armazém para podermos guardar os bens recebidos, um terreno para experimentar novas espécies de árvores de fruto e sementes (para posteriormente distribuir à população, a fim de melhorarem a sua produção), uma carroça de burros, e uma viatura pick-up para facilitar a distribuição local dos bens.
A eficácia da ajuda melhorou imenso em Bissorã graças ao Grupo Local, e assim o apoio dado em Março de 2008, permitiu entre muitas outras coisas, criar a Biblioteca Municipal de Bissorã, e distribuir mais de 2.000 livros por algumas escolas da região.
Importa salientar que o envio de ajuda em Março de 2008, foi realizada em colaboração, com a Associação Humanitária Memória de Gentes, [de Coimbar,]e outras Associações e entidades, e com o apoio de muitos voluntários, pois é grande o esforço a realizar.
Este movimento de ajuda iniciada por um grupo de “jovens” sexagenários, que acredita que “com pouco podemos ajudar muito”, pressupõe a ajuda de cada um dentro das suas possibilidades.
Existem já Zonas de Suporte Logístico em Coimbra e Queluz, e estão a ser organizadas outras zonas, as quais irão recolher bens, quando forem lançadas as campanhas de recolha.
Convidamos-te para colaborar activamente nesta tarefa humanitária, e também a seres sócio, e a convidares outros amigos ou camaradas que tenham sido ou não combatentes na Guiné e que se solidarizem connosco.
Só unidos poderemos ir mais longe.
Aguardamos a tua resposta. Não fiques em silêncio, contacta-nos.
Um grande abraço.
Lisboa, 18 de Julho de 2008
J. Carlos M. Fortunato
Presidente da Ajuda Amiga - Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento
___________
Nota de L.G.:
(*) Vd. último poste desta série > 27 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3949: Ser solidário (28): Dar Vida Sem Morrer, com a Catarina Furtado no Gabu (Torcato Mendonça)
Vd. também:
16 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3900: Expedição Humanitária 2009 (1): Já se fez à estrada a expedição da Humanitarius, com o J. Almeida, o A. Camilo e outros
9 de Novembro de 2008 > > Guiné 63/74 - P3428: Ser solidário (24): Em marcha a expedição de ajuda humanitária de 2009 (José Moreira / Pepito / Carlos Silva / Xico Allen)
Aspecto da sala com as duas mesas. Na primeira, ao meio temos o nosso amigo Patrício Ribeiro, de bigode e camisa branca, outro membro da nossa Tabanca Grande, mais conhecido em Bissau como o verdadeiro embaixador... dos tugas.
Mais uma foto do Patrício Ribeiro, ao centro, ladeado de tugas, da Associação Ajuda Amiga. Antigo fuzileiro, natural de Angola, o Patrício leva já 25 de Guiné, a sua segunda pátria.
Dois portugueses que estavam na mesa do Patrício Ribeiro.
A mesma mesa, vista de outro ângulo, com o Patricio Ribeiro, de costas, à esquerda
Em primeiro plano, a Alice Mané, a presidente da Rede Ajuda, parceira da associação portuguesa Ajuda Amiga.
A Alice Mané e o Carlos Silva
Alice Mané, à direita, mais dois membros da Associação Ajuda Amiga (de que eu só conheço os dois Carlos, o Fortunato e o Silva)
Outro aspectio da mesa onde estava a Alice Mané.
Novamente o Carlos Silva e a Alice Mané. O Camarada da direita não o conheço.
Mais três portugueses da Ajuda Amiga.
Outros dois membros da Associação
Fotos: Pepito (2009). Direitos reservados
1. Mensagem do Pepito com data de 10 do corrente:
Envio-te algumas fotos dos companheiros da Ajuda Amiga que partiram esta manhã para Cantanhez, onde vão passar 2 dias a gozar as belezas da Mata e a partilhar amizade com a população local.
Tenho a certeza que se vão entusiasmar com o ecoturismo (vão ver os chimpanzés e vão de barco à Ilha de Melo, tomar uma banhoca na praia, que o calor já aperta).
Ontem estivemos a conviver lá em casa com a participação da Alice Mané, Presidenta da Rede Ajuda, parceira da Ajuda Amiga.
Também esteve o Patrício Ribeiro da nossa Tabanca Grande, conhecido como o Embaixador dos Portugueses; finalmente o ex-furriel Rui Miranda, meu grande amigo e marido da Isabel, Presidenta da AD. Como são muitas fotos tenho de as ir enviando aos poucos.
abraços do amigo pepito
2. Mensagem do presidente da Ajuda Amiga, Carlos Fortunato, que reproduzimos da respectiva página na Net, com a devida vénia:
Unidos no passado, Unidos no presente!
Amigos e Camaradas
A história da nossa Associação, tem origem em vários combatentes que participaram na guerra da Guiné (1963-1974), os quais sensibilizados pela situação dos antigos camaradas de armas que por lá ficaram, e pela grande amizade que os deixou ligados aquela gente e aquela terra, decidiram tocar a reunir e implementar um movimento de ajuda à Guiné-Bissau, dando seguimento a acções de apoio individuais, ou de pequenos grupos que alguns já vinham realizando na Guiné.
Este movimento cresceu, evoluiu, sempre orientado por um grande espírito humanitário e de solidariedade, tendo em 7/6/2008 sido realizada a Assembleia Geral que deu origem à constituição da Ajuda Amiga - Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento, e em 17/7/2008 a respectiva escritura.
A necessidade de criação desta Associação, sem fins lucrativos, surgiu para poder permitir a continuidade do trabalho anterior de um modo mais eficaz, para poder crescer na sua acção, e para poder obter apoios adicionais, de modo a ajudar quem mais necessita, mas mantendo sempre o principio de acompanhamento no terreno das acções de ajuda, de modo a garantir que estas chegam aos destinatários.
A Associação está organizada por núcleos, o que tem uma dupla finalidade, por um lado responder às motivações dos dadores que são mais sensíveis a ajudar determinadas zonas, por outro lado, utilizar os seus conhecimentos e vontade de se deslocaram a essas zonas, para pessoalmente ajudarem, e verificarem que a ajuda chega aos destinatários, actuando assim cada núcleo sobre uma zona geográfica à sua responsabilidade, a qual acompanha de perto, nomeadamente através de visitas, e de contactos directos com o Grupo Local de Apoio, garantindo a concretização dos objectivos definidos.
A criação destes núcleos e a concretização dos objectivos, depende das vontades e recursos que cada núcleo mobilizar, obviamente que para além disto existirá sempre um espírito de solidariedade global.
As acções iniciais realizadas pelos membros da nossa Associação, são parte da herança que a Associação vai continuar a dar seguimento.
As primeiras acções remontam a 1996, com entrega de artigos escolares e brinquedos no sector de Farim na zona de Cuntima e Jubembem.
Em Bissorã em resultado das acções de ajuda realizadas, criou-se em 2007 um Grupo Local de Apoio, em que vários amigos e camaradas que ali possuem alguns meios, dentro das suas fracas possibilidades, disponibilizaram o seu tempo e os seus meios de produção, para que fosse possível prestar ajuda aquela zona.
A criação deste Grupo Local de Apoio em Bissorã, em 2007, permitiu criar ali um Centro Logístico, assim passamos a ter acesso a um armazém para podermos guardar os bens recebidos, um terreno para experimentar novas espécies de árvores de fruto e sementes (para posteriormente distribuir à população, a fim de melhorarem a sua produção), uma carroça de burros, e uma viatura pick-up para facilitar a distribuição local dos bens.
A eficácia da ajuda melhorou imenso em Bissorã graças ao Grupo Local, e assim o apoio dado em Março de 2008, permitiu entre muitas outras coisas, criar a Biblioteca Municipal de Bissorã, e distribuir mais de 2.000 livros por algumas escolas da região.
Importa salientar que o envio de ajuda em Março de 2008, foi realizada em colaboração, com a Associação Humanitária Memória de Gentes, [de Coimbar,]e outras Associações e entidades, e com o apoio de muitos voluntários, pois é grande o esforço a realizar.
Este movimento de ajuda iniciada por um grupo de “jovens” sexagenários, que acredita que “com pouco podemos ajudar muito”, pressupõe a ajuda de cada um dentro das suas possibilidades.
Existem já Zonas de Suporte Logístico em Coimbra e Queluz, e estão a ser organizadas outras zonas, as quais irão recolher bens, quando forem lançadas as campanhas de recolha.
Convidamos-te para colaborar activamente nesta tarefa humanitária, e também a seres sócio, e a convidares outros amigos ou camaradas que tenham sido ou não combatentes na Guiné e que se solidarizem connosco.
Só unidos poderemos ir mais longe.
Aguardamos a tua resposta. Não fiques em silêncio, contacta-nos.
Um grande abraço.
Lisboa, 18 de Julho de 2008
J. Carlos M. Fortunato
Presidente da Ajuda Amiga - Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento
___________
Nota de L.G.:
(*) Vd. último poste desta série > 27 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3949: Ser solidário (28): Dar Vida Sem Morrer, com a Catarina Furtado no Gabu (Torcato Mendonça)
Vd. também:
16 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3900: Expedição Humanitária 2009 (1): Já se fez à estrada a expedição da Humanitarius, com o J. Almeida, o A. Camilo e outros
9 de Novembro de 2008 > > Guiné 63/74 - P3428: Ser solidário (24): Em marcha a expedição de ajuda humanitária de 2009 (José Moreira / Pepito / Carlos Silva / Xico Allen)
Guiné 63/74 - P4015: Nuvens negras sobre Bissau (20): Citando a filha de Nino, 'vamos parar de nos matar uns aos outros' (Hélder Sousa)
1. Mensagem do nosso camarada Hélder Sousa (ex-Fur Mil Trms TSF, Bissau e Piche, 1970/72):
Caro camarada Luís Graça:
Vi umas breves imagens na RTP1 sobre o funeral de Nino Vieira (*) e delas registo a grande manifestação de pesar por parte de significativo número de elementos da população (também não esqueço que Bissau é chão papel), que me deixaram a pensar, sem ter chegado a nenhuma conclusão, se o povo estava a homenagear o heróico e valoroso combatente da luta de libertação ou se o representante máximo da política que tem desgraçado aquele país. Infelizmente sei que não é fácil, senão impossível, separar as duas personalidades, porque são ambas o mesmo....
No entanto o que realmente retive, me sensibilizou e tomei a sério, foi a vibrante e sentida declaração, em jeito de apelo, duma filha de 'Nino', uma jovem que aparentou uma grande postura e sentido de Estado, de seu nome Nuntcha Vieira (**), que disse, não exactamente por estas palavras, porque não as gravei, mas cujo sentido julgo ter apreendido, e que foi "agora que ele morreu, vamos parar de nos matar uns aos outros, já chega".
É preciso acreditar, mais uma vez, que a Guiné, a "nossa Guiné", nossa no sentido daquela estima e amor que por ela nutrimos, tem ainda direito a mais uma oportunidade para ser um Estado viável. É certo que a conjuntura mundial agora não é nada favorável. É certo que a Guiné já "queimou" inúmeras boas-vontades. Mas é preciso acreditar, tanto mais que temos (tenho) a sensação que pode haver a tentação de "repartir" aquele território pelos seus gulosos vizinhos a norte, leste e sul e disso não me parece que viesse a haver mais benefícios para aquelas populações do interior.
Será certamente a partir das jovens gerações, de novos quadros, da diáspora e não só, de que a Nuntcha parece ser um exemplo, que pode a Guiné renascer na esperança e trilhar de vez o caminho da paz interior e do desenvolvimento.
Que assim seja!
Um abraço forte para todos os amigos
Hélder Sousa
__________
Notas de L.G.:
(*) Vd. último poste desta série > 9 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4001: Nuvens negras sobre Bissau (19): 'Nino' Vieira (1939-2009): tão bom combatente como mau político (Virgínio Briote)
(**) Título do Angola Press: 11-03-2009, 14:43 > Guiné-Bissau: Filha de Nino Vieira pede reconciliação de bissau-guineenses
Bissau - Elisa Vieira, uma das filhas do finado Presidente João Bernardo “Nino” Vieira da Guiné-Bissau, instou os cidadãos deste país a reconciliar-se e parar de se matar de uma vez para sempre, soube a PANA em Bissau.
“Vamos parar de nos matar de uma vez por todas”, clamou a filha do Presidente bissau-guineense na cerimónia de homenagem ao seu pai realizada terça-feira, em Bissau, no Palácio das Colinas de Boé, sede da Assembleia Nacional Popular (Parlamento) da Guiné-Bissau.
Segundo Elisa Vieira, residente actualmente na Europa, a sua vinda e a dos seus irmãos a Bissau teve a finalidade não só de se despedir do pai, assassinado a 2 de Março corrente na sua residência na capital bissau-guineense por militares
não identificados, “mas também de pedir que os Guineenses se reconciliem”.
Afirmou que o seu pai, que esteve durante muito tempo exilado em Portugal depois do último conflito militar que determinou o seu derrube do poder antes de regressar ao país para ganhar as eleições presidenciais de 2005, “morreu por acreditar e crer” na reconciliação do seu povo.
Exaltando o orgulho da sua família pelas qualidades do pai como “um grande homem, um grande filho da Guiné”, Elisa Vieira, que não conseguia conter as lágrimas durante a sua curta alocução, disse que eles nem sempre conseguiram comungar, mas sempre respeitaram, a vontade do seu progenitor de voltar ao seu país “e fazer aquilo que sempre fez desde a infância”. (...).
______________
quarta-feira, 11 de março de 2009
Guiné 63/74 - P4014: Museu Militar, Lisboa: Lançamento de livro sobre os Comandos (Virgínio Briote, ex-Alf Mil Cmd, Brá, 1965/67)
Capa de Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), 14º Volume: Comandos, Tomo 1: Grupos Iniciais, 1ª ed., Lisboa, 2009.
Lisboa > Museu Militar > Sessão de lançamento de Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), 14º Volume – Comandos, Tomo 1 – Grupos Iniciais, 1ª ed., Lisboa, 2009 > 10 de Março de 2009 > velhos Comandos de Brá (ex-Furr Mil João Parreira, ex-Alf Mil Virgínio Briote e Cors. Amadeu Neves da Silva e Vitor Caldeira) (*) . Fotógrafo Raimundo, ex-1º Cabo do Destacamento Foto-cine, do QG, e ex-combatente na Op Tridente.
Lisboa > Museu Militar > 10 de Março de 2009 > O Cor Cmd Glória Alves, à direita, falando, em traços gerais, da evolução dos volumes da Resenha Histórica-Militar da Campanhas de África.
Lisboa > Museu Militar > 10 de Março de 2009 > Pátio interior: aspecto parcial
Lisboa > Museu Militar > 10 de Março de 2009 > Chegada das individualidades
Fotos: © Virgínio Briote (2009). Direitos reservados
1. Mensagem do Virgínio Briote, nosso co-editor, ex-Alf Mil Cmd, Brá, 1965/67:
Ontem já cheguei tarde a casa. A MI foi comigo ao Muser Militar assistir à apresentação do 14º volume da Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961/74).
Estavam lá muita gente, mais de 200 pessoas. Encontrei o Cor Matos Gomes e o Cor Raul Folques, do BCmds Africanos e o Cor Glória Alves que fechou Brá e o BCmds, em 1974. O Matos Gomes pareceu-me em boa forma e está muito interessado na cronologia da Guerra (da sua autoria e do Coronel Aniceto Afonso), que está a sair às 4ªs no Correio da Manhã.
Pela 1ª vez, em 41 anos, encontrei-me, para a fotografia, com alguns dos antigos cmds:
(i) Neves da Silva, Cmdt Gr Apaches, hoje Coronel, responsável militar pela segurança dos PR Mário Soares e Jorge Sampaio;
(ii) Vítor Caldeira, Cmdt Gr Vampiros, também Coronel, que continuou nos cmds de Moçambique e, já depois do 25/4 foi ajudante de campo do então Governador de Macau, Coronel Garcia Leandro.
Dos 4 alfs, cmdts de grupo, faltaram o Luís Raínha e o Vilaça, que já morreu.
Estive também com o Amadu Djaló (*), com quem estabeleci um plano de trabalho para levar ao público a guerra na Guiné, com os olhos de um africano a combater por Potugal.
Esteve também o Parreira. O Mário Dias faltou por doença, isto para falar de gente nossa conhecida. E tive a oportunidade e o gosto de conhecer o Abreu dos Santos, que apenas conhecia da escrita e que, infelizmente, não tivemos tempo de conversar.
Foi uma cerimónia digna. Tratou de história. Da Indochina, Argélia, Angola, Guiné e, finalmente Moçambique. Tiveram a cargo as apresentações:
- O Cor Cmd Glória Alves, que falou, em traços gerais, da evolução dos vols da "Resenha Histórico-Militar da Campanhas de África";
- O Brigadeiro Marquilhas que, em breves palavras, contou os primórdios dos cmds, de Angola a Moçambique, passando pela Guiné, evidentemente;
- O Cor Graça, actualmente Cmdt do Centro de Tropas Cmds, que fez uma pequena resenha deste 14º volume, dedicado às tropas comandos;
- E, finalmente, o CEME, General Ramalho, que encerrou.
Uma cerimónia digna, repito. Não se louvou ninguém, não se falou de acções heróicas, mas revelaram-se pormenores, um ou outro delicioso, sobre os meandros da formação dos Cmds.
Deste tomo, 14º volume, que tenho em meu poder, há momentos folheei-o e tive o gosto de ver que, muito do material publicado sobre o início dos grupos da Guiné, nomeadamente 1965/66, foram por mim facultados, bem como algumas imagens.
VB
2. Mais informação, detalhada, do VB, sobre esta publicação:
Autores:
Cor Cmd José Castelo Glória Alves
Cor Cmd Horácio Silva Ferreira
Cor Cmd Carlos Carronda Rodrigues
Edição do Estado-Maior do Exército / Comissão para o Estudo das Campanhas de África
Associação de Comandos, Lisboa, 2008.
Coordenação e revisão: Major-General Henrique Nascimento Garcia
“Em 1962, em Zemba (Angola), e em 1964, na Namaacha (Moçambique) e em Brá (Guiné), nasceram os 'comandos portugueses' que, desde logo, demonstraram capacidades específicas para actuar no TO que se lhes deparava, enfrentando a guerrilha e a subversão.(….)
A obra focaliza-se na 'tropa comando', sistematizando a génese e a formação da especialidade, a constituição dos primeiros grupos de combate e a actividade desenvolvida. O trabalho de pesquisa apresentou diversas dificuldades, pela dispersão e escassez dos documentos, tendo-se revelado muito importantes os contributos prestados por militares e ex-militares ‘comandos’.”
Do Prefácio, assinado pelo Major-General Adelino Matos Coelho, Director da Direcção de História e cultura Militar.
E do depoimento do General, “Comando” Honorário, Bettencourt Rodrigues:
“Como tive a honra de estar presente nesta fase de arranque, ainda hoje vejo com admiração as figuras do Major Jasmim de Freitas, Tenente-Coronel Antunes de Sá, Major Gilberto Santos e Castro, Major Soares Carneiro e de todos os militares que estiveram sob o meu comando.
E guardo a mais grata recordação do jornalista Dante Vacci, figura fascinante de aventureiro do mundo e que teve influência e intervenção importantes naquela 'fase de arranque' (...).
O volume (607 páginas) está dividido em três grandes capítulos:
Angola, Guiné, Moçambique
Em cada um dos capítulos, descreve-se em pormenor os factos que estiveram na origem da especialidade, o historial dos Centros de Instrução, os nomes dos grupos e dos seus elementos e o histórico das acções em que intervieram.
No capítulo da Guiné (**), são abordados:
(i) Breves considerações sobre as condições geográficas, sócio-políticas e a situação militar
(ii) O porquê dos “comandos”
(iii) Os comandos da Guiné (recolha de informação, difusão da ideia, estágio em Angola, os primeiros seleccionados, o periodo inicial e o período final).
(iv) A operação Tridente (relatórios, mensagens e comentários à actividade, operações, referências)
(v) Levantamento do Centro de Instrução (quartel em Brá, planeamento, material de instrução)
(vi)Instrução
(vii) Iº Curso (grupos, instrutores, referências)
(viii) 1965 - IIº Curso
(ix) Reorganização do CIC (a CCmds do CTIG)
(x) IIIº Curso e a extinção dos grupos de Comandos
(xi) Historial dos grupos (actividade operacional entre 1964/66, louvores, condecorações, baixas)
____________________
Notas de L.G.:
(*) Vd. poste de 16 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3903: A Compª de Cmds do CTIG, 1965/66. Artigo do General Garcia Leandro na Revista Mama Sume. V. Briote
(**) Mensagens do VB, relacionadas com o Amadu Djaló:
13 de Fevereiro de 2009
(...) Fui contactado há tempos pelo Lobo do Amaral, Pres da Ass Cmds, para colaborar na revisão das memórias de um cmd, natural de Bafatá. Na altura, embora no íntimo muito interessado, respondi que não me sentia em condições para tal projecto. Ontem, voltou à carga. Que a Ass Cmds quer publicar em livro as memórias de um guineense que viveu os anos todos da guerra e que na Guiné conheceu os governos de Silva Tavares até Spínola. Eu quero fechar a minha vida na Guiné e não posso.
Estive hoje na Ass Cmds com o Presid. Passou-me para as mãos as memórias do Amadú Djaló. Desde 1958 até 1974. Desde soldado até alferes. Toda uma vida de um guineense que se afirma tão português como muitos de nós. Que escreve em crioulo, ou melhor num misto que ainda não consegui perceber bem. E de que vos mando uma amostra, uma primeira abordagem que comecei esta tarde a fazer. Os olhos doem-me de perceber a escrita manual do Amadú e de escrever para um português perceptível, respeitando o estilo da escrita do autor.
Foi meu camarada nos cmds, embora nunca no gr a que pertenci. Pertenceu ao gr do Saraiva, depois ao do Luís Rainha. Mais tarde esteve em Fá Mandinga, na formação dos cmds africanos. Cumbamory, entre muitos outros, foi um local por onde passou o Amadú. Penso que vamos ter aqui uma obra que vai abrir o blogue aos combatentes africanos que estiveram do nosso lado.
Um abraço do vb
[Mensagem minha de 14 de Fevereiro, em resposta à anterior:
VB: Muito provavelmente nunca irás encerrar esse 'capítulo' da tua vida... Nem tu nem nós... A vida é um continuum, nunca poderá ser feita de compartimentos estanques ou fechados... Em vez de ser um cruz que levas até ao calvário, tranforma isso em prazer intelectual e em solidariedade e camaradagem: tens agora uma bonita oportunidade de dar voz a um homem que tu conheceste, que era tão guineense quanto português, que foi teu camarada, e a quem agora podes emprestar o teu talento, a tua literacia informática, a tua capacidade para entender o outro, para comunciar, para partilhar, o teu/nosso blogue... Diz-me se precisas do nosso concurso... És um homem generoso e solidário ao aceitar esse desafio da Associação de Comandos. Dispõe do blogue como quiseres... Um bom fim de semana. Luís ].
9 de Março de 2009:
(...) Tenho estado entretido com o diário da guerra do Amadu Djaló (1962/74). Estou em 1965. Relata muitas ops militares, vistas pelo olhar e as reflexões de um africano. Muito crioulo e algum fula, misturado com algumas palavras em português...Esta semana vou encontrar-me com ele na AssCmds para esclarecer muitos pontos e amanhã também conto estar presente no Museu Militar, ás 18h00, na apresentação de mais um tomo da Resenha das Campanhas de África. (...)
Guiné 63/74 - P4013: Diário de Guerra, de Cristóvão de Aguiar (org. José Martins) (V): Do Tejo ao Geba (17 de Abril de 1965/25 de Maio de 1965)
(Continuação da publicação do Diário de Guerra, de Cristovão Aguiar)
Lisboa, 17 de Abril 1965
Sábado de Aleluia
Com repiques ao contrário dentro de mim. Acabei de embarcar com a minha Companhia Independente de Caçadores número oitocentos. Vamos com destino marcado para a Guiné. O "Ana Mafalda" vai cheio de carne para canhão e ainda se encontra atracado no Cais da Rocha.
São três as companhias de caçadores e parte de uma de comandos e serviços de um batalhão. No salão de primeira classe, há pouco, houve discursos e vinho do Porto e uísque e salgadinhos.
Uma falta de respeito. Mal acabou a cerimónia, enfiei-me no meu camarote de primeira, pois então! Morra Marta, mas morra farta! Estou para aqui sozinho, lavado em lágrimas, enquanto os outros oficiais meus camaradas, talvez mais corajosos, se encontram na amurada do navio nos últimos acenos de despedida. Puta de Pátria a minha!
Já fora Barra do Tejo, no mesmo dia, à noite
Já fora Barra do Tejo, no mesmo dia, à noite
BARCO DE ESPERANÇA
Fizeste um barco de esperança e partiste
Ao longo de um mar verde de ternura.
Ficou no cais ainda o eco triste
Do mar acalentando a aventura...
Geme agora o mar contra a noite escura,
Num beijo sincopado de segredo...
E a alma num alentejo de secura
Cai de joelhos transida de medo.
Medo da longa noite onde me canso,
Comprida noite onde nunca há descanso,
Nem estrela, nem barco ou gaivota...
E o mar que nos meus olhos cabia inteiro,
É agora um soluço de guerreiro,
Caindo em duas lágrimas de derrota.
18 de Abril
Mar e céu
neste Domingo de Páscoa triste, celebrada com amêndoas amargas que nos serviram à sobremesa do almoço para que houvesse sabor a festa. O navio não dá um balanço sequer. No porão, os soldados jogam às cartas e fazem algazarra. Ouço-os do deque de primeira. À mesa, o capitão só diz asneiras com ar compenetrado e sábio.
22 de Abril
Véspera de chegada.
Ainda se não adivinha terra nem rumor dela. Após a última refeição, passeio no deque, obstinadamente, como um burro à roda da nora. Houve mudança súbita de ventos, o que fez com que logo corresse o boato de que estaríamos mudando de rumo.
Ainda se não perdeu a crença num súbito milagre que nos leve à Ilha do Sal, nosso primordial destino! Só assim, sonhando, se aguenta esta patriótica estopada.
23 de Abril
Bissau
Evola-se desta terra avermelhada e ressequida um bafor que se transmite ao corpo e o faz destilar rios de suor. Logo após o desembarque e com as tropas já aquarteladas na Amura, fomo-nos apresentar ao comando militar. Desconhecia pura e simplesmente a nossa existência. Que não nos destinávamos a esta guerra, mas à da Ilha do Sal − foi-nos dito na secretaria, antes de apresentarmos cumprimentos ao comandante.
Ainda olhámos uns para os outros com um pequeno clarão nos olhos, mas depressa nos desiludiu SEXA, refastelado no seu gabinete, com ar condicionado, onde pouco depois entrámos, perfilados. Tinha na verdade havido um pequeno deslize de informação, mas iria ser imediatamente remediado. Ficaríamos, para compensar, à ordem do comando-chefe. Uma honra para a nossa companhia, que tinha vindo da metrópole para defender este tão pátrio chão.
26 Abril
26 Abril
Carreira de tiro
Fomos todos para a carreira de tiro treinar a pontaria e experimentar pela primeira vez as espingardas G3, que se utilizam nesta guerra. Nos cursos de preparação, em Mafra, Tavira e Santarém ainda se treina o pessoal com a Mauser da última guerra mundial. Que se divide em dez partes, a saber: cano com estrias, coronha, gatilho, guarda-mato, etcetra e tal.
29 de Abril
Ordem unida na Amura
Houve tentativa de levantamento de rancho na nossa companhia. Como ninguém se tivesse acusado como cabecilha da frustrada rebelião, o capitão, furioso por não ter bode expiatório, deu como castigo aos três pelotões operacionais, neles incluindo cozinheiros e outras especialidades não bélicas, oito horas seguidas de ordem unida, entremeada com passo de corrida.
Para que não houvesse quebra de ritmo nem de suor, ordenou que os quatro alferes dessem, à vez e na ordem inversa da sua antiguidade, duas horas de instrução cada um. Ainda se acredita piamente, na tropa, que a ordem unida é a mãe de todas as virtudes militares, sobretudo da disciplina.
5 de Maio
Primeiras baixas, nos arredores de Bissau,
O nosso capitão e o seu guarda-costas foram feridos numa operação-treino nos arredores de Bissau. Foram ambos transportados de urgência, de helicóptero, para o hospital militar. O primeiro, com estilhaços fincados por todo o corpo; o último, sem as duas pernas dos joelhos para baixo e com as tripas de fora e sujas de terra. Como oficial mais antigo, tomei o comando da companhia.
8 de Maio
Em Bissau, como Cmdt da CCaç 800
Recebi um rádio do gabinete do comando-chefe, anunciando a transferência para a metrópole do capitão e do seu soldado guarda-costas. Estou fragilizado e com muito medo. Não nasci para comandar tropas.
Para me sentir mais aconchegado e protegido no meio de toda esta engrenagem de insegurança e de morte pressentida, escrevi uma longa carta a meu tio Francisco, que mal conheço, devido às zangas fraternais entre ele e meu Pai que se estenderam durante quase toda a minha vida. Agora estão de bem um com o outro. Fizeram as pazes há cerca de dois meses, após meu tio ter frequentado, durante três dias, um Curso de Cristandade na Ilha, na estância termal do vale das Furnas.
Soube-me bem acolher-me ao robusto tronco familiar, durante as duas breves horas de escrita epistolar, regada a lágrimas saborosas. Pressinto a morte, muito perto, rondando-me os gestos, as palavras e os passos.
10 de Maio de 1965
No HM 241
Hospital Militar de Bissau, para uma pequena intervenção cirúrgica. Circuncisão, isto é, um corte no freio, que tinha dificuldade em arregaçar.
Se tivesse nascido judeu, ter-me-ia poupado ao incómodo nesta idade de quase um quarto de século. Saí do hospital pouco depois e vim para o quartel da Amura, sem sequer sentir necessidade de me ir recostar na tarimba. Fui antes para o bar dessedentar-me e dar umas boas tragaças, que o cigarro tem sido para mim um excelente camarada de armas...
24 de Maio de 1965
24 de Maio de 1965
Bambadinca
Veio a companhia por aí a cima, sob o meu comando, escoltada por outras tropas e por brigadas especializadas na detecção e levantamento de minas e armadilhas, atravessando terra-de-ninguém de Mansoa até aqui, em não sei quantas viaturas, abarrotando de tudo quanto é necessário para instalar uma companhia operacional no mato, desde tarimbas de ferro até tachos e panelas, passando por móveis para a secretaria, que, na guerra, a papelada tem grande importância. Chamam-lhe mesmo a guerra dos papéis, por vezes ainda mais renhida do que a sua irmã colaça.
Chegámos à margem esquerda do rio Geba, estava um capitão, Gabriel Teixeira de sua graça, com duas secções à nossa espera. Pertencem ao batalhão ao qual vamos ficar logisticamente adstritos, uma vez que, operacionalmente, continuamos à ordem do comando-chefe.
Ainda temos, porém, de atravessar tudo de jangada para a outra margem, incluindo as viaturas, a fim de seguirmos para Bafatá e depois para Contuboel, nosso destino. O rio Geba está sujeito ao regime das marés, nesta altura vivas, aqui chamadas macaréu, de forma que vamos demorar muito tempo até nos passarmos todos para o lado de lá.
Bambadinca, 25 de Maio de 1965
Bambadinca, 25 de Maio de 1965
A TUA AUSÊNCIA
A tua ausência
É este estar nu por dentro,
E ter um rosto velho
Gretado de suor
Do sol dos prados
E das manhãs
Que nunca tive...
Em cada segundo te habito
Como a loira canção das abelhas
O indomável cio
Das flores abrindo-se
Loucas de tesão...
__________
Notas:
1. Destaques da responsabilidade de vb
2. Último artigo do "Diário de Guerra", do Cristóvão de Aguiar em
Guiné 63/74 - P4012: Efemérides (18): Faz hoje 37 anos que tivémos o primeiro contacto com o IN (Luís Dias, CCAÇ 3491, Dulombi, 1971/74)
Guiné > Zona Leste > Dulombi/Galomaro > CCAÇ 3491 (1971/74) > Crachá do 2º Gr Comb, do Alf Luís Dias
Foto: luís Dias (2009). Direitos reservados
1. Mensagem de Luís Dias ex-Alf Mil da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872,
Dulombi e Galomaro, 1971/74
Caro Luís e restantes editores
Faz hoje 37 anos que elementos da CCAÇ 3491, tiveram o primeiro contacto com os guerrilheiros do PAIGC.
Se quiseres publicar esta pequena descrição do acontecido, faz obséquio. Desculpa os acentos, mas o meu portátil está com problemas nas teclas.
Uma chatice.
Em anexo segue o Crachá do 2º Gr Comb que foi um dos pelotões envolvidos naquele contacto
Um abraço,
Luís Dias.
2. Efemérides (18) > O primeiro contacto com o IN da CCAÇ 3491
Faz hoje, 11 de Março de 2009, 37 anos (tanto tempo decorrido), que elementos da CCAÇ 3491, pertencentes ao BCAÇ 3872, que tinham chegado à Guine em 24 de Dezembro de 1971 e ao Dulombi (Leste), em 24 de Janeiro de 1972, tiveram o seu primeiro contacto com os guerrilheiros do PAIGC.
Os velhinhos saíram do Dulombi em 10 de Março e, no dia seguinte, 11 de Março, o 2º e 3º Grupos de Combate, comandados respectivamente pelo Alf Luís Dias e pelo Alf Farinha, reforçados por uma Sec do Pel Mil 288, iniciaram a Operação Alma Forte, com a duração de dois dias (Sábado e Domingo - fim de semana maravilhoso!), com a finalidade de reconhecer e armadilhar os pontos de passagem do IN no R Corubal.
A primeira parte do percurso decorreu sem problemas, mas depois de invertermos a marcha e pelas 18H30, quando parámos para descansar junto ao Rio Lemenei/Paiai Lemenei (a cerca de 20 km do Dulombi), uma zona de mato denso e arborizado, tivemos o nosso primeiro contacto com o IN, estimado em 40/50 elementos.
Nos primeiros momentos de troca de tiros houve alguma dificuldade na resposta ao fogo do adversário, que utilizava armas automáticas e roquetes/morteiros, em especial na utilização dos nossos morteiros e dos dilagramas, devido às condições adversas do local. Só quando conseguimos sair daquela mata e depois de lançarmos várias granadas de morteiro 60 mm, que terão atingido fortemente o adversário é que este iniciou a retirada, a coberto da noite que, entretanto, tinha caído.
Devemos salientar nesta emboscada a actuação do Furriel do 2º Gr Comb, Espírito Santo, o Pira, que fixou com a sua Secção o fogo inimigo, permitindo a saída do restante pessoal da parte densa da mata e a actuação do Sold At Manga Camará (Guineense experiente), do 3º Gr Comb, que, tomando conta do morteirete de 60 mm, colocou-o à barriga (um feito difícil de acreditar para quem não viu) e disparou diversas granadas que mudaram o rumo dos acontecimentos (sentimos que o IN deixou de ripostar com a mesma intensidade).
De salientar ainda a actuação do 1º Cabo, Amílcar Costa, também do 2ºGr Comb, que, alertado por um camarada (o Amarante que foi o primeiro a avistar um elemento do IN e deu o alarme), viu esse guerrilheiro IN e foi o primeiro atirador da nossa companhia a efectuar fogo sobre os elementos inimigos, com a sua Met Lig HK21, só parando quando a mesma se encravou por problemas na fita alimentadora.
Do confronto resultou para o IN, pelos vastos vestígios de sangue encontrados, nomeadamente junto ao local onde fora avistado o guerrilheiro, pelo material diverso abandonado e pela rádio do PAIGC (que confirmou baixas, o que era raro, embora referindo que a nossa tropa tinha sofrido oito mortos), tiveram baixas não controladas e a apreensão de 11 granadas de RPG7 /RPG2, entre outro material e equipamento diverso.
As nossas forças sofreram dois feridos ligeiros e a sorte de outros elementos terem recebido tiros que lhes atravessaram os cantis, os carregadores, as camisas ou dólmens....enfim uma grande sorte!!!
O reconhecimento feito posteriormente levou-nos a concluir que o IN estaria naquele mesmo local a descansar, possivelmente a preparar-se para ir atacar o nosso aquartelamento, tendo sido surpreendidos pela nossa chegada. Colhemos diversos ensinamentos do acontecido, que nos serviriam para o futuro em outras acções.
Esta acção mereceu das diversas cadeias de comando as seguintes referências elogiosas:
-Do Cmdt BCAÇ 3872 msg nº70/03:"Felicito êxito obtido. Transmita pessoal dessa minha satisfação";
-Do Cmdt CAOP2 (Agrupamento de Batalhões daquela área) msg nº952/0: "Felicito tão auspicioso começo";
-Do Cmdt Chefe -REP OPER msg nº984/C: "Cmdt Chefe felicita essa reacção à emboscada do In durante OP "Alma Forte", reveladora de determinação".
O 2º Gr Comb passou a utilizar como lema, posto no seu crachá, o nome da operação que provocou o primeiro contacto com o IN - Alma Forte.
____________
Nota de L.G.:
3 de Fevereiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3926: Efemérides (17): Piche, 22 de Fevereiro de 1971 ou... Carnaval, nunca mais! (Helder Sousa)
Guiné 63/74 - P4011: Poemário do José Manuel (27): Um ruído vem do céu / e há cabeças no ar, / hoje é dia de correio...
Guiné > Região de Tombali > Mampatá > CART 6250 , Os Unidos de Mampatá (1972/74) > Pós-25 de Abril de 1974 > Um guerrilheiro do PAIGC e o Fur Mil José Manuel Lopes, dando o abraço da paz e da reconciliação..."Antes um inimigo, que só podia ser visto pela mira da nossa arma, depois um abraço, um sorriso e porque não um amigo" (JML) ...
O José Manuel voltou à Guiné, voltou a Mampatá, 35 anos depois!... Com os amigos e camaradas da CART 6250, o Carvalho (Fur Enf), o Nina (Fur Mec Auto), o Leça (Sold Cond Auto)... Foi surpreendido pelos trágicos acontecimentos de Bissau, do início da semana passada, em que morreram Tagmé Na Waie e Nino Vieira. Já estavam em Buba, quando souberam da notícia, recebida com calma entre a população fula...
Em Mampatá ficaram 4 dias. Conheceram momentos de alegria e de tristeza. Visitaram as escolas locais (duas, uma pública e uma privada)... Deixaram material aos miúdos. Aperceberam-se da dura realidade da Guiné, em que a administração pública mal existe: duas escolas, uma pública, com 400 e tal miúdos; outra privada, com duas dezenas de alunos... Quem era o professor desta ? O José Manuel reconhceu o antigo professor do PAIGC... As famílias, com algumas posses, pagam ao professor, em géneros... O Estado está meses e meses sem pagar um tusto aos seus funcionários...
Visitaram a campa de um dos seus amigos, milícia, que foi fuzilado, a seguir à independência, na praça pública ("Morreu com uma enorme dignidade, de cara levantada, perante o pelotão de fuzilamento; podia ter fugido, avisaram-no, não o fez"...).
Ofereceram-lhes um cabrito... Gente boa, simples, hospitaleira, que continua a imaginar Portugal como um eldorado: o sonho de uma família fula de Mampatá, é ter um filho a trabalhar cá... A remessa de 50 euros, que seja, é uma benção... Até apareceu um filho de um tuga, a chamar pai a um dos nossos camaradas... Enfim, todos os pretetextos são bons para se chegar a Portugal...
Reconheceram (e foram reconhecidos por) velhos amigos da população (fula) e camaradas de armas... Fizeram a estrada que ajudaram a construir, hoje totalmente degradada, irreconhecível: Nhacobá... Salancaur... Estiveram no corredor de Guileje, mas não foram a Guileje, por dificuldades de ligação.
Enfim, lá tiveram de voltar a casa, por que a vida continua: o Carvalho é presidente de uma Junta de Freguesia, em Gondomar; o Nino tem, na Covilhã, uma empresa de comércio automóvel, com bastantes colaboradores; o Zé Manel tem a sua Quinta da Graça, no Alto Douro, onde é vitivinicultor (e tinha a sua Luísa a chorar de saudades); o Leça (que levou a esposa) é uma antigo emigrante em França... Gente extraordinária, que merece as nossas palmas! Ah!, com eles também viajou o Silvério Lobo, que esteve em Aldeia Formosa, e que é mecânico de profissão...
Chegaram ontem ao fim da tarde, cansados... Fizeram a viagem em contra-relógio. Já em Marrocos encontraram também o resto da malta da Tabanca de Matosinhos: o Xico Allen, o Pimentel, o João Rocha... Ainda lá ficaram, na Guiné, o Moreira e a malta de Coimbra, bem como a malta de Lisboa (Carlos Fortunato, Carlos Silva e outros, da Ajuda Amiga...)... Do Camilo e da malta do Algarve não me soube dizer nada.
Falei ao telefone com o Zé Manel ontem à noite... (Estava a ver a bola, a desgraça do Sporting; ele é benquista, mas patriota... Já o meu amigo Pepito é sportinguista e merece um grande abraço de consolo...).
O Zé Manel disse-me que nem tudo correu pelo melhor, na viagem para lá e para cá (em que perdeu o telemóvel)... Na Mauritânia, o Zé Manel esteve detido 4 horas numa esquadra de polícia, por tirar fotografias... A polícia da Mauritânia faz intimação e chantagem aos turistas... Mas isso são outros contos... para outras alturas. O Zé Manel vai fazer um festinha, um dia destes, num fim de semana (talvez a 21), para partilhar connosco as emoções da viagem... O Paulo Santiago já disse que levava o leitão de Aguada de Cima (que é o melhor do mundo)...
Para celebrar o regresso do Zé Manel e demais amigos e na sequência também do poste, bem humorado, do nosso camarada da Força Aérea António Martins de Matos ("Correio com antenas") (*), fui repescar um dos poemas do Josema (**), poesia singela de um tuga, que era (é) um homem sensível e de coração grande, e que retrata aqui, melhor do que ninguém, em traços breves e leves de aguarela, o nosso quotidiano de guerra...
Foto e poema © José Manuel (2008). Direitos reservados.
Um ruído vem do céu
e há cabeças no ar,
hoje é dia de correio,
há novas para chegar,
faz-se a distribuição
com chamada frente ao bar.
Para o Santos nada veio
será que vai desmaiar?
P'ró Zé Manel veio a Bola
com as novas do Benfica,
p’ró Pinheiro uma encomenda
e alguém lhe manda uma dica,
fazendo-se para a merenda.
Sim, de correio foi o dia,
não pode haver melhor prenda,
é altura de alegria,
retiram-se os felizardos,
relêem a mesma carta
até afogar a saudade.
Mampatá 1972
josema
[Revisão/fixação do texto: L.G.]
__________
Notas de L.G.:
(*) Vd. poste de 11 de Março de 2009 >Guiné 63/74 - P4010: FAP (15): Correio com antenas... (António Martins de Matos, ex-Ten Pilav, BA12, Bissalanca, 1972/74)
(**) Vd. postes de
13 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3884: Poemário do José Manuel (26): O regresso a Mampatá, 35 anos depois...
28 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2694: Poemário do José Manuel (5): Não é o Douro, nem o Tejo, é o Corubal... Nem tudo é mau afinal.... Há o Carvalho, há o Rosa...(...)
27 de Fevereiro de 2008 >Guiné 63/74 - P2585: Blogpoesia (8): Viagem sem regresso (José Manuel, Fur Mil Op Esp, CART 6250, Mampatá, 1972/74)
O José Manuel voltou à Guiné, voltou a Mampatá, 35 anos depois!... Com os amigos e camaradas da CART 6250, o Carvalho (Fur Enf), o Nina (Fur Mec Auto), o Leça (Sold Cond Auto)... Foi surpreendido pelos trágicos acontecimentos de Bissau, do início da semana passada, em que morreram Tagmé Na Waie e Nino Vieira. Já estavam em Buba, quando souberam da notícia, recebida com calma entre a população fula...
Em Mampatá ficaram 4 dias. Conheceram momentos de alegria e de tristeza. Visitaram as escolas locais (duas, uma pública e uma privada)... Deixaram material aos miúdos. Aperceberam-se da dura realidade da Guiné, em que a administração pública mal existe: duas escolas, uma pública, com 400 e tal miúdos; outra privada, com duas dezenas de alunos... Quem era o professor desta ? O José Manuel reconhceu o antigo professor do PAIGC... As famílias, com algumas posses, pagam ao professor, em géneros... O Estado está meses e meses sem pagar um tusto aos seus funcionários...
Visitaram a campa de um dos seus amigos, milícia, que foi fuzilado, a seguir à independência, na praça pública ("Morreu com uma enorme dignidade, de cara levantada, perante o pelotão de fuzilamento; podia ter fugido, avisaram-no, não o fez"...).
Ofereceram-lhes um cabrito... Gente boa, simples, hospitaleira, que continua a imaginar Portugal como um eldorado: o sonho de uma família fula de Mampatá, é ter um filho a trabalhar cá... A remessa de 50 euros, que seja, é uma benção... Até apareceu um filho de um tuga, a chamar pai a um dos nossos camaradas... Enfim, todos os pretetextos são bons para se chegar a Portugal...
Reconheceram (e foram reconhecidos por) velhos amigos da população (fula) e camaradas de armas... Fizeram a estrada que ajudaram a construir, hoje totalmente degradada, irreconhecível: Nhacobá... Salancaur... Estiveram no corredor de Guileje, mas não foram a Guileje, por dificuldades de ligação.
Enfim, lá tiveram de voltar a casa, por que a vida continua: o Carvalho é presidente de uma Junta de Freguesia, em Gondomar; o Nino tem, na Covilhã, uma empresa de comércio automóvel, com bastantes colaboradores; o Zé Manel tem a sua Quinta da Graça, no Alto Douro, onde é vitivinicultor (e tinha a sua Luísa a chorar de saudades); o Leça (que levou a esposa) é uma antigo emigrante em França... Gente extraordinária, que merece as nossas palmas! Ah!, com eles também viajou o Silvério Lobo, que esteve em Aldeia Formosa, e que é mecânico de profissão...
Chegaram ontem ao fim da tarde, cansados... Fizeram a viagem em contra-relógio. Já em Marrocos encontraram também o resto da malta da Tabanca de Matosinhos: o Xico Allen, o Pimentel, o João Rocha... Ainda lá ficaram, na Guiné, o Moreira e a malta de Coimbra, bem como a malta de Lisboa (Carlos Fortunato, Carlos Silva e outros, da Ajuda Amiga...)... Do Camilo e da malta do Algarve não me soube dizer nada.
Falei ao telefone com o Zé Manel ontem à noite... (Estava a ver a bola, a desgraça do Sporting; ele é benquista, mas patriota... Já o meu amigo Pepito é sportinguista e merece um grande abraço de consolo...).
O Zé Manel disse-me que nem tudo correu pelo melhor, na viagem para lá e para cá (em que perdeu o telemóvel)... Na Mauritânia, o Zé Manel esteve detido 4 horas numa esquadra de polícia, por tirar fotografias... A polícia da Mauritânia faz intimação e chantagem aos turistas... Mas isso são outros contos... para outras alturas. O Zé Manel vai fazer um festinha, um dia destes, num fim de semana (talvez a 21), para partilhar connosco as emoções da viagem... O Paulo Santiago já disse que levava o leitão de Aguada de Cima (que é o melhor do mundo)...
Para celebrar o regresso do Zé Manel e demais amigos e na sequência também do poste, bem humorado, do nosso camarada da Força Aérea António Martins de Matos ("Correio com antenas") (*), fui repescar um dos poemas do Josema (**), poesia singela de um tuga, que era (é) um homem sensível e de coração grande, e que retrata aqui, melhor do que ninguém, em traços breves e leves de aguarela, o nosso quotidiano de guerra...
Foto e poema © José Manuel (2008). Direitos reservados.
Um ruído vem do céu
e há cabeças no ar,
hoje é dia de correio,
há novas para chegar,
faz-se a distribuição
com chamada frente ao bar.
Para o Santos nada veio
será que vai desmaiar?
P'ró Zé Manel veio a Bola
com as novas do Benfica,
p’ró Pinheiro uma encomenda
e alguém lhe manda uma dica,
fazendo-se para a merenda.
Sim, de correio foi o dia,
não pode haver melhor prenda,
é altura de alegria,
retiram-se os felizardos,
relêem a mesma carta
até afogar a saudade.
Mampatá 1972
josema
[Revisão/fixação do texto: L.G.]
__________
Notas de L.G.:
(*) Vd. poste de 11 de Março de 2009 >Guiné 63/74 - P4010: FAP (15): Correio com antenas... (António Martins de Matos, ex-Ten Pilav, BA12, Bissalanca, 1972/74)
(**) Vd. postes de
13 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3884: Poemário do José Manuel (26): O regresso a Mampatá, 35 anos depois...
28 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2694: Poemário do José Manuel (5): Não é o Douro, nem o Tejo, é o Corubal... Nem tudo é mau afinal.... Há o Carvalho, há o Rosa...(...)
27 de Fevereiro de 2008 >Guiné 63/74 - P2585: Blogpoesia (8): Viagem sem regresso (José Manuel, Fur Mil Op Esp, CART 6250, Mampatá, 1972/74)
Guiné 63/74 - P4010: FAP (15): Correio com antenas... (António Martins de Matos, ex-Ten Pilav, BA12, Bissalanca, 1972/74)
1. Mensagem de António Martins de Matos (ex-Ten Pilav, BA12, Bissalanca, 1972/74, hoje Ten Gen Pilav Res):
Amigo Luis: Depois de tudo o que se escreveu sobre o Guileje,...a Visão, ... o Nino Vieira, ... , os ânimos andam um pouco tensos, a necessitar de um tónico refrescante.
Junto te envio uma história ligeira e com uma certa piada (para mim claro, porque deve ter havido alguém chateado com a coisa).
A dar um título, penso que ficará bem “Correio com Antenas”
Um abraço
António Martins de Matos
2. FAP (15) > Correio com antenas (*)
por António Martins de Matos
No final de um destacamento de DO-27 em Nova Lamego (fins de 72 ou início de 73), e no momento de regressar a Bissau, o homem do SPM (Serviço Postal Militar) pergunta-me se posso largar um pequeno saco com correio num destacamento situado no trajecto para a Base de Bissalanca, não me lembro do nome, entre Bambadinca e Bafatá, sem pista, sem placa, ... sem nada... .(eventualmente poderá ser Missirá, mas penso que deveria ser um outro destacamento).
Mas que tivesse atenção porque o último piloto a largar o saco tinha sido um grande nabo, tinha calculado mal e este tinha-se perdido no mato, para desespero do pessoal.
Claro que sim, estamos aqui para apoiar a tropa, saco embarcado, viagem sem incidentes até ao respectivo destacamento, contacto estabelecido com o pessoal, boas notícias, vão receber mais um saco de correio, saco de fora da janela, passagem pelo lado direito do objectivo, subida do DO-27 quase à vertical para perder velocidade, inversão rápida, queda de asa à esquerda, picada à FIAT G-91, apontar ao centro do destacamento, saco largado, cai em pleno objectivo, recuperação da picada, ... a satisfação do dever cumprido!.
E não é que os malcriados nem sequer vêm ao rádio agradecer o esforço deste piloto que, na execução do circuito para a largada, quase tinha posto o cabo mecânico a deitar a carga ao mar ?!
Aterragem em Bissau, ... malandros, ... malcriados, ... mal agradecidos… Chega-se o cabo mecânico, ainda suado e amarelo pelo que tinha sofrido, e diz-me:
- Meu Tenente, trazemos uns fios presos à cauda do avião.
Desculpem lá o incómodo, ... oxalá o correio tenha valido a pena.
António Martins de Matos
2. Comentário de L.G.:
Quem disse que os nossos pilotos da BA12, Bissalanca, não eram capazes de fazer uma boa acção de escuteiro, e não tinham sentido de humor ? Nenhuma guerra se ganha com gente mal humorada e incapaz de fazer horas extraordinárias sem pedir mais patacão...
___________________
Nota de L.G.:
(*) Vd último poste desta série, FAP > 27 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3948: FAP (14): Um dia rotineiro na Base Aérea nº 12, em Bissalanca (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, 1972/74)
Amigo Luis: Depois de tudo o que se escreveu sobre o Guileje,...a Visão, ... o Nino Vieira, ... , os ânimos andam um pouco tensos, a necessitar de um tónico refrescante.
Junto te envio uma história ligeira e com uma certa piada (para mim claro, porque deve ter havido alguém chateado com a coisa).
A dar um título, penso que ficará bem “Correio com Antenas”
Um abraço
António Martins de Matos
2. FAP (15) > Correio com antenas (*)
por António Martins de Matos
No final de um destacamento de DO-27 em Nova Lamego (fins de 72 ou início de 73), e no momento de regressar a Bissau, o homem do SPM (Serviço Postal Militar) pergunta-me se posso largar um pequeno saco com correio num destacamento situado no trajecto para a Base de Bissalanca, não me lembro do nome, entre Bambadinca e Bafatá, sem pista, sem placa, ... sem nada... .(eventualmente poderá ser Missirá, mas penso que deveria ser um outro destacamento).
Mas que tivesse atenção porque o último piloto a largar o saco tinha sido um grande nabo, tinha calculado mal e este tinha-se perdido no mato, para desespero do pessoal.
Claro que sim, estamos aqui para apoiar a tropa, saco embarcado, viagem sem incidentes até ao respectivo destacamento, contacto estabelecido com o pessoal, boas notícias, vão receber mais um saco de correio, saco de fora da janela, passagem pelo lado direito do objectivo, subida do DO-27 quase à vertical para perder velocidade, inversão rápida, queda de asa à esquerda, picada à FIAT G-91, apontar ao centro do destacamento, saco largado, cai em pleno objectivo, recuperação da picada, ... a satisfação do dever cumprido!.
E não é que os malcriados nem sequer vêm ao rádio agradecer o esforço deste piloto que, na execução do circuito para a largada, quase tinha posto o cabo mecânico a deitar a carga ao mar ?!
Aterragem em Bissau, ... malandros, ... malcriados, ... mal agradecidos… Chega-se o cabo mecânico, ainda suado e amarelo pelo que tinha sofrido, e diz-me:
- Meu Tenente, trazemos uns fios presos à cauda do avião.
Desculpem lá o incómodo, ... oxalá o correio tenha valido a pena.
António Martins de Matos
2. Comentário de L.G.:
Quem disse que os nossos pilotos da BA12, Bissalanca, não eram capazes de fazer uma boa acção de escuteiro, e não tinham sentido de humor ? Nenhuma guerra se ganha com gente mal humorada e incapaz de fazer horas extraordinárias sem pedir mais patacão...
___________________
Nota de L.G.:
(*) Vd último poste desta série, FAP > 27 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3948: FAP (14): Um dia rotineiro na Base Aérea nº 12, em Bissalanca (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, 1972/74)
terça-feira, 10 de março de 2009
Guiné 63/74 - P4009: Blogoterapia (96): Não chorarei a morte do Nino (Zeca Macedo, ex - 2º Ten DFE 21, Cacine, 1973/74)
1. Mensagem do nosso camarada José Macedo (ou Zeca Macedo), um cabo verdiano da diáspora, que foi FZE [Fuzileiro Especial] no DFE 21 na Guiné em 1973/74, e que hoje é advodado nos EUA, para onde imigrou em 1977 (*).
Caro Luis:
Como sabes, servi no DFE 21-Fuzileiros Africanos- na Guiné e muitos dos "meus" fuzileiros foram assassinados por ordem do Nino Vieira.
Como deves calcular, não chorarei pelo Nino. Mando-te um link de um artigo publicado no diário on line caboverdeano, A Semana, com entrevistas a dois históricos da luta de libertação nacional [, Osvaldo Lopes da Silva e Júlio Carvalho ou Julinho]. (**)
Um abraço amigo,
José J. Macedo
(Ex) Segundo Tenente FZE
DFE 21
-
Jose J. Macedo, Esquire
Law Offices of Jose J. Macedo
392 Cambridge Street
Cambridge, MA 02141
Tel. (617) 354-1115
Fax (617) 354-9955
_____________
Nota de L.G.:
(*) Vd. postes de:
13 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2532: Tabanca Grande (56): José J. Macedo, ex-2º tenente fuzileiro especial, natural de Cabo Verde, imigrante nos EUA
2 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3014: Fuzileiro uma vez, fuzileiro para sempre (José Macedo, EUA)
(**) Vd. artigos de hoje:
Nino Vieira vai a enterrar hoje mas não deixa saudades entre antigos companheiros de armas cabo-verdianos
O falecido presidente da Guiné-Bissau, João Bernardo Vieira, que hoje vai a enterrar, não deixa muitas saudades entre os seus antigos companheiros de armas de Cabo Verde. “Era uma figura sinistra, embora um grande combatente”, diz dele o comandante Osvaldo (...).
Silvino da Luz, antigo ministro dos Negócios Estrangeiros de Cabo Verde e mais recentemente ex-embaixador da Cidade da Praia em Luanda, é uma das raras personalidades cabo-verdianas e estrangeiras a fazer-se representar no funeral de João Bernardo Vieira que hoje tem (...)
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