sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9526: As novas milícias de Spínola & Fabião (1): excerto do depoimento, de 2002, do Cor Inf Carlos Fabião (1930-2006), no âmbito dos Estudos Gerais da Arrábida (Arquivo de História Social, ICS/UL - Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa)




A nova força africana... O major Fabião, na altura (1971/73) comandante do Comando Geral de Milícias, e o gen Spínola, passando revista a uma formatura de novos milícias.


In: Afonso, A., e Matos Gomes, C. - Guerra colonial: Angol,a Guiné, Moçambique. Lisboa: Diário de Notícias, s/d. , pp. 332 e 335. Autores das fotos: desconhecidos. (Reproduzidas com a devida vénia).




1. Vários camaradas nossos , que estiveram na zona leste como alferes milicianos (estou-me a lembrar do Paulo Santiago, do Luís Dias, do J.L. Vacas de Carvalho...) participaram ativamente na formação das novas milícias criadas no tempo do Gen Spínola, integrando a "nova força africana". 

Carlos Fabião (1930-2006) terá sido o pai do novo corpo de milícias, na sua 3ª comissão de serviço no CTIG (abril de 1971-abril de 1973). No depoimento que prestou no âmbito dos Estudos Gerais da Arrábida (A descolonização portuguesa > Guiné > Depoimento do Coronel Fabião, 11 de abril de 2002), a criação das novas milícias é abordado com algum detalhe. 


Muitos de nós (, foi o meu caso do leste,) convivemos com estes homens que tiveram um papel ativo na guerra, não só defendendo as suas tabancas como participando, integradas no nosso exército, em colunas logísticas, nas picagens de itinerários, fazendo segurança e montando emboscadas, servindo de guias, bem como também acompanhando-nos em patrulhamentos ofensivos. 


Com a devida vénia ao valioso Arquivo de História Social do ICS - Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, publicamos alguns excertos do Cor Carlos Fabião, que a morte levou prematuramente aos 76 anos. Os parênteses retos são da responsabilidade dos editores do portal (ICS/UL); os parênteses curvos são nossos.


Mas também há o outro lado, perverso, da militarização da Guiné, tanto por nossa parte como por parte do PAIGC. G3 e Simonov estavam distribuídos a todos os elementos válidos da população da Guiné, no meu tempo (1969/71). Houve, por  certo, consequências a nível, não apenas militar, mas também económico, social, cultural e político, decorrentes da militarização da população guineense... O depoimento de Fabião também é interessante por isso.


Recorde-se entretanto alguns dados estatísticos sobre a população da Guiné em 1960 e 1970:


(i) População da Guiné: 519 mil (1960); 487,5 mil (1970).
(ii) Principais grupos etnicolinguísticos: balantas (30%), fulas (20); manjacos (14%) e mandingas (12,5%). Os brancos e os mestiços somavam apenas 3000 e 5500, respetivamente em 1960 e 1970.
(iii) População fora controlo das NT (segundo estimativa das autoridades militares, em 1971): 160 mil: (a) 60 mil no Senegal; (b) 20 mil na Guiné-Conacri; (c) 80 mil no interior do TO da Guiné nas regiões sob controlo do PAIGC… [No setor L1 - Bambadinca, a proporção seria de 1 para 3: 5 mil,  balantas, beafadas e mandingas, do lado do PAIGC; 15 mil, sobretudo fulás, mas também balantas e mandingas, do nosso lado].


 Fonte: Guerra Colonial (1961/74) [, em linha,]> Estatísticas > Teatro de Operações: Guiné. [Consult em 24/2/2012. Disponível em: http://www.guerracolonial.org/graphics_detail?category=10.



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(…) Manuel de Lucena: O senhor coronel, a certa altura, falou nas «minhas milícias». Pôs-me a pensar se há algo em relação às milícias.


Coronel Fabião: Fui eu que as organizei e que as criei, digamos assim. Havia milícias, mas o Spínola, a certa altura, quis … Como disse há bocado, a maioria dos nossos camaradas, dos meus camaradas, a concepção que tinham de guerra era fazer a vontade ao António [Salazar] e repor a situação na mesma. Conclusão: aquilo não dava, realmente não dava. E era costume, quando uma tropa era rendida, fazer um discurso que terminava dizendo: «missão cumprida». Quando chegou lá o Schulz, ao primeiro que diz «missão cumprida», ele pergunta: «O senhor cumpriu alguma missão?» E dá um balde ao homem … Mais ninguém disse que cumpriu a missão.


Luís Salgado de Matos: Foi o Schulz que disse isso?


Coronel Fabião: Não! O Spínola. Tem graça. No meio dessas coisas todas, eu era um dos meninos bonitos do Schultz e passei por o único que saiu incólume do Spínola.


Manuel de Lucena: Voltando às milícias, como é que as organizou? Quem eram exactamente?


Coronel Fabião: A concepção do Spínola era esta: as milícias tinham que ter uma ligação às populações a que pertenciam. Milícias, misturadas com tropa, para ele não dava. Portanto, a concepção de milícia era diferente de tropa. A milícia era o homem duplamente empregue como guerreiro e como economista.


Manuel de Lucena: Administrador?


Coronel Fabião: Não, era o homem que defendia a tabanca e a aldeia e aquilo tudo e, ao mesmo tempo, nas horas vagas, produzia. Era lavrador, camponês, portanto, era um homem com dupla função: combatente e colono, para o desenvolvimento da terra. Viviam lá nas suas aldeias e defendiam-nas quando o inimigo atacava.


Manuel de Lucena: O inimigo atacava muito as aldeias?


Coronel Fabião: Um bocado.


Manuel de Lucena: Mas como represália por não serem seus partidários?


Coronel Fabião: Eu aí teria de estar a falar um bocado sem ter assente. Eu penso que eles se ligavam a nós e estavam connosco por uma razão muito simples. Naquele tempo a força estava connosco, o poder económico estava connosco. Quer dizer, eu nunca tive dificuldades de recrutar gente, recrutava a que quisesse. Por uma razão muito simples, é que o pouco que lhes pagava (e era pouco relativamente, eram 700$00 por mês a cada um) era suficiente para eles viverem.

Um dos falhanços do Spínola (falhanço relativo), foi que as milícias passaram a viver como combatentes. Irem com a enxada para o campo, não foram realmente, não precisavam. As mulheres deles ganhavam muitíssimo bem, muito mais que eles, porque eram as lavadeiras dos soldados. Cada um de nós tinha a sua lavadeira, para alguns a lavadeira tinha vários empregos e esse dinheiro da lavadeira e o dinheiro deles como milícias dava para viver com um nível de vida que nunca tinham tido, imagino eu. Portanto, quando o PAIGC ia lá cheirar, ia prejudicar… E eles defendiam-se bem.


(…)Manuel de Lucena: Milícias, em 1971? Mas em 1968-1970 também já tinha tido algum trabalho com milícias, ou não?


Coronel Fabião: Não, andavam por lá, desgarradas.


Manuel de Lucena: O Spínola só em 1971 é que lançou a sério as milícias?


Coronel Fabião: Porque depois ele passou a fazer isto: eu arranjava-lhe aquela tropa, que era uma tropa fandanga, realmente era. E […] aqui está um outro grande triunfo do Spínola. O Spínola vai buscar milícias que fundou e vai com elas ocupar postos que estão ocupados pelo Exército português. Os pontos mais sensíveis estão ocupados pelo Exército português. Ele diz-me: «Vê se consegues arranjar milícias para […].» E assim aconteceu de facto. Eu consegui, realmente, arranjar tropas e as unidades de milícias passaram a ir ocupar os postos do Exército português. […] e assim ele conseguiu fazer uma arrancada no Sul e reocupar algumas áreas. Mas nessa altura já a gente sabia que estava tudo perdido, porque já o Marcello tinha dito que não.


Luís Salgado de Matos: Já havia tropas de milícias antes dessas?


Coronel Fabião: Com certeza que havia.


Luís Salgado Matos: Há alguma relação entre as suas milícias e as milícias anteriores?


Coronel Fabião: Foram incorporadas as anteriores nas novas […].


Luís Salgado de Matos: E as antigas milícias adaptaram-se bem ao novo [sistema]?


Coronel Fabião: Adaptaram. O velho era praticamente só de fulas. A Guiné foi pacificada em 1914, 1915, e as tropas utilizadas foram milícias fulas. Eu ainda falei com alguns combatentes fulas de 1914 e eles diziam: «É a velha filosofia da caminheira, não tem que saber». Eles, quando havia um levantamento ou uma guerra a fazer, vinham duas caminheiras [camionetas], uma só para mandingas e outra para [fulas?]. Há um termo qualquer que significa «banda», ou coisa do género. Metiam os fulas lá para dentro, eles vinham por ali acima e eram despejados já na área que estava revoltada e faziam eles a guerra.

Essa gente ainda existia algures. Nós o que quisemos foi fazer isso com balantas, mandingas e outros que não tinham nada a ver connosco […]. Aceitaram ser integrados, e foram muito bem.


(…) Luís Salgado de Matos: Voltando um bocadinho atrás, às novas companhias de milícias africanas. Eles viviam isolados? Numa dada aldeia, havia uma secção, havia um grupo, havia só um? Como é que era a organização. E como é que era a cadeia de comando militar, digamos, para eles?


Coronel Fabião: A cadeia de comando deles era um grupo, uma companhia e chega. Em cada aldeia havia, em princípio, um grupo de milícias. Quando a situação era muito má, pedia-se uma companhia de milícias. Quem comandava o grupo era o comandante militar da área, quem comandava a companhia era o comandante da companhia. Na parte final, a certa altura, começámos a ter uns rendimentos tão grandes, digamos, uma série de resultados tão bons, que o Spínola criou grupos especiais de milícias, poucos, três ou quatro, que fizeram um jeitão.


Luís Salgado de Matos: O que eram esses grupos especiais de milícias?


Coronel Fabião: Eram as milícias vulgares de Lineu, simplesmente não tinham outra função, nem de tomar conta da tabanca, nem de plantar a terra. Estavam ali para fazer golpes de mão, assaltos, coisas desse estilo.


Luís Salgado de Matos: Porque é que fixaram os salários dos milícias em 700$00? Era uma enormidade, para a época. Um professor de liceu, na altura, ganhava 900$00, quando começava cá em Portugal. 700$00 não era nada mau. Quem é que teve a ideia dos 700$00?


Coronel Fabião: Isso eu não sei dizer. Não faço a mínima ideia. Eu pensava que era pouco, está a ver.


Luís Salgado de Matos: Pode ser o meu lado financeiro; eu acho que os ordenados são sempre muito altos.
(…)


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Nota de L.G.: Os parênteses retos são da responsabilidade dos editores do Arquivo de História Social. Os parênteses curvos são nossos. As respostas de Carlos Fabião vêm a itálico. As perguntas dos entrevistadores, a negrito. Corrigimos o apelido Schulz (e não Schultz).

Guiné 63/74 - P9525: Em busca de... (184): Finalmente uma notícia do Armando do Hospital Militar de Bissau 73/74 (Luís Gonçalves Vaz)



1. O nosso Camarigo Luís Gonçalves Vaz, membro da nossa Tabanca Grande e filho do Cor Cav CEM Henrique Gonçalves Vaz (último Chefe do Estado-Maior do CTIG - 1973/74), colocou em 18 de Fevereiro último, no poste: "Guiné 63/74 - P1977: Em busca de... (4): Camaradas do Hospital Militar nº 241, Bissau (1972/74) (Carlos Américo Cardoso, o Cardoso RX)", o seguinte comentário/apelo.

Finalmente uma notícia do Armando do Hospital Militar de Bissau 1973/1974


Caro camarigo Carlos Cardoso:


É com muita satisfação que li este seu poste em que fala no Armando do Hospital de Bissau, na altura a cuidado de todos vocês que trabalhavam no Hospital Militar de Bissau. Como o conheci muito bem, pois durante um ano, entre 1973 e 1974, ia várias vezes durante a semana vê-lo e muitas vezes ia comigo e com os meus dois irmãos para nossa casa em Sª Luzia, brincava muito connosco, comia e dormia lá em casa. 


No início teria sido o meu próprio pai, o coronel Henrique Gonçalves Vaz, CEM/CTIG, que o convidou para ir passar uns dias lá a casa para poder brincar com miúdos como ele, eu tinha 13 anos e o meu irmão mais novo, o Paulo tinha apenas dez anos. Lembro-me dele como um miúdo muito alegre, inteligente e bem disposto. Ainda me lembro, quando no meu quarto, o Armando tirava a prótese (da perna) e continuava a saltar, brincar e falar, sem constrangimentos nenhuns, sim falava muito, demonstrando sempre vontade de saber, de apreender, pois lembro-me muito bem que o Armando (para nós ficou sempre apelidado de Armandinho) demonstrava uma grande curiosidade e uma grande alegria de viver, apesar de ter perdido os pais numa explosão de uma mina, facto responsável pela sua evacuação para o Hospital Militar, penso que em 1972. 

Sempre me disse que era MUITO BEM TRATADO PELOS MILITARES DO HOSPITAL MILITAR DE BISSAU. Gostava muito de saber onde se encontra e contactar com ele, como tal agradeço-lhe, eu caro Américo Cardoso, que me desses qualquer pista sobre o nosso "Armandinho", pois o meu regresso à Metrópole foi um "pouco abrupto", devido ao 25 de Abril, fiquei sempre com saudades dele, e disseram-me que o Armando teria vindo em 74 com um médico militar para Portugal , para frequentar uma instituição em Portugal! 

Tenho uma irmã (a Teresa) que há dias, quando lhe pedia fotografias do Armando na Guiné, pensava que eu o tinha encontrado... ficou eufórica por breves momentos, pois pensava que o tinha encontrado e eu... apenas lhe solicitava as fotos... Como tal, tanto ela como eu gostaríamos muito de saber notícias dele, para o contactar, pois ele, nunca foi esquecido por todos nós, até a minha mãe com 87 anos ainda fala nele, quando relembramos a nossa "estadia" na Guiné! Se tu Armando, por acaso leres esta mensagem, liga-me para o meu telemóvel 936262912 ou manda-me notícias para o meu email: luisbelvaz@gmail.com


Grande Abraço
Luís Beleza Gonçalves Vaz

2. Curioso por saber mais pormenores sobre o Armando, enviei uma mensagem ao Luís Vaz, solicitando-lhe mais alguma informação, nomeadamente pormenores sobre o acidente que matou os pais e mutilou o miúdo, se seria resultado da deflagração de uma mina, em que região e em que circunstâncias. 

A resposta não se fez esperar e quase de imediato recebi a seguinte resposta:

Caro Camarigo Magalhães Ribeiro:

Em tempos soube muito mais, com o passar dos anos ficou apenas parte...

a saber:


O Armando com cerca de 7/8 anos seguia com a sua família numa coluna das NT, penso que seria apeada, e alguém da sua família, o pai ou a mãe pisou uma mina anti-pessoal que matou imediatamente algumas pessoas, duas delas foram os seus pais.


O Armando devia ir como é tradição na região, nas costas da sua mãe, como tal, apesar de ter ficado muito mal da perna esquerda (acabou por ficar sem ela, não sei se foi no local ou no Hospital militar de Bissau!) e na cabeça, onde ficou muito ferido, foi evacuado da zona do "acidente fatal para seus pais" e não sei se para terceiros, e no Hospital salvaram-no e como era órfão e de uma zona do interior da Guiné (já não me lembro a zona de onde era natural), acabou por ficar na Instituição que lhe salvou a vida, sendo "uma espécie de mascote", no melhor sentido, pois era uma criança muito bem tratada segundo me pareceu na altura, e com base no que ele me dizia, quando nós o íamos buscar ao HMB, para passar uns dias connosco para brincarmos, apesar de ele ser um pouco mais novo do que eu, ele teria uns 9 anos no máximo e eu tinha 13 (mas o meu irmão mais novo, o Paulo tinha 10 anos).

Ao longo de um ano, convivemos bastante, pois algumas vezes ficava lá em casa. No final, já não me lembro a última vez que o vi, foi tudo um pouco abrupto, vim com um irmão mais velho em Julho de 1974 para Portugal, mas como o meu falecido Pai ficou até Outubro de 74, disse-nos que ele em princípio viria com um médico obstetra do Hospital, o Dr. Fidalgo de Matos (penso que era este médico, pois era amigo do meu pai), mas posteriormente vim a saber, que não teria vindo para Lisboa com ele, mas acho que alguém o teria trazido para a Metrópole, não tenho a certeza! Só ele poderá contar com rigor o seu percurso de vida pós 25 de Abril! Tanto eu como toda a minha família teríamos muito gosto e alegria em saber dele, do "Armandinho", foi assim que ele ficou na nossa memória! Se souberem dele, agradecia muito as notícias e o seu contacto.

Grande Abraço

Luís Gonçalves Vaz


Guiné > Bissau > Hospital Militar 241 > 1972 > O 1º Cabo Radiologista Cardoso, com um miúdo, o Armandinho, a quem foi amputado parte do membro inferior, e que era a mascote do Hospital. Hoje será médico, segundo informações que o Cardoso terá recebido. A ser verdade, é uma estória fabulosa, de luta contar o destino, de determinação, de coragem!
Foto minha, tirada na altura, não com o Armando, mas com o "Leôncio", um menino que era filho do Soldado Fernando, que servia lá em casa do CEM/CTIG, de etnia Manjaco. Com o Armando só uma irmã minha é que tirou várias, mas ainda não me as enviou.


Bissau > 1974 > Luís Beleza Gonçalves
Bissau > 1974 > Luís Beleza Gonçalves
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Nota de MR:

Vd. também sobre o assunto tratado o poste: 


Vd. último poste desta série em: 

18 DE FEVEREIRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P9503: Em busca de... (183): Manuel da Conceição Clemente, a viver em França, procura um seu camarada ex-1.º Cabo Radiomontador, de Cantanhede ou Anadia, ambos ex-combatentes do Esq Rec 693 (Bafatá, 1964/66)


Guiné 63/74 - P9524: Parabéns a você (385): Manuel Henrique Quintas de Pinho, Marinheiro Radiotelegrafista, LDM 301 e LDM 307 (Guiné, 1971/73)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 18 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9504: Parabéns a você (384): António Carvalho, ex-Fur Mil Enf.º da CART 6250 (Guiné, 1972/74)

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9523: Memória dos lugares (177): Aldeia Formosa e os camaradas que nunca mais vi (Álvaro Vasconcelos)

Vista aérea de Aldeia Formosa


1. Mensagem do nosso camarada Álvaro Vasconcelos*, 1.º Cabo Transmissões do STM, Aldeia Formosa e Bissau, 1970/72, com data de 20 de Fevereiro de 2012:

Boa noite camarigo Carlos Vinhal
É com muito gosto que dirijo esta mensagem.

Obrigado pela publicação do texto que remeti quando do aniversário do Luís Graça. Alongo as alusões a ele remetidas, como reconhecimento do trabalho que se propaga no Blogue, por graça de Deus e por providencial iniciativa de todos vós, editores (desde há seis anos, se não mais) das estórias duma juventude sofredora - nascida numa era de pós-guerra, vivendo um tormento de mais de 14 anos de luta intensamente retrógrada, e castradora, do mais elementar período da vida de quem é jovem - nos anos em que se sonha(va) com a constituição de família autónoma dos progenitores, e nos obrigaram a viver afastados do mundo.
Desgraçadamente hoje os jovens sofrem outro tormento: o desemprego!... Por isso, ajudemo-nos uns e outros!...

Anexo as fotografias que presumo servirão para "retocar" (ou complementar) o post.

Aproveito para dar alguns pormenores que não indiquei:

Eu fui 1.º Cabo Radiotelegrafista, 08025769;
Presentemente sou aposentado - trabalhei no ramo segurador até aos 58 anos.
Após a aposentação mudei-me para o interior e resido em Baião.
Como casei em Matosinhos, onde residi e nasceram os filhos, frequentemente passo alguns dias de cada mês em Leça da Palmeira, onde posso desfrutar do mar e do movimento das embarcações no Porto de Leixões. Enfim: é a PAIXÃO pelo "Horizonte" e pelo "Mar" desta região tão marcante na minha vida.

A primeira, foi conseguida à porta do Posto de Transmissões do aquartelamento: Lembro o Agostinho Barbosa (de pé à esquerda); o Furriel CMDT do Posto; o Tony: em baixo, o Costa e eu.

Na seguinte, aparecem, da esquerda para a direita; o Agostinho, o Fonseca (condutor do Pel Fox) e o Tony.

A outra, nos "matraquilhos", jogava o Carlos Alberto (em primeiro plano), também com o resto do pessoal da guarnição do Posto de Transmissões.

Esta malta não mais se encontrou.

Tenho mais umas quantas fotografias. Vou tentar remetê-las em outras mensagens, oportunamente.

Por agora, um abraço reconhecido.
Muita saúde, para ti e para a família.
Bem hajas!
Álvaro Vasconcelos
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 2 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9434: Tabanca Grande (320): Álvaro Simões Madureira Vasconcelos, Transmissões STM (Aldeia Formosa e Bissau, 1970/72)

Vd. último poste da série de 19 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9505: Memória dos lugares (176): Buruntuma, lá no "cu de Judas"...

Guiné 63/74 - P9522: Memória dos lugares (177): Um topónimo com uma grafia (Tabassi) e uma fonia (Tabassai) (José Manuel Matos Dinis)

Localização de Tabassi na Carta de Pirada


1. Esclarecimento do nosso querido amigo e camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), sobre uma dúvida nossa (do Cherno Baldé e dos editores) a respeito do topónimo Tabassi (ou Tabassai) - uma tabanca que fica(va) a sudoeste de Bajocunda, na estrada Pirada-Bajocunda  (*)

Meus Caros Luís e Cherno,


A verdade é que se trata de uma mesma aldeia, situada a meio caminho da estrada que liga Pirada a Bajocunda. Verbalmente sempre ouvi designá-la pela fonia Tabassai, mas nas cartas geográficas normalmente consta Tabassi. A pronúncia Tabassai era usual entre os naturais, e generalizadamente utilizada. Nos meus escritos uso-a indistintamente. (**)

Um abraço para dividirem.
JD

2. Comentário do editor:

E se for erro (tipográfico) da carta ? É possível... O José Manuel Dinis usa Tabassi ou Tabassai. Dois camaradas nossos, e escritores, Manuel Barão da Cunha (em Tempo Africano) e Armor Pires Mota (em Estranha Noiva de Guerra),  que conheceram a região, usam o topónimo Tabassai, de acordo com notas bibliográficas de Beja Santos:


Vd. poste P6847

(.,..) Depois emergimos em Tabassai, na região de Pirada, estamos ainda em 1970. Tabassai fica sensivelmente a meia distância entre Pirada e Bajocunda, pertence ao regulado da Pachana. Voltando atrás, em 1965, é provável que Barão da Cunha rememore acontecimentos que viveu, descreve usos e costumes, temos novos reencontros, há mesmo uma ida ao Morés, temos de novo os comportamentos de heróis anónimos na permanente elegia de Barão da Cunha (...).

Vd. poste P6727

(...) A paixão entre Mariama e Elias desperta. Passa-se pela região de Lala Samba, os jagudis voltam a atacar o finado, arrancam-lhe os olhos, metade de uma orelha, o nariz. Aos tombos, chegam a Cumbijã Sare, lavam o que resta do Perdiz. A trama ganha novos contornos com a chegada de dois guerrilheiros, depois chegam à tabanca de Sambuiá onde um velho, de nome Mamadú Keta, antigo alferes de segunda linha, irá oferecer um cachimbo ao Bravo Elias. Ali se falará do futebolista Eusébio e numa xícara da Vista Alegre. Depois de terem ladeado Tabassai, dá-se o reencontro com a tropa. Mas a via-sacra ainda não terminou, aliás nunca se saberá qual o seu ponto culminante. Segue-se um ataque a Mansabá, uma descrição como nunca encontrei na literatura da guerra colonial: o vigor da encenação, os sons, as imagens de sofrimento, as águas-fortes das correrias e dos rodopios. No durante o ataque os dois jovens guerrilheiros do Morés matam Mariama. O apocalipse prossegue, Bravo Elias consegue olhar com os olhos enxutos todo este mundo devastado em que até o pássaro John pia assustado, era um fio de voz que doía. E assim termina este romance incomparável: “Então, resolvi erguer-me de onde estava, aéreo e pardacento, e, cambaleando muito, fui à procura de John por cima de um mundo de destroços”. (...)

Eis o texto de apresentação, à Tabanca Grande, do próprio José Matos Dinis, enviado por mail de 21/8/2008:

(...) Caro Luís Graça e amigos:

Chamo-me José Dinis, integrei a CCaç 2679 no CTIG, durante os anos de 1970/71, como Fur Mil,companhia que, inicialmente, desempenhou funções de intervenção no Sector Leste, baseada em Piche, onde estava o BART 2857, tendo passado ao regime de quadrícula em Bajocunda, em Agosto/70, substituindo a CART 2438, sendo dependente do COT 1.

Integrei o 2ª. pelotão, que comandei durante cerca de 18 meses, após atransferência compulsiva do meu grande amigo, o Alf Mil Eduardo Guerra. O grupo ficou conhecido por Foxtrot, e ganhou nomeada pela sua grande disponibilidade, entrega e arrojo. Ao nível da companhia, regista o maior número de louvores e o menor número de 'porradas'.

Em Piche fui dinamizador da estação de rádio ali criada, embora com a antena horizontal próxima do telhado de zinco para 'abafar' as emissões,  em virtude da falta de autorização para o efeito. Em Bajocunda criei a jornal Jagudi, que expandia textos de diversos camaradas, bem como, por vezes, transcrevia artigos de orgãos da comunicação social. O jagudi ganhou alguma notoriedade porque era lido pelo João Paulo Dinis no Pifas.

A Zona de Acção do Sector L4 - Piche -, onde fizemos intervenção, apresenta uma superfície plana de cerca de dois mil quilómetros quadrados, com a altitude média de sessenta metros, e uma cobertura vegetal dispersa, por vezes de savana, adensando-se nas proximidades dos rios.Tinha como limites a fronteira com o Senegal, entre os marcos 50 e 58, a norte, o R Corubal, até à Confluência do R Seli, o R Beli, até à confluência  com o R Juba, o R Juba, o R Camidina, o R Cambajã, Cambajã (excl.), Canjamo (excl.),Sinchã Bebe (excl.),o R Délebel, o R Bidigr,o R Nhangurem, o R Chimanar, o R Rapael, o Nácia, o Bial, o R Corri, o R Nungajá, e o marco 63, regiões fronteiras à Guiné-Conakri.

A Zona de Acção de Bajocunda apresenta características idênticas às do Sector L4  e estendia-se de Tabassi a Copã. Nestas regiões não havia instalações IN,  quer de carácter permanente, como provisório. A actividade do IN consubstanciou-se em acções contra a população (para roubar e intimidar), à implantação de engenhos explosivos em estradas e outras vias de acesso a povoações e a flagelações contra aquartelamentos das NT e aldeias em autodefesa. A única emboscada concretizada não vitimizou o pessoal da companhia.

A densidade populacional era elevada, tendo em conta a fertilidade do terreno e o clima relativamente favorável a fixação. Havia representantes de diversas raças: Fulas, em maioria absoluta, Futa-Fulas, Fulas-Forros, Fulas-Pretos, Mandingas, Panjandincas e Bambarancas.

O Fula não aceita outra relegião para além do islamismo. Também era notória a sua preferência pela língua árabe, mesmo deturpada. O português, como língua falada, não era da sua preferência. Os fulas, ardentes propagandistas do islão, propagavam a escolaridade em árabe. A população manifestava-se algo colaborante, mas assumia uma posição neutra em relação ao IN, de maneira a, agradando a uns, não desagradar aos outros.

A nossa missão era a de garantir a segurança nas regiões, através de patrulhamentos de prevenção às infiltrações do IN, assegurar a liberdade de movimentos nos itinerários, montagem de emboscadas, diurnas e noturnas, em supostos lugares de passagem ou penetração do IN, apoios e contactos com as populações, relativamente a acções de indole psicológica ou sanitária.

A actividade do IN surpreendeu-me por alguma passividade e, para isso, tenho a minha interpretação; Em 1969, após o nosso abandono da região do Boé, e como estruturação do IN para o objectivo da independência, alguns dos seus quadros terão rumado aos países que lhes davam formação, pelo que essa mobilização - que não posso garantir, mas parece ter acontecido - reflectiu-se na abrandamento da guerra, que se acentuou a partir dos finais de 1972.

Para esta caracterização apoiei-me na história da companhia. Afinal, uma boa parte das companhias dispersas pelo território do CTIG tiveram funções semelhantes, mas nomeá-las tem a intenção de recordar ou reportar algumas das tarefas do quotidiano, alguma caracterização antropológica, alguma sensibilidade sobre o relacionamento das partes envolvidas. Lanço o repto a outros mais capazes, de divulgarem os conhecimentos que tenham relativamente a estas matérias, com o óbvio fim de ajudar à melhor compreensão de factores endógenos, que influenciaram on desenrolar dos acontecimentos.

Pronto, fiz a minha apresentação, e peço que me considerem como membro da Tabanca Grande. Quero despedir-me com um abraço aos amigos.

Cascais, 2008.08.21
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 14 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9353: História da CCAÇ 2679 (46): SEXA COMCHEFE visitou Tabassi (José Manuel Matos Dinis) 

Guiné 63/74 - P9521: Nós da memória (Torcato Mendonça) (11): Vida nas Tabancas - Culturas - Fotos falantes IV





1. Texto e Fotos Falantes (IV Série) do nosso camarada Torcato Mendonça (ex-Alf Mil da CART 2339 Mansambo, 1968/69) para integrar os seus "Nós da memória".





NÓS DA MEMÓRIA - 11
(…desatemos, aos poucos, alguns…)

7 – VIDA NAS TABANCAS

- Culturas

Antes uma foto de uma bajuda especial. Uma amizade especial.

Aquelas terras de cultivo eram férteis.
Não era fácil cultivá-las nalguns locais. Estava sempre presente o medo de um ataque do IN, das suas minas, raptos e violações.

Era falso, o respeito deles pelas populações que não estavam subjugadas ao seu poder. Musa Iéro, próximo de Candamã, foi disso exemplo e, sem população armada – excepto um Milícia da Moricanhe em visita à sua família – foi a Tabanca praticamente arrasada. Muitos feridos, alguns mortos, muitos em fuga. O Milícia foi cortado ao meio com uma granada de RPG e as poucas roupas levadas, em profanação de cadáver.

Eu estava lá, melhor eu cheguei lá poucas horas depois.

Não atacaram uma Tabanca com doentes com lepra. Foram evacuados, tempo depois para Bafatá, creio eu.

Vejam as fotos. São de locais de paz.

Vida nas tabancas > Bajuda

Vida nas tabancas > Bajuda e o banho

Vida nas tabancas > Trabalho na bolanha

Vida nas tabancas > Paraísos

Texto e fotos ©: Torcato Mendonça (Fotos Falantes IV) 2012. Direitos reservados
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 20 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9509: Nós da memória (Torcato Mendonça) (10): Vida nas Tabancas - Famílias - Fotos falantes IV

Guiné 63/74 - P9520: Facebook...ando (16): Em busca de camaradas da minha companhia, CCAÇ 3544/BCAÇ 3883, "OS Roncos de Buruntuma", Buruntuma, mar 72 / jan 74 (Francisco Alves, Torres Vedras)


1.  Mensagem do nosso leitor (e camarada) Francisco Alves (a quem convidamos, desde já,  para integrar a nossa Tabanca Grande):

De: caldas [a.caldas@net2000.ch]
Data: 25 de Janeiro de 2012 17:04
Assunto: Contatar ex-camaradas


Francisco Alves,  do Batalhão [de Caçadores] 3883, Companhia [de Caçadores] 3544, "Os Roncos de Buruntuma", natural de Torres Vedras, deseja entrar em contato com camaradas da sua companhia. N° telef: 261 331 509.

Francisco tem um filme da sua passagem pela Guiné, no Facebook (Ponte do Rol TV,  guerra colonial ).  Desde já obrigado pelo vosso blog.



Descrição da página: " Ponte do Rol é a aldeia mais bonita do Mundo.  Ponte do Rol é uma aldeia muito bonita, fica situada no distrito de Lisboa, a 5 km de Torres Vedras, a 10 km de Santa Cruz. É banhada pelo sol todo o santo dia, tem cerca de 2100 filhos. Nossa Senhora da Conceição é sua madrinha. Nosso Senhor Jesus seu padrinho".


Não nos foi possível localizar o supracitado vídeo. É possível que já não esteja disponível nesta página do Facebook. Recorde-se o historial deste batalhão e das suas companhias:


(i) O BCAÇ 3883 foi mobilizado pelo RI 2, tendo partido para a Guiné, de avião, em Março de 1972 (o comando e a CCS em 19/3/1972; a CCAÇ 3544, a 20; a CCAÇ 3545, a 22; e a CCAÇ 3546 a 23);


(ii) A CSS ficou sediada em Piche;


(iii) O comandante era o Ten Cor Inf Manuel António Dantas;


(iv) O comandante da CCAÇ 3546 (Piche, Cambor, Ponte Caium e Camajabá) era o Cap QEO José Carlos Duarte Ferreira;


(v) As outras companhias do BCAÇ 3883 eram a CCAÇ 3544 (Buruntuma e Piche; teve dois comandantes: Cap Mil Inf Luís Manuel Teixeira Neves de Carvalho; Cap Mil Inf José Carlos Guerra Nunes) e a CCAÇ 3545 (Canquelifá e Piche; comandante, Cap Mil Inf Fernando Peixinho de Cristo);


(vi) O batalhão regressou a casa, de avião, em Junho de 1974.


A CCAÇ 3544 - "Os Roncos de Buruntuma" - foi rendida pela 2ª C/BCAV 8323/73:


(i) A 2ª C/BCav 8323/73 seguiu em 15Nov73 para Piche, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CCaç 3463, tendo assumido a responsabilidade do respetivo subsetor de Piche em 25Nov73, ficando na dependência do BCaç 3883;


(ii) Em 24Jan74, mantendo-se no Setor L4, assumiu a responsabilidade do subsector de Buruntuma, por troca com a CCaç 3544, onde se manteve até à sua evacuação em 05Jul74, deslocando-se para Piche.
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Nota do editor:
Último poste da série > 15 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9355: Facebook... ando (15): Um "regalo" para a Maria Ivone Reis, que anteontem fez anos (Hugo Moura Ferreira)

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9519: O Nosso Livro de Visitas (127): Carlos Alberto Morais dos Santos, ex-1.º Cabo Mec Auto da CCAV 1749 (Mansabá, 1967/69)

1. Mensagem do nosso camarada e leitor Carlos Alberto Morais dos Santos, ex-1.º Cabo Mec Auto da CCAV 1749, Mansabá, 1967/69, com data de 17 de Fevereiro de 2012:

Chamo-me Carlos Alberto Morais dos Santos, fiz parte da Companhia de Cavalaria 1749 como Mecânico Auto e estava em Mansabá aquando do ataque na quinta-feira Santa de 1969, que o SR descreve no seu blogue, e que eu costumo ler, recordando tempos passados. Mas uma situação me intriga. O SR apenas faz referencia à sua Companhia e ao Batalhão 2851 então comandado pelo Tenente Coronel César da Luz Mendes, e não fala da actuação da Companhia de Cavalaria 1749, que também sofreu um morto e vários feridos. Porquê? Será por esquecimento? Gostaria de saber.

Carlos Alberto Morais dos Santos


2. Deduzido que o nosso camarada se referia ao Poste 3146* do nosso tertuliano Raul Albino (ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, , Mansabá e Olossato, 1968/70), foi a este pedido o devido esclarecimento.

Recebemos do Raul esta mensagem que foi reencaminhada ao Carlos Santos:

Em relação à observação do nosso ex-combatente Carlos Santos, da CCav 1749, ele tem toda a razão, eu não me refiro à sua Companhia. A razão é muito simples. Se qualquer pessoa ler bem esse post, eu tinha chegado a Mansabá dois dias atrás, vindo de Có acompanhado por mais um grupo de combate, que tinham ficado em Có para reforçar e acompanhar a passagem de testemunho para a Companhia que nos substituiu enquanto a CCaç 2402 (a dois grupos de combate) ia reforçar o contingente de Mansabá.

Eu relato claramente a minha frustração durante esse ataque, por não conhecer o aquartelamento nem o seu plano de defesa e muito menos a composição desse destacamento, ou seja desconhecia a existência da CCav 1749 ou outra qualquer Unidade lá destacada. Conhecia a minha Companhia e o meu Batalhão, como ele muito bem refere. Mais ainda, foi nessa altura que tive o primeiro contacto com o resto do Batalhão, porque tínhamos iniciado a comissão em Có como Companhia independente, reportada ao comando de Bula.

No livro da História do Batalhão, vi que está lá reportado toda a operação a um nível global, com a intervenção de todas as Unidades que responderam a esse ataque inimigo, incluindo as referências às baixas nossas e deles. Como eu só relatei aquilo que vi e que se passou comigo, não era a pessoa mais habilitada para descrever o que se passou com as outras Unidades. Isso é o que essas Unidades terão de fazer para enriquecer a história desse ataque violento, de preferência contado na primeira pessoa. Eu procurei que nos relatos que fiz sobre a CCaç 2402, já compilados em livro, que todos os participantes dessem a sua perspectiva sobre um mesmo acontecimento (ataque, emboscada, etc.), como se se tratasse de um filme com varias câmaras a captar. Nem sempre consegui a participação de vários intervenientes, possivelmente por insegurança quanto à qualidade dos seus textos. Já viram o que seria, por exemplo, a descrição desse ataque a Mansabá, visto de vários ângulos? Dava um filme...

Espero ter esclarecido o nosso bloguista Carlos Santos e sugiro que ele conte aquilo que viu e assistiu na sua campanha na Guiné. Para ele um abraço de amizade, na esperança de nos virmos a encontrar no próximo convívio do blogue.

Um bem haja,
Raul Albino


Novembro de 1971 > Testemunho da passagem da CCAV 1749 por Mansabá.
Foto de Carlos Vinhal


3. Esta foi a reacção do nosso camarada Carlos Santos:

Boa tarde
Pois meu amigo fico muito grato pela sua resposta, e compreendo perfeitamente a razão por que não faz referência à minha Companhia. Para começar a nossa conversa informo-o de que não sou homem de estudos, tenho apenas o nono ano e como tal o meu português é limitado, mas ao contrário da competência escolar, sou grande em experiência de situações vividas. Eu era à data desse ataque apenas 1.º Cabo Mecânico Auto, profissão que desenvolvi por toda a minha vida até à presente data.


Nesse dia estava de Mecânico de Dia ao Batalhão e como tal saí de Mansabá de madrugada a caminho de Bissau acompanhando a coluna. No regresso a Mansabá como saberá parávamos em Mansoa, terra onde também estive nove meses, e aí fomos informados pelo SR Comandante do Agrupamento de que o inimigo tinha sido visto em dois sítios, portanto para irmos com muita atenção porque embora não tivéssemos duas emboscadas, uma íamos ter de certeza.

Eu conduzia nessa tarde um carro civil sem a respectiva autorização, coisas da idade e o dono desse carro, que tinha um estabelecimento em Mansabá, o Sr Amadeu Pereira que tinha a cabeça a prémio ficou em Bissau possivelmente já informado do que iria acontecer e pediu-me para eu levar o carro e entregá-lo à Dona Benvinda, sra. cabo-verdiana que com ele vivia. Comecei então a ter algum receio visto que o carro civil era conhecido, mas chegamos a Mansabá sem que alguém nos perturbasse.

Pelas 11h15 ouviram-se os primeiros rebentamentos que só terminaram à meia-noite e que provocaram tudo quanto o sr descreve e muito mais. Morreu nesse ataque um soldado condutor da CCS do BCAÇ 2851 que tinha saído do hospital nessa tarde, morreu um apontador de morteiro e morreu o soldado José Maria Madeira Lorem da Companhia de Cavaria 1749 à qual eu pertencia, para além de vários civis, incluindo crianças queimadas e os que morreram posteriormente.

Tenho o histórico da minha Companhia e vou procurar mais informação sobre este ataque e vou enviar-lha, assim como as minhas fotos que pede.

Quanto a possível encontro de ex-militares estarei sempre à disposição para recordar, o que apesar de tudo ainda recordo com alguma saudade.

Saudações amigas
Carlos Alberto Soares dos Santos

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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 24 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3146: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (12): Ataque a Mansabá

Em 3 de Abril de 1969, um grupo inimigo estimado em cerca de 100 elementos, atacaram Mansabá de diversas direcções com Canhão sem recuo, Morteiro 82, Lança Granadas Foguete, Metralhadoras Pesadas, Metralhadoras Ligeiras e outras armas automáticas.

O ataque começou cerca das 23,15 horas e durou 45 minutos. As nossas tropas (ao nível do Batalhão) sofreram 1 morto, 10 feridos graves e 23 feridos ligeiros. Segundo o relatório da nossa Companhia, pertencer-nos-ia 3 feridos graves evacuados para o Hospital Militar 241, tendo posteriormente um dos feridos sido evacuado definitivamente para o HMP de Lisboa, além de 16 feridos ligeiros. A população sofreu 7 mortos, 12 feridos graves e 19 feridos ligeiros.[...]


Foto 1 > Mansabá > Alguns dos feridos esperando evacuação para Bissau

Foto © Raul Albino (2008). Direitos reservados.


Vd. último poste da série de 2 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9431: O Nosso Livro de Visitas 126): Fernando Paiva, Pel Caç Nat 57, Mansoa e Bindoro, abril de 1967/abril de 1969

Guiné 63/74 - P9518: Os nossos últimos seis meses (de 25abr74 a 15out74) (2): Frutuoso João Ferreira, natural da Lourinhã, 1º cabo at cav, 3ª C/BCAV 8323/73 (Pirada, nov73/ago74)

1. Faltam-nos, no nosso blogue, depoimentos dos "últimos guerreiros do império". Por uma razão ou outra (pudor, medo de censura social, falta de tempo, de disponibilidade,  de motivação, etc.), muitos dos  nossos camaradas que chegaram à Guiné nos  último meses que antecederam o fim da guerra e o regresso a casa, ainda não passaram para o papel ou para o ecrã do computador as suas memórias desse tempo, e os sentimentos contraditórios que muitos terão experimentado aquando da retração do nosso dispositivo militar e do "regresso definitivo das naus"...

Percorrendo a Net fui encontrar o depoimento de uma camara da minha terra, que esteve no TO da Guiné durante um ano (Set 73/Set 74) e que pertenceu ao BCAV 8323/73. Esse depoimento está publicado no sítio do Jornal das Caldas (edição em linha) (Jornal regionalista,  tem como diretor Jaime Costa e chefe de redação Francisco Gomes). Tem também uma página no Facebook

Por se revelar de grande interesse para os nossos camaradas que estiveram no leste da Guiné, no final da guerra (*), tomamos a liberdadade de reproduzir aqui, com a devida vénia, um excerto extenso do artigo. Os nossos parabéns ao autor do artigo e ao seu jornal. Um Alfa Bravo para o nosso camarada Frutuoso (e, no meu caso, conterrâneo). (LG)



Memórias da Guerra na Guiné > Frutuoso Ferreira > Jornal das Caldas, 28 de Janeiro de 2009 

Frutuoso João Ferreira foi 1º cabo atirador do Batalhão de Cavalaria 8323, na Guiné, em 1973/74.  Nasceu em Abelheira, Lourinhã, há 56 anos. Antes de cumprir serviço militar foi pedreiro da construção civil. Depois, quando regressou da Guiné à sua terra natal, continuou nessa profissão por mais quatro anos. Em 1978 tornou-se guarda-fiscal. Desde 2005 que está em situação de reserva da Brigada Fiscal da GNR. (...)


Assentou praça em Elvas, no Batalhão de Caçadores 8, em 14 de Maio de 1973, e foi tirar a especialidade em Estremoz, no Regimento de Cavalaria 3. Tinha 20 anos. 

“Quem vivia nos meios rurais, como era o meu caso, de política pouco ou nada conhecia, mas como qualquer bom português que se prezasse, o ânimo que tínhamos era que estávamos a servir a Pátria”, relata.

No dia 22 de Setembro de 1973 embarcou no Niassa (...). Ia o [BCAV]  8323 e mais dois outros batalhões e uma companhia. Levaram uma semana a chegar à Guiné. Alcançaram Bissau e entraram em lanchas [, LDG,] que os transportaram até à ilha de Bolama, onde estiveram um mês a tirar o IAO  (...)

O batalhão adoptou o nome “Os cavaleiros do Gabú” (Gabú era a região onde esteve). O comandante do Batalhão era o [tenente] coronel Jorge Mathias, da Ericeira.

 “Eu estava no 4º pelotão da 3ª companhia, comandada pelo capitão Ernesto Brito, de Lisboa. O alferes Alípio Cunha, de Vila Nova de Famalicão, comandava o meu pelotão e havia três furriéis – o Sousa, o Simão e o Esteves. Os outros comandantes de pelotão eram os alferes Manuel Gonçalves, Rodrigo Coelho e António Pereira, respetivamente do Fundão, Pinhel e Amarante”, descreve.

O comandante da [CCS] era o tenente Francisco Costa, de Coimbra. O capitão Ângelo Cruz, da Amadora, chefiava a 1ª Companhia, enquanto que o capitão Aníbal Tapadinhas, de Lisboa, comandava a 2ª. Integrava ainda o Batalhão a [CCAÇ 11], que tinha à frente o capitão Nuno Sousa, de Lisboa.

“Quando acabou a formação, regressámos no dia 31 de Outubro a Bissau e deslocámo-nos para Pirada, uma pequena povoação que ficava a poucos metros da fronteira do Senegal, onde o inimigo – os guerrilheiros do PAIGC – tinha algumas das suas bases”, indica.

Em Pirada estava a CCS e a 3ª companhia:

 “A nossa missão era proteger  [a sede do batalhão,] e as populações locais – os brancos que lá havia era só um casal de comerciantes e a filha – e patrulhar constantemente aquela zona para que o inimigo não tivesse nenhuma progressão no terreno. Havia um campo de minas e todos os dias íamos lá para ver se tinha acontecido alguma coisa. O certo é que os guerrilheiros do PAIGC nunca foram ao pé do arame farpado para nos atacarem”, lembra. “Mas desde a fronteira eles disparavam mísseis [ foguetões 122 mm] e nós respondíamos com os velhos obuses 14, que tinham menos alcance”, sublinha.

“A 1ª companhia foi para Paunca e a 2ª para Bajocunda e nós tínhamos de ir abastecê-las. Foi numa dessas alturas que passei o primeiro susto e momento aflitivo. Quando íamos para Bajocunda, a 13 de Dezembro [de 1973], foram detetadas várias minas anticarro. Toda a gente se protegeu, ficando só o sapador da CCS – o soldado Fernando Almeida – que as levantou. Repetiu a operação quatro vezes, só que a seguinte foi-lhe fatal”, narra.

“Gritava ele para o alferes Alípio Cunha, dizendo-lhe, satisfeito, que ao levantar a quinta mina já tinha dinheiro para ir à metrópole de férias (a passagem de avião custava cerca de quatro mil escudos – 20 euros) – os sapadores recebiam do Estado mil escudos (cinco euros) por cada mina anticarro que levantassem – mas a mina estava armadilhada com outra antipessoal e rebentou”, prossegue.

“O corpo ficou todo desfeito aos bocados, espalhados pelo mato. Um pé foi cair à minha frente. Juntou-se o que se pôde e ficámos muito impressionados e desmoralizados. Não estávamos assim há tanto tempo na Guiné e já havia uma baixa. A partir daí sentimos que estávamos na guerra a sério”, comenta Frutuoso Ferreira.



No dia 18 de Dezembro houve um ataque inimigo a Amedalai e a 7 de Janeiro [de 1974]  houve em Bajocunda uma emboscada com armas ligeiras a uma coluna que ia abastecer um pelotão que estava em Copá. Morreram dois soldados – Sebastião Dias e José Correia, da 2ª Companhia, que ficaram em cima das duas Berliet destruídas. O pelotão a que pertencia foi escalado para ir lá buscar os corpos e tentar trazer o que restava das viaturas, operação difícil mas conseguida.

Durante o mês de Fevereiro registaram-se várias investidas em Copá e Bajocunda. A 1ª companhia também sofreu ataques e morreram o 1º cabo António Ribeiro e os soldados Rui Patrício, Silvano Alves e José Oliveira.

“Passados uns dias fomos fazer protecção a Sissaucunda, povoação a quinze quilómetros de distância de Pirada, com meia dúzia de palhotas. Cada pelotão permanecia naquele fim do mundo durante um mês. A nossa alimentação era ao almoço arroz com marmelada e ao jantar esparguete com atum. No dia seguinte era quase a mesma e só variava com arroz com salsicha”, conta.

O PAIGC quis juntar-se à "festa” e no dia 13 de Abril [de 1974]  brindou-os com um ataque de mísseis lançados desde o Senegal. O destino era Pirada

“Vi os mísseis passarem por cima de Sissaucunda e começámos todos a correr para as valas escavadas no chão para nos protegermos. Sentia os mísseis a ‘assobiarem’ por cima de nós e poucos segundos depois a caírem em Pirada. O objectivo deles era atingir o quartel, mas caíram na povoação e mataram muitos civis”, descreve.

No dia 25 de Abril o PAIGC voltou a atacar Pirada e mataram civis africanos, mas “da nossa parte não houve feridos nem baixas”. 

A partir de 25 de Abril de 1974, em virtude das modificações políticas ocorridas em Portugal, “não tivemos mais problemas na Guiné, porque iniciaram-se os contactos e conversações com os chefes da zona, entre as nossas tropas, o PAIGC e a população. Ainda bem que assim foi, porque a guerra estava tão acesa naquele setor, que se tem continuado mais tempo não sei se estaria cá para contar a história”.

“A primeira vez que encontrámos o inimigo já como amigo, na fronteira do Senegal, houve um sentimento estranho. Mas baixaram as armas e começámos a trocar tabaco e bonés”, conta. E adianta: “Passámos o resto do tempo a recolher material bélico e na companhia do PAIGC a fazer propaganda política”.

A 21 de Agosto procedeu-se à entrega de Paunca ao PAIGC. No dia seguinte foi a vez de Bajocunda e a 25 de Agosto seguiu-se Pirada, com a recolha da CCS e da 3ª Companhia a Bissau.

Ainda prestou serviço no quartel-general em Bissau a guardar o palácio do brigadeiro Carlos Fabião, comandante-chefe das Forças Armadas na Guiné. No dia 4 de Setembro, na parada do BCP 12, em Bissalanca, cerca de 500 homens do [BCAV]  8323 uniram-se em formatura geral, “sentindo cada homem palpitar dentro do seu peito a dignidade do soldado português, que enfrentou os perigos de uma guerra dura”, manifesta Frutuoso Ferreira, que regressou a Portugal no dia 12 de Setembro de 1974.

Francisco Gomes (texto)
Texto e foto: Jornal das Caldas
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Nota do editor:

Último poste da série > 21 de fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9512: Os nossos últimos seis meses (de 25abr74 a 15out74) (1): O caso de Buruntuma e o ultimatum de Bobo Keita, comandante do PAIGC

Guiné 63/74 – P9517: Convívios (397): Comemoração do Dia do Combatente de Gondomar, dia 3 de Março de 2012 (Carlos Silva)

1. Mensagem do nosso camarada Carlos Silva (ex-Fur Mil Inf CCAÇ 2548/BCAÇ 2879, Jumbembem, 1969/71), com data de 19 de Fevereiro de 2012:

Meus caros amigos Vinhal ou Magalhães
Agradeço-vos que publiquem no blogue o cartaz relativo às comemorações do Dia do Combatente em Gondomar a celebrar no próximo dia 3 de Março
Apelo a todos os ex-combatentes, familiares e amigos que compareçam nesse dia em Gondomar

Com um abraço amigo
Carlos Silva


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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 16 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 – P9495: Convívios (317): 3º Encontro de várias gerações de Lanceiros Polícia Militar/Polícia do Exército (Nuno Esteves)